Estudo Prospetivo – Relatório Final
Identificação: 000748402013 – O sistema de formação profissional dual alemão:
determinação das potencialidades e entraves da sua eventual
incorporação ao sistema de formação profissional português
NIPE
Universidade do Minho
Programa Operacional de Assistência Técnica do Fundo Social Europeu (POAT-FSE)
31 março 2015
Coordenador
Francisco Carballo-Cruz
POATFSE: gerir, conhecer e intervir
Ficha Técnica
Entidade Beneficiária
Designação
Núcleo de Investigação em Políticas Económicas – NIPE
Escola de Economia e Gestão – EEG
Universidade do Minho – UM
Endereço Institucional
Departamento de Economia
Escola de Economia e Gestão
Universidade do Minho
4710-057 Braga – Portugal
Telefone: 253604517
Fax: 253601380
Email: [email protected]
Equipa Técnica
Membros da Equipa
Francisco Carballo-Cruz (Coordenador)
José Cadima Ribeiro
Rosa-Branca Esteves
Colaboradores
João Cerejeira
Paulo Mourão
Assistentes
Ana Martins
Andreia Amorim
João Luís Oliveira
Entidades Consultoras/Colaboradoras
Edit Value, Lda.
Simple Talks, Lda.
Gestão Administrativa e Financeira
Gestora
Dina Guimarães
i
Agradecimentos
A equipa técnica está agradecida a todas as entidades que colaboraram direta ou
indiretamente no estudo, assim como a todas as pessoas que tiveram a amabilidade de
participar nas entrevistas ou deram o seu contributo para a elaboração dos estudos de caso,
nomeadamente, a: David Justino e Mariana Peliz (Conselho Nacional de Educação), HansJoachim Böhmer (Câmara de Comércio Luso-Alemã), Ana Paula Filipe e Sandra Bernardo
(Instituto de Emprego e Formação Profissional), António Marques (CIP), José Luís Presa
(ANESPO), Adelino Calado (ANDAEP), Margarida Gomes da Silva e Cátia Rocha (ATEC), Elísio
Silva (DUAL) e Luís Caseiro (Toyota Caetano Portugal). É de agradecer também o contributo
dos especialistas alemães em ensino dual, Christian Sperle (Confederação Alemã de
Atividades Manuais) e Andreias Saniter (Universidade de Bremen), que tiveram um papel
essencial de assessoria e aconselhamento ao longo dos trabalhos.
Agradece-se também a colaboração dos assistentes de investigação Ana Martins, Andreia
Amorim e João Luís Oliveira, que participaram no estudo realizando tarefas de suporte, que
permitiram que os membros da equipa mantivessem o seu foco no essencial. Não podemos
deixar de agradecer ainda a colaboração das entidades externas, pela competência e
empenho com que se envolveram na realização das tarefas que lhes foram encomendadas.
Endereça-se um agradecimento especial à gestora do projeto na Agência para o
Desenvolvimento e Coesão, Paula Feliciano, pela disponibilidade demonstrada para resolver
dúvidas relativas à execução física e financeira do projeto e pela sua compreensão naquelas
conjunturas em que surgiram dificuldades e contratempos. Não podemos deixar de prestar
um agradecimento difícil de mensurar a Dina Guimarães, gestora do projeto no NIPE, não só
pela dedicação e profissionalismo que sempre caracteriza o seu trabalho, mas também por ter
assumido o projeto como seu desde o primeiro momento, libertando a coordenação das
tarefas para as que nunca se está preparado.
A todos eles pelo interesse demonstrado e pela colaboração desinteressada: Muito obrigado!
Espera-se que o estudo contribua para esclarecer dúvidas e eliminar incertezas e para formar
opiniões mais fundamentadas sobre a formação profissional dual, assim como para
despoletar um debate informado sobre um assunto de capital importância para o País.
Braga, Março de 2015, pela Equipa Técnica, Francisco Carballo-Cruz
ii
Índice Geral
Pág.
1. Enquadramento, Conceitos e Metodologia
1
1.1. Introdução, objetivos e estrutura
2
1.2. Conceitos e pressupostos
5
1.3. Metodologia e organização
6
2. O Sistema Dual Alemão de Formação Profissional
11
2.1. Enquadramento e funcionamento do sistema dual alemão
12
2.2. A conjuntura atual do sistema dual alemão
26
2.3. Vantagens, problemas e desafios do sistema dual alemão
42
2.3.1. As vantagens do sistema
42
2.3.2. Os problemas e desafios do sistema
44
3. O Sistema Educativo e o Sistema de Formação Profissional Português
49
3.1. Os percursos formativos no sistema educativo português
50
3.2. A formação profissional no sistema educativo português – A evolução
56
3.3. A formação profissional no sistema educativo português – A atualidade
63
4. A Transferência do Sistema Dual
71
4.1. Introdução
72
4.2. O argumento da redução do atraso educativo
74
4.3. O argumento da redução do desemprego jovem
85
4.4. A transferência do sistema dual alemão: interesse e dificuldades
91
4.5. Os fatores de sucesso dos sistemas de formação profissional
99
5. Experiências bem-sucedidas de base dual no sistema de formação profissional em
Portugal
105
5.1. Introdução
106
5.2. Os estudos de caso
107
5.2.1. Estudo de Caso 1 – EC1: ATEC
107
5.2.2. Estudo de Caso 2 – EC2: DUAL
112
5.2.3. Estudo de Caso 3 – EC3: Toyota Caetano Portugal
117
iii
Pág.
6. O Sistema de Formação Profissional em Portugal e a sua eventual Dualização: a
Perspetiva dos Stakeholders
123
6.1. Introdução
124
6.2. Consideração gerais
125
6.3. A situação do sistema de formação profissional em Portugal – O status quo
126
6.4. A reforma do sistema de formação profissional em Portugal – A dualização
131
7. Conclusões e recomendações
141
Referências
153
Anexos
159
Anexo I – Ofertas formativas minoritárias de nível básico e secundário
161
Anexo II – Indicadores de definição dos níveis do Quadro Europeu de Qualificação
165
Anexo III – Memorando de Cooperação na Educação Vocacional e Profissional na
Europa
167
Anexo IV – Esquema Comparativo dos Sistema Educativos Português e Alemão
171
Anexo V – Guião das Entrevistas
173
Anexo VI – Listagem de Participantes nas Entrevistas
175
Anexo VII – Listagem de Peritos Internacionais Participantes
177
iv
Índice de Figuras
Figura 2.1
Figura 2.2
Figura 2.3
Figura 2.4
Figura 2.5
Figura 2.6
Figura 2.7
Figura 2.8
Figura 2.9
Figura 2.10
Figura 2.11
Figura 2.12
Figura 2.13
Figura 2.14
Figura 2.15
Figura 2.16
Figura 3.1
Figura 3.2
Figura 3.3
Figura 3.4
Figura 4.1
Figura 4.2
Figura 4.3
Figura 4.4
Figura 4.5
Figura 4.6
Figura 4.7
Figura 4.8
Figura 4.9
Figura 4.10
Figura 4.11
Figura 4.12
Figura 4.13
Figura 4.14
Figura 4.15
Figura 4.16
Figura 4.17
Figura 4.18
Número de novos contratos no sistema dual, 2000-2014
Candidatos que não conseguem aceder ao sistema dual (%), 2008-2014
Número de aprendizes nos programas do sistema dual, 2000-2012
Distribuição do trânsito dos alunos que saem da escola (%), 2006-2012
Inscrições em cada um dos subsistemas do sistema formação profissional, em função do nível
de estudos à entrada (%), 2012
Nível de estudos à entrada dos alunos inscritos em cada um dos subsistemas do sistema
formação profissional (%), 2012
Idade com que os aprendizes acedem ao sistema dual (%), 2012
Distribuição das idades com que os aprendizes acedem ao sistema dual (%), 2012
Distribuição regional dos inscritos em programas duais, 1992-2014
Desequilíbrios regionais no sistema dual, 2014
Número de programas do sistema dual por duração, 2000-2012
Distribuição dos contratos de aprendizagem, por grandes sectores, no sistema dual (%),
1994-2014
Número de contratos por profissão, 2012
Top 10 das profissões mais procuradas – número de novos contratos, 2012 e 2014
Aprendizes por tipo de empresa – tamanho (%), 1999-2012
Empresas formadoras que ofereceram vagas, 2012
Número de alunos inscritos em cursos de nível secundário do sistema de aprendizagem,
2008-2013
Número de alunos inscritos em cursos profissionais – escolas profissionais e escolas
secundárias públicas, 2003-2013
Alunos inscritos em cursos profissionais no total de alunos inscritos no ensino secundário (%),
2003-2013
Alunos matriculados nas principais modalidades de ensino secundário, 2003-2013
Taxa de graduação terciária (ISCED 5-6) (%), 2004-2012
Taxa de desemprego dos trabalhadores com educação terciária, por grupo etário (%), 2012
Evolução da taxa de desemprego dos trabalhadores com educação terciária em Portugal, por
grupo etário (%), 2000-2012
Adultos [25-64 anos] com pelo menos o ensino secundário superior e adultos com ensino
superior (terciário), por faixas etárias (%) – Alemanha e Portugal, 2012
População com formação até a segunda etapa da Educação Secundária, segundo orientação:
formação profissional ou formação geral (%), 2012
Taxa de abandono escolar precoce (%) – Alemanha e Portugal, 1997-2013
População jovem [15-24 anos] que não estuda nem trabalha (NEET) (%), 2013
Alunos matriculados em cursos de formação profissional em Portugal, 2003-2014
Remunerações relativas dos trabalhadores com estudos superiores, por faixas etárias, 2012
Diferencial das remunerações brutas entre os trabalhadores portugueses e alemães, por tipo
de ocupação, fator
Diferencial nas taxas de desemprego jovem [15-24 anos] e de desempego adulto [25-64
anos], fator, 2014
Graduados em programas de ensino secundário por orientação, geral ou profissional (%),
2012
Taxa de desemprego jovem, por grupo etário e por nível educativo (%), 2013
Taxa de desemprego jovem, por grupo etário e por nível educativo (%) – Alemanha e
Portugal, 2013
Figura 4.15 – Composição sectorial da economia, emprego e valor acrescentado bruto (%) –
Alemanha e Portugal, 2012
Dimensão empresarial, número de trabalhadores (%) – Alemanha e Portugal, 2012
Dimensão empresarial no sector industrial, número de trabalhadores (%) – Alemanha e
Portugal, 2012
Diferencial das remunerações brutas entre os trabalhadores portugueses e alemães, por
setor de atividade, fator, 2011
v
Pág.
27
27
28
29
30
30
31
31
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35
35
36
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78
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84
85
87
87
88
90
95
96
97
98
Índice de Tabelas
Tabela 1.1
Tabela 2.1
Tabela 2.2
Tabela 3.1
Tabela 3.2
Tabela 3.3
Tabela 3.4
Tabela 4.1
Tabela 4.2
Tabela EC1.1
Tabela EC1.2
Tabela EC1.3
Síntese de organização do estudo
Visão sintética dos sistemas duais mais próximos do sistema alemão na UE
Perspetiva sintética do sistema dual na Alemanha
Percursos formativos no sistema educativo português para jovens de diversas idades
Alunos matriculados no ensino secundário por modalidade de ensino, 2000-2013
Importância do ensino profissional/vocacional no sistema educativo português, 2012-2013
Cursos de ensino profissional/vocacional em Portugal
Nível de formação da população adulta [25-64 anos] (%), 2012
Desemprego por níveis de formação da população adulta [25-64 anos] (%), 2012
Cursos de formação profissional ATEC para jovens
Cursos de formação profissional DUAL para jovens
Cursos de formação profissional Toyota Caetano Portugal para jovens
vi
Pág.
10
25
41
55
64
66
67
75
89
110
115
119
Listagem de Acrónimos
AHK
ANACOM
ANDAEP
ANESPO
ANET
ANQ
ANQEP
APLOG
ATEC
BiBB
NMF
CCILA
CEB
CEE
CEDEFOP
CEF
CEIIA
CET
CIP
CNEDU
CNO
CNQ
CP
CPOE
CPOVA
CPP
CQEP
DET
DGEEC
DGERT
DIHK
EAE
ECTS
EDUTEC
EFA
EPRE
ER
FCB
FCT
FMC
FP
FSE
GIZ
IEFP
IHK
INE
ISCED
ISCO
ITED
ITUR
LBD
Câmaras de Comércio e Indústria Alemãs no Estrangeiro
Autoridade Nacional de Comunicações
Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas
Associação Nacional de Escolas Profissionais
Ordem dos Engenheiros Técnicos
Agência Nacional de Qualificações
Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional
Associação Portuguesa de Logística
Associação de Formação para a Indústria
Instituto Federal de Formação Profissional (Alemanha)
Ministério Federal para a Educação e a Investigação (Alemanha)
Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã
Ciclo do Ensino Básico
Comunidade Económica Europeia
Centro Europeu para o Desenvolvimento da Formação Profissional
Cursos de Educação e Formação
Centro de Excelência para a Inovação da Indústria Automóvel
Cursos de Especialização Tecnológica
Confederação Empresarial de Portugal
Conselho Nacional de Educação
Centro de Novas Oportunidades
Catálogo Nacional de Qualificações
Cursos Profissionais
Cursos Predominantemente Orientados para o Prosseguimento de Estudos
Cursos Predominantemente Orientados para o Ingresso na Vida Ativa
Cursos com Planos Próprios
Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional
Diploma de Especialização Tecnológica
Direção-Geral de Estatísticas de Educação e Ciência
Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho
Confederação das Câmaras de Comércio e Indústria
Ensino Artístico Especializado
European Credit Transfer and Accumulation System
Escolas Tecnológicas de Referência
Educação e Formação de Adultos
Escolas Profissionais de Referência Empresarial
Ensino Recorrente
Formação em Competências Básicas
Formação em Competências Técnicas
Formação Modular Certificada
Formação Profissional
Fundo Social Europeu
Sociedade Alemã de Cooperação Internacional
Instituto do Emprego e Formação Profissional
Câmaras de Comércio e Indústria na Alemanha
Instituto Nacional de Estatística
ISCED – International Standard Classification of Education
Classificação Internacional Uniforme de Ocupações
Infraestruturas de Telecomunicações em Edifícios
Infraestruturas de Telecomunicações em Loteamentos, Urbanizações e Conjuntos de Edifícios
Learning-by-Doing
vii
MEC
NEET
OCDE
PAEF
PAF
PAP
PAT
PCA
PIEF
QEQ
QNQ
RFA
RVCC
SA
SDA
SNQ
TCP
TIC
STW
UE
UFCD
VAB
Ministério de Educação e Ciência
Neither in School Nor in Education
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
Programa de Assistência Económica e Financeira
Prova de Avaliação Final
Prova de Aptidão Profissional
Prova de Aptidão Tecnológica
Percursos Curriculares Alternativos
Programa Integrado de Educação e Formação
Quadro Europeu de Qualificações
Quadro Nacional de Qualificações
República Federal Alemã
Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências
Sistema de Aprendizagem
Sistema Dual Alemão
Sistema Nacional de Qualificações
Toyota Caetano Portugal
Tecnologias de Informação e Comunicação
School-to-Work
União Europeia
Unidades de Formação de Curta Duração
Valor Acrescentado Bruto
viii
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 1 – Enquadramento, Conceitos e Metodologia
1
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
1.1. Introdução, objetivos e estrutura
Perante a grave situação do desemprego jovem nos países europeus do Sul, os seus governos
nacionais estão a avaliar um portefólio de políticas estruturais que altere a forma de inserção
dos jovens no mercado de trabalho e garanta a sua permanência a médio prazo. Essas políticas
destinam-se a melhorar o match entre oferta e procura de trabalho de forma a reduzir a
exclusão dos jovens do mercado e, simultaneamente, ir ao encontro das necessidades das
empresas em termos de perfil profissional. A preocupação pelo desemprego jovem não se
esgota nos governos nacionais. No período de programação 2014-2020, a Comissão Europeia
pretende destinar à luta contra o desemprego entre os mais jovens cerca de €6.000 milhões.
Um dos aspetos que está a concentrar maior atenção por parte das autoridades com
responsabilidades na matéria é a formação profissional. Existe algum consenso sobre o
desajustamento entre este tipo de ensino e as necessidades das empresas e, inclusivamente,
sobre a inadequação do processo de aprendizagem dos alunos nos sistemas de formação
profissional baseados na escola dos países do Sul da Europa. Nesta conjuntura, alguns
responsáveis políticos nacionais e estrangeiros, assim como empresários nacionais e quadros
de multinacionais estrangeiras presentes em Portugal, têm sublinhado a necessidade de
apostar em modelos de formação duais nos quais convivam a formação no posto de trabalho
com a formação ministrada em escolas e centros de formação profissional. Entre estes
modelos duais, o que domina o sistema alemão de formação profissional é o mais conhecido,
razão pela qual vários governos em diversos continentes estão a tentar integrá-lo, com
algumas adaptações, nos seus sistemas de ensino e formação. O sucesso do sistema alemão
deriva genericamente das suas vantagens em termos educativos e formativos e de inserção
profissional.
A formação dual alemã tem o objetivo de dotar os trabalhadores de habilidades,
conhecimentos e competências suficientes para desenvolver uma profissão qualificada
(Tremblay e Le Bot, 2003). Além das competências profissionais, a formação prática que
integra os programas permite aos jovens adquirir outras, tais como responsabilidade,
capacidade de trabalho em equipa e a capacidade de aprender a aprender.
2
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Para os defensores desta modalidade de ensino, os benefícios do sistema dual de formação
profissional distribuem-se entre os diversos participantes (Dybowski, 2005; Strauch, 2011):
-
As empresas:
-
Podem influenciar o conteúdo e a organização da formação que pretendem,
através da participação nos regulamentos;
-
Veem reduzidos os custos de recrutamento de pessoal;
-
Garantem que a seguinte geração de trabalhadores vai estar adequadamente
formada.
-
Os aprendizes:
-
Conseguem uma formação especializada e relevante para o mercado de
trabalho;
-
Adquirem uma série de competências e habilidades sociais que influenciam
positivamente a sua personalidade;
-
Desempenham uma atividade motivante, ao entrarem em contacto com a
realidade;
-
Auferem uma retribuição mensal.
O Estado:
-
Consegue manter controlados os gastos públicos com a formação profissional,
graças à contribuição das empresas para o financiamento do sistema;
-
Transfere parte da responsabilidade das funções educativas para outros agentes
institucionais e para as empresas;
-
Consegue reter os jovens no sistema educativo;
-
Oferece saídas profissionais aos estudantes do ensino secundário;
-
Mantém o desemprego jovem em níveis comparativamente reduzidos.
Atualmente participam no ensino profissional alemão à volta de 455.000 empresas, entidades
e repartições da administração pública e escritórios profissionais. Quase 75% das entidades
participantes no sistema são micro, pequenas e médias empresas.
Outros países Centro-europeus têm sistemas duais muito similares ao alemão, nomeadamente
a Áustria, a Dinamarca e a Suíça, todos com elevadas taxas de participação (entre 40 e 60% dos
estudantes do ensino secundário). Nos últimos anos, vários países da UE implementaram
experiências piloto para explorar as potencialidades do sistema dual e avaliar as possibilidades
de adaptação às suas realidades nacionais. Inclusivamente, países como o México, o Egito ou a
China, entre outros, têm adotado, em diferentes graus, o sistema alemão, nos últimos anos.
3
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Nestes e noutros casos, a expansão do sistema deve-se ao papel ativo do governo alemão,
através de Instituto Federal de Formação Profissional (BiBB),1 conjuntamente com outras
entidades como a Sociedade Alemã de Cooperação Internacional (GIZ)2 e os Ministérios
competentes, os quais, desde meados da década de noventa, estão a desenvolver tarefas de
cooperação e assessoria técnica em matéria de formação profissional em diversos países do
mundo.
Durante a vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) para Portugal,
iniciado em meados de 2011, o governo alemão mostrou, em diversas ocasiões,
disponibilidade para apoiar o governo português na realização de reformas estruturais em
vários âmbitos. Nesse período, tem vindo a público a possibilidade de transferir a experiência
alemã em matéria de formação profissional, nomeadamente da modalidade dual, para o
sistema de formação profissional português.
O objetivo fundamental deste estudo é determinar as potencialidades e entraves derivados da
eventual implementação de um sistema dual, similar ao alemão, no sistema de formação
profissional português. São também objetivos do estudo: i) caracterizar o sistema de formação
profissional dual alemão, em termos de fundamentos e funcionamento, e efetuar uma análise
crítica do mesmo; ii) apresentar o sistema de educação e formação profissional português e
realizar um retrato da sua situação atual; iii) refletir sobre a oportunidade e viabilidade de
transferir o sistema dual alemão para Portugal e discutir alguns dos principais entraves desse
processo; iv) apresentar iniciativas e experiências de formação profissional dual em Portugal;
v) avaliar a adequação e funcionamento do atual sistema de formação profissional em
Portugal, bem como a possibilidade de avançar na sua dualização; vi) conhecer a opinião de
um conjunto de agentes económicos e sociais com responsabilidade e interesse em matéria de
formação profissional, sobre essa eventual dualização; e, vii) efetuar recomendações de
política destinadas aos policiy makers portugueses, relativas à potencial dualização do sistema
de formação profissional português.
O relatório organiza-se da seguinte forma. Na secção 2 deste capítulo esclarecem-se conceitos
e pressupostos de base e na secção 3 apresenta-se a metodologia. No Capítulo 2 analisa-se o
sistema dual alemão de formação profissional e no Capítulo 3 o sistema educativo e de
formação profissional português. No Capítulo 4 discute-se a transferibilidade do sistema
alemão à realidade portuguesa, com base em argumentos educativos e laborais, experiências
1
2
Bundesinstitut für Berufsbildung.
Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit.
4
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
internacionais e a opinião de peritos internacionais. A descrição de iniciativas de formação
profissional dual em Portugal é realizada no Capítulo 5. O Capítulo 6 sintetiza e organiza as
opiniões de um conjunto de stakeholders ligados à formação profissional e às empresas, em
Portugal, sobre a situação atual do sistema e sobre a sua eventual dualização. O Capítulo 7
conclui, avançando um conjunto de recomendações sobre a matéria objeto de análise e
estudo.
1.2. Conceitos e pressupostos
Na literatura internacional sobre ensino profissionalizante existe uma sobreposição
permanente entre formação profissional e formação vocacional. Entre estes dois conceitos
existem, no limite, pequenas diferenças de conteúdo, mas, em essência, trata-se de duas
formas de referir-se à mesma realidade, a primeira em países do Sul da Europa e da América
Latina e a segunda em países do Norte da Europa ou de tradição anglo-saxónica.
Essa dicotomia profissional-vocacional aparece associada aos termos educação, formação e,
inclusivamente, treino. Embora as dimensões de educação e de treino estejam presentes na
formação profissional, neste relatório assume-se, por simplicidade, que o objeto de estudo é
sempre a formação. Desta forma, para evitar confusões e por questões de consistência, o
termo utilizado para referir-se genericamente às vias formativas profissionalizantes neste
estudo será o de formação profissional. O termo formação vocacional aparece apenas em
situações em que se faz referência a modalidades de ensino designadas especificamente desta
forma, com a finalidade de as diferenciar de outras que utilizam a denominação de formação
profissional.
Outros conceitos que merecem um esclarecimento prévio são dual e dualização. Embora no
domínio da formação profissional dual existam outros aspetos bidimensionais, em certa
medida contrapostos, tais como os princípios formativos ou o financiamento, neste estudo o
termo dual faz referência à combinação de componentes de formação escolar (na
escola/centro de formação) e de formação em contexto de trabalho (na empresa).
É a combinação dessas duas componentes o que dá substância ao adjetivo dual. Para que a
aplicação do termo dual faça sentido, as duas componentes têm que estar presentes e da
forma que se pressupõe nos programas de formação. Esta questão é de extrema importância
no caso da formação em contexto de trabalho, dado que uma modalidade formativa não
poderá ser catalogada como dual quando esta componente for substituída por práticas
5
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
simuladas, por estágios com práticas em ambientes formativos não laborais ou,
inclusivamente, por visitas a empresas.
A dualização é entendida no estudo como um processo de transformação do sistema de
formação profissional, tanto quantitativa como qualitativamente. A transformação
quantitativa implica, por um lado, o aumento do peso da componente de formação em
contexto de trabalho nos programas atuais e, por outro, o incremento do número, e portanto
do peso, de programas de formação criados de raiz com uma filosofia completamente dual no
conjunto do sistema de formação profissional. A transformação qualitativa do sistema
pressupõe a integração e interiorização de aspetos basilares de organização dos sistemas
duais, tais como a participação empresarial, a colaboração dos parceiros sociais ou o
acompanhamento e monitorização permanente por parte da Administração Pública. O grau de
dualização do sistema dependerá do nível de generalização dos programas formativos
dualizados ou duais e da intensidade de adoção dos princípios e formas de organização de um
sistema dual.
Todas as referências no estudo ao sistema dual de formação profissional em Portugal têm um
caráter abstrato e, salvo no capítulo de conclusões e recomendações, não pretendem
influenciar as suas características ou configuração. O objetivo último do estudo é, no caso de
ser apropriado, apontar vias para dualizar progressivamente o sistema de formação
profissional português em geral, ou, pelo menos, naqueles âmbitos sectoriais ou ocupacionais
em que tal possibilidade seja mais adequada.
1.3. Metodologia e organização
A bateria metodológica utilizada no estudo abrange diferentes instrumentos e técnicas de
recolha e análise de dados e informação e a auscultação de diferentes perspetivas sobre o
sistema de formação profissional e a sua eventual dualização, através do envolvimento de
diferentes stakeholders com interesse na temática. Entre outros, são adotados os seguintes
procedimentos metodológicos:
-
Recolha, tratamento e análise de informação de fontes estatísticas secundárias sobre o
sistema educativo e o mercado de trabalho em Portugal e sobre o sistema de formação
profissional na Alemanha, especialmente sobre o sistema dual. A finalidade última
destes procedimentos de pesquisa e sistematização de informação tem caráter
expositivo e argumentativo. A maioria da informação será apresentada de forma
sintética, através de gráficos e quadros ilustrativos e comparativos.
6
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
Produção
de
informação
qualitativa
(opiniões, posições,
pontos
de
vista,
entendimentos e reflexões, entre outras), a partir da realização de entrevistas. Os
participantes no inquérito por entrevista foram selecionados em função do seu
conhecimento do assunto, do seu papel atual no sistema de ensino e formação
profissional, da sua capacidade de influência na hora de reformar o sistema e do rol
que potencialmente poderiam desempenhar num sistema dualizado.
-
Compilação de opinião de peritos sobre a matéria objeto de estudo. Foram escolhidos
dois peritos alemães em ensino profissional, um ligado a um centro de investigação em
políticas de educação de uma universidade, e um outro, vinculado à unidade de
educação e formação de uma confederação profissional de âmbito nacional. As análises
e informações disponibilizadas foram utilizadas para balizar algumas dimensões e
fundamentar as conclusões e recomendações do estudo.
-
Realização de estudos de caso baseados em experiências bem-sucedidas de aplicação
de programas de formação de base dual em Portugal. Dois dos casos correspondem a
duas academias de formação ligadas a entidades ou empresas alemãs, que aplicam
programas assentes em lógicas duais. O outro caso é o da estrutura de formação de
uma grande empresa industrial portuguesa. Os programas de formação oferecidos nos
casos estudados inserem-se, maioritariamente, no sistema de aprendizagem,
combinando uma componente de formação escolar com uma outra de formação em
contexto de trabalho.
-
Sistematização da informação coligida e elaboração de um conjunto de recomendações
de política para reformar o sistema de formação profissional em Portugal e construir
uma estratégia de reforma.
Os dados sobre a realidade do mercado de trabalho e do sistema educativo em Portugal
procedem fundamentalmente do Instituto Nacional de Estatística (INE) e da Direção-Geral de
Estatísticas de Educação e Ciência (DGEEC) do Ministério de Educação e Ciência (MEC). A
informação qualitativa sobre o funcionamento do sistema educativo procede de fontes
nacionais (relatórios e sites) do Ministério de Educação e Ciência (MEC), do Conselho Nacional
de Educação (CNEDU), da Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional (ANQEP)
e do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP). Para fins de comparação
internacional foram utilizadas fontes internacionais, nomeadamente a Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), o Centro Europeu para o
7
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Desenvolvimento da Formação Profissional (CEDEFOP) e a Direção-Geral de Emprego,
Assuntos Sociais e Inclusão da Comissão Europeia, para matérias de educação, e a EUROSTAT,
para matérias de emprego e mercado de trabalho. Os dados sobre o sistema educativo e o
sistema dual alemão procedem, fundamentalmente, do Instituto Federal de Educação e
Formação Profissional (BiBB), embora tenham sido utilizadas outras fontes, nomeadamente
outras instituições locais com vínculos ao sistema educativo.
A maioria das entidades participantes nas entrevistas foi escolhida por motivos óbvios,
nomeadamente pelo seu vínculo aos sectores da educação e da formação profissional. As
pesquisas efetuadas sobre formação dual em Portugal orientaram outras escolhas de pessoas
e entidades, seguindo critérios similares.
As entrevistas efetuadas tiveram caráter semiestruturado, de modo a permitir que o
interlocutor tivesse alguma liberdade para abordar assuntos da sua iniciativa ou complementar
as questões do entrevistador, respondendo a perguntas acessórias tacitamente introduzidas
no diálogo. Foi preparado um guião com um conjunto de questões sobre tópicos de interesse,
para balizar os conteúdos da entrevista e permitir a sua organização posterior. Em algumas
entrevistas, parte das questões não foram formuladas dado o perfil do entrevistado e os
conhecimentos que se lhes pressupunham.
Antes de iniciar as entrevistas foi efetuada uma entrevista piloto que resultou em alterações
na estrutura do questionário e em ajustamentos em algumas das questões inicialmente
propostas. Embora a equipa tivesse definido uma ordem (com certa flexibilidade) para a
realização das entrevistas, a dificuldade de agendamento de algumas delas e as limitações
logísticas acabaram por definir a ordem em que foram realizadas. Foram entrevistados os
responsáveis das seguintes entidades e associações: Conselho Nacional de Educação, Instituto
de Emprego e Formação Profissional, Câmara de Comércio Luso-Alemã, Confederação da
Indústria Portuguesa, ATEC Academia de Formação, DUAL Qualificação, Toyota Caetano
Portugal, Associação Nacional de Escolas Profissionais e Associação Nacional de Diretores de
Agrupamentos e Escolas Públicas.
O recurso a peritos internacionais na matéria, oriundos da Alemanha, é utilizado no âmbito do
estudo como um instrumento de interpretação de realidades e tendências e como uma
ferramenta de validação/rejeição da informação obtida nas entrevistas. Considerou-se que
dois (peritos) seria um número suficiente, tendo em atenção que deveria primar-se a
qualidade dos participantes face à quantidade. Adicionalmente, a elevada disponibilidade que
8
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
se pretendia, em matéria de comunicação e capacidade de resposta, não era compatível com
um número alargado de especialistas. Para garantir diversidade, um dos peritos selecionados
tem ligação a uma universidade e o outro a uma confederação profissional de alcance
nacional, com preocupações e interesses em matéria de formação profissional. A escolha dos
peritos foi efetuada, portanto, com base em critérios de competência e disponibilidade.3
A interação com os peritos foi efetuada maioritariamente via correio eletrónico e telefone.4 As
solicitações formais de opinião sobre determinados aspetos, através de questionários
fechados com respostas abertas, foram acompanhadas de pedidos menos formais sobre
questões específicas, fundamentalmente para fins de esclarecimento. Os peritos participantes
foram Andreas Saniter, Investigador do Instituto de Tecnologia e Educação [Institut Technik
und Bildung (ITB)], Universidade de Bremen [Universität Bremen] – Perito I, e Christian Sperle,
da Unidade de Políticas Europeias de Educação e Formação Profissional e de Estratégias de
Aprendizagem ao Longo da Vida, Confederação Alemã de Atividades Manuais [Zentralverband
des Deutschen Handwerks] – Perito II.
A organização do estudo em termos de compatibilização dos objetivos estruturais (de
conteúdo) com os objetivos operacionais, bem como com a panóplia de metodologias
anteriormente explicitadas, consta na Tabela 1.1. A cada objetivo estrutural corresponde, pelo
menos, um objetivo operacional e um ou mais instrumentos metodológicos. Na tabela existem
ainda referências aos capítulos relativos a cada um deles.
3
4
As relações pessoais indiretas foram importantes no primeiro contacto com os peritos.
Houve também encontros pessoais em Portugal aproveitando deslocações ao País.
9
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 1.1 – Síntese da organização do estudo
Objetivos Estruturais (Conteúdo)
Objetivo
Operacional
Metodologia
Capítulo
Descrição dos fundamentos e funcionamento do
sistema dual alemão de formação profissional
Exposição e
análise
Recolha, tratamento e
análise de informação
Cap. 2
Caracterização da realidade atual do sistema
dual alemão de formação profissional
Exposição e
análise
Recolha, tratamento e
análise de informação
Cap. 2
Opinião de peritos
Descrição dos percursos formativos do sistema
educativo português
Exposição e
análise
Recolha, tratamento e
análise de informação
Cap. 3
Descrição do sistema de formação profissional
português
(conjunto
de
modalidades
profissionalizantes)
Exposição e
análise
Recolha, tratamento e
análise de informação
Cap. 3
Caracterização da realidade atual do sistema de
formação profissional português
Exposição e
análise
Entrevistas
Recolha, tratamento e
análise de informação
Cap. 3
Entrevistas
Exposição de argumentos para a dualização do
sistema de formação profissional português
Proposição
Recolha, tratamento e
análise de informação
Cap. 4
Entrevistas
Opinião de peritos
Reflexão sobre a transferibilidade do sistema
dual alemão a outras realidades e sobre os seus
problemas de adaptação à realidade portuguesa
Discussão
Apresentação de iniciativas e experiências de
formação profissional dual em Portugal
Evidenciação
Estudos de caso
Cap. 5
Síntese de opiniões sobre a situação do sistema
de formação profissional português e
consolidação de perspetivas sobre uma eventual
reforma de inspiração dual e a estratégia a
seguir nesse caso
Organização e
síntese
Entrevistas
Cap. 6
Conclusão
Organização e
síntese
Sistematização de
informação
Proposição
Opinião de peritos
Elaboração de recomendações que possam ser
transformadas em propostas genéricas de ação
Sistematização de
informação
Cap. 4
Opinião de peritos
Fonte: Elaboração Própria.
10
Opinião de peritos
Cap. 7
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 2 – O Sistema Dual Alemão de Formação Profissional
11
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
2.1. Enquadramento e funcionamento do sistema dual alemão
O sistema dual alemão de formação profissional tem despertado um grande interesse em
vários países do mundo, por apresentar um conjunto de vantagens, quer em termos
formativos quer em termos de inserção dos jovens no mercado de trabalho. O sistema dual de
formação profissional oferece aos jovens uma via para aprender uma profissão e aceder
progressivamente a um posto de trabalho que exija certa qualificação. Desta forma,
contrariamente a alguns países europeus que privilegiam as vias de prosseguimento de
estudos ou a formação profissional baseada na escola, polarizando a oferta de ensino, a
Alemanha tem um sistema educativo bastante mais diversificado e abrangente.
A dualidade do sistema (dual) de formação profissional alemão manifesta-se, pelo menos, em
duas dimensões. Em primeiro lugar, na dualidade do conhecimento teórico e prático
adquirido, ao tratar-se de programas que combinam formação teórica em escolas de formação
profissional com formação prática em contexto empresarial, mais concretamente no posto de
trabalho. A primeira componente permite aos alunos concluir a sua educação secundária geral,
muito centrada em disciplinas fundamentais, tais como a Matemática e o Alemão, assim como
adquirir conhecimentos teóricos relativos ao perfil de formação profissional escolhido. Em
segundo lugar, na dualidade público-privada da estrutura de governação do sistema, com
governação pública nas escolas de formação profissional e governação privada nas empresas.
O sistema de formação profissional no sistema educativo alemão
O sistema alemão de formação profissional integra três modalidades: i) o sistema dual, que
combina formação em contexto de trabalho com ensino em contexto escolar em centros de
formação profissional (Berufsschule); ii) o sistema de qualificação, baseado em programas de
formação
profissional
ministrados
integralmente
em
escolas
(Berufsfachse)
–
fundamentalmente de nível médio, nos sectores da saúde, dos serviços sociais e dos media; e,
iii) o sistema de transição, integrado por programas pré-vocacionais e vocacionais. Os
programas dos dois primeiros sistemas são específicos para determinados tipos de ocupações
e garantem certificação profissional. O sistema de transição serve fundamentalmente para que
os jovens que não conseguiram aceder aos outros dois sistemas se formem, durante algum
tempo, para, a prazo, tentarem o acesso novamente.
O sistema educativo alemão tem duas grandes vias bem-definidas: a via geral – de
prosseguimento de estudos, e a via profissional – profissionalizante. Ambas as vias diferem em
termos de princípios educativos (teoria vs. prática), objetivos de aprendizagem (competências
12
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
gerais vs. competências profissionais) e foco dos conteúdos (conhecimento científico vs.
habilidades práticas para o mercado de trabalho). As diferenças evidenciam-se também em
termos de prestígio e de reconhecimento de competências, dado que as adquiridas na via da
formação profissional não são, em grande medida, reconhecidas para fins de prosseguimento
de estudos.5 O sistema enfrenta graves défices de permeabilidade que lhe retiram flexibilidade
no seu conjunto, apesar da sua diversidade.
Os problemas de permeabilidade veem-se amplificados pela precocidade com que os alunos
devem escolher a via em que farão o resto do seu percurso educativo (9/10 anos). Na via
profissionalizante, uma das alternativas é completamente autárcica, não permitindo que os
alunos possam transferir-se para vias que garantam prosseguimento de estudos.
Após o ensino primário (em Portugal, 1º ciclo do ensino básico), um aluno alemão tem três
alternativas para efetuar o ensino secundário inferior (a partir do 5º ano), o Gymnasium, a
Realschule e a Hauptschule. O aluno que tencione prosseguir estudos deverá inscrever-se no
Gymnasium, onde, para além do secundário inferior (5º a 10º ano), poderá realizar o ensino
secundário superior (11º a 13º ano) e, uma vez concluído, seguir para a Universidade
(Hochshule).
Os alunos que concluam a Realschule ou a Hauptschule podem aceder a uma escola
profissional de especialidade a tempo completo (Berufsfachse)6 ou, alternativamente, podem
aceder à formação profissional no sistema dual (Berufsschule). Após a conclusão da formação
em qualquer uma dessas vias podem continuar estudos em escolas técnicas especializadas de
nível terciário (Fachschule), com vista a aprofundar os seus conhecimentos e prática
profissional, obtendo o título de mestre na profissão em questão.
Para além da via anterior, os alunos que concluam a Realschule podem aceder quer ao ensino
secundário superior (Gymnasium) quer a uma escola profissional de especialidade superior a
tempo completo (Fachoberschule). A conclusão destes estudos na Fachoberschule permite aos
alunos aceder a uma escola universitária (Fachhochschule), de caráter terciário, com uma
grande componente prática. Os que continuam estudos na via geral do ensino secundário, no
5
De facto, um diploma de educação secundária superior obtido em programas de formação profissional
não é equivalente a um diploma de educação secundária superior obtido em escolas secundárias gerais
(Gymnasium), dado que não outorgam o diploma de acesso à universidade (Abitur).
6
Os programas que oferecem são exclusivos destas escolas. Não existem no ensino dual. Por isso, um
aluno que pretenda formar-se numa profissão cujo programa é exclusivo destas escolas tem
obrigatoriamente que inscrever-se nelas.
13
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Gymnasium, podem igualmente aceder a uma escola universitária (Fachhochschule) ou,
alternativamente, seguir para a Universidade (Hochshule).
Embora seja possível que alunos que possuam um diploma de estudos secundários superiores,
obtido em programas de formação profissional (de três anos de duração), mas que não
tenham um diploma de acesso à universidade (Abitur), acedam à universidade, na realidade
estes alunos apenas representam 2% dos estudantes universitários.
Nos últimos anos foram criados vários programas de estudos superiores de caráter dual (Duale
Studiengänge), os quais são uma forma híbrida de educação, que combina formação em
contexto de trabalho e educação universitária.7 Nestes programas, conduzidos por empresas,
os alunos são contratados como aprendizes e no final do programa obtêm um certificado
profissional e um grau universitário, normalmente emitido por uma universidade de ciências
aplicadas.
Antecedentes do sistema
O surgimento e desenvolvimento do sistema de ensino dual na Alemanha explicam-se em
grande medida pelas caraterísticas socioculturais do País (Gessler e Howe, 2013). O embrião
do sistema dual, a aprendizagem, remonta ao período compreendido entre os séculos IX e XIII,
no esplendor das denominadas guildas medievais. Estas tiveram uma importância fulcral no
desenvolvimento de uma cultura promotora do treino profissional, baseado no sentimento de
honra profissional, na ideia de identidade profissional e no reconhecimento do indivíduo
enquanto membro de uma comunidade, onde se socializa profissionalmente. A aprendizagem
em contexto de trabalho é uma tradição, que emana da filosofia destas sociedades
profissionais e que acabou por permanecer ao longo da história até à atualidade.
A introdução da liberdade de troca no período 1869-1871 implicou uma perda de influência e
dos direitos fundamentais das guildas no 1º Reich – fixação de preços, controlo da formação
profissional e controlo de acesso a profissão. Essa perda de influência, comum a vários países
europeus, foi temporária, tendo-se recuperado na Alemanha apenas 10 anos mais tarde, em
1881. Nessa altura, a associação de artesãos adquiriu o estatuto legal de empresa pública e
foram-lhe conferidos direitos especiais, tais como a criação de tribunais arbitrais, a regulação
dos processos de aprendizagem em contexto de trabalho e a introdução de exames de
admissão para os lugares de mestre e de trabalhador não aprendiz.
7
Estes programas foram criados na década de setenta no estado de Baden-Wurttemberg. Atualmente
estão inscritos nestes programas aproximadamente 50.000 alunos.
14
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
O ganho de preponderância da associação dos artesãos foi sucedido por um reaparecimento
das guildas em maior escala, que culminou na criação da Câmara das Artes em 1897,
instituição para a qual foi transferido o poder de supervisão de todas as guildas. Neste quadro
institucional, as guildas funcionavam como uma extensão do Estado, sendo responsáveis pela
organização e controlo da formação profissional nas empresas, nomeadamente através da
determinação dos direitos de um aprendiz, da tipificação dos seus contratos de trabalho e da
estipulação das normas de cumprimento obrigatório para as empresas participantes na
formação de trabalhadores.
O desenvolvimento do sistema de aprendizagem acabou por ser impulsionado na viragem do
século por motivos políticos e económicos. Entre os primeiros, destaca-se a promoção da
equidade social, através da formação dos trabalhadores mais pobres, numa sociedade
industrial onde a existência de trabalhadores fabris e o desenvolvimento sindical pudessem
provocar instabilidade social. Entre os motivos económicos relevam a eficiência do sistema de
formação de aprendizes e a necessidade de garantir a existência de trabalhadores qualificados
para trabalhar na indústria. Estas motivações levaram a que as empresas fossem legalmente
obrigadas a replicar o sistema de aprendizagem para melhorar a qualificação dos
trabalhadores.8
A par desses progressos no domínio da formação nas indústrias, iniciou-se o desenvolvimento
de um sistema de formação profissional nas escolas. Desta forma, no início do século XX, os
elementos angulares do atual sistema dual de formação profissional estavam no terreno, uma
vez que à tradição de formação profissional em contexto de trabalho, iniciada na Idade Média,
juntou-se a formação profissional ministrada nas escolas (Gessler e Howe, 2013).
Desde os primeiros anos do século XX, o sistema dual de formação profissional alemão esteve
sujeito a alterações significativas. Os ajustamentos e mudanças no sistema estiveram
motivados, em grande medida, pelo confronto entre os artesãos e os empresários industriais e
o aumento da influência dos sindicatos. O sistema foi adaptado como consequência dos
conflitos entre artesãos e empresários industriais, uma vez que estes últimos contestavam
fortemente a aplicabilidade à atividade industrial dos modelos de ensino e formação utilizados
pelos artesãos, nomeadamente devido à falta de condições para realizar a aprendizagem nas
fábricas. O sistema dual experimentou modificações também em resultado da importância
adquirida pelos sindicados após a II Guerra Mundial, que se materializou, por exemplo, na sua
8
Por volta de 1920, o ensino dual, num modelo semelhante ao utilizado pelos artesãos, foi adotado
também nas profissões ligadas ao comércio.
15
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
integração nas negociações dos contratos de trabalho dos aprendizes ou na definição de
regulamentos sobre o processo de ensino.
A partir de 1925, o sistema educativo alemão passou a oferecer, após a conclusão da
escolaridade obrigatória (com 14 anos), duas vias alternativas: o Gymnasium, para estudos
gerais, e a formação profissional, para fins profissionalizantes e a inserção no mercado de
trabalho. No âmbito do sistema de formação profissional, o sistema dual desenvolve-se e
consolida-se a partir de 1969, graças às reformas efetuadas pelo governo.
Nesse ano foi aprovada a Lei Federal de Educação e Formação Profissional,9 que estabeleceu o
quadro legal do ensino dual e deu segurança jurídica a todas as partes envolvidas,
nomeadamente às empresas. Este diploma determina os direitos e as obrigações da relação
entre o aprendiz e a empresa. No âmbito do sistema, os aprendizes são tratados como
trabalhadores e, portanto, usufruem igualmente de direitos de proteção, segurança e
segurança social, bem como de direitos salariais, embora limitados. O aprendiz tem, ainda,
direitos adicionais, derivados da sua condição, nomeadamente o direito a ser formado e
ensinado e a não ser tratado, portanto, como força de trabalho.
As primeiras academias de formação profissional foram criadas três anos mais tarde, em 1972,
na região de Baden-Württemberg, graças à cooperação entre instituições de ensino e grandes
empresas como a Robert Bosch GmbH, a Daimler Benz AG e a Standard Elektrik Lorenz AG
(Graf, 2013). O então denominado Modelo de Estugarda combinava treino em grandes
empresas com aprendizagem nas academias de formação profissional, em moldes muito
semelhantes aos do ensino dual atual. O interesse das grandes empresas pelo sistema dual,
primeiro em Baden-Württemberg e depois noutras regiões,10 contribuiu para o aumento do
número de instituições envolvidas, bem como para a adaptação do sistema às necessidades de
um maior número de empresas e indivíduos.
Ao longo da sua história recente, o sistema dual tem enfrentado diversos desafios,
nomeadamente as mudanças na estrutura sectorial e profissional do mercado de trabalho
alemão, o incremento dos requerimentos de habilidades e competências dos postos de
trabalho, a expansão da procura de educação e formação e a necessidade de incluir
socialmente os jovens de baixo desempenho escolar (Solga, 2009).
9
Berufsbildungsgesetz BBiG. Foi atualizada, por última vez, no ano de 2005.
Länder – Estados Federados.
10
16
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Estrutura organizativa do sistema
O sistema dual alemão de formação profissional tem como caraterística distintiva, face aos
sistemas de formação profissional de outros países, a forte cooperação existente entre a
administração central, as administrações regionais e locais, os parceiros sociais, as Câmaras de
Comércio e Indústria e as empresas. O sistema dual está sujeito a elevados níveis de regulação.
As responsabilidades e ações de cada um destes intervenientes estão definidas e reguladas
pela Lei Federal de Educação e Formação Vocacional e pelos regulamentos produzidos pelo
Comité Conjunto do Instituto Federal de Educação Profissional, ou seja, por legislação de
âmbito Federal.11
O Ministério Federal de Educação12 é o responsável máximo pela definição da estratégia do
sistema de formação profissional. É responsável também pela preparação e aprovação dos
regulamentos da componente de formação em contexto de trabalho, pela conceção das
estratégias e ações para a melhoria da qualidade do sistema, pela publicação de um relatório
anual sobre a formação profissional na Alemanha e pelo financiamento do Instituto Federal
para a Educação e Formação Profissional.13
As administrações regionais14 são responsáveis pelo funcionamento das escolas de formação
profissional e pela definição do plano de estudos da componente escolar do sistema dual. Esta
última circunstância faz com que exista uma considerável variabilidade entre regiões na
organização e conteúdos da componente escolar (Hoekel e Schwartz, 2010). As administrações
regionais assumem também o financiamento do quadro de professores das escolas de
formação profissional e a supervisão legal das atividades das Câmaras de Comércio e Indústria.
Os parceiros sociais têm também um papel relevante na administração do sistema dual.
Colaboram na atualização dos regulamentos de formação, designadamente através da
nomeação de especialistas para a elaboração e revisão dos regulamentos e a realização de
propostas para a inclusão de novas profissões no catálogo de qualificações. Os parceiros
sociais envolvem-se, ainda, nas negociações dos salários dos aprendizes que, por regra, se
fazem via contratos coletivos de trabalho.
11
Contrariamente, o sistema baseado na escola é, em grande medida, organizado e regulado pelos
diferentes Estados, o que se traduz na existência de quadros legais diferentes em cada um deles e numa
ampla diversidade programática. De facto, apenas metade das profissões cuja formação pode ser obtida
nestes cursos estão sujeitas a regulação Federal (Hall e Krenel, 2014).
12
Bundesministerium für Bildung. Administração Central – Federal.
13
Bundesinstitut für Berufsbildung – BiBB.
14
Länder. Administração Regional – Estatal.
17
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
As empresas são responsáveis pela formação do aprendiz em contexto de trabalho. Suportam
os custos da formação na empresa, incluindo os salarios e demais encargos dos formadores e a
remuneração dos aprendizes. As empresas são também responsáveis pela definição da oferta
de vagas dos programas do sistema dual. Esta característica do sistema é um dos seus
principais handicaps, dado que a oferta de vagas acaba por estar muito dependente do ciclo
económico e da disponibilidade das empresas.
O papel das Câmaras de Comércio e Indústria15 na estrutura e gestão do sistema é
fundamental. As Câmaras são responsáveis por prestar serviços de consultoria às empresas
participantes e por supervisionar a formação nas mesmas, nomeadamente através da
verificação das condições laborais, da supervisão da formação em contexto de trabalho e da
regulação do acesso à condição de instrutor/tutor e da monitorização das suas aptidões. As
Câmaras de Comércio e Indústria encarregam-se ainda do registo dos contratos dos aprendizes
e da organização dos exames finais.
Funcionamento do sistema e conteúdos programáticos
A organização participada e relativamente centralizada do sistema dual, garantem, por um
lado, planos de estudos adaptados às necessidades das empresas e, por outro, standards de
qualidade e conteúdos definidos a nível Federal.16 Os programas do sistema dual têm, regra
geral, uma duração de entre 2 anos e 3,5 anos. Para serem admitidos nestes programas, os
candidatos têm apenas que ter completado a escolaridade obrigatória, contrariamente ao que
sucede nas escolas de formação profisional a tempo inteiro, onde os requisitos de acesso são
mais restritivos.
Como referido, o acesso ao sistema dual é efetuado através das vagas de aprendiz oferecidas
pelas empresas, as quais devem estar previamente certificadas e cumprir os standards
exigidos em matéria de formação. Desta forma, os jovens devem candidatar-se a uma vaga de
aprendiz numa dada empresa para poder aceder ao programa dual do seu interesse. Se o
aluno for recrutado como aprendiz, acede ao programa e a sua relação com a empresa é
formalizada através de um contrato de aprendizagem. Segundo o BMBF (2011), o contrato
deve incluir: i) a duração do programa, que tem de estar de acordo com o estipulado nos
15
Em Alemanha existem à volta de 80 Câmaras de Comércio e Indústria (IHK). Trata-se de entidades de
gestão privada (pelos sócios) com estatuto público, integradas por empresas de todos os sectores e
dimensões, desde microempresas a grandes empresas industriais. A pertença das empresas às Câmaras
é obrigatória por Lei desde 1956 (IHK – Gesetz).
16
Apenas a definição dos conteúdos do bloco de formação geral da componente escolar é da
responsabilidade das administrações regionais.
18
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
regulamentos; ii) as datas de início e conclusão do programa, podendo a formação, em
determinadas condições, ser alargada para além do inicialmente previsto; iii) os conteúdos da
formação, incluindo o plano de formação na empresa; e, iv) a remuneração do aprendiz, que
deve cingir-se aos valores estipulados em sede de contrato coletivo de trabalho.17
Nos programas convencionais de ensino dual, o tempo dedicado pelos estudantes à
componente de formação em contexto de trabalho (na empresa que os contratou como
aprendizes) é de 3 ou 4 dias por semana. O plano de trabalhos correspondente à componente
de formação em contexto de trabalho rege-se pelos regulamentos em vigor para cada tipo de
programa/profissão do catálogo do sistema dual. Esses regulamentos abrangem o
reconhecimento da qualificação, a sua designação, a duração do programa, o perfil do posto
de trabalho a ocupar, assim como as competências mínimas necessárias para ocupá-lo, uma
síntese do plano de estudos calendarizado e o perfil dos exames de avaliação (BMBF, 2011).
Os programas que integram o catálogo do sistema dual são periodicamente atualizados,
modificados e, inclusivamente, substituídos por outros de nova criação. A revisão e preparação
dos regulamentos são efetuadas, de forma conjunta, por representantes das associações
empresariais, Câmaras de Comércio e Indústria, sindicatos, governo federal, governos
regionais e peritos em formação profissional. A iniciativa da revisão dos regulamentos
existentes ou da introdução de regulamentos para novos programas é da responsabilidade do
governo federal, através do Ministério Federal de Educação, sempre que os parceiros sociais
concordem à partida.
Os instrutores/tutores das empresas devem possuir uma série de competências específicas,
relacionadas quer com a função/profissão objeto de formação quer com aspetos pedagógicos
e educacionais. Os instrutores/tutores das empresas, que regra geral são escolhidos entre os
trabalhadores com mais experiência, só podem exercer a função se obtiverem aprovação num
exame prévio de competências. Adicionalmente, os instrutores/tutores são obrigados a
frequentar periodicamente seminários de pedagogia e de técnicas de formação. As empresas
formadoras que, pela sua pequena dimensão, não tenham capacidade para fornecer algum
dos tipos de formação estabelecidos no regulamento, podem formar parcerias com outras
empresas para aproveitar complementaridades e sinergias.
A componente de formação em contexto de trabalho complementa-se com o ensino em
contexto escolar nas escolas de formação profissional. Em média, os estudantes dedicam à sua
17
Quase 90% dos aprendizes estão cobertos por contratos coletivos.
19
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
formação nestas escolas entre 1 e 2 dias por semana, com uma carga horária letiva de cerca de
12 horas semanais (Hoeckel e Schwartz, 2010). Os programas de estudos da componente
escolar incluem um terço de conteúdos gerais e dois terços de conteúdos específicos, sendo a
aprendizagem baseada maioritariamente na realização de atividades. A componente específica
do plano de estudos é definida pela Conferência Permanente de Ministros Regionais de
Educação, enquanto a componente geral é estabelecida pela administração regional. Os
professores que lecionam a componente escolar devem ter um diploma universitário ou
equivalente e possuir formação em ensino prático.
Acesso ao sistema
A oferta de vagas de aprendiz no sistema dual de formação profissional é baseada no mercado,
sendo a procura muito competitiva, nomeadamente em certos sectores de atividade. O acesso
aos programas do ensino dual não está regulado por critérios estandardizados. O acesso ao
estágio, que é o elemento que garante o acesso ao sistema, depende da política de
recrutamento da empresa, tanto em quantidade (número de vagas) como em qualidade
(requisitos de acesso).
O número de candidatos à procura de uma vaga de aprendiz é maior que o número de vagas
oferecido pelas empresas. A concorrência induzida por esse desequilíbrio vê-se intensificada,
ainda, pela existência de algumas assimetrias regionais em termos de oferta, devido à
diferente conjuntura e composição sectorial de cada região. O alto nível de concorrência pelas
vagas poderia reduzir-se se o grau de mobilidade inter-regional dos aprendizes fosse mais
elevado, o que não acontece dada a juventude da grande maioria dos candidatos.
Ao contrário do que acontece nas escolas de formação profissional a tempo inteiro, o único
requisito de acesso para os aprendizes é ter concluído a escolaridade obrigatória. Contudo, nos
últimos anos, o número de candidatos com níveis de formação mais elevados tem vindo a
aumentar consideravelmente. A intensa concorrência pelas vagas faz com que as empresas
aceitem maioritariamente alunos que possuem um diploma de ensino secundário intermédio
(Realschulabschluss) – nos últimos anos, perto de metade dos que conseguiram vaga – face
aos que possuem um diploma de ensino secundário inferior (Hauptschulabschluss) – algo mais
de um quarto dos que conseguiram vaga. As empresas têm demonstrado também um
interesse crescente em aceitar candidatos que tenham concluído o ensino secundário superior
e possuam um certificado de acesso à universidade (Abitur) – nos últimos anos, quase um
quarto dos contratados.
20
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
O sistema dual, em geral, e o acesso aos estágios está altamente segmentado. Os aprendizes
com um diploma de ensino secundário inferior, em geral, realizam a sua formação em
contexto de trabalho em estágios pior remunerados, normalmente em atividades manuais, na
agricultura e em sectores que exijam poucas qualificações. Os que possuem um diploma de
ensino secundário intermédio são recrutados como aprendizes em sectores com uma
remuneração mais atrativa, tais como a indústria, o comércio e os serviços públicos. Para
estágios em programas para perfis de elevada qualificação ou que possuam um elevado
prestígio social, as empresas procuram aprendizes que detenham um certificado de acesso à
universidade (sectores de banca, seguros e TIC).
Os alunos que não conseguem aceder ao sistema dual são desviados, regra geral, para o
sistema de transição. Os programas desse sistema, que é financiado integralmente pelo
Estado, têm um caráter pré-vocacional, não outorgam certificação profissional e têm uma
duração de um ano, mas podem ser mais curtos ou mais longos (até dois anos). Alguns incluem
formação em contexto de trabalho mas a maioria são integralmente ministrados em escolas de
formação profissional. O sistema de transição tem atualmente duas funções. Por um lado,
fornecer alternativas temporais para os jovens que não conseguem aceder ao sistema dual ou
ao sistema de formação profissional baseado na escola. Por outro, oferecer alguma formação
aos jovens de baixo desempenho escolar, que são considerados imaturos para serem
formados pelos seus potenciais empregadores.
Financiamento do sistema
Embora as empresas suportem a maior parte dos custos do sistema, o seu financiamento é
partilhado pelas diferentes entidades intervenientes. Como referido, o financiamento das
escolas de formação profissional é responsabilidade das administrações regionais e das
administrações locais. As primeiras suportam os salários dos professores e as segundas os
custos operacionais das escolas e realizam os investimentos em equipamentos e
infraestruturas necessários para o bom funcionamento do sistema.
As empresas suportam a totalidade dos custos associados à formação em contexto de
trabalho, incluindo os dos formadores/tutores e os de equipamento, bem como a
remuneração dos aprendizes. Regra geral, a remuneração dos aprendizes cresce anualmente
até ao final do programa e, em média, corresponde a um terço do salário de um trabalhador
qualificado da profissão em questão (Hoeckel e Schwartz, 2010). Os custos salariais dos
aprendizes são o maior custo do sistema para as empresas (cerca de 60% do total). Em alguns
21
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
sectores existe um fundo geral, constituído e dotado pelas empresas que financia
parcialmente os custos de formação em contexto de trabalho. Em algumas regiões com
problemas de desenvolvimento e declive industrial e elevadas taxas de desemprego,18 as
empresas recebem um subsídio da administração federal para cobrir os custos de formação da
sua responsabilidade.
Com a finalidade de melhorar o funcionamento do sistema, nomeadamente para resolver os
problemas derivados do défice de estágios, nos últimos anos, a administração federal tem
vindo a conceder às empresas alguns apoios. Entre esses apoios destacam-se, por exemplo: i)
os bónus para empresas que aceitem aprendizes que não tenham acedido a um estágio num
período de um ano, apesar de o ter procurado; e, ii) as isenções para empresas que aceitem
aprendizes que não encontrem estágios, até 30 de setembro de cada ano, durante um período
experimental de entre 6 a 12 meses; neste caso, os alunos devem ser socialmente
desfavorecidos ou ter dificuldades de aprendizagem (pagamento do salário de aprendiz e
isenção dos impostos correspondentes). Os apoios das administrações regionais com maior
adesão têm sido: i) os subsídios para empresas que aceitem aprendizes que previamente
estavam a trabalhar em companhias que entraram em insolvência, e; ii) os empréstimos com
taxas de juro bonificadas para empresas que aceitem aprendizes de famílias socialmente
desfavorecidas.
A participação em programas duais de formação profissional é bastante positiva para as
empresas. Para as grandes empresas, o balanço entre custos e benefícios é, nas primeiras
fases, regra geral, negativo, dado que o retorno dos aprendizes é inferior aos custos
imputáveis a estes programas de formação. Para estas empresas trata-se de um investimento
a longo prazo, que lhes permitirá dispor de trabalhadores formados com as habilidades e
competências requeridas e, simultaneamente, diminuir os custos de recrutamento, seleção e
socialização dos trabalhadores. Para as empresas de menor dimensão, o equilíbrio entre
custos e benefícios, neste tipo de programas, é conseguido mais cedo, dado que os aprendizes
estão mais próximos dos processos core da sua atividade.
Outros sistemas duais na União Europeia
No âmbito da União Europeia, a Áustria e a Dinamarca são os países com sistemas de
formação profissional mais próximos do sistema alemão. No entanto, existem algumas
diferenças a nível institucional, derivadas das particularidades económicas, políticas e
18
Nomeadamente em alguns estados do Leste.
22
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
institucionais de cada país. A Tabela 2.1 resume o funcionamento dos sistemas duais nesses
dois países.
Contrariamente ao alemão, o sistema dual dinamarquês é altamente descentralizado,
designadamente ao nível do planeamento dos conteúdos programáticos (Cort, 2008). Os
programas da componente escolar da formação dual são desenhados por entidades locais
representativas das escolas de formação profissional, embora respeitando as linhas gerais
definidas pelo Ministério da Educação. Tal como o alemão, o sistema dual austríaco é
totalmente centralizado, com o currículo teórico e prático definido a nível nacional. Esta
circunstância assegura um elevado grau de homogeneidade das qualificações, garantindo
maiores níveis de mobilidade interregional e interempresarial dos trabalhadores (Ebner, 2009).
Outra diferença do sistema dinamarquês em relação aos de origem germânica reside na forma
de financiamento do salário dos aprendizes. Na Dinamarca existe um fundo financiado de
forma conjunta por todas as empresas, em função da sua dimensão, com independência de
participarem ou não no sistema. Este fundo paga cerca de 90% dos salários dos aprendizes,
enquanto nos outros sistemas as empresas suportam diretamente 100% dos custos salariais.
O sistema dual austríaco diferencia-se dos outros no que diz respeito à tutela das escolas
profissionais. Em concreto, enquanto as escolas profissionais austríacas são tuteladas por
ministérios sectoriais, tais como o de Saúde ou o de Agricultura, as suas homólogas alemãs
dependem diretamente do Ministério Federal de Educação.
Para além das diferenças institucionais, existem outras diferenças relacionadas com o
funcionamento do sistema, nomeadamente a duração e abrangência dos programas, os
procedimentos de avaliação ou o acesso ao lugar de formador, entre outros. Os três sistemas
enfrentam problemas comuns, entre os quais se destacam a variabilidade da oferta de vagas
de aprendiz nas empresas ou a integração no sistema de jovens com dificuldades de
aprendizagem ou défices de desempenho, para os quais cada país tem implementado
estratégias de combate diversas.
Apesar das diferenças identificadas, estes três sistemas duais assentam numa matriz comum.
O seu aparente sucesso baseia-se num conjunto de caraterísticas partilhadas, nomeadamente
(Eichhorst et al, 2012):
-
O elevado nível de formalização, dado que as qualificações profissionais são certificadas
por centros de formação credenciados. A componente de formação em contexto de
23
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
trabalho é sujeita a uma atualização permanente, em função das mudanças requeridas
pelo mercado de trabalho;
-
O grande envolvimento dos parceiros sociais no desenvolvimento e manutenção do
currículo, tanto a nível nacional como a nível regional, através de órgãos consultivos. A
implementação e monotorização é realizada por comités regionais e/ou profissionais;
-
A componente do ensino em sala de aula realiza-se em escolas de formação
profissional. Os custos da componente de formação na escola são suportados pelo
Estado;
-
As empresas têm de seguir certas normas técnicas para serem acreditadas como
empresas formadoras. A oferta de estágios é uma decisão opcional para as empresas. A
ligação entre a empresa e o estagiário deve seguir certos procedimentos padrão. Os
custos de estágio dentro das empresas são suportados por elas, quer diretamente quer
através de um fundo.
24
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 2.1 – Visão sintética dos sistemas duais mais próximos do sistema alemão na UE
O Sistema Dual Austríaco
O sistema dual austríaco (Lehre) visa proporcionar qualificação profissional de nível ISCED 3B
e preparar os jovens para a sua integração no mercado de trabalho. Com essa finalidade,
permite o acesso dos jovens ao mercado de trabalho desde muito cedo, através de uma via de
aprendizagem bem estruturada.
Em média, 76% dos graduados na via dual conseguem colocação no mercado de trabalho no
prazo de 3 meses após a conclusão do programa, o que quer dizer que o sistema é muito
eficaz na facilitação das transições school-to-work (STW). O aprendiz passa 80% do tempo de
formação no local de trabalho e 20% numa escola de formação profissional. A empresa
formadora é responsável por planear e fornecer formação relacionada com a aprendizagem,
bem como por apoiar aos aprendizes. É amplamente aceite que o sucesso da aprendizagem
baseada no learning-by-doing (LBD) é, em grande medida, determinado pelas competências
profissionais e pedagógicas dos formadores na empresa.
Para garantir a qualidade dos formadores são-lhes exigidas não só qualificações profissionais
e experiência relevante, mas também a realização de uma prova de conhecimentos e
habilidades pedagógicas e no domínio do direito do trabalho. Adicionalmente, o candidato a
formador deve realizar um exame para se tornar formador (que é um módulo do exame para
mestre artesão) ou completar com êxito um curso para formadores de 40 horas e uma
entrevista específica sobre questões profissionais. As empresas formadoras devem garantir
que um número suficiente de formadores profissionalmente e pedagogicamente qualificados
estão disponíveis para trabalhar com os aprendizes. O corpo docente responsável por ensinar
e acompanhar os aprendizes na escola de formação profissional deve também estar
devidamente qualificado e possuir três anos de prática profissional.
O Sistema Dual Dinamarquês
O sistema de aprendizagem dual dinamarquês é também muito eficaz, ao garantir rápidas
transições STW. Em geral, os graduados em programas duais são os primeiros a serem
contratados, antes mesmo dos graduados universitários sem experiência prática no mercado
de trabalho. O sistema caracteriza-se também por apresentar uma elevada taxa de conclusão,
concretamente à volta de 70% dos que iniciaram os programas.
Entre os fatores que contribuem para o sucesso destes programas destacam-se: i) o grande
envolvimento dos parceiros sociais; ii) a estreita relação entre o sistema de ensino e o mundo
empresarial; e, iii) a existência de procedimentos de certificação rigorosos que garantem uma
qualificação reconhecida a nível nacional. A avaliação final no sistema dinamarquês é
realizada através de um exame baseado na escola, um exame de trabalhador qualificado
(svendeprøve) ou uma combinação de ambos.
A avaliação combinada é a situação mais comum, assegurando a aferição tanto de
conhecimentos teóricos como de conhecimentos práticos. A avaliação é realizada por
examinadores externos, indicados pelos comités locais de comércio. A aprovação no exame
oficial permite ao aluno a obtenção da qualificação e do estatuto de trabalhador qualificado.
Fonte: CEDEFOP (2012).
25
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
2.2. A conjuntura atual do sistema dual alemão
Apesar da expansão do ensino secundário superior e do ensino superior na Alemanha, nos
últimos vinte anos, a formação profissional oferecida pelo sistema dual continua a ser muito
procurada, embora o interesse dos jovens tenha vindo a decair. Nos últimos anos tem-se
assistido a uma procura do sistema por jovens com níveis de formação à entrada cada vez mais
elevados. Em 2012, 23% dos novos matriculados em programas duais tinha o ensino
secundário superior completo e um diploma de acesso à universidade (Abitur). A formação
dual é vista, cada vez mais, como uma fase do processo de formação e não como o fim do
percurso. Uma parte crescente dos jovens vê o sistema como uma forma de garantir uma
formação com valor acrescentado no mercado de trabalho antes de realizar os seus estudos
superiores. Em 2012, à volta de 25% dos estudantes universitários tinham concluído um
programa de formação dual antes de aceder à universidade (BiBB, 2014).
Apesar da aparente fortaleza do sistema, a quota de novas inscrições no sistema dual
(contratos) no total de novas inscrições no sistema de formação profissional e no ensino
superior tem vindo a decrescer de mais de 40% para pouco mais de 35%, num período de vinte
anos. Contrariamente, a quota das inscrições no ensino superior no mesmo universo
aumentou de menos de 20% para mais de 35%.
Em 2014, aproximadamente metade das novas inscrições no sistema de formação profissional
correspondeu a programas duais, 22% ao sistema basado na escola e os 27% restantes ao
sistema de transição.19 No sistema de formação profissional dual foram oferecidas, em 2014,
quase 560.000 vagas, menos 4.000 que em 2013 e menos 40.000 que em 2011.
O número de novos contratos formalizados pelas empresas com aprendizes ultrapassou, em
2014, os 520.000 (Figura 2.1). Nos últimos quinze anos observa-se uma diminuição progressiva
do número de contratos formalizados. Em termos acumulados, a quebra ultrapassa os 15%,
apesar da forte recuperação dos anos 2006 e 2007. Em 2014 foram formalizados menos
100.000 contratos que no ano 2000, passando-se de 620.000 para 520.000.
19
O número de alunos em programas pré-vocacionais tem vindo a aumentar nos últimos anos, devido
ao desequilíbrio entre oferta e procura de estágios nas empresas e aos crescentes requerimentos das
empresas. Em 2014, o número de novos alunos no sistema de transição ultrapassou os 250.000. 73%
dos alunos sem qualquer diploma e 43% dos detentores de um diploma de estudos secundários
inferiores passaram ao sistema de transição (BiBB, 2014). Apenas um terço dos alunos que abandonam
o sistema de transição vão para um programa de formação profissional qualificante ou para um
emprego.
26
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.1 – Número de novos contratos no sistema dual, 2000-2014
650 000
630 000
621 693
625 884
614 235
610 000
616 341
590 000
572 979
576 153
570 000
564 306
569 379
572 322
550 000
550 179
557 634
559 959
551 259
530 000
529 542
510 000
522 231
490 000
470 000
450 000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Fonte: Elaboração Própria a partir de dados de Matthes et al (2015).
Figura 2.2 – Candidatos que não conseguem aceder ao sistema dual (%), 2008-2014
15%
14%
13,6%
13,3%
13,5%
13,5%
13%
12,6%
12,1%
12%
11,6%
11%
10%
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
Fonte: Elaboração Própria a partir de dados de Matthes et al (2015).
Nos últimos anos, entre 11 e 14% dos candidatos aos programas duais não são recrutados
pelas empresas, não podendo, portanto, aceder ao sistema (Figura 2.2). A elevada inserção
27
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
dos graduados nos programas duais faz com que muitos dos candidatos rejeitados se
candidatem novamente em anos posteriores. De facto, em 2012, 31% dos candidatos a estes
programas já tinham tentado o acesso previamente (BiBB, 2012).
A redução de novas entradas no sistema, evidenciada na Figura 2.1, tem o seu reflexo no
número total de aprendizes (nos vários anos dos programas). No período 2000-2012 o sistema
dual perdeu, em termos agregados, quase 300.000 aprendizes, passando-se de mais de
1.700.000 para pouco mais de 1.400.000 (Figura 2.3). À volta de 85% dos aprendizes
concentra-se em Alemanha Ocidental e os 15% restantes em Alemanha Oriental. 60% são
homens e 40% mulheres.
Figura 2.3 – Número de aprendizes nos programas do sistema dual, 2000-2012
1 750 000
1 702 017
1 700 000
1 650 000
1 684 668
1 613 343
1 622 442
1 600 000
1 581 630
1 550 000
1 570 614
1 594 773
1 564 065
1 571 457
1 553 436
1 508 328
1 500 000
1 460 658
1 450 000
1 400 000
1 429 977
1 350 000
1 300 000
1 250 000
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
Fonte: Elaboração Própria a partir de BiBB (2014).
No final do ano académico 2011/2012, 47% dos alunos que saíram da escola aspiravam a
entrar num programa do sistema dual (BiBB, 2014). Apesar do interesse pelo sistema ter vindo
a decair, segundo os resultados dos inquéritos periódicos do BiBB, a proporção de alunos que
saem da escola e transitam para programas duais tem permanecido relativamente estável. A
Figura 2.4 mostra que essa proporção se tem mantido ligeiramente acima dos 30%, de forma
persistente, desde o ano 2006. No mesmo período, o peso dos alunos que transitam para a
universidade tem aumentado em 6 pontos percentuais (p.p.).
28
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.4 – Distribuição do trânsito dos alunos que saem da escola (%), 2006-2012
100%
90%
33%
32%
30%
10%
10%
9%
50%
14%
12%
40%
11%
80%
70%
60%
30%
20%
10%
9%
6%
10%
10%
11%
14%
11%
4%
3%
32%
11%
9%
9%
17%
4%
17%
20%
24%
2006
2008
2010
18%
0%
2012
Emprego/Outras Atividades (1)
Desemprego
Estudos Universitários
Educação Geral e Educação Vocacional (2)
Sistema de Transição
Sistema de FP baseado na Escola
Sistema Dual de FP
Notas: (1) Emprego, programas de estágio, serviço militar voluntário, serviço federal voluntário, serviço
social/ecológico ou outros; (2) Escola Secundária Inferior (Hauptschule), Escola Secundária Intermédia (Realschule),
Escola Integrada (Gesamtschule), Escola Secundária (Gymnasium), Escola Profissional Especializada (Berufsfachse) e
Escola Profissional Especializada Superior (Fachoberschule).
Fonte: Elaboração Própria a partir de BiBB (2014).
O nível académico à entrada dos alunos matriculados nas várias vias do sistema de formação
profissional é bastante diferente (Figura 2.5). Quase 70% dos jovens com um diploma de
educação secundária superior que se inscrevem no sistema de formação profissional o fazem
no sistema dual. Mais de 40% dos detentores de um diploma de educação secundária inferior
e mais de 70% dos jovens sem qualquer certificado matriculam-se em programas do sistema
de transição. A maioria dos alunos do sistema dual e do sistema baseado na escola detêm um
diploma de secundária intermédia ou superior (Figura 2.6). Contrariamente, a maioria dos
alunos do sistema de transição não possuem qualquer certificado ou possuem apenas um
certificado de secundária inferior.
29
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.5 – Inscrições em cada um dos subsistemas do sistema de formação
profissional, em função do nível de estudos à entrada (%), 2012
100%
16%
90%
80%
30%
43%
70%
29%
73%
60%
12%
50%
40%
68%
30%
55%
45%
20%
26%
10%
0%
Sem qualquer diploma
Diploma secundário
inferior
(Hauptschulabschluss)
Sistema Dual
Diploma secundário
intermédio
(Realschulabschluss)
Sistema B. Escola
Diploma secundário
suferior (Abitur)
Sistema Transição
Fonte: BBiB (2014).
Figura 2.6 – Nível de estudos à entrada dos alunos inscritos em cada um
dos subsistemas do sistema de formação profissional (%), 2012
100%
90%
23%
24%
26%
80%
70%
60%
45%
50%
58%
52%
18%
20%
Sistema B. Escola
Sistema Transição
40%
30%
20%
28%
10%
4%
0%
Sistema Dual
Diploma secundário suferior (Abitur)
Diploma secundário intermédio (Realschulabschluss)
Diploma secundário inferior (Hauptschulabschluss)
Sem qualquer diploma
Fonte: BBiB (2014).
30
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.7 – Idade com que os aprendizes acedem ao sistema dual (%), 2012
20%
18%
16,2%
16%
15,2%
15,2%
14%
12%
12,9%
11,1%
9,5%
9,0%
10%
8%
6,5%
6%
4,4%
4%
2%
0%
16 e
menos
anos
17 anos
18 anos
19 anos
20 anos
21 anos
22 anos
23 anos Entre 24 e
40 anos
Fonte: Elaboração Própria a partir de BiBB (2014).
Figura 2.8 – Distribuição das idades com que os aprendizes acedem ao
sistema dual (%), 2012
100%
3,7%
3,5%
3,7%
4,8%
5,8%
32,4%
31,5%
30,5%
29,8%
29,3%
48,0%
47,7%
47,1%
46,2%
46,4%
16,0%
17,4%
18,7%
19,3%
18,5%
2010
2011
2012
2013
2014
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
15-16 anos
17-19 anos
20-24 anos
25 ou mais anos
Nota: Na classe 15-16 anos incluem-se também os menores de 15 anos.
Fonte: Elaboração Própria a partir de dados de Matthes et al (2015).
Existe uma elevada dispersão da idade de entrada dos jovens contratados pelas empresas
como aprendizes (Figura 2.7). Em 2014, a frequência da distribuição para as classes entre 16 e
21 anos é superior (ou muito próxima) de 10% em todos os casos. Nos últimos 5 anos, observa-
31
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
se uma certa estabilidade na distribuição etária dos entrantes, por grandes grupos de idade
(Figura 2.8). Não obstante, desde 2010, evidencia-se um aumento do peso dos estudantes
mais novos (com 15 e 16 anos) e dos mais velhos (com mais de 24 anos).
Figura 2.9 – Distribuição regional dos inscritos em programas duais, 1992-(2014)
10 332
Thuringia
19 797
Schleswig-Holstein
11 025
Saxônia-Anhalt
18 075
Saxônia
7 317
Sarre
26 550
Renânia-Palatinado
117 396
Renânia do Norte-Westefália
7 815
Meclemburgo-Pomerânia
37 887
Hesse
13 401
Hamburgo
5 733
Bremen
10 239
Brandenburgo
15 840
Berlim
91 815
Bavaria
55 812
Baixa Saxônia
73 197
Baden-Württemberg
0
20 000
2014
40 000
2012
60 000
2002
80 000
100 000
120 000
140 000
1992
Fonte: Elaboração Própria a partir de estatísticas de BIBB (Vários anos).
A distribuição dos alunos inscritos em programas duais consta da Figura 2.9. Os länder com
maiores inscrições são os estados ricos do Sul, Baviera e Baden-Württemberg, e o populoso
estado de Renânia do Norte-Vestefália. O número de vagas e de inscritos nestes programas
corresponde, genericamente, ao peso da população dos estados, o que revela que o sistema é
regionalmente bastante equilibrado, não obstante, existem algumas exceções. Na Figura 2.10
apresenta-se o peso populacional de cada estado no total do país e o peso dos inscritos em
programas duais em cada estado no total do país. Embora exista certo equilíbrio, os estados
com maiores inscrições, anteriormente indicados, encontram-se sobre-representados em
relação à sua população. Apesar de não existir uma explicação única para esta circunstância, o
principal motivo estará relacionado com a potente base industrial desses länder.
32
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.10 – Desequilíbrios regionais no sistema dual, 2014
Thuringia
Schleswig-Holstein
Saxônia-Anhalt
Saxônia
Sarre
Renânia-Palatinado
Renânia do Norte-Westefália
Meclemburgo-Pomerânia
Hesse
Hamburgo
Bremen
Brandenburgo
Berlim
Bavaria
Baixa Saxônia
Baden-Württemberg
0%
5%
10%
% População
15%
20%
25%
% Inscritos
Fonte: Elaboração Própria a partir de estatísticas de BIBB (Vários anos).
O sistema dual alemão oferece atualmente programas para cerca de 350 programas/profissões
diferentes. O número de programas tem permanecido relativamente estável desde o ano
2000. De acordo com BMBF (2011), as áreas de formação oferecidas podem ser divididas em
três grandes grupos, em função do seu nível de especialização: i) áreas especializadas, tais
como a de técnico de laboratório de biologia ou a de alfaiate; ii) áreas especializadas mas com
competências adaptáveis a vários empregos, tal como a de empregado de escritório no sector
industrial; e, iii) áreas aplicáveis a diferentes sectores da atividade económica, tais como a de
técnico de mecatrónica ou a de escriturário.
Em 2012, dos 344 programas oferecidos, 72,7% tinham uma duração de entre 30 e 36 meses,
15,7% de 42 meses e 11,6% de entre 18 e 24 meses (Figura 2.11). Os dois primeiros, de maior
duração, garantem a obtenção do grau de educação secundária superior, enquanto os
terceiros, mais curtos, conferem o grau de educação secundária inferior. Estes programas mais
curtos destinam-se a alunos com pior desempenho académico ou com dificuldades de
aprendizagem, dado que exigem menores requisitos, do ponto de vista dos conhecimentos
teóricos.
33
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.11 – Número de programas do sistema dual por duração, 2000-2012
350
300
64
58
54
247
249
250
37
35
40
2000
2006
2012
250
200
150
100
50
0
18-24 meses
30-36 meses
42 meses
Fonte: BIBB (Vários anos).
Entre 2003 e 2012 foram reestruturados os programas de 194 profissões (BiBB, 2014). Mais de
três quartos das reestruturações (159) correspondem a modernizações/atualizações de
programas. As restantes alterações na oferta do sistema dual, nessa década, correspondem à
introdução de novos programas (35).
Em 2014, 59,1% dos novos contratos foram formalizados no sector industrial e comercial,
27,7% em atividades manuais (crafts) e os restantes 13,2% nos serviços públicos, nos serviços
domésticos, na agricultura e em profissões liberais (Figura 2.12). Nos últimos vinte anos tem-se
verificado uma redução significativa do peso das atividades manuais no total dos contratos,
que passou de 37,9% em 1994 para 27,0% em 2014. No mesmo período, a proporção de
contratos na indústria e comércio passou de 45,5% para os referidos 59,5%.
Entre os programas de nova criação que foram incorporados ao catálogo de cursos do sistema
dual, desde 2000, destacam-se, por exemplo, os de especialista em marketing e pesquisa
social, especialista em geomática, operador de maquinaria, especialista em segurança e
proteção, técnico de gestão de lixo e reciclagem, assistente de serviços administrativos de
saúde ou o de microtecnólogo. O número de contratos de aprendizes nas principais profissões
consta na Figura 2.13.
34
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.12 – Distribuição dos contratos de aprendizagem, por grandes
sectores, no sistema dual (%), 1994-2014
100%
90%
8,1%
7,3%
7,1%
7,6%
7,8%
8,1%
29,4%
28,2%
27,6%
27,7%
26,7%
27,0%
56,3%
58,5%
59,9%
59,1%
60,3%
59,5%
2004
2006
2008
2010
2012
2014
10,4%
80%
70%
60%
37,9%
50%
40%
30%
20%
45,5%
10%
0%
1994
Indústria e Comércio
Atividades Manuais
Profissões Liberais
Agricultura, Mar e Economia Doméstica
Administração Pública
Fonte: Elaboração Própria a partir de dados de Matthes et al (2015).
Figura 2.13 – Número de contratos por profissão, 2012
Pintor e Envernizador
Especialista em Tecnologias de Informação
Mecánicos de Sistemas Sanitários, Aquecimento e…
Comercial de Produtos Alimentares
Especialista Hoteleiro
Especialista de Armazéns de Logística
Assistente de Odontologia
Técnico de Eletrónica
Cozinheiro
Empregado de Escritório de Comunicações
Cabeleireiro
Bancário
Mecánico Industrial
Assistente Médico
Empregado de Escritório na Área de Comércio…
Empregado de Escritório na Indústria
Técnico de Mecatrónica para Automóveis
Empregado de Escritório
Vendedor
Empregado de Escritório da Área Comercial
0
5 000 10 000 15 000 20 000 25 000 30 000 35 000
Fonte: Elaboração Própria a partir de estatísticas de BIBB (Vários anos).
35
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 2.14 – Top 10 das profissões mais procuradas – número de novos
contratos, 2012 e 2014
Técnico de Eletrónica
12 099
Bancário
12 495
13 302
Mecánico Industrial
14 133
Assistente Médico
14 889
Empregado de Escritório de Com. Internacional por…
18 321
Empregado de Escritório na Indústria
20 193
Técnico de Mecatrónica para Automóveis
29 136
Empregado de Escritório
25 209
Vendedor
26 514
Empregado de Escritório da Área Comercial
0
5 000 10 000 15 000 20 000 25 000 30 000 35 000
2014
2012
Fonte: Elaboração Própria a partir de estatísticas de BIBB (Vários anos).
Embora o sistema dual tenha surgido no âmbito das profissões manuais e se tenha
desenvolvido no sector industrial, nos últimos anos tem sido alargado a outros sectores. Em
concreto, um número crescente de vagas tem sido oferecido em profissões comerciais e de
serviços às empresas (em escritórios), em resposta a uma procura crescente por parte do
mercado. Nos últimos anos, as três profissões com maior número de contratos de
aprendizagem pertencem a estes sectores: empregado de escritório da área comercial,
vendedor e empregado de escritório, sempre por cima dos 25.000 contratos anuais (Figura
2.14). Curiosamente, apenas constam quatro profissões diretamente relacionadas com a
indústria: técnico de mecatrónica para automóveis, empregado de escritório na indústria,
mecânico industrial e técnico de eletrónica. Na Figura 2.14 observa-se que existe certa
estabilidade no número de contratos em cada uma das profissões, dado que o número de
contratos assinados em 2012 e 2014 é relativamente similar em quase todas elas. A exceção
mais significativa é no programa de empregado de escritório, que experimentou um
crescimento, no número de contratos, superior a 40% nesse período.
Em 2011, dos 2,1 milhões de empresas alemãs, à volta de 455.000 estiveram envolvidas em
programas de formação, o que se traduz num rácio de participação de 21,7% (BiBB, 2014). As
36
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
empresas formadoras veem a formação dual como um investimento para garantir as suas
necessidades futuras de trabalhadores qualificados. De facto 83% das empresas formadoras
participam em programas de formação dual para formar trabalhadores qualificados com a
intenção de os contratar posteriormente (BiBB, 2015).
Figura 2.15 – Aprendizes por tipo de empresa – tamanho (%), 1999-2012
100%
90%
27,8%
27,1%
28,1%
23,1%
27,2%
27,1%
26,1%
26,2%
22,5%
19,5%
18,6%
1999
2011
2012
80%
70%
60%
50%
40%
26,6%
30%
20%
10%
0%
Microempresas [1-9 empregados]
Pequenas Empresas [10-49 empregados]
Médias Empresas [50-249 empregados]
Grandes Empresas [≥250]
Fonte: Elaboração Própria a partir de estatísticas de BIBB (Vários anos).
Em 2012, aproximadamente 55% dos aprendizes que acederam ao sistema dual formalizaram
um contrato de aprendizagem com grandes [≥ 250 empregados] e médias empresas [50 a 249
empregados], algo mais de um quarto com pequenas empresas [10 a 49 empregados] e os
restantes (18,6%) com micro empresas [1 a 9 empregados] (Figura 2.15). Nos últimos anos
tem-se assistido a um incremento da importância das médias e grandes empresas no mercado
da aprendizagem, em detrimento das microempresas, enquanto as pequenas empresas têm
conseguido manter a sua quota de participação mais ou menos estável.
No ano académico 2011-2012, 62,8% das empresas participantes em programas de formação,
ofereceram contratos de aprendizagem no âmbito do sistema dual.20 Esta percentagem varia
entre sectores, sendo o sector da Administração Pública, o cuidado infantil e a educação
aqueles em que mais entidades ofereceram contratos (76,4%), e o de serviços empresariais
aquele em que foram oferecidos menos (40,1%) (Figura 2.16). Neste âmbito, observam-se
também diferenças significativas dependendo da dimensão das empresas. Mais de 75% das
20
Empresas formadoras.
37
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
empresas grandes, médias e pequenas ofereceram vagas de aprendiz (concretamente, 92,7%,
80,0% e 78,1%, respetivamente), enquanto pouco mais de metade das microempresas
disponibilizaram vagas de formação (concretamente, 55,6%).
Figura 2.16 – Empresas formadoras que ofereceram vagas, 2012
100%
90%
76,4%
80%
70%
66,3%
65,4%
69,4%
62,6%
60%
50%
40,1%
40%
30%
20%
10%
0%
Indústrias
Indústrias
Transformadoras Processadoras
Comércio
Grossista e
Retalhista e
Repações
Serviços
Empresariais
Outros Serviços Administração
Pública, Cuidado
Infantil e
Educação
Fonte: Elaboração Própria a partir de estatísticas de BIBB (2014).
Em 2012, a remuneração média mensal de um aprendiz, negociada em contração coletiva, foi
de €737.21 Não obstante registam-se diferenças remuneratórias em função da ocupação e do
sexo do aprendiz. Em termos médios, em 2012, um aprendiz recebeu mensalmente €664 no
primeiro ano de formação, €731 no segundo, €812 no terceiro e €851 no quarto.22
No ano académico 2012-2013, os custos brutos médios por aprendiz no âmbito do sistema
dual foram de €17.933, enquanto os seus retornos médios se ficaram pelos €12.535 (BiBB,
2015). Desta forma, os custos líquidos por aprendiz para as empresas participantes foram de
€5.398. 59% das empresas afirmam estar satisfeitas ou muito satisfeitas com o rácio custobenefício de oferecer formação dual. Apenas 11% reporta estar insatisfeitas ou
completamente insatisfeitas (BiBB, 2015).
Os valores médios estão sujeitos a uma elevada variância, explicada por fatores de caráter
regional, por diferenças ocupacionais ou por especificidades próprias das empresas. Os custos
21
Nos estados da antiga Alemanha Ocidental (RFA). Nos novos estados da Alemanha do Leste foi de
€674.
22
Dados para os estados da antiga Alemanha Ocidental (RFA).
38
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
e retornos por aprendiz variam significativamente em função da dimensão das empresas. As
microempresas são as que apresentam menores custos e retornos brutos. Em termos líquidos,
os maiores custos por aprendiz são suportados pelas grandes empresas (€7.354) e os menores
pelas pequenas empresas (€4.254). Do ponto de vista sectorial, também se observam
diferenças relevantes. Os sectores com maiores custos líquidos são a Administração Pública
(€8.032), a economia doméstica (€6.385) e a indústria e o comércio (€6.146). Os custos
líquidos mais baixos estão associados às profissões liberais (€3.705) e à agricultura (€1.293).
As ocupações técnicas são as que apresentam maiores custos líquidos, enquanto as comerciais
são as que suportam menores encargos líquidos. Os programas de dois anos são os que geram
menores custos líquidos, enquanto os de três anos e meio são os que apresentam maiores
encargos líquidos, devido, essencialmente, aos seus maiores custos brutos.
Atendendo aos valores médios, a principal parcela dos custos do aprendiz é a de custos com
pessoal, que inclui o salário e os benefícios sociais a cargo do empregador e que representa
62% dos custos brutos (~€11.000). A seguinte rúbrica em ordem de importância, é a dos custos
de formação que representam 23% dos custos brutos (€4.125). Os restantes 15%
correspondem a custos com instalações, equipamentos e materiais, assim como a outros
custos de formação e aprendizagem, administrativos e financeiros.
Os retornos do aprendiz estão fundamentalmente associados a atividades não qualificadas
(~50%) e a atividades qualificadas (47%). O remanescente corresponde a retornos relacionados
com os workshops de formação e com subsídios concedidos por diversas entidades.
Os custos líquidos por aprendiz apenas podem ser considerados um custo na sua totalidade se
este não for contratado no final da aprendizagem. Se for contratado, a empresa poupará os
custos de recrutamento e seleção. No caso alemão, os custos médios de recrutamento e
seleção de um trabalhador qualificado são de €8.715.23 Assumindo que os custos líquidos
médios de um aprendiz formado num programa dual de três anos são de €16.194 (custo
líquido anual de €5.398), se o aprendiz for contratado e, consequentemente, os custos de
recrutamento e seleção forem poupados, o custo líquido da aprendizagem cairá
aproximadamente para metade (€7.479).
Em média, entre 2011 e 2013, cada empresa contratou 59% dos aprendizes que concluíram
satisfatoriamente os programas. A maior taxa de contratação verificou-se na administração
pública, onde em média permaneceram 83% dos aprendizes. Nos sectores da indústria e do
23
2012-2013.
39
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
comércio aproximadamente dois terços dos aprendizes foram contratados. A taxa de
contratação varia também em função da dimensão da empresa. As empresas de 500 ou mais
trabalhadores contrataram, em média, 82% dos seus aprendizes, enquanto as microempresas
não ultrapassaram os 50%.
Em 2010, a despesa pública total dedicada a formação profissional na Alemanha foi de €13
bilhões, aproximadamente.24 Em 2013, a despesa bruta das empresas atingiu os €25,6 bilhões,
aproximadamente, com uns retornos aproximados de €17,9 bilhões. Desta forma, a despesa,
em termos líquidos, rondou os €7,7 bilhões. No curto prazo, por cada €100 euros de
investimento bruto no sistema dual, as empresas obtêm €70 de retorno, reduzindo a €30 o
investimento líquido efetuado.
24
Inclui uma parte dos custos com educação e formação contínua.
40
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 2.2 – Perspetiva sintética do sistema dual na Alemanha
O Sistema Dual Alemão
Visão Geral
Eficácia
Objetivos: Preparar os jovens para uma profissão
num mundo de trabalho em mudança e transmitir
os conhecimentos, aptidões e competências
necessárias para desempenhar uma profissão,
através de um programa de estágio estruturado. A
formação profissional deve permitir também a
aquisição da experiência de trabalho necessária
para um desempenho competente da profissão.
Distribuição do tempo dedicado à sala de aula e
ao estágio: 30%/70%; em geral os aprendizes
frequentam a sala de aula 1/2 dias por semana.
Duração dos programas: Entre dois e três anos.
No entanto, existem alguns programas com uma
duração de três anos e médio.
História do sistema: Os estágios integrados no
ensino fazem parte da filosofia de aprendizagem
na Alemanha desde há vários séculos. O princípio
da dualidade foi estabelecido, numa primeira fase,
em 1897. O sistema funciona nos termos atuais
desde 1969, embora tenha sido reformulado em
2005.
Sector: Todos os sectores – os jovens podem
escolher de um leque de cerca de 350 programas
correspondentes ao mesmo número de profissões.
Escala: Nacional.
Mediação: Tripartida.
Custos totais e fontes de financiamento: O
sistema é financiado fundamentalmente por
empresas formadoras, as quais em 2013
destinaram ao sistema €25,6 biliões. Em 2010, o
financiamento público foi de €13 biliões.
Participantes no sistema: Em 2014, foram
contratados mais de 522.000 aprendizes; Em 2012,
cerca de 1.430.000 alunos participavam no
sistema dual. Entre 1992 e 2011, foram admitidos
quase 12.280.000 aprendizes no sistema.
Eficácia geral: Alta, os objetivos do programa são
largamente atingidos, com bons níveis de
empregabilidade e bons resultados educacionais
para os alunos, especialmente no médio e no
longo prazo. A baixa taxa de desemprego jovem na
Alemanha tem sido parcialmente atribuída ao seu
sistema de formação profissional, que garante que
as empresas possam dispor de jovens com bons
conhecimentos teóricos e certa experiência
profissional. A competitividade e inovação da
economia alemã deriva, pelo menos parcialmente,
da formação dos seus trabalhadores, obtida em
muitos casos no sistema dual de formação
profissional.
Eficácia dos resultados ao nível do emprego: Em
média, entre 2011 e 2013, as empresas
contrataram
59%
dos
aprendizes
que
completaram satisfatoriamente os seus programas
duais. Os restantes continuaram estudos noutros
programas
ou
foram
registados
como
desempregados
Eficácia dos custos: Sem informação.
Fatores de sucesso do sistema: i) Certo prestígio
no sistema educativo; a formação profissional dual
é uma componente fundamental do sistema
educativo alemão; ii) Elevado envolvimento dos
parceiros sociais na conceção dos programas,
monitorização e controlo da qualidade; iii)
Regulação nacional dos conteúdos e da estrutura
do ensino profissional, que define os níveis de
qualificação; iv) O sistema é financeiramente bem
estruturado – existe um leque alargado de
medidas e apoios destinados a prevenir o
abandono e a aumentar o número de estudantes
com elevados níveis de educação.
Fonte: Adaptado a partir de CEDEFOP (2012).
41
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
2.3. Vantagens, problemas e desafios do sistema dual alemão
2.3.1. As vantagens do sistema
Apesar dos vários problemas que afetam o sistema dual na atualidade, este apresenta
vantagens para vários dos intervenientes no mesmo. Para os alunos, especialmente para
aqueles que não tencionam prosseguir estudos, o sistema permite-lhes obter um grau
académico seguindo um programa com uma forte orientação prática e, simultaneamente,
auferir uma remuneração. A conclusão de um programa dual garante aos jovens, pelo menos
no curto prazo, dispor de melhores oportunidades de colocação no mercado de trabalho.
O sistema dual garante às empresas que no médio prazo não haverá escassez de mão-de-obra
especializada. Adicionalmente, a configuração do sistema permite-lhes reduzir os custos
associados à fraca produtividade dos recém-contratados nas tarefas especializadas e serve de
meio para fidelizar os aprendizes à empresa, dado que, numa proporção significativa dos
casos, quando concluem o programa têm preferência por trabalhar na empresa em que foram
formados. Por último, o sistema acaba por ser um meio eficiente de recrutamento e seleção,
dado que reduz o gap informacional entre a empresa e o candidato-trabalhador. Graças à
informação privada sobre a produtividade atual e potencial do trabalhador, obtida pelas
empresas formadoras durante o processo de formação, o sistema diminui os problemas de
informação imperfeita existentes no mercado de trabalho. Desta forma, as empresas adquirem
certo poder de monopsónio, em resultado da informação adquirida durante o processo de
formação em contexto de trabalho (Acemoglu e Pischke, 1998).
Com independência dos beneficiados, o sucesso do sistema dual na Alemanha assenta
fundamentalmente nos seguintes aspetos (ver, por exemplo, Hoeckel e Schwartz, 2010 e Euler,
2013):
-
A forte aceitação e o profundo enraizamento do sistema na sociedade alemã, explicado
por razões históricas e pelo seu caráter participado e a sua clara divisão funcional. A
participação e o compromisso dos agentes institucionais, económicos e sociais
permitem o autorreforço do sistema, dado que as partes interessadas têm, em
diferentes domínios e graus, capacidade para influenciar decisões políticas que
redundem na sua promoção;
-
O grande desenvolvimento do sistema dual, que abrange um amplo espectro de
profissões/ocupações e dispõe de mecanismos para assegurar a sua adaptabilidade às
necessidades do mercado de trabalho. A configuração e a capacidade de adaptação do
42
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
sistema contribuem para melhorar a efetividade da transição dos jovens para o
mercado de trabalho;
-
O financiamento conjunto do sistema, dado que participação das empresas no
financiamento reduz a despesa pública em educação e garante um maior envolvimento
da comunidade empresarial;
-
A existência de mecanismos públicos e privados de garantia, que evitam que os
problemas de liquidez das empresas interfiram com o normal funcionamento do
sistema. Estas circunstâncias poderiam por em causa os objetivos do sistema,
nomeadamente os de caráter educativo;
-
A colaboração e compromisso efetivos dos parceiros sociais, que asseguram a
engrenagem de um sistema complexo, melhoram os processos de tomada de decisões
e evitam que as divergências sejam fonte de conflitos desnecessários, dado que
existem diversos mecanismos que permitem a sua resolução de forma construtiva;
-
A regulação estrita do acesso dos professores e instrutores/tutores ao sistema assegura
que possuem as qualificações e competências adequadas para lecionarem no sistema
dual com qualidade e profissionalismo;
-
O equilíbrio entre flexibilidade e estandardização nos programas de formação, que
permite a adaptabilidade do sistema à heterogeneidade interprofissões, sem
consequências em termos de qualidade;
-
O considerável esforço de investigação na área, que se traduz na existência de
instituições como Instituto Federal de Formação Profissional e de uma rede nacional de
centros de investigação, universitários e não universitários, que se dedica ao estudo de
diferentes aspetos do sistema, apoiando a sua melhoria contínua e criando uma
plataforma sólida de apoio à tomada de decisões neste âmbito.
As vantagens elencadas coincidem genericamente com as identificadas pelos peritos, que
acrescentam como vantagens a abordagem holística da conceção do curriculum e o facto de
não existir uma preocupação exclusiva com a adquisição de conhecimentos, dado que se
pretende ensinar também habilidades e competências, permitindo uma integração
harmoniosa no mundo do trabalho. Outros aspetos também destacados são a existência de
salários para os aprendizes e a adequação de certos perfis aos jovens com pior desempenho
académico. Como principal vantagem para a economia alemã é referido o baixo nível de
desemprego jovem, embora neste aspeto ressalvem que manter aos jovens no sistema é uma
43
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
forma de os tirar das estatísticas do desemprego. Por último, os peritos consideram que o
reconhecimento social é certamente uma vantagem do sistema. Contudo, alertam para o facto
de, nos últimos anos, se estar a assistir a um certo desprestígio e à degradação da sua imagem,
especialmente em determinados estratos sociais.
2.3.2. Os problemas e desafios do sistema
Apesar das reconhecidas virtudes e do prestígio do sistema, existem um conjunto de
problemas que requerem respostas rápidas e eficientes, alguns dos quais se têm agudizado
nos últimos anos, provocando desajustamentos consideráveis no mesmo. O principal desses
problemas é a falta de correspondência entre a oferta de vagas nas empresas para realizar a
formação em contexto de trabalho e a procura dos aprendizes pelas mesmas.
A escassez de vagas para aprendizes nas empresas não é um fenómeno novo, dado que, desde
os anos oitenta, tem havido um considerável défice de oferta a este nível (Baethge, Solga e
Wieck, 2007); não obstante, nos últimos anos o problema tem vindo a agravar-se
significativamente. Em cinco anos, entre o 2007 e o 2012, o número de contratos de
aprendizagem celebrados caiu em mais de 75.000, de 625.000 para 550.000,
aproximadamente.25
Uma explicação para a redução verificada é a diminuição do número de empresas
participantes no sistema. Em 2011, menos de 22% das empresas participaram no sistema
como empresas formadoras (-0,8 p.p. que um ano antes). Em termos absolutos, esse rácio
corresponde ao número mais baixo desde 1999 (455.000 empresas).
A escassez global de vagas afeta especialmente os programas com elevada procura, que são os
que
vão
ao
encontro
das
preferências
dos
candidatos
potenciais
(preferência
sectorial/ocupacional, remuneração futura ou moda, entre outros). As consequências desta
realidade são, por um lado, a intensificação da concorrência por aceder a determinados
programas e, por outro, a generalização das segundas e terceiras escolhas, dado que um
número muito significativo de jovens tem que se matricular em programas que não
respondem às suas preferências e, não são, portanto, do seu interesse (Protsh, 2014).
Uma outra explicação prende-se com o aumento dos requerimentos de acesso às vagas
disponíveis para os aprendizes, por parte das empresas (Protsch, 2014), em certos sectores ou
para certas ocupações. A maior restritividade nas condições de acesso deriva do notável
25
Note-se que as vagas disponíveis no sistema dual são definidas pelas empresas.
44
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
incremento da exigência, em termos de qualidade do trabalho e em outros aspetos da esfera
laboral, das empresas alemãs nos últimos quinze anos. Como consequência destas mudanças,
as empresas veem-se obrigadas a elevar o perfil dos aprendizes recrutados no âmbito do
sistema dual ou a alterar o perfil dos trabalhadores para o posto de trabalho em questão.26
Atualmente, as empresas impõem como critérios de seleção dos aprendizes aspetos como a
autoconfiança, a capacidade de reflexão, a criatividade e o compromisso (Böhle, 2010). Desta
forma, assiste-se a uma reorientação do sistema dual, que, na atualidade, procura alunos com
um desempenho académico cada vez melhor.
Apesar das várias iniciativas dos parceiros sociais e do governo nos últimos anos,27 não tem
sido possível eliminar o desajustamento entre a oferta e a procura de estágios para
aprendizes, derivada da falta de capacidade das empresas em integrar os aprendizes
disponíveis. A impossibilidade de integrar todos os candidatos, especialmente os de pior
desempenho, obriga a direcioná-los para o sistema de transição, o qual, segundo Spöttl e
Windelband (2013), é um sistema desqualificado, pouco permeável e que não facilita a
inserção laboral dos jovens.28
A expansão do sistema de transição tem provocado um forte crescimento de estágios para
aprendizes financiados pelo estado em contexto fora-da-empresa. Tem dado origem também
ao aparecimento de cursos de um ou dois anos a tempo completo nas escolas profissionais, de
cursos pré-vocacionais e de esquemas de formação iniciais, os quais, em nenhum caso,
conferem uma certificação profissional. A maioria das formações que integram a oferta do
sistema de transição não oferece grandes oportunidades de acesso ao mercado de trabalho.
Estes programas devem quase sempre ser complementados com outras formações para atingir
o nível de qualificação exigido pelas empresas. Segundo Hoeckel e Schwartz (2010), o sistema
de transição é extremamente fragmentado e apresenta uma eficácia muito reduzida, dado que
apenas um número limitado de alunos acaba por conseguir transferir-se para o sistema dual.
Para além dos desajustamentos, quantitativos e qualitativos, entre oferta e procura de vagas
para aprendizes e da expansão do sistema de transição, existem outros problemas
relacionados com o acesso, o funcionamento e a saída do sistema, bem como com o próprio
mercado de trabalho:
26
Inclusivamente, para alguns perfis ocupacionais as empresas estão a recorrer a contratações de
graduados de outras vias de ensino, nomeadamente do ensino superior, para ocupar lugares que
tradicionalmente eram ocupados por graduados do ensino profissional dual.
27
Por exemplo, Jobstarter or Entry-Level Qualification.
28
Este sistema está sujeito a fortes críticas na maioria da literatura consultada.
45
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
A orientação profissional no sistema de ensino da Alemanha tem uma qualidade muito
variável. Embora o aconselhamento profissional esteja disponível sob várias formas e
seja disponibilizado por escolas, parceiros sociais e administrações regionais, existe
uma elevada fragmentação e uma considerável falta de coordenação que condiciona a
sua eficácia. O resultado destes défices é que 40% dos estudantes dos últimos anos da
escolaridade obrigatória não sabem o que irão fazer quando a concluam (HippachSchneider, Krause e Woll, 2007);
-
O menosprezo pela aquisição de capacidades académicas no sistema dual e a sua
escassa adequação/preparação para avaliá-las (Hoeckel e Schwartz, 2010). Isto traduzse na fraca capacidade do sistema para dotar os aprendizes de capacidades básicas de
numeracia e literacia;
-
O exame final aos aprendizes do sistema dual, o Exame da Câmara, não tem em
consideração o seu desempenho na parte escolar, o qual, segundo Hoeckel e Schwartz
(2010), pode constituir um desincentivo para que os estudantes se esforcem na parte
escolar dos programas duais;
-
A elevada disparidade em termos de reconhecimento dos programas no mercado (Hall
e Krekel, 2014). Esta circunstância implica que, dependendo do programa em questão,
os salários, o risco de desemprego, o risco de ter que aceitar empregos menos
qualificados e as potencialidades de carreira dos graduados são muito diferentes;
-
O escasso desenvolvimento do ensino dual a nível terciário, sobretudo comparado com
outros países com grande tradição neste tipo de sistemas, tais como, a Suíça. A
reduzida oferta de programas deste tipo desincentiva o prosseguimento de estudos
para os que concluem os programas duais de nível secundário, pela baixa
permeabilidade do sistema;
-
Os riscos associados à reduzida mobilidade inter-profissões no mercado de trabalho
alemão, derivada da sua intensa regulação, que implica que o acesso aos empregos
esteja fortemente condicionado pela posse de certificações profissionais.29 No caso dos
graduados em programas duais estes riscos intensificam-se pelo facto de serem
programas de banda estrita e escassa versatilidade.
29
Os trabalhadores com qualificações profissionais com uma procura de trabalho em declínio suportam
maior risco de desemprego ou de degradação profissional que num mercado de trabalho menos
regulado.
46
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
De acordo com os peritos internacionais consultados, o principal problema do sistema é o
desajustamento entre a oferta e a procura de vagas, especialmente em períodos de
desaceleração económica, dado que a primeira está muito ligada ao ciclo económico. De todas
formas, consideram que o atual défice tem um caráter cada vez mais estrutural, não podendo
ser apenas imputado às flutuações da atividade económica. A forte orientação do sistema para
o mercado e a existência destes desajustamentos, obriga a que o estado corrija a falha
correspondente criando alternativas atrativas que acolham os jovens excluídos pelo sistema.
Para além da divergência entre oferta e procura de estágios, os peritos identificaram dois
problemas adicionais. Primeiro, a escassa capacidade de reação do sistema perante o
surgimento de novas ocupações, quer em sectores existentes quer em novos sectores. Embora
o sistema esteja sujeito a atualizações periódicas (renovação do catálogo de profissões e dos
próprios programas), a adaptação às dinâmicas do mercado de trabalho não é suficientemente
rápida. Segundo, a dificuldade das empresas de menor dimensão para cumprir a componente
de formação em contexto de trabalho dos programas. Esta problemática não é normalmente
tratada em toda a sua extensão pelas dificuldades para supervisionar a totalidade das
empresas que participam em programas duais.
A resolução dos problemas identificados constituem em si próprios desafios de curto e médio
prazo para os responsáveis da condução e administração do sistema. Não obstante, a sua
resolução é mais simples que os derivados dos desafios que o sistema enfrenta em prazos mais
latos. À medida que se desenvolve uma sociedade de serviços e de conhecimento, a
importância do conhecimento teórico sistemático aumenta e a importância do conhecimento
prático e tácito e da experiência diminuem. O resultado desta tendência poderá ser, no limite,
o declínio da importância do sistema dual na sociedade alemã (Baethge, Solga e Wieck, 2007)
e a sua reorientação para a formação dos jovens com pior desempenho ou dificuldades de
aprendizagem. Embora esta possibilidade seja, todavia, remota, começam a evidenciar-se
alguns sintomas de crise no sistema, os quais têm a sua origem:
-
Na progressiva perda de importância dos trabalhadores com formação profissional dual
para as empresas orientadas ao futuro, devido ao paulatino desaparecimento da
identificação com profissões específicas resultante das mudanças nas estruturas
económicas e organizacionais (Kupfer, 2010);
-
Nas mudanças nas estruturas organizacionais das empresas impulsionadas pelas
reformas de Bolonha. Nos últimos anos, em consequência da alteração do perfil das
47
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
formações superiores e das mudanças nas exigências dos postos de trabalho, um
número crescente de graduados universitários está a aceder a ocupações que
anteriormente eram preenchidas por graduados do sistema dual, forçando a saída de
alguns deles.
48
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 3 – O Sistema Educativo e o Sistema de Formação Profissional
Português
49
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
3.1. Os percursos formativos no sistema educativo português
Em resultado das várias reformas educativas implementadas nas últimas três décadas
destinadas a elevar as qualificações da população portuguesa, o sistema educativo nacional é
constituído por cinco níveis hierarquizados: i) a educação pré-escolar; ii) o ensino básico; iii) o
ensino secundário (sendo que ii) e iii) constituem a escolaridade obrigatória – 12 anos); iv) o
ensino pós-secundário não superior; e, v) o ensino superior.
A educação pré-escolar é dirigida a crianças entre os três e os cinco anos de idade e, embora
facultativa, tem sido amplamente reconhecida pelo Estado, nomeadamente através da aposta
na sua universalização.30 É oferecida em jardins-de-infância públicos ou privados, sendo no
primeiro caso totalmente gratuita.
O ensino básico, de caráter obrigatório e gratuito, geralmente decorre entre os seis e os
catorze anos de idade. Compreende nove anos de escolaridade distribuídos por três ciclos: um
1º ciclo com a duração de quatro anos (entre os seis e os nove anos de idade), correspondente
ao ensino primário; um 2º ciclo de dois anos (entre os dez e os onze anos de idade); e um 3º
ciclo de três anos (geralmente iniciado aos doze anos e findo aos catorze). Ao concluírem o 3º
ciclo do ensino básico, os alunos realizam exames nacionais às disciplinas de Português e
Matemática, sendo-lhes atribuído um diploma de conclusão do ensino básico.
Atualmente este nível de ensino prepara quer para o posterior prosseguimento de estudos
quer para a inserção na vida ativa, uma vez que para além da via geral31 (regular) compreende
também as seguintes modalidades: i) o Ensino Artístico Especializado (EAE); ii) o Ensino
Vocacional (EV); e, iii) o Ensino Básico Recorrente (EBR). Adicionalmente, existem um conjunto
de ofertas específicas que permitem a conclusão do ensino básico, nomeadamente:32 i) os
Percursos Curriculares Alternativos (PCA), ii) o Programa Integrado de Educação e Formação
(PIEF), iii) os Cursos de Educação e Formação (CEF), para jovens com idade mínima de 15 anos
e historial de insucesso escolar; enquanto os maiores de 18 anos (inclusive) podem concluir
através de: iv) os cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA); v) os processos de
Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC); e, vi) as formações
modulares certificadas.
O ensino artístico, tutelado pelo Ministério da Educação e Ciência (MEC), embora
primordialmente reconhecido como modalidade formativa de dupla certificação de nível
30
Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro, e Decreto-Lei n.º 147/97, de 11 de junho.
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/2013, de 10 de julho.
32
Ver Anexo I.
31
50
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
secundário, está disponível no ensino básico nas áreas da Música, Dança e Canto Gregoriano,33
a partir do 5º ano de escolaridade. O EAE de nível básico, que constitui uma etapa de iniciação
à educação artística e criativa, confere certificação escolar (de conclusão do 3º ciclo do ensino
básico) e profissional (correspondente ao nível 2 do Quadro Nacional de Qualificações – QNQ).
Nas vertentes da Música e Dança, o seu acesso encontra-se limitado a candidatos
considerados aptos numa prova eliminatória específica.
Os cursos vocacionais, criados para combater o insucesso e o abandono escolares, estavam
inicialmente destinados a jovens a partir dos 13 anos de idade com historial de retenções no
ensino básico (duas retenções num só ciclo ou três em ciclos distintos, respetivamente).34 Os
primeiros cursos vocacionais entraram em funcionamento no ano letivo 2012/2013, no âmbito
de um projeto piloto em treze escolas públicas. Estes cursos organizam-se seguindo uma
estrutura modular que permite combinar a aquisição de conhecimentos e a prática simulada
em contexto de trabalho. Os cursos vocacionais asseguram certificação escolar ao nível do 6º e
do 9º ano. Esta via é fortemente permeável ao prosseguimento de estudos, dado que os
jovens que concluam o 3º ciclo do ensino básico nesta modalidade podem continuar no ensino
vocacional (se aprovados em 70% dos módulos das componentes geral e complementar e
100% na vocacional), optar pelo ensino regular (após aprovação nas provas finais globais), ou
ingressar num curso profissional (desde que concluam a totalidade dos módulos da formação
vocacional).
O ensino recorrente de nível básico destina-se a jovens a partir dos 15 anos e a adultos que
não tenham concluído o ensino básico na idade legalmente prevista. Esta modalidade constitui
uma oportunidade quer para quem abandonou precocemente a escola quer para os que nunca
a frequentaram. O ensino recorrente permite o prosseguimento de estudos e a sua conclusão
confere diplomas escolares equivalentes aos atribuídos nos mesmos níveis do ensino regular.
O ensino secundário (em regra, realizado entre os quinze e os dezassete anos de idade,
compreende os 10º, 11º e 12º anos) inclui um conjunto de vias consideradas principais: i) os
Cursos Científico-humanísticos; ii) os Cursos com Planos Próprios (CPP); iii) os Cursos Artísticos
Especializados (CAE); iv) os Cursos Profissionais (CP); v) o Ensino Secundário Recorrente (ESR);
e, vi) os Cursos Vocacionais (CV). Adicionalmente, existe uma oferta no âmbito do sistema de
aprendizagem, tutelada pelo IEFP. Acrescem ainda outras ofertas com menor expressão, tais
33
A Portaria n.º 225/2012, de 30 de julho, retificada pela Declaração de Retificação n.º 55/2012, de 28
de setembro, cria os cursos artísticos nas áreas da Dança, Música e Canto Gregoriano no 2º e 3º ciclo do
ensino básico e regulamenta os cursos de Dança e Música do 1º ciclo.
34
Portaria n.º 292-A/2012, de 26 de setembro.
51
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
como os cursos de educação e formação ou outras iniciativas orientadas para a educação e
formação de adultos, designadamente os cursos EFA, as formações modulares e os processos
RVCC.35
Os cursos científico-humanísticos enquadram-se no ensino secundário regular, possuem a
duração de três anos letivos e visam preparar os jovens para o ensino superior. Os alunos que
ingressam nestes cursos podem optar pelas seguintes vias formativas: Ciências e Tecnologias,
Ciências Socioeconómicas, Línguas e Humanidades e Artes Visuais.
Os cursos com planos próprios, que integram a oferta de nível secundário, são na sua maioria
de dupla certificação e asseguram quatro componentes de formação: geral, científica,
tecnológica e prática em contexto de trabalho. Esta última é da responsabilidade de cada
escola em parceria com as entidades empresariais do contexto onde se localiza a oferta. A
conclusão bem-sucedida destes cursos implica a realização de uma prova de aptidão
tecnológica (PAT). Este tipo de cursos estiveram no início afetos exclusivamente à rede privada
de ensino.36 Em 2012 foram alvo de alterações significativas com a finalidade de melhorar a
empregabilidade dos seus estudantes.37
Os cursos do ensino artístico especializado de nível secundário, para além de reforçarem as
aptidões adquiridas no EAE básico, preparam os jovens para o futuro ingresso num curso
superior artístico e para o exercício de uma profissão no ramo. Estes cursos, com uma
duração de três anos letivos, abrangem três domínios: Artes Visuais e Audiovisuais, Dança e
Música. 38 Os dois primeiros possuem uma estrutura curricular com formação geral, científica e
técnico-artística, e formação em contexto de trabalho; o último prepara apenas para o
prosseguimento de estudos em cursos de nível terciário. Aos cursos de Dança e Música podem
aceder apenas alunos que superem uma prova eliminatória. Por sua vez, nos cursos de Artes
Visuais e Audiovisuais privilegia-se o acesso de candidatos com médias elevadas nos
programas de Educação Visual. Os EAE de Artes Visuais e Audiovisuais e Dança atribuem uma
qualificação de nível 4 e os de Música apenas de nível 3. Os EAE são oferecidos em regime
35
Ver anexo I.
Estes cursos surgiram ao abrigo dos artigos 11.º e 12.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo,
regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 553/80, de 21 de novembro (entretanto revogado).
37
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho.
38
Os cursos nas áreas das Artes Visuais e Audiovisuais encontram-se regulamentados na Portaria n.º
243-A/2012 de 13 de agosto, com a Declaração de Retificação n.º 59/2012 de 10 de dezembro, alterada
pela Portaria n.º 419-A/2012 de 20 de dezembro. Por sua vez, os cursos nos domínios da Dança e da
Música estão regulamentados nos termos da Portaria n.º 243-B/2012, de 13 de agosto, alterada pela
Portaria n.º 59-B/2014, de 7 de março.
36
52
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
integrado (num só estabelecimento escolar), articulado (em estabelecimentos diferentes) ou
supletivo (em estabelecimentos de ensino artístico especializado e apenas para a frequência
da vertente científica e técnica-artística).
Os cursos profissionais visam a qualificação inicial dos jovens, conferindo dupla certificação,
profissional e escolar. Garantem a possibilidade de continuidade de estudos em cursos do
ensino pós-secundário não superior ou do ensino superior. Os cursos profissionais, de três
anos de duração, destinam-se a candidatos com o 9º ano de escolaridade e, à sua conclusão,
conferem uma qualificação de nível 4. Estes cursos, tutelados pelo Ministério de Educação e
Ciência, são ministrados em escolas secundárias públicas e em escolas profissionais (públicas e
privadas). Caracterizam-se por ter uma organização modular distribuída em três áreas
formativas: sociocultural, científica e técnica. Esta última inclui, necessariamente, formação
em contexto de trabalho (real ou simulado). Para concluir estes cursos é obrigatório elaborar e
apresentar um projeto denominado Prova de Aptidão Profissional (PAP). No caso de os alunos
pretenderem prosseguir estudos no ensino superior devem realizar os exames nacionais de
acesso.
Desde 2012 o ensino secundário recorrente de nível secundário enquadra-se numa perspetiva
de aprendizagem ao longo da vida e de melhoria das qualificações da população adulta, no
âmbito das metas da Estratégia Europa 2020. Destina-se a indivíduos que tenham concluído os
seus estudos do ensino básico nas idades previstas. Tal como no ensino básico, a conclusão
desta modalidade de ensino confere um diploma do ensino secundário equivalente ao obtido
pela via regular.
No âmbito do secundário, os cursos vocacionais foram lançados imediatamente após a
experiência piloto implementada em 2012/13. Desde 2013 os cursos vocacionais admitem
também jovens do ensino secundário de idade igual ou superior a 16 anos, com o 3º ciclo do
ensino básico concluído e que apresentem um elevado risco de abandono escolar.39 Tal como
no nível básico, estes cursos combinam a aprendizagem em contexto de sala de aula com a
formação em contexto de trabalho. Os cursos vocacionais de nível secundário conferem
certificação escolar ao nível do 12º ano e certificação profissional de nível 4. A conclusão dos
cursos vocacionais de nível secundário permite aos alunos iniciar um curso de educação póssecundária não superior (nível 5) ou mesmo uma licenciatura, se reunirem os requisitos
legalmente estabelecidos.
39
Despacho n.º 4653/2013, de 3 de abril, e Portaria n.º 276/2013, de 23 de agosto.
53
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Os cursos de aprendizagem40 constituem uma modalidade de formação profissional inicial, em
alternância, dirigida a jovens com idades compreendidas entre os 15 e os 25 anos de idade,
que concluíram com aproveitamento o 9º ano de escolaridade ou que não concluíram o ensino
secundário.41 Os programas destes cursos apresentam uma forte articulação entre a formação
em sala de aula (sociocultural, cientifica e tecnológica e prática) e a formação em contexto de
trabalho. Os dois anos e meio de formação distribuem-se em três períodos formativos, que
concluem com a realização de uma Prova de Avaliação Final (PAF). A conclusão de um curso de
aprendizagem confere ao aluno o 12º ano de escolaridade e o nível 4 de qualificação. O
sistema de aprendizagem é da responsabilidade do IEFP e está sob a alçada do Ministério do
Trabalho. Embora uma parte significativa dos cursos de aprendizagem sejam ministrados em
centros de formação do IEFP, podem também decorrer em entidades formadoras externas,
entidades de apoio à alternância e entidades parceiras para a qualificação.
Os cursos de especialização tecnológica (CET),42 enquadrados na formação profissional de nível
pós-secundário não superior, destinam-se a jovens que tenham concluído, ou não, o 12º ano
de escolaridade (e, portanto, detenham uma qualificação profissional de nível 3 ou 4) ou que
possuam um diploma de especialização tecnológica ou um grau académico do ensino superior,
e pretendam requalificar-se profissionalmente. Os CET contemplam formação geral, científica,
tecnológica e em contexto laboral e garantem certificação profissional de nível 543 e um
Diploma de Especialização Tecnológica (DET). Os candidatos poderão prosseguir estudos no
ensino superior (via concursos especiais de acesso) podendo inclusivamente creditar as
unidades de formação dos cursos de especialização tecnológica na respetiva licenciatura. Os
cursos de especialização tecnológica são oferecidos em escolas secundárias e instituições do
ensino superior, públicas e privadas, centros de formação do IEFP, escolas tecnológicas e
outras entidades devidamente qualificadas.
O ensino superior é ministrado em duas redes alternativas, a das Universidades e a dos
Institutos Politécnicos. Os graus académicos correspondentes a este nível de ensino são o de
licenciado (três a quatro anos), mestre (variável, mas normalmente entre um ano e meio e dois
anos) e doutor (nunca menos de três anos).
40
Portaria n.º 1497/2008, de 19 de dezembro.
Excecionalmente poderão ser aceites candidatos com idade superior a 25 anos, desde que em
situação de desemprego, inscritos no IEFP e sem outras ofertas formativas adequadas ao seu perfil.
42
Decreto-Lei n.º 88/2006, de 23 de maio.
43
Portaria n.º 782/2009, de 23 de julho.
41
54
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
A Tabela 3.1 ilustra os percursos formativos disponíveis para jovens menores de 15 anos,
jovens com idade igual ou superior a 15 anos e jovens com 18 ou mais anos, no sistema
educativo português.
Tabela 3.1 – Percursos formativos no sistema educativo Português para
jovens de diversas idades
Idades
Modalidades
Percursos formativos para jovens com idade
inferior a 15 anos
Percursos formativos para jovens com idade igual
ou superior a 15 anos
-
Percursos formativos para jovens com idade igual
ou superior a 18 anos
Fonte: Elaboração Própria.
55
Cursos Gerais
Cursos de Ensino Artístico Especializado
Cursos Vocacionais
Percursos Curriculares Alternativos
Cursos Científico-humanísticos
Cursos com Planos Próprios
Cursos de Ensino Artístico Especializado
Cursos Profissionais
Ensino Recorrente
Cursos Vocacionais
Cursos de Aprendizagem
Percursos Curriculares Alternativos
Programa Integrado de Educação e Formação
Cursos de Educação e Formação
Cursos Tecnológicos (recentemente extintos, mas
ainda em vigor)
Ensino Recorrente
Cursos de Educação e Formação de Adultos
Processos de Reconhecimento, Validação e
Certificação de Competências
Formações Modulares
Competências básicas
Vida Ativa
Vias de conclusão do ensino secundário
Cursos de Especialização Tecnológica
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
3.2. A formação profissional no sistema educativo Português – A evolução
Após o 25 de abril, os primeiros cursos de formação profissional foram lançados no âmbito do
sistema de aprendizagem. Este sistema, criado em 1984,44 surgiu como uma alternativa ao
sistema de formação tradicional com a finalidade de apoiar a qualificação e certificação dos
jovens que, por diversos motivos, abandonavam precocemente o sistema de ensino. O sistema
de aprendizagem, que segue uma abordagem de work-based learning (WBL), é um sistema de
dupla certificação, em alternância, no qual existe interação entre as componentes de formação
teórica e de formação em contexto de trabalho.
Nos cursos do sistema de aprendizagem, que são exclusivamente tutelados pelo IEFP, as
empresas são consideradas espaços ativos de formação, dado que permitem a aprendizagem
dos formandos em contexto real de trabalho. Atualmente, o processo de aprendizagem
integra quatro componentes: sociocultural, científica, tecnológica e prática.45 A carga horária
destes cursos varia entre as 2.800 e as 3.700 horas. As horas de formação prática em contexto
real de trabalho não devem representar menos de 40% da carga horária total, podendo variar
entre as 1.100 e as 1.400 horas. A relação entre o formando e a entidade formadora é
formalizada através de um contrato de aprendizagem. Este contrato não gera nem titula
relações de trabalho subordinado e caduca com a conclusão do curso.
Embora inicialmente estes cursos tenham tido um âmbito mais restrito e objetivos educativos
mais modestos, em finais da década de oitenta foram introduzidas um conjunto de reformas,
que permitiram melhorar o sistema do ponto de vista da certificação, qualificação e
permeabilidade.46 Esta reforma permitiu acolher jovens com o 9º ano, que após a conclusão
bem-sucedida da formação, obtinham um diploma profissional de certificação e uma
qualificação de nível 3 (técnicos intermédios).47 Para efeitos de prosseguimento de estudos, o
diploma passou a ser equivalente ao 12º ano regular e, portanto, análogo ao atribuído nas
escolas profissionais.
44
Foi inicialmente criado pelo Decreto-Lei n.º 102/84, de 29 de março. Em 1996, através do Decreto-Lei
n.º 205/96, de 25 de outubro, foram introduzidas no sistema um conjunto de alterações pedagógicas e
organizativas, para fins de adaptação ao novo contexto socioeconómico.
45
Portaria n.º 1497/2008, de 19 de Dezembro.
46
Decreto-Lei n.º 436/88, de 23 de novembro.
47
Esta via estava inicialmente destinada a jovens maiores de catorze anos, com percursos de abandono
escolar, após a conclusão da escolaridade obrigatória, na altura de seis anos.
56
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Embora o sistema tenha passado, nas suas três décadas de existência, por fases diversas em
termos de atratividade,48 nos últimos anos tem conseguido atrair um número significativo de
alunos. De facto, nos últimos cinco anos letivos o número de alunos inscritos em cursos do
sistema de aprendizagem de nível secundário tem crescido significativamente (Figura 3.1).
Figura 3.1 – Número de alunos inscritos em cursos de nível secundário do
sistema de aprendizagem, 2008-2013
40 000
33 366
35 000
30 000
25 000
21 056
20 000
15 000
18 669
17 619
13 584
10 000
5 000
08-09
09-10
10-11
11-12
12-13
Fonte: DGEEC (2014).
Para além dos cursos do sistema de aprendizagem, no sistema educativo português existem
um conjunto de modalidades com uma orientação profissionalizante, que têm vindo a
consolidar-se ao longo das últimas três décadas, em resultado de respostas a fatores exógenos
com impactos económicos e sociais alargados e da evolução intrínseca do sistema de ensino e
formação e do mercado de trabalho. A adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia
(CEE), em 1986, teve um impacto significativo sobre o sistema de ensino, em geral, e sobre o
sistema de formação profissional, em particular. Nesse ano, foi aprovada a Lei de Bases do
Sistema Educativo,49 que tinha entre os seus objetivos a descentralização e diversificação das
estruturas e ações educativas para garantir a adequada adesão à CEE. Outra medida
importante foi a constituição, em 1987, do Conselho Nacional de Educação, como organismo
48
Por exemplo, este sistema experimentou uma quebra abrupta nas inscrições entre os anos 2005 e
2008. Este período coincidiu com a expansão da oferta de cursos profissionais de nível secundário nas
escolas secundárias públicas.
49
Lei n.º 46/86, de 14 de outubro.
57
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
superior com funções de caráter consultivo. Essas alterações foram reconfigurando o sistema
educativo, à medida que foram sendo incorporadas outras modalidades de ensino e formação.
A criação, em 1989, do subsistema de escolas profissionais50 é a medida com maior impacto no
domínio da formação profissional em Portugal, no final da década de oitenta e na década de
noventa. Esta rede nasceu com o duplo objetivo de melhorar a empregabilidade dos jovens e ir
de encontro das suas necessidades e expetativas, através de formações de espectro largo,
local e sectorialmente enquadradas. Para o desenvolvimento da nova rede de
estabelecimentos privados de ensino e formação, o Estado apostou num partenariado
educativo, baseado na celebração de contratos-programa, em especial com entidades privadas
(nomeadamente sindicatos, empresas e associações) mas também com autarquias, em função
das caraterísticas e especificidades locais e regionais. A tutela e o financiamento dos
estabelecimentos deste subsistema são da responsabilidade do Estado, através do Ministério
de Educação e Ciência.
Os programas dos cursos profissionais são integrados por três componentes de formação:
sociocultural, científica e técnica. A carga horária máxima é de 3.100 horas e a da formação
técnica de 1.600 horas, das quais 420 devem ser dedicadas a formação em contexto de
trabalho. A componente de formação em contexto de trabalho pode ser substituída por
práticas simuladas em contexto escolar.
As escolas profissionais tiveram o monopólio dos cursos profissionais até ao ano académico
2004-2005. Nesse ano, esta tipologia de cursos passou a ser oferecida também nas escolas
secundárias públicas.51 Embora nos primeiros anos o número de cursos profissionais e de
turmas oferecidos na rede pública fosse modesto,52 a partir do ano académico 2007-2008
verificou-se um crescimento explosivo, que fez com que o número de alunos crescesse até os
75.000, no ano académico 2012-2013. Apesar do rápido crescimento do número de alunos nos
cursos profissionais nas escolas secundárias públicas, o número de alunos nas escolas
profissionais privadas continuou a aumentar. Concretamente, entre 2003-200453 e 2012-2013,
o número de alunos inscritos nas escolas profissionais aumentou de 34.399 para 42.513. Nesse
período as escolas profissionais passaram de concentrar praticamente 100% dos inscritos em
cursos profissionais a representar apenas 36,7% do total.
50
Decreto-Lei n.º 26/89, de 21 de janeiro.
Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março.
52
2004-2005 (11 Escolas e 13 turmas); 2005-2006 (20 Escolas e 30 turmas); e, 2006-2007 (93 Escolas e
261 turmas).
53
Ano académico imediatamente anterior ao fim do monopólio.
51
58
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Uma outra medida com consequências importantes no domínio da formação profissional,
nesse período, foi a reforma curricular do ensino secundário de 1989.54 Esta reforma aboliu os
Cursos Secundários Profissionais e Técnico-Profissionais e estabeleceu duas tipologias
formativas: os Cursos Predominantemente Orientados para o Prosseguimento de Estudos
(CPOPE) ou cursos gerais, e os Cursos Predominantemente Orientados para o Ingresso na Vida
Ativa (CPOVA) ou cursos tecnológicos (Antunes, 2004).
A partir de 1989, as principais características do ensino secundário em Portugal passaram a ser
as seguintes (Azevedo, 2009):
-
O acesso ao ensino secundário implica a conclusão da escolaridade obrigatória, com
uma duração de nove anos e estruturada em três ciclos de estudos: 1º ciclo do ensino
básico – CEB (1º a 4º anos), 2º CEB (5º e 6º anos) e 3º CEB (7º, 8º e 9º anos);
-
O ensino secundário é ministrado em três locais diferenciados: i) as escolas
secundárias, que oferecem cursos gerais e cursos tecnológicos; ii) as escolas
profissionais, que oferecem cursos profissionais; e, iii) os centros de formação
profissional, que oferecem cursos de aprendizagem, integrados no sistema do mesmo
nome;
-
A duração média do ensino secundário é de três anos, com exceção dos cursos do
sistema de aprendizagem, que podiam prolongar-se por mais tempo;
-
O curriculum dos cursos secundários das diferentes vias contemplam três áreas: i) geral
ou sociocultural; ii) específica ou científica; e iii) técnica ou tecnológica. Esta estrutura
permaneceu em vigor até a reforma de 2004;
-
Embora as diversas vias confiram à conclusão dos cursos diplomas diferentes, todos
eles permitem o prosseguimento de estudos superiores.
Entre 2002 e 2004, preparou-se, através da aprovação de um conjunto de normativos, uma
profunda reforma do ensino secundário, destinada a promover um ensino secundário
qualificante. Em 2002 foi publicada a Lei Orgânica do Ministério da Educação,55 na qual se
previa a adequação da qualificação nacional de recursos humanos às diretrizes europeias de
competitividade económica e educação ao longo da vida. Em 2004 avança-se com a reforma
do ensino secundário,56 com a pretensão, por um lado, de melhorar a formação e a
54
Decreto-Lei nº 286/89, de 29 de agosto.
Lei n.º 31/2002, de 20 de dezembro
56
Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de março, alterado pelo Decreto-Lei n.º 24/2006, de 6 de fevereiro.
55
59
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
qualificação dos jovens e, por outro, de combater o insucesso e o abandono escolares. No
âmbito da formação profissional, a medida com maior impacto nesse período foi, como
referido, a introdução dos cursos profissionais nas escolas secundárias públicas regulares,57 até
então lecionados exclusivamente nas escolas profissionais.
A reforma proposta nos normativos supracitados pretendiam impulsionar: i) a diversificação e
permeabilidade da oferta formativa; ii) a introdução das novas tecnologias de informação e
comunicação; e, iii) o reforço da autonomia das escolas. A reforma planeada desencadeou um
processo de homogeneização e estandardização da oferta existente, fazendo convergir as
diferentes vias com a via mais geral/liceal de ensino. Esta estratégia, que visou potenciar o
ensino profissional através do envolvimento de novos agentes, nomeadamente das escolas
secundárias, acabou por revelar-se bem-sucedida, pelo menos do ponto de vista quantitativo.
Embora os primeiros cursos tivessem um caráter experimental e fossem introduzidos de forma
muito gradual (em substituição dos Cursos Tecnológicos), a oferta de formação profissional
nas escolas secundárias da rede pública expandiu-se muito rapidamente, de forma que, entre
2005 e 2010, o número de alunos desta modalidade praticamente triplicou (Figura 3.2). Este
crescimento revela que os cursos profissionais têm vindo a ganhar espaço no ensino
secundário e a constituir-se como uma alternativa competitiva face às restantes modalidades
deste nível de ensino.
A expansão dos cursos profissionais alterou a orientação do ensino secundário português,
como consequência da perda de peso da modalidade regular e do aumento de peso das
modalidades profissionalizantes. De facto, entre 2003 e 2013, o peso dos alunos inscritos em
cursos profissionais no total do ensino secundário aumentou constantemente até atingir quase
30% do total das inscrições neste nível de ensino (Figura 3.3).
Uma outra medida com um forte impacto no ensino secundário em geral e com algum impacto
no ensino profissional, em particular, foi o lançamento da Iniciativa Novas Oportunidades
(INO), no ano de 2005. Este programa, inserido no Plano Nacional de Emprego 2005-2008,
emergiu como um instrumento de combate aos baixos níveis de escolarização/qualificação da
população portuguesa e como uma estratégia para a elevação dos mesmos através de
processos de qualificação e certificação.
57
Portaria n.º 550-C/2004, de 21 de maio.
60
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 3.2 – Número de alunos inscritos em cursos profissionais – escolas
profissionais e escolas secundárias públicas, 2003-2013
140 000
120 000
107 266
100 000
110 462
113 749 115 885
93 438
80 000
70 177
60 000
47 709
40 000
34 399
36 765
36 943
03-04
04-05
05-06
20 000
0
06-07
07-08
08-09
09-10
10-11
11-12
12-13
Fonte: DGEEC (2014).
Figura 3.3 – Alunos inscritos em cursos profissionais no total de alunos
inscritos no ensino secundário (%), 2003-2013
29,1%
30%
27,7%
25,1%
25%
22,2%
20,1%
18,8%
20%
15%
10%
13,4%
9,8%
9,0%
10,6%
5%
0%
03-04
04-05
05-06
06-07
07-08
Fonte: DGEEC (2014).
61
08-09
09-10
10-11
11-12
12-13
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
A Iniciativa Novas Oportunidades tinha como metas fundamentais:
-
A elevação do referencial de educação para 12 anos de escolaridade;
-
A elevação do número de vagas/candidatos à oferta formativa qualificante, de modo a
que, em 2010, estes representassem metade das vagas/candidatos do ensino
secundário regular.
Em 2007, em articulação com o Quadro Europeu de Qualificações (QEQ),58 foi instituído o
Sistema Nacional de Qualificações (SNQ),59 com a finalidade de potenciar a formação de base
da
população
ativa,
através
da
elevação
do
seu
nível
de
competências
(escolares/profissionais). Paralelamente, surgiu a Agência Nacional de Qualificações (ANQ),60
como estrutura coordenadora do SNQ, em articulação com os demais organismos
competentes em matéria de educação e formação profissional.
Neste âmbito foram posteriormente criadas novas entidades e instrumentos de gestão e
articulação entre formação profissional enquadrada no sistema educativo e formação
profissional associada ao mercado de trabalho, designadamente: os Centros de Novas
Oportunidades (CNO),61 os Conselhos Sectoriais para as Qualificações; a Rede de Entidades
Formadoras; o Quadro Nacional de Qualificações (QNQ); o Catálogo Nacional de Qualificações
(CNQ); a Caderneta Individual de Competências e o Sistema de Reconhecimento, Validação e
Certificação de Competências (RVCC).
Um outro aspeto com grande impacto sobre o sistema educativo em Portugal, nos últimos
anos, foi o estabelecimento da escolaridade obrigatória em 12 anos.62 A entrada em vigor
dessa obrigatoriedade63 foi acompanhada da criação de novas ofertas educacionais de caráter
vocacional, tanto de nível básico como secundário.64 Com estes cursos pretende-se acautelar
os interesses vocacionais dos alunos e melhorar a sua empregabilidade, através de programas
que aproximem a escola e as empresas.
58
Os níveis deste Quadro constam do Anexo II.
Decreto-Lei n.º 396/2007, de 31 de dezembro.
60
Decreto-Lei n.º 276-C/2007, de 31 de Julho. Em 2012, através do Decreto-Lei n.º 36/2012, de 15 de
fevereiro, a ANQ passou a designar-se Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional, I. P.
(ANQEP, I. P.). Os seus Estatutos foram aprovados pela Portaria n.º 294/2012, de 28 de setembro.
61
Em 2013, os CNO foram extintos pela Portaria n.º 135-A/2013, de 28 de março, e substituídos por
Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional (CQEP).
62
Decreto-Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto.
63
Decreto-Lei n.º 176/2012, de 27 de agosto.
64
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/2012, de 10 de julho.
59
62
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Em 2014, foi proposto um novo regime jurídico para as atuais escolas profissionais e a criação
de Escolas Profissionais de Referência Empresarial (EPRE).65 Em consonância com a “Estratégia
Europa 2020” e com o “Compromisso para o Crescimento, Competitividade e Emprego”, estas
medidas visam potenciar o ensino dual e as modalidades formativas de dupla certificação
(escolar e profissional). Pretende-se que entidades empresariais de sectores economicamente
relevantes desenvolvam cursos de ensino e formação de dupla certificação de nível 4. A oferta
formativa resultante comportará uma significativa carga horária de formação tecnológica e
prática, sendo esta última desenvolvida em contexto empresarial. Para além da oferta
formativa de nível 4 direcionada aos jovens, as EPRE orientar-se-ão também para a
qualificação da população adulta, no âmbito da aprendizagem ao longo da vida.
Para complementar a oferta profissionalizante existente, disponibilizando alternativas para o
prosseguimento de estudos nesta via, está previsto que futuramente venham a ser lançados
mais programas de formação profissional de nível 5. Esta oferta integrará os denominados
cursos técnicos superiores profissionais (CTSP), de 120 ECTS, os quais, à partida, serão
oferecidos na rede de Institutos Politécnicos.
3.3. A formação profissional no sistema educativo Português – A atualidade
O sistema educativo português abrange quatro ciclos educativos:66,67
-
Dois ciclos de educação primária – 1º e 2º ciclo do ensino básico (de 4 e 2 anos de
duração, respetivamente);
-
Dois ciclos de educação secundária – 3º ciclo do ensino básico (secundário inferior) e
ciclo secundário (secundário superior) (de 3 anos de duração cada).
O ensino básico, que abrange os três ciclos de estudos mencionados, oferece formação geral,
formação profissional e formação vocacional. O ensino secundário superior oferece ensino
regular de caráter geral, ensino profissional e ensino vocacional.
O panorama do ensino secundário em Portugal tem-se alterado significativamente na última
década. A Tabela 3.2 apresenta a evolução dos alunos inscritos nas diferentes modalidades de
ensino secundário existentes no país.
65
Decreto-Lei n.º 92/2014, de 20 de junho.
Esta secção assenta, em grande medida, numa das secções do Relatório de Ensino e Formação Dual,
elaborado pelo Conselho Nacional de Educação (CNEDU, 2014).
67
O ensino superior foi excluído da análise.
66
63
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 3.2 – Alunos matriculados no ensino secundário por modalidade de
ensino, 2003-2013
Modalidade de
ensino
Cursos Científicohumanísticos
Cursos
Profissionais
Cursos de
Aprendizagem
03/04
04/05
05/06
06/07
07/08
08/09
09/10
10/11
11/12
12/13
212.342
205.671
188.460
196.023
196.216
195.330
197.582
197.918
199.131
201.118
34.399
36.765
36.943
47.709
70.177
93.438
107.266
110.462
113.749
115.885
X
X
X
X
X
13.584
17.619
18.669
21.056
33.366
Cursos CEF
2.877
2.832
3.422
5.224
8.425
4.388
2.320
2.117
2.012
3.025
Artístico
Especializado
2.196
2.184
2.063
2.256
2.264
2.527
2.348
2.283
2.341
2.462
Recorrente
77.548
69.970
64.284
62.679
30.891
18.208
12.578
8.323
6.058
6.970
Cursos
Tecnológicos
52.850
59.474
52.228
42.820
25.673
20.212
14.577
13.315
10.145
5.976
Cursos EFA
-
-
-
-
15.831
52.214
41.773
39.467
28.005
18.386
Formações
Modulares
X
X
X
X
X
X
963
396
472
426
Processos RVCC
X
X
X
X
X
98.426
86.956
47.945
28.269
10.833
382.212
376.896
347.400
356.711
349.477
498.327
483.982
440.895
411.238
398.447
Total
Fonte: DGEEC (2014).
Figura 3.5 – Alunos matriculados nas principais modalidades de ensino
secundário, 2003-2013
500 000
498 327
483 982
440 895
450 000
400 000
398 447
382 212
376 896
411 238
356 711
350 000
349 477
347 400
300 000
250 000
212 342
205 671
196 023
196 216
197 918 199 131 201 118
195 330
200 000
197 582
188 460
150 000
99 322
76 809
100 000
66 616
127 205
136 817
111 410
57 376
50 000
152 276
131 248
66 612
0
03-04
04-05
Total
05-06
06-07
Cursos Gerais
07-08
08-09
09-10
10-11
Cursos Profissionalizantes
Fonte: DGEEC (2014).
64
11-12
Outros
12-13
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Entre 2003 e 2013, a oferta profissionalizante tem vindo a ganhar peso no nível secundário de
ensino.68 Na Figura 3.5, que considera apenas as modalidades mais relevantes da oferta
profissionalizante – cursos profissionais, cursos de aprendizagem e cursos de educação e
formação (em franco declínio), observa-se o crescimento continuado da quota dessas
modalidades no ensino secundário português.
No sistema de educação e formação português, a formação profissional (e vocacional) tem
presença em diversas fases/ciclos de estudos. Nomeadamente:
-
No ensino básico existe formação profissional de dupla certificação (CEF) para jovens
que tenham concluído o 2º ciclo do ensino básico ou que estejam a frequentar o
segundo (último) ano desse ciclo. Estes cursos conferem qualificação de nível 2.
-
No ensino secundário inferior (3º ciclo do ensino básico) existe formação profissional
de dupla certificação (CEF), de 1 a 2 anos de duração, e ensino vocacional, com início a
partir dos 13 anos de idade. Estes cursos conferem qualificação de nível 2 e
apresentam uma elevada permeabilidade.69
-
No ensino secundário superior (secundário) existe formação profissional de dupla
certificação (CEF), de 1 a 2 anos de duração,70 para jovens a partir dos 15 anos, ensino
vocacional, de 2 a 3 anos de duração,71 e cursos profissionais, de 3 anos de duração.72
Estes cursos destinam-se a jovens que tenham concluído o 3º ciclo do ensino básico
(secundário inferior). Estas ofertas são altamente permeáveis ao prosseguimento de
estudos.73.
No âmbito do secundário, ainda que sob a tutela do Ministério do Trabalho, existem
cursos de aprendizagem, com uma duração de 2 anos e meio.74 Esta oferta destina-se
a jovens com menos de 25 anos que tenham concluído o 3º ciclo do ensino básico
(secundário inferior) mas não tenham um diploma de nível secundário. Outorgam uma
qualificação de nível 4 e permitem o prosseguimento de estudos.
68
Cursos profissionais, cursos de aprendizagem, cursos de educação e formação, cursos artísticos
especializados e os cursos tecnológicos – em extinção.
69
Ensino geral e ensino vocacional secundário.
70
A carga horária varia entre 1.025 e 2.275 horas, aproximadamente.
71
A carga horária mínima total é de 3.000 horas.
72
A carga horária máxima é de 3.100 horas.
73
Desde que cumpridos os requisitos legais em vigor permitem o acesso ao ensino superior.
74
A carga horária varia entre as 2.800 e as 3.700 horas.
65
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
No ensino pós-secundário não superior existem os denominados cursos de
especialização tecnológica – CET, para jovens de 18 a 19 anos, bem como para jovens
adultos de até 23 anos. Estes cursos têm uma duração de 1 ano,75 aproximadamente, e
conferem uma qualificação de nível 5.76 Podem aceder a estes cursos os titulares de
ensino secundário ou equivalente, alunos com 10º e 11º e frequência do 12º ano,
titulares de qualificação de nível 3, titulares de diploma de especialização tecnológica
ou com grau de ensino superior.
Tabela 3.3 – Importância do ensino profissional/vocacional no sistema
educativo português, 2012-2013
Tipologia de Cursos
Cursos de Educação e Formação
Inscritos
3.025
% Ensino
Profissionalizante
% Ensino
Secundário
1,99%
0,76%
Cursos Vocacionais
(1) 1.910
Cursos Profissionais
113.749
74,70%
28,55%
33.366
21,91%
8,37%
Cursos de Aprendizagem
Cursos Especialização Tecnológica (2)
Total
7.453
---
---
---
---
(3) 157.593
Notas: (1) Dados relativos ao ano académico de 2014-2015. Este foi o primeiro ano de funcionamento destes cursos
de nível secundário; (2) Cursos de ensino pós-secundário não superior; (3) Total excluindo os cursos vocacionais.
Fonte: DGEEC (2014) e Cálculos Próprios.
O retrato atual do ensino profissional/vocacional em Portugal de nível secundário está
consignado na Tabela 3.3. A Tabela 3.4 resume as principais características dos cursos de
formação profissional/vocacional atualmente em funcionamento em Portugal.
75
76
A carga horária varia entre as 1.200 e as 1.560 horas.
Este tipo de cursos na maioria dos países europeus conferem uma qualificação de nível 4.
66
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 3.4 – Cursos de formação profissional/vocacional em Portugal (I)
Tipo de Curso/Objetivos
Principais Características
Cursos de Educação e Formação
(CEF)
[Nível secundário]
Principal objetivo:
Motivar os alunos para a
continuação
de
estudos
fornecendo
soluções
de
aprendizagem flexíveis, de
acordo
com
as
suas
expectativas e as necessidades
do mercado de trabalho local.
Idade: +15 anos
Requisitos de admissão: 3º ciclo do ensino básico (9º
ano de escolaridade) ou 10º ou 11º.
Organização do curso: estes cursos incluem vários
percursos formativos, com 1 a 2 anos de duração,
organizados numa sequência de etapas formativas. Os
trajetos de formação são organizados sequencialmente
do tipo 1 ao tipo 7. Os cursos de educação e formação
de nível secundário são os de tipo 5 e 6. A carga horária
desses percursos varia entre as 1.380 e as 2.276 horas.
Os alunos que acedam com o 9º ano de escolaridade ou
equivalente deverão efetuar um Curso de Formação
Complementar de 1.020 horas.
Tipo de instituição: escolas públicas, privadas ou
cooperativas de ensino, centros do IEFP, centros de
formação certificados.
Certificação: dupla certificação – ensino secundário/12º
ano de escolaridade e nível 4 do QNQ.
Cursos Vocacionais
[Nível secundário]
Objetivos:
- Criar condições para o
cumprimento da escolaridade
obrigatória;
- Reduzir o abandono escolar
precoce;
- Melhorar a integração dos
jovens no mercado de
trabalho;
- Responder aos interesses dos
jovens.
Idade: +16 anos
Requisitos de admissão: 3º ciclo do ensino básico (9º
ano de escolaridade) ou alunos que tendo frequentado
o ensino secundário pretendam reorientar o seu
percurso formativo.
Organização do curso: a duração normal do curso é de
2 anos organizados em várias componentes, geral,
complementar, vocacional e estágio formativo, com
uma carga horária mínima de 3.000 horas. O estágio
deve ter uma duração mínima de 1.400 horas.
Tipo de instituição: escolas secundárias públicas e
privadas e escolas profissionais.
Certificação: dupla certificação – ensino secundário/12º
ano de escolaridade e nível 4 do QNQ.
Fonte: Elaboração Própria.
67
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 3.4 – Cursos de formação profissional/vocacional em Portugal (II)
Tipo de Curso/Objetivos
Principais Características
Cursos Profissionais
Objetivos:
- Contribuir
para
o
desenvolvimento
de
competências
pessoais
e
profissionais para o exercício
de uma profissão;
- Dar resposta às necessidades
do mercado de trabalho local e
regional.
Idade: +15 anos
Requisitos de admissão: conclusão do 3º ciclo do ensino
básico (9º ano de escolaridade). Os candidatos procuram
um ensino prático com ligação ao mercado de trabalho e
que, além disso, lhes permita prosseguir os estudos.
Organização do curso: a duração do curso é de 3 anos
organizados em módulos, com uma duração de 2.800 a
3.700 horas. A componente prática é obrigatória. Os
alunos devem realizar uma Prova de Aptidão Profissional,
no final do 3º ano, que demonstre as competências e
conhecimentos adquiridos durante o estágio.
Tipo de instituição: escolas profissionais públicas ou
privadas e escolas secundárias da rede pública.
Certificação: dupla certificação – ensino secundário/12º
ano de escolaridade e nível 4 do QNQ.
Cursos de Aprendizagem
Principal objetivo:
- Promover a formação inicial de
jovens com a finalidade de
aumentar a sua empregabilidade;
- Dar resposta às necessidades
do mercado de trabalho.
Idade: jovens entre 15 e 24 anos de idade.
Requisitos de admissão: conclusão do 3º ciclo do ensino
básico (9º ano de escolaridade) ou nível secundário não
completo.
Organização do curso: a duração do curso é de 2 anos e
meio, com uma duração de 2.800 a 3.700 horas; inclui
um estágio obrigatório (40% da carga horária do curso).
Tipo de instituição: IEFP/centros de formação e
entidades privadas com protocolos com o IEFP.
Certificação: dupla certificação – ensino secundário/12º
ano de escolaridade e nível 4 do QNQ.
Fonte: Elaboração Própria.
68
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela 3.4 – Cursos de formação profissional/vocacional em Portugal (III)
Tipo de Curso/Objetivos
Principais Características
Cursos de Especialização
Tecnológica (CET)
[Nível pós-secundário não superior]
Objetivos:
- Dotar o aluno de uma
formação técnica de alto nível;
- Fornecer ao aluno capacidades
e conhecimentos para que
possa assumir, de forma
autónoma ou independente,
responsabilidades de conceção e/ou de direção e/ou de
gestão.
Idade: +18 anos de idade.
Requisitos de admissão:
- Os titulares de um curso secundário ou de
habilitação legalmente equivalente;
- Os que tendo obtido aprovação em todas as
disciplinas do 10º e 11º e tendo estado inscritos no
12º ano de um curso de ensino secundário, ou de
habilitação legalmente equivalente, não o tenham
concluído;
- Os titulares de uma qualificação profissional de
nível 3;
- Os titulares de um diploma de especialização
tecnológica ou de um grau de ensino superior.
Organização do curso: variável, dependendo do
número de ECTS, que pode, por sua vez, variar entre 60
e 90 (normalmente entre 1.200 e 1.560 horas). Os
cursos são organizados em três áreas: científica,
tecnológica e aprendizagem em contexto de trabalho).
Tipo de instituição: escolas públicas, privadas e
cooperativas de ensino, universidades e politécnicos,
centros do IEFP e centros de formação certificados.
Certificação: Diploma de Especialização Tecnológica e
nível de 5 de qualificação.
Fonte: Elaboração Própria.
69
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
70
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 4 – A Transferência do Sistema Dual
71
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
4.1. Introdução
A capacidade dos sistemas de formação profissional dual para elevar os níveis gerais de
educação e garantir a inserção dos jovens no mercado de trabalho, reduzindo os níveis de
desemprego jovem, tem despertado o interesse de governos de diversos países, que procuram
incorporar alguns dos seus princípios às suas realidades nacionais. Nas últimas décadas, o
sistema dual alemão tem sido alvo de várias tentativas de transferência/replicação, em
diversos países, com o apoio da Sociedade Alemã para a Cooperação Internacional (GIZ).
Nos últimos vinte e cinco anos, vários países africanos têm sido um campo de experimentação
permanente nesta matéria. Países como o Egito,77 Mali, Gâmbia, Etiópia, Benim e Burkina Faso
desenvolveram experiências de formação profissional dual, com diferente alcance e ambição.
A maioria das iniciativas implementadas na África Subsariana têm-se revelado, de um modo
geral, mesmo quando bem-sucedidas, de pequena escala e demasiado dependentes de um
sector específico.
Para além de iniciativas pontuais em países como as Filipinas, na Ásia o sistema dual não tem
despertado tanto interesse como noutras latitudes. Não obstante, a China está a estudar
formas de renovar o seu sistema de formação profissional, inspirando-se nos princípios dos
sistemas duais europeus, nomeadamente do sistema alemão (Zhao et al, 2014). Apesar dos
avanços experimentados pelo sistema de formação profissional chinês, graças às várias
reformas efetuadas pelo governo desde 1978, o sistema ainda apresenta grandes limitações,
estando bastante desajustado das necessidades das empresas e dos requisitos dos postos de
trabalho.
Entre os principais problemas do sistema destacam-se: a preponderância dos programas
baseados na escola, a variabilidade de qualidade dos programas e a sua falta de atratividade, a
rejeição social deste tipo de ensino por questões culturais, a pequena escala das escolas
profissionais, a fraca qualidade dos professores e a escassez de financiamento público (Wang,
2011). Estes problemas traduzem-se na insatisfação generalizada dos empregadores com o
sistema, em geral, e com a falta de adequação das competências e habilidades dos graduados
nestes programas, em particular. Nesta conjuntura, o governo chinês está a encetar reformas
no sistema de formação profissional, inspiradas nos sistemas duais de inspiração germânica. O
objetivo das reformas é garantir o fornecimento de mão-de-obra especializada com as
77
Através da denominada Iniciativa Mubarak-Kohl.
72
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
competências técnicas requeridas por um sector industrial em expansão e progressiva
complexificação.
Em países europeus com graves problemas de desemprego jovem, o interesse pelos sistemas
duais de formação profissional tem-se intensificado notavelmente, nomeadamente desde o
início da crise em 2007/2008. Adicionalmente, o ganho de influência alemã no âmbito da
União Europeia, durante a crise, e a dependência das instituições comunitárias dos países
especialmente afetados pela mesma têm resultado no alinhamento dos governos destes
últimos com as perspetivas e propostas do governo alemão.
Neste contexto, no final de 2012, os ministros de alguns dos estados-membros da União
Europeia, responsáveis pelos programas de educação e formação, assinaram em Berlim um
memorando para a Cooperação em matéria de Educação Vocacional e Profissional na
Europa.78 O acordo, assinado pela Alemanha e por todos os países do Sul (Portugal, Espanha,
Grécia e Itália),79 visa potenciar a formação profissional como via para melhorar a inserção dos
jovens no mercado de trabalho, reduzir o desemprego jovem, melhorar o nível educativo em
geral e elevar a competitividade da economia europeia, entre outros.
Desde o início da crise, dos países do Sul, Espanha é o que mais tem avançado na dualização
do seu sistema de ensino profissional. Em 2012 foi lançada a formação profissional dual80 que
abrange o conjunto de ações e iniciativas de formação e de emprego-e-formação, destinadas a
melhorar a qualificação profissional dos trabalhadores num regime de alternância, no âmbito
do sistema de formação profissional para o emprego ou do sistema educativo espanhol.
Os progressos em Portugal têm sido mais modestos. Os avanços nesta matéria cingem-se
basicamente ao lançamento de uma oferta de cursos vocacionais de inspiração dual,
destinados essencialmente a alunos com problemas de desempenho escolar.81 Apesar destes
progressos, o nível de dualização do sistema de formação profissional português continua a ser
relativamente baixo.
Devido às especificidades institucionais e culturais dos países potencialmente recetores, a
transferência/replicação direta dos sistemas duais está condenada ao fracasso. Não obstante,
as vantagens dos sistemas profissionais que combinam formação na escola com formação em
78
Ver Anexo III.
Assinaram também o acordo a Letónia e a Eslováquia.
80
Real Decreto n.º 1529/2012.
81
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/2013, de 10 de julho, e
Portaria n.º 276/2013, de 23 de agosto.
79
73
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
contexto de trabalho são difíceis de refutar. Embora possam existir múltiplos argumentos para
justificar a necessidade de avançar na dualização do sistema de formação profissional em
Portugal, existem dois que, atendendo à realidade atual do país, se sobrepõem a todos os
outros:
-
A redução do atraso educativo;
-
A redução do desemprego jovem.
4.2. O argumento da redução do atraso educativo
Face à maioria dos estados membros da UE, Portugal apresenta um problema de atraso
educativo. Esse défice explica, em grande medida, o diferencial de produtividade da economia
portuguesa face a outras economias avançadas (CEDEFOP e REFERNET, 2012). Apesar dos
sucessivos governos, desde a entrada de Portugal na CEE, terem realizado um esforço enorme
em aproximar os níveis educativos do país dos padrões comunitários, o atraso neste domínio
continua a ser muito significativo, quer em relação aos países do Norte quer em relação aos
países do Sul, com os quais Portugal é comparado na maioria dos âmbitos.82
A Tabela 4.1 mostra os níveis de formação da população adulta [25-64 anos], para um
conjunto de países selecionado, de acordo com a Classificação Internacional Uniforme de
Educação – ISCED, versão 2011 (UIS, 2012).83 Não obstante os progressos referidos, em 2012,
63% da população adulta portuguesa tinha níveis de formação iguais ou inferiores ao ensino
secundário inferior (atualmente, 3º ciclo do ensino básico). Este dado contrasta fortemente
com os dos restantes países, inclusivamente com os da Grécia (32%) e a Espanha (46%). Estes
resultados estão muito afastados das médias da UE84 (23%) e da OCDE (24%).
Em 2012, a população portuguesa com ensino secundário superior ficava-se pelos 19%, uma
percentagem muito superior aos 10,5% de 2000 e aos 14% de 2006. Apesar dos enormes
progressos realizados desde 1986, a distância face aos países com sistemas de formação
profissional dual de nível secundário continua a ser muito significativa. A população com
ensino secundário superior na Alemanha e na Áustria representa à volta de 50% do total,
82
Os países utilizados nas comparações internacionais, neste capítulo, são os três da UE com sistemas
de formação profissional dual mais desenvolvidos, Alemanha, Áustria e Dinamarca, e os três países do
Sul da UE com maiores problemas de desemprego jovem, Espanha, Grécia e Portugal. Em certos casos
para evidenciar as grandes diferenças existentes e para facilitar a leitura dos dados, as figuras
apresentam comparativas diretas entre Alemanha e Portugal.
83
International Standard Classification of Education. A ISCED-2011 é a segunda atualização de
importância.
84
UE-21.
74
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
enquanto na Dinamarca ultrapassa os 40%. O diferencial face aos outros países do Sul é
menor, especialmente em relação a Espanha (4 p.p.), mas o gap em relação às médias da UE85
(48%) e da OCDE (44%) ultrapassa os 25 p.p.
Tabela 4.1 – Nível de formação da população adulta [25-64 anos] (%), 2012
País
A
Ensino Secundário
Ensino PréSuperior
Ensino
primário e
Secundário ISCED 3C
Ensino
Inferior
(programas ISCED 3A
Primário
longos/3B)
3
10
47
3
Educação Terciária
Ensino PósSecundário
não Terciário
Tipo B
Tipo A
8
11
16
1
Outros
AT
(1)
16
47
6
10
7
13
1
D
1
20
37
6
-
6
28
2
E
17
29
9
14
-
10
22
1
G
21
11
7
27
8
9
17
0
P
42
21
(2)
19
-
(3)
16
2
Notas: (1) Juntamente com o Ensino Secundário Inferior; (2) Juntamente com o Ensino Secundário Geral (ISCED 3A);
(3) Juntamente com o Ensino Terciário Tipo A.
Fonte: OCDE (2014).
No domínio do ensino superior, os diferenciais não são tão profundos graças aos grandes
progressos dos últimos 25 anos.86 Em 2012, 16% da população adulta portuguesa possuía um
diploma do ensino superior, face aos 10,5% do 2000 e aos 14% do 2006. Neste caso não há um
padrão Norte/Centro-Sul tão evidente como nos outros níveis de educação. Em relação a
Portugal, a proporção da população com ensino superior é (pelo menos) o dobro na Dinamarca
e na Espanha, que se situam aproximadamente na média da OCDE (33%), e (mais) de uma vez
e meia na Alemanha e na Grécia, que se situam ligeiramente abaixo da média da UE87 (29%).
Portugal está relativamente próximo da Áustria, onde um quinto da população adulta concluiu
algum programa de educação superior.
O menor diferencial português neste nível educativo está relacionado com um conjunto de
fatores, que enviesam as escolhas dos jovens em favor deste tipo de formação face a outras de
natureza mais profissionalizante. Esta avidez pelo ensino superior em Portugal explica o
progressivo crescimento da taxa de graduação terciária88 na última década, entre os menores
85
UE-21.
Terciário Tipo A e Tipo B.
87
UE-21.
88
Graduados em cursos superiores (ISCED 5-6) por cada 1.000 jovens com idades compreendidas entre
os 20 e os 29 anos.
86
75
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
de 30 anos. Em 2012, Portugal apresentava a segunda taxa mais alta (77,3%), entre os países
da amostra, sendo somente superado pela Dinamarca (Figura 4.1.) Entre 2004 e 2012, a taxa
de graduação terciária aumentou mais de 33 p.p. em Portugal, um incremento apenas
ultrapassado pelo da Áustria, com 34 p.p., embora este país partisse de uma base bastante
mais baixa.
Figura 4.1 – Taxa de graduação terciária (ISCED 5-6) (%), 2004-2012
88,4%
90%
79,8%
80%
70%
70,4%
64,1%
61,3%
55,7%
60%
50%
40,5%
40%
77,4%
71,3%
33,4%
41,2%
44,0%
44,8%
30,1%
48,6%
43,1%
44,0%
29,3%
30%
20%
10%
0%
Alemanha
Áustria
Dinamarca
2004
2008
Espanha
Grécia
Portugal
2012
Nota: Graduados totais (ISCED 5-6) por cada 1000 jovens com idades compreendidas entre os 20 e os 29 anos.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
O aumento da população com ensino superior, especialmente da mais jovem, está a colocar
problemas de inserção profissional nos países do Sul, onde as taxas de desemprego têm
crescido de forma acentuada a par do aumento no número de titulados (Figura 4.2). É evidente
que uma parte significativa do elevado desemprego é explicado pela crise económica, em
geral, e pelo défice de crescimento, em particular. Mas também é certo que, em alguns casos,
esse desemprego tem a sua origem num desajustamento, cada vez mais estrutural, entre os
conhecimentos, competências e habilidades próprios desses programas e as necessidades dos
mercados de trabalho nacionais.
76
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 4.2 – Taxa de desemprego dos trabalhadores com educação
terciária, por grupo etário (%), 2012
30,0%
30%
25%
19,8%
20%
17,1%
17,0%
14,0%
15%
10,5%
10%
5%
7,7%
4,7%
2,4% 2,8%
2,1%2,7%
Alemanha
Áustria
0%
Dinamarca
25-64
Espanha
Grécia
Portugal
25-34
Fonte: OCDE (2014).
No início da década de 2000, as taxas de desemprego dos trabalhadores com ensino superior
eram muito similares em Portugal e nos países do Norte/Centro da Europa, que integram a
amostra. Não obstante, enquanto o desemprego dos graduados superiores desses países tem
permanecido relativamente estável desde essa altura, em Portugal não tem parado de
aumentar desde então (Figura 4.3). O crescimento do desemprego entre esses trabalhadores,
em Portugal, afetou tanto os adultos mais novos [25-34 anos] como os adultos em geral [25-64
anos], cujas taxas de desemprego praticamente quadruplicaram em ambos os casos.
Apesar do intenso crescimento da população com ensino secundário e com ensino superior em
Portugal, derivada das políticas expansivas no sector da educação dos vários governos no
poder desde 1986, o certo é que, em termos comparativos, o país continua a revelar um
importante atraso educativo. O diferencial educativo é significativo em relação às médias da
OCDE e da UE, mas atinge contornos dramáticos quando a referência são países avançados de
primeira linha ou com sistemas educativos sólidos, tais como a Alemanha.
A Figura 4.4 apresenta os níveis de educação da população adulta [25 a 64 anos] – ensino
secundário superior e ensino superior – em Portugal e na Alemanha, por faixas etárias. No
77
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
ensino superior observam-se diferenças significativas nas faixas etárias de mais idade, embora
no agregado o diferencial não seja tão acentuado (19% - Portugal; 28% - Alemanha).
Figura 4.3 – Evolução da taxa de desemprego dos trabalhadores com
educação terciária em Portugal, por grupo etário (%), 2000-2012
17,1%
18%
16%
14%
12%
10,5%
9,4%
9,2%
10%
8%
4%
6,3%
5,4%
6%
4,3%
2,7%
2%
0%
2000
2005
2010
25-64
2012
25-34
Fonte: OCDE (2014).
Figura 4.4 – Adultos [25-64 anos] com pelo menos o ensino secundário superior e adultos
com ensino superior (terciário), por faixas etárias (%) – Alemanha e Portugal, 2012
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
≥ Sec.
Sup.
Terciário
25-34
≥ Sec.
Sup.
Terciário
35-44
≥ Sec.
Sup.
Terciário
45-54
Alemanha
78
Portugal
≥ Sec.
Sup.
Terciário
55-64
≥ Sec.
Sup.
Terciário
25-64
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Fonte: OCDE (2014).
No ensino secundário as diferenças são enormes, especialmente nas faixas de mais idade, mas
mesmo entre os adultos mais jovens [25 a 34 anos] o diferencial é de quase 30 p.p. (58% Portugal; 87% - Alemanha). Estes dados, para além de confirmarem o atraso educativo
português, evidenciam que o principal problema educativo do país é o défice de
população/trabalhadores com ensino secundário (superior).
Um problema relacionado com o anterior é a preponderância da via geral no ensino
secundário para prosseguimento de estudos, face a modalidades de caráter mais
profissionalizante. A consequência deste enviesamento é que a população adulta com ensino
secundário
em
consequentemente,
Portugal
níveis
concluiu
de
maioritariamente
qualificação
e
vias
gerais,
especialização
apresentando,
relativamente
baixos,
nomeadamente nas primeiras fases da sua vida laboral. Nos países do conjunto selecionado, a
importância das vias seguidas pelos adultos para a conclusão dos seus estudos secundários
superiores varia significativamente entre países.
Figura 4.5 – População com formação até a segunda etapa da Educação Secundária, (1)
segundo orientação: formação profissional ou formação geral (%), 2012
60%
58%
55%
50%
42%
40%
30%
27%
19%
20%
14%
15%
9%
10%
6%
3%
2%
0%
Alemanha
Áustria
Dinamarca
Secundário Profissional
Espanha
Grécia
Portugal
Secundário Geral
Notas: (1) Incluem-se estudos pós-secundários não terciários; (2) Os dados para Portugal são agregados. Não
existe informação desagregada sobre esta temática.
Fonte: OCDE (2014).
79
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Conforme se observa na Figura 4.5, em certos países do Norte/Centro da Europa, as vias
profissionalizantes são preponderantes, tendo sido as alternativas seguidas por mais de 90%
dos adultos com formação secundária. Nos países do Sul, aproximadamente dois terços da
população adulta concluiu os seus estudos secundários seguindo a via geral e os restantes as
vias profissionalizantes. Embora não exista informação desagregada para Portugal é provável
que a distribuição seja mais desfavorável que nos dois países do Sul da Europa da amostra
utilizada. Esta circunstância estaria explicada pelo desenvolvimento tardio do subsistema de
formação profissional e dos cursos profissionais no país e pelo modesto peso dos graduados
em vias profissionalizantes (inferior a 40%).
As principais causas do reduzido número de adultos com estudos secundários superiores,89 em
Portugal, são as seguintes:
A elevada taxa de abandono escolar precoce que afetou o país durante décadas
O abandono escolar precoce em Portugal constituiu um flagelo permanente para as
autoridades educativas durante décadas. Apesar dos enormes progressos efetuados nos
últimos anos nesta matéria, em grande parte graças a medidas como o incremento da
escolaridade obrigatória, em 2013 a taxa de abandono precoce (18,9%) era quase 60%
superior à da média comunitária90 (11,6%). Na Figura 4.6 podem verificar-se as grandes
diferenças neste indicador em relação à Alemanha, nas últimas duas décadas, bem como a
intensa redução do abandono precoce em Portugal no mesmo período.
O abandono escolar precoce repercute-se tanto no mercado de trabalho como na sociedade,
dado que os jovens que abandonam precocemente a escola, ao terem baixas qualificações,
depararão com dificuldades acrescidas no processo de inserção no mercado de trabalho.
Muitos destes jovens passam a integrar o grupo dos denominados nem-nem.91 A Figura 4.7
mostra a percentagem de jovens com idades entre os 19 e os 24 anos que nem trabalham nem
estudam nos países do conjunto selecionado. Mais uma vez, observa-se uma grande clivagem
entre os países do Norte/Centro e os do Sul, derivada, por um lado, das diferentes dinâmicas
dos seus mercados de trabalho e, por outro, dos diferentes graus de adequação e eficiência
dos seus sistemas educativos e de formação profissional.
89
Incluídos pós-secundários não terciários.
UE-28.
91
Nem estudam nem trabalham.
90
80
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 4.6 – Taxa de abandono escolar precoce (%) – Alemanha e Portugal, 1997-2013
44,2%
45%
40,6%
38,3%
40%
35%
30,9%
30%
25%
18,9%
20%
15%
12,9%
13,5%
12,3%
11,1%
9,8%
10%
5%
0%
1997
2001
2005
Alemanha
2009
2013
Portugal
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
Figura 4.7 – População jovem [15-24 anos] que não estuda nem trabalha (NEET) (%), 2013
25%
20,4%
20%
18,6%
14,1%
15%
10%
6,3%
7,1%
6,0%
5%
0%
Alemanha
Áustria
Dinamarca
Espanha
Nota: NEET – Neither in employment nor in education and training.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
81
Grécia
Portugal
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
A presença marginal dos cursos de formação profissional no ensino público, após o 25 abril e
até a segunda metade da década de 2000
Como explicado no Capítulo 3, o subsistema de formação profissional português desenvolveuse em várias etapas e de forma relativamente hesitante. Este subsistema acolhia,92 no ano
académico 2002-2003, aproximadamente 55.000 alunos em cursos de nível secundário,
representativos de menos de 15% dos alunos desse nível de ensino. A grande expansão do
ensino profissional em Portugal não acontece até a generalização dos cursos de formação
profissional nas escolas secundárias públicas, no ano académico 2006-2007, tal como pode ser
verificado na Figura 4.8.
Figura 4.8 – Alunos matriculados em cursos de formação profissional em Portugal, 2003-2014
140 000
115 885
120 000
110 462
107 266
113 749
100 000
93 438
80 000
70 177
60 000
47 709
36 765
40 000
36 943
34 399
20 000
0
03-04
04-05
05-06
06-07
07-08
08-09
09-10
10-11
11-12
13-14
Fonte: DGEEC (2014).
A escassa atratividade dos cursos de formação profissional
Embora nos últimos anos esta circunstância tenha vindo a mudar, durante muito tempo os
cursos de formação profissional não eram suficientemente atrativos para os jovens, por
diferentes motivos:
-
Porque
durante
muitos
anos
estiveram
excessivamente
centrados
em
profissões/qualificações tradicionais. Não obstante, nos últimos anos, tem-se realizado
92
Incluindo os alunos das Escolas Profissionais e do Sistema de Aprendizagem.
82
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
um esforço significativo por abrir os cursos a novas áreas do sector dos serviços e dos
sectores das TIC e, inclusivamente, a sectores de grande interesse para os alunos
relacionados com o turismo, o desporto e o lazer;
-
Porque apesar de ser a via preferente para os jovens que procuram uma formação
eminentemente prática, estão excessivamente baseados na escola, tendo uma
componente pouco expressiva de formação em contexto de trabalho. Apesar do peso
relativo desta componente ter sido reforçado nos últimos anos, nos cursos
profissionais continua a representar menos de 15% da carga horária total;
-
Pelo estigma social associado à formação profissional em Portugal, muito ligado às
representações sociais das profissões. As profissões manuais e técnicas de caráter
intermédio têm em Portugal, como em outros países, um reconhecimento social
bastante inferior ao das profissões às que se acede por intermédio de um diploma do
ensino superior. Os atuais problemas de empregabilidade dos titulados superiores e o
sucesso de algumas iniciativas no domínio da formação profissional estão a contribuir
para a alteração desses valores e representações sociais. Contudo, o seu enraizamento
social continuará a dificultar essas mudanças em horizontes temporais de curto e
médio prazo.
O elevado retorno da educação superior em Portugal
O prémio salarial dos detentores de um diploma de educação superior face aos que apenas
completaram ciclos educativos secundários promove a via de prosseguimento de estudos face
às vias profissionalizantes. O prémio remuneratório associado à educação superior tem sido
historicamente elevado em Portugal, contudo, tem vindo a reduzir-se desde 1995, como
consequência da grande expansão do ensino superior e o correspondente aumento da oferta
de licenciados (Sá et al, 2015).
De acordo com a OCDE, em Portugal o retorno salarial dos trabalhadores adultos [25-64 anos]
com ensino superior era, em 2012, 70%93 superior ao dos trabalhadores com ensino
secundário superior (Figura 4.9). O prémio salarial (superior-secundário) para os adultos é
similar ao observado na Alemanha (74%) ou na Áustria (71%), mas bastante superior aos dos
93
Estudos recentes para Portugal, tal como o de Sá et al. (2015), obtêm um retorno remuneratório
menor. De acordo com as estimações realizadas nesse estudo, com base em dados por trabalhador do
ano de 2009, o prémio remuneratório dos trabalhadores licenciados era de 49% face àqueles que
apenas concluíram o ensino secundário superior e de 113% face aos que somente concluíram o segundo
ciclo do ensino básico.
83
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
outros países da amostra selecionada: Grécia (52%), Espanha (41%) e Dinamarca (28%). No
caso dos adultos jovens [25-34 anos], o retorno da educação superior é maior em Portugal, em
termos relativos. Concretamente, nessa faixa etária, a remuneração de um trabalhador com
ensino superior é 56% superior à de um trabalhador com ensino secundário superior, sendo o
diferencial muito mais elevado que nos restantes países considerados, nos quais se situa entre
os 12 e os 48%.
Figura 4.9 – Remunerações relativas dos trabalhadores com estudos
superiores, por faixas etárias, 2012 (1)
200
180
160
174
171
170
141
138
140
156
152
148
128
127
127
112
120
100
80
60
40
20
0
Alemanha
Áustria
Dinamarca
25-64
Espanha
Grécia
Portugal
25-34
Nota: (1) Educação secundária superior = 100.
Fonte: OCDE (2014).
Os baixos salários dos técnicos médios pagos pelas empresas portuguesas
A remuneração bruta dos trabalhadores portugueses em ocupações médias é bastante mais
baixa que a média europeia e muito mais baixa que em países como Alemanha. Na Figura 4.10
consta o fator que relaciona o nível de remuneração bruta dos trabalhadores portugueses e o
dos alemães, para vários tipos de ocupações, de acordo com a Classificação Internacional
Uniforme de Ocupações – ISCO, versão 08 (ILO, 2012).94
94
International Standard Classification of Occupations. A ISCO-08 é a quarta atualização.
84
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
O diferencial nas remunerações em ocupações médias (ISCO495, ISCO596 e ISCO797) é muito
superior (maior fator) ao das ocupações superiores (ISCO1,98 ISCO299 e ISCO3100) e
inclusivamente ao diferencial médio. No caso das ocupações manuais relacionadas com o
sector industrial, agrupadas na ISCO-7, as remunerações brutas dos trabalhadores portugueses
são um terço das dos trabalhadores alemães.
Figura 4.10 – Diferencial das remunerações brutas entre os trabalhadores
portugueses e os alemães, por tipo de ocupação, fator
3,50
3,00
3,00
2,50
2,81
2,48
2,32
2,00
1,76
1,88
1,89
ISCO-2
ISCO-3
1,50
1,00
0,50
0,00
ISCO-1
Média
ISCO-4
Superiores
ISCO-5
ISCO-7
Médios
Nota: Últimos dados disponíveis sobre remunerações brutas – 2008.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
4.3. O argumento da redução do desemprego jovem
Os problemas de inserção dos jovens no mercado de trabalho e as elevadas taxas de
desemprego que afetam as faixas mais jovens são um motivo de preocupação para os
governos nacionais de alguns estados membros, que olham com preocupação para níveis de
desemprego jovem superiores a 30% e, em alguns casos, superiores a 50%. Portugal não é
alheio a esta realidade. Embora o desemprego jovem não seja tão elevado como em Espanha
95
Pessoal de apoio administrativo.
Trabalhadores do sector serviços e vendedores e comerciais.
97
Oficiais, operários e artesãos de artes mecânicas e outros ofícios.
98
Diretores e gerentes.
99
Profissionais científicos e intelectuais.
100
Técnicos e profissionais de nível médio.
96
85
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
ou na Grécia, nos últimos anos tem-se verificado um crescimento sem precedentes, quer entre
os jovens com menores níveis de qualificação quer entre os que concluíram os seus estudos
superiores. O desemprego dos jovens licenciados é particularmente impactante, dado que em
2012, afetava mais de 17% dos ativos jovens enquanto na viragem do século afetava pouco
mais de 4% dos mesmos.
As causas do elevado desemprego jovem são variadas. Em primeiro lugar, a queda dos níveis
de atividade económica provocada pela crise económico-financeira do País e reforçada pelas
políticas de austeridade associadas ao programa de ajustamento imposto pela Troika de
credores internacionais entre 2011 e 2014.101 A escassa pulsão económica é um fator
transversal ao mercado de trabalho, que não distingue faixas etárias ou níveis de qualificação.
Em segundo lugar, a configuração institucional do mercado laboral português que resulta num
mercado de trabalho profundamente dualizado, onde os ajustamentos quantitativos e salariais
acabam por ser suportados pelos mais frágeis, nomeadamente pelos mais jovens. Esta
situação reflete-se num diferencial significativo nas taxas de desemprego jovem e de
desemprego adulto. Em 2014, esse diferencial atingiu em Portugal um fator de 2,8,
praticamente duplicando o diferencial alemão e ultrapassando o de todos os países incluídos
na amostra (Figura 4.11).
Em terceiro lugar, a organização do sistema de ensino português, em geral, e o perfil do
sistema de formação profissional, em particular. A formação profissional em Portugal tem tido
tradicionalmente um peso reduzido no ensino secundário. Adicionalmente, as vias de ensino
profissionalizante têm sido dominadas por modelos baseados na formação na escola face aos
modelos preponderantes noutras latitudes, baseados na formação em contexto de trabalho.
Esta configuração institucional poderá estar a condicionar a inserção dos jovens no mercado
de trabalho e, consequentemente, os níveis de desemprego jovem. A formação profissional
fornece competências e habilidades que preparam os jovens para a sua entrada no mercado
de trabalho e aumentam as suas probabilidades de sucesso profissional (Quintini e Martin,
2006).
Nos últimos anos, o peso dos graduados em programas de ensino secundário de orientação
profissional tem aumentado significativamente em Portugal, atingindo em 2012 uma
repartição muito similar à de Alemanha (Figura 4.12). No ano 2000 o peso dos graduados
nesses programas era inferior a 10% do total de graduados no ensino secundário.
101
Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu.
86
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura 4.11 – Diferencial nas taxas de desemprego jovem [15-24 anos] e
de desempego adulto [25-64 anos], fator, 2014
3,0
2,8
2,5
2,4
2,3
2,1
2,1
2,0
1,6
1,5
1,0
0,5
0,0
Alemanha
Áustria
Dinamarca
Espanha
Grécia
Portugal
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
Figura 4.12 – Graduados em programas de ensino secundário por
orientação, geral ou profissional (%), 2012
90%
76,8%
80%
68,2%
70%
60%
50%
57,5%
51,6%
51,2% 48,8%
48,4%
49,9% 50,1%
42,5%
40%
31,8%
30%
23,2%
20%
10%
0%
Alemanha
Áustria
Dinamarca
Geral
Espanha
Grécia
Portugal
Profissional
Nota: A repartição em Portugal, quando utilizados os dados do Ministério de Educação e Ciência diferem
consideravelmente.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
87
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Aparentemente tem havido progressos também no que concerne à incorporação nos
programas de componentes de formação em contexto de trabalho, muito embora em algumas
modalidades, nomeadamente na maioritária, os cursos profissionais, seja inferior a 15% da
carga horária total.102
Figura 4.13 – Taxa de desemprego jovem, por grupo etário e por nível educativo (%), 2013
80%
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
[0-2]
[3-4]
[5-8]
[0-2]
De 15 a 19 anos
Alemanha
Áustria
[3-4]
[5-8]
De 20 a 24 anos
Dinamarca
Espanha
Grécia
Portugal
Notas: (1) As taxas para os jovens de entre 15 e 19 anos com ensino superior (terciário) não são incluídas por falta
de reporte ou por falta de confiabilidade; (2) [0-2]: Menos que primária, primária e educação secundária inferior;
[3-4]: Educação secundária superior e educação pós-secundária não terciária; e, [5-8]: Educação terciária.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
Segundo a OIT (2013), a existência de sistemas de formação profissional dual desenvolvidos e
atrativos em países como a Áustria, a Dinamarca, a Alemanha ou a Suíça contribuem para a
diminuição do desemprego jovem e fornecem à população mais nova as habilidades e
competências que o mercado de trabalho procura. Na Figura 4.13 apresenta-se as taxas de
desemprego nas faixas etárias mais jovens (15-19 anos e 20 a 24 anos), segundo o seu nível
educativo, para a amostra de países utilizada para fins comparativos. No lado esquerdo da
102
Nos cursos do sistema de aprendizagem o peso da carga horária da formação em contexto de
trabalho é mais elevada, não podendo ser inferior a 40% da carga horária total.
88
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Figura, observa-se que, entre os jovens de 20 a 24 anos,103 nos países com sistemas duais
desenvolvidos, a taxa de desemprego tende a diminuir à medida que aumenta o nível de
formação, num contexto de reduzidas taxas de desemprego. Em Espanha observa-se um
padrão similar, embora as taxas de desemprego se situem num intervalo de 43% (níveis 5 a 8)
a 58% (níveis 0 a 2).
Em Portugal, o padrão é bastante diferente, dado que são os jovens com ensino superior os
que apresentam uma maior taxa de desemprego (37,5%), seguidos dos que têm níveis de
formação inferiores ao secundário superior (36,5%). Os jovens com ensino secundário
completo são aos que se associa uma menor taxa de desemprego (32,6%), não sendo possível
antecipar as causas dessa circunstância. Ao não existir informação sobre a taxa de desemprego
por orientação do ensino secundário (geral ou profissional), também não se pode adiantar se
as vias profissionalizantes estão a garantir uma melhor inserção dos jovens no mercado de
trabalho.
Tabela 4.2 – Desemprego por níveis de formação da população adulta [25-64 anos] (%), 2012
País
A
Ensino Secundário
Ensino préSuperior
Ensino
primário e
Secundário ISCED 3B/3C
ensino
Inferior
(programas ISCED 3A
primário
longos)
16,7
11,8
5,5
7,0
Educação
Terciária
Ensino PósSecundário não
Tipo A e
Terciário
Tipo B
Programas
Investigação
3,7
2,0
2,6
AT
8,2
3,4
4,7
3,1
D
9,8
5,8
8,4
-
Total
5,2
2,6
3,7
5,1
4,6
6,2
E
35,8
29,3
22,8
21,5
-
17,6
12,5
22,8
G
24,9
26,0
25,9
23,0
26,9
21,1
15,1
22,4
P
16,1
15,8
14,2
24,4
10,5
14,5
Fonte: OECD (2014).
Para além de melhorar a inserção profissional dos mais jovens, estes programas duais de
formação profissional de nível secundário garantem boas oportunidades de emprego ao longo
da vida para os adultos com este tipo de formações (ISCED 3B e 3C – Programas longos), os
quais enfrentam taxas de desemprego mais baixas que aqueles que concluíram programas
gerais de educação secundária (ISCED 3A). Na Tabela 4.2 apresentam-se as taxas de
desemprego da população adulta [25-64 anos], em função dos níveis de formação no conjunto
103
As análises nesta faixa etária estão menos sujeitas a enviesamentos do que na faixa etária dos 15 aos
19 anos, onde determinadas políticas educativas ou de emprego ou a forma de registo estatístico
podem introduzir heterogeneidade nos dados reportados.
89
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
de países selecionados. Na Alemanha, Áustria e Dinamarca os adultos com educação
secundária profissionalizante apresentam taxas de desemprego mais baixas do que os que
optaram pela via geral. Nos países do Sul para os que existem dados, a realidade é inversa,
mas os diferenciais das taxas de desemprego são pouco significativos.
As escassas oportunidades de emprego em Portugal para os mais jovens e os baixos salários à
entrada oferecidos pelos empregadores têm incentivado a emigração dos mais jovens,
designadamente para outros países da UE. A escassez de oportunidades de emprego para os
trabalhadores jovens deriva da escassa dinâmica do mercado de trabalho e das dificuldades na
transição para o mercado de trabalho.
Figura 4.14 – Taxa de desemprego jovem, por grupo etário e por nível
educativo (%) – Alemanha e Portugal, 2013
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
[0-2]
[3-4]
[5-8]
[0-2]
Alemanha
De 15 a 19 anos
[3-4]
[5-8]
Portugal
De 20 a 24 anos
De 25 a 29 anos
De 30 a 34 anos
Notas: (1) As taxas para os jovens de entre 15 e 19 anos com ensino superior (terciário) não são incluídas por falta
de reporte ou por falta de confiabilidade; (2) [0-2]: Menos que primária, primária e educação secundária inferior;
[3-4]: Educação secundária superior e educação pós-secundária não terciária; e, [5-8]: Educação terciária.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
Os jovens portugueses encontram grandes dificuldades para aceder a um posto de trabalho
depois de concluir a sua etapa formativa. Estas dificuldades podem ser inferidas através do
ritmo de redução das taxas de desemprego entre as várias faixas etárias. Em Portugal, as taxas
de desemprego para cada nível de formação reduzem-se significativamente inter-faixas, do
qual se pode inferir que a facilidade de inserção no mercado vai aumentando com a idade e,
90
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
simultaneamente, com a experiência laboral (Figura 4.14).104 Note-se que a queda do
desemprego é mais abrupta nos jovens com níveis de formação 3 e 4, ou seja, nos jovens que
ocupam postos de trabalho onde uma parte das habilidades é adquirida no posto de trabalho.
Na Alemanha a transição é muito mais suave. As taxas de desemprego entre as várias faixas
etárias seguem um padrão decrescente, embora muito menos intenso que no caso português.
Os baixos salários à entrada são outra das causas da procura de alternativas laborais noutros
países. A economia portuguesa é uma economia de baixos salários. No contexto Europeu,
Portugal é dos países com maiores assimetrias salariais, não obstante, nos últimos anos, têm
vindo a esbater-se como consequência dos sucessivos aumentos do salário mínimo nacional.
As várias crises dos últimos anos impulsionaram o número de trabalhadores que recebem o
ordenado mínimo no país. Em 2005, aproximadamente 5% dos trabalhadores recebiam o
salário mínimo, enquanto que em 2014, ano de conclusão do Programa de Assistência
Económica e Financeira (PAEF), os trabalhadores nessas circunstâncias aumentaram para
12,9%. Isto é, mais de 465.000 trabalhadores auferiam um ordenado de €505 mensais. Sendo
o ordenado mínimo atualmente o salário de acesso a um número significativo de empregos no
país e sendo os jovens o principal segmento de trabalhadores à procura de emprego é de
esperar que os que conseguem aceder a um posto de trabalho aufiram o salário mínimo ou um
ligeiramente superior.
4.4. A transferência do sistema dual alemão: interesse e dificuldades
Como referido na introdução, a transferência/replicação dos sistemas duais é um assunto que
tem sido amplamente debatido em diversos âmbitos sociais. Na esfera académica as
preocupações em torno da transferência têm-se centrado na determinação dos aspetos a
acautelar nesses processos. Segundo Solga et al (2014), a replicação do sistema dual em países
terceiros não é fácil, nomeadamente porque os seus quadros institucionais e normativos,
tanto do sistema educativo como do mercado de trabalho, são consequência da história e dos
valores sociais próprios de cada um. Embora não seja possível “copiar” diretamente o sistema
existem um conjunto de recomendações que devem ser tidas em consideração na hora de
dualizar um sistema de formação profissional, nomeadamente (Solga et al, 2014):
-
A existência de vínculos intensos entre as escolas e as empresas e entre os jovens e as
empresas;
104
A figura apesenta dados de 2013. Os resultados para um outro período qualquer, por exemplo, para
o ano de 2007 (ano imediatamente anterior ao início da crise), apresentam um padrão muito similar.
91
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
A certificação e a existência de certo grau de estandardização da formação em
contexto de trabalho;
-
A criação de vínculos institucionais entre o sistema educativo e o mercado de trabalho,
que deve envolver tanto as empresas como aos sindicatos ou outros parceiros sociais
que possam ter um papel com valor acrescentado no sistema;
-
A estandardização dos programas tanto na componente de formação escolar como na
componente de formação em contexto de trabalho pode ser uma estratégia para
consolidar os sistemas duais ou dualizados.
Eichhorst et al (2012) refere também a dificuldade para transferir o sistema nos moldes em
que funciona na Alemanha ou em países como a Áustria ou Dinamarca. Essa dificuldade deriva
da impossibilidade de replicar os alicerces do sistema, nomeadamente a intensa cooperação
entre o Estado, as empresas e os parceiros sociais, a preocupação com a certificação de
competências, o desenvolvimento dos programas e o seu ajustamento ou o financiamento
público-privado do sistema. Para além destes aspetos, as questões sociais, designadamente o
grau de aceitação do sistema, são um entrave à sua importação a âmbitos com valores sociais
diferentes ou muito diferentes.
Para além dos académicos, existem várias instituições que têm promovido iniciativas para
compreender
o
processo
de
transferência
e
melhorar
os
resultados
da
sua
replicação/adaptação. De todas elas, a mais completa é a da Fundação Bertelsmann,105 que
financiou recentemente um estudo que inclui um modelo para apoiar a transferência
modificada do sistema dual alemão a outros países (Euler, 2013). De acordo com o modelo,
existem onze aspetos que devem ser tidos em consideração para a transferência modificada
do sistema. Na nossa interpretação esses aspetos podem ser organizados nos seguintes
termos:
-
Finalidade com a que se implementa o sistema – no sistema dual alemão (SDA) a
finalidade é ampla. A formação profissional é entendida como um meio para alcançar
objetivos económicos (garantir a eficiência económica e social), sociais (evitar a
exclusão social) e individuais (melhorar o potencial do aluno);
-
Capacidades a adquirir pelo aluno – no SDA o aluno adquire capacidades profissionais,
que aliam competências técnicas, humanas e sociais;
105
Bertelsmann Sriftung.
92
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
Métodos de aprendizagem – no SDA o princípio dual pressupõe a aprendizagem com
duas componentes, escolar e em contexto de trabalho;
-
Partenariado social – no SDA a formação profissional é uma responsabilidade
partilhada entre agentes públicos e privados;
-
Financiamento – no SDA o financiamento é público-privado; exige uma contribuição
significativa das empresas ao sistema que acabam por recuperar, parcialmente, via
retorno dos aprendizes ou redução dos custos de recrutamento, seleção e socialização;
-
Complementaridades
com
outras
ofertas
educativas
–
no
SDA
existem
complementaridades, mas o nível de permeabilidade é relativamente reduzido;
-
Codificação de standards de qualidade – no SDA estes referenciais são, em geral,
elevados, de forma a garantir a transparência e a confiabilidade do sistema para os
participantes;
-
Qualificação do pessoal docente e dos formadores – no SDA dá-se muita importância
ao acesso e atualização dos responsáveis por transmitir conhecimentos aos alunos;
-
Equilíbrio entre normalização e flexibilização – no SDA este equilíbrio permite a
participação de empresas de pequena dimensão no sistema sem que existam grandes
riscos de perda de qualidade na formação;
-
Bases fundamentadas para as decisões e a configuração – no SDA existe uma entidade
de apoio ao sistema que realiza atividades de planeamento e investigação;
-
Aceitação social da formação – a aceitação social do SDA é relativamente elevada,
embora existam
diferenças assinaláveis entre programas, em
termos de
reconhecimento.
A ideia subjacente à abordagem proposta em Euler (2013) é que antes de iniciar uma
transferência modificada do sistema devem ser observadas essas onze dimensões e verificar a
distância existente entre a situação atual do sistema recetor e o referencial do SDA, assim
como as possibilidades reais de aproximação ao referencial. As possibilidades de insucesso da
importação do sistema aumentam à medida que a distância aumenta ou que as possibilidades
de aproximação diminuem. Do nosso ponto de vista, o modelo proposto em Euler (2013) é
excessivamente vago e, sobretudo, bastante incompleto, dado que embora alerte para a
necessidade de acautelar as dimensões institucionais e culturais com impacto na transferência
do sistema, praticamente obvia as de caráter económico e sectorial.
93
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
A transferência do sistema dual de formação profissional, integral ou modificada, para
realidades institucionais e culturais diferentes é, em grande medida, uma impossibilidade. Até
agora as tentativas de transferência têm sido mal sucedidas ou quando bem-sucedidas têm
tido um alcance bastante modesto. No caso de reconhecer o potencial do sistema dual de
inspiração alemã para melhorar a inserção dos jovens no mercado de trabalho e elevar o nível
de educação em geral, afigura-se mais exequível e com maior probabilidade de sucesso
promover a dualização dos sistemas de formação profissional locais, assumindo princípios e
práticas do sistema alemão.
A eventual dualização do sistema de formação profissional em Portugal enfrentaria, tal como
noutras realidades, problemas institucionais e culturais. Os primeiros associam-se à existência
de importantes diferenças nos sistemas educativos e de formação profissional de ambos os
países,106 e, os segundos, tanto à grande diferença de perceções sociais sobre este tipo de
programas, como à dificuldade existente em Portugal para alcançar acordos políticos e sociais
abrangentes e duradouros, que mobilizem a sociedade em matérias estruturantes. Para além
destes entraves, é provável que o processo de dualização enfrente outras dificuldades
derivadas, quer das particularidades da estrutura económica do país, quer das características
de alguns dos seus sectores mais relevantes. Do ponto de vista económico-empresarial,
existem várias dimensões que devem ser tidas em consideração se se pretende avançar na
dualização do atual sistema, nomeadamente:
A composição sectorial da economia
A estrutura sectorial da economia pode ser um aspeto de grande importância para aferir o
grau de adequação do sistema de formação profissional dual, por tratar-se de um sistema que
utiliza abordagens e rotinas formativas muito orientadas para a assunção de competências e
habilidades no sector secundário.107 Portanto, este sistema poderá ter dificuldades de
transferência/adequação e, sobretudo, de generalização em países com estruturas produtivas
dominadas pelos sectores primário e terciário.
Embora Portugal não possa ser considerada atualmente uma economia industrial, o peso deste
sector na economia ainda é relativamente relevante. Contudo, existem diferenças
consideráveis no peso do sector industrial nas economias portuguesa e alemã, quer em termos
106
Para uma comparação dos sistemas educativos e de formação profissional na Alemanha e em
Portugal ver o esquema do Anexo IV.
107
Embora o peso dos programas no sector do comércio e dos serviços tenha vindo a aumentar nos
últimos anos.
94
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
de contribuição para o emprego total quer em termos de valor acrescentado (Figura 4.15). As
diferenças no emprego não são muito relevantes (menos de 3 p.p.), devido à maior
intensidade em fator trabalho da indústria portuguesa, mas as diferenças no valor
acrescentado são muito significativas (perto de 10 p.p.). Esta diferença na estrutura sectorial
pode ser um problema para dualizar o sistema de formação profissional português,
nomeadamente se não for possível adaptá-lo à realidade dos sectores não industriais da
economia, especialmente a determinados subsectores de caráter terciário.
Figura 4.15 – Composição sectorial da economia, emprego e valor acrescentado
bruto (%) – Alemanha e Portugal, 2012
80%
76,0%
73,7%
70%
65,1%
68,4%
60%
50%
40%
26,2%
30%
19,0%
20%
16,9%
16,3%
11,7%
10%
5,7% 6,9% 4,5% 4,9%
0,9% 2,2%
1,6%
0%
Emprego
VAB
Agricultura
Emprego
VAB
Emprego
Indústria
VAB
Construção
Alemanha
Emprego
VAB
Serviços
Portugal
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
A esta problemática acresce o facto de se verificar uma forte assimetria espacial na localização
da indústria, muito concentrada no Norte do país e em algumas cidades e clusters industriais,
não existindo uma distribuição relativamente homogénea no território. Deverá ser tido em
consideração ainda o facto de a maioria das empresas industriais portuguesas pertencer a
sectores tradicionais, com níveis de intensidade tecnológica relativamente baixos e outputs
industriais relativamente pouco complexos.
A estrutura empresarial – A dimensão das empresas
O tamanho das empresas pode ser um outro aspeto de grande relevância na hora de proceder
à dualização de um sistema de formação profissional. O sistema dual alemão assenta
95
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
essencialmente nas grandes empresas. Em 2012, as companhias com mais de 50 empregados
ofereceram mais de 55% dos contratos de aprendizagem. Se forem consideradas as vagas das
empresas de 10 a 49 empregados, a proporção ultrapassa 80% do total, dado que as
microempresas de 1 a 9 trabalhadores apenas acolhem 18,6% dos aprendizes do sistema.
Figura 4.16 – Dimensão empresarial, número de trabalhadores (%) –
Alemanha e Portugal, 2012
250 ou mais empregados
0,5%
0,1%
De 50 a 249 empregados
2,5%
0,6%
4,8%
1,4%
De 20 a 49 empregados
9,9%
De 10 a 19 empregados
2,7%
82,3%
De 0 a 9 empregados
95,2%
0%
10%
20%
30%
40%
Alemanha
50%
60%
70%
80%
90%
100%
Portugal
Nota: Todos os sectores não financeiros da economia.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
Entre Portugal e Alemanha existem diferenças significativas no que se refere ao tamanho das
empresas, medido com base no número de trabalhadores (Figura 4.16). Em Portugal, as
microempresas (1 a 9 trabalhadores) representam aproximadamente 95% do total das
empresas, enquanto na Alemanha constituem à volta de 82% do seu tecido empresarial. As
diferenças no peso das empresas de maior tamanho nas estruturas empresariais de ambas as
economias são muito significativas. Em cada umas das restantes categorias (pequenas, médias,
grandes e muito grandes) o peso das empresas alemãs quadruplica o peso das portuguesas
nos respetivos tecidos empresariais.
A estrutura empresarial na indústria evidencia, mais enfaticamente ainda, a atomização
relativa do tecido empresarial português (Figura 4.17). A diferença no peso das microempresas
é ainda maior no sector secundário que no total da economia, dado que se na estrutura
empresarial total o diferencial é de 13 p.p., na indústria é de 20 p.p., aproximadamente (62,1%
96
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
na Alemanha e 82,9% em Portugal). Adicionalmente, as empresas industriais grandes e muito
grandes representam mais de 10% do tecido industrial alemão, enquanto que em Portugal não
representam nem 3,5% das empresas industriais do país.
Figura 4.17 – Dimensão empresarial no sector industrial, número de
trabalhadores (%) – Alemanha e Portugal, 2012
2,0%
0,4%
250 ou mais empregados
De 50 a 249 empregados
8,1%
2,9%
De 20 a 49 empregados
7,8%
5,7%
De 10 a 19 empregados
20,0%
8,2%
62,1%
De 0 a 9 empregados
0%
10%
20%
30%
40%
Alemanha
50%
60%
70%
82,9%
80%
90%
100%
Portugal
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
A pequena dimensão das empresas em Portugal pode constituir um entrave para a dualização
do sistema de formação profissional, nomeadamente porque nas empresas de menor
dimensão torna-se mais difícil acompanhar com qualidade a formação de um jovem em
contexto de trabalho. Não obstante, em países com sistemas duais desenvolvidos existem
soluções para estes desafios, designadamente a constituição de consórcios de pequenas
empresas para fins formativos.
A atratividade dos sectores âncora
O nível de atratividade dos sectores âncora do sistema, isto é, aqueles onde for
preferentemente efetuada a formação em contexto de trabalho ou aqueles que acolham a
maioria dos graduados, é de grande importância para garantir o sucesso das modalidades
duais. Sendo os níveis salariais um dos principais fatores de atratividade para quem faz
escolhas educativas ou de inserção no mercado de trabalho, o sistema será atrativo se os
sectores em que se ancora apresentam níveis de remuneração apelativos.
97
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Se for assumido que o sector industrial é uma das principais âncoras dos sistemas duais, nesse
caso a transferência ou replicação enfrentará dificuldades quando esse sector resulte
escassamente atrativo do ponto de vista salarial.108 Na Alemanha, as remunerações do sector
industrial são extremamente atrativas. A remuneração bruta anual de um trabalhador
industrial alemão equivale a 90,6% da média das remunerações pagas no país. Os ordenados
no sector industrial alemão são apenas ultrapassados, entre os grandes sectores, pelo sector
financeiro e segurador e pelas atividades profissionais. Em Portugal, um trabalhador industrial
aufere apenas 76,8% da média, sendo dos grandes sectores da economia aquele que paga
ordenados mais baixos.109
Figura 4.18 – Diferencial das remunerações brutas entre os trabalhadores
portugueses e alemães, por sector de atividade, fator, 2011
Saude e trabalho social
2,33
Educação
1,76
Prof. e atividades científicas e técnicas
2,29
Imobiliário
1,98
Sector financeiro e seguros
1,64
Informação e comunicações
1,93
Hotelaria e serviços associados
1,77
Transporte e armazenamento
1,56
Comércio (grosso e retalho)
2,18
Serviços às empresas
2,22
Construção
2,38
Indústria
3,22
0,00
0,50
1,00
1,50
2,00
2,50
3,00
3,50
Nota: Dados de empresas com 10 ou mais trabalhadores.
Fonte: Cálculos Próprios a partir de EUROSTAT.
Para além de serem baixas a nível interno, as remunerações no sector industrial português são
também excecionalmente baixas se comparadas com as do sector industrial alemão. Na Figura
4.18 apresenta-se o fator que relaciona as remunerações dos trabalhadores industriais
portugueses e as dos alemães, para os grandes sectores da economia. O maior diferencial nas
remunerações verifica-se no sector industrial, onde as remunerações médias dos
108
Para além dos salários, podem existir outros fatores que restrinjam essa atratividade,
nomeadamente as condições gerais do trabalho.
109
Dados de EUROSTAT para o ano de 2010.
98
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
trabalhadores alemães mais que triplicam as dos trabalhadores portugueses. Pode observar-se
também que em sectores onde os níveis de formação são predominantemente mais elevados,
tais como o educativo ou o financeiro, o diferencial remuneratório entre ambos países é muito
menor.
A falta de atratividade do sector secundário em Portugal, nomeadamente de alguns
subsectores, bem como de outros sectores âncora para a operacionalização da dualização do
sistema de formação profissional, pode dificultar este processo. Contudo, estas complicações
poderão não ser tão relevantes como parecem à partida. Em primeiro lugar, porque o
incremento de produtividade, que pode derivar da maior qualificação dos trabalhadores (via
formação dual), pode induzir aumentos salariais que, por sua vez, incrementem a atratividade
desses sectores. Em segundo lugar, porque a dualização do sistema de formação profissional
em Portugal deverá ter em consideração a estrutura sectorial da economia portuguesa, não
podendo ficar confinado num conjunto restrito de sectores.
4.5. Os fatores de sucesso dos sistemas de formação profissional
Para garantir que o processo de dualização de um sistema de formação profissional qualquer
progride na direção certa convém conhecer os elementos centrais de um sistema modelo, que
combine as vantagens de vários sistemas e evite os seus inconvenientes.110 Embora na
realidade não exista esse sistema modelo, na literatura académica e técnica tem havido a
preocupação de sistematizar um conjunto de aspetos-chave, partilhados pelos sistemas com
melhores resultados, para orientar as opções políticas dos governos predispostos a reformar
os seus sistemas nacionais de formação profissional.
Segundo CEDEFOP (2012), o sucesso dos sistemas de formação profissional dependem das
ações que se elencam a seguir:
-
Assegurar a relevância do currículo, promovendo o envolvimento do Estado, das
empresas, dos parceiros sociais e das instituições de ensino no desenvolvimento e na
implementação dos programas; deve existir também uma definição clara das
responsabilidades de cada parte;
-
Manter um contacto estreito com o mercado de trabalho, criando instrumentos de
monitorização e feedback contínuo que permitam o reporte permanente das empresas
sobre aspetos estruturais e de funcionamento do sistema;
110
Como indicado no Capítulo 2, apesar das suas vantagens, o sistema dual alemão não está isento de
problemas.
99
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
Assegurar um ensino de alta qualidade, garantindo níveis de financiamento suficientes
que permitam dispor de material de apoio apropriado e de docentes com elevados
níveis de formação;
-
Incentivar as entidades formadoras e criar concorrência entre elas, através da
combinação adequada de financiamento público e privado, e garantir elevados níveis
de autonomia na tomada de decisões em matéria de recursos humanos docentes e
administrativos;
-
Manter um elevado nível na qualidade do estágio, promovendo o desenvolvimento de
um sistema descentralizado de acreditação e garantia da qualidade, assim como a
concorrência entre centros de formação (o financiamento deve ser função dos
resultados);
-
Limitar o risco de se estabelecer um percurso profissional sem saída; para esse efeito,
deve garantir-se a comparabilidade das competências e qualificações adquiridas na via
profissionalizante e na via geral, para assegurar elevados níveis de permeabilidade.
No contexto da UE, a Direção-Geral de Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão, após a análise
dos programas de formação profissional dos 27 estados-membros, concluiu que os principais
fatores de sucesso dos programas de formação deste tipo são os seguintes (DG-EASI, 2013):
-
A existência de um quadro institucional e regulamentar sólido e estável, que defina o
contexto e as condições de base no âmbito das quais serão implementados os
programas;
-
A participação ativa dos parceiros sociais, que promova o seu envolvimento no sistema
e o diálogo construtivo das empresas com os sindicatos e os representantes dos
trabalhadores;
-
Um forte envolvimento dos empregadores em várias dimensões do sistema,
nomeadamente na elaboração conjunta de programas, na oferta de estágios de
qualidade, no apoio ao aprendiz/estagiário, na garantia da qualidade e na criação de
esquemas de promoção;
-
Uma estreita parceria entre empregadores e instituições de ensino, com interação
bidirecional entre o sistema educativo e os empregadores, que assegure uma oferta
suficiente de estágios, quer em quantidade quer em qualidade;
-
Um financiamento suficiente para o desenvolvimento dos programas, com recurso a
diversas
fontes,
tais
como
fundos
100
comunitários
(incluindo
FSE),
fundos
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
nacionais/regionais, fundos constituídos por empresas, subsídios/incentivos para os
empregadores e recursos próprios das empresas;
-
Um forte alinhamento dos programas com as necessidades do mercado de trabalho
nacional, regional ou local. Os programas devem estar alinhados com as referências do
quadro de qualificações;
-
A existência de procedimentos sólidos de garantia de qualidade, administrados por um
único organismo externo ou em conjunto com os centros/escolas de formação teórica
e as entidades responsáveis pela formação prática;
-
A elevada qualidade na orientação, apoio e tutoria dos aprendizes/estagiários, tanto
na componente escolar como na componente de formação em contexto de trabalho,
por ser crítica para a conclusão dos programas e para a redução dos riscos de
abandono, bem como para a garantia da qualidade geral do sistema;
-
A garantia de um matching apropriado entre o aprendiz/estagiário e a instituição onde
irá desenvolver a formação em contexto de trabalho;
-
A adequada combinação da formação escolar com a experiência adquirida no local de
trabalho, permitindo ao aprendiz/estagiário obter qualificações baseadas em
conhecimentos teóricos e em competências e habilidades práticas;
-
A existência de um acordo de aprendizagem/estágio, que defina o rol e
responsabilidade de todas as partes envolvidas e especifique os direitos e as
obrigações dos aprendizes/estagiários;
-
A certificação dos conhecimentos, habilidades e competências adquiridos, tanto na
escola como no posto de trabalho. A certificação deve indicar, no mínimo, a duração e
o conteúdo da aprendizagem, as tarefas e atividades desenvolvidas, bem como os
conhecimentos, habilidades e competências adquiridos;
-
A existência de abordagens flexíveis, adaptadas às necessidades de jovens vulneráveis,
que permitam alterar os métodos pedagógicos, flexibilizar os currículos, individualizar
os percursos de aprendizagem, realizar parcerias, melhorar os mecanismos de
financiamento e adaptar os ambientes de formação em contexto de trabalho.
Para além destes fatores de sucesso para os sistemas de formação profissional em geral,
existem também catálogos de recomendações para o sucesso dos programas duais. Por
101
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
exemplo, van Breugel (2014) propõe um conjunto de recomendações para potenciar os
sistemas duais ou avançar no processo de dualização. Concretamente sugere que:
-
Os programas devem ter em consideração tanto as necessidades dos empregadores
(que mudam rapidamente) como as dos alunos;
-
A oferta deve incluir competências básicas e transferíveis para preparar os alunos para
diversos postos de trabalho ao longo do desenvolvimento da sua carreira;
-
Os professores devem ter um conhecimento atualizado dos sectores;
-
O local de trabalho deve ser utilizado como um lugar de aprendizagem preferente;
-
A informação sobre a relação entre aprendizagem e resultados deve ser
permanentemente atualizada;
-
Deve assegurar-se que a aprendizagem no posto de trabalho é de boa qualidade,
utilizando instrumentos de monitorização e controlo de qualidade;
-
Devem promover-se alianças entre governos, empregadores e sindicatos para
melhorar os vínculos entre a aprendizagem e o mundo do trabalho;
-
A aprendizagem no posto de trabalho deve ser complementada com alternativas, tais
como a disponibilidade de oficinas nas escolas, para o caso de não existirem vagas
suficientes ou para aquelas situações em que o posto de trabalho não se configura
como o local de aprendizagem mais adequado;
-
Devem conceber-se respostas para manter o número de vagas de aprendizagem no
local de trabalho, em períodos de recessão ou em períodos com maior procura de
formação profissional;
-
Deve melhorar-se o quadro legal para o período de aprendizagem, explicitando o
estatuto, os direitos e os deveres dos empregadores e dos aprendizes, para reduzir a
incerteza e os custos de transação;
-
Os programas de aprendizagem dual devem ser alargados a todos os sectores,
nomeadamente ao sector dos serviços, em áreas como a educação, a saúde ou os
cuidados infantis. Dado que estes sectores são geralmente preferidos por estudantes
do género feminino, esta abertura contribuirá para melhorar a participação feminina
no sistema de formação profissional;
102
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
Devem melhorar-se os processos de reconhecimento de certificações para aumentar o
seu valor no mercado de trabalho;
-
Devem aperfeiçoar-se os processos de divulgação dos bons resultados alcançados,
quer aos potenciais alunos e às suas famílias, quer à sociedade em geral, como forma
de promover a formação profissional dual como uma alternativa sólida ao ensino
superior.
103
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
104
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 5 – Experiências bem-sucedidas de base dual no sistema de
formação profissional em Portugal
105
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
5.1. Introdução
O desenvolvimento da formação profissional em Portugal é relativamente recente. Os
primeiros programas do sistema de aprendizagem têm pouco mais de trinta anos e os
primeiros cursos profissionais pouco mais de vinte e cinco.
A matriz portuguesa dos cursos de formação profissional assenta em programas baseados
fundamentalmente na escola. Os cursos de aprendizagem, atualmente minoritários, têm
programas de carater misto, nos quais é combinada formação escolar em centros de formação
com formação simulada e em contexto de trabalho, normalmente em empresas. A
componente em contexto escolar destes cursos, tutelados pelo IEFP, é muito superior à de
qualquer outra modalidade oferecida no sistema de formação profissional português. Por esse
motivo, os programas oferecidos neste âmbito são os que mais se aproximam dos do sistema
dual alemão.
Os cursos do sistema de aprendizagem têm sido muito criticados ao longo das últimas três
décadas. Muitas das críticas estão plenamente fundamentadas e é inquestionável que alguns
programas oferecidos não cumpriam/cumprem com os standards de qualidade que se
pressupõem no ensino secundário. Não obstante, existem experiências bem-sucedidas que
merecem ser destacadas, especialmente algumas surgidas nos últimos anos, ligadas a
entidades e empresas alemãs. No âmbito do sistema de aprendizagem existem ainda algumas
experiências promovidas por entidades e empresas portuguesas que, nos moldes em que
funcionam, poderiam servir como modelos para terceiros.
Para ilustrar o potencial duma eventual dualização do sistema de formação profissional em
Portugal apresentam-se os casos de três iniciativas que oferecem cursos profissionais de base
dual com elevados níveis de procura, bons níveis de aceitação social e altas taxas de
empregabilidade. A seguir constam os casos da ATEC – Academia de Formação, da DUAL
Qualificação e da Estrutura de Formação da Toyota Caetano Portugal.
106
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
5.2. Os estudos de caso
Estudo de caso 1 – EC1: A ATEC
EC1.1. Apresentação
A ATEC – Associação de Formação para a Indústria, também conhecida por Academia de
Formação, é uma associação sem fins lucrativos, constituída em dezembro de 2003, tendo
como promotores a Volkswagen Autoeuropa, a Siemens, a Bosch e a CCILA (Câmara de
Comércio e Industria Luso-Alemã).
A constituição da ATEC visou criar uma organização que contribuísse para o incremento da
qualificação dos profissionais e, consequentemente, da sua empregabilidade, contribuindo,
em simultâneo, para o aumento da produtividade do tecido empresarial.
Os vetores estratégicos de intervenção da ATEC centram-se essencialmente no
desenvolvimento e aperfeiçoamento de competências, através da formação e qualificação de
pessoas, utilizando formadores de elevada qualidade bem como métodos e equipamentos
avançados.
A ATEC tem a sua sede em Palmela, no Parque Industrial da Volkswagen Autoeuropa, e uma
delegação no Porto, nas instalações da Siemens, no Freixieiro. São também desenvolvidas
ações e cursos de formação em Aveiro, Braga, São João da Madeira, Sines e Viseu.
As áreas de atuação da ATEC são três, designadamente:
-
A formação de desempregados: destinada a jovens à procura do primeiro emprego ou
a adultos à procura do aperfeiçoamento, reconversão ou reciclagem (de
desempregados) à procura de novo emprego;
-
A formação contínua: destinada a ativos ao serviço das empresas promotoras;
-
A formação e consultoria para o mercado: trata-se de oferta formativa promovida pela
ATEC ou de formação específica requerida pelas empresas clientes da ATEC.
EC1.2. Evolução e conjuntura
A ATEC é uma parceira da Volkswagen Autoeuropa, a Siemens e a Bosch, com o objetivo de
colmatar as necessidades de qualificação específicas da indústria, especialmente dos clusters
eletrónico e automóvel.
107
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Apesar de em 2003 existir já em Portugal formação profissional, esta tinha um cariz
fundamentalmente teórico, muito afastado das necessidades reais do sector industrial, que
procurava essencialmente técnicos qualificados, com uma formação maioritariamente prática.
Por isso, surgiu a necessidade de criar um modelo de formação mais próximo das necessidades
do tecido industrial, isto é, um modelo que combinasse a vertente de formação teórica com a
vertente de formação prática.
A atividade da ATEC desde a sua fundação norteou-se por três princípios fundamentais: i) a
promoção de ações de formação baseadas no sistema dual alemão; ii) a transferência e
partilha de conhecimento; e, iii) a qualificação do mercado, especialmente dos clusters
automóvel e eletrónico.
Em 2003, a ATEC iniciou o desenvolvimento de cursos de formação dual (aprendizagem), em
parceria com o IEFP, através de um acordo de cooperação assinado em dezembro desse ano.
Esta parceria, assinada por 10 anos e renovada por mais 10 em 2013, tem permitido a criação,
abertura e funcionamento de novos cursos de formação para jovens e adultos à procura de
emprego.
No atual contexto de internacionalização e globalização, a competitividade empresarial
depende em grande medida da disponibilidade de técnicos qualificados. Por esse motivo, a
formação de base dual, originariamente criada para dar resposta às necessidades das
empresas promotoras da ATEC, é atualmente cada vez mais procurada pelas empresas
portuguesas do sector industrial.
A experiência dos promotores da ATEC e a aposta no desenvolvimento e aperfeiçoamento
permanente de competências, através da formação e qualificação de pessoas, orientada e
adaptada às necessidades do mercado, permitiram que a ATEC assuma hoje uma posição
cimeira em matéria de formação dual em Portugal.
EC1.3. A marca ATEC
A formação ministrada na ATEC é baseada no sistema dual alemão, cujo objetivo principal é
conjugar conhecimentos teóricos com as competências adquiridas no posto de trabalho
(learning-by-doing).
Os cursos oferecidos na ATEC possuem quatro componentes formativas: a sociocultural, a
científica e a tecnológica, todas desenvolvidas na ATEC, e a formação prática em contexto real
108
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
de trabalho (estágio), desenvolvido numa das empresas parceiras, na maioria PMEs, de
diversos sectores de atividade.
A academia conta atualmente com mais de 200 empresas parceiras, entre as quais se
destacam: a Volkswagen, a Autoeuropa, a Siemens, a Bosch, a Ikea, a Continental, a Toyota
Caetano Portugal, a Gamobar, a ZEISS e a Schmitt-SCHM Elevadores, entre outras.
A ATEC é associada de diversas entidades ligadas ao tecido empresarial nacional e regional,
tais como o FIAPAL – Fórum Industria Automóvel de Palmela, o CEIIA – Centro de Excelência
para a Inovação da Industria Automóvel, a APLOG – Associação Portuguesa de Logística, a
Associação MTM Portuguesa ou a Associação KNX, entre outras.
O reconhecimento da qualidade da formação ministrada na ATEC é confirmado pelas
diferentes certificações que lhe têm sido atribuídas por diversas entidades. Concretamente
está certificada pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT) e pela
Autoridade Nacional das Comunicações (ANACOM) e pela Agência Portuguesa do Ambiente
(APA). A ATEC é ainda CISCO Academy e Microsoft IT Academy.
EC1.4. A qualificação e formação profissional de jovens
Dado que o foco deste estudo é o nível secundário e pós-secundário não terciário, dos
diferentes serviços de formação oferecidos pela ATEC interessa analisar fundamentalmente a
formação profissional destinada a jovens.
Os cursos de formação profissional ATEC para jovens são os seguintes:
-
Cursos de aprendizagem: destinados a jovens com o 9º ano, com 3.675 horas de
formação e uma duração média de 2,5 anos. Dão equivalência ao 12º ano e
certificação profissional de nível 4;
-
Cursos de especialização tecnológica: destinados a jovens com o 12º ano, com 1.500
horas de formação e uma duração média de 1 ano. Conferem certificação profissional
de nível 5.
A listagem dos cursos oferecidos atualmente pela ATEC constam da Tabela EC1.1. Estes cursos
permitem o contacto dos formandos com o mundo do trabalho desde o início, preparam-nos
para a vida profissional, conferem certificação profissional e académica e têm uma elevada
taxa de empregabilidade (superior a 80%).
109
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela EC1.1 – Cursos de formação profissional ATEC para jovens
Cursos de Aprendizagem
(9º ano)
Cursos de Especialização Tecnológica
(12ºano)
Manutenção Industrial de Metalurgia e
Metalomecânica (Palmela, Porto)
Gestão de Redes e Sistemas Informáticos (Palmela,
Porto)
Mecatrónica Automóvel (Palmela, Porto)
Tecnologias e Programação de Sistemas de
Informação (Palmela, Porto)
Eletrónica, Automação e Comando (Palmela)
Telecomunicações e Redes (Palmela, Porto)
Eletrónica e Telecomunicações (Palmela)
Automação, Robótica e Controlo Industrial (Aveiro,
Braga, Palmela, Porto, São João da Madeira)
Informática-Instalação e Gestão de Redes
(Palmela)
Tecnologia Mecatrónica (Palmela, Porto, Sines,
Viseu)
Mecatrónica (Palmela, Porto)
Mecatrónica Automóvel, Planeamento e Controlo de
Processos (Palmela, Porto)
Maquinação e Programação CNC (Palmela)
Soldadura (Palmela, Porto)
Fonte: ATEC.
Para as empresas, estes cursos têm uma boa relação custo-benefício, permitem-lhes dispor de
mão-de-obra especializada à medida, são uma fonte de recrutamento de pessoal qualificado,
garantem a identificação dos formandos com a cultura empresarial e permitem a gestão dos
conhecimentos da empresa mediante a transferência de conhecimento entre os colaboradores
efetivos e os formandos.
Critérios de seleção dos alunos: Os jovens interessados em frequentar os cursos de
aprendizagem devem possuir o 9º ano de escolaridade completo. Os candidatos aos cursos de
especialização tecnológica devem possuir o 12º completo. O processo de seleção integra
testes psicotécnicos, uma prova de grupo e uma entrevista individual. Para todas as
modalidades de formação, o processo de seleção organiza-se em fases eliminatórias. Os
candidatos aos cursos CET têm que estar obrigatoriamente inscritos no centro de emprego da
área de residência como desempregados.
Forma de vinculação: Todos os formandos celebram um contrato de formação com a ATEC. Os
estágios nas empresas são formalizados através de um protocolo com a ATEC.
Papel dos tutores/formadores: Os tutores são responsáveis por acolher os formandos, por
planear as suas atividades na empresa e por acompanhar e avaliar o seu desempenho. Os
110
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
tutores são ainda responsáveis por manter a articulação com a ATEC para o tratamento de
todos os assuntos relativos à formação dos estagiários na empresa.
Recrutamento dos formandos pelas empresas participantes: Embora as empresas não
estejam obrigadas a recrutar os formandos no final dos estágios, constata-se que muitos deles
são recrutados pelas empresas onde estagiaram. Em geral, existe uma estreita colaboração
entre as empresas e a ATEC para facilitar e melhorar os processos de recrutamento.
EC1.5. Perspetivas futuras para a ATEC
As prioridades da ATEC, no médio e no longo prazo, são as seguintes: i) a intensificação da
formação para o mercado; ii) a expansão da sua atividade no território português, a fim de
responder às necessidades das empresas instaladas em diferentes pontos do país; iii) a
internacionalização da sua atividade, especialmente em mercados como Angola e
Moçambique, dadas as oportunidades de negócio e a proximidade linguística; e, iv) o aumento
do envolvimento da sociedade, mediante a incorporação no Conselho Consultivo da ATEC de
mais membros e/ou entidades, em representação da indústria, da economia e da comunidade
académica.
111
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Estudo de caso 2 – EC2: A DUAL
EC2.1. Apresentação
A Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã (CCILA), fundada em 1954, é uma associação de
empresas sem fins lucrativos e de utilidade pública com mais de 1.000 empresas associadas. A
procura de profissionais qualificados, ao nível de quadros médios, e a inexistência à data da
sua criação de ensino profissionalizante em Portugal levaram a que em 1983 fosse fundado o
serviço de qualificação profissional da CCILA, por iniciativa de doze prestigiadas empresas
multinacionais alemãs: AEG, Robert Bosch, Hoechst, Siemens, Bayer, Henkel, Grundig,
Mercedes-Benz, Thyssenkrup, Groz-Beckert, Basf e Rauschert. Em 2007, esse serviço passou a
designar-se DUAL, sendo atualmente uma marca registada. A DUAL tem centros em Lisboa,
Porto e Portimão.
A DUAL apresenta diferentes serviços na área da formação profissional, designadamente:111
-
Qualificação Inicial DUAL: destinada a jovens que pretendam preparar-se para uma
vida profissional futura e a empresas interessadas em acolher jovens formandos;
-
Qualificação Contínua DUAL: destinada a profissionais que pretendam adquirir novas
competências ou atualizar e desenvolver as já adquiridas;
-
Qualificação Intraempresa DUAL: destinada a empresas que pretendam programas de
qualificação personalizados e ajustados à sua realidade e necessidades;
-
Consultoria e Qualificação: destinada a empresas, da indústria ou dos serviços, que
pretendam reduzir e otimizar custos de produção;
-
Serviços às Empresas na área de Consultoria e Recursos Humanos.
A formação profissional realizada pela DUAL baseia-se na filosofia dos sistemas de inspiração
dual. Nos programas oferecidos, as componentes de formação teórica são ministradas nos
seus Centros em Lisboa, Porto e Portimão enquanto a formação prática é da responsabilidade
das suas empresas parceiras.
EC2.2. Evolução e conjuntura
A exportação do sistema dual de formação profissional alemão para outros países está
motivada pela procura de trabalhadores qualificados por parte das empresas alemãs com
111
A DUAL refere-se sistematicamente às suas atividades de formação como qualificação profissional e
não como formação profissional.
112
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
atividade no estrangeiro. Esta circunstância fez com que a formação dual passasse a ser
estratégica para a Organização das Câmaras de Comércio e Indústria Alemãs (DIHK-IHK-AHK),
que, neste domínio, se tem focado no aconselhamento em matéria de políticas para a
introdução de modelos de formação profissional dual.
Neste contexto, as 80 Câmaras de Comércio e Indústria Regionais na Alemanha (IHKs) e as
Câmaras de Comércio e Indústria no estrangeiro (AHKs), presentes em 120 cidades de 85
países, bem como a Confederação das Câmaras de Comércio e Indústria (DIHK), enquanto
tutela das IHKs e das AHKs, são interlocutores-chave em matéria de formação profissional de
inspiração dual, de apoio às empresas alemãs com atividade no exterior.
Para a Organização Cameral Alemã é de extrema importância que as câmaras no estrangeiro
possam disponibilizar às empresas associadas, sobretudo para as empresas alemãs, uma oferta
uniformizada de serviços de formação com um elevado grau de reconhecimento. Para este
efeito, os diferentes serviços de formação devem enquadrar-se e respeitar os princípios do
sistema alemão de formação profissional. A atividade da CCILA neste domínio enquadra-se na
filosofia de atuação das Câmaras de Comércio e Indústria alemãs no estrangeiro, tendo-se
pautado pelos princípios de inspiração dual.
EC2.3. A marca DUAL
Na formação ministrada pela DUAL devem ser respeitados vários princípios inspirados na
formação dual alemã, designadamente:
-
As empresas formadoras, as escolas de formação, os curricula, os exames e a sua
realização devem respeitar determinadas normas de qualidade;
-
Os formadores teóricos e práticos e os examinadores devem cumprir um conjunto de
normas;
-
Os professores, formadores e examinadores devem ter qualificação metodológica e
didática “dual”;
-
Quem ensina, não examina;
-
Dois terços do tempo de formação deve estar orientado para a prática na empresa;
-
A IHK/AHK organiza a formação e garante procedimentos independentes, neutros e
com garantia de qualidade. Para esse efeito, as câmaras constituem comissões de
formação profissional e avaliação.
113
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
EC2.4. A qualificação inicial DUAL
Dado que o foco do estudo deste trabalho é o nível secundário e pós-secundário não terciário,
dos diferentes serviços de qualificação oferecidos pela DUAL interessa analisar
fundamentalmente a qualificação inicial DUAL destinada a jovens.
Os cursos promovidos neste âmbito seguem as diretrizes do sistema dual alemão com as
seguintes características: i) os centros DUAL são responsáveis pela formação teórica; ii) as
empresas formadoras são responsáveis pela formação prática; iii) há uma conjugação dos
conhecimentos teóricos com as competências adquiridas no posto de trabalho (learning by
doing); e, iv) os jovens são selecionados através de um processo de seleção que inclui
entrevistas, testes psicológicos e um assessment centre.
Os cursos de formação profissional inicial DUAL são os seguintes:
-
Cursos de formação profissional/qualificação DUAL, com uma duração média de 2 anos
destinados a jovens com idade máxima até 25 anos, com o 11º de escolaridade
completo e/ou frequência do 12º ano. Nestes cursos o formando passa 4 dias por
semana numa empresa e dedica 1 dia por semana às aulas teóricas. Conferem
equivalência ao 12º ano e atribuem um certificado profissional de nível 4;
-
Cursos de formação profissional/aprendizagem DUAL, com uma duração média de 2,5
anos destinados a jovens com idade máxima até 25 anos, com o 9º de escolaridade
completo. Nestes cursos existem blocos intensivos de aulas. O formando pode passar
2/3 dias por semana numa empresa e 3/2 dias por semana no centro DUAL em aulas
teóricas. Conferem equivalência ao 12º ano e atribuem um certificado profissional de
nível 4.
Em 2014, dos 2.818 formandos que frequentaram ações de formação na DUAL, 1.157
frequentaram programas de formação profissional inicial. No final do ano, a DUAL tinha em
funcionamento 68 turmas de formação profissional inicial nas mais diversas áreas. A taxa de
empregabilidade dos jovens que frequentaram as ações de formação profissional inicial na
DUAL foi de cerca de 90% em 2014. A Tabela EC2-1 resume os diferentes cursos de
Qualificação e Aprendizagem oferecidos pela DUAL.
Nesse ano, 281 empresas estiveram envolvidas em programas de formação profissional
promovidos pela DUAL. Apenas 20% do total eram alemãs, 10% doutras nacionalidades e 70%
portuguesas, o que atesta o crescente interesse do tecido empresarial português pela
formação profissional de base dual.
114
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Tabela EC2.1 – Cursos de formação profissional DUAL para jovens
Área
Cursos de Qualificação
(11ºano)
Cursos de Aprendizagem
(9ºano)
Rececionista de Hotel
Hotelaria e Restauração
Técnico de hotelaria
Técnico de Cozinha e Pastelaria
Técnico de Restaurante/Bar
Eletrónica/Automação
Técnico de Eletrónica/Automação e
Comando
Energia e Gás
Técnico de Gás
Gestão e Administração
Técnico de Gestão
Administrativa
Técnico de Apoio à Gestão
Técnico de Manutenção Industrial
(Mecatrónica)
Manutenção Industrial
Construção e Reparação
de Veículos a Motor
Serviços de Transporte
Técnico de Mecatrónica
Automóvel Aplicada
Técnico de Mecatrónica Automóvel
Técnico de Pintura Automóvel
Técnico de Receção/Orçamentação de
Oficina
Técnico de Transportes
Fonte: CCILA.
Critérios de seleção dos alunos: Os jovens interessados em frequentar os cursos de
aprendizagem DUAL, com uma duração de 2,5 anos, devem possuir o 9º ano de escolaridade.
Os candidatos à frequência das cursos de qualificação DUAL, com uma duração de 2 anos,
devem possuir o 11º completo e/ou frequência do 12º ano. A idade máxima para concorrer a
cada um dos cursos é de 25 anos. A classificação final no processo de seleção resulta do
somatório da pontuação obtida nas seguintes componentes: testes psicotécnicos (25%);
provas de grupo ou Assessment Centre (30%) e entrevista pessoal (45%), tendo esta um
carácter eliminatório.
Forma de vinculação: Todos os formandos celebram um contrato de formação com a DUAL.
Os estágios nas empresas são formalizados através de um protocolo com a DUAL.
Papel dos tutores/formadores: Os tutores são responsáveis por acolher os formandos e por
planear as suas atividades nas empresas, bem como por acompanhar e avaliar o seu
desempenho. Os tutores são ainda responsáveis por manter uma ligação permanente com a
DUAL, a fim de tratar todos os assuntos relativos à formação dos estagiários nas empresas.
115
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Recrutamento por parte das empresas participantes: Embora as empresas não estejam
obrigadas a recrutar os formandos no final dos estágios, no final da formação cerca de 30% dos
formandos são recrutados pelas empresas onde realizaram o estágio.
EC2.5. Perspetivas futuras para a DUAL
A DUAL prevê manter a sua atividade na área da formação profissional inicial de jovens e,
eventualmente, expandir a sua atividade em termos geográficos e sectoriais, acolhendo um
número crescente de formandos.
116
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Estudo de caso 3 – EC3: Toyota Caetano Portugal
EC3.1. Apresentação
O Grupo Salvador Caetano criou em 1981 uma estrutura dedicada exclusivamente à formação
de ativos e à formação profissional de jovens, para dar resposta às necessidades de formação
específicas das várias áreas de atividade do grupo. Para o grupo a formação do capital humano
é um instrumento estratégico para garantir a competitividade e o crescimento sustentável de
todas as suas empresas.
As três áreas de formação da Toyota Caetano Portugal (TCP) são as seguintes:
-
Formação de ativos;
-
Formação profissional de jovens;
-
Certificações.
A expansão da estrutura de formação da Toyota Caetano Portugal, através da abertura
sucessiva de vários polos em diversas localizações, norteou-se pelas necessidades de
profissionais qualificados nas zonas geográficas onde o Grupo possui maior implantação, quer
ao nível industrial quer ao nível de serviços de oficina.
EC3.2. Evolução e conjuntura
As atividades de formação da Toyota Caetano Portugal iniciaram-se em 1983, com a oferta de
cursos piloto no polo de formação de Vila Nova de Gaia. A abertura dos outros polos de
formação no período 1991-2014 tem permitido ao Grupo expandir a oferta de cursos de
formação profissional nas suas principais áreas de atividade. Atualmente a Toyota Caetano
Portugal tem em funcionamento cinco polos de formação, nomeadamente em:112 Vila Nova de
Gaia (1983), Ovar (1991), Carregado (1992), Sintra-Rio de Mouro (2010) e Braga (2014).
No período 1983-2014 foram ministrados 207 cursos de formação em áreas relacionadas com
as principais atividades do Grupo (Tabela EC3.1). Nesses programas participaram um total de
3.340 jovens. Nos cinco polos de formação da Toyota Caetano Portugal estavam em
funcionamento, em finais de 2014, um total de 29 cursos, envolvendo 535 alunos, com uma
média etária de 16,8 anos.
112
Anos de entrada em funcionamento entre parênteses.
117
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
O reconhecimento da formação da Toyota Caetano Portugal é confirmada pela elevada
procura dos seus programas de formação profissional.113 Sem efetuar, por política do Grupo,
qualquer esforço de promoção e divulgação, em 2014, o número de candidatos representou
190% das vagas disponíveis.
EC3.3. A marca Toyota Caetano Portugal
A formação profissional ministrada na Toyota Caetano Portugal é de base dual. Tem, portanto,
como principal objetivo conjugar conhecimentos teóricos com a aprendizagem de
competências no posto de trabalho. A formação realiza-se alternadamente entre o polo de
formação da Toyota Caetano Portugal em questão e as empresas parceiras. O objetivo do
modelo é aproximar o máximo possível o dia-a-dia dos formandos das rotinas e realidades com
que irão deparar nos futuros postos de trabalho.
Os cursos oferecidos dividem-se em quatro componentes formativas: a sociocultural, a
científica e a tecnológica, todas desenvolvidas no polo de formação Toyota Caetano Portugal, e
o período de formação prática em contexto real de trabalho (estágio), desenvolvido numa
empresa parceira, do Grupo ou associada.
Independentemente do polo, a formação realizada pela Toyota Caetano Portugal rege-se pelos
mesmos princípios e orientações. O objetivo da homogeneização de abordagens é assegurar
que a formação tem uma identidade própria, que respeita os valores do Grupo. Os aspetos
distintivos da formação na Toyota Caetano Portugal são os seguintes:
-
O objetivo último dos programas de formação profissional oferecidos é a integração
futura dos jovens em empresas do Grupo. Os formandos são vistos pelos
trabalhadores do Grupo, incluindo os da área da formação, como “futuros colegas”;
-
A formação decorre na empresa e não numa escola ou centro de formação;
-
Os conhecimentos e know-how do Grupo são inteiramente partilhados com os
formandos;
-
Para além do desenvolvimento de competências técnicas, o Grupo valoriza o
desenvolvimento de competências sociais e relacionais;
-
Durante a formação os formandos convivem com os restantes colaboradores da
empresa, tomando conhecimento dos seus problemas, dificuldades e sucessos;
113
Transversal a todos os programas oferecidos.
118
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
Pretende-se que os jovens assimilem e interiorizem os valores do Grupo Salvador
Caetano, convivendo com diferentes profissionais, nas várias áreas funcionais das
empresas;
-
Os formandos devem cumprir as mesmas regras e normas que os trabalhadores
efetivos. Por essa razão, aplicam-se aos formandos as regras relativas a horários e
faltas em vigor na empresa, bem como os procedimentos de utilização da cantina,
portarias e vestiários.
EC3.4. A qualificação e formação profissional de jovens
Dado que o foco do estudo é o nível secundário e pós-secundário não terciário, dos diferentes
serviços de formação oferecidos pela Toyota Caetano interessam essencialmente os de
formação profissional destinada a jovens. Neste âmbito a Toyota Caetano Portugal oferece
Cursos de Formação Profissional destinados a jovens com idades compreendidas entre os 15 e
os 25 anos, com o 9º ano de escolaridade completo. Têm uma duração de 2/3 anos e conferem
equivalência ao 12º ano e certificação profissional de nível 4. A Tabela EC3.1 resume os
diferentes cursos de formação profissional para jovens oferecidos pela Toyota Caetano
Portugal.
Tabela EC2.3 – Cursos de formação profissional DUAL para jovens
Cursos de Aprendizagem
(9º ano)
Técnico de Mecânica Automóvel
Técnico de Pintura Automóvel
Técnico de Reparação e Pintura de Carroçarias
Técnico de Receção e Orçamentos
Caixeiro de Peças
Técnico de Eletricidade/Eletrónica
Técnico de Mecatrónica Automóvel
Técnico de Manutenção Industrial de Metalurgia e Metalomecânica
Técnico de Receção e Orçamentação Oficina
Técnico de Produção e Transformação de Compósitos (Aeronáutica)
Fonte: Toyota Caetano Portugal.
119
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Estes cursos apresentam uma elevada taxa de empregabilidade (87,8%), que se justifica pela
elevada absorção dos formandos por parte das empresas do Grupo Toyota Caetano Portugal e
das empresas associadas das zonas geográficas em que se localizam os vários polos de
formação.
Critérios de seleção dos alunos: Os jovens interessados em frequentar os diferentes cursos de
formação profissional devem ter até 25 anos de idade e o 9º ano de escolaridade completo. O
processo de seleção é realizado com o apoio da estrutura de recrutamento e seleção da
empresa. O processo de seleção baseia-se em provas de inteligência, testes de personalidade e
provas de grupo e, se necessário, em entrevistas individuais. O processo de seleção fica
completo com exames médicos da responsabilidade dos serviços de medicina do trabalho da
empresa.
Forma de vinculação: Todos os formandos celebram um contrato de formação com a Toyota
Caetano Portugal. Os estágios nas empresas são formalizados através de um protocolo.
Papel dos tutores/formadores: Os formadores são responsáveis por acolher os formados, por
monitorizar as várias unidades e atividades que fazem parte do plano curricular, bem como
por acompanhar e avaliar o seu desempenho. Os formadores são escolhidos tendo em
consideração a sua experiência e competências pedagógicas, os resultados de anteriores
processos de formação e o conhecimento dos valores da empresa. O início dos cursos é
precedido de reuniões da equipa de professores/formadores para conhecer o perfil dos
formandos e concertar estratégias pedagógicas. A equipa de professores/formadores reúne
mensalmente com os formandos e informa periodicamente os encarregados de educação
sobre o desempenho e evolução dos seus educandos.
Práticas de mérito: Os bons desempenhos são incentivados e premiados pela Toyota Caetano
Portugal. A atribuição dos locais (oficinas do Grupo Salvador Caetano) em que decorre a
formação em contexto de trabalho depende do desempenho dos formandos. Após a avaliação
dos formandos pela equipa formativa em dimensões como a capacidade de aprendizagem, o
cumprimento de regras e normas de segurança, a utilização de equipamentos e ferramentas, o
relacionamento com colegas e formadores e a assiduidade e pontualidade é-lhes dada a
oportunidade de escolherem, de entre os locais/empresas previamente selecionadas, o local
onde preferem realizar a formação em contexto de trabalho.
Vínculo com o recrutamento por parte das empresas associadas: Embora as empresas não
estejam obrigadas a recrutar os formandos no final dos estágios, uma proporção elevada dos
120
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
mesmos são acolhidos por empresas do Grupo Salvador Caetano no final da formação, sendo
outros recrutados por empresas com atividades relacionadas nas zonas geográficas dos polos
de formação.
EC3.5. Perspetivas futuras para a Toyota Caetano Portugal
A Toyota Caetano Portugal prevê manter a sua atividade na área da formação profissional de
jovens, aproveitando algumas oportunidades de expansão geográfica. Pretende-se também
oferecer programas adicionais relacionados com as atividades da empresa, para outros níveis
de certificação, se tal se afigura possível. Adicionalmente, o Grupo tenciona alargar as
parceiras com empresas de fora do Grupo para assegurar a componente de formação em
contexto de trabalho.
121
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
122
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 6 – O Sistema de Formação Profissional em Portugal e a sua
eventual Dualização: a Perspetiva dos Stakeholders
123
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
6.1. Introdução
Com a finalidade de obter a opinião de um conjunto de agentes próximos do sistema de
formação profissional em Portugal, ligados aos sectores educativo, empresarial, da formação e
da Administração Pública, sobre a sua situação atual, bem como sobre a forma de reformá-lo,
foram realizadas um conjunto de entrevistas de caráter semi-estruturado. As instituições,
entidades e associações selecionadas, bem como as pessoas entrevistadas estão identificadas
no Anexo VI. A auscultação destes stakeholders visou conhecer as diferentes perspetivas sobre
a evolução recente e a conjuntura atual do sistema de formação profissional, bem como sobre
os aspetos que poderiam ser melhorados para que esta via contribua para elevar os níveis de
educação, melhorar a inserção dos jovens no mercado de trabalho e aumentar os níveis de
produtividade das empresas e a competitividade geral da economia. As entrevistas basearamse no guião que consta do Anexo V. As pessoas entrevistadas apresentam, em geral, uma
ampla experiência na gestão direta ou indireta de programas ou projetos de formação
profissional.
Para validar a informação obtida foram consultados dois peritos internacionais em matéria de
formação profissional dual, um com vínculos a uma instituição de ensino superior e um outro a
uma confederação profissional. Os peritos consultados e o seu cargo/responsabilidade estão
identificados no Anexo VII. Neste caso as consultas não seguiram um guião pré-estabelecido;
as suas opiniões e pontos de vista foram obtidos através de diversas consultas pontuais com
fins de esclarecimento ou confirmação.
As reuniões com os entrevistados tiveram lugar no primeiro trimestre de 2015, nas instalações
das instituições e entidades consultadas ou nas escolas às que, de alguma forma, estão
vinculados os participantes; as entrevistas foram realizadas por um dos membros da equipa. 114
As opiniões e pontos de vista dos participantes estão organizados em três secções. Geralmente
são apresentadas apenas as opiniões maioritárias, embora se façam também referências a
outras por questões de singularidade ou interesse. A generalidade das opiniões enquadra-se
no referencial para a dualização do sistema proposto pelos peritos. Sempre que possível, no
texto, evitam-se as menções a instituições, entidades, associações e pessoas. Porém, em
determinadas circunstâncias torna-se inevitável, sendo absolutamente necessário para
exemplificar determinadas situações ou práticas.
114
A entrevista ao Vogal da Direção da CIP, Dr. António Marques, foi realizada em Braga, por questões
de caráter logístico, e não nas instalações da CIP em Lisboa.
124
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
6.2. Considerações gerais
Os intervenientes nas entrevistas efetuaram um conjunto de considerações gerais sobre o
ensino profissional e algumas questões relacionadas, tais como a inserção no mercado de
trabalho ou a empregabilidade. Embora existam algumas diferenças de enfoque, das
intervenções retiram-se perspetivas relativamente convergentes em algumas dessas
dimensões.
De acordo com o entendimento maioritário, o principal objetivo da formação profissional
(inicial) é formar jovens, sem esquecer a dimensão educativa, de acordo com as suas
necessidades e interesses e os requisitos do mercado de trabalho. A formação profissional tem
que estar cada vez mais ligada às necessidades do mercado de trabalho e deve
necessariamente dotar o aluno com as competências exigidas a um dado perfil profissional. Se
isto não for cumprido, existe uma descredibilização dos programas, da via e do sistema como
um todo.
O desenvolvimento da formação profissional é fundamental em qualquer sociedade avançada,
dado que a inadequação da oferta formativa não permite aproveitar as capacidades e o
talento dos jovens nem melhorar a competitividade da economia, num contexto
crescentemente globalizado.115 Para a produção de bens tangíveis e intangíveis as economias
precisam de trabalhadores com níveis de qualificação diversificados, tanto vertical como
horizontalmente. A formação é fundamental para iniciar e dar continuidade aos processos de
inovação e diversificação empresarial, sobretudo em áreas produtivas viradas para o mercado
internacional que precisam de profissionais competentes com elevados níveis de qualificação e
capacidades de atualização continuada.
Verificou-se também certo consenso em relação à inserção laboral dos jovens e à sua
empregabilidade. Embora fosse reconhecido pela maioria que a aproximação do sistema às
necessidades das empresas melhora a inserção profissional e o potencial de empregabilidade,
todos os entrevistados vincularam a facilidade de acesso ao mercado de trabalho à existência
de uma economia forte, assente em empresas com capacidade para criar emprego de
qualidade.
A maioria dos entrevistados considera que o crescimento do ensino profissionalizante nos
últimos anos, em Portugal, foi impulsionado pelas condições de oferta e não tanto pela
115
Um dos entrevistados com ligações a entidades alemãs declarou textualmente: ”Sem Know-how não
há indústria. Sem pessoas formadas não há investimento.”
125
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
procura real. Para os participantes com vínculos ao sector empresarial e para alguns dos
dirigentes escolares, a expansão da oferta de cursos profissionais não respondeu a um
interesse real em promover a formação profissional. Na sua opinião, a promoção desta via no
sector público foi uma forma de alterar a realidade do sector educativo, aproximando-o
artificialmente dos padrões de alguns países europeus, nos quais a formação profissional tem
uma quota de mercado significativa no nível secundário de ensino.116,117
6.3. A situação do sistema de formação profissional em Portugal – O status quo
A totalidade dos entrevistados consideram que o atual sistema de formação profissional
português é complexo, existindo zonas de sobreposição que tornam difícil as escolhas dos
alunos e as leituras das empresas. A maioria considera também que existe uma importante
margem de progressão/melhoria para a otimização/racionalização do sistema, sem que isso
implique perda de qualidade ou limitação de escolhas.
O atual sistema de formação profissional está constituído em essência por dois tipos de
cursos:118 os cursos profissionais e os cursos de aprendizagem, tutelados por ministérios
diferentes, os primeiros pelo Ministério de Educação e Ciência e os segundos pelo Ministério
do Trabalho.119,120 Os participantes nas entrevistas sem ligações a cada uma das tipologias de
cursos têm perspetivas relativamente críticas a seu respeito. Os que não têm vínculos com os
cursos de formação profissional consideram que os cursos desta modalidade, em geral, não
respondem às necessidades e exigências do mercado de trabalho, estão mal dotados em
termos de recursos humanos e materiais e respondem a lógicas de expansão e funcionamento
assentes em incentivos perversos.
Os que não têm vínculos com os cursos de aprendizagem entendem que estes programas
constituem, no seu cerne, um sistema bem-intencionado. Não obstante consideram também
que os cursos de aprendizagem apresentam problemas de qualidade, designadamente
relacionados com a falta de homogeneidade entre programas e entidades formadoras,121 e de
116
A expressão “trabalhar para as estatísticas” foi utilizada em diversas ocasiões.
Alguns afirmaram que a expansão da oferta de cursos profissionais nas escolas secundárias públicas
foi uma forma de assegurar o seu financiamento.
118
As restantes modalidades são marginais ou a extinguir.
119
Atualmente pelo Ministério de Economia.
120
A diferente tutela traduz-se numa concorrência soterrada entre sistemas. A maioria dos
entrevistados considera perniciosa a competição vigente em diversas dimensões. A escassa cooperação
entre os sistemas assenta em relações ocasionais, maioritariamente de caráter pessoal.
121
As diferenças de qualidade no sistema de aprendizagem manifestam-se em termos de procura. No
sistema coexistem programas e entidades com grandes défices de procura com outros com excesso de
117
126
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
reconhecimento social, que se traduzem numa reduzida participação.122,123 Nos últimos anos, a
melhoria da eficiência dos centros de formação e a entrada de novas entidades no sistema têm
melhorado quer os seus resultados quer a sua própria imagem.
Para além destas modalidades existe uma outra criada recentemente, os cursos vocacionais,
que aparentemente têm caráter profissionalizante, mas que, na opinião da maioria,
constituem uma modalidade menor destinada a reter os alunos de fraco desempenho no
sistema, permitindo que cumpram com o requisito da escolaridade obrigatória.124 Com
independência dos problemas de enquadramento125 ou de falta de recursos, as limitações
desta modalidade derivam, em grande medida, dos requisitos de acesso estabelecidos na
legislação. De facto, este é um dos aspetos destes cursos unanimemente criticado pelos
entrevistados, que consideram desacertado que se tenham estabelecido condições de acesso
que privilegiam o insucesso dos candidatos (existência de um dado número de retenções para
poder aceder).
A criação desta modalidade e a sua associação à formação profissional desperta fortes
reservas entre os entrevistados, dado que os cursos vocacionais desvirtuam as alternativas
verdadeiramente profissionalizantes e contribuem para exacerbar a sua imagem negativa na
sociedade, por associá-las ao insucesso e à falta de perspetivas. Na sua opinião, para não
degradar a imagem da formação profissional ainda mais, deve fazer-se um esforço, sobretudo
de comunicação, para separar claramente os cursos vocacionais da formação profissional
(cursos profissionais e cursos de aprendizagem).
Um dos principais problemas do atual sistema de formação profissional é a diversidade de
programas e currículos. Alguns entrevistados, nomeadamente os ligados ao sector
empresarial, consideram que existe um número excessivo de programas, muitos deles com um
grau de diferenciação relativamente reduzido. Consideram também que as escolas têm
demasiada liberdade na definição do curriculum, o que resulta na existência de programas
procura, nomeadamente pela sua boa reputação no mercado (qualidade do programa e boa inserção
profissional). Entre estas últimas, por exemplo, a ATEC tem entre 3 e 4 candidatos por vaga e o Centro
de Formação da Toyota Caetano Portugal à volta de 2 candidatos por vaga.
122
Segundo a representante do IEFP objeto de entrevista, a perda de alunos circunscreve-se
fundamentalmente às faixas etárias mais baixas, devido às restrições impostas pelo aumento da
escolaridade obrigatória.
123
Alguns foram mais longe nas suas críticas, afirmando que no sistema de aprendizagem existe muito
facilitismo, com a finalidade evitar a desistência e inflacionar artificialmente o output do sistema. Estas
práticas têm obviamente impacto em termos de qualidade e de imagem.
124
Os entrevistados com ligações ao tecido empresarial referiram que este tipo de formação não é
reconhecida pelas empresas.
125
Por exemplo, em termos de qualificação profissional e de progressão de estudos.
127
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
similares com currículos completamente diferentes, dificultando a compreensão do perfil dos
graduados pelas empresas. Para o tecido empresarial não é aceitável que cursos similares
produzam graduados com perfis completamente diferentes e que, apesar das divergências,
confiram a mesma certificação profissional. Na opinião de muitos dos participantes, estas
diferenças reduzem a transparência do sistema, criando confusão nos processos de
recrutamento.
Na opinião de alguns dos entrevistados,126 essa liberdade na definição da oferta e na
construção dos currículos acaba por criar uma oferta desligada do mercado de trabalho, que
pretende dar resposta a objetivos próprios das escolas e da classe docente. Para muitos dos
entrevistados, a falta de orientação da oferta para o mercado forma os jovens em áreas com
escassas saídas profissionais, desiludindo as suas expetativas e as das suas famílias.
Uma parte da oferta disponível responde, em grande medida, à capacidade instalada nas
escolas (sobretudo, recursos humanos) e às prioridades, gostos e modas dos jovens. A
disponibilidade de docentes com competências (ou disponibilidade para as adaptar/adquirir)
para lecionar em determinados cursos de formação profissional é um dos principais drivers do
sistema, nomeadamente nas escolas públicas. O outro condicionador-impulsionador do
sistema é o grau de exigência material e tecnológica dos cursos de formação profissional. A
falta de laboratórios e espaços oficinais bem dotados nas escolas secundárias públicas e nas
escolas profissionais enviesam a oferta em favor de cursos em áreas do sector serviços ou de
sectores de apoio à indústria sem grandes exigências técnicas e/ou tecnológicas.
Outro aspeto que concitou unanimidade foi a escassa ligação do sistema de formação
profissional às empresas, especialmente no subsistema dos cursos profissionais,
nomeadamente no que toca ao seu grau de envolvimento na formação em contexto de
trabalho. Segundo os entrevistados com vínculos ao sector escolar, os défices identificados
neste domínio derivam: i) da falta de cultura de colaboração das escolas públicas com as
empresas e do próprio choque cultural provocado pela grande distância existente entre
entidades com objetivos, operações e formas de atuar completamente diferentes; ii) da
reduzida disponibilidade do tecido empresarial português para acolher alunos em formação; e,
iii) do escasso empenhamento de uma proporção significativa de empresas participantes nas
atividades de formação em contexto de trabalho.
126
Os ligados a entidades empresariais e, inclusivamente, alguns ligados a escolas secundárias públicas.
128
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Para os entrevistados com vínculos ao sector empresarial, os motivos da aparente falta de
envolvimento estariam relacionados com: i) a escassa cultura de formação do trabalhador
existente em Portugal; ii) a falta de interesse de uma boa parte dos programas, por não ir ao
encontro das reais necessidades das empresas; e, iii) a inexistência de incentivos públicos para
apoiar a formação em contexto de trabalho.
Os entrevistados com vínculos a entidades alemãs confirmaram que as empresas dessa
nacionalidade ou aquelas que conhecem o funcionamento do sistema alemão ou as vantagens
da formação em contexto de trabalho são mais recetivas a acolher alunos em formação. Na
sua opinião, a falta de disponibilidade das empresas portuguesas para formar os jovens
inscritos nos cursos de formação profissional não é o único problema do sistema. Entendem
que para que o sistema seja mais eficiente e responda às exigências de uma economia
competitiva, as empresas devem ter um maior envolvimento na definição das prioridades em
matéria de formação e na construção dos currículos dos programas.
Para que a oferta de formação profissional responda às necessidades da economia e das
empresas deve existir um sistema de monitorização bem desenhado, que utilize uma
metodologia estável em linha com as melhores práticas internacionais. Alguns entrevistados
referiram, sobre esta matéria, que, embora em Portugal existam sistemas de
acompanhamento do mercado, nomeadamente ligados ao IEFP e à ANQEP, as suas
deficiências acabam por evidenciar-se nas contínuas discordâncias que existem nas listas de
profissões prioritárias publicadas periodicamente por ambas entidades.127 A consequência das
fragilidades do sistema é que as listagens de profissões prioritárias, construídas de forma
centralizada, não correspondem às reais necessidades das empresas.128
Os entrevistados do sector educativo referiram que a condição de acesso aos cursos de
formação profissional e aos de aprendizagem (9º ano completo) é considerada suficiente para
garantir níveis de qualidade compatíveis com as exigências programáticas. Relativamente à
qualidade dos alunos, os professores entrevistados consideram que a qualidade dos
estudantes captados está em grande medida condicionada pelas saídas profissionais ao seu
dispor. Alguns também são da opinião que alunos com um desempenho relativamente fraco
127
Discordâncias significativas entre as listas de ambas entidades e entre as listas da mesma entidade
correspondentes a períodos sucessivos. Estas diferenças podem ter a sua origem na utilização de
amostras não representativas com elevados níveis de renovação entre inquéritos e com alterações ou
diferenças metodológicas.
128
Esta perspetiva foi a veiculada pelos dois entrevistados que se pronunciaram sobre este assunto.
129
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
melhoram significativamente quando se inscrevem num curso que se adapta ou desperta o seu
interesse vocacional/profissional, aumentando os seus níveis de motivação.
Vários participantes nas entrevistas referiram que a formação profissional não pode ser vista
como a solução de último recurso para os alunos de fraco desempenho, dado que a insistência
nesta abordagem acaba por afetar a imagem e a credibilidade do sistema no seu todo. Os
entrevistados revelaram não ter uma opinião suficientemente consolidada em relação às
modalidades que devem acolher os alunos que não concluíram o 9º ano ou os alunos com
dificuldades de aprendizagem. Não obstante, a maioria entende que estes alunos não devem
ser admitidos em cursos de formação profissional se não cumprirem os requisitos mínimos.
A grande maioria dos entrevistados confirma a existência de uma estigmatização do ensino
profissional em Portugal, embora discordem sobre as origens da mesma. Para uns o grande
problema deriva das representações sociais dominantes na sociedade portuguesa, de acordo
com as quais o ensino superior outorga um estatuto social muito superior ao dos detentores
de níveis de formação inferiores, com independência da qualificação que confiram e da
competência profissional do detentor. A este problema junta-se a história dos cursos
profissionalizantes em Portugal, que nasceram com o intuito de acolher alunos incapazes de
vingar na via geral ou procedentes de famílias com escassas possibilidades de garantir a
continuidade dos filhos no sistema educativo. O perfil dos alunos recrutados juntamente com
a perceção de menor qualidade acabaram por exacerbar a negatividade da perceção social que
se lhes associa.
Por último, alguns utilizaram argumentos mais elaborados, tais como a dimensão do prémio
salarial dos graduados do ensino superior, que acaba por criar grandes incentivos para que os
alunos optem pela via do prosseguimento de estudos. Não obstante, foi apontado, a este
respeito, que caso não sejam promovidos ajustamentos no atual sistema de educativo, será o
próprio mercado a fazê-los. Desta forma, com a massificação do ensino superior e a previsível
queda do seu retorno, as decisões dos indivíduos deverão contemplar escolhas alternativas,
tais como a formação profissional. Esta hipótese torna-se mais realista num contexto de
escassez de quadros intermédios, onde as oportunidades de emprego bem remuneradas
possam surgir em postos de trabalho com os perfis conferidos pelos cursos de formação
profissional.
Apesar do estigma social que ainda se associa a este tipo de formação, um número
significativo dos entrevistados, em especial os ligados a entidades de formação de inspiração
130
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
alemã, referiram que, nos últimos tempos, assiste-se a uma mudança de perceção, pelo menos
da parte dos alunos,129 que antepõem a empregabilidade e aspetos de diferenciação
profissional a questões de estatuto ou prestígio social.
6.4. A reforma do sistema de formação profissional em Portugal – A dualização
A maioria dos entrevistados coincidiu na importância de melhorar o sistema de formação
profissional português, embora as razões para justificar uma reforma neste domínio sejam
bastante diferentes. Os participantes nas entrevistas, ligados ao sistema de ensino, apontam
argumentos relacionados com o incremento da eficiência do sistema, com a melhoria do
aproveitamento escolar e, portanto, a redução do insucesso e, inclusivamente, com a melhoria
de inserção dos alunos no mercado do trabalho. Este argumento é utilizado também pelos
participantes com responsabilidades na dinamização do mercado de trabalho ou com vínculos
às empresas, embora estes últimos recorram também a argumentos como a adequação às
necessidades do tecido empresarial ou a melhoria do match entre oferta e procura de
trabalho. Alguns justificam a reforma com base em motivações de ordem geral, como a
melhoria da sociedade portuguesa ou o futuro do país.130
Em geral, os entrevistados entendem que deveriam ser introduzidas reformas no ensino
profissionalizante em Portugal, que tornem o sistema de formação profissional mais simples,
mais eficiente e mais orientado para o mercado. Embora muitos reconheçam no sistema dual
alemão algumas/bastantes vantagens, a maioria considera que é de difícil replicação em
Portugal. A opinião maioritária em matéria de transferência é que numa eventual reforma do
sistema português deve existir recetividade para incorporar dimensões bem-sucedidas e boas
práticas originárias de outros sistemas. A perspetiva geral dos entrevistados é que se deve
avançar na dualização do sistema – maior participação das empresas e maior componente de
formação em contexto de trabalho – sem descurar a qualidade da componente escolar.131
Muitos entrevistados manifestaram que no processo de dualização da formação profissional
deve aproveitar-se a experiência passada nesta matéria.132 Para a totalidade dos entrevistados
a dualização da formação profissional deve ter em consideração a realidade portuguesa,
129
A perceção das famílias, que têm um papel muito importante neste âmbito, pode não ser a mesma.
Curiosamente estes argumentos foram esgrimidos pelo Diretor-Geral da Câmara de Comércio LusoAlemã.
131
A perspetiva dos participantes ligados às escolas, nomeadamente às escolas profissionais, é que, nos
últimos anos, o peso da componente de formação em contexto de trabalho tem aumentado
consideravelmente, não sendo necessário reforçá-la muito mais.
132
Alguns consideram, inclusivamente, que existe um modelo português de formação profissional.
130
131
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
devendo adaptar-se às características socioeconómicas do País. Esta leitura coincide com a
perspetiva dos peritos internacionais que entendem que os sistemas de formação profissional
não podem ser implementados ou transferidos. O sucesso de um sistema depende do seu
desenvolvimento e melhoria a partir da realidade que o enquadra.
Um dos aspetos consensuais entre todos os participantes nas entrevistas é a necessidade de
simplificar o sistema, que neste momento inclui uma panóplia de vias e modalidades que não
facilitam as escolhas dos alunos, dificultam o reconhecimento dos programas por parte dos
empregadores e resultam pouco transparentes para a sociedade em geral. Muitos referiram a
necessidade de fazer convergir todas as modalidades profissionalizantes numa única ou, no
máximo, em duas. Entre estes, alguns opinam que o sistema deveria assentar numa
modalidade única, que servisse de referência, com pequenas variantes para acomodar
especificidades nos programas ou nos perfis de alunos, por forma a incrementar a eficiência
geral do sistema de educação e formação profissional.
Neste domínio a solução proposta, pela maioria, foi a convergência do sistema de
aprendizagem e o sistema de formação profissional atual, dando lugar a um sistema único
mais legível para alunos, empresas e sociedade em geral. Se tal não for possível, dever-se-ia,
no mínimo, tentar uma aproximação entre ambos, para limitar a concorrência, aproveitar
sinergias e partilhar recursos.133,134 A ideia subjacente a esta convergência/aproximação é a
potenciação das vantagens de ambos os sistemas e a minimização das suas fragilidades.
O sistema dever ser simples, transparente e estável. O novo sistema não deve criar situações
de vantagem relativamente a outras vias, no que toca a condições de acesso (menos
requisitos), cargas horárias (menos horas), permeabilidade (vantagens no acesso ao ensino
superior) ou certificação (concessão de níveis de qualificação mais elevados).
Na eventual reforma do sistema, foi considerado conveniente, de forma praticamente
unânime, separar a formação vocacional da formação profissional. A formação vocacional, nos
moldes atuais, não pode ser considerada formação profissional. Os cursos atualmente em
funcionamento servem, como referido, para dar resposta e manter na escola os jovens com
133
A representante do IEFP referiu que a concorrência entre ambos os sistemas pode considerar-se
inclusivamente como desleal, dado que as escolas públicas seguem, na sua opinião, estratégias de
retenção de alunos.
134
O representante das Escolas profissionais mostrou-se contrário a esta convergência e muito crítico
com o sistema de aprendizagem, o qual na sua opinião não deveria conferir certificação escolar, por ser
tutelado pelo Ministério de Trabalho, e deveria ficar reservado a alunos com mais de 18 anos.
132
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
problemas de desempenho escolar. O sistema tal como foi concebido está, inevitavelmente,
conotado com o insucesso.
Os representantes do sector educativo entrevistados consideram que para que o processo de
dualização seja bem-sucedido é necessário dispor de uma rede de ensino adaptada às
necessidades do sistema. Deve maximizar-se a utilização da capacidade instalada (a rede de
centros e a estrutura do IEFP está claramente subaproveitada) para expandir e qualificar a
rede de ensino. Para este fim, a maioria julga necessário que exista um diálogo permanente
entre ministérios, escolas e municípios. Outros entrevistados consideram que as empresas
também têm um papel importante neste processo. Tem de existir um trabalho de
planeamento, otimização e monitorização da rede, que deverá estar articulado com a
racionalização da oferta formativa.
Em matéria de oferta de cursos, a grande maioria concordou com a necessidade de orientá-la
para as necessidades do mercado no médio e no longo prazo.135 O principal argumento
utilizado foi que a oferta não pode ser mantida à margem das lógicas de funcionamento do
mercado de trabalho e das empresas. Alguns entrevistados sugeriram a criação de um
observatório do emprego e da formação que monitorizasse, analisasse e antecipasse as
tendências estruturais do mercado de trabalho e as necessidades e exigências de formação
para o país, em geral, e para determinadas regiões ou sectores, em particular.136 Neste âmbito,
o papel das empresas e das associações empresariais foi considerado fundamental,
nomeadamente na identificação dos sectores carenciados e das necessidades de formação
potenciais. Ainda no domínio da oferta programática, alguns dos entrevistados sugeriram que,
preferencialmente, antes de decidir a abertura dos cursos, fosse realizado um estudo de
mercado para aferir a sua viabilidade. Para os entrevistados com ligações às empresas, a
estabilidade da oferta e a homogeneidade programática são elementos chave para o sucesso
do sistema.
Alguns entrevistados referiram que orientando a oferta de formação para as reais
necessidades das empresas e garantindo a sua participação no processo de aprendizagem
evitar-se-ia, por um lado, frustrar expetativas, ao melhorar o potencial de inserção dos jovens
no mercado de trabalho, e por outro, degradar a qualidade do ensino, ao garantir a
transmissão de competências de difícil aprendizagem em contexto escolar. Para os
135
Em termos de certificação, indicou-se que a reforma do sistema deve garantir a existência de cursos
de formação que confiram diferentes níveis de qualificação 3, 4 e 5. Atualmente, o nível 3 não existe,
dado que qualquer jovem que conclua um curso de dupla certificação tem, automaticamente, o nível 4.
136
O horizonte temporal referido por alguns foi de pelo menos três anos.
133
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
participantes ligados a entidades alemãs, o défice de formação em contexto de trabalho não
permite nem a especialização nem a diferenciação da formação e dos programas.
Relativamente aos docentes, quase todos os entrevistados, incluindo os representantes das
escolas, referiram que um sistema de formação profissional orientado para o mercado precisa
de professores com formação nas áreas de especialidade dos programas. Deve investir-se em
programas de formação de professores. É fundamental também contar com tutores bemformados nas empresas. De acordo com a experiência dos entrevistados com
responsabilidades em programas de inspiração dual, os tutores devem ser, preferencialmente,
trabalhadores experientes com habilidades de relacionamento interpessoal.
Ainda no âmbito dos recursos, a maioria dos entrevistados concordou que o sistema de
formação profissional deve estar dotado de recursos materiais e tecnológicos suficientes para
garantir a qualidade do ensino. Esta questão é especialmente importante no domínio da
formação simulada que prepara o aluno para a formação em contexto de trabalho.
Segundo os entrevistados, num sistema de formação profissional crescentemente dualizado, o
papel das empresas no processo de aprendizagem é absolutamente fundamental. Foi
reconhecido unanimemente que o sistema não funciona se não for possível mobilizar as
empresas. Os representantes ligados ao tecido produtivo declararam que as empresas devem
encarar o seu rol formador como a melhor forma de dispor de trabalhadores qualificados no
futuro e como parte da sua responsabilidade social corporativa. As empresas têm que estar
recetivas a receber estudantes/estagiários e a ensiná-los.137 Em relação a este assunto, uma
minoria dos participantes mostrou-se favorável à introdução de um sistema de quotas para
alunos de formação profissional nas empresas.
Embora esta perspetiva não fosse unânime, para alguns entrevistados, o sector empresarial
deveria dar um contributo substantivo na organização e conteúdos dos programas
(nomeadamente dos técnicos e profissionais).138 Para outros, especialmente para os ligados ao
sistema educativo, esta função deve manter-se essencialmente no seu âmbito, dado que os
programas não devem descurar a conceitualização dos conteúdos, conferindo dimensão
científica à formação ministrada.
137
Para a representante da ATEC os alunos da formação profissional não são estagiários, são aprendizes.
Os empresários podem apropriar-se de algum valor acrescentado dos primeiros, mas terão muita
dificuldade para fazê-lo dos segundos.
138
As maiores reticências nesta matéria advieram dos entrevistados ligados ao sector educativo,
especialmente dos ligados ao ensino público.
134
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Em relação à componente de formação em contexto de trabalho, a generalidade dos
entrevistados considera que deve ser organizada em blocos temporalmente não coincidentes
com a componente de formação escolar. A compatibilização destas componentes e a sua
coincidência temporal (como acontece na Alemanha) não são extrapoláveis à realidade
portuguesa.139 Os estágios em períodos contínuos, numa modalidade mais próxima do modelo
francês, permitem uma melhor organização das cargas de trabalho tanto nas escolas/centros
de formação como nas empresas, segundo se depreende da opinião da maioria dos
participantes.140 Adicionalmente, a distribuição em blocos contínuos permite criar laços com a
empresa de acolhimento e melhorar a aceitação dos alunos por parte dos trabalhadores
efetivos.141
No processo de dualização do ensino profissional é de extrema importância garantir a
transparência e a disponibilidade de informação suficiente para que os alunos e as suas
famílias, por um lado, e as empresas, por outro, tomem as suas decisões num contexto de
informação quase-completa. Neste domínio, deveriam reforçar-se os sistemas de
monitorização e avaliação da adequação e qualidade dos programas, dos centros de formação
e das empresas.
Para a maioria dos entrevistados a orientação vocacional é um elemento fundamental para
garantir a eficiência do sistema de ensino. As tendências vocacionais deveriam ser sinalizadas
desde muito cedo, e não apenas no 9º ano. Na opinião de alguns, na orientação vocacional
deveriam ser incluídas também as famílias. A relevância da orientação aumenta à medida que
se reduzem as idades com que os alunos têm que tomar decisões que podem condicionar o
seu futuro escolar. Por esse motivo, os alunos que pretendem seguir a via profissionalizante
devem ser acompanhados pelos serviços de orientação vocacional, para assegurar a
maturidade de leituras e a pertinência das escolhas, evitando erros com consequências
indesejadas. Na opinião dos entrevistados ligados a entidades alemãs, a orientação
profissional não deve ser responsabilidade das escolas, dado que deveria ser o mais neutral
possível. O sistema atual cria incentivos perversos, dado que as escolas acabam por ter
interesse em reter os alunos nas modalidades de ensino que oferecem.
139
Neste contexto, foram referidos, em várias ocasiões, os problemas derivados da dispersão
populacional e empresarial.
140
Segundo referido por um dos participantes com uma longa experiência em formação profissional de
inspiração dual, existem ciclos/processos de trabalho mais longos que o período semanal que
corresponderia num modelo em alternância.
141
Outro argumento utilizado é a juventude de alguns dos alunos (14-15 anos), o que dificulta a sua
integração no posto de trabalho.
135
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Quanto à permeabilidade do sistema, a maioria dos entrevistados não se manifestou. A
opinião de alguns dos mais experientes é que a permeabilidade do sistema deve diminuir à
medida que os alunos avançam. O sistema não deve ser garantista, ou seja, o aluno deve
cumprir, em qualquer circunstância, os requisitos mínimos de acesso ao ensino superior.
Alguns entrevistados referiram ainda que o sistema deve incluir a possibilidade de continuar
na via profissional em cursos de nível 5 e 6, preferentemente em instituições de ensino
superior politécnico.
A maioria dos entrevistados considera que a qualificação do sistema de formação profissional
implica atrair e formar bons alunos. Para tal é indispensável credibilizar e valorizar as vias
profissionalizantes. As estratégias para atrair bons alunos para o sistema de formação
profissional passam por racionalizar a oferta, tornando-a mais transparente, apresentar os
cursos como uma alternativa para obter o nível secundário de educação, garantir a sua
permeabilidade, permitindo o prosseguimento de estudos, e disseminar boas experiências e
práticas de ensino profissional.
Embora os entrevistados considerem que existe espaço para fazer progredir o sistema de
formação profissional nos termos enunciados, avançaram também um conjunto de entraves
que podem condicionar a sua reforma, em geral, e a sua dualização, em particular. Os entraves
mais importantes advêm das características do sistema atual, das perceções sociais e da
realidade económico-empresarial do país. Não obstante, existem outros de caráter
regulamentar que podem ter impactos consideráveis no processo de reforma.
Os condicionantes do atual sistema de ensino para a dualização da formação profissional são a
dimensão do quadro docente das escolas e o enraizamento dos interesses instalados. O
excesso de docentes no ensino secundário, resultante da dualização da formação profissional,
teria importantes consequências políticas e sociais. Este tema foi um assunto recorrente nas
entrevistas. Neste domínio, o entendimento da dimensão do excesso e da forma de o resolver
difere significativamente entre entrevistados, dependendo da sua tipologia. Para os
representantes do sector educativo, o excesso de docentes não será um problema tão grave,
nomeadamente porque apenas afetaria uma parte do sistema, podendo ser encontradas
soluções pontuais no seu âmbito. Para outros, nomeadamente para os entrevistados ligados
ao sector empresarial, a generalização de um sistema de inspiração dual provocaria um
excesso significativo de docentes, designadamente no ensino público. Para estes, as soluções
variam entre reciclar professores para que desempenhassem tarefas docentes ou não
docentes dentro do próprio sistema, até outras mais radicais, consistentes na reafectação dos
136
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
professores em outras áreas da função pública. Para os defensores desta reafectação na
Administração Pública, a importância de dispor de um bom sistema de formação profissional
para o país obriga a soluções drásticas.
Outro aspeto com consequências no processo de dualização do atual sistema é a existência de
importantes interesses instalados. No caso da aprendizagem, destacam-se os ligados aos
fornecedores de serviços de educação. No caso da formação profissional privada, os das
escolas profissionais, e no caso da pública, os interesses das escolas e dos professores. Ainda
neste domínio, a existência de sistemas de formação profissional tutelados por ministérios
diferentes não facilita o desmantelamento desses interesses, porque, em essência, os próprios
ministérios têm certo interesse em manter o status quo atual, sob pena de perder capacidade
de influência.
Os entraves de natureza económico-empresarial apontados pelos participantes nas entrevistas
são a reduzida dimensão das empresas e a escassa densidade empresarial em determinadas
regiões do país. Estes entraves, que foram exaustivamente analisados na secção 4.4, podem
ser muito condicionadores da dualização do sistema, nomeadamente pelas dificuldades das
empresas pequenas em conciliar formação e atividade produtiva, e pelos problemas derivados
da escassa densidade empresarial em determinadas zonas do país. Alguns entrevistados
declararam, não obstante, que estes entraves podem ser ultrapassados, pelo menos
parcialmente, implementando soluções já testadas noutros países. Para resolver os problemas
da dimensão empresarial podem ser criados consórcios de empresas (ou outro tipo de
acordos), que garantam a implementação da componente de formação em contexto de
trabalho dos programas.142 Para a resolução dos problemas impostos pela baixa densidade
empresarial em determinadas regiões deve promover-se uma cultura de mobilidade entre os
mais jovens. Os entrevistados vinculados a entidades alemãs referiram, a este respeito, que
onde não há empresas não pode haver formação profissional de inspiração dual.
Um outro entrave com grande relevância relaciona-se com as perceções sociais e a imagem
deste tipo de formação entre os jovens portugueses e as suas famílias. Para reduzir o estigma
social associado à formação profissional em Portugal, segundo alguns dos entrevistados,
dever-se-ia incrementar a qualidade dos programas e implementar políticas de comunicação e
divulgação para mudar perceções. Para a melhoria da qualidade devem ser tomadas medidas
em matéria de conteúdos, organização e funcionamento. No âmbito do sistema de
142
Segundo os representantes dos centros de formação de inspiração dual estas práticas são cada vez
mais correntes em Portugal.
137
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
aprendizagem, a desvinculação do financiamento do número de formandos poderia ter um
impacto muito significativo em termos de qualidade, dado que estes modelos de
financiamento introduzem sempre incentivos perversos no sistema.
A melhoria da imagem, que subjaz a alteração de perceções, passa pelo investimento na
promoção do sistema e na divulgação de iniciativas bem-sucedidas no domínio da formação
profissional.143 Neste sentido, seria também de extrema importância que a política de
recrutamento das Administrações Públicas se tornasse mais abrangente e abrisse vagas
destinadas a candidatos com os perfis profissionais deste tipo de cursos.
Na opinião de muitos dos entrevistados, a estratégia de credibilização e valorização da
formação profissional obriga a desenvolver iniciativas demonstrativas que criem dinâmicas de
arrastamento. Essas iniciativas, para além de ter impactos no interior do sistema, podem ter
impactos sociais mais vastos, com consequências sobre a imagem e as perceções sobre a
formação profissional.
Entre os entraves de caráter regulamentar, o mais importante é o alargamento da
escolaridade obrigatória, dado que pode limitar a mobilidade dos jovens entre subsistemas.
Outro aspeto, neste domínio, que pode ter um impacto significativo é a atribuição ou não de
um subsídio aos alunos. Embora as opiniões a favor e contra desta possibilidade e em relação
às suas consequências sejam muito diversas, todos concordaram que qualquer decisão deve
ser alvo de uma avaliação prévia muito cuidadosa.
Segundo os entrevistados que se pronunciaram sobre o assunto, a estratégia para reformar o
sistema de formação profissional deve ser mobilizadora, realista e progressiva. Em primeiro
lugar, deve conseguir-se o envolvimento e participação dos principais stakeholders. A
mobilização passa também por promover as experiências de sucesso no domínio da formação
profissional de inspiração dual, tais como a ATEC ou a DUAL, para fins de demostração e
eventual reprodução. Em segundo lugar, devem estabelecer-se objetivos compatíveis com a
capacidade instalada, a realidade económico-empresarial e o sistema de ensino. Por último, a
progressividade na implementação é fundamental para evitar erros que tenham um custo
reputacional sobre sistema. Convém introduzir as reformas de modo progressivo, dualizando o
sistema em sectores com atividades claramente compatíveis com abordagens deste tipo e em
regiões com realidades económico-empresariais que não condicionem a sua adoção.
143
Na opinião de vários dos entrevistados um passo importantíssimo neste domínio passaria por mudar
as perceções a nível governamental e da Administração Pública.
138
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
De acordo com os peritos internacionais, esta estratégia de implementação é completamente
adequada. Contudo, efetuaram duas matizações relevantes:
-
O envolvimento dos parceiros tem que ser efetivo, ou seja, devem ter tarefas e
responsabilidade atribuídas;
-
O processo de dualização deve começar por sectores em que seja possível antecipar a
existência de um equilíbrio entre os recursos destinados a formação e o seu retorno
efetivo.
Por último, a maioria dos participantes referiram que a reforma do sistema com objetivos
dualizadores não será conseguida sem vontade e força política. Não obstante, esta condição
não será suficiente se não houver um processo de concertação entre todos os sectores
interessados na formação profissional em Portugal, que permita consolidar acordos em várias
matérias, sem os quais o sistema continuará a reproduzir os problemas atuais. O
desenvolvimento de um quadro legal adequado é absolutamente fundamental.
139
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
140
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Capítulo 7 – Conclusões e Recomendações
141
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Conclusões e recomendações
Neste estudo foi efetuada uma análise do sistema dual alemão de formação profissional e da
conjuntura do sistema de formação profissional em Portugal. Foram também estudadas as
experiências e os entraves e dificuldades da transferência do sistema dual alemão para outros
contextos. Foram ainda revistos os aspetos chave de um processo de transferência deste tipo,
assim como os elementos comuns dos sistemas de formação bem-sucedidos. O estudo
apresenta também as experiências de três iniciativas que, em Portugal, estão a oferecer
programas de formação profissional de base dual com resultados extremamente positivos. Por
último, neste relatório sistematiza-se a opinião de um conjunto de stakeholders, direta ou
indiretamente relacionados com a formação profissional, sobre a situação do sistema em
Portugal e sobre uma eventual reforma do mesmo de inspiração dual.
As principais conclusões do estudo, assentes nas revisões efetuadas e nos resultados da
aplicação das várias metodologias, sintetizam-se nos seguintes pontos:
1.
A formação dual alemã é um sistema de formação profissional em alternância com um
forte envolvimento das empresas e de outros agentes sociais e institucionais. Tem
como objetivo dotar os trabalhadores de habilidades, conhecimentos e competências
suficientes para desenvolver uma profissão qualificada.
2.
Vários países Centro-europeus têm sistemas muito similares, nomeadamente a
Áustria, a Dinamarca e a Suíça, com elevadas taxas de participação dos jovens. Nos
últimos anos, vários países da UE implementaram experiências piloto para explorar as
potencialidades do sistema e avaliar as possibilidades de adaptação às suas realidades
nacionais.
3.
Desde 2011, o governo alemão tem mostrado disponibilidade para apoiar o governo
português na realização de reformas no domínio da formação profissional. Nesse
período tem sido ventilada a possibilidade de transferir a experiência alemã em
matéria de formação profissional, nomeadamente da modalidade dual, para o sistema
de formação profissional português.
4.
O sistema dual alemão tem como caraterística diferencial, face aos sistemas de
formação profissional de outros países, a forte cooperação existente entre a
administração central, as administrações regionais e locais, os parceiros sociais, as
Câmaras de Comércio e Indústria e as empresas. Trata-se de um sistema
extremamente regulado.
142
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
5.
As empresas têm um papel destacado na formação profissional dual. São responsáveis
pela admissão do aprendiz no sistema e pela sua formação em contexto de trabalho,
suportando ainda os custos correspondentes. As empresas são também responsáveis
pela definição da oferta de vagas dos programas do sistema dual.
6.
Nos programas convencionais de ensino dual, o tempo dedicado pelos estudantes à
componente de formação em contexto de trabalho é de 3 ou 4 dias por semana. O
plano de trabalhos correspondente à componente de formação em contexto de
trabalho rege-se pelos regulamentos em vigor para cada tipo de programa/profissão
do catálogo do sistema. A componente de formação em contexto de trabalho
complementa-se com o ensino em contexto escolar nas escolas vocacionais. Em média,
os estudantes dedicam à sua formação nestas escolas entre 1 e 2 dias por semana,
com uma carga letiva de cerca de 12 horas semanais.
7.
As empresas suportam a totalidade dos custos associados à formação em contexto de
trabalho, incluindo os salários dos formadores/tutores e os equipamentos, bem como
a remuneração dos aprendizes. Regra geral, essa remuneração cresce anualmente até
ao final do programa e, em média, corresponde a um terço do salário de um
trabalhador qualificado da profissão em questão. Embora as empresas suportem a
maior parte dos custos do sistema, o seu financiamento é partilhado pelas diferentes
entidades intervenientes.
8.
Em 2014, aproximadamente metade das novas inscrições no sistema alemão de
formação profissional correspondeu a programas duais. No âmbito do sistema dual
foram oferecidas quase 560.000 vagas, tendo o número de contratos formalizados
pelas empresas com aprendizes ultrapassado os 520.000. Quase 60% dos novos
contratos foram formalizados no sector industrial e comercial, algo mais de 25% em
atividades manuais (crafts) e quase 15% em serviços públicos, serviços domésticos, na
agricultura e em profissões liberais.
9.
O sistema dual alemão oferece atualmente programas para cerca de 350 profissões
diferentes. Dos 344 programas oferecidos em 2012, quase 75% tinham uma duração
de entre 30 e 36 meses, algo mais de 15% de 42 meses e algo mais de 10% de entre 18
e 24 meses. Nos últimos anos, as três profissões/programas com maior número de
contratos de aprendizagem pertencem a sectores comerciais e de serviços às
143
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
empresas (em escritórios): empregado de escritório da área comercial, vendedor e
empregado de escritório.
10. Em 2011, dos 2,1 milhões de empresas alemãs à volta de 455.000 estiveram envolvidas
em programas de formação, o que se traduz num rácio de participação de 21,7%. 83%
das empresas formadoras participaram em programas de formação dual. Em 2012,
aproximadamente 55% dos aprendizes foram contratados (estagiaram) por grandes e
médias empresas, algo mais de um quarto por pequenas empresas e os restantes
quase 20% por micro empresas. Em média, entre 2011 e 2013, 59% dos aprendizes que
concluíram satisfatoriamente os programas duais foram contratados pela empresa
onde desenvolveram a sua formação.
11. Em 2012, a remuneração média mensal de um aprendiz foi de €737. Em termos
médios, um aprendiz recebeu mensalmente €664 no primeiro ano de formação, €731
no segundo, €812 no terceiro e €851 no quarto. No ano académico 2012-2013, os
custos brutos médios por aprendiz do sistema dual foram de €17.933, enquanto os
seus retornos médios atingiram os €12.535. Os custos líquidos por aprendiz para as
empresas participantes foram de €5.398.
12. O sistema dual alemão apresenta diversas vantagens. Para os alunos, especialmente
para aqueles que não tencionam prosseguir estudos, o sistema permite-lhes obter um
grau académico seguindo um programa com uma forte orientação prática, recebendo
uma remuneração, bem como melhorar as suas oportunidades de inserção no
mercado de trabalho. O sistema dual permite às empresas: i) minimizar o risco de
escassez de mão-de-obra especializada; ii) reduzir os custos de integração dos recémcontratados; iii) fidelizar os aprendizes à empresa; e, iv) melhorar os processos de
recrutamento e seleção, dado que se reduz o gap informacional entre a empresa e o
candidato-trabalhador.
13. Apesar das suas reconhecidas virtudes, o sistema dual alemão apresenta um conjunto
de problemas, alguns dos quais têm-se agudizado nos últimos anos, nomeadamente: i)
a escassez de vagas para aprendizes nas empresas; ii) a grande variabilidade da
qualidade da orientação vocacional/profissional; iii) o menosprezo pela aquisição de
conhecimentos académicos e a escassa preparação do sistema para avaliá-los; iv) o
desincentivo ao empenho dos estudantes na componente escolar; v) as grandes
assimetrias em termos de reconhecimento dos programas; vi) a escassa capacidade de
144
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
reação do sistema perante o surgimento de novas ocupações; e, vii) a dificuldade das
empresas de menor dimensão para cumprir a componente de formação em contexto
de trabalho de alguns programas.
14. O sistema educativo português é constituído por cinco níveis hierarquizados: i) a
educação pré-escolar; ii) o ensino básico; iii) o ensino secundário; iv) o ensino póssecundário não superior; e, v) o ensino superior. O ensino secundário compreende um
conjunto de vias consideradas principais: i) os cursos científico-humanísticos; ii) os
cursos com planos próprios; iii) os cursos artísticos especializados; iv) os cursos
profissionais; v) o ensino secundário recorrente; e, vi) os cursos vocacionais.
Adicionalmente existe uma oferta no âmbito do sistema de aprendizagem, tutelado
pelo IEFP. Acrescem ainda outras ofertas com menor expressão, tais como os cursos de
educação e formação ou outras iniciativas orientadas para a educação e formação de
adultos, designadamente os cursos EFA, as formações modulares e os processos RVCC.
15. Em Portugal, o regime mais próximo do sistema dual alemão de formação profissional
é o sistema de aprendizagem, criado em 1984. Este sistema surgiu como uma
alternativa ao sistema de formação tradicional, com a finalidade de apoiar a
qualificação e certificação dos jovens que, por diversos motivos, abandonavam
precocemente o sistema de ensino.
16. Para além do sistema de aprendizagem, no sistema educativo português, existem um
conjunto de modalidades com uma orientação profissionalizante. Em termos
quantitativos, a mais relevante são os cursos profissionais, ligados desde o seu
lançamento às escolas profissionais, criadas em 1989. As escolas profissionais tiveram
o monopólio dos cursos profissionais até ao ano académico 2004-2005, dado que
nesse ano passaram a ser oferecidos também nas escolas secundárias públicas.
17. A expansão dos cursos profissionais alterou a orientação do ensino secundário
português. Na última década, o peso dos cursos profissionais no ensino secundário
tem vindo a aumentar sistematicamente, até atingir quase 30% dos alunos inscritos
em 2013, face aos 9% de 2003.
18. O crescimento do ensino profissionalizante, nomeadamente dos cursos profissionais,
foi impulsionado pelas condições de oferta e não tanto pela procura real. A expansão
da oferta não respondeu a num interesse real em promover a formação profissional; a
145
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
promoção desta via no ensino público foi uma forma de alterar a realidade do sector
educativo, aproximando-a artificialmente dos padrões de alguns países europeus.
19. No ano académico 2012-2013, as principais modalidades de ensino profissionalizante,
os cursos profissionais e os cursos de aprendizagem, representavam mais de 95% do
total. Nesse ano, o peso conjunto dos alunos matriculados nessas modalidades no
universo do ensino secundário aproximou-se dos 38%.
20. O atual sistema de formação profissional português é complexo, existindo zonas de
sobreposição que tornam difícil as escolhas dos alunos e as leituras das empresas. O
sistema caracteriza-se também pela diversidade de programas e currículos. A oferta de
cursos encontra-se parcialmente desligada das necessidades do mercado de trabalho e
responde a outras lógicas, na maioria dos casos, relacionadas com a capacidade
instalada nas escolas.
21. O sistema de formação profissional português apresenta numa fraca ligação ao tecido
empresarial, em parte pela falta de predisposição das empresas para acolher alunos,
mas também pela falta de cultura de colaboração dos agentes do sector educativo. O
envolvimento das empresas noutras dimensões, tais como a monitorização do
mercado de trabalho ou a elaboração dos programas é marginal.
22. Existe uma profunda estigmatização do ensino profissional em Portugal derivada das
representações sociais dominantes na sociedade portuguesa, da origem e história dos
cursos profissionalizantes e de questões relacionadas com os diferenciais de
remuneração. Apesar da vigência desse estigma social, nos últimos tempos, tem-se
assistido a uma mudança de perceção sobre estas modalidades de ensino.
23. A formação profissional de nível secundário desempenha um papel de grande relevo
em alguns países europeus, quer em termos educativos quer em termos de
preparação para enfrentar o mercado de trabalho. A capacidade dos sistemas de
formação profissional dual, especialmente do alemão, para elevar os níveis gerais de
educação e garantir a inserção dos jovens no mercado de trabalho tem despertado o
interesse de governos de diversos países, que procuram incorporar alguns dos seus
princípios às suas próprias realidades.
24. O governo português tem mostrado interesse em conhecer e transferir a experiência
alemã para o país, incorporando uma ou várias modalidades duais no sistema de
formação profissional nacional. A potencial incorporação de cursos de inspiração dual
146
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
pode ser uma boa oportunidade para reformar o sistema que aglutina as modalidades
profissionalizantes, tornando-o mais simples, mais eficiente e mais orientado para o
mercado.
25. Os principais argumentos para reformar o sistema de formação profissional em
Portugal, aprofundando a dualização dos programas, são reduzir o atraso educativo
(especialmente no nível secundário, 19% da população adulta face a 44% da OCDE) e o
desemprego jovem do país (entre 32,5% e 37,5%, dependendo do nível de estudos).
26. O reduzido número de adultos com estudos secundários está relacionado, entre outros
fatores, com: i) a elevada taxa de abandono escolar precoce que afetou o país durante
décadas; ii) a presença marginal dos cursos de formação profissional no ensino
público, até 2004; iii) a escassa atratividade dos cursos de formação profissional; iv) o
elevado retorno da educação superior; e, v) os baixos salários dos técnicos médios
pagos pelas empresas.
27. O elevado desemprego jovem associa-se, fundamentalmente: i) à queda dos níveis de
atividade económica dos últimos anos (transversal); ii) à configuração institucional do
mercado laboral português; e, iii) à organização do sistema de ensino e ao perfil do
sistema de formação profissional.
28. Para além dessas motivações de amplo espetro, existem outras razões para reformar o
sistema de formação profissional português, nomeadamente: i) o incremento da
eficiência do sistema; ii) a melhoria do aproveitamento escolar e, portanto, a redução
do insucesso; iii) a melhoria de transição dos alunos para o mercado do trabalho; iv) a
adequação às necessidades do tecido empresarial; v) a melhoria do match entre oferta
e procura de trabalho, e, inclusivamente; vi) a melhoria da sociedade portuguesa ou o
futuro do País.
29. Nas últimas décadas, o sistema dual alemão tem sido alvo de várias tentativas de
transferência em diversos países, contudo, em geral, os resultados obtidos têm ficado
bastante aquém das expetativas iniciais. A dificuldade para transferir este sistema
deriva da impossibilidade de replicar os seus alicerces e das diferenças no grau de
aceitação do mesmo em termos sociais. Embora não seja possível importar
diretamente o sistema alemão, algumas dimensões tais como o envolvimento das
empresas, a concertação entre agentes sociais e institucionais, a estandardização de
147
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
programas ou a certificação podem ser alvo de uma transferência adaptada, tendo em
consideração a realidade de destino.
30. Ainda que na realidade não exista um sistema de formação profissional modelo, na
literatura académica e técnica tem havido a preocupação de sistematizar um conjunto
de aspetos-chave, partilhados pelos sistemas com melhores resultados. Uma reforma
abrangente e profunda de um sistema de formação profissional deverá tê-los em
consideração para evitar eventuais erros que condicionem os objetivos traçados e os
resultados esperados.
Das conclusões do estudo resulta que embora não seja possível transferir o sistema dual
alemão diretamente, uma eventual reforma do sistema de formação profissional em Portugal
poderia incorporar alguns dos seus princípios e abordagens. Atendendo ao nível de
maturidade do atual sistema, a questões culturais, ao enraizamento dos interesses instalados e
às especificidades económico-empresariais do país, uma proposta de migração completa do
sistema vigente para um de inspiração dual é completamente irrealista.
A eventual reforma do sistema de formação profissional, assente na adoção de princípios
duais, poderia ser afrontada de duas formas. A primeira consiste em dualizar a oferta atual,
promovendo uma maior participação empresarial, sobretudo ao nível da oferta de estágios, e
aumentando o peso da componente de formação em contexto de trabalho. A experiência dos
últimos anos revela que apesar das boas intenções neste domínio, sem mudanças estruturais
na configuração e filosofia do sistema, os resultados efetivos ficam muito aquém dos
inicialmente esperados. A segunda consiste em permitir a convivência de um sistema baseado
na escola, nos moldes atuais, com um sistema dual adaptado à realidade portuguesa, criado a
partir de modalidades atualmente em funcionamento. Atendendo à informação qualitativa
proporcionada pelos stakeholders e os peritos participantes no estudo esta poderia ser a
melhor forma de avançar na dualização do sistema de formação profissional em Portugal.
Algumas experiências consolidadas nos últimos anos, tais como as que protagonizam os
estudos de caso, confirmam os bons resultados dos programas de base dual em Portugal, bem
como as suas vantagens para os diversos agentes envolvidos.
Com independência de qual for a opção adotada para dualizar o sistema, existem um conjunto
de recomendações, baseadas na literatura internacional e nas diversas perspetivas obtidas no
âmbito deste estudo, que deveriam servir para informar decisões de política pública nesta
148
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
matéria. Note-se que, embora as recomendações tenham caráter geral, têm uma aplicação
mais direta no caso da criação de um sistema de base dual que conviva/compita com o sistema
baseado na escola, atualmente em funcionamento. Concretamente, as principais
recomendações a reter no âmbito de uma reforma do sistema de formação profissional em
Portugal são as seguintes:
1.
Assegurar o acordo prévio entre as esferas educativa e laboral, sobretudo a nível da
administração, para garantir a convergência dos sistemas de educação e formação e de
aprendizagem;
2.
Aprovar um quadro institucional e regulamentar sólido e estável, que defina o
enquadramento institucional e as condições legais de funcionamento dos programas;
3.
Promover um amplo consenso dos agentes envolvidos: sistema educativo (dirigentes
educativos, professores), alunos, associações empresariais e empresas, sindicatos e
administração. Na configuração final do sistema devem estar claramente definidas as
responsabilidades das várias partes envolvidas;
4.
Garantir um elevado grau de compromisso da administração para promover o
entendimento entre os diferentes parceiros envolvidos, bem como para impulsionar e
consolidar plataformas de colaboração bidirecional, que permitam a operacionalização
do sistema (fundamentalmente entre empresas e escolas e centros de formação
profissional), mediante a integração de trabalhadores com perfis profissionais
vocacionados para a organização e gestão do relacionamento entre as partes;
5.
Assegurar um forte compromisso das empresas, isoladamente e através das
associações empresariais, quer em termos organizacionais quer em termos
financeiros. O apoio das empresas na elaboração de programas, na oferta de estágios
de qualidade, no apoio aos formandos e no compromisso geral com o sistema são
elementos chave para o seu sucesso. Deve ser efetuado um trabalho de pedagogia
junto das empresas para que interiorizem a sua responsabilidade em matéria de
formação e assimilem os benefícios privados e sociais do seu envolvimento em
programas de base dual;
6.
Promover alguma concorrência entre fornecedores de formação (escolas e centros de
formação), ligando uma proporção (reduzida) do seu financiamento aos resultados
obtidos. Deve, sempre que possível, desligar-se o financiamento dos fornecedores de
149
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
formação do número de alunos, para evitar incentivos perversos nos resultados
escolares;
7.
Criar um sistema de incentivos que mobilize todas as partes envolvidas, tais como
reduções nos descontos para a Segurança Social e concessões de benefícios fiscais
para as empresas; financiamento adicional e melhores condições para as escolas
públicas e os centros de formação profissional com maior grau de envolvimento e
proatividade; remunerações moderadas para os alunos, ligando-as aos resultados das
avaliações periódicas;
8.
Unificar e reformar os mecanismos de acompanhamento do mercado de trabalho; a
identificação de perfis profissionais com procura em horizontes temporais de médio
prazo, tanto novos como existentes é fundamental para garantir o sucesso do sistema;
o envolvimento de empresas e associações empresariais, assim como a utilização de
uma metodologia de monitorização adequada são absolutamente cruciais;
9.
Estabelecer mecanismos de controlo de qualidade e avaliação, geridos por um
organismo independente, que incidam sobre a configuração e o funcionamento do
sistema. Concretamente, os fornecedores de formação e as empresas devem ser alvo
de apertados controlos de qualidade, os programas devem ser avaliados ex-ante e
durante o seu funcionamento e a formação em contexto de trabalho e a avaliação dos
alunos devem ser objeto de monitorização e avaliação permanente por parte das
entidades da tutela;
10. Assumir uma orientação pró-mercado e pró-qualidade que garanta o encerramento de
programas por desajustamento com o mercado ou falta de qualidade, quer dos
próprios programas quer dos parceiros envolvidos nos mesmos (escolas, centros de
formação ou empresas). Em algumas áreas devem existir exceções ao princípio da
orientação pró-mercado;
11. Melhorar a flexibilidade do sistema, de modo a que incorpore com rapidez as
tendências do mercado, sem descurar outras dimensões que devem orientar também
a oferta de programas e os conteúdos dos currículos;
12. Garantir níveis de financiamento suficientes que permitam dispor de material e
tecnologia apropriados e de docentes e tutores com elevados níveis de formação. O
financiamento do sistema deve permitir ultrapassar os problemas derivados das
características económico-empresariais da economia portuguesa, por exemplo,
150
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
garantindo a formação de consórcios de PMEs e assegurando a mobilidade dos
formandos em zonas de baixa densidade. No domínio do financiamento é de grande
importância mobilizar recursos privados que complementem os recursos públicos
disponíveis;
13. Reforçar os sistemas de informação e orientação profissional. Nestes sistemas devem
ser envolvidos, para além dos alunos, os responsáveis de educação, nomeadamente
para fins informativos;
14. Separar os cursos vocacionais dos cursos de formação profissional. Os cursos
vocacionais, nos moldes atuais, estão condenados ao fracasso. Os alunos com
problemas de desempenho devem ser alvo de medidas de acompanhamento e apoio
escolar, que lhes permitam concluir, pelo menos, o 9º ano de escolaridade.
15. Otimizar a oferta de cursos e assegurar que existe homogeneidade nos programas de
formação que correspondem aos mesmos perfis profissionais. Neste sentido, é
necessário centralizar a elaboração dos programas e a definição de conteúdos,
assegurando a participação de todos intervenientes no sistema. Os programas devem
fornecer tanto competências específicas como competências transferíveis, que possam
ser utilizadas pelos formandos em postos de trabalho com perfis profissionais
diferentes do que corresponde ao programa;
16. Garantir que os conteúdos da componente escolar são suficientes para o perfil
profissional em causa e para o prosseguimento de estudo, no seu caso;
17. Em termos operacionais, separar as duas componentes de formação. A formação em
contexto de trabalho deve acontecer depois da formação escolar, por questões do foro
organizativo tanto nas escolas e centros de formação como nas empresas;
18. Assegurar que os alunos cumprem requisitos mínimos de acesso e que os processos de
seleção são rigorosos. A qualidade dos alunos é uma condição sine qua non para o
sucesso do sistema;
19. Reforçar a certificação dos conhecimentos, habilidades e competências adquiridos,
tanto na componente escolar como na componente de formação em contexto de
trabalho. O fortalecimento dos processos de certificação contribuirá para incrementar
o valor das qualificações profissionais no mercado de trabalho;
151
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
20. Criar incentivos para que os professores do ensino secundário se envolvam ativamente
nos cursos de formação profissional de base dual;
21. Promover e desenvolver a figura do tutor nas empresas; diferenciar estes
trabalhadores do resto em termos remuneratórios, com o apoio do estado;
22. Facilitar a permeabilidade do sistema, tanto horizontal como vertical. Neste último
caso é especialmente importante garantir vias de acesso ao ensino superior, sempre
que garantidos os requisitos de acesso para evitar situações de falta de equidade face
aos cursos gerais para prosseguimento de estudos;
23. Reforçar a oferta de cursos de ensino secundário não terciário e garantir uma oferta
razoável de cursos superiores de caráter aplicado, em áreas como a engenharia
técnica, extrapolando princípios e experiências bem-sucedidas no domínio do ensino
dual superior, como por exemplo a da Suíça;
24. Apoiar experiências de formação profissional dual de caráter demonstrativo,
preferentemente já instaladas, em locais do país com tecidos empresariais
suficientemente densos;
25. Efetuar um acompanhamento permanente dessas iniciativas para garantir o seu
sucesso. Os bons resultados dessas experiências darão origem a efeitos arrastamento
noutros sectores e noutras regiões do país;
26. Desenvolver uma campanha promocional intensa e abrangente em meios de
comunicação e nas redes sociais (mais barata e com maior reach no público-alvo) para
contrariar o estigma social associado à formação profissional e difundir as vantagens
do sistema em termos formativos e de empregabilidade. Convém difundir também o
sucesso do sistema à medida que vai sendo implementado.
152
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Referências
153
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Referências
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157
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
158
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexos
159
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
160
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo I
Ofertas formativas minoritárias de nível básico e secundário
Percursos Curriculares Alternativos – Básico
Os percursos curriculares alternativos (PCA) destinam-se a jovens até aos 18 anos (inclusive)
com historiais de insucesso escolar ou em risco de abandono e com dificuldades de
aprendizagem e de integração na comunidade escolar.144 Estes jovens deverão apresentar,
ainda, o mínimo de duas retenções por ciclo. As idades de acesso são 13 anos, no caso do 2º
ciclo do ensino básico, ou 15 anos, no caso do 3º ciclo. Em termos de certificação os PCA
atribuem um certificado de conclusão do ano escolar e permitem o prosseguimento de
estudos, embora os alunos que optem pela via regular devam realizar as correspondentes
provas de final de ciclo. Está previsto que este tipo de programas venha a ser extinto a curto
prazo, dado que se trata de uma medida temporária e excecional, que apenas deve ser
utilizada em ausência ou depois de esgotar outras alternativas, nomeadamente os cursos
vocacionais.
Programa Integrado de Educação e Formação (PIEF) – Básico
O programa integrado de educação e formação (PIEF) foi especialmente formulado para evitar
o abandono escolar precoce de jovens com 15 ou mais anos, com percursos marcados por
várias retenções (três no mínimo) e dificuldades de inserção no meio escolar.145 A conclusão
da escolaridade obrigatória num percurso PIEF facilita o acesso a propostas educativas e
formativas de dupla certificação (escolar e profissional) ou de certificação profissional,
promovidas por entidades tuteladas pelo Ministério de Educação e Ciência ou pelo Instituto de
Emprego e Formação Profissional.
Competências Básicas – Básico
A formação em competências básicas (FCB), enquadrada no nível básico de ensino, destina-se
a adultos de idade igual ou superior a 18 anos, sem habilitações ao nível do 4º ano de
escolaridade ou que embora tenham concluído o 1º ciclo não tenham adquirido competências
básicas de leitura, escrita e cálculo.146 O programa possui uma duração variável de entre 150 a
300 horas e garante uma certificação para efeitos de frequência de cursos EFA (B1 ou B1 e B2)
ou Processos de RVCC de nível básico.
144
Regulamentados, inicialmente, pelo Despacho Normativo n.º 1/2006 de 6 de janeiro,
posteriormente alterado pelo Decreto-Lei n.º 139/2012 de 5 de julho, alterado, pela sua vez, pelo
Decreto-Lei n.º 91/2013 de 10 de julho.
145
Decreto-Lei n.º 139/2012 de 5 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/2013 de 10 de julho.
146
Portaria n.º 1100/2010, de 22 de outubro, alterada pela Portaria n.º 216-C/2012, de 18 de julho.
161
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Cursos de Educação e Formação (CEF) – Básico e Secundário
Os cursos de educação e formação (CEF) foram inicialmente criados para colmatar o risco de
abandono no ensino básico (sem conclusão do 9º ano) de jovens de entre 15 e 18 anos.147
Posteriormente, foram reestruturados com a finalidade de resolver problemas semelhantes no
nível secundário de ensino.148 O grupo alvo dos novos CEF passaram a ser tanto jovens com
idade igual ou superior a 15 anos em risco de abandono, como jovens que após a conclusão do
12º ano de escolaridade visem qualificar-se profissionalmente para iniciar uma atividade
laboral. Dado que os cursos de educação e formação podem aceitar candidatos com
habilitações muito diversas, que podem variar entre níveis de escolaridade mínima, inferior ao
6º ano, e o ensino secundário, estes cursos apresentam sete tipologias diferentes. As
diferentes tipologias de cursos de educação e formação apresentam durações (entre um e dois
anos) e percursos formativos diferentes. Desta forma, os cursos de educação e formação tipo 1
conferem qualificação de nível 1 (CEF tipo 1), os cursos de educação e formação tipos 2, 3 e 4 e
o curso de formação complementar conferem qualificação nível 2 e os cursos de educação e
formação tipos 5, 6 e 7 conferem qualificação nível 4. Com independência da sua tipologia, os
cursos de educação e formação possuem uma componente formativa sociocultural, científica,
tecnológica e prática e podem ser oferecidos em instituições do ensino público e particular,
centros de formação profissional do IEFP e entidades formadoras devidamente acreditadas.
Cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA) – Básico e Secundário
Os cursos de educação e formação de adultos (EFA)149 oferecem formação de dupla
certificação a adultos com idade superior a 18 anos e simultaneamente: i) não qualificados ou
sem qualificação que lhes permita integrar o mercado de trabalho; ii) que não tenham
concluído o ensino básico ou secundário; iii) ativos ou desempregados; iv) com inscrição válida
nos centros de emprego; v) ou referenciados nomeadamente por “empresas, ministérios e
sindicatos”. Os cursos EFA de nível secundário e em regime diurno aceitam unicamente
candidatos com mais de 23 anos (inclusive). Estes cursos garantem uma certificação escolar
correspondente aos 4.º, 6.º, 9.º ou 12.º anos de escolaridade e qualificação profissional
correspondente aos níveis 2 ou 4.150
147
Despacho Conjunto n.º 123/97, de 16 de junho.
Despacho Conjunto n.º 453/2004, de 27 de julho.
149
Portaria n.º 230/208, de 7 de março, alterada pela Portaria n.º 283/2011, de 24 de outubro.
150
Em determinados casos, dependendo do perfil do aluno, podem fornecer unicamente certificação
escolar.
148
162
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Formações Modulares – Básico e Secundário
A Formação Modular Certificada (FMC)151 prevê a formação contínua de adultos ativos com
idade superior a 18 anos, que não tenham concluído o ensino básico ou secundário e não
possuam qualificações adequadas à sua (re) integração ou progressão no mercado laboral. Nas
formações modulares, os percursos formativos são desenvolvidos através da frequência de
Unidades de Formação de Curta Duração (UFCD), correspondentes a módulos que variam
entre 25 e 50 horas e integram os referenciais de formação do Catálogo Nacional de
Qualificações (CNQ). Os cursos efetuados através de UFCD podem variar entre as 25 e as 600
horas de formação e conferem certificação escolar (ao nível do ensino básico ou secundário) e
profissional (níveis 2 e 4 de qualificação, respetivamente). Em cursos baseados em UFCD com
duração superior a 300 horas, um terço das UFCD devem integrar a componente de formação
de base do respetivo referencial. No caso de que a formação modular permita obter uma
qualificação inserida no Catálogo Nacional de Qualificações, as UFCD devem ser validadas por
uma Comissão Técnica habilitada para o efeito, em exercício nos Centros para a Qualificação e
o Ensino Profissional (CQEP). Este tipo de formações permitem o prosseguimento de estudos
superiores, sempre que cumpridos os requisitos legais em vigor.
Processos de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) – Básico e
Secundário
Os processos Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) destinam-se
a adultos entre os 18 e os 23 anos (inclusive), empregados ou desempregados, que precisem
obter ou reforçar os conhecimentos e competências adquiridos ao longo da vida em situações
formais, não formais ou informais de aprendizagem. Para poder aderir a estes processos é
fundamental que os candidatos possuam no mínimo 3 anos de experiência profissional. Os
processos RVCC desenvolvem-se atualmente em Centros para a Qualificação e o Ensino
Profissional (CQEP).152 Estes processos estão organizados através de um sistema flexível de
horários e duração e oferecem aos adultos a possibilidade de enveredarem por um RVCC
escolar, profissional ou ambos em simultâneo.
151
152
Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, alterado pelo Decreto-Lei n.º 91/2013, de 10 de julho.
Portaria n.º 135-A/2013, de 28 de março.
163
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Vida Ativa
A Medida Vida Ativa – Emprego Qualificado153 criou-se com a finalidade de potenciar a (re)
integração laboral de jovens e adultos desempregados (independentemente do seu nível de
escolarização), inscritos nos Centros de Emprego do IEFP há pelo menos 6 meses e
beneficiários ou não de apoios sociais, mediante a aquisição ou o reforço de competências
(tecnológicas, gerais e específicas, pessoais e empreendedoras). Desenvolvida através de
percursos de formação modular, formação prática em contexto laboral ou processos RVCC,
abrange inclusivamente licenciados desempregados, que careçam de formação adequada para
serem integrados no mercado de trabalho atual.
A formação associada à Vida Ativa organiza-se preferencialmente em regime laboral e com
uma carga semanal não superior a 28 horas, sendo obrigatório que durante o período
formativo os formandos procurem emprego ativamente. A formação poderá decorrer em
centros de emprego e centros de formação do IEFP, escolas públicas e privadas, outras
entidades devidamente acreditadas e, inclusivamente, em instituições de ensino superior. O
tipo de certificação varia em função dos cursos, podendo incluir a atribuição de um certificado
de qualificações ou de um certificado de formação profissional.
Vias de conclusão do nível secundário de educação – Secundário
Estas vias de conclusão estão disponíveis para adultos com 18 ou mais anos que frequentaram
(sem concluir) cursos cientifico-humanísticos ou profissionais entre os anos letivos 1972/73 e
2003/04.154 Dado que os planos de estudo frequentados foram extintos, as vias de conclusão
do nível secundário possibilitam a permuta de um máximo de 6 unidades curriculares, através
da submissão aos exames das disciplinas dos cursos atuais (da mesma tipologia) ou da
frequência de unidades de formação de curta duração (UFCD).
Cursos Tecnológicos – Secundário
Os cursos tecnológicos (CT), criados em 1990, integraram o ensino secundário regular
juntamente com os cursos científico-humanísticos. Estes cursos têm sido gradualmente
substituídos pelos cursos profissionais introduzidos nas escolas públicas, o que se traduz num
número decrescente de alunos desde o ano académico 2004-2005, em que tinham quase
60.000 alunos inscritos. Estes cursos, com uma duração de 3 anos (correspondentes aos 10º,
11º e 12º anos de escolaridade), conferem um diploma de conclusão do ensino secundário a
par de uma qualificação profissional de nível 3. No ano letivo de 2013-2014, os CT deixaram de
admitir novas matrículas, não obstante estes programas continuarem a ter alunos inscritos
(perto de 6.000 em 2012-2013).
153
Portaria n.º 203/2013, de 17 de junho.
Decreto-Lei n.º 357/2007, de 29 de outubro, retificado pela Declaração de Retificação n.º 117/2007,
de 28 de dezembro.
154
164
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo II
Indicadores de definição dos níveis do Quadro Europeu de Qualificações (QEQ)
Níveis
Conhecimentos
Aptidões
Nível 1
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 1
Nível 2
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 2
Nível 3
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 3
Nível 4
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 4
Nível 5
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 5
Nível 6
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 6
Conhecimentos gerais
básicos
Conhecimentos
factuais básicos numa
área de trabalho ou
de estudo
Conhecimentos de
factos, princípios,
processos e conceitos
gerais numa área de
estudo ou de trabalho
Aptidões básicas necessárias à
realização de tarefas simples
Aptidões cognitivas e práticas
básicas necessárias para a
aplicação da informação
adequada à realização de tarefas
e à resolução de problemas
coerentes por meio de regras e
instrumentos simples
Uma gama de aptidões cognitivas
e práticas necessárias para a
realização de tarefas e a
resolução de problemas através
da seleção e aplicação de
métodos, instrumentos,
materiais e informações básicas
Competência
Trabalhar ou estudar sob
supervisão direta num contexto
estruturado
Trabalhar ou estudar sob
supervisão, com um certo grau
de autonomia
Assumir responsabilidades para
executar tarefas numa área de
estudo ou de trabalho. Adaptar
o seu comportamento às
circunstâncias para a resolução
de problemas
Conhecimentos
factuais e teóricos em
contextos alargados
numa área de estudo
ou de trabalho
Uma gama de aptidões cognitivas
e práticas necessárias para
conceber soluções para
problemas específicos numa área
de estudo ou de trabalho
Gerir a própria atividade no
quadro das orientações
estabelecidas em contextos de
estudo ou de trabalho,
geralmente previsíveis, mas
suscetíveis de alteração.
Supervisionar as atividades de
rotina de terceiros, assumindo
determinadas
responsabilidades em matéria
de avaliação e melhoria das
atividades em contextos de
estudo ou de trabalho
Conhecimentos
abrangentes,
especializados,
factuais e teóricos
numa determinada
área de estudo ou de
trabalho e
consciência dos
limites desses
conhecimentos
Uma gama abrangente de
aptidões cognitivas e práticas
necessárias para conceber
soluções criativas para problemas
abstratos
Gerir e supervisionar em
contexto de estudo ou de
trabalho, sujeitos a alterações
imprevisíveis. Rever e
desenvolver o seu desempenho
e o de terceiros
Aptidões avançadas que revelam
a mestria e a inovação
necessárias à resolução de
problemas complexos e
imprevisíveis numa área
especializada de estudo ou de
trabalho
Gerir atividades ou projetos
técnicos ou profissionais
complexos, assumindo a
responsabilidade da tomada de
decisões em contextos de
estudo ou de trabalho
imprevisíveis. Assumir
responsabilidades em matéria
de gestão e desenvolvimento
profissional individual e
coletivo
Conhecimento
aprofundado de uma
determinada área de
estudo ou de trabalho
que implica uma
compreensão crítica
de teorias e princípios
165
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Indicadores de definição dos níveis do Quadro Europeu de Qualificações [QEQ) (Cont.)
Níveis
Nível 7
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 7
Nível 8
Resultados de
aprendizagem
correspondentes ao
Nível 8
Conhecimentos
Aptidões
Competência
Conhecimentos
altamente
especializados, alguns
dos quais se
encontram na
vanguarda do
conhecimento numa
determinada área de
estudo ou de
trabalho, que
sustentam a
capacidade de
reflexão original e/ou
investigação.
Consciência crítica
das questões relativas
aos conhecimentos
numa área ou nas
interligações entre
várias
Aptidões especializadas para a
resolução de problemas em
matéria de investigação e/ou
inovação para desenvolver novos
conhecimentos e procedimentos
e integrar os conhecimentos de
diferentes áreas
Gerir e transformar contextos
de estudo ou de trabalho
complexos, imprevisíveis e que
exigem abordagens
estratégicas novas.
Assumir responsabilidades por
forma a contribuir para os
conhecimentos e as práticas
profissionais e/ou para rever o
desempenho estratégico de
equipas
Conhecimentos de
ponta na vanguarda
de uma área de
estudo ou de
trabalhos e na
interligação entre
áreas
As aptidões e as técnicas mais
avançadas e especializadas,
incluindo capacidade de síntese e
de avaliação, necessárias para a
resolução de problemas críticos
na área da investigação e/ou
inovação ou para o alargamento
e a redefinição dos
conhecimentos ou das práticas
profissionais existentes
Demonstrar um nível
considerável de autoridade,
inovação, autonomia,
integridade científica ou
profissional e assumir um firme
compromisso no que diz
respeito ao desenvolvimento
de novas ideias ou novos
processos na vanguarda de
contextos de estudo ou de
trabalho, inclusive em matéria
de investigação
Fonte: DG-EC (2008).
166
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo III
Memorando de Cooperação na Educação Vocacional e Profissional na Europa
No âmbito de um Conselho de Ministros com os Ministros de alguns dos Estados-Membros da
União Europeia, responsáveis pelos programas de educação e formação, celebrado em Berlim,
nos dias 10 a 12 de dezembro de 2012, os ministros reunidos acordaram assinar um
Memorando de Cooperação em Educação Vocacional e Profissional. Desta forma, os Ministros:
1.
Pretendem contribuir para a redução do desemprego jovem e promover o emprego
qualificado, assim como reforçar a competitividade através da realização de esforços
para implementar um sistema de ensino profissional dual;
2.
Concordaram que o sistema de educação profissional dual deve ser encarado como o
modelo de ensino vocacional e profissional na Europa;
3.
Realizarão esforços para aumentar a atração e a qualidade dos modelos de ensino
vocacionais e profissionais;
4.
Partilharam a opinião de que o ensino vocacional e profissional contribui
consideravelmente para o desenvolvimento do mercado de trabalho e da educação
europeus e traz benefícios para os sistemas de educação nacionais;
5.
Concordaram nos esforços para a modernização do sistema de educação vocacional e
profissional com o objetivo de apoiar novas formas de cooperação entre as empresas
envolvidas através do ensino profissional dual;
6.
Concordaram que o envolvimento de parceiros sociais e industriais é imprescindível
para o bom funcionamento do modelo de ensino vocacional e profissional,
indispensável para o mercado de trabalho;
7.
Partilharam da perspetiva de que a cooperação transfronteiriça e a aprendizagem
entre pares são fatores importantes para a modernização do ensino vocacional e
profissional dos vários países, ao abrigo da estratégia europeia de aprendizagem ao
longo da vida;
8.
Consideraram que a iniciativa constitui uma contribuição essencial para estabelecer e
implementar uma Aliança Europeia para a Aprendizagem, a qual foi anunciada pela
Comissão Europeia para dar continuidade a este Memorando;
9.
Concordaram em que devem focar-se em esforços que reúnam as seguintes cinco
linhas de ação:
-
Aumentar a atração e a qualidade do ensino vocacional e profissional,
Envolver os parceiros sociais e o sector privado como atores principais no
desenvolvimento do ensino vocacional e profissional,
Apoiar cada Estado-Membro na implementação do ensino vocacional e
profissional,
167
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
-
Aumentar a mobilidade no ensino vocacional e profissional como um contributo
para o desenvolvimento de um mercado de trabalho e educacional europeu,
- E, realizar esforços para a cooperação europeia no domínio do ensino vocacional
e profissional, utilizando as estruturas e os programas europeus de ensino.
10. Concordaram que as seguintes atividades e objetivos têm de ser implementados a
partir de 2013:
-
-
-
Estabelecer pelo menos 30 projetos piloto com o objetivo de criar ligações
profissionais regionais entre as empresas,
Provisionar 10 milhões de euros para financiar projetos pioneiros alemães que
estabeleçam parcerias e colaborações entre empresas em países parceiros,
Considerar o cofinanciamento entre os países parceiros para apoiar os próprios
projetos,
Desenvolver a rede EURES dentro de um contexto de estágios europeus e
reforçar o programa “Your First EURES Job” de acordo com o orçamento
disponível,
Realizar, pelo menos, dez visitas de estudo nos campos de ação do Memorando
em 2013/2014,
Utilizar o programa do novo ensino europeu e os fundos sociais para a
cooperação e a implementação do Memorando (a partir de 2014),
Aumentar o número de participantes para 2.000 pessoas por ano, se possível,
com origem em países parceiros, para que realizem longos períodos de formação
na Alemanha (incluindo professores e formadores), ao abrigo dos programas
europeus,
Iniciar a parceria Leonardo da Vinci ou a transferência de projetos de inovação
(através de seminários com os países parceiros),
Identificar um grupo de profissionais em ensino vocacional e profissional em
todos os países, incluindo um coordenador em cada caso,
E, definir uma plataforma de cooperação para assegurar os desenvolvimentos
futuros do desenvolvimento e cooperação e rever o progresso verificado no
âmbito deste Memorando.
Anexo – Campos de cooperação
Os Ministros concordaram em reforçar a cooperação e a modernização do ensino vocacional e
profissional na Europa. Serão desenvolvidas atividades conjuntas nas seguintes áreas com a
finalidade de atingir esse objetivo, nomeadamente:
1.
Tornar o ensino vocacional e profissional um ensino atrativo, de elevada preparação
profissional, baseado nas necessidades do mercado de trabalho.
2.
Envolver os parceiros sociais e o sector privado como intervenientes responsáveis pelo
ensino vocacional e profissional.
3.
Apoiar cada país parceiro na modernização do ensino vocacional e profissional.
168
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
4.
Aumentar a mobilidade no ensino vocacional e profissional com a finalidade de
promover o desenvolvimento do mercado de trabalho e educacional europeu.
5.
Unir esforços para a cooperação europeia nos campos do ensino vocacional e
profissional e fazer uso dos programas e estruturas da União Europeia.
169
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
170
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo IV
Esquema Comparativo dos Sistemas Educativos Português e Alemão
171
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Escolaridade Obrigatória (12 anos)
Escolaridade Obrigatória (9 anos)
Doutoramento [3 a 4 anos]
Gymnasium
Ensino Secundário
[até 12º/13º ano]
3º Ciclo (7º - 9º Ano)
Via Geral
Realschule
(5º - 10º ano)
Grundschule
Ensino Primário (1º - 4º ano)
172
[3 a 3,5
anos]
10º Ano
2º Ciclo (5º - 6º Ano)
1º Ciclo (1º - 4º Ano)
[3 a 3,5
anos]
Gymnasium
Cursos Científico-Humanísticos
Outras Vias (C. Artísticos Esp. …)
Estágio
[2,5 a 3 anos]
Secundário (10º - 12º ano)
-
Estágio
Formação
Profissional
[2 a 2,5
anos]
Especialização Tecnológica [1 a 1,5 anos]
Estágio
Licenciatura [3 ou 4 anos]
[2 a 2,5
anos]
Estágio
Mestrado [1,5 a 2 anos]
Ensino Técnico Dual
Hochschule
Universidade
[4 a 5 anos]
15
14
13
12
11
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
Alemanha
Ensino Dual
20
19
18
17
16
15
14
13
12
11
10
9
8
7
6
Portugal
Ensino
Superior
21
20
19
18
17
16
Educação
Secundária
Tempo
26
25
24
23
22
21
Educação
Básica
Idade
Figura AI – Esquema comparativo dos sistemas de educação e formação profissional em Portugal e na Alemanha, 2014
Hauptschule
(5º - 9º ano)
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo V
Guião das Entrevistas
Campus de Gualtar
4710-057 Braga – P
Escola de Economia e Gestão
Departamento de Economia
Guião Entrevistas Semi-Estruturadas
Estudo – POAT: Sistema Dual Alemão em Portugal
Instituição/Projecto: ____________________________________________________________
Nome do Entrevistado: __________________________________________________________
Cargo/Responsabilidade: ________________________________________________________
Questões orientativas
I.
II.
III.
IV.
V.
VI.
VII.
VIII.
IX.
Daquilo que conhece, como avalia a situação atual, em Portugal, do ensino
profissional, em geral, e do ensino profissional/vocacional dual, em particular?
Considera que os vários desenvolvimentos legislativos dos últimos anos irão contribuir
para a implementação/desenvolvimento efetiva/o de um sistema dual de ensino
profissional/vocacional em Portugal?
Quais são as principais limitações do regime jurídico do ensino profissional/dual
proposto?
Quais as principais vantagens?
Considera que a abordagem dual à formação profissional proposta é a melhor forma
de resolver os problemas de empregabilidade dos jovens portugueses, nomeadamente
dos jovens com pior desempenho escolar? Considera que o sistema conseguirá atrair
bons alunos, ultrapassando o estigma social associado à formação profissional?
Considera que o sistema dota realmente os jovens das competências necessárias para
enfrentar o mercado de trabalho (referência ao plano de estudos)?
Qual a melhor forma de compatibilizar a nova oferta de ensino dual com a oferta do
sistema de aprendizagem? Deveriam ambos os sistemas ser integrados?
Em relação ao sistema de aprendizagem, tutelado pelo IEFP, quais considera serem as
principais vantagens e os principais inconvenientes?
Em termos gerais, com independência dos desenvolvimentos legislativos recentes,
considera que a aproximação ao sistema dual baseada na escola é a mais adequada ou
que esta deveria conviver com uma via dual a partir da empresa (onde houvesse
173
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
X.
XI.
XII.
inclusivamente um contrato de trabalho de formação/aprendizagem entre as
empresas e os alunos, configurando-se, desta forma, uma via mais próxima das do
modelo alemão)?
Em termos gerais, considera haver alguma vantagem na incoporporação de um
sistema dual no sistema de educação e formação português? Quais?
Que inconvenientes antevê que podem derivar de um sistema deste tipo? Quais
considera que serão as principais dificuldades de implementação em Portugal?
Quais as ameaças derivadas da implementação de um sistema como este para o -------?
174
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo VI
Listagem de Participantes nas Entrevistas
Nome
Prof. Dr. David
Justino
Entidade
CNEDU – Conselho Nacional de Educação
Responsabilidade
Presidente
Dra. Marina Peliz
CNEDU – Conselho Nacional de Educação
Assessora Técnica
Dr. José Luís Presa
ANESPO – Associação Nacional de Escolas
Profissionais
Presidente
Dr. Adelino Calado
ANDAEP – Associação Nacional de Diretores de
Agrupamentos e Escolas Públicas
Presidente da Mesa da
Assembleia Geral
Dra. Ana Paula Filipe
IEFP – Instituto de Emprego e Formação
Profissional
Diretora Departamento de
Formação
Dra. Sandra
Bernardo
IEFP – Instituto de Emprego e Formação
Profissional
Diretora de Serviços de
Qualificação
Dr. Hans-Joachim
Böhmer
AHK – Câmara de Comércio e Indústria LusoAlemã
Diretor Executivo
Dr. António
Marques
CIP – Confederação Empresarial de Portugal
Vice-Presidente do Conselho
Geral; Vogal da Direção
Dra. Margarida
Gomes da Silva
ATEC – Formação Profissional
Administradora Técnica
Dra. Cátia Rocha
ATEC – Formação Profissional
Responsável de Comunicação
Institucional
Dr. Elísio Silva
DUAL-CCILA – Qualificação Profissional
Diretor Geral
Dr. Luís Caseiro
Toyota Caetano Portugal
Diretor de Formação
175
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
176
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Anexo VII
Listagem de Peritos Internacionais Participantes
Nome
Prof. Dr.
Andreas
Saniter
Prof. Dr.
Christian
Sperle
Id
Entidade
Responsabilidade
Perito I
Universidade de
Bremen
[Universität Bremen]
Investigador do Instituto de Tecnologia e Educação
[Institut Technik und Bildung (ITB)]
Perito II
Confederação Alemã de
Atividades Manuais
[Zentralverband des
Deutschen Handwerks]
Diretor da Unidade de Políticas Europeias de Educação e
Formação Profissional e de Estratégias de Aprendizagem ao
Longo da Vida
Representante Alemão para a Formação Profissional em
UEAPME
177
Sistema Dual Alemão de Formação Profissional – Incorporação em Portugal
Núcleo de Investigação em Políticas Económicas – NIPE
Escola de Economia e Gestão – EEG
Universidade do Minho – UM
Citação:
Carballo-Cruz, F., Cadima Ribeiro, J. e R.B. Esteves (2015), O Sistema de Formação Profissional
Dual Alemão: Determinação das Potencialidades e Entraves da sua Eventual Incorporação ao
Sistema de Formação Profissional Português, Relatório Técnico para o Programa Operacional de
Assistência Técnica do Fundo Social Europeu, Lisboa: POAT-FSE.
178
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Estudo - Programa Operacional de Assistência Técnica