Classificação da joalheria Paraense a partir dos processos produtivos e inserção da cultura local. Classification of the Paraense jewelry by the productions processes and the introduction of local culture Chagas, Fonseca Clarisse; Mestranda; Universidade Federal do Pará [email protected] Pinto, Rosângela Gouvêa; Mestranda; Universidade Federal do Pará [email protected] Resumo O presente trabalho se propõe a estudar e classificar a joia produzida na região metropolitana de Belém, a partir da implantação do Programa Estadual de Verticalização Mineral do setor de gemas e joias em 1998. O qual fomentou a criação, planejamento e execução de joias com Design Paraense, utilizando matéria prima e mão de obra local, favorecendo o uso de elementos da cultura material e imaterial (na busca de uma identidade própria), considerando também os processos de fabricação, que definem categorias de joias estabelecidas pelo mercado como: artesanal, artística e industrial. Palavras Chave: Design de Joias; Processos Produtivos; Cultura. Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Abstract This research aims to study and classify the jewelry produced in metropolitan region of Belém by the establishment of the State Program Verticalization Mineral of Gems and Jewelry in 1998, which stimulated the development, planning and execution of Pará’s jewelry with exclusive design using raw materials and local labor, favoring the use of material culture and heritage elements in search of an identity and considering also the manufacturing processes, which define categories of jewelry set by the market as craft, of art and industrial. Keywords: Jewelry Design; Production Processes; Culture. 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. O tema proposto surgiu do anseio de estudar as características peculiares da joia paraense, observando os materiais, as técnicas, os processos de fabricação e a inserção dos elementos que compõem a cultura material e imaterial local, a partir de incursões em oficinas, feiras e palestras no Espaço São José Liberto, administrado pelo Instituto de Joias e Gemas do Pará/IGAMA. O setor de joias é responsável por um número considerável de arrecadações no Estado, gerando emprego e renda através do desenvolvimento de empresas em diversos setores como embalagem, design gráfico, promoção de eventos (como ExpoJoias e Rodadas de Negócios, realizados pelo SEBRAE/PA). Também, por ser um setor em ascensão, tornou-se fundamental a necessidade da produção de conhecimentos científicos sobre a Joia Paraense, formando um acervo de publicações a serem disponibilizados para comunidade. A inserção de temáticas da cultura regional na joia tem ampla visibilidade no Norte, especificamente no Estado do Pará, pois há uma produção relevante e espaço sócio-cultural que podem dar subsídios teóricos e práticos para realização do trabalho. Os quais podem ser observados através do uso de elementos significativos, como: as sementes (açaí, tucumã), o patrimônio histórico (Theatro da Paz), festas religiosas (Círio de Nazaré), lendas (vitóriarégia, curupira) entre outros temas regionais. Para esta pesquisa foi realizada uma abordagem Crítico-dialético, analisando as unidades produtivas, designers e produtos. Como procedimento se apropriou de pesquisa bibliográfica, levantamento de dados e imagens. Os Instrumentos utilizados foram visitas técnicas e questionários fechados. Programa Pólo Joalheiro O Projeto Pólo Joalheiro foi coordenado inicialmente pela Associação São José Liberto (ASJL). O espaço físico onde foi instalado o Programa está localizado no antigo convento e presídio São José, o qual foi restaurado e revitalizado para funcionar como espaço de comercialização das joias e artesanato do Pará, sendo renomeado como Espaço São José Liberto. Durante a reforma, o prédio foi seccionado em quatro principais espaços: A casa do artesão, onde é promovida a venda de artesanato 1, as “Ilhas de produção 2” onde o visitante observa a mesma joia que se encontra na vitrine, sendo produzida pelo Ourives, o museu de gemas onde se encontram acervos da cultura paraense, gemas variadas (diamantes, ametistas, quartzos tricolores, etc.) e o Jardim da Liberdade, localizado ao ar livre, juntamente com as lojas de joias dos participantes do Programa. No ano de 2007, ocorreu uma mudança na administração do Espaço São José Liberto, passando da ASJL para o Instituto de Gemas e Joias da Amazônia (IGAMA). Este instituto objetiva qualificar o setor joalheiro, promovendo cursos de capacitação e palestras para ourives e designers do programa. Portanto, dando continuidade às ações já realizadas pela antiga associação e promovendo novas ações como consultorias em design, comunicação visual, vitrina, embalagens e gestão empresarial. 1 Conjunto de artefatos mais expressivos da cultura de um determinado grupo, representativo de suas tradições, porém incorporados à sua vida cotidiana. Sua produção é, em geral, de origem familiar ou de pequenos grupos vizinhos, o que possibilita e favorece a transferência de conhecimentos sobre técnicas, processos e desenhos originais. Artesanato de referência cultural São produtos cuja característica é a incorporação de elementos culturais tradicionais da região onde são produzidos. 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Figura 01: Espaço São José Liberto onde está instalado o Programa Pólo Joalheiro. Fonte: Panfleto Institucional IGAMA, 2009. A inserção do Design na Joalheria Paraense O Design de produto é uma área muito extensa, a ela cabe a criação de todos os objetos do nosso cotidiano, como: mobiliário, automóveis, eletroeletrônicos, objetos de decoração, eletrodomésticos, vestuário, joias, acessórios, máquinas, equipamentos para diversos fins, etc. Filho (2006) descreve Design do objeto como: “os objetos concebidos para serem fabricados não só no modo industrial, mas também no modo artesanal e/ou misto”. Além destes quesitos projetuais, é necessária a pesquisa sobre o objeto a ser criado, e também a uma pesquisa do local e dos hábitos da população para onde o produto será comercializado. Logo, devido ao objeto de estudo deste trabalho ser a joia produzida no Programa Pólo Joalheiro, é importante refletir se seu processo produtivo condiz com as bases estabelecidas pelos autores, conforme segue: A passagem de um tipo de fabricação, em que o mesmo individuo concebe e executa o artefato, para outro, em que existe uma separação nítida entre projetar e fabricar constitui um dos marcos fundamental para caracterização do Design. (DENNIS, 2000, pag.17) Podemos classificar a joia como um bem de consumo denominado de Produto de Uso, pois a interação entre o objeto e o homem é direta. Isso significa que o homem utiliza-o sem intermédio de outros produtos ou pessoas, conforme definição Produtos de Uso – Incontáveis produtos com que os usuários mantêm interface efetiva de utilização, como: veículos, mobiliários, utensílios domésticos, eletrodomésticos, eletroeletrônicos, calçados, joias, embalagens, e outros. (FILHO, 2006, p. 27) Antes da implementação do Projeto Pólo Joalheiro, a conscientização dos empresários sobre o exercício do Design não existia. O empresário era ao mesmo tempo lojista, ourives, 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. designer, vitrinista, designer gráfico e contador. Portanto, a cadeia produtiva do setor era desestruturada. O processo de inserção do Design no Estado se deu através do programa Pólo Joalheiro, que, com suas ações, proporcionaram a conscientização dos ourives sobre a necessidade da presença do designer de joias no processo produtivo. Uma das ações que auxiliou a inserção do designer nessa cadeia foi o workshop de criação de novos produtos – para designers, com o objetivo de desenvolver coleções temáticas, até então não produzidas no Estado. Figura 02: Workshop de criação para coleção de joias - Círio de Nazaré 2008 Fonte: IGAMA, 2008 Nessas atividades procura-se ressaltar a estilização do cotidiano Amazônico, para que as joias não apresentem formas demasiadamente óbvias e figurativas. Sobre este assunto, Campos (2007) afirma que o designer de produto, hoje, precisa ajustar seus processos de criação às novas tendências de Design, que dão ênfase à abstração, imaterialidade e complexidade. Na joalheria, o desenvolvimento de uma coleção é um processo que passa por várias etapas. Inicialmente o designer precisa observar o espírito da época, realizando suas pesquisas para a compreensão do contexto no qual está inserido. Em seguida, avaliam-se as tendências observadas, adequando-as a realidade da empresa e do mercado visado, O próximo passo é a montagem de um mood board 3 com o material recolhido e previamente selecionado. (...) Após a definição do tema, vem a etapa da pesquisa deste tema e montagem de uma ambiência especifica formada por uma ou mais imagens. (CAMPOS, 2007, p 84) Outra questão pertinente a inserção do Design, é a utilização de temas provenientes da cultura e do cotidiano Amazônico. Com os workshops de criação, veio também uma proposta de utilização dos ícones da cultura amazônica de uma forma consciente, propondo o deslocamento de determinado ícone sem descontextualizá-lo, para que o seu entendimento pudesse ser claro e comunicar como joia. Como exemplo, a utilização de grafismos marajoaras encontrados em urnas mortuárias, aplicados em joias criadas para uma coleção de “Dia das Mães”. Esta é apenas uma das falhas que foram corrigidas, a partir de uma nova abordagem da cultura na utilização de seus ícones direcionados para a joalheria local. 3 Painel com recorte de imagens e textos, também podem ser definidos como painel de inspiração 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Ao término do workshop de criação é realizada uma exposição com os projetos desenvolvidos, sempre com uma temática previamente escolhida, para que proporcione coerência e unidade na escolha dos materiais e uma estética adequada à história a qual será narrada através das joias. A fase de elaboração e escolha de conceitos permite ao designer a experimentação de novas propostas e oferece o ambiente propicio para as “invenções”. [...] Tendência forte na concepção de joias, hoje, a coleção codifica, classifica e dá coerência às peças, instaurando um repertório de formas e cores, tal qual uma linguagem que conta a história que as alicerça, sensibilizando e mobilizando as conotações afetivas. (CAMPOS, 2007, p 84) Esta metodologia de trabalho por coleções ocasionou um novo perfil para a Joalheria Paraense, pois, a partir disto é possível produzir catálogos que possam contar a história amazônica de uma maneira mais clara, sem que a cultura que serviu como base para a pesquisa não seja deturpada. Atualmente o quadro apresenta pequenas mudanças e o empresário está mais consciente da necessidade de segmentar as atividades, tornando a cadeia mais organizada e estruturada. Assim, firmando a importância do designer e dos demais profissionais dentro de sua empresa. Como se observa na afirmação abaixo, sobre o setor joalheiro no Brasil, no Estado do Pará, este percurso não foi divergente. Há dez, quinze anos atrás, a sinergia entre ambos era um desafio cuja superação tinha poucas perspectivas de eixo. Se os designers de joias eram vistos como artistas afastados da realidade do mercado, aos industriais cabiam a fama de serem intolerantes e resistentes a novas propostas [...] O reconhecimento do processo de design como “valor agregado” aos processos e conhecimentos organizacionais foi uma mudança de paradigmas para os joalheiros que, aos poucos, passaram a admitir a presença deste novo profissional – o designer de joias – em seu quadro de funcionários. (CAMPOS, 2007, p. 52) No espaço São José Liberto a comercialização de projetos de joias desenvolvidos por designers ainda é em pequena quantidade. Entretanto, os ourives começaram a perceber a necessidade de trabalhar em parceria com o designer e nota-se, além disso, uma evolução sobre os aspectos projetuais de antes da inserção do Projeto, onde as criações eram aleatórias, sem uma preocupação com o ciclo de vida do produto entre outros fatores. A Joia Paraense e as classificações produtivas - Joia industrial A fundição é um método de confecção de joias muito antigo. Atualmente com a evolução da técnica, existem várias maneiras de executá-la, as principais são pela confecção do modelo em metal e pela confecção do modelo em cera. O maquinário de fundição antes era encontrado apenas em empresas de joalheria com produção de larga escala, principalmente fabricante de joias comerciais como alianças, anéis 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. de formatura, conjuntos (brinco, pendente e anel) de baixa complexidade. Contudo, no Estado do Pará, algumas unidades artesanais já utilizam este maquinário como uma etapa de seu processo artesanal, pois assim como pode ser utilizado com o objetivo de produção em larga escala, os produtores locais utilizam a técnica com o objetivo de aumentar a quantidade e tornar o produto mais idêntico ao projeto original, implicando na qualidade. - Joia artesanal A joia artesanal é caracterizada por um processo mais duradouro e detalhado do que a joia industrial, pois todas as etapas são realizadas manualmente. Desde fundir 4, laminar ou trefilar 5, cortar e serrar, limar 6, lixar 7, soldar até a etapa final (o acabamento) que pode ser polido, acetinado, fosqueado, adiamantado, jateado entre outras texturas. Na joalheria brasileira contemporânea, é freqüente a presença de materiais alternativos como madeiras, fibras naturais, chifres, sementes, borrachas, couro de peixe, e outros materiais reaproveitados como a fibra ótica. Essa “re-descoberta do Brasil” possibilitou aos designers um novo posicionamento na Joalheria Internacional, fazendo com que a inserção de elementos até então simplórios causassem estranhamento em joalheiros e críticos mais conservadores, entretanto, também gerando uma surpreendente aceitação do mercado interno e externo. No caderno de tendências, o anuário do Instituto de Gemas e Metais Preciosos – IBGM, a designer Regina Machado classifica o material alternativo como ‘novas preciosidades’. O perfil da joia brasileira contemporânea se fixou nas raízes do Brasil, na sua terra, fibras, folhas, flores, animais e cores. Esta é a essência da joia verde e amarela, entretanto sem perder o charme que toda joia requer. Novas preciosidades: couros, madeiras, ossos, chifres. O diferencial dos materiais alternativos. Ouro e diamantes funcionam como pontos de luz que consagram a nobreza dos materiais. As texturas naturais sinalizam autenticidade no encontro com o brilho dos metais e das gemas. (MACHADO, 2008, p.7) Os designers que projetam este perfil de joia sempre procuram associar histórias do repertório imagético vivido por eles ou pelo público que pretendem alcançar. Estas características mais fortes, que ocasionam o distanciamento entre a joalheria contemporânea e a tradicional, são resultados de um retrocesso a valorização do que é regional. - Joia de montagem No segmento da joalheria artesanal existe a joalheria de montagem, a qual também utiliza metais nobres, acabamentos refinados, de qualidade e gemas naturais. O seu diferencial é a habilidade de improviso em determinadas fases da produção. Nesta joia é importante analisar com atenção os entremeios e fechos a serem utilizados para que não seja confundido com bijuteria. 4 Elevar a temperatura do metal, fazendo com que ele mude de estado sólido para líquido se unindo a outros metais transformando-se em uma liga metálica 5 Diminuir a espessura da barra de metal, transformando-a em chapa 6 Desgastar a liga metálica com uma serra de metal 7 Desgastar a liga metálica com uma lixa convencional. 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Joalheria de montagem é a técnica que permite o ourives construir a peça sem precisar utilizar grandes quantidades de soldas 8, pois o processo de construção se baseia na escolha do material a ser utilizado, e montar peça por peça até que resulte em uma joia. As peças mais utilizadas neste tipo de produção artesanal são fios de metal, entremeios (argolas), fechos, passadores, ganchos e demais elementos. Neste processo são utilizados vários itens que dão à joia a sensação de única, pois o ourives pode utilizar as mesmas peças, entretanto poderá montá-las de diversas maneiras. No Brasil, a Designer Karina Achôa é a precursora da joalheria de montagem. Em seu trabalho, Achôa torna notável a presença de materiais alternativos, formas orgânicas e ampliadas, fechos e elos diferenciados e com pouca solda. A Joia de Montagem resgatou e ampliou o uso de materiais menos convencionais. O que mais vemos são Joias de Montagem que permitem e facilitam a criação, incorporando rochas e minerais, libertando assim o designer da ditadura do uso exclusivo das gemas. (ACHÔA, 2009, p. 1) O processo produtivo da joalheria de montagem é semelhante aos demais processos artesanais utilizados por alguns participantes do Programa Pólo Joalheiro, pois todo o procedimento não é realizado apenas por uma só pessoa. Ou seja, a cravação, lapidação ou a aplicação da incrustação paraense 9 na maioria das vezes é realizada por terceiros, assim agilizando a produção e reduzindo o custo total de produção da joia. Observa-se esta descrição na citação abaixo: A Joia de Montagem liberta e dá oportunidade de criar, sem necessidade de se executar cada parte de uma peça, numa tarefa muitas vezes árdua e demorada. O que, sem dúvida, computando o tempo empregado nesta execução, pode elevar muito o preço, colocando-a às vezes acima do valor de mercado. (ACHOA, 2008, p1) - Joia de pesquisa Outra categoria artesanal é a joia de pesquisa, nesta especialidade os artesãos e designers trabalham diretamente com a experimentação de novos materiais, geralmente não usuais em uma joia, como fibra ótica, plástico, vidro, acrílico, borracha e até alimentos quimicamente tratados. A comercialização não é o grande foco deste tipo de joia devido a complicações na utilização como peso, ângulos demasiadamente agudos, entre outros entraves. A ausência de preocupação com o funcional é uma conseqüência da liberdade cedida à criatividade neste processo. Este fato é um indicador do perfil de quem a cria, da sociedade em que vive e permite a descoberta de tecnologias e materiais. Segundo Franchi (2009), a joia de pesquisa é a que tem maior a experimentação de materiais e/ou formas ou a expressão de sentimentos. Na maioria das vezes ela acaba diminuindo a ideia de joia devido as suas diferentes formas e usos. (informação verbal) 10 8 Unir metais através de grandes temperaturas. Técnica paraense de pigmentação no metal 10 Palestra proferida por Claudio Franchi no I Workshop Internacional de Joias, Belém, 2009) 9 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. No Programa Pólo Joalheiro existem pesquisadores como Paulo Tavares, que desenvolve estudos com ligas metálicas, materiais alternativos e resinas regionais. Em uma de suas pesquisas aborda a coloração de resinas através da extração de pigmentos de alimentos como a maniva utilizada na maniçoba, tucupi, açaí, chocolate, pimenta, entre outros alimentos. Lidia Abrahim, designer do Programa, também se destaca com projetos classificados como joia de pesquisa. Atualmente desenvolve um projeto experimental com reaproveitamento de CDs. Além de seu trabalho com CDs, Lidia realiza experimentações com diversos metais, resultando em novas propostas para utilização e reaproveitamento de materiais que inicialmente não tinham sua função destinada ao adorno corporal. Este perfil de pesquisa é importante para a evolução da joalheria, devido à descoberta de novas possibilidades de uso tornando a joia uma vitrine da sociedade em que foi criada. Figura 03: Adorno em CDs com prata de Lidia Abrahim Fonte: Arquivo Lidia Abrahim, 2010 - Joia de autor A joalheria de autor no Brasil é muito difundida, vários ateliês de joias se classificam nesta categoria pelas suas características, como liberdade para criação e utilização de materiais inusitados como os anéis de Francisco Garcia e Elizabeth Franco que são transições de escultura/joia/obra de arte. A joia de autor acaba se transformando em joalheria de arte/obra de arte, e assim como acontece em alguns exemplos da joalheria de pesquisa, esta afinidade é devido à grande semelhança dos processos criativos de ambos. “A joalheria de arte é, hoje, uma das fortes tendências do setor [...] O mais importante é reconhecer que os experimentos, as ousadias e as “loucuras” realizadas pelos artistas-joalheiros têm contribuído de maneira efetiva para o desenvolvimento do design de joias no Brasil. (CAMPOS, 2007, p. 90) 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Como afere Campos (2007), em geral entende-se por ‘joia de autor’ a joia que é confeccionada por quem a cria. Muitas vezes, não existe um projeto prévio e é durante o manuseio do metal que o artista desenvolve sua obra. [joia de autor é] uma peça única ou de tiragem limitada, produto de um desenho e realizada com técnica de joalheria artesanal na bancada. A joia de autor é uma criação pura, não importando ao autor entrar em oposição a tudo que existe, é uma “anti-joia” no sentido tradicional, é o passo a frente do convencional, é uma escultura portável. Campos (Apud GOLCMAN, 2003) A joalheria de autor é uma categoria muito presente no Programa Pólo Joalheiro e consiste na ausência de um projeto completo planejado anteriormente à execução da joia, pois esta é ‘criada’ no momento de sua execução. Camilla Amarall é a joalheria de autor que mais se destaca no programa, pois desenvolve suas joias neste método de criação/produção utilizando a cultura e materiais da Amazônia. Figura 04: Joalheria de autor – par de brincos em prata e coco, inspirados na flora amazônica de Camilla Amarall Fonte: Arquivo Camilla Amarall, 2008 Ao final desta classificação dos tipos de produção encontrado na joalheira paraense, segue o organograma que descreve as fases do processo produtivo realizado pelas empresas do Programa Pólo Joalheiro, a partir das análises nas unidades produtivas. A descrição deste processo foi elaborada por meio de estudo das atividades mais desenvolvidas dentro da maioria das empresas, o que não implica que todas exerçam metodicamente as atividades descritas abaixo na confecção de todas as suas joias. 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Figura 05: Organograma – Processo produtivo Fonte: Autora, 2009. Análise do setor produtivo do estado Com o objetivo de analisar os processos produtivos do setor, foram questionadas 14 das 22 empresas (formais e informais - participantes do Programa Pólo Joalheiro). Para a classificação da joalheria, foi estabelecido como parâmetro o processo produtivo da joia paraense. As informações abaixo relacionadas são decorrentes de questionário repassado entre os meses de Setembro e Outubro de 2009 Na relação unidade produtiva e funcionário, 93% dos questionados afirmaram ter apenas entre 01 a 05 pessoas trabalhando em sua unidade produtiva, este dado caracteriza o perfil de produção artesanal. Cada funcionário é responsável por uma atividade na produção em 50% das unidades pesquisadas. Entretanto 36% são responsáveis por executar todo o processo. A liga mais utilizada entre os produtores é a de ouro amarelo com 57% e em seguida a liga de prata com 36%. Contudo, quando se observa os catálogos oficiais e exposições realizados pelo IGAMA, é perceptível que a liga de prata 950 é mais utilizada. A maioria dos ourives classificou sua produção como artesanal - 86% e os demais 14% afirmam ter uma produção semi-industrial. Os questionados afirmaram que mais da metade das joias confeccionadas são próprias criações, e 43% corresponde a projetos comprados. As peças mais produzidas são: o anel (43%), pendente (36%) e o brinco (21%). Os produtores apresentaram em suas respostas uma produção antagônica, pois 29% afirmaram produzir apenas de 05 a 15 peças/mês, enquanto outros 29% afirmaram produzir mais de 100 peças por mês. Estes indicativos são painéis de um nítido processo de transição onde a joia paraense sofre uma mudança de pequena escala (10 peças) para larga escala (acima de 100 peças), no entanto, não deixando de ser confeccionada a mão. Os produtores se mostraram proativos, pois 79% afirmaram trabalhar com coleções de joias além das coleções que são promovidas pelo IGAMA, este dado apresenta uma 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. satisfatória evolução quanto à inclusão das consultorias relacionadas às tendências de mercado em suas unidades. Dos ourives questionados 86% asseguram aceitar a presença de designers em suas unidades produtivas e já trabalham com projetos de designers sem que sejam motivados para participar dos eventos promovidos pelo IGAMA. Dado significativo para demonstrar que a inserção do profissional tem se dado gradativamente ao longo dos doze anos do Programa. Com a leitura final destes dados constata-se que a produção local se encontra em uma lenta transição da joalheria artesanal para industrial. Contudo, classificá-la mista, ou semiindustrial seria um equivoco, pois as características de produção artesanal ainda são mais presentes do que qualquer outro processo. Devido a estes fatos poderíamos classificar a joalheria paraense como joalheria artesanal, o que não torna a joalheria paraense diminuída perto das demais, caracterizadas por produzir em grandes quantidades. Esta denominação deve ser vista de forma positiva, pois o termo industrial não é sinônimo de selo de qualidade. Após as leituras dos questionários e análises dos catálogos institucionais foi construído um gráfico simbólico (figura 06), o qual afirma que a joia paraense é em sua maioria joalheria de autor (60%). Portanto, mesmo com a inserção do designer na cadeia produtiva de joias através do Programa Pólo Joalheiro, a grande maioria dos produtores ainda tem em suas vitrines maiores quantidades de joias criadas em bancadas do que projetada por designers. Aproximadamente 30% das joias têm o perfil da joalheria de pesquisa, pois possui características artísticas e conceituais evidentes devido à grande inserção da cultural material e imaterial nas inspirações. Apenas 10% das empresas participantes do Programa Pólo Joalheiro têm com as características a joalheria de montagem. Figura 06: Quadro demonstrativo do perfil da joalheria paraense. Fonte: Autora, 2009 Conclusão As informações coletadas foram importantes para o reconhecimento do Setor Joalheiro do Estado e apresentar a produção joalheira local analisada e classificada em categorias de joias. 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. As ações executadas pelo IGAMA e por outras Instituições foram relevantes para o desenvolvimento da joalheria, pois promoveram a qualificação e ordenação da cadeira produtiva de joias, gerando um novo direcionamento e perspectivas para a joia do Pará. A partir desta pesquisa e da experiência ao longo de três anos realizando projetos de joias para empresas locais e para coleções institucionais, participando de cursos e workshops de qualificação, afirmo que a produção joalheira do Estado é constituída de joias artesanais com feições artísticas quanto a sua estética. A quantidade produzida é limitada e em alguns casos por encomenda. Ainda pela inserção em coleções institucionais, percebe-se que, em geral as joias são produzidas próximo as datas dos eventos, dificultando a produção em série. O fato de algumas unidades produtivas do Programa Pólo Joalheiro conhecerem o processo de fundição por cera perdida e utilizá-lo em seus produtos não os caracteriza como produção industrial, pois estas empresas não utilizam esta fase do processo industrial diariamente em suas unidades e sim, apenas para a produção de determinadas joias. É notável que 100% das joias são inspiradas em lendas, mitos e costumes da Amazônia, entretanto algumas formas são estilizações do comum, e apenas algumas formas são reais abstrações de histórias. A Fauna e a Flora são os temas mais encontrados nas lojas. As categorias detectadas durante a pesquisa foram analisadas tendo como parâmetro a categoria que mais se mostrava presente em cada unidade produtiva. Entretanto é perceptível a presença sutil de todas as categorias aqui citadas nas unidades produtivas participantes do Programa Pólo Joalheiro. A joia produzida no Pará não diverge das joias dos demais Estados do Brasil, quando se faz uma análise sobre qualidade e contextualização com a cultura local. Este produto está em constante mudança, sempre se reinventando, nunca deixando de ter uma comunicação global com um olhar local. 9° Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design Classificação da joalheria paraense através dos processos produtivos e inserção da cultura local. Referências BAXTER, Mike. Projeto de Produto: Guia prático para o design de novos produtos. 2º Ed. São Paulo-SP. Editora Edgard Blucher, 2001. BÜRDEK, Bernhard E. Design: História, Teoria e Prática do Design de Produtos. Editora Edigard Blucher, São Paulo-SP, 2007. CAMPOS, Maria Aparecida de Moraes Siqueira (Cidda Siqueira). A Pesquisa De Tendências: Uma Orientação Estratégica no Design de Joias. 2007. 108f. Dissertação (Mestrado em Artes e Design) – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006. CARDOSO, Rafael. 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