Despacho em 22/04/2014 - RE no(a) RE Nº 60078 Juiz Lourival Almeida Trindade Os Recorrentes, através de advogado, regularmente habilitado, irresignados com o acórdão n.º 45/2014, integrado pelo acórdão n.º 257/2014, prolatado por este Tribunal, nos autos do Recurso Eleitoral n.º 600-78.2012.6.05.0090 - Classe 30, oriundo do município de Brumado/BA, interpõem recurso especial, com fulcro no artigo 276, I, "a" e "b" , do Código Eleitoral. Aduzem, em síntese, a existência, no acórdão exprobado, de violação aos artigos 73, II, IV, V, VIII, §§ 1º ao 11; 74, da Lei n.º 9.504/97; 22, da Lei n.º 64/90; 37, caput e §4º, da Constituição Federal, bem como asseveram haver divergência jurisprudencial em derredor da matéria decidenda. É o breve relato, passo a decidir. Desvelando-se o recurso especial interposto, não se vislumbra, no acórdão n.º 45/2014, vergastamento a qualquer preceito legal, por isso que guarda perfeita harmonia com a legislação aplicável, consoante ressai do mérito de sua ementa (fls. 647/648): Recursos. Ação de investigação judicial eleitoral. Procedência. Abuso de poder político. Captação ilícita de sufrágio. Não demonstração. Provimento. [....] Mérito. Dá-se provimento aos recursos para julgar improcedente o pedido, considerando-se que a contratação e as demissões ocorridas, assim como as inaugurações de obras narradas na exordial, não se deram com motivação eleitoreira, afastada, assim, a ocorrência de abuso de poder político ou econômico. Nesta senda, por maioria, esta Corte Regional concluiu, por meio do voto condutor do referido acórdão (fls. 635/644), que: MÉRITO. A pretensão recursal enseja acolhimento pois, do exame das provas existentes nos autos, não exsurge o abuso de poder político e econômico vislumbrado pelo julgador de primeiro grau, de modo a amparar a procedência do pedido por ele decretada. Os autores propuseram a ação em exame contra o ex-prefeito do Município de Brumado e os candidatos por ele apoiados para sua sucessão, defendendo que teria havido abuso de poder em benefício de suas candidaturas. O pedido fundamentou-se na ocorrência dos seguintes fatos, que ora merecem criteriosa análise: 1. Contratação de estagiários antes da campanha eleitoral e sua demissão logo após o resultado das eleições. Não se vislumbra irregularidade nas contratações e dispensas de estagiários ocorridas no Município de Brumado. A referida contratação obedeceu ao quanto determinado em lei específica e se deu por intermédio do Instituto Euvaldo Lodi - IEL, tendo ocorrido também em anos anteriores a 2012. Antonia Bezerra da Rocha, Coordenadora Regional do referido instituto, ao prestar seu depoimento em juízo, esclareceu que o programa de estágio no Município de Brumado está em atividade desde o ano de 2009, não tendo sofrido aumento no número de contratações em 2012, nem qualquer ingerência da administração municipal para fins de contratação ou dispensa de estudantes específicos. A coordenadora afirmou ter estado por diversas vezes no referido município, cuidando da seleção, entrega de documentos e acompanhamento dos estudantes escolhidos, que atendiam os critérios definidos pela Lei nº 11.788. Asseverou, ainda, nunca ter recebido qualquer reclamação de estagiários que estariam sendo obrigados a comparecer a inaugurações ou atos de campanha durante o processo eleitoral sob pena de serem dispensados. A afirmação de que os estagiários eram obrigados a comparecer a atos de campanha para não perderem a contratação não foi demonstrada. Embora em seu depoimento Barbara Cristina Vasconcelos Coqueiro, pedagoga concursada da prefeitura, tenha afirmado que recebeu ligações das servidoras Núbia e Rose, da Secretaria de Educação, determinando que os estagiários e contratados de sua unidade deveriam participar de caminhadas e carretas, Jarilda dos Santos Bonfim, ex-estagiária ouvida como testemunha referida, esclareceu que eles eram obrigados a ir a reuniões do programa de estágio mas que, quando se tratava de atos de campanha, havia convite feito por telefone pelas servidoras, mas não se dizia ser obrigatório, conclusão a que chegavam em conversas entre os colegas. Embora essa estagiária tenha afirmado que fora demitida por suspeita de ter votado na candidata representante, ao ser cotejado seu depoimento com as declarações por ela prestadas perante o Ministério Público, ressaltou-se que, naquela oportunidade, ela não fez qualquer menção a ter sido vítima de retaliação por conta de sua escolha política já que, naquele momento, havia admitido ter sido dispensada a pedido da diretoria da escola onde estagiava. Soa pouco provável que a testemunha tenha procurado o Ministério Público para fazer queixa de ter sido desligada antes do final do seu contrato, em razão de perseguição política, e tenha deixado de mencionar tal fato em suas declarações. Também Juliete Moreira Bernardes, ex-estagiária ouvida em termos de declarações por ter atuado como fiscal do partido dos autores da presente AIJE, asseverou que somente recebeu convite, por meio de SMS assinado pelo Sr. Welington, para comparecer a atos de campanha, tendo ido a apenas um deles. Esclareceu, também, que quando de sua seleção não lhe foi exigida a apresentação de título de eleitor. Embora os estagiários possam ter recebidos chamados para atos políticos por mensagens em seus celulares, enviados por Wellington Lopes, ex-assessor do prefeito e candidato a vereador, restou demonstrado que se tratava de convites e não de convocações, sem qualquer sanção a quem optasse por não participar. Por fim, vale destacar que não há óbice ao desligamento de estagiários no período que antecede e sucede as eleições, tendo a administração municipal justificado que, ao dispensá-los próximo ao fim do mandato, estava agindo por necessidade de atender às exigências dispostas no artigo 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Assim, a alegada contratação oportunista de estagiários, com sua posterior dispensa após o prélio, não caracteriza abuso de poder político em benefício dos candidatos eleitos, ainda mais quando não se produziu qualquer prova de que a seleção fora feita sob a condição de votarem nos candidatos apoiados pelo então prefeito. Afasto, pois, esse fundamento. 2. Demissão de servidores públicos após o resultado das eleições. A demissão de servidores contratados foi admitida pelos recorridos, porém restou esclarecido que se tratava de contratos que cessaram para dar cumprimento a TAC celebrado com o Ministério Público (fls. 66/74), que demandava a dispensa de servidores com contratos irregulares para que fossem contratados os aprovados em concurso público (fls. 246/249), dispensa que se deu não só em 11 de outubro de 2012, mas também durante o período eleitoral, não demonstrando assim conotação eleitoreira nesse fato. Importante frisar que, em parecer, o representante do Ministério Público Eleitoral zonal reconheceu que as demissões se deram com respaldo legal (fl. 462). Por meio do Decreto nº 4.531, de 27 de abril de 2012 (fl. 251), foram dispensados 111 (cento e onze) contratados; pelo Decreto nº 4.562, de 24 de agosto de 2012 (fl. 255), mais 139 (cento e trinta e nove) e pelo Decreto nº 4.586, de 30 de novembro de 2012, mais 9 (nove) servidores. Por editais, foram convocados candidatos aprovados em concursos públicos nos meses de fevereiro, abril, maio e junho de 2012 (fls. 265/288). Da instrução do feito, ressalta-se que Getúlio Borges Pereira, testemunha arrolada pelos autores, fez menção a pessoas que foram demitidas antes das eleições, o que respalda a justificativa da administração de que estaria cumprido o quanto acordado no TAC firmado com o Ministério Público. Assim, ainda que o primeiro recorrente apoiasse a chapa dos recorridos à sua sucessão, situação que não denota irregularidade, as testemunhas ouvidas não deram notícia de qualquer envolvimento ou mesmo do conhecimento desses candidatos nas contratações ou demissões que se afirmou terem motivação políticas, alegações que não considero comprovadas. Nesses termos, a demissão dos servidores após a eleição também não pode ser caracterizada como abuso de poder político, não configurando irregularidade que justifique a cassação dos mandatos dos candidatos aos quais o ex-prefeito prestava apoio. 3. Aumento das despesas de programas sociais no período da campanha eleitoral. Alegou-se que teria havido grande distribuição de cestas básicas através do Avante Sertanejo, programa assistencialista criado às vésperas das eleições de 2008, bem como pelo Fundo Municipal de Desenvolvimento Social e Cidadania de Brumado, o que caracterizaria abuso de poder político e econômico perpetrado pelo prefeito municipal em prol dos seus candidatos. Ocorre que restou demonstrado que o Programa Avante Sertanejo foi criado em janeiro de 2007 pela Lei Municipal nº 1.514, suspenso de setembro de 2008 a novembro de 2010 por força de decisão judicial referente à análise de sua execução anteriormente ao ano eleitoral de 2008 e da constitucionalidade da lei que o havia criado. Contudo, o referido programa foi reativado em novembro de 2010, atingindo um acréscimo progressivo no número de famílias beneficiadas ao longo do ano de 2011, que não sofreu alterações em 2012. Tratou-se de um programa com previsão de atender até mil famílias em estado de vulnerabilidade social, com renda de até 1/3 de salário mínimo por pessoa, todas devidamente cadastradas. A quantidade de alimentos distribuídos dependia da efetiva participação das famílias cadastradas nos cursos e atividades desenvolvidas pela Secretaria de Desenvolvimento Social e Cidadania, realizadas no Centro de Referência da Assistência Social ao longo do mês anterior, bem como do número de integrantes dessas famílias, por isso sofria variações, que não guardaram relação com o período eleitoral. Os documentos de fls. 362/367 demonstram que em 2011 foram pagos R$ 401.320,70 referentes à aquisição de alimentos para distribuição às famílias participantes do Programa Avante Sertanejo, com restos a pagar no valor de R$ 137.384,73. Já em 2012, foram listados processos pagos no valor de R$ 640.838,30, não tendo havido assim o acréscimo de despesas na ordem de 45% apontado pelos autores mas sim de R$ 102.132,87, ou seja, cerca de 15%. A entrega dos alimentos era feita diretamente pelos fornecedores, mediante apresentação de formulário de autorização emitido pela SESOC, não tendo havido vinculação da distribuição dessas cestas básicas a pedidos de votos para os candidatos recorridos. Maria Nicéia de Oliveira Almeida Silva, Coordenadora do Centro de Referência Especializada da Assistência Social explicou, ainda, a possibilidade de distribuição de cestas básicas em casos pontuais, com fundamento na Lei de Benefício Eventual, mas somente após ter sido comprovada a necessidade emergencial e após a visita da assistente social do município. Nesse ponto, não se fez qualquer prova de beneficiado que tivesse recebido cesta acompanhada ou vinculada a pedido de voto. Cabe ressaltar que o programa Avante Sertanejo estava de acordo com o quanto previsto no § 10 do artigo 73 da Lei nº 9.504/97, não lhe podendo ser atribuído caráter eleitoreiro nem a vinculação de seu uso a captação ilícita de votos. 4. Inauguração de obras públicas concentradas no período eleitoral e sua paralisação após a eleição. Não há vedação para que obras públicas sejam inauguradas nos meses que antecedem o pleito e mostra-se razoável que, ao se aproximar o fim do mandado de um gestor, haja um esforço para concluir os projetos em andamento. Tampouco há irregularidade em se divulgar essas inaugurações, convidando-se tanto servidores públicos, contratados e estagiários como a população em geral para prestigiá-las, com chamados feitos por carro de som, com o slogan adotado "sexta tem, sábado também" . Importante frisar que divulgavam-se as obras mas sem qualquer vinculação aos candidatos concorrentes ao pleito. Além disso, é fato comprovado durante a instrução do feito que obras continuaram a ser concluídas e inauguradas mesmo após as eleições (fls. 237/244), ainda que em menor ritmo, o que se explica pela proximidade do fim do mandato do prefeito. Em depoimento, a testemunha Getúlio Borges Pereira, arrolada pelos autores, apontou tanto a obra de um canal que deixou de ser executada ainda antes das eleições como a inauguração de uma praça que se deu depois. Do mesmo modo, a depoente Maria Nicéia de Oliveira Almeida confirmou ter ido a algumas inaugurações depois das eleições. A par disso, não houve durante as inaugurações de obras ocorridas nos meses que antecederam as eleições, no período vedado, qualquer participação dos candidatos eleitos, nem se demonstrou que o então gestor municipal tivesse, naquelas oportunidades, pedido votos para os mesmos. Vê-se, pois, que as condutas reputadas como irregulares pelos autores da AIJE não se enquadraram em abuso de poder político e/ou econômico. Por todas as razões retrosustentadas, entendo que a condenação dos recorridos não se sustenta, devendo ser reformada a sentença de primeiro grau, julgando-se improcedente o pedido vertido na inicial. Esse entendimento foi mantido, à unanimidade, quando do inacolhimento dos embargos de declaração opostos pelos ora recorrentes, sob o fundamento de que revelam mera inconformidade da parte em relação ao quanto decidido (acórdão n.º 257/2014). No que tangencia à alegada divergência jurisprudencial, apesar dos recorrentes haverem trazido à sua peça recursal decisório do Tribunal Superior Eleitoral, não procederam ao necessário cotejo analítico, entre o acórdão recorrido e o aresto, alçado a paradigma, com vistas à demonstração da similitude fática. Em regra, o referido cotejo analítico e a correspondente demonstração da similitude fática caracterizam-se pela exposição dos fatos, objeto de julgamento do acórdão recorrido, em confronto/comparação com os fatos, objeto de julgamento pelo acórdão paradigma, de modo a se revelar que a solução jurídica, em cada um, mostra-se divergente. In casu, dessume-se que os recorrentes, só e somente, anexaram ementa de acórdão (coligido na íntegra, ao final do apelo), sem haver procedido qualquer cotejo analítico, de modo a demonstrar similitude fática, ressevere-se. A propósito, estatui o artigo 541, parágrafo único, do Código de Processo Civil, in verbis: ¿Quando o recurso fundar-se em dissídio jurisprudencial, o recorrente fará a prova da divergência mediante certidão, cópia autenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que tiver sido publicada a decisão divergente, ou ainda pela reprodução de julgado disponível na Internet, com indicação da respectiva fonte, mencionando, em qualquer caso, as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados." [grifei]. Nesse sentido, posicionou-se a Corte Superior Eleitoral: "AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. NÃO DEMONSTRADA. NEGADO PROVIMENTO. (...) II - A divergência requer, para sua caracterização, o devido confronto analítico, além da similitude fática e jurídica entre o julgado e o acórdão paradigma, para possibilitar o conhecimento do recurso especial." [grifei]. Por consectário, a mera transcrição de ementa de acórdão de outro tribunal eleitoral, sem a devida exposição dos fatos que o desencadeou, não se presta a caracterizar o dissídio jurisprudencial alegado, por não mencionar as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados. Demais disso, a decisão tomada por este Regional aplicou a norma de regência, em conformidade com a convicção formada a partir das provas coligidas nos autos. A modificação de tal entendimento, ao contrário do que aduzem os recorrentes, exigiria reexame do conjunto fático-probatório; se entremostra, portanto, desprovida de visos de juridicidade, na via angusta do recurso especial, conforme diretriz encampada pelos enunciados das Súmulas n.º 7, do Superior Tribunal de Justiça, e n.º 279, do Supremo Tribunal Federal. Eis, no particular, paradigmático decisório do Tribunal Superior Eleitoral: RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ELEIÇÕES 2008. PREFEITO E VICE-PREFEITO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). CONDUTAS VEDADAS AOS AGENTES PÚBLICOS EM CAMPANHA. ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. REFORMATIO IN PEJUS. PARCIAL PROVIMENTO. (...) 3. Quanto ao abuso de poder, o reconhecimento de que a conclusão regional é contrária à prova dos autos demanda o reexame de fatos e provas, que encontra óbice na Súmula 7/STJ. 4. No que concerne à suposta ausência de análise da potencialidade da conduta, a despeito da oposição de embargos de declaração na origem, os recorrentes não apontaram violação ao art. 275 do Código Eleitoral, o que impede o conhecimento da questão. 5. Recurso especial eleitoral parcialmente provido somente para excluir as sanções de cassação do registro, de multa e de majoração do prazo de inelegibilidade impostas pelo TRE/PI. (Recurso Especial Eleitoral nº 256, Acórdão de 18/04/2013, Relator(a) Min. FÁTIMA NANCY ANDRIGHI, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 111, Data 14/06/2013, Página 57/58 ) [grifei] Resumindo-se, de um só lance, sublinhe-se ser baldo o apelo dos pressupostos recursais de que trata o artigos 276, I, "a" e "b" , do Código Eleitoral. Pelos fundamentos predelineados, inadmito a subida deste Recurso Especial. Intime-se. Salvador, 08 de abril de 2014. Des. LOURIVAL ALMEIDA TRINDADE Presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia