O CONTROLE INTERNO E A AUDITORIA INTERNA GOVERNAMENTAL: DIFERENÇAS FUNDAMENTAIS Wanderlei Pereira das Neves 1 Resumo Nosso trabalho visa a demonstrar que a auditoria interna governamental é o ápice da pirâmide do sistema de controle interno. Enquanto o controle interno se subordina ao titular do órgão ou entidade, pois faz parte de suas atividades administrativas normais, a auditoria interna não faz parte (até pode) necessariamente da estrutura ou dessas atividades. A auditoria interna governamental deve fiscalizar, avaliar o grau de confiabilidade e controlar a eficiência e a eficácia dos controles internos do órgão ou da entidade auditada, com toda a autonomia que a lei lhe assegurar, sem com eles se confundir. Palavras-chave: Governamental. Administração Pública, Controle Interno, Auditoria O artigo que ora apresentamos tem como objetivo estabelecer uma diferenciação bastante nítida entre as atividades do controle interno e as atividades da auditoria interna governamental, haja vista a grande confusão que se vem fazendo nos diversos órgãos e entidades da Administração Pública de um modo geral. A partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, ganhou ênfase a discussão sobre o controle interno governamental, especialmente pela sua previsão constitucional contida nos artigos 70 e 74, que transcrevemos: “Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Art. 74 Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de: I – avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União; II – comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e 1 Wanderlei Pereira das Neves é Contador (UFSC, 1987), Especialista em Auditoria Governamental (UFSC, 1989), Mestre em Administração (ESAG/UDESC, 2000), Auditor Interno do Poder Executivo do Estado de Santa Catarina e Professor de Contabilidade Pública, Auditoria Pública e de Técnica Orçamentária e Finanças Públicas. E-MAIL: [email protected] entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado; III – exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União; IV – apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional. § 1° Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.” No âmbito do Estado de Santa Catarina, a Constituição de 1989 prevê, em seus artigos 58 e 62, praticamente os mesmos dispositivos da Carta Magna Federal. Em face da falta de uma padronização organizacional, principalmente em virtude das diferentes estruturas administrativas adotadas pelos vários Estados da Federação, muita confusão se tem feito a respeito do assunto. Ora se atribui o controle interno aos departamentos de contabilidade, ora aos departamentos de finanças, orçamentação, contabilidade e auditoria, ou, equivocadamente, se atribui à auditoria interna todo o controle interno. Segundo o AICPA - American Institute of Certified Public Accoutant (apud Mota, 1988), o controle interno pode ser conceituado da seguinte forma: “O Controle Interno compreende o plano de organização e todos os métodos e medidas, adotadas numa empresa para proteger seu ativo, verificar a exatidão e a fidelidade de seus dados contábeis, incrementar a eficiência operacional e promover a obediência às diretrizes administrativas estabelecidas.” O comitê do AICPA publicou o SAS (Statement on Auditing Produceres) nº 29, em outubro de 1958, subdividindo o controle interno em contábil e administrativo, conforme segue: • CONTROLE INTERNO CONTÁBIL – compreende o plano de organização e todos os procedimentos referentes diretamente relacionados com a salvaguarda do ativo e a fidedignidade dos registros financeiros. Geralmente compreende controles, tais como os sistemas de autorização e aprovação, segregação entre as tarefas relativas à manutenção e elaboração de relatórios e aquelas que dizem respeito à operação ou custodia do ativo, controles físicos sobre o ativo e auditoria interna. • CONTROLE INTERNO ADMINISTRATIVO – compreende o plano de organização e todos os métodos e procedimentos referentes principalmente à eficiência operacional, e à obediência às diretrizes administrativas que normalmente se relacionam apenas indiretamente com os registros contábeis e financeiros. Incluem-se aqui controles como análises estatísticas, estudos de tempo e movimento, relatórios de desempenho, controle de qualidade. 2 Segundo a definição do AICPA (apud Conselho Regional de Contabilidade do Estado de São Paulo, 1988), os objetivos do controle interno são quatro: • proteção dos ativos; • obtenção de informação adequada; • promoção da eficiência operacional; e • estimulação da obediência e do respeito às políticas da administração. Assim, podemos concluir que o controle interno faz parte das atividades normais da Administração Pública, se subordina ao titular do órgão ou da entidade, tendo como função acompanhar a execução dos atos indicando, em caráter opinativo, preventivo ou corretivo, as ações a serem desempenhadas com vistas a atender o controle da execução orçamentária, financeira, contábil e patrimonial, bem como os controles administrativos de um modo geral. Em que pese o comitê do AICPA ter incluído a auditoria interna nos controles contábeis, o trabalho do auditor transcende tais controles. O Auditor atua sobre todas as atividades da Administração Pública, tendo como ponto de referência para os testes de auditoria a serem aplicados justamente o controle interno, ou seja, todo o planejamento da auditoria deverá levar em consideração o grau de confiabilidade do controle interno existente no órgão ou na entidade a ser auditada. A auditoria interna governamental pode ser considerada o ápice da pirâmide do sistema de controle interno, uma vez que a mesma supervisiona, normatiza, fiscaliza e avalia o grau de confiabilidade dos controles internos, buscando garantir a eficiência e eficácia dos mesmos, sem com eles se confundir. É uma parte especializada da auditoria que se dedica à fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos órgãos e das entidades da administração pública, quanto à legalidade, à legitimidade, à economicidade, bem como à fiscalização dos recursos repassados pelo Estado a título de Convênio, Subvenções Sociais e Econômicas e demais formas de antecipações de recursos legalmente admitidas, que têm como beneficiários os Municípios, Entidades Públicas ou Entidades Privadas sem fins lucrativos. Cruz (1997), considera que a evolução da auditoria pode ser classificada em três etapas. Este autor destaca para cada uma destas etapas o principal resultado a alcançar, conforme segue: • “Auditoria Fiscalizadora – principal resultado a alcançar: certificar a adequação dos controles internos e apontar irregularidades, truques e fraudes detectados; • Auditoria de Gestão – principal resultado a alcançar: identificar desvios relevantes e apontar atividades e/ou departamentos fora do padrão de desempenho esperado; • Auditoria Operacional – principal resultado a alcançar: certificar a efetividade e oportunidade dos controles internos e apontar soluções alternativas para melhoria do desempenho operacional. Medir o grau de 3 atendimento das necessidades dos clientes e acompanhar, mediante indicadores do nível de eficiência e eficácia, o desvio em relação ao desafiopadrão.” Portanto, ao contrário do controle interno tradicionalmente executado, a auditoria interna não faz parte (até pode) necessariamente da estrutura ou das atividades normais dos órgãos e entidades. Normalmente existe um órgão centralizador das atividades de auditoria interna governamental, que atua sobre todos os demais órgãos e entidades. No Poder Executivo do Estado de Santa Catarina a auditoria interna está centralizada na Diretoria de Auditoria Geral da Secretaria de Estado da Fazenda, sendo 10 o número de cargos existentes e 9 (nove) o número de auditores internos em atividades (todos nomeados por concurso público). O grau de confiabilidade dos controles internos é fundamental para o trabalho do auditor interno. Da confiança que nele se obtiver dependerá todo o enfoque, amplitude e natureza da auditoria a ser efetuada. Assim, se os controles internos de um órgão ou entidade da administração pública forem satisfatórios, serão escolhidos procedimentos mínimos numa extensão reduzida (pode ser adotada uma amostragem, ao invés de uma auditoria completa). Por outro lado, se os controles internos se apresentarem insatisfatórios, deficientes, o trabalho do auditor interno deverá ser o mais amplo possível, com ênfase em todo o processo da execução orçamentária e contábil (execução da receita e da despesa), especialmente quanto aos estágios do recolhimento dos numerários por parte dos agentes arrecadadores, da licitação, do empenhamento, da liquidação e do pagamento da despesa pública, bem como quanto aos atos de pessoal e demais controles contábeis e administrativos. Conforme exposto, concluímos que as atividades de auditoria se sobrepõem às atividades operacionais de um modo geral, inclusive sobre as atividades do controle interno administrativo e contábil, ou seja, as primeiras normatizam, orientam, fiscalizam, avaliam o grau de confiabilidade e controlam a eficiência e a eficácia das segundas, conforme resumido na figura a seguir: Sistema de Controle Interno AVALIAÇÃO E REVISÃO FISCALIZAÇÃO AUDITORIA INTERNA: Normatização e orientação CONTROLE INTERNO: Controles Controles E administrativos contábeis 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 21ª ed. São Paulo, Saraiva, 1999. CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE DO ESTADO DE SÃO PAULO. Curso Básico de Auditoria. São Paulo: Atlas, 1988. CRUZ, Flávio da. Auditoria Governamental. São Paulo: Atlas, 1997. MOTA, João Maurício. Auditoria: Princípios e Técnicas. São Paulo: Atlas, 1988. 5