PRINCESA SELVAGEM – Annie
West
Um príncipe regente…uma princesa
relutante.
Raul, o príncipe de Maritz, não aceita ser
subjugado a uma lei arcaica que o obriga
a casar. Entretanto, escândalos e
distúrbios se tornaram rotina em sua vida.
Somente a união com a princesa Luisa
Hardwicke trará estabilidade à monarquia.
Mas Luisa é uma mulher franca, criada
em fazenda, bem longe dos luxos da
realeza. Ela não tem medo de se sujar
para concluir suas tarefas e nem de expor
o que pensa. Transformada em uma
dama da corte à força, Luisa desafiará o
príncipe a todo o momento…e fará Raul
desejar cada vez mais a noite de núpcias
com sua rainha.
O PREÇO DO SUCESSO – Maya
Blake
Ela só pensava em vencer…ele só
queria possuí-la.
Dono da escuderia Espiritu, Marco de
Cervantes achava que sabia exatamente o
que se passava na bela cabecinha de
Sasha Fleming. Ela certamente não
poderia se considerar superior por ser a
primeira mulher a fazer parte da equipe
de corredores! O problema é que a
campeã das pistas não tem nenhum
interesse em se tornar uma esposa-troféu.
Ela só pensa em subir ao pódio e provar
para todos o seu valor. Entretanto, Marco
está acostumado a conseguir o que
deseja, e não aceitaráum “não” como
resposta.
Querida leitora,
Quando duas mulheres geniosas e
decididas encontram dois homens
fortes e poderosos, o resultado só pode
ser explosivo.
Em Princesa selvagem, de Annie
West, o príncipe Raul terá que usar
todo o seu poder de sedução para
convencer a rebelde Luisa a ser sua
rainha. Ela está bastante relutante, o
que deixa Raul cada vez mais
apaixonado.
Em O preço do sucesso, de Maya
Blake, Sarah Fleming fará de tudo para
vencer. Até mesmo se subjugar às
regras do implacável Marco de
Cervantes, ainda que seja difícil resistir
a esse atraente magnata.
Boa leitura!
Equipe Editorial Harlequin Books
Annie West
Maya Blake
ESCÂNDALO &
SUCESSO
Tradução
Deborah Mesquita de Barros
Joana Souza
2014
SUMÁRIO
Princesa selvagem
O preço do sucesso
Annie West
PRINCESA SELVAGEM
Tradução
Deborah Mesquita de Barros
CAPÍTULO 1
RAUL OLHAVA,
sem ver nada, para o
lado de fora do helicóptero que saíra de
Sidney e seguia a costa sul. Não deveria
estar ali, quando a situação em casa
estava tão delicada. Mas não possuía
escolha.
Que confusão!
Suas mãos se fecharam em punhos,
enquanto ele movimentava as pernas,
agitadamente.
O destino de sua nação e o bem-estar
de seus súditos estavam em risco. Sua
coroação, seu direito a herdar o reinado
para o qual ele tinha nascido e
devotado sua vida, era incerta. Mesmo
agora, ele mal podia acreditar nisso.
Desesperadamente, os advogados
haviam procurado um caminho legal
após outro, mas as leis de herança não
podiam ser mudadas, não até que ele se
tornasse rei. E para se tornar rei...
A alternativa era ir embora e deixar
seu país vítima das rivalidades que
tinham se tornado perigosas sob o
último rei, o pai de Raul. Uma guerra
civil quase dividira o país, duas gerações
atrás. Raul precisava proteger seu povo
disso, independentemente do custo
pessoal.
Seu povo, sua necessidade de
trabalhar por eles, o fizera superar o
mar de desilusões, quando seu mundo
se tornara amargo, anos atrás. Quando
paparazzi
fizeram
escândalo
e
insinuações, e seus sonhos haviam
desmoronado ao seu redor, o povo de
Maritz o apoiara.
Raul deveria apoiá-los agora, quando
eles mais precisavam dele. Ademais, a
coroa era sua. Não apenas por direito
de primogenitura, mas também por
cada dia, cada hora que ele devotara às
responsabilidades da realeza.
Ele não renunciaria à sua herança.
Ao seu destino.
A raiva o percorreu. Apesar da
dedicação de uma vida inteira à nação,
apesar de sua experiência e capacidade,
tudo se reduzira à decisão de uma
estranha.
O fato de que seu futuro, o futuro de
seu país, dependia desta visita feria seu
orgulho.
Raul
abriu
o
relatório
do
investigador, procurando detalhes
familiares.
Luisa Katarin Alexandra Hardwicke,
24 anos, solteira. Independente.
Ele desejou que o arquivo contivesse
uma foto da mulher que faria um papel
tão importante em sua vida.
Fechou o relatório.
Não importava a aparência dela. Raul
não era fraco como seu pai. Aprendera
que beleza podia mentir. Emoções
faziam um homem de tolo. Raul
regrava sua vida, assim como seu
reinado, com a cabeça.
Luisa Hardwicke era a chave para
proteger seu reinado. Ela podia ser feia
como o pecado, e isso não faria
diferença.
A VACA se mexeu, quase derrubando
Luisa. Cansada, ela lutou para
recuperar o equilíbrio no lamaçal à
beira do riacho.
Tinha sido uma manhã longa com
ordenha logo cedo, problemas com o
gerador e um telefonema inesperado do
gerente do banco. Ele mencionara uma
inspeção na propriedade que soava
ameaçadoramente como um primeiro
passo para a execução hipotecária.
Ela tremeu. Eles tinham lutado por
tanto tempo para manter a pequena
fazenda
cooperativa
funcionando
através das secas, doenças e enchentes.
Certamente, o banco não poderia lhes
negar ajuda agora. Não quando eles
tinham uma chance de reverter a
situação.
O barulho de um helicóptero soou
acima. A vaca agitou-se.
– Turistas? – disse Sam. – Ou você
estava escondendo alguns amigos
prósperos?
– Bem que eu gostaria! – Os únicos
que ela conhecia com tanto dinheiro
eram os bancos. A ansiedade a
percorreu. O tempo para a cooperativa
estava acabando.
Inevitavelmente, sua cabeça voltouse para aquele outro mundo que ela
conhecera tão brevemente. Onde
dinheiro não era objeção. Onde riqueza
era uma realidade certa.
Se ela escolhesse, poderia estar lá
agora, uma mulher rica sem uma única
preocupação financeira na vida. Se
tivesse colocado riqueza antes de amor
e integridade, e vendido sua alma
naquele acordo do demônio.
Somente o pensamento lhe causava
náuseas.
Preferia estar ali, na lama,
enfrentando falência, com pessoas que
amava, do que estar milionária, se isso
significasse desistir de sua alma.
– Pronto, Sam? – Luisa forçou-se a se
concentrar. Pressionou seu ombro
contra a vaca. – Agora! Devagar e com
firmeza.
Finalmente, entre os dois, eles
conseguiram desatolar o animal e
movê-lo na direção certa.
– Ótimo. – Luisa ofegou. – Só mais
um pouco e... – Suas palavras foram
abafadas
quando
o
helicóptero
apareceu acima da colina.
A vaca se assustou, colidindo com
Luisa. Ela balançou, agitando os braços,
então tombou para a frente, caindo. A
lama sujou-a do rosto aos pés.
– Luisa! Você está bem? – Seu tio
parecia mais preocupado do que
divertido.
Ela levantou a cabeça e viu a vaca
andando para o solo firme, sem olhar
para trás. Atordoada, Luisa ajoelhou-se
na terra encharcada, então ficou de pé.
– Perfeito. – Ela esfregou o rosto,
tentando limpá-lo. – Dizem que lama é
boa para pele, não é? – acrescentou e
sorriu para Sam. – Talvez nós
devêssemos engarrafar esta lama e
tentar vendê-la como tônico para pele.
– Não ria, garota. Talvez, tenhamos
de chegar a isso.
DEZ MINUTOS depois, com o rosto duro
pela lama seca, Luisa deixou Sam e
andou para sua casa. Sua mente estava
no telefonema daquela manhã. A
situação financeira deles parecia
assustadoramente ruim.
Ela movimentou os ombros rígidos.
Pelo menos, um banho estava a
minutos de distância. Depois, uma
xícara de chá e...
Luisa diminuiu o ritmo dos passos
quando chegou ao topo do morro e viu
um helicóptero no gramado atrás da
casa. Metal e vidro brilhavam ao sol.
Era uma aeronave cara e sofisticada...
um contraste total com as velhas tábuas
da casa, e com o galpão antigo que mal
cobria o trator, e com seu sedan
enferrujado.
O medo a envolveu e um peso
instalou-se em seu estômago. Aquela
podia ser a inspeção que o banqueiro
mencionara? Tão rápido?
Não, o banco não desperdiçaria
dinheiro num helicóptero, pensou ela
com lógica.
Uma figura apareceu atrás do
helicóptero e Luisa parou.
O sol silhuetava um homem alto,
magro e elegante. O epítome da
masculinidade urbana.
Ela podia distinguir cabelos escuros,
um terno que provavelmente custava
mais do que o trator e seu carro, juntos,
além de um incrível par de ombros.
Então, ele se virou e andou alguns
passos, falando com alguém atrás do
helicóptero. O corpo másculo movia-se
com uma graça que falava de poder.
A pulsação de Luisa acelerou.
Definitivamente, não um banqueiro.
Não com aquele corpo atlético.
Ele estava de perfil, agora. Testa alta,
nariz aristocrata, boca esculpida e
queixo firme. Luisa leu determinação
naquele maxilar sólido, e nos gestos
decisivos dele. Determinação e alguma
coisa desafiadoramente masculina.
Um calor percorreu seu corpo.
Consciência.
Ela
respirou
fundo.
Nunca
experimentara uma atração tão
instantânea antes. Não pôde reprimir
sua reação perturbadora.
Apesar das roupas elegantes, o
homem parecia... perigoso.
Luisa abafou uma risada. Perigoso?
Ele provavelmente desmaiaria se sujasse
seus sapatos polidos de lama.
Atrás da casa, jeans surrado, camisas
desgastadas e meias grossas estavam
pendurados no varal. Ela fez uma
careta. O homem, que parecia ter saído
de uma revista, não poderia estar mais
fora de lugar. Ela se forçou a se
aproximar.
Quem era ele?
– Posso ajudá-lo? – Sua voz soou
rouca. Luisa assegurou-se que isso não
tinha nada a ver com o impacto do
olhar enigmático dele.
– Olá. – Ele sorriu.
Ela tremeu. Ele
era lindo.
Impossivelmente lindo de um jeito
muito masculino. Com olhos brilhantes
e intrigantes. E uma covinha sexy no
queixo.
Luisa engoliu em seco e forçou um
sorriso.
– Você está perdido? – Ela se
distanciou alguns passos. Precisou
inclinar o queixo para fitá-lo nos olhos.
– Não, não perdido. – A voz
profunda tinha um leve sotaque
estrangeiro. – Eu vim falar com srta.
Hardwicke. Estou no lugar certo?
Luisa franziu o cenho, perplexa.
Aquela era uma pergunta retórica.
Desde o tom de voz seguro até a
postura fácil, como se ele fosse o dono
da fazenda, e ela a intrusa, o homem
irradiava confiança. Com um aceno da
mão, ele parou a aproximação de uma
figura robusta rodeando o canto da
casa. O olhar dele voltou-se para a
propriedade, como se esperando mais
alguém.
– Você está no lugar certo.
Ela olhou da figura atrás da casa, cuja
postura cautelosa indicava que era um
guarda-costas, para o helicóptero, onde
o piloto fazia uma checagem do
equipamento. Outro homem de terno
estava ali perto, falando ao telefone. Os
três homens olhavam para ela. Alertas.
Quem eram aquelas pessoas? Por que
estavam lá?
A apreensão a envolveu. Pela
primeira vez desde sempre, sua casa
pareceu perigosamente isolada.
– Você tem negócios aqui? –
perguntou ela.
O instinto, e o ar de comando do
estranho, disse-lhe que aquele homem
não tinha nada a ver com o gerente do
banco local.
– Sim, eu preciso falar com srta.
Hardwicke. – Ele a olhou, então
desviou o olhar. – Sabe onde posso
encontrá-la?
Alguma coisa naquele único olhar
para seu rosto, nem uma vez descendo
para suas roupas sujas, deixou-a
envergonhada. Não apenas da lama,
mas do fato de que, mesmo limpa e no
seu melhor traje, ela se sentiria sem
classe.
Luisa endireitou a coluna.
– Você a encontrou.
Desta vez, ele realmente olhou-a.
Com uma intensidade que a aqueceu
inteira. Os olhos do homem se
arregalaram, e ela viu que eram verdes.
Do tom profundo de esmeraldas. Luisa
viu choque na expressão dele. E, podia
ter jurado, horror.
Segundos depois, ele mascarara as
emoções, tornando o semblante
inexpressivo. Apenas uma sobrancelha
preta erguida sugeria que ele não estava
feliz.
– Srta. Luisa Hardwicke?
Ele pronunciou seu nome do jeito
que sua mãe fazia, com aquele sotaque
cantado que transformava o mundano
em alguma coisa bonita.
Um pressentimento arrepiou a nuca
de Luisa. O sotaque tinha de ser uma
coincidência. Aquele outro mundo
estava fora de seu alcance agora.
Luisa limpou a maior parte da sujeira
de sua mão e estendeu-a. Era hora de
tomar o controle daquela situação.
– E você é...?
Ele hesitou por um momento, então
envolveu os dedos dela na mão grande.
Abaixou a cabeça, quase como se para
beijar sua mão. O gesto era charmoso e
estranho,
fazendo-a
ofegar.
Especialmente uma vez que a mão
quente e poderosa ainda segurava a
sua.
Um calor escaldou seu rosto, e ela
ficou grata pela sujeira, que escondia o
rubor.
Ele endireitou o corpo.
– Eu sou Raul de Maritz. – Ele falou
com tanta autoconfiança que Luisa
quase podia imaginar o som de
trombetas nos fundos. – Príncipe Raul.
RAUL OBSERVOU-A enrijecer. Ela puxou a
mão da sua e deu um passo atrás,
cruzando os braços de maneira
protetora sobre o peito.
Não as boas-vindas que ele
geralmente recebia, pensou ele,
intrigado. Demonstrar excitação era
mais comum.
– Por que você está aqui? – Desta
vez, a voz dela não soou brusca,
fazendo-a
parecer vulnerável
e
feminina.
Feminina! Ele não percebera que ela
era mulher!
Considerando a voz rouca, as botas
enlameadas, o macacão largo e o
chapéu surrado, que sombreava o rosto
sujo, ela possuía qualquer coisa, menos
atrativos femininos. E aquele andar!
Rígido como um robô.
Ele congelou, imaginando-a na
sociedade de Maritz, onde protocolo e
boas maneiras eram valorizados. Isso
era pior do que temera. E não havia
saída.
Não se ele quisesse reivindicar seu
trono e proteger seu país.
Cerrou os dentes, silenciosamente
censurando as legalidades arcaicas que
o colocaram nesta situação.
Quando ele fosse rei, haveria
algumas mudanças.
– Eu perguntei o que você está
fazendo nas minhas terras. – O tom
dela era de animosidade. Mais e mais
intrigante.
– Eu peço perdão. – Ele sorriu,
suavizando seu lapso. Não era desculpa
que o choque dela o distraísse. – Nós
temos assuntos importantes para
discutir.
Ele esperou por um sorriso em
resposta. Por um relaxamento na
postura rígida da mulher. Não houve
nenhum.
– Nós não temos nada a discutir. –
Ela ergueu o queixo.
Ela o estava dispensando? Que
absurdo!
– Na verdade, temos.
Raul esperou que ela o convidasse
para entrar. Ela não se moveu. Ele
começou a se sentir impaciente. E
desgostoso com o destino, que
decretava que ele tinha de colocar esta
mulher
debaixo
de
sua
asa.
Transformar este material nada
promissor em...
– Eu gostaria que você fosse embora.
Raul enrijeceu com indignação. Ao
mesmo tempo,
sua curiosidade
aumentou. Ele desejou poder vê-la sem
a máscara de lama.
– Eu viajei da minha terra natal na
Europa para falar com você.
– Isso é impossível. Eu não tenho...
– Longe de ser impossível, eu fiz a
viagem com este único propósito. –
Raul aproximou-se, deixando sua altura
superior enviar uma mensagem
silenciosa. Quando falou novamente,
foi num tom que não aceitava oposição.
– Eu não irei embora até concluirmos
nossos negócios.
HAVIA UM nó no estômago de Luisa, e
seus nervos estavam à flor da pele,
enquanto ela atravessava a casa,
voltando para a varanda, onde deixara
seu visitante.
O príncipe da coroa de Maritz, a
terra natal de sua mãe, estava na sua
casa! Isso não podia ser bom.
Ela tentara mandá-lo embora. Não
queria encontrar ninguém daquele
lugar. As memórias eram dolorosas
demais. Porém, ele não se movera.
Uma única olhada para aquele maxilar
de aço lhe dissera que ela não teria
sucesso.
Além disso, precisava saber por que
ele estava lá.
Agora, de banho tomado e com
roupas limpas, Luisa tentou conter seu
pânico.
O que ele queria?
Ele preenchia a varanda com sua
presença maior que a vida, fazendo-a se
sentir pequena e insignificante. Ele a
lembrava de fotos do velho rei em sua
juventude... impossivelmente bonito,
com maçãs do rosto salientes e postura
orgulhosa. Desde o traje elegante até o
ar de comando, este homem era
alguém.
Todavia, membros da realeza não
apareciam simplesmente para uma
visita.
Ele se virou para ela, que se sentiu
em desvantagem, instantaneamente.
Com feições aristocráticas esculpidas e
um ar de pura masculinidade, ele era...
espetacular.
A boca de Luisa secou. Com uma
onda de choque, ela percebeu que era o
homem em si, tanto quanto a
identidade dele, que a perturbava.
Luisa uniu os dedos, em vez de
endireitar sua camisa larga, a única
limpa depois de semanas de chuva.
Afastou mechas úmidas do rosto,
ignorando o friozinho na barriga.
Recusava-se a ser intimidada em sua
própria casa.
– Eu estava admirando sua vista –
disse ele. – É um lugar adorável.
Luisa olhou para as montanhas
familiares. Apreciava a beleza natural,
mas não se lembrava da última vez que
encontrara tempo para apreciá-la.
– Se você tivesse visto o lugar dois
meses atrás, depois de anos de seca, não
teria ficado tão impressionado. – Ela
respirou fundo, escondendo seu
nervosismo. – Não vai entrar?
Ela se moveu para abrir a porta, mas,
com um passo longo, ele chegou lá
antes, gesticulando para que ela o
precedesse.
Luisa não estava acostumada com
alguém lhe abrindo portas. Por isso,
enrubesceu.
Inalou um sutil aroma exótico que
subiu direto à sua cabeça, deixando-a
levemente tonta. Nenhum homem que
ela conhecia tinha uma aparência e
uma voz tão lindas, ou um cheiro tão
delicioso como Raul de Maritz.
– Por favor, sente-se. – Ela gesticulou
para a mesa da cozinha. Não tivera a
chance de mover os baldes e lonas
impermeáveis da sala de estar, onde
eles haviam recebido os pingos da
última chuva.
Ademais, Luisa aprendera, muito
tempo atrás, que nascer na aristocracia
não era medida de valor. Ele poderia
sentar-se onde seus amigos e parceiros
de trabalho se reuniam.
– É claro. – Ele puxou uma cadeira e
sentou-se de maneira altiva, como se
aquele fosse um trono almofadado.
Ela pegou a chaleira, enquanto
reprimia hostilidade. Precisava ouvi-lo.
– Gostaria de chá ou café?
– Não, obrigado.
O coração de Luisa acelerou quando
ela lhe encontrou o olhar resoluto.
Relutantemente, ela se sentou na
cadeira oposta.
– Então, Vossa Alteza. O que eu
posso fazer por você?
Por um longo momento, ele a
estudou, então, inclinou-se um pouco
para a frente.
– Não se trata do que você pode fazer
por mim. – A voz dele era profunda e
hipnótica, contendo uma promessa a
qual Luisa instintivamente respondeu,
apesar de sua cautela. – Trata-se do que
eu posso fazer por você.
Cuidado com estranhos prometendo
presentes. A vozinha dentro de sua
cabeça enviou um tremor através dela.
Anos antes, ela recebera promessas
de presentes maravilhosos. O futuro
parecera uma terra mágica e brilhante.
Entretanto, tudo tinha sido uma farsa
vazia. Ela aprendera a desconfiar pelo
caminho mais duro... não somente
uma, mas duas vezes.
– Realmente?
Ele assentiu.
– Primeiro, eu preciso confirmar que
você é a única filha de Thomas Bevan
Hardwicke e Margarite Luisa Carlotta
Hardwicke.
Luisa congelou, alarmada. Ele parecia
um advogado, prestes a lhe dar más
notícias. A voz de aviso em sua cabeça
tornou-se mais estridente. Certamente,
seus laços com Maritz haviam sido
completamente cortados, anos atrás.
– Isso está correto, embora eu não
veja...
– Vale a pena ter certeza. Diga-me,
quanto você sabe sobre meu país e seu
governo?
Luisa lutou para permanecer calma,
quando lembranças dolorosas vieram à
tona. Este encontro parecia mais um
pesadelo. Ela queria gritar para que ele
fosse direto ao ponto, antes que seus
nervos explodissem. Mas aquele olhar
brilhante era implacável. O homem
faria aquilo do jeito dele. Luisa
conhecera homens como ele, antes.
Cerrou os dentes.
– O suficiente. – Mais do que Luisa
gostaria. – É um reino alpino. Uma
democracia com um parlamento e um
rei.
Ele assentiu.
– Meu pai, o rei, faleceu
recentemente. Eu serei coroado em
alguns meses.
– Sinto muito por sua perda –
murmurou Luisa, esforçando-se para
dar sentido àquilo. Por que ele estava lá,
interrogando-a?
– Obrigado. – Ele pausou. – E
Ardissia?
Ela lhe deu um olhar desafiador,
lutando contra a impaciência.
– É uma província de Maritz, com
seu próprio príncipe hereditário, que
deve lealdade ao rei de Maritz. Minha
mãe nasceu lá, como tenho certeza que
você sabe.
Luisa tremeu, enquanto memórias
amargas lhe preenchiam a mente.
– Agora, minha vez para uma
pergunta. – Ela plantou as palmas sobre
a mesa e inclinou-se para a frente,
encarando-o. – Por que você está aqui?
Luisa esperou, seu coração batendo
freneticamente, observando-o estudá-la
com olhos estreitos. Ele se mexeu na
cadeira. Subitamente, ela imaginou se
ele também estava desconfortável.
– Eu vim para encontrá-la.
– Por quê?
– O príncipe de Ardissia está morto.
Estou aqui para lhe dizer que você é a
herdeira dele, princesa Luisa de
Ardissia.
CAPÍTULO 2
RAUL
empalidecer sob o
bronzeado. Ela balançou na cadeira. Ia
desmaiar?
Ótimo. Uma mulher hipersensível!
Ele ignorou o fato de que qualquer
um ficaria abalado. Que sua raiva
diante desta situação diabólica o
tornava irracional.
Ela não era a única que tivera a vida
virada de ponta-cabeça! Por anos, Raul
ASSISTIU-A
vinha dirigindo o próprio destino,
tomando todas as decisões. Ser
restringido
dessa
maneira
era
ultrajante.
Mas a alternativa... virar as costas
para seu povo, e para a vida a qual ele
se devotara... era impensável.
– Você está bem?
– É claro. – Mas a expressão nos
olhos dela era confusa.
Eram olhos surpreendentemente
bonitos, vistos sem aquele chapéu que
os sombreara. Azuis-acinzentados um
momento atrás, agora azuis como um
céu de verão nos Alpes de Maritz. O
tipo de olhos nos quais um homem
podia se perder.
Com o rosto lavado, as feições dela
também eram agradáveis, e até mesmo
atraentes.
Se você gostasse do estilo simples e
natural.
Raul
preferia
suas
mulheres
sofisticadas e bem arrumadas.
Que tipo de mulher não dedicava
tempo para arrumar os cabelos? Claros
e molhados, os cabelos dela estavam
penteados para trás do rosto, e o corte
parecia... torto. Ela era totalmente
inapropriada para...
– Eu não posso ser herdeira dele! –
Luisa soou quase acusadora.
Raul arqueou as sobrancelhas.
– Acredite, é verdade.
Ela piscou, e ele teve a impressão de
que havia mais coisa acontecendo atrás
daqueles olhos azuis do que simples
surpresa.
– Como isso é possível?
Raul abriu a pasta que Lukas levara.
– Aqui está o testamento de seu avô
e sua árvore familiar.
Ele planejara que seu secretário,
Lukas, discutisse tais detalhes com ela.
Mas mudara de ideia ao ver como Luisa
Hardwicke estava despreparada para
este papel. Quanto menos gente lidasse
com ela neste estágio inicial, melhor.
Raul reprimiu uma careta. O que
começara como uma missão delicada,
agora tinha potencial ilimitado para
desastre. Ele podia imaginar as
manchetes, se a imprensa a visse como
ela era! Não permitiria que a coroa de
Maritz fosse foco de fofocas da mídia,
novamente.
Rodeou a mesa e espalhou os papéis
diante de Luisa.
Ela se agitou em sua cadeira, como se
a presença dele a contaminasse. Raul
enrijeceu.
Mulheres
geralmente
ansiavam por sua proximidade.
– Aqui está sua mãe – indicou ele na
árvore familiar. – Acima dela, seu avô,
o último príncipe.
Ela levantou a cabeça. Mais uma vez,
o impacto daqueles olhos azuis o
atingiu. Raul podia jurar que o olhar
produziu um eco dentro de seu peito.
– Por que meu tio não é o herdeiro?
Ou minha prima, Marissa?
– Você é a última de sua família.
As sobrancelhas de Luisa se uniram.
– Ela devia ser tão jovem. Isso é
horrível.
– Sim. O acidente foi trágico. E
alterou a sucessão.
Ela meneou a cabeça.
– Mas eu não sou parte da família!
Minha mãe foi deserdada quando se
apaixonou por um australiano, e
recusou-se a casar com o homem
escolhido pelo pai.
Ela sabia sobre aquilo? Isso explicava
a animosidade dela?
– Seu avô ameaçou, mas nunca a
deserdou,
realmente.
Nós
só
descobrimos isso recentemente, quando
o testamento dele foi lido. – O príncipe
de Ardissia tinha sido um tártaro
irascível, mas muito orgulhoso de sua
linhagem para cortar um descendente
direto. – Você é definitivamente
elegível para herdar.
– Eu lhe digo que isso é impossível! –
Ela se inclinou para a frente, estudando
os papéis.
O aroma de lavanda chegou a ele.
Raul
inalou,
intrigado.
Estava
acostumado aos perfumes mais caros.
Todavia, essa fragrância simples era
estranhamente agradável.
– Isso não pode estar certo. Ele me
deserdou,
também.
Nós
fomos
informadas disso!
Raul fitou-a para encontrar os olhos
azuis brilhando. O pequeno queixo
estava angulado no ar, e, pela primeira
vez, havia cor nas faces de Luisa.
Ela estava... bonita. De uma maneira
não sofisticada.
E sabia mais do que ele esperara.
Fascinante.
– Apesar do que foi informada, você
é herdeira dele. Herdou a fortuna e as
responsabilidades de seu avô. – Ele lhe
deu um sorriso encorajador. – Eu vim
para levá-la para casa.
– PARA CASA? – Luisa levantou-se. – Esta
é minha casa! É aqui que pertenço –
disse, gesticulando para a cozinha
aconchegante que conhecera durante
toda sua vida.
Lutou contra um senso de
irrealidade. Aquilo só podia ser um erro
horrível.
– Não mais. – Do outro lado da
mesa, ele sorriu.
Ele era inacreditavelmente lindo.
Até que você focasse naqueles olhos
frios. No sorriso que não alcançava os
olhos.
– Você tem uma vida nova à sua
frente. Seu mundo mudará para
sempre. – O sorriso dele mudou,
tornando-se mais íntimo, e para sua
surpresa, Luisa sentiu um calor não
familiar se espalhando por seu corpo.
Como isso tinha acontecido?
– Você terá riqueza, posição,
prestígio... o melhor de tudo. Levará
uma vida de luxo, como princesa.
Princesa.
A palavra reverberou na mente de
Luisa. Uma onda de náusea ameaçou
subir à sua garganta.
Aos 16 anos, ela ouvira as mesmas
palavras. Tinha sido como um sonho se
tornando realidade. Que garota não se
sentiria excitada ao descobrir que
possuía sangue da realeza e um avô
prometendo uma vida de excitação e
privilégio?
O coração de Luisa apertou,
enquanto ela se lembrava de sua mãe,
pálida, porém sorrindo bravamente,
sentada a essa mesa, dizendo-lhe que
ela precisava decidir sobre o próprio
futuro. Explicando que, embora ela
tivesse dado as costas para aquela vida,
Luisa teria de escolher se queria
descobrir seu direito de primogenitura.
E, inocente como era, Luisa tinha
ido. Seduzida por uma fantasia de
conto de fadas.
A realidade havia sido brutalmente
diferente. No momento que ela
rejeitara o que seu avô oferecia e voltara
para casa, sentira-se grata que ele não a
apresentara publicamente como sua
parente. Que ele a mantivera uma
hóspede enclausurada durante seu
período de “teste”. Somente sua família
mais próxima sabia que ela um dia
ficara tentada pelas falsas promessas de
seu avô de uma reunião familiar alegre.
Luisa fora ingênua, porém não mais.
Agora, conhecia bem a realidade feia
daquela sociedade aristocrática, onde
nascimento e conexões importavam
mais do que amor e decência. Se as
ações de seu avô não tivessem bastado,
ela apenas tinha de recordar-se do
homem que pensara amar. Como ele
planejara seduzi-la, quando descobrira
sua identidade secreta. Tudo por
ambição.
O estômago de Luisa embrulhou, e
ela balançou a cabeça para afastar as
lembranças horríveis.
– Eu não quero ser princesa.
Silêncio. Lentamente, ela se virou. A
expressão do príncipe Raul era de
impaciência e choque.
– Você não pode estar falando sério.
– Acredite, eu nunca falei mais sério.
A repulsa preencheu Luisa quando
ela se lembrou de seu avô. Ele a
convidara para se juntar a ele, de modo
que pudesse transformá-la no tipo de
princesa que ele queria. Para que ela
lhe obedecesse sem questionar. Para
que ela fosse o tipo de filha que sua
mãe fracassara ser.
No começo, Luisa estivera cega para
o fato de que ele meramente queria um
peão para manipular, não uma neta
para amar.
Ele mostrara quem realmente era
quando a notícia da doença terminal de
sua mãe chegara. Tinha recusado as
súplicas desesperadas de Luisa para
retornar. Em vez disso, seu avô lhe dera
um ultimato... que ela rompesse
qualquer contato com seus pais, ou
desistisse da nova vida. Quanto às
súplicas de Luisa para que ele pagasse
tratamento médico, ele respondera que
não perderia tempo com uma mulher
que dera as costas ao seu mundo.
A traição cruel ainda causava revolta
em Luisa.
E era de quem ela herdeira! De um
tirano cruel e sem coração. Não era de
admirar que jurara não ter nada a ver
com sua família de sangue azul.
Recordava-se de seu avô reclamando
de sua ingratidão. Da inabilidade de
Luisa ser o que ele queria.
Alguém tocou seu braço e tirou-a de
seus
pensamentos.
Raul
estava
assustadoramente perto.
Luisa engoliu em seco, e os olhos
dele seguiram o movimento. Um olhar
que perdera sua distância, e agora
parecia
incendiar-se
com
calor
inesperado.
– O que foi? O que você está
pensando? – perguntou ele.
Luisa respirou fundo, desorientada
pela carga de eletricidade que podia
sentir entre eles. Pela sensação de
familiaridade que sentia com este
estranho bonito.
– Eu estou pensando que você
deveria me soltar.
Imediatamente, ele deu um passo
atrás, abaixando a mão.
– Perdoe-me. Por um momento, você
pareceu fraca.
Ela assentiu. Sentira-se enjoada. Isso
explicava sua falta de firmeza. Não
tinha nada a ver com o toque dele.
A eletricidade entre eles era
imaginária.
Luisa virou-se para beber um copo de
água, esperando restaurar um pouco da
normalidade. Sentia como se tivesse
sido virada do avesso.
Erguendo o queixo, virou-se.
Ele estava encostado contra o balcão,
os braços cruzados, um tornozelo
casualmente descansando sobre o
outro. Parecia incrivelmente sexy.
– Quando você tiver tempo de
absorver as notícias, verá que ir para
Maritz é a coisa sensata a fazer.
– Obrigada, mas eu já absorvi as
notícias – replicou ela, irritada com o
jeito arrogante do príncipe.
Ele não se moveu, mas o corpo
grande enrijeceu visivelmente. De
súbito, ele parecia predatório, em vez
de elegante.
A pele de Luisa arrepiou-se.
– Você não fica tentada pelo
dinheiro? – A boca de Raul se
comprimiu. Obviamente ele achava que
dinheiro era mais importante do que
tudo.
Assim como seu avô e os amigos
dele.
Luisa abriu a boca, então fechou-a
quando seu cérebro finalmente entrou
em ação.
Dinheiro!
No seu choque, nem registrara isso.
Ela pensou nas dívidas enormes, nos
reparos que eles tinham adiado, na
velha máquina de ordenha de Sam, no
seu carro enferrujado. A lista era
infinita.
– Quanto dinheiro? – Ela não queria
nada com a posição na alta sociedade.
Mas o dinheiro...
O príncipe descruzou os braços e
nomeou uma quantia que fez a cabeça
de Luisa girar. Ela se apoiou contra a
mesa.
– Quando eu recebo o dinheiro?
Estava imaginando o brilho de
satisfação naqueles olhos verdes?
– Você é princesa, use ou não o
título. Nada pode alterar isso. – Ele
pausou. – Mas há condições para
herdar sua fortuna. Você deve se
estabelecer em Maritz e assumir suas
obrigações da realeza.
Os ombros de Luisa baixaram. O que
ele sugeria era impossível. Ela rejeitara
aquele mundo por sua própria
sanidade. Aceitar seria uma traição a si
mesma e a tudo que acreditava.
– Eu não posso.
– É claro que você pode. Eu farei os
arranjos.
– Você não ouve? Eu não vou! – A
vida naquela sociedade fria e cruel a
mataria. – Esta é minha casa. Minhas
raízes estão aqui.
Ele endireitou o corpo para ficar alto
e imponente. O cômodo encolheu, e,
apesar de sua raiva, Luisa sentiu o
magnetismo formidável de Raul atraíla.
– Você também tem raízes em
Maritz. O que você tem aqui, além de
trabalho duro e pobreza? No meu país,
você terá uma vida privilegiada,
misturando-se nos círculos sociais de
elite.
Ele falava igualzinho ao seu avô
esnobe.
– Eu prefiro os meus círculos sociais –
retrucou ela. – As pessoas que eu amo
estão aqui.
Ele fez uma careta.
– Um homem? – O príncipe Raul
aproximou-se, e, involuntariamente,
Luisa deu um passo atrás, diante da luz
feroz nos olhos dele.
– Não, meus amigos. E o irmão do
meu pai e a esposa dele. – Sam e Mary,
quase uma geração mais velha que os
pais de Luisa, tinham sido como avós
amados durante sua infância feliz, e nos
piores momentos. Ela não os deixaria,
envelhecendo e com dívidas, por uma
vida glamourosa vazia, longe dali.
– Obrigada por ter vindo me dar esta
notícia pessoalmente. – Ela juntou os
papéis com movimentos precisos. – Mas
você terá de encontrar outro herdeiro. –
Luisa ergueu o queixo. – Eu o
acompanho até lá fora.
A BOCA de Raul se comprimiu enquanto
o helicóptero subia.
Luisa Hardwicke não tinha reagido
como ele esperara. Ainda bem que ele
lhe contara apenas sobre a herança, não
sobre os aspectos mais desafiadores de
seu novo papel como princesa. Ela
parecera tão arisca que era melhor dar
tal notícia mais tarde.
Ele nunca conhecera uma mulher
mais teimosa. Ela praticamente o
expulsara de lá!
A indignação o preencheu.
Alguma coisa sobre a qual ele não
sabia a motivava. Raul precisava
descobrir o que era. Mais, precisava
descobrir o gatilho que a faria mudar de
ideia.
Por um instante lá, ele ficara tentado
a sequestrá-la. O sangue de gerações de
guerreiros e barões ladrões, assim como
monarcas, corria em suas veias. Teria
sido fácil erguê-la nos braços e
sequestrá-la, até que ela visse a razão.
Tão satisfatório.
Uma imagem de Luisa Hardwicke,
com
olhos
azuis
desafiadores,
preencheu sua mente.
Raul lembrou-se da camisa dela se
erguendo quando ela pegou o copo de
água, revelando um traseiro firme e
arredondado no jeans justo. Das curvas
femininas delineadas pela camisa
quando ela se movia. Um corpo
destoando de sua impressão original.
Um fogo instalou-se no seu baixoventre.
Talvez, houvesse compensações, afinal
de contas.
Luisa Hardwicke possuía uma beleza
autêntica que o atraía mais do que
deveria. Nos últimos oito anos, ele
fizera questão de cercar-se apenas de
mulheres sofisticadas que entendessem
suas necessidades.
Fez uma careta, encarando a verdade
que raramente admitia. Que, se ele
algum dia tivesse tido uma fraqueza,
havia sido pelo tipo de honestidade e
franqueza aberta que Luisa projetava.
O tipo no qual ele um dia acreditara.
A realidade sórdida o curara de
quaisquer fragilidades. Todavia, estar
com ela era como ouvir um eco de seu
passado, lembrando-o de fragmentos de
sonhos que ele um dia nutrira. Sonhos
agora destruídos por enganação e
traição.
E, apesar de sua indignação, ele
respondera ao orgulho e à coragem
dela.
Aquela era uma inconveniência que
complicava seus planos. Entretanto,
perversamente, Raul admirava o desafio
que ela representava. Que mudança das
mulheres ansiosas e submissas que ele
conhecia! Em outras circunstâncias, ele
teria aplaudido a postura de Luisa.
Ademais, ele via agora, uma pessoa
sem personalidade
nunca
seria
adequada para o que estava por vir.
Raul precisava descobrir uma
maneira de fazê-la ver o bom-senso.
Fracasso não era uma opção, quando
sua nação dependia dele.
– Lukas, você disse que a cooperativa
da fazenda está com dívidas?
– Sim, senhor. Dívidas pesadas. É um
milagre que ainda esteja funcionando.
Raul olhou para a pequena mancha
que era o lar de Luisa. Uma ponta de
remorso o preencheu. Quisera evitar
coerção, mas ela não lhe deixara
escolha.
– Compre os débitos. Imediatamente.
Eu quero isso resolvido hoje.
O BARULHO de um helicóptero fez Luisa
levantar a cabeça.
Não podia ser. Após rejeitar sua
herança no dia anterior, não havia
razão para que seu caminho e o do
príncipe Raul se cruzassem novamente.
Ela foi para a janela. Não podia ser, mas
era. Príncipe Raul estava lá!
Para a irritação de Luisa, seu coração
disparou.
Vinte e quatro horas tinham lhe
dado tempo de se assegurar que ele não
era tão imponente quanto ela lembrava.
Estivera enganada.
Luisa pesquisara sobre ele na
internet, no dia anterior, descobrindo
sua reputação para trabalho árduo e
riqueza. Os artigos também falavam de
casos
discretos
com
mulheres
maravilhosas.
Todavia, as fotos não faziam justiça
ao impacto dele em carne e osso. Ela
arfou enquanto ele subia os degraus.
Felizmente, ela era imune.
– Luisa. – Ele parou à sua frente, os
ombros largos preenchendo o vão da
porta, a voz sensual ao falar seu nome.
– Vossa Alteza. Por que você está
aqui? Nós encerramos o assunto ontem.
Ele inclinou-se sobre sua mão
novamente,
quase
a
beijando,
causando-lhe um friozinho na barriga.
Luisa precisava lembrar-se de não se
impressionar por charme superficial. Já
fizera isso antes.
Mas seu olhar foi para o rosto bonito,
quando ele endireitou o corpo. O brilho
de fogo nos olhos verdes fez sua
pulsação acelerar.
– Chame-me de Raul.
Aquilo não parecia natural, mas
recusar seria rude.
– Raul. – Era loucura, mas ela quase
pôde sentir o gosto do nome em sua
boca, como um vinho rico e encorpado.
– Você não vai me convidar para
entrar?
Luisa mordeu o lábio. Ele devia ter
motivo para ter voltado. Quanto antes
ela ouvisse, mais depressa ele iria
embora.
– Por favor, entre. – Ela liderou o
caminho para a sala de estar.
Em vez de sentar-se, ele parou diante
da janela. Uma posição de comando,
notou ela, nervosa.
Luisa não gostava da postura de
Raul, como se ele estivesse em seu
próprio território. Ela permaneceu de
pé, encarando-o, recusando-se a ser
dominada.
– Você não mudou de ideia?
Ela ergueu o queixo.
– Não se o dinheiro vem com elos
atados.
Apesar
de
estar
precisando
desesperadamente de dinheiro, ela não
poderia concordar.
Luisa passara a tarde anterior
consultando seu advogado. Devia haver
um jeito de acessar parte do dinheiro
da herança, sem desistir de sua vida ali.
Não confiava que Raul, um homem
com seus próprios objetivos, fosse
honesto com ela a esse respeito.
Era muito cedo para saber, mas a
possibilidade de negociar fundos
suficientes para levantar a cooperativa
lhe dera uma noite de sono melhor do
que ela tivera em séculos. A mesma
possibilidade fortaleceu sua confiança
agora.
– Posso persuadi-la a reconsiderar? –
Os lábios dele se curvaram num
pequeno sorriso.
– De jeito nenhum. – O mero
pensamento de aceitar deixava-a
enjoada.
– É uma pena. Uma grande pena. –
Ele pareceu triste. Finalmente, enfiou a
mão do bolso do paletó. – Neste caso,
estes são para você.
Confusa, Luisa aceitou os papéis.
– Você quer que eu assine, desistindo
de minha herança? – Ela não assinaria
nada sem conselho legal.
Ele meneou a cabeça.
– Leia com calma. Os documentos
são autoexplicativos.
Confusa, ela estudou os papéis.
Diferentemente do dia anterior, não
eram de rico pergaminho. Pareciam
mais os documentos de empréstimo que
eram a maldição de sua vida.
Luisa forçou-se a se concentrar.
Quando finalmente começou a
entender, seu mundo girou à sua volta.
– Você comprou os débitos da
cooperativa. – Incrédula, ela manuseou
os papéis. – Todos eles!
E num dia. Cada papel tinha a data
do dia anterior.
Aquilo era possível?
Confusa, ela olhou para cima. A
gravidade da expressão dele convenceua mais do que as palavras digitadas.
Luisa sentou-se no braço da cadeira,
os joelhos muito fracos para suportarem
seu peso.
– Por quê? – perguntou ela.
Ele se aproximou.
– No dia que você assinar os
documentos, aceitando sua herança, eu
lhe darei esses papéis de presente, de
modo que você possa picá-los em
pedacinhos.
Um alívio a percorreu tão de repente
que Luisa tremeu.
Ele era tão obstinado! Ainda não
aceitava sua rejeição. Sem dúvida,
achava embaraçoso que a herdeira de
um título real estivesse tão endividada.
Era um gesto generoso. Um pelo qual
ela o compensaria, se descobrisse um
jeito de acessar os fundos.
– Mas eu não vou. Ficarei aqui.
– Não, você não ficará.
Alguém alguma vez negara o que ele
queria?
Uma energia impaciente irradiava-se
dele. E ela nunca vira uma fisionomia
mais determinada.
Luisa levantou-se. Precisava ser firme
e fazê-lo aceitar sua decisão.
– Eu não tenho planos de partir.
Ele lhe prendeu o olhar por longos
momentos.
– Sabendo como você se importa com
o bem-estar de sua família e amigos,
tenho certeza que irá mudar de ideia. –
A voz dele era dura sob a inflexão
aveludada. – A menos que queira que
eles percam tudo.
Luisa congelou. Sua garganta se
fechou.
Chantagem?
Ela abriu a boca, mas nenhum som
emergiu. Os papéis caíram de suas mãos
trêmulas no chão.
– Você... não pode estar falando
sério!
– Eu nunca falei tão sério, Luisa.
– Não me chame assim! – O jeito que
ele falava seu nome, com o mesmo
sotaque que sua mãe usara, era como
uma imitação de um termo carinhoso
familiar.
– Princesa Luisa, então.
Ela fechou as mãos em frustração.
– Você não pode fazer isso!
Destruiria o meio de vida de uma dúzia
de famílias. – E o sonho de seu pai.
Algo para o que ela trabalhara a maior
parte de sua vida.
Depois que Luisa voltara para casa, a
fim de cuidar de sua mãe, nunca
encontrara tempo para retornar aos
estudos. Em vez disso, tinha ficado para
ajudar seu pai, que nunca se recuperara
completamente da perda da esposa.
– A decisão é sua. Você pode salválos, se eles significam tanto para você.
Ele falava sério!
– Mas... por quê? – Luisa balançou a
cabeça. – Você pode encontrar outro
herdeiro, alguém que ficaria radiante
em levar a vida que está oferecendo. –
Alguém que ficaria contente em desistir
da alma pelas riquezas que ele
prometia. – Eu não levo jeito para ser
princesa!
O brilho nos olhos verdes sugeriu
que ele concordava.
– Não há mais ninguém, Luisa. Você
é a princesa.
– Você não pode ditar meu futuro! –
Luisa plantou as mãos nos quadris,
deixando o desafio mascarar seu medo.
– Por que você está se envolvendo tão
pessoalmente?
Quando seu avô fizera contato, tinha
sido através de mensageiros. Ele não
fora até ela. Todavia, Raul, como
príncipe da coroa, era muito mais
importante do que seu avô.
Ele lhe pegou a mão, antes que ela
pudesse puxá-la. Um calor inundou-a,
apesar de as intenções dele lhe
causarem calafrios.
– Eu tenho um interesse no seu
futuro – murmurou ele.
Automaticamente, Luisa ergueu o
queixo em desafio.
– Verdade?
– Um interesse muito pessoal. – Ele
segurou sua mão com firmeza, o
polegar acariciando sua palma, fazendoa tremer. – Você não é apenas a
herdeira de Ardissia, como também
está destinada a ser a rainha de Maritz.
– Raul pausou, prendendo-lhe o olhar.
– É por isso que eu estou aqui. Para
levá-la como minha noiva.
CAPÍTULO 3
LUISA OBSERVOU
os lábios firmes de
Raul formarem a palavra “noiva”. Sua
cabeça girou.
Não havia risada nos olhos dele.
Apenas uma certeza que a impedia de
protestar.
Ainda segurando sua mão, ele usou a
outra para tocar seu ombro, como se
para apoiá-la.
De maneira violenta, ela se afastou e
foi para a janela, ofegando.
– Não me toque!
Os olhos verdes se estreitaram, e ela
sentiu que, sob a calma exterior, havia
um homem de paixões voláteis.
– Explique. Agora! – disse ela
quando recuperou o fôlego.
– Talvez você devesse se sentar.
De modo que ele pudesse se
agigantar sobre ela?
– Não, obrigada! Eu prefiro ficar de
pé. – Mesmo que suas pernas
estivessem tremendo.
– Como quiser.
– Você ia explicar por que precisa se
casar.
– Para ascender ao trono, eu preciso
estar casado. É uma lei antiga,
objetivando assegurar uma linhagem
real inquebrável.
Um tremor a percorreu diante da
ideia de “assegurar a linhagem real”.
Com ele.
Não importava quão bonito ele fosse.
Ela aprendera que beleza podia
esconder um coração negro. Era o
interior que contava. Pelo que ela vira,
Raul era tão orgulhoso, obstinado e
egoísta quanto seu avô detestável.
O coração de Luisa estava disparado
quando ele continuou:
– É tradição que o príncipe da coroa
tome uma noiva de um dos principados
de Maritz. Quando nós éramos
adolescentes, um contrato foi redigido
para meu casamento com sua prima,
Marissa, princesa de Ardissia. Mas
Marissa morreu logo depois.
– Lamento – disse Luisa.
– Depois disso, eu não tive pressa de
me unir em casamento. Mas quando
meu pai morreu, recentemente, foi hora
de encontrar outra noiva.
– De modo que você pudesse herdar.
– Luisa tremeu, lembrando-se daquele
mundo, onde casamentos eram
contratos dinásticos, desprovidos de
amor.
– Meus planos foram abreviados
quando o testamento de seu pai foi
lido, e nós descobrimos que você
herdaria. Antes disso, considerando o
que ele falara sobre deserdar sua mãe,
seu ramo da árvore familiar não estava
em nossas considerações.
Ele falava como se eles fossem uma
complicação enfadonha no grande
plano das coisas! Indignada, ela
questionou:
– O que o testamento tem a ver com
seu casamento?
– O contrato é irrevogável, Luisa. –
Ele se aproximou, causando-lhe falta de
ar.
– Mas como? – Luisa começou a
andar, precisando de espaço. – Se
Marissa está...
– Todo mundo, inclusive os
genealogistas e advogados, acreditavam
que a linhagem de seu avô morreria
com ele. A notícia de que ele tinha uma
neta que não fora deserdada foi uma
bomba. Você deveria estar grata por nós
conseguirmos encontrá-la, antes da
mídia. Ou teria a imprensa acampada
aqui dia e noite.
– Você está dramatizando. Eu não
tenho nada a ver com seu casamento.
Uma sobrancelha escura arqueou-se.
– O contrato diz que eu devo me
casar com a princesa de Ardissia. – Ele
pausou, a expressão de desgosto. – Seja
ela quem for.
– Você está louco! – exclamou Luisa,
em pânico. – Eu nunca assinei contrato
algum!
– Isso não importa. O documento é
legal. As melhores mentes no país não
conseguiram achar uma escapatória
disso.
Luisa balançou a cabeça, encostandose contra a janela.
– Independentemente do que diz seu
contrato, você não pode me levar para
lá como...
– Minha noiva? Acredite, eu farei o
que for necessário para reivindicar meu
trono. – O príncipe Raul ergueu o
queixo de maneira régia, deixando claro
que não queria se casar com alguém de
um nível tão inferior ao seu. Alguém
tão sem atrativos.
Por que ele estava tão desesperado?
O poder significava tanto assim?
Luisa reprimiu uma onda de raiva.
Tinha 24 anos e recebera duas
propostas de casamento... ambas de
homens ambiciosos que a viam como
um meio de adquirir poder! Por que
não poderia encontrar um homem
honesto, que a amasse por quem ela
era? Sentiu-se suja e vulgar.
– Espera que eu desista da minha
vida e me case com você, um completo
estranho, de modo que você possa se
tornar rei? – De que século ele saíra? –
Isso é bobagem antiquada.
O olhar dele era gelado.
– Pode ser antiquado, mas eu preciso
me casar.
– Case-se com outra pessoa!
Alguma coisa perigosa brilhou nos
olhos verdes. Mas quando ele falou, as
palavras foram medidas:
– Se eu pudesse, faria isso. Se você
não existisse, ou se já estivesse casada, o
contrato seria anulado, e eu poderia
escolher outra esposa. – A voz profunda
enviou um tremor pelo corpo de Luisa.
– Não há mais tempo de encontrar uma
saída. Eu preciso estar casado dentro do
prazo constitucional, ou não poderei
herdar.
– Por que eu deveria me importar?
Nem sequer o conheço.
E o que conhecia, ela não gostava.
Ele deu de ombros, e Luisa pensou
que aqueles eram ombros típicos de um
salva-vidas ou de um fazendeiro
australiano, não de um aristocrata
privilegiado.
– Eu sou a melhor pessoa para o
reino. Treinei para ser rei durante uma
vida inteira.
– Outros poderiam aprender.
Ele meneou a cabeça.
– Não agora. Não a tempo. Há uma
inquietude crescente pelos últimos anos
de reinado de meu pai. Um rei forte é o
que o país necessita.
O fervor nos olhos dele tirou o fôlego
de Luisa.
– Isso deixa apenas uma opção.
Ela era a opção dele!
– Eu não me importo! Não sou um
carneiro de sacrifício para o massacre.
Ele deu um sorriso presunçoso.
– Você acha que se casar comigo
seria um sacrifício? – A voz profunda
tornou-se subitamente sedutora. – Que
eu não sei como dar prazer a uma
mulher?
Luisa engoliu em seco, usando as
mãos para se ancorar ao peitoril atrás de
si, em vez de ser atraída em direção aos
olhos verdes, que pareciam prometer
deleites inimagináveis.
Ele era muito mais perigoso do que ela
percebera.
– Tenha certeza, Luisa, que você
encontrará prazer em nossa união. Eu
lhe dou minha palavra nisso.
Uma onda de poder, de calor, pulsou
entre eles, e ela soube como um animal
se sentia, hipnotizado por um predador.
– A resposta ainda é não – sussurrou
ela, chocada por seu corpo traidor
responder à promessa sensual. Por que
seus
hormônios
adormecidos
subitamente ganhavam vida perto dele?
Por um longo momento, eles se
entreolharam, como adversários numa
batalha silenciosa de força de vontade.
– Então, infelizmente, você não me
deixa escolha. – O ardor nos olhos
verdes foi substituído por frieza. –
Apenas lembre que a decisão, e o
resultado, são inteiramente seus.
Ele já tinha se virado. Luisa tocou-lhe
o cotovelo para detê-lo.
– O que você quer dizer? –
perguntou ela, sentindo o gosto amargo
do medo.
Ele não se virou.
– Eu tenho negócios para finalizar,
antes de partir. Alguns fazendeiros para
demitir.
O pânico a inundou. Os dedos de
Luisa agarraram a lã do paletó fino.
Então, ela se posicionou na frente dele.
– Você não pode executar a hipoteca!
Eles não lhe fizeram nada.
Encarando-a com intensidade, Raul
afastou a mão dela.
– Numa escolha entre seus parentes e
meu país, não há concorrência. – Ele
inclinou a cabeça. – Adeus, Luisa.
– EU TENHO certeza que Mademoiselle
ficará feliz com este novo estilo. Um
pouco mais curto, um pouco mais
chique. Sim?
Luisa saiu de seu devaneio e
encontrou os olhos da jovem francesa
no espelho. Claramente, a cabeleireira
estava excitada por ter sido chamada à
residência parisiense do príncipe.
Diferentemente da manicura, que
praticamente bufara seu desprazer
quando Luisa recusara unhas postiças,
sabendo que não conseguiria conviver
com elas. Ou da costureira prepotente
que tirara suas medidas com óbvio
desprezo pelas roupas de Luisa.
A cabeleireira não se assustara diante
da perspectiva de trabalhar em alguém
tão comum como Luisa.
Talvez, ela gostasse de um desafio.
– Tenho certeza que ficará adorável.
– Noutra época, ela teria adorado ter
seus cabelos cortados por alguém com
tanto entusiasmo. Mas não hoje, apenas
horas depois que o avião particular de
Raul aterrissara em Paris.
Tudo
acontecera
rapidamente
demais. Até mesmo sua despedida de
Sam e da emocionada Mary, chorando
diante da notícia feliz que Luisa
finalmente tomaria sua herança há
muito tempo perdida.
Como ela desejava estar com eles
agora. De volta ao mundo que
conhecia, ao qual pertencia.
Luisa cerrou os dentes, lembrando
como Raul lhe tirara a iniciativa até
mesmo em suas despedidas.
Quando ela fora dar a notícia,
descobrira que ele estivera lá antes. Sua
família e amigos já estavam empolgados
com a história de Luisa finalmente
assumir seu “lugar legítimo” como
princesa. E com a notícia de que as
dívidas deles seriam canceladas.
Todavia, Luisa demandara que Raul
colocasse um administrador de fazenda
capaz em seu lugar, para levantar a
coorporativa. Recusava-se a deixar seus
amigos na mão.
Diante da alegria deles, Luisa se
sentira quase egoísta, querendo ficar,
quando tanta coisa boa resultaria de sua
partida. Todavia, ela deixara parte de si
mesma para trás.
Sua família e amigos teriam ficado
desgostosos, se soubessem por que ela
partira. Não teriam tocado o dinheiro
da princesa, se conhecessem a verdade.
Mas ela não poderia fazer isso com eles.
Não poderia arruiná-los por seu
orgulho.
Ou por seu medo do que a
aguardava em Maritz.
Ela tremeu ao pensar em entrar no
mundo de Raul. Estar com um homem
que deveria repeli-la, entretanto...
– Estas camadas irão complementar a
linha do queixo, entende? E tornar
estes cabelos adoráveis fáceis de cuidar.
Luisa assentiu, vagamente.
– E, permita-me dizer, um corte com
comprimento igualado dos dois lados
fica melhor em você.
Luisa corou ao lembrar-se de seu
corte torto anterior.
– Minha amiga queria tornar-se
cabelereira. Ela treinou comigo.
– Os instintos dela eram bons, mas a
execução... – A outra mulher deu uma
última cortada nas pontas, então,
afastou-se. – Viola! O que você acha?
Pela primeira vez, Luisa realmente se
olhou no espelho, para ver seu novo
visual.
Não era um novo visual. Era uma
nova mulher!
Seus cabelos compridos demais agora
dançavam em volta do pescoço quando
ela mexia a cabeça. Mal tocavam os
ombros, mas davam forma aos
contornos de seu rosto. Cabelos
castanho-claros opacos tinham ganhado
uma luz dourada natural.
– O que você fez?
Luisa não reconheceu a mulher no
espelho. Uma mulher cujos olhos
pareciam maiores, o rosto quase
esculpido e... atraente.
A francesa deu de ombros.
– Algumas luzes para acentuar seu
louro natural, e um bom corte. Você
aprova?
Luisa assentiu, incapaz de encontrar
palavras para descrever o que sentia.
Lembrou-se
dos últimos meses
cuidando de sua mãe, olhando revistas
de moda com ela, emprestadas da
biblioteca local. Sua mãe, com um olho
infalível para estilo, apontava que corte
ficaria perfeito em Luisa. E Luisa
participava da brincadeira, fingindo que
iria a um salão de beleza e faria um
corte exatamente como aquele. Como
se tivesse tempo ou dinheiro para gastar
com qualquer coisa, exceto com os
cuidados de sua mãe e as constantes
demandas da fazenda.
– Está longo o suficiente para
prender em ocasiões formais.
Um nó se formou no estômago de
Luisa diante do pensamento de
enfrentar ocasiões formais quando eles
chegassem a Maritz.
Aquilo não podia ser real. Como ela
concordara?
Subitamente,
precisava
escapar.
Respirar ar fresco. Sair dos confins da
mansão repleta de ouro, com móveis
antigos e servos discretos.
Ocorreu-lhe que, desde o momento
que Raul lhe dera o ultimato, ela não
ficara sozinha. Os homens de segurança
dele estiveram a serviço na última noite
que
ela
dormira
em
casa.
Provavelmente para garantir que ela
não fugisse no meio da noite! Depois
disso, houvera comissários de bordo,
mordomos, chofer.
E o próprio Raul invadindo seu
espaço pessoal, mesmo quando estava o
mais longe dela possível.
A cabeleireira mal tinha tirado a capa
protetora dos ombros de Luisa, quando
ela estava de pé, agradecendo o corte
maravilhoso e indo para a porta.
Seus
pensamentos
congelaram
quando a francesa olhou para alguma
coisa sobre o ombro de Luisa, então fez
uma cortesia.
– Ah, Luisa, Mademoiselle. Vocês
acabaram? – veio a voz profunda de
Raul.
– Sim, nós acabamos. – Enrijecendo a
coluna, ela se virou.
Mais uma vez, o esplendor dele
atingiu-a com força total. Não somente
a elegância da figura alta e forte num
terno impecável. O impacto da
personalidade forte estava estampado
nas feições austeras dele.
– Eu gosto do seu novo visual. – O
sorriso de Raul foi como mel quente. O
brilho de apreciação nos olhos verdes
parecia genuíno. Ela disse a si mesma
que não se importava. Mesmo que seu
coração
estivesse
freneticamente
disparado.
– Obrigada.
Quando a cabelereira se dirigiu para
a porta, Luisa seguiu-a.
Devia ter sabido que não seria fácil.
Uma mão firme segurou seu cotovelo,
quando ela passou por Raul.
– Aonde você vai?
– Sair. – Ela olhou de modo
significativo para a mão que a prendia.
– Isso é impossível. Você tem outro
compromisso.
Uma fúria envolveu-a.
– Verdade? Que estranho. Eu não
me recordo de ter marcado algum
compromisso.
Desde
que
concordara
em
acompanhá-lo era assim. Educação da
parte dele e deferência do staff. No
entanto, todas as decisões tinham sido
tomadas por ela.
No começo, Luisa estivera num
estado de choque, muito perplexa para
fazer mais do que ceder à força de
vontade de Raul. Mas sua indignação
crescera a cada hora. Especialmente
quando ela fora informada, não
questionada, sobre compromissos com
manicura,
pedicura,
cabelereira,
costureira... Como se ela fosse uma
boneca animada, não uma mulher com
cérebro próprio.
Ele baixou a mão.
– Está aborrecida.
– Você notou! – Ela respirou fundo,
lutando por controle.
Luisa passara tempo suficiente
lutando contra intimidadores. Desde
seu avô tirânico até grandes bancos
ansiosos por retorno imediato. Até esse
homem, que tomara conta de sua vida.
Deveria ser capaz de enfrentá-lo!
Nunca se sentira tão impotente.
Isso a assustava. E instigava seu
espírito de luta.
– Você está cansada, após a longa
jornada.
Luisa não dormira um segundo,
mesmo na cama luxuosa designada para
ela durante o longo voo para a Europa.
Todavia, fadiga era a menor de suas
preocupações.
– Estou cansada de ter você dirigindo
minha vida. Apenas porque eu cedi à
chantagem não significa que perdi a
habilidade de pensar. Não sou um
capacho.
– Ninguém presumiria...
– Você presume, o tempo inteiro!
Não me perguntou uma única vez sobre
nada. Seu staff simplesmente me
informa o que você decidiu.
Os olhos velados de Raul não
entregavam nada, mas o ângulo do
queixo disse-lhe que ela o atingira.
Ótimo! A ideia de irritar aquele homem
era atraente. Já era hora de ele
descobrir como era a sensação de não
conseguir o que queria.
– Membros da realeza têm um
horário rígido.
– E pessoas que trabalham em
fazendas de gado leiteiro não? – Ela pôs
as mãos nos quadris. – Depois que você
passar sua vida acordando antes do
amanhecer, para fazer a ordenha, fale
comigo sobre gerenciar meu tempo!
– Não é a mesma coisa.
– Não, não é. – Luisa esforçou-se
para manter a voz calma. – Minha vida
podia não ser excitante, mas era sobre
trabalho árduo e honesto. Um trabalho
de verdade, fazendo alguma coisa útil.
Não – ela gesticulou para o salão
decorado e o homem prepotente à sua
frente –, não brilho e privilégios vazios.
O maxilar esculpido de Raul
enrijeceu, e os dedos longos se
flexionaram e se curvaram. A energia
irradiava dele como uma força tangível.
– Você vai descobrir que a vida de
uma realeza não é ociosa. Governar um
país é um emprego exigente de período
integral.
Luisa ignorou-o. Nada desculpava a
maneira que ele a tratava. Aquilo tinha
de mudar. Agora.
– Sob extrema coação, eu concordei
em vir para seu país e aceitar minha
herança. Isso não lhe dá carta-branca
para gerenciar a minha vida.
– Aonde você estava indo? – A
pergunta de Raul surpreendeu-a.
Luisa olhou pelas janelas, para a vista
de um bulevar elegante e um parque a
distância.
– Eu nunca estive em Paris. – Ela
nunca viajara. Exceto para a casa de seu
avô, e para Sidney, quando sua mãe
visitara especialistas. Nenhuma delas
havia sido uma experiência prazerosa. –
Quero explorar.
– Não há tempo. Suas roupas novas
chegaram, e você precisa se arrumar. É
importante parecer uma princesa
quando descer do avião, em Maritz.
– Do contrário, eu posso não sair
bem nas fotos da imprensa? – Luisa
zombou, então notou o jeito que ele se
fechou diante de sua menção da
imprensa.
– É por você, também, Luisa.
Imagine-se chegando no meio da
agitação do público, vestida como está.
Havia uma ponta de compaixão na
voz dele, ou ela imaginou isso?
– Não há nada errado com minhas
roupas. Elas são...
Baratas, confortáveis e um pouco
surradas. Não era que Luisa não
quisesse roupas lindas. Era a ideia de
fingir ser alguém que não era, como se
não valesse a pena conhecer a Luisa
verdadeira. Todavia, uma vozinha
interior admitia que ela não queria
enfrentar a imprensa da nação como
estava.
Não queria enfrentar a imprensa, em
absoluto!
– Roupas são como armaduras. Você
se sente mais confiante em roupas que
melhoram sua aparência.
Ele falava por experiência própria?
Vendo a inclinação orgulhosa da cabeça
escura, Raul provavelmente poderia
ficar nu diante de uma multidão e não
perder sua atitude régia.
Sua respiração acelerou diante da
ideia de Raul nu. Com aquelas pernas
longas e fortes, e aquele torso
poderoso...
Com esforço, Luisa focou-se no
assunto em mãos.
– Eu não preciso de permissão para
sair. Não lhe devo satisfações, e
pretendo ver um pouco da cidade.
– Então, e seu eu levá-la para sair,
esta noite? – Luisa piscou em
perplexidade. – Tenho compromissos
pelo resto do dia, mas depois do jantar,
se você quiser, eu lhe mostrarei alguns
dos pontos turísticos de Paris. – Ele
pausou, quase sorrindo. – Que tal isso?
A ideia de sair daquela casa
claustrofóbica era tão irresistível que ela
não questionou por que Raul estava
cedendo.
– Combinado.
SEIS HORAS depois, Luisa estava num
cruzeiro de barco no rio, inclinando-se
sobre o parapeito conforme cada ponto
turístico surgia à vista. Desde a Ile de la
Cité, com a catedral de Notre Dame
iluminada contra a escuridão, até a
Ponte Nova e a brilhante Torre Eiffel.
Paris deslizava em volta deles,
maravilhosa e sedutora. Todavia, ela
ainda se sentia tensa.
Ela e Raul eram os únicos
passageiros.
Outro lembrete do que o dinheiro
dele podia comprar.
Como suas roupas. Calça de lã preta,
com uma túnica chique cor de creme.
Botas e um casaco longo de couro
macio. Um lenço de seda azul e cor de
laranja, que levava cor às suas faces.
Exceto que suas faces já queimavam
com o lembrete dos sussurros do
estilista para o assistente de Raul sobre
sua forma, tamanho, postura e andar.
Sua postura era boa, aparentemente,
mas o andar! Como o de um homem. E
ela não tinha noção de como ostentar
uma roupa!
Todavia, apesar de sua aparente
insubordinação,
ela
havia
sido
transformada.
Não que Raul tivesse notado. Ele a
escoltara para o carro sem uma palavra.
O orgulho de Luisa ficara ferido por ele
não ter comentado sobre sua aparência.
Era óbvio que aquilo lhe era
indiferente.
E esse homem que falara de
casamento!
Ela respirou fundo. Em Maritz,
consultaria advogados. Devia haver
uma saída do contrato de casamento.
– Você está se divertindo? – No
escuro, ela viu movimento, quando
Raul parou ao seu lado. Uma onda de
calor a inundou. Luisa detestava como
seu corpo traidor respondia, entretanto,
não conseguia conter a excitação. Nem
quando adolescente, época na qual se
acreditara apaixonada, sentira-se dessa
maneira.
– A cidade é linda. Obrigada pelo
cruzeiro.
– Então você admite que há
vantagens em nosso arranjo?
– Elas não são maiores do que as
desvantagens – retrucou ela, frustrada.
Ele fez um movimento abrupto com a
mão, um raro sinal de impaciência que
a surpreendeu. Raul era normalmente
tão calmo.
– Você se recusa a ficar satisfeita,
independentemente do que lhe é
oferecido.
– Eu não me recordo de nenhuma
oferta. Oferta implica em escolha.
– Você preferiria estar com suas vacas
preciosas a estar aqui? – O gesto dele
englobava a vista mágica. – Eu lhe dei a
chance de ser rainha.
– Casando-me com você. – Ela deu
um passo atrás. – Eu irei com você para
Maritz, mas quanto ao casamento... –
Luisa meneou a cabeça.
O brilho feroz nos olhos dele deixoua ansiosa, instigando-a a acrescentar:
– Você não pode me dar nada que eu
verdadeiramente desejo!
Anos antes, um homem tentara
tomá-la, não por paixão, mas por
ambição calculada. Aquilo a fizera se
sentir suja. Foi quando Luisa decidira
que nunca se contentaria com nada
menos do que amor.
– Eu quero me casar com um homem
que faça meu coração disparar e meu
corpo cantar...
Mãos fortes agarraram seus braços, e
ela fitou o rosto esculpido, tão perto.
Um calor preenchia os olhos verdes. A
expressão dele enviou adrenalina pelo
corpo de Luisa.
Raul abaixou a cabeça e a respiração
quente soprou-lhe o rosto.
– Assim, você quer dizer?
CAPÍTULO 4
A
de Raul cobriu a de Luisa,
pressionando, demandando, até que ela
entreabriu os lábios num suspiro, e ele
tomou posse.
Tarde demais para perceber seu erro.
A faísca de indignação e culpa que o
instigara a silenciá-la se transformou
numa chama ardente. Ele explorou a
boca doce de Luisa e descobriu alguma
coisa inesperada.
BOCA
Única.
E subitamente, precisava de mais.
Suspeitara, quase desde o começo, que
havia alguma coisa única sobre Luisa.
Mas isto...!
Ele aprofundou o beijo, e lá estava a
sensação, novamente. Uma excitação
que não experimentava desde que era
adolescente.
Raul puxou-a para mais perto e
entrelaçou a mão nos cabelos sedosos
que quisera tocar desde que entrara no
salão aquela tarde.
O fogo baixou para sua barriga,
então, espalhou-se por todas as
direções.
Quando ela circulou seu pescoço com
os braços, um tremor o abalou.
Como um beijo podia fazer aquilo
com seus sentidos?
O
beijo
continuou,
inacreditavelmente
provocante,
enquanto ela o explorava de maneira
sensual e arrepios de deleite o
percorriam.
Raul deslizou a mão por baixo do
casaco longo dela, sobre a curva do
traseiro firme. Abrindo os dedos,
pressionou-a contra si, e sentiu a
suavidade feminina lhe dando as boasvindas. A luxúria inundou-o.
Ele engoliu o gemido de Luisa,
correspondendo ao beijo dela com
fervor crescente. Luisa tinha gosto de
sol, era quente, suave e deliciosa.
E ele percebeu que nunca se sentira
tão sem controle na vida. Queria deixar
a paixão seguir seu curso inevitável.
Uma luz brilhante caiu sobre eles,
um banho de sanidade.
Raul piscou na luz de uma ponte
acima. Levantou a cabeça, mas suas
mãos continuaram em Luisa, as partes
inferiores de seus corpos unidas,
mesmo quando eles passaram por um
grupo de turistas, olhando para o rio
Sena abaixo.
Mesmo agora, o desejo o inundava.
Deus! O que estava fazendo, dando
liberdade à paixão, em público? Isso era
absurdo! Raul mantinha sua vida sexual
escrupulosamente privada, depois do
terrível escândalo, oito anos atrás.
Trabalhara incansavelmente desde
então para restaurar a crença de seu
povo e o respeito pela monarquia.
Entretanto, não conseguia tirar os
olhos de Luisa, não conseguia se forçar
a dar um passo atrás.
Os lábios dela estavam entreabertos.
Os cílios escuros estavam baixos,
escondendo os olhos. Ela parecia
devassamente convidativa, e o calor em
seu sexo intensificou-se.
Esta podia ser a mesma mulher que
ele uma vez pensara que não era
feminina? Ela era linda.
Mas ele conhecia mulheres lindas o
tempo inteiro. E nenhuma o fazia se
sentir assim.
As mulheres em sua vida eram
companhias fáceis. Elas satisfaziam sua
necessidade por sexo. Raul as tratava
bem, e elas eram ansiosas para agradar.
Simples. Descomplicado.
Todavia, com Luisa, ele não
respondia meramente a uma mulher
bonita. O fogo, a determinação e a força
dela eram únicos. Ele também se sentia
desejado.
Ela se mexeu contra ele, e uma carga
de energia erótica o preencheu.
Não! Estava imaginando coisas. Este
desejo era tão intenso porque ele lhe
permitira provocar raiva.
Raul evitou analisar o fato de que
isso em si era incomum. Aprendera,
anos atrás, a canalizar todas as suas
energias no trabalho. A emoção o levara
à beira do desastre. A consequência de
tal erro tinha destruído sua família e
ameaçado o país. Agora, ele sabia
controlar seu mundo. Nunca mais seria
um refém do sentimento.
Os olhos de Luisa se abriram, e ela o
encarou. O coração de Raul disparou,
enquanto
suas
racionalizações
ameaçavam virar pó.
Abruptamente, ele a liberou e deu
um passo atrás.
O QUE ela havia feito?
Luisa balançou, suas pernas bambas,
sensações não familiares percorrendo-a.
Ela certamente não podia ter beijado
o homem que a chantageara?
Certamente, não... gostara daquilo?
O ar frio batia no seu rosto. Todavia,
um calor instalara-se em sua barriga e
entre as pernas.
O que acontecera com a reserva que
a mantivera impérvia para o sexo oposto
por tanto tempo? Com a cautela nascida
de desilusão e dor?
Raul a envolvera nos braços,
beijando-a, e ela passara de indignada a
desejosa e ansiosa por mais.
Como podia responder a um homem
que certamente odiava?
E ter revelado sua inexperiência para
ele! De jeito algum, seu entusiasmo
desavergonhado tinha compensado por
sua falta de habilidade. Ele sabia como
ela era ingênua. Devia estar zombando
dela, pensando que agora tinha a
camponesa comendo na palma de sua
mão.
Ecos do passado preencheram o
cérebro de Luisa. Ela não aprendera?
Como
podia
estar
suscetível,
novamente?
Com relutância, abriu os olhos.
Instantaneamente, ele se afastou, a
expressão carrancuda, como se não
pudesse acreditar que a tocara.
A dor a percorreu. Sem dúvida, ela
não correspondera aos padrões do
príncipe. Luisa experimentou uma
sensação de déjà vu, lembrando-se das
terríveis revelações de seu expretendente.
– Eu não quero que você me toque. –
A voz dela foi ríspida.
– Não foi essa a impressão que você
me deu um momento atrás. – Raul
puxou a camisa, endireitou o paletó.
– Eu não o convidei para tais
intimidades. – Convenientemente, ela
ignorou o jeito que se entregara ao
beijo.
Na iluminação fraca, enquanto o
barco se afastava da ponte, ele parecia
ter enrubescido. Mas isso devia ser
imaginação sua. A fisionomia de Raul
ainda era arrogante.
– Eu peço desculpas. Fique tranquila,
pois não tenho o hábito de forçar
minhas atenções onde elas não são
desejadas.
Raul fez uma reverência formal.
– Eu a deixarei para que você
contemple a vista.
Ele se virou e andou para a cabine do
leme. Parecia muito calmo, como se a
paixão deles tivesse sido imaginação de
Luisa. Como se não tivesse sentido
nada.
Mas ele estivera tão sedento por ela
quanto ela por ele.
Ou não? A possibilidade de que Raul
tivesse fingido desejo abalou-a.
Por que ele faria isso?
A resposta veio rapidamente demais.
Para torná-la uma submissa sonhadora.
Luisa balançou contra o parapeito.
Funcionara. Quando ele a beijara,
todas as suas dúvidas e raiva haviam
desaparecido. Os beijos ardentes
tinham nublado sua mente e
preenchido seu corpo com ânsia
desesperada.
Sua posição impossível acabara de se
tornar impossivelmente complicada.
RAUL REPRIMIU uma onda de tristeza
quando Luisa saiu de sua suíte. Era
uma infelicidade que ele tivera de
chantageá-la
ao
casamento.
A
vulnerabilidade e o orgulho feroz dela o
tocavam. E aquela paixão...
Não! A noite anterior tinha acabado.
Uma fraqueza passageira.
Ele estava no controle agora. Era
impossível que seus sentimentos
estivessem envolvidos pela mulher no
topo da escadaria. Raul não tinha
sentimentos. Não mais. Um erro
desastroso o curara.
Todavia, numa calça cor de mel e
blusa de seda preta, Luisa estava linda.
O traje realçava as curvas que ele
segurara apenas horas atrás. Seus dedos
se flexionaram com as memórias, ainda
vívidas depois de uma noite de insônia.
Ela deu uma rápida olhada na sua
direção e mordeu o lábio.
Uma onda de desejo perturbou sua
calma interior.
Estoicamente, ele ignorou isso,
observando-a descer a escada. Ela
segurava no corrimão com força,
claramente insegura nos saltos altos.
Como ele suspeitara. Luisa precisaria
de ajuda quando eles chegassem a
Maritz, em poucas horas. Ele não queria
que ela caísse da escada do avião e
quebrasse o pescoço.
Ele olhou para a longa linha do
pescoço delicado. Ela possuía uma
elegância natural, que as roupas de
fazenda tinham camuflado.
Seus olhares se encontraram, e a
pulsação de Raul acelerou.
Ele franziu o cenho. Uma coisa era
sentir desejo com o corpo quente de
uma mulher pressionado intimamente
contra o seu. Outra bem diferente era
experimentar isso ali, quando seu
mordomo esperava para conduzi-los a
caminho do aeroporto.
Pior, aquilo parecia mais complexo
do que luxúria. Em dois dias, Luisa, de
alguma maneira, entrara em sua cabeça.
Instantaneamente, ele rejeitou a
ideia. Era simples desejo que
experimentava.
– Luisa. Espero que você tenha
dormido bem.
Ela se aproximou quando acabou de
descer a escada. Tropeçou, e Raul
estendeu a mão para firmá-la, mas ela
puxou
o
braço,
passando
apressadamente por ele.
Raul respirou fundo. Depois de uma
vida inteira esquivando-se de mulheres
muito ávidas, descobriu que não
gostava da alternativa.
– Sim, obrigada. Eu dormi bem.
Mentirosa! Apesar da maquiagem
realçando os olhos azuis, Raul via os
sinais de fadiga.
– E você? – A expressão de Luisa era
desafiadora, como se ela soubesse que
ele passara a maior parte da noite
acordado, revivendo aqueles momentos
quando ela se derretera em seus braços
como uma sedutora de nascença.
Mesmo agora, ele não tinha certeza
sobre Luisa. Houvera mais do que uma
dica da inocência dela, na noite
anterior.
Mas então, fingir inocência podia ser
uma arma tão efetiva. E ele sabia disso
por experiência própria. Um calafrio o
percorreu.
– Eu sempre durmo bem em Paris. –
Ele ofereceu o braço, novamente, desta
vez, prendendo-lhe o olhar até que ela
cedesse.
Raul cobriu-lhe a mão com a sua,
segurando-a de maneira possessiva.
Quanto antes ela se acostumasse com
ele, melhor.
– E agora, se você está pronta, nosso
avião está esperando.
Ele a sentiu tremer. Viu os olhos
azuis se arregalarem no que parecia
ansiedade.
Não havia nada a temer. A maioria
das mulheres venderia a alma para estar
no lugar de Luisa, casando-se com um
homem que a imprensa rotulava como
um dos solteiros mais elegíveis do
mundo. Mas era óbvio que Luisa não
era como as outras mulheres.
Raul ouviu-se dizendo:
– Eu cuidarei de você, Luisa. Não
precisa ficar ansiosa.
FOI DURANTE o caminho para o
aeroporto que Raul descobriu o custo
de suas ações impulsivas da noite
anterior. O discreto toque de seu
celular, e a breve conversa com Lukas,
já os esperando no aeroporto, o fez
pedir licença e abrir seu notebook.
Não que Luisa tivesse notado. Ela
estava ocupada pressionando o nariz na
janela, enquanto o carro percorria as
ruas de Paris.
Raul acessou a página de notícias em
seu computador. O tipo de manchete
que ele habitualmente ignorava:
“AMANTE SECRETA DO PRÍNCIPE”.
“INTERLÚDIO
PARISIENSE
DE
RAUL”. “SEDUÇÃO ARDENTE NO
RIO SENA”.
Não havia muito nos artigos, aparte
especulações sobre a identidade de sua
nova amante. Todavia, a raiva o
inundou, enquanto ele via foto após
foto do beijo da noite anterior.
Ele franziu o cenho, perplexo por sua
reação.
Essa não era a primeira vez que os
paparazzi o fotografavam com uma
mulher. Ele era um assunto favorito.
Geralmente, não se importava com
aquele tipo de artigo.
Mas dessa vez...
A compreensão lhe causou uma onda
de náusea.
Dessa vez, o fotógrafo o pegara num
momento de rara vulnerabilidade. A
imprensa não poderia saber, mas Raul
estivera sem controle, dominado por
forças não familiares. Por uma
compulsão que não experimentara em
anos.
Oito anos, na verdade.
Desde a especulação da imprensa
sobre um triângulo amoroso da realeza.
A memória o enojava.
Desde que aprendera a desconfiar
dos protestos femininos de amor e
demonstração de inocência. Desde que
ele
reconstruíra
seu
mundo
despedaçado
com
determinação,
orgulho e uma completa falta de
emoções.
Seu estômago se contraiu quando ele
se lembrou de enfrentar a imprensa,
ávida pelo cheiro de sangue... do seu
sangue. O esforço de parecer inabalado
diante da maior traição. De como ele
tivera de reconquistar seu autorrespeito
depois de cometer o maior erro de sua
vida. Como, dia após dia, tivera de
permanecer forte. Até que, finalmente,
a fachada se tornara realidade, e Raul
aprendera a viver sem elos emocionais.
Exceto por seu amor a Maritz.
Ele fechou o notebook.
As causas não eram as mesmas. Ele
sofrera com a intensidade de emoções
juvenis. Agora, aos 30 anos, estava no
controle de seu mundo. O que sentira
na noite anterior tinha sido luxúria,
nada mais.
Além disso, o interesse público em
Luisa poderia ser usado para vantagem.
Não seria ruim insinuar que havia mais
em suas núpcias iminentes do que a
realização de um contrato legal. As
pessoas gostavam de acreditar em
contos de fadas, e isso poderia facilitar o
caminho para ela.
Raul planejara uma chegada discreta
a Maritz, a fim de dar a Luisa tempo
para se ajustar ao ambiente novo.
Todavia, nas circunstâncias, revelar a
identidade dela tinha, definitivamente,
benefícios.
Ele combinaria isso com Lukas no
aeroporto.
– VOCÊ PODE tirar o cinto, madame. – A
comissária de bordo sorriu para Luisa,
em seu caminho para a porta aberta do
avião.
Um nó se formou na boca do
estômago de Luisa.
A ideia de sair do avião e entrar no
país que um dia tinha sido de sua mãe,
e de seu avô detestável, apavorava-a.
Um pressentimento a avisava que esse
próximo passo seria irrevogável.
Mais uma vez, ela experimentou a
sensação do mundo se encolhendo para
um túnel escuro, onde o futuro à sua
frente era imutável.
– Aqui. – Uma voz profunda
interrompeu seus pensamentos. –
Deixe-me ajudá-la. – Mãos grandes e
capazes desafivelaram seu cinto e o
tiraram de seu colo.
Luisa levantou a cabeça para
encontrar Raul inclinado sobre ela, os
olhos calorosos.
Seu coração disparou, fazendo-a
lembrar mais uma vez da intimidade
deliciosa da noite anterior.
Então ele deu um passo atrás e
estendeu um braço.
– É hora de ir.
Luisa assentiu, incapaz de falar. O
que estava lhe acontecendo? Não tinha
desejo de cair nos braços de Raul
novamente, entretanto, imaginou calor
nos olhos dele. Quando tudo que ele se
importava era com o quanto ela lhe era
útil.
Silenciosamente, Luisa o deixou
colocar um casaco de cashmere sobre
seus ombros, então andou para a porta.
Quanto antes chegasse ao destino deles,
mais depressa poderia falar com os
advogados e achar uma saída para
aquela situação.
Uma gritaria preencheu seus
ouvidos, e ela parou abruptamente no
topo da escada, piscando contra a luz
do sol.
– Está tudo bem – disse Raul. – Eles
estão apenas felizes em nos ver.
Ele deslizou um braço ao seu redor.
Luisa tentou afastar-se, mas Raul não
permitiu.
– Relaxe. Eu estou me certificando
que você não tropece nestes saltos altos.
Então
eles
desceram,
Luisa
segurando o corrimão, e estranhamente
grata pelo apoio dele. Pura bravata a
induzira a usar os saltos mais altos de
seu novo guarda-roupa, determinada a
parecer sofisticada. A ação se provara
um erro quando ela descobrira que sua
altura extra apenas a deixava mais perto
do olhar perspicaz de Raul.
Luisa focou-se na cena abaixo.
Uma multidão gritava e balançava
bandeiras de Maritz atrás da cerca, na
extremidade da pista de decolagem. O
maritzian de Luisa estava enferrujado,
de modo que tudo que ela podia
entender era o nome de Raul. E o seu.
Ela parou e olhou para Raul.
– O que está acontecendo?
– Uma recepção de boas-vindas.
Nada mais.
Luisa franziu o cenho, lutando contra
uma sensação de irrealidade.
– Mas como eles sabem meu nome?
Ele deu de ombros.
– Sua identidade não é um segredo,
é?
Ela meneou a cabeça.
– Mas isso não faz sentido. Como
pode...
A visão de um cartaz no meio da
multidão a fez parar no meio da
sentença. Mostrava seu nome e o de
Raul, unidos num grande coração, com
uma coroa no topo.
Luisa virou-se e leu satisfação nos
olhos dele.
– O que você fez?
– Eu autorizei meu staff a confirmar
sua identidade, se interrogada. Agora,
vamos.
Muda, Luisa o encarou, sua mão
apertando o corrimão.
Os olhos verdes brilharam, então
Raul sorriu.
– Como quiser, madame.
Ele fez uma reverência. Mas não era
uma reverência, percebeu ela quando
braços fortes a circularam.
Segundos depois, ele a ergueu contra
seu peito. A multidão vibrou em
aprovação. Mas Luisa mal ouviu os
gritos.
Deveria odiar ser tratada dessa
forma. Odiava! Quase.
Ele sorriu, aninhando-a mais junto a
si.
– Carregando minha noiva escada
abaixo.
CAPÍTULO 5
LUISA ATRAVESSOU a pista de decolagem
em direção à multidão. Era assustador.
Por um momento insano, desejou que
estivesse de volta nos braços dele. Para
seu horror, ela se sentira... segura lá.
Seus joelhos tremiam com cada
passo. O braço de Raul em volta de sua
cintura era tanto um tormento como
um apoio.
Ela engoliu em seco, nervosa. E
furiosa.
– Não desmaie agora, Luisa.
– Sem chance – disse ela, e tentou
responder aos sorrisos em muitos
rostos. – Eu não vou desmaiar nos seus
braços. Nem pela sua audiência.
– Nossa audiência.
Uma série de flashes disparou ao
redor deles. Raul ergueu a mão em
reconhecimento, e a multidão vibrou
mais.
As informações que ela encontrara
na internet mencionavam a dedicação
de Raul ao país, mas Luisa não
percebera o quanto ele era popular.
Cinicamente, estudou a multidão, e
notou que havia aproximadamente três
vezes mais mulheres do que homens.
Isso explicava um pouco da excitação
do povo.
Seria fácil apaixonar-se por Raul, se
você não conhecesse o homem por trás
do exterior maravilhoso.
Ele a conduziu para uma limusine
brilhante. Eles tinham quase chegado
ao carro, quando Luisa viu o que
provocara tanto interesse. Alguém
erguia uma página de jornal, com uma
foto de um casal se abraçando
apaixonadamente.
Levou um minuto para ela perceber a
verdade. O homem que olhava de
maneira tão possessiva para a mulher
era Raul. O rosto sério falava de desejo
sexual feroz. Ou de maquinação
intensa.
E
a
mulher,
aparentemente
desmaiando nos braços dele, era ela!
Luisa
engoliu
em
seco,
freneticamente. Sentia-se... violada
diante do conhecimento que alguém
mais tinha visto aquele momento, visto
sua vulnerabilidade. Já era ruim o
bastante que Raul soubesse de sua
fraqueza,
mas
ter
outros
testemunhando isso, colocando no
jornal...
Ela arfou, diminuindo os passos.
– Vamos, Luisa. – Raul impulsionoua para a frente. – Não pare aqui, na
frente das câmeras.
A menção às câmeras colocou-a em
movimento, até que ela estivesse
sentada, tremendo, e batendo os
dentes, numa limusine.
– Luisa? – Mãos quentes esfregaram
as suas geladas. Então um paletó foi
colocado sobre suas pernas.
– Eu não preciso disto. Estou bem. –
Sua voz soou alta no silêncio, agora que
a tela divisória tinha subido. Mas uma
olhada pela janela, para as pessoas
observando o veículo deles a fez
encolher-se no banco de couro.
– Você sofreu um choque. Peço
desculpas. Eu deveria tê-la avisado. –
Luisa quase acreditou que havia
arrependimento genuíno na voz
profunda.
Mas sua mente estava marcada com a
memória da expressão dele naquela
foto. Ela não era tola para acreditar que
ele estivera tomado por paixão. Raul se
recuperara
muito
depressa.
Provavelmente estivera analisando se
sua sedução fora bem-sucedida.
Avaliando quão obediente ela seria no
futuro.
A fúria substituiu o choque.
– Você fez aquilo! – acusou ela. –
Armou para que aquela foto fosse
tirada.
O gelo cobriu as feições de Raul.
– Eu não negocio com paparazzi.
Luisa balançou a cabeça.
– Alguém fez isso! Eles estavam lá,
esperando por nós. Você não pode me
dizer...
– Eu lhe digo, Luisa, que não tenho
nada, exceto desprezo por repórteres e
fotógrafos que passam seu tempo atrás
de tais histórias. – O maxilar dele
enrijeceu.
Talvez ela fosse ingênua, mas tudo
em Raul, desde os ombros tensos, até o
brilho feroz nos olhos, a convenceram
que ele estava falando a verdade.
– A imprensa está sempre
espreitando por oportunidades para
fotografar.
Eles
me
seguem
constantemente, todavia, graças à
minha equipe de segurança, geralmente
a distância. Isso faz parte de ser um
membro da realeza.
– Eu não gosto muito da ideia de ser
da realeza, então.
Para sua surpresa, Raul deu um
sorriso raro, que fez alguma coisa em
seu interior se suavizar.
– Eu também não. Não dessa parte.
A mão dele envolvia a sua, e, por um
instante, Luisa teve vontade de sorrir de
volta, compartilhando um momento de
intimidade.
Exceto que aquilo era uma miragem.
Não havia intimidade.
– Lamento a foto, Luisa. Se eu tivesse
percebido que estávamos visíveis... – Ele
deu de ombros.
E ela se pegou querendo acreditar
nele.
– Mas mesmo se a imprensa tivesse
reportado nosso... nosso passeio no rio,
não entendo por que a multidão ficaria
excitada sobre a minha chegada.
Certamente, eles não se reúnem para
ver todas as suas... namoradas. – Luisa
puxou a mão da dele.
– Eu lhe disse. Instruí meu staff para
explicar quem você é, se isso fosse
questionado.
– Mas meu nome não significaria
nada!
– Seu título significa. Princesa Luisa
de Ardissia.
Luisa congelou quando entendeu as
implicações.
– Eu não sou princesa ainda. Não
assinei...
– Mas assinará. Foi para isso que
você veio aqui, não foi?
Ela
assentiu,
experimentando
novamente aquela sensação de estar
encurralada.
– Isso não foi tudo que eles falaram,
foi? – perguntou ela, desconfiada,
tirando o paletó dele de cima de suas
pernas. – Eles mencionaram o contrato
de casamento, não é?
Raul prendeu-lhe o olhar, e, por um
momento, ela sentiu um eco das
emoções da noite anterior, quando ele a
puxara para mais perto e dera-lhe puro
prazer.
– Isso não é segredo, Luisa, embora
os detalhes não sejam amplamente
conhecidos.
Ela se
recostou, o coração
bombeando.
– Você nunca desiste? O que
esperava conseguir? Pressionar-me para
que eu concordasse?
Era como se ele soubesse que Luisa
ainda tinha esperança de evitar o
casamento.
– Eu não serei forçada ao casamento,
porque seu público precioso espera isso.
Se eu saísse de cena, a história seria
toda sobre você. Como foi rejeitado.
Não sobre mim.
Raul empalideceu. Uma energia
irradiou-se dele. Um senso de poder
mal controlado. De perigo.
– Não haverá rejeição. – Fascinada,
Luisa viu músculos pulsando no maxilar
de Raul.
– Eu não deixarei meu povo no caos
que se seguiria se eu desistisse do trono.
– Ele pausou. – Lembre por que você
concordou em vir para cá.
Olhos determinados encontraram os
seus, e qualquer esperança de que ele
não cumprisse a ameaça desapareceu.
Este homem faria qualquer coisa para
conseguir o que queria. Como ela
permitira que o carinho falso da noite
anterior a cegasse para isso? Ou a
solicitude dele, ali no carro?
Luisa fechou mais seu casaco e virouse para a janela.
Eles tinham saído da estrada e se
dirigiam à parte velha da cidade.
Atravessaram uma praça larga, com
construções em estilo barroco, que
hospedavam lojas caras.
O carro virou, e diante deles surgiu
uma ladeira íngreme, quase um
penhasco. No topo, parecendo crescer
de uma pedra viva, estava o castelo real.
Pedras cinza, com torres redondas e
telhados cobertos de folhagem, eram
visíveis atrás da enorme muralha.
Livros turísticos diziam que o castelo
era um grande exemplo de construção
medieval, modernizado com salões
espetaculares do século XVIII, de onde
se tinha vistas extraordinárias dos Alpes
e do rio abaixo. Que a casa era única na
Europa central, e seu salão de bailes,
uma joia arquitetônica.
Mas o que não saía da cabeça de
Luisa era que, em quase um milênio de
uso, ninguém nunca escapara dos
calabouços do castelo, uma vez presos
por ordem do rei.
SUA SUÍTE de cômodos era arejada, clara
e suntuosa. Nada parecida com uma
cela de prisão. Todavia, Luisa mal
absorvia a beleza à sua volta.
Estava diante das janelas, olhando as
montanhas cobertas de neve a
distância. Era onde Ardissia ficava. O
lugar que a unia à riqueza e posição, e a
uma vida de brilho vazio, em vez de
calor e segurança emocionais. Unida a
Raul. Um homem cuja ambição a
repelia, entretanto a fazia tremer de
excitação.
Luisa trilhou os dedos sobre a mesa
antiga. Não que ela não gostasse de
coisas bonitas ou das roupas de grife.
Era que sabia que tais coisas não eram
substitutas de felicidade. De carinho e
amor. Ela crescera com amor, e sua
única experiência em romance lhe
ensinara que não poderia aceitar outra
coisa.
Num impulso, Luisa pegou o
telefone. Consultando o relógio,
calculou a diferença de fuso horário.
Com a ajuda de uma lista telefônica,
achou o código internacional e ligou
para casa.
– Oh, querida! É tão bom ouvi-la. –
A voz animada de Mary acalmou um
pouco de sua tensão. Luisa sentou-se
numa cadeira diante da mesa. – Você
está bem? Como foi a viagem? O
adorável príncipe Raul está cuidando de
você?
Luisa mordeu o lábio ao pensar em
como Raul estava cuidando dela.
– A viagem foi boa, Mary. Nós
paramos em Paris...
– Paris? Verdade?
Luisa contou um pouco sobre a
viagem, respondendo as perguntas de
Mary, até que, finalmente, a conversa
focou-se no lar.
– Nós sentimos a sua falta, querida.
Parece estranho com aquele novo
homem e o filho dele, na sua casa. Mas
não posso negar que eles começaram
bem. Ele parece ser um administrador
decente. E está avaliando as mudanças
que você e seu pai começaram, para
modernizar a coorporativa. E, cá entre
nós, é um alívio saber que as dívidas
foram canceladas. Sam é um novo
homem, sem aquele peso sobre ele. E
Josie está empolgada sobre se mudar
para a cidade, a fim de estudar, agora
que nós podemos ajudá-la com o
aluguel. E a pequena Julia Todd, que
está grávida e estava preocupada em
como sustentaria outra criança, agora
está radiante.
Luisa pôs o cotovelo sobre a mesa, e
baixou a cabeça na mão.
Com cada nova revelação de Mary
ficava mais claro que Luisa não poderia
voltar. Seu passado, a vida que ela
amara, estava fechado para ela.
O último fio de esperança acabara
hoje, quando ela estudara os olhos
verdes no rosto bonito. Raul faria
qualquer coisa que fosse necessária para
obter a coroa que cobiçava.
As pessoas que ela amava já estavam
seguindo em frente, antecipando o
cancelamento
das
dívidas
da
cooperativa. Luisa tinha entendido isso,
mas só agora a realidade devastadora a
atingia com força total.
Luisa não tinha escolha.
Levantou a cabeça e olhou ao redor
do cômodo delicado. Um cômodo para
uma princesa.
Tremeu diante da enormidade do
que enfrentaria.
Mas o exemplo de seus pais era
vívido
em
sua
mente.
Independentemente do que a vida lhes
despejava, eles lutavam, fazendo o
melhor que podiam, sem reclamar.
Luisa ergueu o queixo. Era hora de
enfrentar seu futuro.
– RAUL.
Ele ergueu os olhos dos papéis que
estava
discutindo
com
Lukas...
relatórios perturbadores sobre mais
inquietação.
Luisa estava parada junto à porta.
Havia alguma coisa diferente sobre ela.
A mulher nervosa de meras horas atrás
tinha desaparecido. Esta era a Luisa que
ele vira pela primeira vez... confiante e
no controle, entretanto, sem a
aparência de alguém que trabalhava
numa fazenda.
Ela estava... magnífica.
Ele se levantou.
– Nós continuaremos mais tarde,
Lukas. – Seu assistente juntou os
relatórios e saiu do estúdio, fechando a
porta.
– Por favor, sente-se.
Ela atravessou a sala e parou na
frente da mesa.
– Isto não vai demorar.
Raul rodeou a mesa.
– O que eu posso fazer por você,
Luisa? – Esta era a primeira vez que ela
o procurava.
Olhos azuis encontraram os seus.
– Eu vim para lhe dizer que farei isso.
Eu me casarei com você.
Raul respirou fundo, quando o nó de
tensão que apertara sua barriga por
tanto tempo se soltou.
Apesar de sua determinação e de seu
desespero, ainda tivera dúvidas se ela
iria até o fim naquilo.
– O que a fez mudar de ideia?
Ela deu de ombros.
– Isso importa?
Raul abriu a boca. Parte sua
acreditava que sim. A parte que queria
conhecer Luisa melhor. E parte, ele
supunha,
que
o
tornara
emocionalmente
suscetível,
todos
aqueles anos atrás. A parte que pensara
ter apagado de seu ser.
Ele meneou a cabeça. O que
importava era a concordância dela.
– Creio que não. – Raul pegou-lhe a
mão na sua. Ela não resistiu. – Eu lhe
prometo, Luisa, que farei tudo que
estiver em meu poder para que você
nunca se arrependa disto.
Ele lhe ergueu a mão para seus
lábios, pensando em tudo que aquilo
significava para ele e para seu povo.
– Você terá minha gratidão e minha
lealdade. – A pele de Luisa estava fria, a
expressão fechada, todavia, ele sentia a
pulsação acelerada no pulso dela.
Inalou o aroma feminino delicado.
Alguma coisa que parecia mais forte do
que gratidão o tocou.
– Você me deve mais.
Perplexo, ele levantou a cabeça. Ela
liberou a mão da sua.
– O que você quer?
Ela quase o convencera que não se
importava com riqueza e glamour. Ele
devia ter sabido. Ana não lhe ensinara
nada? Qual era o preço de Luisa?
– Eu quero... Eu não quero ser
tratada como uma boneca sem cérebro.
Sempre que possível, quero tomar
minhas próprias decisões. Não espere
ditar minha vida.
Raul observou o brilho desafiador
nos olhos azuis, o ângulo determinado
do pequeno queixo, e sentiu sua tensão
se dissolver.
Sem demandas absurdas? Sem
acessos de nervos ou lágrimas?
Orgulho e respeito por esta mulher
notável o inundaram.
Talvez, afinal de contas, Luisa fosse
tão única quanto parecesse.
Ele sorriu com prazer genuíno.
– Eu não esperaria menos de você.
RAUL VIU Luisa passar pelos conselheiros
reais, e atravessar a vasta sala de
recepção. A futura princesa de Ardissia
estava muito elegante em tons de
caramelo e creme. As costas estavam
eretas e o queixo erguido, como se ela
estivesse inabalada pela presença de
tantos nobres. Todavia, Luisa estava
pálida, e parecia um pouco frágil.
A culpa o assolou. Poucos dias atrás,
ela estivera levando uma vida
completamente distinta. Ele fizera a
coisa certa em cimentar aquele arranjo
tão rapidamente?
Raul reprimiu o pensamento. Isso era
para o bem da nação. A alternativa
levaria o país ao caos.
Quanto antes aquilo fosse feito,
melhor.
Ele atravessou a sala para recebê-la.
Quase a alcançara à mesa ornada,
quanto ela o viu e recuou. Um
desapontamento envolveu-o. Esta não
era a primeira vez que ela reagia como
se seu toque contaminasse.
E no movimento abrupto para tirar o
braço do alcance dele, Luisa derrubou
um tinteiro de cristal. O líquido preto
caiu no tapete tecido à mão, que era
uma relíquia de família, e no seu terno.
Todos arfaram ao mesmo tempo.
Num momento, Luisa tinha pegado
mata-borrão da mesa e se ajoelhado,
absorvendo a tinta.
Servos correram para ajudá-la, mas
ela não notou.
– Nós precisamos de alguma coisa
para absorver isto.
Raul tirou um lenço impecável do
bolso e ajoelhou-se ao seu lado.
– Isto ajuda?
– Não muito. Mas é melhor do que
nada. O pano branco juntou-se ao
líquido preto no tapete.
– Com licença, senhora. Senhora? –
Um dos membros do staff apareceu
com produtos para limpar o pior da
mancha.
– Luisa. – Raul segurou-lhe o
cotovelo, fazendo-a olhar para cima. –
O staff lidará com isto.
Ela abriu a boca para protestar, então
olhou por sobre o ombro dele, e
arregalou os olhos. Como se somente
agora lembrasse que todos os membros
da Suprema Corte e os conselheiros da
realeza estavam lá para testemunhar as
formalidades.
Enrubescendo, ela desviou o olhar.
Gentilmente, ele a ajudou a ficar de pé.
– Sinto muito. – Ela observou o staff
lidando com uma mancha que era
provavelmente irremovível.
– Está tudo bem – murmurou ele,
conduzindo-a para o outro lado da
mesa.
– Mas o tapete! É antigo e valioso,
certamente?
– Não importa. É incrível quão bem
eles fazem reproduções, hoje.
Ele ouviu seu mordomo arfar diante
da mentira. Na época do pai de Raul,
danificar uma relíquia de família como
aquela resultaria em punição severa.
Mas, vendo o desconforto de Luisa,
sentindo o braço delicado tremer sob
sua mão, Raul não se importou com
nada, exceto em aliviar a culpa dela.
– Venha – disse ele. – Aqui está um
assento para você.
Ela se sentou na cadeira, e Raul
afastou o mata-borrão de lado,
gesticulando para que o documento
fosse colocado à sua frente. Enfiando a
mão no bolso, retirou sua própria
caneta.
Maritz precisava acompanhar os
tempos
modernos.
Não
havia
necessidade de continuar a tradição de
assinar e testemunhar documentos
importantes com canetas de pena
antiquadas.
Lukas apresentou o documento que,
quando assinado, confirmaria Luisa
como princesa de Ardissia, herdeira da
fortuna do avô. E futura esposa de
Raul.
Estava espalhado sobre a mesa, e as
testemunhas se aproximaram. Raul
entregou a caneta a ela.
E esperou.
Pois Luisa não assinou. Em vez disso,
ela leu a tradução em inglês, lenta e
metodicamente. Apontou um dedo
para uma cláusula difícil e levantou a
cabeça, virando-se para Lukas, que
estava do seu outro lado.
– Você poderia me explicar esta
referência? – pediu ela, suavemente.
– É claro, senhora. – Lukas inclinouse sobre o pergaminho, explicando a
cláusula. Então, depois de alguns
momentos, outra.
A audiência começou a ficar
inquieta.
Raul
notou
algumas
sobrancelhas arqueadas entre os
conselheiros mais antiquados. Podia
imaginar o que eles estavam
cochichando. Que a mulher deveria
aceitar, agradecida, o que era oferecido,
sem questionar.
Luisa estava ciente dos sussurros na
sala. Suas faces coraram e o pescoço
elegante enrijeceu. Mas ela continuou
lendo cada linha.
Aquela demora para concretizar seus
planos deveria ter irritado Raul.
Entretanto,
sua impaciência foi
temperada com admiração. Luisa era
naturalmente cautelosa.
Como ele. Raul nunca assinava nada
sem cuidadosa consideração.
Recordou-se das informações que
recebera recentemente. Que, através de
investigação, tinha sido descoberto que
a
fazenda
de
Luisa
era
surpreendentemente
bem
administrada. Que as dificuldades
financeiras se deviam à grande seca e a
diversos problemas de saúde, incluindo
a morte do pai dela, no ano anterior.
Segundo os contadores, os negócios
tinham o potencial de ser tornar muito
bem-sucedidos, uma vez que dinheiro
fosse
liberado
para
novos
equipamentos.
Luisa
fizera
um
excelente trabalho.
Ela não era como outras mulheres.
Ele estivera tão focado em alcançar seus
fins que, inicialmente, pensara em Luisa
como uma esposa conveniente, não
como uma mulher de verdade. Agora,
ponderava sobre o tipo de mulher com
quem se casaria.
Olhou para a cabeça loura abaixada,
notando como ela mordia o lábio em
concentração.
Ela o fascinava, admitiu ele agora.
Aquele jeito obstinado, prático e
orgulhoso. A maneira despretensiosa e
a sensualidade natural. Há quanto
tempo uma mulher não o intrigava
tanto? Desde quando um beijo o fizera
perder a cabeça?
Finalmente, com um movimento ágil,
Luisa levantou a caneta e assinou.
Somente Raul, posicionado bem perto
ao seu lado, viu como a mão dela
tremeu. Feria-o ver como aquilo
custava a ela.
Todavia, um alívio o inundou. Estava
quase feito. Logo, a coroa seria sua. Seu
destino estava em suas mãos. Seu país
ficaria seguro.
Raul pegou a caneta e, com um
floreado, adicionou sua assinatura
como primeira testemunha.
– Obrigado, Luisa – murmurou ele.
Ela inclinou a cabeça e seus olhos se
encontraram. Um calor inundou seu
baixo-ventre, as reverberações daquele
ato o envolvendo, mesmo quando ela
desviou o olhar.
Agora, esta mulher intrigante, tão
sem sofisticação, entretanto com graça e
integridade tão inatas, estava unida a
ele.
O casamento seria de conveniência.
Pelo bem da nação.
Entretanto, para sua perplexidade,
Raul
registrou
uma
satisfação
puramente
pessoal
diante
da
perspectiva.
CAPÍTULO 6
– EU
poderia ter feito um
trabalho melhor de estragar aquilo,
nem se tivesse tentado. – Luisa fez uma
careta, enquanto seguia Lukas, através
de um labirinto de corredores, para sua
suíte.
Um calafrio a percorreu diante da
memória dos olhos críticos sobre ela:
uma estrangeira desajeitada.
NÃO
– Discordo, senhora. Você se
comportou com grande compostura.
Luisa sorriu. Lukas era um homem
gentil.
– Obrigada, Lukas, mas não precisa
fingir. Eu vi o jeito que eles me
olharam, e a impaciência de todos,
porque eu quis ler o que assinei.
– É verdade que alguns conselheiros
são antiquados. – Lukas gesticulou para
que ela o precedesse em outro corredor.
– Tenho certeza que Sua Alteza não se
importaria se eu dissesse que esse tem
sido um dos desafios dele em governar
o país como uma nação moderna.
Não ocorrera a Luisa que Raul
pudesse ter dificuldades. Com a atitude
de comando dele, não podia imaginar
isso.
– Você fala como se ele estivesse
governando o país por um longo tempo.
Eu pensei que o rei tivesse morrido
recentemente.
– Isso está correto, senhora. – Lukas
pausou, então, parecendo tomar uma
súbita decisão, acrescentou: – Mas Sua
Alteza era, de muitas maneiras,
responsável por governar o país, muito
antes disso. O rei anterior... deixava
muitas coisas nas mãos do príncipe.
Luisa pensou em pressionar Lukas
por uma explicação, até que sentiu o
desconforto dele.
– E isso ainda é difícil?
Lukas deu de ombros.
– O príncipe fez até os cortesões mais
antiquados enxergarem os benefícios.
Mas alguns se ressentem da mudança.
Alguns que prefeririam competir por
poder pessoal, em vez de cooperar num
esforço nacional para modernizar.
Luisa diminuiu o ritmo dos passos. A
avaliação de Lukas ecoava as palavras
de Raul. Palavras que ela ignorara,
acreditando que ele apenas cobiçava a
coroa. Todavia, vendo-o com outros,
ela notara vislumbres de um homem
altruísta. Ele alegava que agia pelo país
tanto quanto por si mesmo. Isso podia
ser verdade? Era tentador esperar que
sim.
Todavia,
nada
desculpava
o
comportamento de Raul em relação a
ela.
– Quanto a hoje, senhora –
murmurou Lukas –, eu sei que o
príncipe ficou muito satisfeito com sua
primeira aparição oficial.
Luisa apostava que sim! Ela assinara
o documento precioso dele. Seu coração
bombeou perante as implicações do que
fizera. Não havia volta, agora.
– Lukas, eu mudei de ideia. Pode me
mostrar o caminho para os jardins?
Preciso de ar fresco.
QUARENTA MINUTOS depois, Luisa sentiase menos claustrofóbica. Andando pelos
pátios, ela encontrara um jardineiro.
Eles haviam discutido os terrenos com
entusiasmo e linguagem de sinais, uma
vez que seu maritzian era escasso, e
Gregor, o jardineiro, falava um dialeto
incompreensível.
Eles tinham andado pelos terraços e
jardim de rosas, onde Luisa reconheceu
os nomes de lindas rosas que sua mãe
mencionara. Visitaram pomares, um
jardim murado com fontes e o jardim
da cozinha, onde Luisa lutara para
identificar as ervas mais raras.
Pela primeira vez em dias, sentira-se
no mundo real, com o cheiro rico do
solo e a natureza ao seu redor.
Respirou fundo enquanto subia a
escada em espiral dentro das muralhas.
Gregor parecera dizer que ela veria o
jardim ornamental dali. Luisa lera que
ver tais jardins do alto dava muito mais
efeito.
Todavia, ela não gostava muito de
altura, e quando olhou pela janela
aberta ao seu lado, que dava vista para
a cidade abaixo, sentiu-se levemente
tonta.
Pressionando a mão úmida contra a
parede, continuou subindo. Logo,
emergiu a uma abertura baixa, com
vista para o castelo. Alguém estivera
trabalhando lá, e ela desviou de uma
pilha de ferramentas. A abertura era tão
baixa que Luisa sentiu-se mais segura
ajoelhada, as mãos sobre a construção
de pedras.
O jardim era espetacular, embora
estivesse excessivamente crescido. Ela
distinguiu os remanescentes do dragão
de Maritz, aquele voando na bandeira
da torre superior, exibida na cerca viva
abaixo. Arbustos com folhagem
dourada denotavam os olhos dele, e um
grupo de folhas vermelhas devia ter
sido a representação do fogo saindo da
boca do dragão. A cauda estava
faltando, e um caminho atravessava
uma garra, mas ainda assim, era
magnífico.
Encantada, Luisa inclinou-se um
pouco para a frente.
Herdara o amor de sua mãe por
jardins.
Um movimento chamou sua atenção.
Então ela viu uma figura familiar
andando
pelo
jardim.
Raul.
Instantaneamente,
sua
pulsação
acelerou.
Ele a viu e gritou alguma coisa
enquanto se aproximava da escada,
correndo.
Instintivamente,
Luisa
recuou,
sentindo-se como se tivesse sido pega
invadindo uma propriedade ou algo
assim. Novamente, foi tomada por uma
tontura. Apenas que desta vez, não era
somente sua cabeça que girava.
Para seu horror, a parede sob suas
mãos se moveu. Seu movimento
empurrou-a mais para fora, a pedra
deslizando para a frente com um
terrível barulho de tritura.
Ela tentou ir para trás, mas seu
centro de gravidade estava muito para a
frente. Com um ruído, o velho peitoril
sob suas mãos caiu no solo abaixo.
Luisa foi jogada para a frente, seus
braços suspensos no espaço, caindo de
pé sobre rocha irregular. A pedra áspera
feria suas costelas, mas o medo de que
outra
parte
da
construção
desmoronasse, desta vez, com ela,
congelou-a no lugar.
Ela não podia ver Raul agora, e sua
garganta estava fechada, de modo que
não conseguia gritar.
Após alguns momentos, tentou
rastejar para trás, apenas para
escorregar mais para a frente, quando
outro bloco da construção caiu.
A qualquer minuto agora, poderia ser
ela.
– ESTÁ TUDO bem. – A voz profunda mal
penetrou sua consciência. – Eu peguei
você. – E braços fortes envolveram sua
cintura.
– Não! – gritou Luisa, aterrorizada. –
Recue. É muito perigoso. Certamente, o
peso de Raul com o seu sobre a parede
instável faria os dois caírem.
– Não se mova. Apenas relaxe e me
deixe fazer isto.
– Relaxar? – Ele devia estar
brincando. Luisa fechou os olhos
quando experimentou mais uma onda
de vertigem.
Seu corpo estava rígido quando ele a
puxou para trás, os braços ao seu redor.
Ela esperou, ofegante, pelo barulho
assustador de pedra sobre pedra. Em
vez disso, ouviu Raul arfar, quando ele
segurou o peso dela contra si,
arrastando-a lentamente para a
segurança. A respiração dele soprava
seu pescoço, e mãos fortes a seguravam.
Ela ainda estava tremendo.
– Está tudo bem. Eu juro. – Mas os
tremores não passaram.
– Eu... n-nunca... gostei de alturas.
– Abra os olhos.
Ela obedeceu, e ele a abaixou para
sentá-la no chão.
Luisa tombou como uma boneca de
trapo, seu corpo mole. Mesmo agora, a
vista abaixo, das pedras distantes, estava
estampada em seu cérebro.
– Aqui, incline-se para a frente. – Ela
fez isso, e o calor envolveu-a quando
Raul pôs o paletó ao redor de seus
ombros trêmulos.
Luisa levantou a cabeça. Ele estava à
sua frente, mãos nos quadris e
sobrancelhas arqueadas.
Ela o vira sem paletó apenas uma vez,
brevemente, na limusine. Ele estava
sempre impecavelmente vestido. Agora,
seus olhos trilharam o torso poderoso, e
Luisa arfou, lembrando-se daqueles
músculos sólidos pressionados contra
seu corpo, no barco em Paris. Não era
de admirar que a sensação tivesse sido
tão boa!
– Nós precisamos levá-la para dentro,
onde está quente. – Mas ela não se
moveu. Ele via o quanto ela estava
fraca?
Tremendo,
Luisa
assentiu,
aninhando-se mais ao paletó.
– Logo. Eu preciso recuperar meu...
fôlego.
– Aqui. – Com um passo rápido, Raul
moveu-se para trás dela. Então as mãos
capazes estavam levantando-a e
colocando-a sobre o colo dele,
enquanto ele se inclinava contra a
parede oposta ao buraco.
Luisa deveria protestar. Não queria
estar tão perto dele. Mas não tinha
energia para resistir, apesar de não
conseguir ignorar o calor do corpo
sólido, das pernas musculosas ao redor
das suas!
– Espero que esta parede seja segura!
– Não se preocupe. Apenas o outro
lado é problema. – Ele a puxou para
mais perto, aninhando-a contra o peito
largo. – Você não viu a placa de aviso?
Ela se recordou de ter visto uma
placa na base na torre, mas mal olhara
para a mesma.
– A porta estava aberta.
– Não estará no futuro. Não até que
seja seguro. – Ele suspirou. – Por que
você veio aqui? Há vistas melhores do
outro lado do castelo.
Luisa deu de ombros.
– Eu queria ver o jardim ornado.
Gregor me mostrou, mas eu não queria
o efeito do solo.
– Gregor? – Um tom duro na voz de
Raul a fez virar-se para olhá-lo. Os
olhos verdes tinham escurecido, e,
assim de perto, ela descobriu um brilho
dourado neles, também.
– Sim, um de seus jardineiros.
Raul franziu o cenho.
– Ele não a encorajou a subir aqui,
certo?
– É claro que não. – Somente agora,
ela percebeu que os gestos de Gregor
tinham avisado que ela ficasse longe da
estrutura insegura.
– Obrigada por me salvar.
– Eu só fico feliz por ter visto você no
momento que vi. – A expressão de Raul
tornou-se feroz subitamente, como se
ele quisesse culpar alguém.
Luisa estudou-lhe a expressão
preocupada, e tentou lembrar como ele
era implacável. Que ele a forçara ao
casamento.
– Se você não tivesse me alcançado,
talvez não tivesse uma princesa para se
casar. Então nunca herdaria.
Uma mão firme segurou seu queixo,
e ela arfou. O dourado nos olhos dele
pareceu mais brilhante.
Raul meneou a cabeça.
– Se não houvesse princesa, o
contrato não me amarraria mais. Eu
estaria livre para me casar com quem
quisesse.
– Há alguém com quem você quer se
casar?
– Não se preocupe, Luisa. – Ele
aproximou mais o rosto. – Você não
está interferindo entre eu e o amor da
minha vida.
– Então não existe ninguém especial?
– Aquilo confirmava o sangue-frio de
Raul para abordar o casamento. Mas no
momento, ofuscada pelos olhos
brilhantes, tranquilizada pela carícia do
polegar no seu rosto e pelo calor do
corpo forte envolvendo o seu, Luisa não
conseguiu energia para ficar ultrajada.
Sentia-se... distanciada da dor. Quem
teria pensado que ela encontraria
consolo no abraço de Raul? Havia um
prazer inesperado na sensação de que,
por este momento, pelo menos, eles
poderiam ser francos.
– Ninguém que importa. – A
respiração quente acariciou seu rosto, e
ela lutou para encontrar a raiva que a
consumira antes. Certamente, não
poderia gostar de estar lá, com ele?
– Você é realmente implacável, não
é? – O tom de Luisa era mais curioso do
que acusador.
Ele se mexeu, e ela descobriu sua
cabeça descansando contra o ombro
largo. Luisa quase suspirou diante da
sensação deliciosa. Sentia-se relaxada,
como uma gata sendo acariciada no sol.
– Se você quer dizer que eu planejo
para conseguir o que quero, então sim –
replicou Raul.
– Você sempre conseguiu tudo que
queria?
Ele meneou a cabeça.
– Longe disso. Eu não fui mimado,
em absoluto. Minha mãe morreu no
parto, e meu pai era impaciente com
crianças.
O coração de Luisa apertou. Não era
de admirar que Raul fosse tão
autossuficiente. Ela olhou para a boca
esculpida, feita para seduzir mulheres.
– Mas como adulto. Com mulheres,
aposto que você sempre...
– Luisa. – A mão que estava em seu
queixo deslizou para segurar sua nuca.
Os olhos verdes brilhavam com fogo. –
Você está falando demais.
Ela viu aqueles lábios descendo em
câmera lenta. Como se ele lhe desse
uma chance para se libertar. Ou para
saborear o beijo iminente. Uma
excitação a percorreu.
No momento que a boca de Raul
tocou a sua, os lábios de Luisa estavam
se abrindo para ele, e seu coração
bombeava freneticamente.
O beijo foi uma troca lenta e
prazerosa. O deleite inundava-a numa
onda ardente. Isso não era como a
paixão feroz que eles haviam
compartilhado em Paris.
Uma voz em sua cabeça tentou
apontar que, em Paris, eles não tinham
compartilhado coisa alguma. Raul não
sentira nada.
Ali, naquele momento, parecia ser
uma troca, dando e recebendo. Sem
domínio ou submissão. Mas algo
mutuamente satisfatório.
Luisa deslizou um braço em volta da
cintura dele, deleitando-se ao sentir os
músculos poderosos ficarem tensos,
depois relaxarem sob seu toque.
O beijo se aprofundou, enquanto o
desejo crescia em seu interior. Ela
sentiu uma pulsação insistente entre as
pernas, e seus mamilos enrijeceram.
Sua mão livre foi para o pescoço de
Raul, descobrindo a pulsação acelerada
ali. Então, ela entrelaçou os dedos nos
cabelos sedosos.
Raul gemeu. O som rouco aumentou
o prazer de Luisa, e ela se moveu contra
ele, querendo mais.
Então, abruptamente, Raul afastouse. Apenas o bastante para que ela visse
o rosto dele. Luisa levou um momento
para ler o ardor nos olhos verdes, e
perceber que ele estava ofegando.
Ele lhe capturou o pulso e segurou-o
longe de si.
– Da próxima vez que você quiser um
tour, peça para mim. – Raul respirou
fundo. – Eu acompanharei você, ou
pedirei que alguém a guie. Combinado?
Silenciosamente, Luisa assentiu, sua
mente confusa. Podia culpar o choque
pelo fato de que queria cair novamente
nos braços do homem que detestava?
DUAS SEMANAS depois, enquanto
conversava com um curador da galeria,
Raul descobriu seu olhar desviando
para Luisa. Ela estava diante de uma
exibição
de
estudos
botânicos,
conversando com o curador júnior, que
organizara a exposição.
O olhar de Raul desceu para as
pernas delgadas. Aquela era a primeira
vez que ele a via num vestido, e não
conseguia tirar os olhos dela.
Especialmente quando ela sorria
calorosamente para o jovem curador.
Luisa estava se desabrochando numa
linda mulher. Isso tinha de explicar por
que ele a desejava com tanta avidez
desde Paris.
E por que sucumbira à tentação e a
beijara na torre. Sua pulsação acelerou,
e algo que parecia medo apertou seu
peito com a memória de Luisa sobre
aquelas pedras prestes a caírem de uma
altura fatal. A necessidade de abraçá-la
e nunca mais soltá-la tinha sido
enorme. O desejo por outro gosto doce
daqueles lábios, inexplicável.
A força daquela atração inesperada
perturbava-o. Ela não era sofisticada,
preferia sapatos sem saltos, e evitava até
mesmo as joias herdadas mais simples.
Possuía o hábito de falar com todo
mundo, e preferia falar com o staff a
falar com pessoas importantes. Parecia
tão feliz conversando com os jardineiros
quanto indo a alguma estreia brilhante.
Todavia, seu coração se alegrava na
presença de Luisa.
Disse a si mesmo que aquilo era uma
bobagem sentimental. Entretanto, havia
definitivamente alguma coisa sobre sua
futura esposa.
Raul balançou a cabeça. Por que
Luisa não saía de seus pensamentos?
Por que ele achara tão difícil liberá-la
aquele dia na torre? Ou cuidar de seus
próprios compromissos, enquanto ela
começava aulas no idioma, aulas de
etiqueta, história e cultura?
Porque ele a queria. E quase tanto
quanto a queria, ele queria sua
companhia.
Raul voltou-se para o curador.
– A princesa e eu podemos ter algum
tempo, sozinhos, para ver o resto da
exposição?
Dois minutos depois, Raul e Luisa
estavam a sós.
– Obrigada. – Ele se virou e viu que
os olhos dela estavam marejados. Com
o coração disparando, Raul pegou-lhe a
mão.
– Você está bem? – Ele quisera
agradá-la com aquela visita, não
aborrecê-la. Mostrar-lhe que ela possuía
uma conexão com sua terra natal.
– Eu não esperava ver o trabalho de
minha mãe exposto. Foi uma surpresa
adorável.
Raul deu de ombros.
– Ela era uma artista talentosa. É
uma pena que ela não continuou suas
pinturas botânicas.
Luisa desviou o olhar.
– Minha mãe dizia que esta era uma
disciplina que necessitava de dedicação.
Algo que ela não podia dar. Não com a
fazenda.
Ele assentiu. A mãe de Luisa
abandonara o trabalho artístico por
uma vida de trabalho duro. Tudo pelo
suposto amor de um homem que podia
lhe dar tão pouco.
Pessoas eram tolas, acreditando em
fantasias de amor.
Amor era uma ilusão. Uma
armadilha para os descuidados. Ele não
aprendera isso, pagando seu próprio
preço?
– Foi gentileza sua me trazer aqui. –
Ela lhe tocou a manga de um jeito
quase amável. – Lukas me contou que
você raramente tem tempo para este
tipo de coisa, principalmente agora.
– Não foi nada. Fazia tempo que eu
não visitava a galeria, e havia assuntos
para discutir. – Raul não queria que ela
pensasse que ele mudara sua agenda
por ela. Mesmo se isso fosse verdade.
Luisa não reclamara de nada durante
suas primeiras semanas em Maritz,
embora a mudança devesse ser difícil
para ela. Apesar de todas as aulas que
ela estava tendo, sempre que Raul a via
andando pelos jardins, tinha a
impressão de que Luisa estava se
sentindo solitária.
A culpa o assolou. Ela estava lá por
sua causa, por seu país, por suas
necessidades. O que Luisa ganhava
pessoalmente com aquilo?
Ela não estava interessada em riqueza
ou prestígio. O único dinheiro que
queria era para salvar os amigos.
Não o via como um prêmio, mesmo
se não pudesse esconder a paixão que
brilhava nos olhos azuis quando ele a
beijava. Luisa Hardwicke era uma lição
útil para o ego de Raul.
– Eu não sabia que o trabalho de
mamãe era tão estimado. – Ela se virou
para examinar o desenho delicado de
uma flor selvagem na montanha, e ele a
seguiu.
– Fale-me sobre ela.
Luisa virou-se.
– Por quê?
Ele deu de ombros, não querendo
confessar sua necessidade de entender
a família dela, e entendê-la.
– Ela deve ter sido forte para
enfrentar seu avô.
Luisa fez uma careta.
– Talvez, este seja um traço de
família.
– Perdão?
Ela balançou a cabeça.
– Eu a achava notável. E meu pai
também.
Raul entrelaçou os dedos de ambos,
contente quando ela não se afastou.
– Conte-me.
Por um longo momento, ela o fitou.
Então, pareceu decidir.
– Ela era como outras mães.
Trabalhadora, administrando uma casa
e fazendo a contabilidade. – Luisa
pausou. – Ela fazia os melhores
biscoitos de canela de Natal, e dava os
abraços mais carinhosos... garantidos a
fazer você se sentir melhor, todas as
vezes. Adorava rosas, e tinha um olho
para moda, mesmo que nós não
pudéssemos comprar roupas da moda.
Luisa moveu-se para o próximo
quadro, e ele seguiu.
– Ela odiava passar roupa, e detestava
acordar cedo.
– Não adequada para ser uma esposa
de fazendeiro, então. – A mudança do
palácio para a fazenda devia ter sido
difícil. O casamento fora um desastre?
Aparentemente, não.
Luisa riu, um som rico que mexeu
com os sentidos de Raul.
– Era o que papai costumava dizer.
Ele balançava a cabeça e fingia estar
com medo que ela voltasse para seu
mundo glamouroso. Mamãe dava
aquele sorriso especial, que reservava
para ele, e dizia que ela não poderia
partir até que conseguisse fazer bolos
fofos tão bem quanto minha tia. Papai
diria que ninguém jamais faria bolos
como Mary, de modo que mamãe teria
de ficar para sempre. Então, ele a
beijava.
Raul observou um sorriso nostálgico
nas feições de Luisa. Sentiu um enorme
desejo de experimentar o que ela
experimentara. O carinho, o amor.
Uma infância com biscoitos de canela e
abraços. Tão diferente de seu próprio
crescimento!
– Mas o casamento deu certo? – Raul
descobriu-se curioso. – Eles eram tão
diferentes.
– Eles vinham de mundos diferentes,
mas criaram seu próprio mundo, juntos.
Papai dizia que ela o fazia se sentir um
rei. Mamãe dizia que ele a fazia sentir
mais princesa do que ela algum dia se
sentira, vivendo no palácio. – Luisa
virou-se para olhá-lo. – A vida com
meu avô não era prazerosa. Ele tentou
forçá-la a se casar com alguém que ela
detestava, apenas para cimentar uma
negociação.
Não
havia
risadas,
divertimento. Não como na nossa casa.
Alguém que ela detestava. Raul se
encaixava nessa categoria para Luisa?
– Eles se amavam; esse era o segredo.
Não era preciso ser um gênio para
saber que Luisa quisera aquilo para si
mesma. Até que ele aparecera.
O dever para Raul nunca parecera
tão oneroso, antes. Ele estava
condenado a desapontá-la. Nem
mesmo acreditava em amor. Nunca
experimentara o sentimento.
– Mas ela amava aqui. – Luisa sorriu.
– Mamãe queria nos trazer um dia, para
conhecer o país.
– Fico feliz. Com o tempo, espero
que você passe a amá-lo, também. É um
lugar especial. Não há pessoas como os
maritzians.
Raul conduziu-a para ver o resto da
exposição, contando-lhe uma história
local tradicional. Surpreendeu-o quanto
ele queria ouvi-la rir, novamente.
RAUL ANDOU rapidamente para seu
estúdio. Havia muito trabalho a fazer, e
embora a inquietude nas províncias
tivesse se abatido um pouco, ele não
podia ser complacente.
Mas o casamento no dia seguinte...
um evento pequeno, uma vez que a
nação estava de luto por seu pai...
pavimentaria o caminho para sua
coroação e ajudaria a resolver seus
problemas.
Levar sua esposa para cama resolveria
a dor permanente em seu sexo.
Luisa o fascinava cada vez mais. Ela
era vibrante, envolvente, independente.
E diferente de qualquer mulher que ele
conhecia.
Lukas abordou-o, quando ele chegou
ao estúdio.
– Vossa Alteza.
– Sim? Eu estou atrasado para minha
reunião?
– Não, não isso. – Seu secretário
hesitou. – Você tem uma visita. Eu
queria avisá-lo...
– Raul, querido! – A voz feminina
veio da porta à frente. Em choque, Raul
fechou as mãos em punhos. Então,
preparando-se,
aproximou-se
lentamente da loura parada à porta.
– Isto é inesperado, Ana. O que você
está fazendo aqui?
– Certamente, você não esperava que
eu perdesse seu casamento, querido? –
Os lábios pintados de vermelho
formaram um biquinho. – Eu não
recebi seu convite. Por sorte, ouvi sobre
o casamento através de fofocas.
Ele parou a um metro de distância, o
desgosto o preenchendo.
Eles não estavam em público,
portanto, não havia necessidade para
uma reverência. E o inferno congelaria
antes que ele aceitasse o convite
implícito naquele biquinho.
Não quando ela era a mulher que,
oito anos atrás, o levara para o inferno.
CAPÍTULO 7
– LUISA, VOCÊ está adorável! – disse
Tamsin. – Esta cor de creme perolado
fica maravilhosa com o tom dourado de
sua pele.
– Você acha? – Luisa estava rígida,
desconfortável com o vestido longo de
seda. O corpete justo era coberto de
renda fina. A coroa da cabeça era de
ouro e pérolas.
O vestido de noiva mostrava os
produtos tradicionais mais finos de
Maritz. Renda de uma província. Seda
de outra. A gargantilha de ouro que
deixava seu pescoço elegante era feita
por um artesão de outra província.
Apenas a noiva não estivera
envolvida no design de seu traje de
casamento.
Luisa virou-se para o espelho,
sentindo-se uma fraude.
Todavia, a imagem que viu tirou-lhe
o fôlego. Poderia ser realmente ela?
Uma mulher que até recentemente
passava seus dias em jeans e botas de
borracha?
– Você parece uma princesa de conto
de fadas – comentou Tamsin.
– Eu não me sinto como uma. – A
náusea embrulhou seu estômago. Luisa
nem conseguira almoçar. Ela, cujo
apetite era sempre saudável!
– Acredite. – Tamsin sorriu. – Você
vai roubar o fôlego de todos.
Especialmente o de Raul. Ele não
conseguirá tirar os olhos de você.
Luisa viu o sorriso secreto da outra
mulher, e imaginou se ela estava
pensando em seu recente casamento
com o príncipe Alaric, primo distante
de Raul. Era óbvio que o homem
grande, com o rosto quase tão bonito
quanto
o
de
Raul,
estava
profundamente apaixonado por sua
nova esposa inglesa.
Por um momento, Luisa permitiu-se
imaginar como seria casar por amor. Ela
sempre ansiara por vivenciar amor
verdadeiro, mas estivera tão enterrada
na fazenda que não se abrira para a
possibilidade?
Luisa, às vezes, fantasiava que sua
união com Raul pudesse se tornar
especial. Mas tal fantasia era muito
dolorosa. Porque ele não a escolhera
por
amor.
Nem
mesmo
por
conveniência. Mas porque não tivera
outra opção!
– Foi gentileza sua me ajudar a me
arrumar. – Ela sorriu para Tamsin.
– Tudo vai dar certo. – Tamsin
pegou-lhe a mão, num gesto caloroso. –
Eu sei que é assustador casar-se com
alguém de um mundo novo. Da
realeza. Mas Raul irá cuidar de você.
Ele é como Alaric. Forte e protetor. –
Ela deu um olhar especulativo para
Luisa. – E, eu desconfio, muito
apaixonado por trás daquela aparência
composta.
Luisa enrubesceu. Tamsin riu,
corando, também.
– Desculpe. Eu não pretendia
embaraçá-la. É apenas que, às vezes,
tenho vontade de me beliscar. Tudo
parece tão irreal.
– Eu sei o que você quer dizer. –
Tamsin também era estrangeira... uma
plebeia que se casara com seu príncipe
por amor, e intrigara todo mundo. Mas
Tamsin se apaixonara. Luisa enfrentaria
seu casamento real e o peso da
expectativa pública, sem amor.
– Fico feliz que você esteja aqui –
acrescentou Luisa, grata pela presença
da mulher calorosa.
– Eu também! E depois de sua lua de
mel, espero que nós possamos passar
mais tempo juntas.
Luisa assentiu, não querendo
desapontá-la. Raul era viciado em
trabalho. Não tiraria dias de folga para
uma lua de mel. Não com uma esposa
que não queria realmente.
Uma esposa que era apenas uma
solução para um problema.
Um nó se formou em seu estômago
quando uma batida soou à porta.
– Está na hora, Vossa Alteza.
A MÚSICA aumentou de volume, as
grandes portas se abriram, e Luisa
atravessou a soleira da capela do
castelo.
Luzes
multicoloridas
brilhavam
através das janelas antigas. O aroma de
plantas, incenso e uma variedade de
perfumes preenchia o ar. Centenas de
rostos se viraram para olhá-la. Ela não
reconheceu um único.
Uma onda de pânico quase fez Luisa
virar-se e correr. Seu coração batia
contra as costelas e seus joelhos
tremiam.
Ela parou, curvando a mão na manga
de Alaric. Ele lhe cobriu a mão com a
sua e inclinou-se para mais perto.
– Luisa?
– Este é um casamento pequeno? –
Atordoada,
ela
viu
bandeiras
heráldicas, incluindo algumas do
dragão
vermelho
de
Maritz,
penduradas do teto alto.
– Coragem, pequena. Tudo logo
acabará. – Ele deu um passo à frente, e
ela não teve escolha senão seguir. –
Tamsin e eu fizemos uma aposta sobre
quem usa o chapéu mais absurdo.
Casamentos incitam mulheres a usarem
as coisas mais monstruosas em suas
cabeças, não acha?
Ele continuou brincando ao longo do
corredor, quase a distraindo dos
convidados.
Convidados
que
observavam. Julgavam. Achando-a
insatisfatória.
Subitamente, ela capturou um
sorriso. Era Tamsin, encorajando-a.
Atrás dela havia outra mulher, loura
platinada, repleta de joias, mas com
expressão mal-humorada.
Então eles estavam no fim do
corredor, e Luisa voltou os olhos para o
homem que evitara olhar desde que
entrara.
Raul, alto e maravilhoso num
uniforme vermelho e preto, parecia o
modelo para Príncipe Encantado.
A expressão dele era austera e
orgulhosa. Não havia uma centelha de
prazer no rosto bonito. Uma completa
ausência de qualquer coisa que pudesse
um dia se transformar em amor.
Ela piscou contra as lágrimas,
detestando-se, porque mesmo agora,
deparada com a indiferença de Raul,
ansiou pelo carinho que ele tinha
começado a lhe mostrar.
Como ela podia ser tão fraca para
desejar o impossível?
Alaric impulsionou-a para a frente, e
Raul pegou-lhe a mão na sua, a outra
mão segurando-lhe o cotovelo, quando
Luisa balançou.
Ela
precisava
controlar
sua
ansiedade. Tinha concordado com
aquilo. Desviou o olhar, para as flores
no altar: um rio de rosas e lírios, a
fragrância muito forte para seu
estômago embrulhado.
O padre falou, mas Luisa não ouviu.
Estava pensando que lírios, no seu país,
eram tradicionais para funerais.
– QUEM É aquela mulher? – Luisa
observou a loura platinada inclinar-se
contra Raul, a mão possessiva no braço
dele. O vestido vermelho combinava
com o paletó dele, e o decote
avantajado mostrava um lindo colo. Ela
sorria, o semblante muito diferente
daquele que Luisa vira na capela.
– Ela não estava na fila da recepção –
acrescentou Luisa.
Raul estava do outro lado do salão de
festas, de costas para Luisa, mas dali,
ela podia quase jurar que a mulher
flertava com ele. A raiva inundou-a.
– Ela é uma ex-namorada?
Ao seu lado, Tamsin engasgou com
champanhe.
– Você está bem?
– Sim, eu inalei algumas bolhas. Não
estou acostumada com champanhe.
Luisa assentiu, então perguntou:
– Você não a conhece?
Finalmente, Tamsin olhou para cima.
E corou.
– Tamsin? – A expressão de sua nova
amiga deixou Luisa tensa.
– A mulher com Raul? Ninguém com
quem você precisa se preocupar. – As
palavras saíram de maneira afobada. –
Ela mora nos Estados Unidos, agora.
– Mas quem é ela?
Tamsin deu outro gole do
champanhe.
– É Ana. A madrasta de Raul.
Madrasta?
– Mas ela é muito jovem! – E não
agia como madrasta. A mulher estava
flertando descaradamente. O único
consolo de Luisa era que Raul estava
rígido, embora inclinasse a cabeça para
ouvi-la.
– Eu acho que ela e Raul têm
aproximadamente a mesma idade.
Luisa percebeu o desconforto de
Tamsin, que desviou o olhar, como se
procurando uma diversão.
A intuição disse-lhe que havia
alguma coisa que Tamsin não estava lhe
contando. Luisa virou-se, notando
como os convidados mantinham
distância do par. Ninguém abordara
Raul desde que a madrasta demandara
a atenção dele, mas todos olhavam de
modo
especulativo.
Sussurros
aconteciam em volta deles.
A onda de desconforto se
transformou em desconfiança.
Não! Luisa se recusava a tirar
conclusões sobre os relacionamentos de
Raul. Independentemente do que seus
olhos lhe dissessem.
Entretanto, não podia sufocar um
sentimento de traição.
Como se sentindo seu escrutínio,
Raul virou-se, encontrando seu olhar.
Ela enrubesceu ao perceber que havia
sido pega observando-o.
Mas tinha todo direito de estar lá.
Esta era a sua festa de casamento. Seu
dia. Mesmo se não fosse sua escolha.
Uma risada histérica quase escapou
de sua garganta. Hoje deveria ser o dia
mais feliz de sua vida!
Se ela não risse do absurdo,
certamente choraria.
Prendendo os olhos de Raul, ela
levantou o queixo e bebeu o resto de
seu champanhe.
– Se você me der licença, Tamsin, é
melhor eu me apresentar para minha
sogra. – Luisa entregou sua taça para
um garçom. Ergueu as saias do vestido
formal, e fez convidados se moverem
para o lado, enquanto ela passava.
ELA ERA magnífica. Abria caminho entre
a multidão como se esta não existisse,
os olhos prendendo os dele.
Uma onda de calor o percorreu
diante
da
visão
de
Luisa.
Distraidamente, Raul afastou a mão de
Ana do seu braço. Ele fizera o que
tivera de fazer... aceitara a presença
dela publicamente. Mas agora bastava.
Ele já tivera o bastante, oito anos
atrás!
Mal registrou o protesto de Ana,
enquanto andava em direção à sua
nova esposa, e o prazer o inundava.
O dia inteiro, ele estivera rígido de
tensão. Preocupações com o país. Fúria
pelo retorno de Ana. Desconforto
diante da ideia de casamento. Culpa
por ter forçado a mão de Luisa. A
necessidade
de
enterrar
seus
pensamentos atrás de uma capa de
calma real. Agora, a tensão se
transformara em alguma coisa que não
tinha nada a ver com preocupações, e
tudo a ver com necessidades reprimidas
por muito tempo.
E, com o desafio, ele leu a expressão
e a postura de sua noiva.
Havia um brilho feroz nos olhos
azuis. Ele respirou fundo, a primeira
respiração livre do dia.
Tinha cumprido seu dever, casandose. Agora, queria esquecer sobre dever,
diplomacia, construir pontes com
políticos intransigentes e acalmar os
egos feridos dos amigos de seu pai.
Queria esquecer suas próprias dúvidas.
Queria... Luisa.
Ele sorriu.
– Luisa, você está encantadora. – Ela
ameaçou tropeçar, e ele parou à sua
frente, pondo a mão na cintura delgada
para firmá-la. Através de renda e seda,
sentiu músculos se flexionando quando
ela suspirou.
Raul pegou-lhe a outra mão na sua e
levou-a aos lábios. Então, virou-lhe a
mão e pressionou os lábios no pulso
delicado. Ouvindo-a arfar, ele moveu a
boca lentamente, beijando-lhe a palma
e tocando a língua no centro desta.
Luisa tentou recolher a mão, mas ele
não permitiu.
– Você vai me apresentar para sua
mãe?
Ele viu a dúvida e o orgulho ferido
nos olhos azuis, e, silenciosamente,
aplaudiu a coragem dela.
– Você quer dizer, a segunda esposa
de meu pai. Não minha mãe.
– Meu erro. – Ela mordeu o lábio. –
Vocês dois pareceram tão próximos...
O tom de ciúme na voz de Luisa o
inundou de prazer. O desejo dela
combinava com o seu? Uma onda de
excitação o percorreu. Ele se lembrou
da paixão de Luisa, do jeito que ela se
derretera em seus braços. Pensou em
como ela o observava quando achava
que ele não estava olhando.
Raul inclinou-se para a frente e
sussurrou:
– Eu não vou apresentá-la. Você não
gostaria dela.
Luisa arfou
diante
de
sua
honestidade. Ele queria beijar aqueles
lábios até que ela esquecesse como
falar. Queria aquela energia poderosa
canalizada
em
direções
mais
satisfatórias.
– Por que não? – Luisa pareceu
perplexa.
– Porque ela não é uma boa pessoa.
– Mas certamente eu preciso
conhecê-la.
– Dificilmente. Ela partirá para Los
Angeles, esta noite. De carona com o
mais novo namorado, um produtor de
Hollywood.
Ele nem sequer sentiu a raiva usual.
Ana não podia se incomodar em fingir
estar de luto pelo marido. O casamento
deles tinha sido uma farsa, seu pai
fazendo vista grossa para qualquer coisa
no comportamento de sua jovem esposa
que pudesse ferir seu orgulho.
Raul estava cansado de fingir que o
casamento de seu pai não fora uma
farsa. Seu pai estava morto, e não podia
mais ter o ego ferido. Ana não merecia
mais do que a mera observância da
cortesia. A tentativa dela de arrancar
mais dinheiro dos cofres reais tinha sido
esperada, porém o momento que ela
escolhera
para
fazer
aquilo
surpreendera até mesmo Raul, que a
conhecia bem.
– Venha – disse ele, virando Luisa
em direção ao palco, onde o trono real
estava. Ela segurou as saias e
acompanhou-o.
Raul
inalou
o
refrescante aroma de lavanda e ajudou
sua esposa a subir os degraus.
O rubor nas faces de Luisa era
charmoso. O olhar dele desceu para o
lindo colar de ouro, então para onde o
topo dos seios se movimentava com a
respiração. Suas mãos coçavam de
vontade de tocá-la.
Sair cedo da festa causaria agitação.
Mas Raul não estava no humor de
preocupar-se com protocolo. Depois de
anos cumprindo deveres e convenções,
tentando compensar pelo trauma do
escândalo real anterior, ele escolheu,
pela primeira vez, desconsiderar
tradição.
A sensação era boa. Ele ignoraria as
fofocas. Pegou a mão de sua esposa,
apreciando a presença dela ao seu lado.
– Senhoras e senhores. – Raul
dirigiu-se aos convidados. Quando
terminou o breve discurso, uma salva
de palmas se seguiu.
Ele
levantou
a
mão
em
reconhecimento, então, virou-se para
Luisa.
– É hora de sairmos da festa.
Os olhos azuis se arregalaram, mas
um momento depois, ela sorriu e
acenou para a audiência. Ela era
realmente incrível.
Logo, eles estavam andando ao longo
de um corredor privado, de mãos
dadas. As portas se fecharam,
emudecendo o som dos aplausos.
A satisfação o preencheu. Estava
sozinho com sua esposa.
TUDO ACONTECERA tão rapidamente que
Luisa sentia-se atordoada, enquanto ele
a conduzia pelo labirinto de corredores.
Apenas duas coisas eram reais. A
mão quente de Raul envolvendo a sua,
e o fato de que ela estava casada.
Mesmo na capela não parecera real.
Mas ouvindo Raul dizer aos convidados
que aproveitassem a hospitalidade do
casamento, vendo a curiosidade, a boa
vontade, a até a inveja em alguns dos
rostos que a encaravam, a verdade
atingira-a.
Ela se unira a este homem. Não havia
volta.
Luisa tremeu quando Raul parou
diante de uma porta não familiar, então
deu um passo ao lado, esperando que
ela o precedesse.
Ela entrou, então parou. Não deveria
estar ali, nos aposentos privados dele.
A porta foi fechada, o silêncio os
envolvendo.
– Venha. – A mão em seu cotovelo
impulsionou-a para a frente. – Você
precisa de comida. Não comeu nada na
recepção.
– Como você sabe? – Pela maior
parte da recepção, eles tinham ficado
em lados opostos do salão.
– Eu observei você.
A ideia de que Raul se concentrara
nela durante o tempo que conversara
com dignitários enviou uma onda de
calor pelo corpo de Luisa.
– E você só tomou uma taça de
champanhe.
Ela o fitou. O ardor que viu na
expressão dele a fez desviar os olhos.
– Talvez comer alguma coisa seja
uma boa ideia. – Depois, ela iria
embora. Estava muito consciente de
Raul ao seu lado.
Consciente de si mesma, também.
Do farfalhar do tecido rico ao redor de
suas pernas, quando ela se movia. Do
corpete justo contra seu peito, enquanto
ela se esforçava para inalar oxigênio. O
tecido do sutiã parecia subitamente
abrasivo, arrepiando os bicos de seus
seios.
Ela se distanciou um passo, apenas
para parar abruptamente.
– Isto parece... íntimo.
– Isso importa?
– É claro que importa! – Ela soou
como uma adolescente, não como uma
mulher madura.
Uma mesa baixa estava posicionada
diante de um sofá imenso. Almofadas
de veludo pareciam macias e
convidativas.
Uma
garrafa
de
champanhe descansava num balde de
prata. Uma lagosta estava arranjada de
maneira suntuosa ao lado de uma
cumbuca de gelo, que aninhava caviar.
Luisa deu um passo atrás, apenas
para colidir com Raul. Ela se virou, as
mãos plantadas no peito largo, como se
para detê-lo. Então, por que seus dedos
se curvaram no paletó dele?
Apressadamente, ela recuou.
– Isto é algum tipo de brincadeira? É
como um cenário clichê para uma
sedução.
– Você não gosta de lagosta?
– Bem, sim. – Ela só experimentara
uma vez, ali no castelo, e adorara cada
garfada.
– Ou de frutas? – Ele gesticulou, e ela
viu uma travessa com suas frutas
favoritas: pêssegos, cerejas e amoras.
Atrás desta, havia uma cesta com pães...
não os pães finos que agraciavam a
mesa do palácio, mas pães integrais,
grossos com sementes, que Luisa
descobrira quando se convidara para a
cozinha. O cardápio tradicional dos
camponeses, tinham lhe dito. O melhor
pão que ela já provara.
Luisa inclinou-se para a frente e viu
uma tábua de queijo, uma cumbuca
com castanhas de caju. Suas favoritas.
Um pote familiar na ponta da mesa
chamou sua atenção. A letra de Mary
no rótulo: geleia de framboesa.
Luisa piscou contra as lágrimas.
Estendeu a mão e pegou o pote da
geleia de sua tia, a geleia que ela
ajudava a fazer desde que era criança.
Um gosto de lar. Ela mal podia
acreditar que ele se dera o trabalho de
pedir aquilo para Mary.
Raul não tinha apenas estalado os
dedos e ordenado uma festa. Aquilo era
apenas para ela. Algo especial. A
consideração dele a pegou de surpresa.
– Como você...? – Sua garganta
fechou com emoção.
– Como eu soube que você prefere
fruta a doces, queijos a chocolate? – Ele
pausou. – Porque eu noto tudo sobre
você. – A voz de Raul era profunda. –
Você é minha esposa, agora. Eu quero
fazê-la feliz.
Nem para si mesma, Luisa admitiu
como aquelas palavras aliviavam sua
alma ferida.
– Mas não assim. – Ela gesticulou,
englobando o sofá, as taças de cristal, a
cena inteira de sedução. – Nós
concordamos com um casamento de
conveniência!
Ela estava tentando convencê-lo ou
convencer a si mesma? Desde que
entrara na câmara dele, experimentava
uma deliciosa excitação.
Raul não disse nada. Todavia, o olhar
dele queimava. A boca era uma linha
sensual de tentação, a qual ela precisava
resistir.
Parte
de
Luisa
queria
desesperadamente tocá-lo. Para não
fazer isso, levou as mãos para trás das
costas e as manteve lá.
– Nós nos casamos por razões legais.
De modo que você possa herdar,
lembra?
– Eu lembro. – A voz dele era baixa,
ressonando através do seu corpo para
lugares cuja existência ela não
conhecera antes. – Também me lembro
de como foi a sensação de beijá-la.
Você lembra, Luisa? Do fogo entre nós?
Do desejo?
Ela negou com a cabeça, e seu véu
balançou entre eles.
– Não foi assim. Você apenas...
Luisa perdeu o fôlego quando ele lhe
removeu o véu. Os dedos másculos
estavam a centímetros de seu peito, e
ela respirou fundo, tentando não
pensar em Raul tocando-a ali.
Mas
a
respiração
significou
movimento. Seu peito roçou a mão
dele, fazendo-a tremer.
Ele não olhou para cima, mas ela viu
os lábios de Raul se curvarem.
– Eu não sou um divertimento
passageiro – disse ela.
– Eu nunca pensei que você fosse.
Leva as coisas muito a sério para isso. –
Os olhos verdes encontraram os seus, e
Luisa esqueceu sobre respirar. As mãos
dele baixaram e seguraram as suas,
quentes e firmes. – Você é minha
esposa. Será a mãe de meus filhos. Eu
levo isso a sério.
O sorriso que ele deu causou impacto
no corpo inteiro de Luisa.
Seu
coração
disparou...
em
indignação, assegurou a si mesma.
Todavia, indignação não tinha nada a
ver com o calor de desejo inundando
seu corpo.
– Eu não concordei em compartilhar
sua cama.
– Você não quer filhos? – Ele
arqueou uma sobrancelha.
– É claro que eu quero... – Ela parou
e tentou organizar seus pensamentos
confusos. – Um dia. – Uma vez, Luisa
sonhara com uma família. Mas com
Raul? Pensara que aquele fosse um
casamento apenas no papel. Ou se
enganara deliberadamente?
O problema era que ele a instigava
com cada coisa que ela tentava, sem
sucesso, negar querer: ele. Desde o
começo, tinha sido incapaz de impedirse de responder a ele no nível mais
básico.
Para Raul, desejo era uma coisa
corriqueira, mas para Luisa, era algo
que transformava a vida. Ela aprendera
a desconfiar muito cedo.
Ele sorriu, então, ergueu-a contra seu
peito num único movimento fluído.
– Eu nunca disse...
Raul atravessou o cômodo como se
ela não pesasse nada, entrando em
outra câmara e fechando a porta. A
visão de uma cama enorme secou a
boca de Luisa.
Ele a colocou no chão, e ela fechou
os olhos, desejando que não se
deleitasse na fricção de cada centímetro
que seu corpo deslizava contra o dele.
– Pensei que você fosse corajosa,
Luisa. Por que está com medo? Alguém
machucou você?
Ela abriu os olhos.
– Não, eu não fui machucada. – Não
fisicamente, pelo menos.
Todavia, ele estava certo. Ela estava
com medo: de seus novos sentimentos
intensos. Com medo de se perder, se
cedesse ao desejo. Isso era uma traição
ao seu código de moral... entregar-se a
um homem que não amava.
Entretanto, parada ali, sentindo a
respiração de Raul no seu rosto e o
corpo poderoso tão perto, seu desejo
era profundo. Desejo por uma
intimidade que nunca tivera. E nunca a
teria com amor, não agora que aceitara
uma barganha prática e fria.
Ele lhe roubara essa chance.
A percepção foi como uma mão fria
em seu coração.
Ela nunca experimentara amor
verdadeiro. Nunca experimentaria o
que seus pais haviam compartilhado.
Aquilo sempre fora seu maior desejo,
especialmente depois do desastre de seu
primeiro romance.
O conhecimento diminuiu seus
medos e tornou-a muito zangada. A
raiva, mais forte que tristeza ou dúvida,
inundou-a.
Raul lhe roubara tanta coisa.
– É tão errado encontrar prazer,
juntos? – Ele vociferou os pensamentos
que já estavam preenchendo a mente
de Luisa. – Você me desaponta, Luisa.
Pensei que fosse mulher o bastante para
admitir o que sente.
Luisa fitou os olhos verdes ardentes,
e a raiva ajudou-a a decidir entregar-se
à autossatisfação. Deu um passo à
frente e pressionou-se contra o corpo
forte. Segurando-lhe o rosto nas
palmas, beijou-o na boca. Inclinou-se
sobre ele, até que, no meio de um
farfalhar de seda, ambos caíssem na
cama.
CAPÍTULO 8
ERA COMO segurar uma chama.
Luisa era pura energia. Seu toque,
seu corpo, fazendo o sangue de Raul
ferver nas veias.
Um tremor o percorreu quando ela
inseriu a língua em sua boca e
aprofundou o beijo. Havia pouca
delicadeza, mas a avidez de Luisa
incitou seus impulsos mais possessivos.
Ela lhe segurou a cabeça, como se
para aprisioná-lo em paixão ardente.
Raul deu boas-vindas ao ato,
correspondendo ao beijo que era mais
uma batalha por supremacia do que
uma carícia.
Sentia-se vivo como nunca antes,
capturado por uma força pulsante que
apagava todos os seus pensamentos,
exceto um.
Sua necessidade por Luisa. Agora.
Ele a posicionou em cima de seu
corpo, em contato com seu sexo,
enquanto afundava na cama grande.
Estava em chamas.
Ela se contorceu de prazer,
encorajando-o, e ele ergueu as camadas
de saias, puxando-as para cima da
cintura de Luisa, até que, finalmente,
tocou a pele sedosa nua. Seu sexo
pulsou quando ele abriu as mãos sobre
as nádegas firmes.
O gemido de Luisa contra sua boca
tornou
seu
nível
de
tensão
impossivelmente alto.
Um momento depois, ele a tinha
deitada sobre as costas. Ela estava
corada, os olhos brilhando, os lábios
entreabertos num convite. O peito se
movia contra o corpete justo, e Raul
permitiu-se um momento de diversão.
Cobriu um dos seios com a mão,
sentindo-a arquear-se sob seu toque.
Então, movimentou a mão em círculos,
e Luisa gemeu, fechando os olhos e se
contorcendo.
Com a outra mão, Raul estava
novamente levantando as saias. Mas
um homem podia fazer duas coisas ao
mesmo tempo. Ele abaixou a cabeça e,
com a boca aberta, beijou-lhe o seio,
sentindo o bico enrijecer através de
seda e renda.
Agarrando sua cabeça, Luisa arfou
em deleite. Sob ele, continuava se
contorcendo, como se procurando o
peso de seu corpo sobre o dela.
Raul nunca tivera uma mulher tão
enlouquecida por ele. Não havia jogos
ou sutilezas, apenas um desejo
devastador que combinava com o seu.
Tamanha paixão era libertadora.
Raul subiu a mão pela coxa de Luisa,
pressionou o sexo feminino através da
calcinha e descobriu que estava úmido.
Esse era todo o encorajamento que
precisava.
Segundos depois, tinha aberto sua
calça e se libertado o bastante para
deslizar sua extensão contra o ápice
quente, num movimento tão excitante
que ele teve de pausar e se recompor.
Luisa não esperaria. Ela circulou seus
quadris de um jeito tão voraz que
acabou com o último vestígio de
controle de Raul.
Apoiado sobre um braço, Raul rasgou
o delicado tecido da calcinha e
acomodou-se sobre ela.
– É isto que você quer? – perguntou
ele com voz rouca e a promessa de
prazer incomparável.
Os olhos azuis brilharam. Ele leu
paixão e alguma outra emoção não
familiar neles. Mas o corpo feminino
relaxou sob o seu. Ela estava
incrivelmente suave, e, ao mesmo
tempo, vibrando com energia erótica.
Ela ofegou, mas ele queria ouvir as
palavras. Por que, não tinha ideia.
Levou uma das mãos ao seio
arrepiado.
– Fale, Luisa. – Raul pressionou-se
contra ela, torturando ambos com a
fricção de seus corpos. – O que você
quer?
Em vez de responder, Luisa puxoulhe a cabeça para baixo e beijou-o
ardentemente.
Raul lutou contra a força daquele
ardor. Mas era demais. Era irresistível.
Com um gemido abafado, ele cedeu
e correspondeu ao beijo, enquanto,
usando suas coxas, abria-lhe mais as
pernas e se acomodava à entrada dela.
Deslizou a mão sobre os cachos louros e
encontrou o botão do prazer de Luisa.
Um toque ali, e ela tremeu.
– Raul! – Seu nome falado de
maneira ofegante rompeu seu controle
frágil.
Um momento depois, beijando-lhe a
boca, ele a penetrou. Uma pressão se
construiu em seu interior, quando
paredes quentes e
sedosas o
envolveram. A passagem era mais
apertada do que parecia possível. Raul
sentiu as coxas de Luisa tremendo
contra seus quadris.
Atônito, ele tentou recuar, mas Luisa
entrelaçou os dedos em seus cabelos e
beijou-o com um desespero que fez sua
cabeça girar.
Ela envolveu as pernas ao seu redor,
e Raul afundou mais. Segurando-lhe os
quadris, ele inclinou o corpo para trás,
vendo estrelas atrás de seus olhos
fechados, enquanto incríveis sensações
o percorriam.
Após um momento,
investiu
novamente, cedendo à força de um
desejo que o perseguia desde aquela
noite em Paris.
– Sinto muito, eu não posso... – Suas
palavras foram engolidas pelo som de
um grito cortando o ar.
Luisa convulsionou-se ao seu redor,
roubando-lhe a força e a consciência,
enquanto ele se perdia em deleite.
Somente os gemidos de Luisa o
levaram de volta à realidade. Então ele
começou os movimentos, os quais se
tornaram cada vez mais frenéticos, até
que, com a respiração ofegante, Raul
mergulhou no esquecimento.
APESAR DO peso de Raul sobre ela, Luisa
sentia como se estivesse flutuando. Ecos
de prazer incrível ainda percorriam seu
corpo.
Finalmente, ela reuniu forças para se
mexer, e deixou suas pernas,
impossivelmente pesadas, afundarem
contra o colchão. Até mesmo a dor nos
músculos não usados era satisfatória.
Seus braços se apertaram em volta de
Raul.
Ela pensou em abrir os olhos, mas a
ideia de que a realidade interferisse na
experiência mais notável de sua vida
impediu-a de fazer isso.
Mesmo agora, não podia dar um
nome
aos
sentimentos
que
experimentara quando confrontara
Raul na recepção do casamento deles.
Ou quando Raul a desafiara a fazer
amor com ele. Não... fazer sexo com
ele.
Luisa engoliu em seco, tentando
ignorar o aperto no coração.
Se aquilo era fazer sexo, como seria
fazer amor?
Como alguma coisa tão gloriosa
podia ter resultado de emoções tão
turbulentas?
Luisa esperou pela vergonha que
sentiria. Pela tristeza de ter se
entregado a um homem que, apesar de
ser seu marido, não a amava.
Sim, havia tristeza. Tristeza porque
nunca conheceria como era estar com
um homem que amava e que a amava.
Todavia, não podia negar o fato de
que, com Raul, ela sentia-se... diferente,
gloriosa, poderosa. As palavras não
faziam justiça à sensação de flutuar, de
vida, excitação e prazer que tinham
percorrido suas veias quando eles
atingiram o orgasmo, juntos. Mesmo
quando eles discutiam, havia uma
promessa escondida que a instigava a
desafiá-lo.
O que isso significava? Luisa franziu
a testa, enquanto tentava entender seus
sentimentos. Mas pensar era muito
difícil, quando apenas estar deitada ali,
com Raul, era tão maravilhoso.
Um dedo gentil alisou sua testa.
– Sem rugas de preocupação. Este
não é o fim do mundo.
Luisa abriu os olhos para ver o rosto
de Raul. Ele parecia tão perplexo
quanto ela se sentia. Uma mecha de
cabelo escuro caía sobre a testa larga,
fazendo-o parecer ainda mais jovem,
mais acessível. Ela queria afastar a
mecha dali, mas, apesar do que eles
haviam acabado de compartilhar, o ato
parecia íntimo demais.
Ele se moveu, colocando o peso sobre
os cotovelos, e ela enrubesceu,
percebendo que eles ainda estavam
unidos, intimamente. Luisa desviou o
olhar, mas ele lhe virou a cabeça na sua
direção.
– Você não me contou.
– Não contei o quê?
– Que você não tinha feito isto antes.
Aquilo não havia sido óbvio?
Enquanto a paixão durara, tal fato não
importara para Luisa. Tudo que contava
era seu desejo feroz, e o fato de que
Raul correspondera com a mesma
avidez. Ele ficara desapontado?
– Isso importa? – perguntou ela.
– É claro que importava. Eu teria me
certificado que fosse melhor para você.
Luisa quase perguntou como era
possível que fosse melhor do que
aquilo, mas conteve-se a tempo.
– Eu poderia fazer isso agora –
ofereceu Raul com um sorriso. Para sua
surpresa, Luisa sentiu seu corpo
inundar de desejo. Tão breve!
Mas não podia esquecer que, para
Raul, ela era uma conveniência. Se
Luisa tentasse, talvez conseguisse se
convencer de que o que eles tinham
acabado de fazer significava tão pouco
para ela quanto devia significar para ele.
Apenas tinha de tentar mais
arduamente.
– Eu preciso levantar. Este vestido irá
ficar destruído.
Abruptamente, ele se retirou de seu
interior, o sorriso desaparecendo. Luisa
imediatamente sentiu a falta do peso
sobre si.
Tremendo, ela desceu as saias,
enquanto Raul se levantava e fechava a
calça. Luisa precisava lembrar que ele
estava acostumado a lidar com sexo.
Para ele, aquilo não era especial.
– Deixe-me ajudá-la. – Ele lhe
segurou o braço e puxou-a para uma
posição sentada.
Evitando-lhe o olhar, Luisa estudou a
seda amassada.
– Está arruinado.
– Bobagem. O vestido apenas precisa
de alguma atenção. O palácio tem
tintureiros especializados.
Luisa alisou o tecido, notando um
rasgo na renda fina, sentindo umidade
no corpete, onde Raul lambera.
– Eles saberão o que nós fizemos.
– Ninguém espera que sejamos
celibatários. – Ele lhe inclinou o queixo.
– Você não deve se envergonhar do que
nós fizemos. – Sentindo-a hesitar, Raul
perguntou: – Está envergonhada?
Alguma coisa se passou entre eles,
uma onda de calor, de paixão. Então
aquilo não tinha acabado, afinal de
contas. Ela ainda o desejava.
Foi quando encarou a verdade.
– Não, eu não estou envergonhada.
– Ótimo. Porque eu pretendo que
isso aconteça com frequência. – Ele lhe
acariciou o rosto, e ela arfou ao ver a
promessa nos olhos verdes. – Vire-se, e
eu a ajudarei remover o vestido. Você
se sentirá melhor depois de um banho.
Luisa virou-se de lado, dizendo a si
mesma que era natural que apreciasse
sexo com seu marido bonito e viril. Eles
eram jovens e saudáveis. Tais...
impulsos eram esperados. Todavia, ela
não conseguia se livrar da sensação de
que as coisas não eram tão simples
assim.
Ela não entendia seus sentimentos.
Num minuto, ele a irritava. No minuto
seguinte, intrigava-a. Às vezes, gostava
muito dele.
Talvez tivesse caído pela sedução
habilidosa de Raul? Ele era altamente
experiente, e ela era uma completa
novata. Entretanto, houvera pouca
sedução. Ele parecera tão descontrolado
quanto ela.
O toque dos dedos de Raul em sua
nuca a fez arfar, quando o colchão
afundou atrás dela.
– Isso levará um tempo. – O
costureiro insistira numa infinidade de
botões, cada um com sua casa
minúscula.
Raul sentou-se perto, a respiração
soprando na pele desnuda de Luisa. Ela
endireitou a coluna, os mamilos
formigando. No silêncio, ouvia sua
própria respiração ofegante.
– Fico pensando...
– Sim? – Ela nunca ouvira Raul tão
hesitante.
– Por que você era tão contra vir para
cá? Não era apenas a perspectiva do
casamento. Desde o começo, você se
opôs à ideia de ser herdeira.
– Incomoda você que eu não caí aos
seus pés?
– Se eu algum dia esperei isso, já sei o
quanto me enganei, agora. Ademais, eu
prefiro você como é. – Ela pensou ter
ouvido admiração na voz dele.
Seus sentidos conspiravam para
enganá-la?
Dedos quentes roçaram suas costas, e
uma pulsação começou em sua barriga.
Ele destruía suas defesas. Luisa respirou
fundo, buscando controle.
– Você não vai me contar? – A voz
dele era sedosa como uma carícia.
Ela fechou os olhos. Que mal isso
faria?
– Quando eu tinha 16 anos, minha
mãe foi diagnosticada com uma doença
terminal. Eu cuidei dela.
– Sinto muito. Isso deve ter sido
difícil.
Luisa assentiu, um nó na garganta.
– Pelo menos, eu estava com ela. Mas
a questão é, antes disso, alguns
estranhos foram à fazenda, querendo
falar comigo. Tinham sido enviados por
meu avô.
– Não para visitar sua mãe?
– Não. – Um gosto amargo
preencheu a boca de Luisa. – A oferta
era somente para mim. Ele me
convidou para morar com ele e
aprender a ser uma princesa, de
verdade. – Ela pausou, lembrando-se
das promessas e das demandas.
– No começo, eu fiquei excitada. Eu
queria vê-lo, estar na casa dele. Era
como um conto de fadas. Mesmo que
ele me mantivesse ocupada no palácio,
me treinando, ele dizia, para quando eu
estivesse pronta para assumir meu lugar
com ele.
– Você veio para cá? Eu não sabia.
Ela assentiu.
– Ninguém sabia. Obviamente, eu
não correspondi aos altos padrões de
meu avô. Mas fiquei aqui tempo
suficiente para avaliá-lo, e avaliar as
pessoas com quem ele convivia. Isso fez
com que eu nunca mais quisesse voltar.
– Luisa deu uma risada vazia. – Eu era
ingênua. Levei um tempo para perceber
que eu era apenas uma marionete para
ser manipulada. Sem escolhas. Sem
carreira. Sem controle do meu próprio
destino.
Os toques de Raul em suas costas
eram gentis. Ela experimentou um
desejo ridículo de inclinar-se contra ele.
– Quando a notícia da doença de
minha mãe chegou, eu enxerguei quem
ele realmente era. Meu avô insistiu que
eu cortasse todos os elos com meus pais.
Detestava que minha mãe houvesse
escapado da vida que ele planejara para
ela... uma esposa obediente para algum
amigo dele. Meu avô nunca a perdoou.
Quando eu supliquei por ajuda, para
um melhor tratamento, ele ficou
furioso, alegando que minha mãe
parara de existir no momento que saíra
de casa.
Luisa tremeu ao se recordar do
sarcasmo do homem mais velho. Da
crueldade dele.
Um xingamento furioso em maritzian
cortou o ar.
– Eu sabia que ele era antiquado. – A
voz de Raul era um sussurro letal. –
Mas isso foi cruel.
Luisa sentiu lágrimas nos olhos ao
ouvir ultraje e compaixão na voz dele.
Ela jamais contara aquilo aos seus
pais, embora suspeitasse que sua mãe
tivesse adivinhado parte do que
acontecera.
Um alívio inundou-a por ter revelado
a terrível verdade.
– Então, você voltou para a fazenda.
– Mamãe precisava de mim. Assim
como papai. Quando ela morreu, ele
ficou devastado.
– Foi quando você começou a
assumir a responsabilidade pela
cooperativa. Lamento, Luisa.
Ela enrijeceu.
– Não há nada para lamentar. Eu
queria estar com eles.
– Eu quis dizer que lamento que seu
primeiro contato com Maritz tenha sido
tão ruim. Não é de admirar que você
tenha detestado a ideia do lugar.
A risada dela foi amarga.
– Eu pensei que o lugar fosse repleto
do pior tipo de pessoas.
– Não apenas seu avô?
Ela hesitou, ciente de que, mais uma
vez, estava entrando num território que
jamais compartilhara.
– Luisa? – Ele pausou. – Você quer
me contar? – Foi a preocupação na voz
de Raul que fez aquilo. A gentileza.
– Havia um sujeito um pouco mais
velho do que eu, no palácio de meu
avô. – Ela respirou fundo. – Ninguém
sabia que eu era a neta do príncipe, mas
quando nós nos encontramos nos
jardins, não pareceu importar quem eu
era. Nós conversamos por horas. –
Luisa parou. Como tinha sido ingênua!
– Nós nos víamos todos os dias. E
eu... me apaixonei. – Ele a beijara, e
Luisa se acreditara apaixonada. – Ele
quis fugir para que nos casássemos, mas
eu me recusei. – Ela quisera seus pais
no seu casamento.
– Aquilo o irritou. Ele tentou... me
forçar, mas eu lutei. Ele partiu com um
olho roxo, mas não antes de explicar
que só se aproximara de mim por causa
de quem eu era. Tinha descoberto, e
queria me usar para sua vantagem. Ele
era um homem ambicioso. Casar-se
com uma princesa seria uma vitória.
– Luisa. – A voz de Raul era rouca. –
Eu sinto muito.
– Não é culpa sua.
– Mas é meu país, meu povo.
Ela sentiu um beijo terno em suas
costas, e ficou tentada a pedir que Raul
fizesse amor com ela novamente, até
que as memórias perturbadoras
desaparecessem, e tudo que ela
conhecesse fosse êxtase.
Raul a fazia sentir coisas que ela não
deveria sentir.
Sobre
pernas
bambas,
Luisa
levantou-se, segurando o vestido, agora
solto. Precisava tomar o controle. Já
revelara demais.
– Eu posso me virar agora, se você
me disser onde é o banheiro.
– Deixe-me ajudar. – Por trás, ele
puxou o vestido.
Resistir rasgaria o tecido, então ela
cooperou, apenas para descobrir que
seu sutiã, de alguma maneira, abrira
com o vestido. Ela cruzou os braços
para cobrir os seios nus.
– Basta. Eu...
Ele puxou a seda até que o vestido
caísse aos pés dela.
Tarde demais para lembrar que sua
calcinha estava rasgada, em algum
lugar. Não havia um roupão ou uma
toalha para cobrir sua nudez.
Ele a circulou, vestido em suas
roupas finas, enquanto ela não usava
nada além de meias de nylon presas às
coxas por uma faixa elástica. Sentia-se
vulnerável,
especialmente
diante
daquele corpo tão alto.
– Você é maravilhosa. Deixe-me
olhar para você.
O brilho ávido nos olhos verdes e a
respiração ofegante dele falavam de um
homem prestes a perder o controle.
Luisa sentiu as mãos másculas
tremendo, quando ele pegou as suas.
Ela nunca ficara nua na frente de um
homem. O embaraço ruborizou sua
pele. Mas com isso, veio uma onda de
excitação, uma crescente sensação de
poder.
Porque Raul parecia... hipnotizado.
Com esforço visível, ele ergueu o
olhar para o rosto dela. Lentamente,
balançou a cabeça. Então, liberou-a e
deu um passo atrás.
– Você era virgem. Ficará dolorida.
Eu não deveria...
Luisa não se sentia dolorida. Não
muito. Sentia-se maravilhosa. Porque
ele a queria como ela o queria? Ou por
que Raul se importava o bastante para
se conter? Para colocar as necessidades
dela em primeiro lugar.
Ela abraçou o conhecimento. Era
uma coisa pequena, mas parecia
significativa.
Quando ele gentilmente ergueu-a
nos braços, Luisa aninhou-se contra o
corpo forte. Deleitou-se nas batidas
firmes do coração de Raul, enquanto
ele a carregava para o banheiro.
Minutos depois, ela estava dentro de
uma banheira com água aromática. Um
bálsamo para seus músculos levemente
doloridos.
Sob cílios baixos, observou Raul
remover o paletó, enrolar as mangas da
camisa e pegar uma esponja. A
antecipação a percorreu.
Os movimentos circulares que ele
fazia
com
a
esponja
eram
impossivelmente eróticos. E Raul
cuidava dela com tanta gentileza. Como
se ela fosse preciosa.
O suor brilhava no rosto de Raul,
escorrendo pelo pescoço, e ela queria
deslizar a mão ao longo da pele dele.
Mas a expressão tensa no rosto bonito
dissuadiu-a.
Até que ela notou o volume dentro
da calça masculina. Não era de admirar
que ele parecesse estar com dor. Ou
que as mãos grandes tremessem tanto
que ele derrubou o sabonete mais de
uma vez.
O conhecimento deixou-a em
chamas.
– Eu vou sair. – Luisa esforçou-se
para se levantar.
– Espere! – Não se importando com a
água, Raul tirou-a da banheira com
facilidade. Ela se inclinou contra o peito
largo e abriu as mãos sobre a camisa
dele.
– Você precisa descansar. – O
maxilar de Raul estava rígido de tensão.
– Não é disso que eu preciso. – Luisa
ergueu o queixo e encontrou-lhe os
olhos. – Preciso de você.
Pronto, ela falara aquilo, e o mundo
não desmoronara ao seu redor! Na
verdade, a sensação era ótima.
– Agora. – Seus dedos se curvaram na
camisa ensopada. Ela se colocou na
ponta dos pés e beijou-lhe os lábios.
Num movimento apressado, ele a
ergueu nos braços e carregou-a para
colocá-la sobre a cama. Segundos
depois, estava sem camisa. A pulsação
de Luisa acelerou enquanto ela
estudava o torso esculpido, com pelos
escuros. As mãos grandes foram para a
calça, enquanto ele se livrava dos
sapatos. Um momento depois, Raul
estava nu e imponente.
Ela se esqueceu de respirar enquanto
admirava o corpo perfeito, sentia o
poder irradiando-se dele. Então, ele se
juntou a ela, e todos os pensamentos
desapareceram.
Raul deslizou as mãos por seu corpo
inteiro, acariciando-a e provocando-a,
até que Luisa se contorcesse e tentasse
retribuir as carícias. Mas ele a segurava,
as coxas grossas imobilizando-a, as
mãos hábeis capturando-lhe os pulsos.
A tortura começou quando ele usou
lábios, dentes e língua em seu corpo.
Minutos se transformaram numa
infinidade de prazer.
Era como se ele tentasse compensá-la
pela velocidade do ato sexual anterior.
Luisa estava em chamas, tremendo com
desejo e prazer. Aquilo era intenso
demais.
– Por favor, Raul. Pare de me
enlouquecer.
Ele olhou para cima, então tomou
um mamilo na boca. Prendeu-lhe o
olhar, enquanto circulava o bico com a
língua. Quando ela gemeu, Raul
deslizou a mão ainda mais para baixo,
massageando seu ponto mais sensível.
E Luisa gritou, deleitando-se nas
ondas de êxtase que abalaram seu corpo
inteiro. Ele ainda prendia seu olhar,
mesmo enquanto o mundo girava à
volta dela. A sensação era tão
maravilhosa que a deixou sem fala.
Mas não era Raul.
Luisa agarrou os ombros largos e,
finalmente, quando ela tombou contra
o colchão, ele se acomodou entre suas
coxas. A sensação da carne quente ali
renovou as energias dela, e uma
sensação de familiaridade preencheu-a.
Desta vez, ele deslizou para seu
interior com facilidade. Com cada
investida, a fricção se construiu para
níveis inflamáveis.
Mas eram os olhos dele que a
hipnotizavam. A conexão entre eles era
diferente, desta vez. Ela leu excitação e
contenção nos olhos verdes. E mais.
Alguma
coisa
desprotegida
e
vulnerável. Honesta.
Raul acelerou o ritmo, e Luisa ergueu
os quadris para encontrá-lo. O prazer
crescente inundava a ambos.
Então o clímax veio. Um clímax de
abalar a terra, que continuou e
continuou. Durante o tempo inteiro,
eles se entreolhavam em comunicação
silenciosa.
A sensação era de que eles
compartilhavam como iguais.
CAPÍTULO 9
A
REALIDADE
atingiu-a quando Luisa
acordou.
Na noite anterior, ela quase
acreditara
que
eles
tinham
compartilhado mais do que seus corpos.
Mas acordar sozinha na cama de Raul
relembrou-a quais eram as prioridades
dele. O casamento era sobre o desejo
dele pelo poder. Sexo era um bônus.
Seu peito apertou quando ela se
forçou a pensar naquilo como sexo.
Sentira como se eles tivessem feito amor.
Todavia, Raul incumbira uma criada
de acordar sua esposa, discretamente
fingindo não notar que Luisa estava
nua entre os lençóis emaranhados.
Ela enrubesceu ao ver a garota
pegando o vestido de noiva, dobrando
os metros de seda e renda com a
reverência que este merecia.
Então assentiu quando a criada
apontou em direção à porta que
conectava ao seu quarto, para quando
ela quisesse se vestir. Luisa nem
soubera que os apartamentos eram
conectados. Nem mesmo reconhecera o
corredor, quando Raul a levara para lá!
Estivera tão envolvida em sua reação a
ele.
Finalmente sozinha, Luisa olhou para
o travesseiro vazio ao seu lado.
Não tinha direito de sentir-se
desapontada. Soubera o que estava
fazendo. Ela começara aquilo! Mas
durante uma noite de intimidade,
aninhada nos braços dele, esquecera.
O que eles tinham compartilhado era
puramente físico. Seu sonho de um dia
encontrar amor, como seus pais, estava
morto. Ela teria de contentar-se com
isso... o êxtase e a solidão.
Ignorando a bandeja de café da
manhã, Luisa foi para a porta de
conexão, determinada a não se render a
lamentações. Arrumaria sua cama e...
Ela agarrou a maçaneta da porta e
parou quando um pensamento ocorreulhe. Seus joelhos tremeram tanto que
ela temeu cair.
Eles não tinham usado contracepção!
Como ela só percebera isso agora?
O fato de Raul confundir seus
pensamentos assustava-a. Luisa mudava
quando estava ao seu lado. Ele lhe
despertava paixões que ela jamais
conhecera. Todas as suas emoções, de
raiva à alegria, pareciam muito mais
intensas por causa dele.
Entregar-se a Raul certamente
tornava-a mais vulnerável à influência
potente dele. No entanto era tarde
demais para voltar atrás.
Tudo que podia fazer era tentar ser
sensata,
lembrar
que
eles
compartilhavam um relacionamento
conveniente. Não cairia na armadilha
de sonhos tolos.
Começaria com contracepção. Não
estava pronta para trazer um bebê em
tal situação.
– VOSSA ALTEZA, bem-vindo. – O
prefeito fez uma reverência, a cabeça
careca brilhando ao sol.
Mas a atenção de Raul não estava na
figura resplandecente diante da
prefeitura. Estava em Luisa. Num traje
claro, os cabelos dourados presos no
topo da cabeça, ela estava muito
elegante. E uma olhada para os lábios
carnudos e pescoço delgado fez
memórias virem à superfície.
De Luisa sob ele na noite anterior, se
contorcendo com paixão irrestrita,
enquanto
o
enlouquecia
completamente e lhe roubava todo
controle.
Como se ele fosse virgem, e ela a
sedutora!
Mesmo a sensação do braço de Luisa,
enquanto ele a guiava sobre o piso
irregular de pedras, fazia seu desejo
ganhar vida. Ele precisou acessar toda
sua experiência para mascarar seus
sentimentos.
Era isso que o preocupava. O fato
que ela o fazia sentir. Não meramente
luxúria. Não apenas alívio e gratidão
porque a coroa estava assegurada.
Um coquetel de emoções o abalara
na noite anterior, quando ela falara
sobre o avô e o suposto sedutor. Um
desejo feroz de protegê-la o consumira.
Fúria pelo sofrimento de Luisa.
Tristeza. Uma ternura que ele jamais
conhecera.
E uma alegria tão profunda que o
chocara e o tirara da cama esta manhã,
procurando trabalho como uma
distração.
Instintivamente, Raul tentou negar a
intensidade de suas emoções. Não
lidava com sentimentos. Era assim que
tinha sobrevivido e reconstruído sua
vida diante da humilhante especulação
pública e dor privada.
O que Luisa fazia com ele?
Mesmo quando jovem, quando ele
fora golpeado pelo que, tolamente,
considerara amor, Raul comportara-se
melhor do que isso.
A multidão vibrou e Raul teve de se
esforçar para se lembrar de acenar em
reconhecimento. Pela primeira vez, teve
dificuldade de lembrar seu dever.
A percepção apavorou-o.
O dever tinha sido sua vida. Ele se
devotara ao seu país com uma
dedicação
que
outros
homens
ofereciam a esposas e famílias. Isso lhe
dava propósito. Ajudara-o a prosseguir
nos piores momentos, quando o mundo
desmoronara à sua volta.
– Príncipe Raul, princesa Luisa, bemvindos. – Os olhos do prefeito
brilharam com admiração, antes que ele
fizesse uma reverência para Luisa.
Raul experimentou uma vontade
irracional de puxar Luisa para trás de si
e tirá-la de visão. Ou levá-la para o
castelo e trancá-la em seu quarto.
Lutando
por
controle,
Raul
cumprimentou
o
prefeito
adequadamente, que logo se voltou
para Luisa, segurando uma enorme
chave ornamental, que simbolizava a
entrada livre dela em todos os prédios
na capital.
– Bem-vinda à nossa cidade, Vossa
Alteza. Espero que você seja tão feliz
aqui, como estamos em tê-la conosco. –
Ele falou em maritzian, depois em
inglês, e a multidão aplaudiu.
– Muito obrigada. É um prazer estar
aqui. – Para a surpresa de Raul, Luisa
falou num maritzian lento, porém claro,
quando se voltou para as pessoas
alinhadas na praça. – É gentileza de
todos vocês terem vindo para me dar as
boas-vindas em sua cidade adorável.
Estou ansiosa para conhecê-la.
A multidão gritou em alegria.
Não importava que Luisa se virara do
microfone, de modo que o som saiu
baixo, ou que o sotaque dela não era
perfeito. O fato de ela ter se esforçado
para falar o idioma, quando todos
sabiam que ela não era fluente,
encantou o povo.
O prefeito sorriu. Mais aplausos se
seguiram.
O orgulho o percorreu quando Raul
observou-a sorrir para o público.
Somente ele, ao seu lado, viu como as
pequenas mãos tremeram quando ela
pegou a chave pesada.
Somente ele, o homem que a forçara
a abandonar tudo que ela conhecia, e
adotar um papel que Luisa rejeitara
repetidamente, imaginava o que aquela
fachada custava a ela.
A dor o preencheu. Ele fizera o que
precisara fazer por sua nação, e tinha
sido Luisa quem sofrera.
Ele se recordou de quando ela lhe
contara sobre a manipulação do avô.
Raul fechou as mãos em punho. Suas
próprias demandas deviam ter sido
como um eco daquela época horrível. O
pensamento era desconfortável. A
sensação era de culpa.
– Aqui, deixe-me ajudá-la. – Raul
pegou a chave, perturbado pela
vergonha que sentia. Não estava
acostumado a questionar suas ações.
Passara tanto tempo seguro no
conhecimento de que agia para o bem
do povo.
– Acabou – murmurou ele. – Já
podemos voltar para o carro.
Finalmente, Luisa encontrou-lhe os
olhos, e chocou-o. Não havia mais a
surpresa e o calor que tinham
transformado a noite anterior em
alguma coisa notável. Alguma coisa que
ele recusava-se a analisar.
Pela primeira vez desde que ela
concordara com o casamento, o olhar
de Luisa era distante.
Raul experimentou uma inexplicável
sensação de perda. Ele pensara que eles
haviam começado a compartilhar alo
mais do que aceitação de dever.
Instintivamente, estendeu o braço para
tocá-la, mas ela se afastou.
No último momento, ele se lembrou
de agradecer ao prefeito. Quando
terminou, Luisa já estava na sua frente,
a coluna ereta numa postura perfeita.
Aquilo não fora aprendido na última
semana. A mãe dela lhe ensinara?
Ele a seguiu, o olhar na saia feminina
que se movia sobre as curvas deleitosas
com cada passo. Por isso, Raul não viu o
tumulto na extremidade da multidão. A
próxima coisa que viu foi um dos
guardas de segurança abrindo espaço,
enquanto outro se inclinava para a
frente. Instantaneamente alerta, Raul
atravessou as pedras, a adrenalina o
bombeando,
preparando-o
para
protegê-la.
Ele parou ao seu lado, e ela se
abaixou. Foi quando Raul viu o
cachorro vira-lata, peludo e com a
língua de fora, saltando aos pés dela.
O coração de Raul disparou. Quando
ele vira seus homens de segurança
entrando em ação, temera o pior. Se
alguma coisa acontecesse a ela...
– Luisa, ele está sujo. – As palavras
soaram mais bruscas do que ele
pretendera, enquanto o alívio o
inundava. Sua esposa tinha lhe dado
um susto.
– Ele é apenas um cãozinho
inofensivo. – Ela pegou o vira-lata,
murmurando num tom tão suave que
fez o cachorro lambê-la em êxtase.
Se Luisa lhe sorrisse daquele jeito,
sussurrando e esfregando sua barriga,
ele lamberia, também. Ela apenas
precisava sorrir, e ele ficava excitado
como um adolescente. Raul não
entendia isso.
Uma comoção capturou-lhe o olhar.
Um garotinho estava tentando passar
pelo staff de Raul, que assentiu para
que eles o deixassem passar.
A criança olhou, com medo, sobre o
ombro, então correu em frente. Raul
viu um homem carrancudo de rosto
vermelho, na multidão, onde o garoto
estivera.
Uma memória de seu próprio pai,
usando aquela mesma expressão numa
das poucas ocasiões que se dignava a
passar tempo com seu filho mais novo,
lhe veio à mente. Raul não recordava o
que tinha feito para ganhar a ira de seu
pai. Arranhado seus sapatos, talvez, ou
ganhado uma nota menos que perfeita
nos estudos. Não era preciso muita
coisa para desapontar o velho homem.
A amargura o preencheu, e ele
estreitou os olhos.
O garoto parou na frente deles, a
cabeça baixa.
– Este cachorro é seu? – Raul esperou
que
o
menino
assentisse,
silenciosamente, então sentiu a mão de
Luisa no seu braço.
O quê? Ela achava que ele ia agredir
a criança?
– Sim, senhor. Ele não faz mal a
ninguém. A corda arrebentou e...
– Completamente compreensível –
disse Raul. – Com todo este barulho, é
normal que ele tenha ficado
superexcitado.
O garoto levantou a cabeça e olhouo, como se incapaz de acreditar nos seus
ouvidos.
– Ele deve ter sentido que a princesa
gosta de cães. – Raul descobriu-se
querendo tranquilizá-lo. Não tivera
ideia que Luisa gostava de cachorros,
até que a vira acariciar um. Ela sorriu
para o garoto e agachou-se no nível
dele.
Boa com crianças e cachorros. Raul
observou o nervosismo do menino
desaparecer sob a aprovação calorosa de
Luisa, e percebeu que ela era natural
com ambos. Daria uma boa mãe...
amável e afetuosa. Ela entregou o
cachorro para o menino e acariciou-lhe
a cabeça.
Raul imaginou-a preferindo jogar
bola com as crianças no jardim do
palácio a aperfeiçoar seu latim, antes
que todos fossem chamados para jantar.
E uma emoção o percorreu. Aquelas
crianças seriam seus filhos.
Pela primeira vez, a ideia de
paternidade o agradou, embora ele não
tivesse experiência de vida em família.
Tentou imaginar Luisa carregando
um bebê seu, e achou a ideia
estranhamente satisfatória. Embora não
tão prazerosa quando tê-la para si
mesmo, nua e desejosa.
– É hora de ir. – Ele lhe pegou o
braço e ajudou-a a se levantar. Então
conduziu sua esposa e o garoto em
direção ao homem carrancudo, na
frente da multidão.
Queria sua esposa para si mesmo,
quisera isso desde que fora forçado a
deixá-la esta manhã. Mas antes, tinha
um problema a resolver.
LUISA ACENOU para a multidão reunida
junto à estrada. Era mais seguro olhar
para eles do que para o homem ao seu
lado, que continuava confundindo-a.
Ela cruzou as pernas sobre o ponto
da meia que o cachorro puxara. Então
limpou as manchas de lama em suas
roupas.
– Não mexa nas suas roupas.
Ninguém mais pode ver a sujeira.
Assustada, ela se virou. Pensara que
Raul estivesse focado na multidão do
outro lado da estrada. Mesmo agora,
ele não se virou. Ela podia ver-lhe o
perfil,
enquanto
ele
acenava.
Observando os lábios cheios, lembrouse do jeito que ele a beijara na noite
anterior.
Um calor inundou-a, e ela engoliu
em seco. Não adiantou. Não podia
reprimir o desejo que ele lhe
despertara.
Obviamente, Raul não compartilhava
o sentimento. Ele estava muito
composto. Sem dúvida, desgostoso por
ela ter pegado um cachorrinho que não
passava de um vira-lata. Luisa fechou os
olhos e imaginou as fotos da imprensa.
Raul parecendo régio, e ela com um
rasgo na meia.
Bem, ela não pedira para ser
princesa. Ele a obrigara a isso. Agora
deveria aguentar o fato de que ela não
se encaixava no molde.
Ela vira o comportamento sério de
Raul durante a cerimônia de hoje.
Como se esperando que ela se
embaraçasse. Nem mesmo suas frases
ensaiadas, aprendidas com a ajuda de
Lukas, tinham suavizado o semblante
severo dele.
Somente uma vez durante todo o
procedimento a fisionomia de Raul se
suavizara. Com o garoto.
– Por que você foi até aquele homem
na multidão? – perguntou ela.
Raul virou-se, e uma onda de desejo
abalou-a quando seus olhares se
encontraram.
Como ele fazia aquilo? Era igual com
todas as mulheres que ele levava para
cama?
A ideia era pura tortura.
– Eu quis me certificar de que não
houvesse problema.
– Problema?
– Ele estava reclamando, em voz alta,
sobre o filho ser descontrolado. E sobre
como o cachorro era irritante.
– Está brincando? – exclamou Luisa.
– Peter era uma gracinha, mas muito
sério, não descontrolado. Se alguma
coisa, ele parecia muito velho para a
idade que deve ter.
Raul deu de ombros.
– Viver com pais críticos faz isso.
Luisa queria questionar a afirmação
de Raul, mas a expressão fechada dele a
fez desistir.
– O que você falou para o pai dele?
– Eu o parabenizei pelo bom filho.
– Bela atitude!
Olhos verdes atônitos encontraram
os seus, e, por um momento, Luisa
perdeu o fio da meada.
– E eu convidei o garoto e o cachorro
para visitar o castelo.
Luisa tentou, sem sucesso, ler a
expressão de Raul. Entretanto, o
instinto disse-lhe por que ele fizera
aquilo.
– Você quis se certificar de que ele
não se livrasse do cachorro?
Raul prendeu-lhe o olhar por mais
um instante, antes de virar-se para a
janela e levantar a mão em
reconhecimento
das
pessoas
aglomeradas na lateral da estrada.
– Um garoto deveria poder ter um
cachorro como companhia. Você não
acha?
O tom dele indicava que o assunto
não era importante. Entretanto, ela se
lembrou do medo no rosto de Peter, e
do jeito nervoso que ele olhara para o
pai. Raul tinha se dado o trabalho de
falar com eles, quando não falara com
mais ninguém na multidão, preferindo
acenar a distância.
Luisa sentiu que o episódio do
menino mexera com ele.
Franzindo o cenho, percebeu que
não sabia quase nada sobre o homem
com quem se casara.
CAPÍTULO 10
A MÃE de Raul morrera no parto, o pai
era impaciente com crianças e Raul não
tinha irmãos. Isso era tudo que Luisa
sabia, aparte o fato de que ele se
distanciava atrás de uma terrível
reserva.
O que isso dizia sobre ele?
– Você teve um cachorro quando era
criança?
Raul deu-lhe um olhar surpreso,
enquanto o carro atravessava os portões
do castelo.
– Não – replicou ele. – Cachorros e
relíquias antigas não é uma boa
combinação.
Luisa olhou para o enorme pátio e
pensou sobre o labirinto de terraços,
jardins murados e canais em volta do
castelo.
– Há muito espaço aqui fora.
Se ela tivesse um filho, deixaria a
criança ter um ou mais cachorros, e
descobriria um meio de proteger as
antiguidades.
O choque fechou sua garganta ao
perceber que estava imaginando um
garotinho correndo no pátio, com
cabelos pretos e olhos verdeesmeraldas. Olhos como...
– Você está pronta, Luisa? – Ela
olhou para cima, e descobriu que Raul
já estava de pé ao lado da limusine,
oferecendo a mão. Não havia como
evitar tocá-lo, sem ser rude. Ainda
assim, mesmo preparada, o toque dele
enviou eletricidade por todo seu corpo.
E quando ele enganchou o braço no
seu, e conduziu-a para a entrada, Luisa
teve de reprimir tremores de excitação.
– Com quem você brincava? – Ela
procurou distração.
– Eu tinha pouco tempo para brincar.
Príncipes precisam ser moldados para o
papel.
Luisa ficou horrorizada. Mas o tom
frio dele sinalizava o fim do assunto,
enquanto Raul acelerava os passos e
conduzia-a para o elevador.
– Mas quando você era pequeno,
deve ter brincado.
Ele deu de ombros.
– Eu não lembro. Tive tutores e aulas
desde os 4 anos. Hora de brincar não
era agendada, embora, mais tarde,
esportes foram incluídos no currículo.
– Isso parece... organizado. – Ela
reprimiu seu ultraje. Certamente, eles
poderiam ter permitido algum tempo
para ele ser criança! Aquilo reforçou
sua resolução de não se arriscar a ter
um bebê. Nenhum filho seu seria
tratado dessa forma.
Raul chamou o elevador.
– Meus dias eram movimentados.
Movimentados, mas não felizes. O
castelo antigo era perfeito para brincar
de esconde-esconde e de outras
fantasias que crianças adoravam. O
coração de Luisa se comprimiu pelo
garotinho que Raul tinha sido, tão
solitário.
Tal solidão explicava a atitude
distante
dele?
O
autocontrole
formidável?
– Você via muito seu pai? – Como o
fato de o pai ter sido impaciente com
crianças o impactara?
Eles entraram no elevador, e quando
começaram a subir, ele respondeu:
– Meu pai era ocupado. Ele tinha um
país para reinar.
As portas do elevador se abriram, e
Luisa não se moveu.
– Quer dizer que ele não tinha tempo
para você?
O semblante de Raul fechou-se
completamente. E ela teve vontade de
abraçá-lo. A imagem de Peter, o
garotinho na praça, tão formal, lhe veio
à mente. Raul tinha sido assim quando
criança?
Sua própria infância gloriosa, repleta
de risadas e amor, dias felizes no rio, ou
andando de trator com seu pai,
brincando com cachorros e até com um
lagarto, era tão alegre em comparação.
– Por que você quer saber?
– Por que não quer me contar? Eu
sou sua esposa. – Ela nem gaguejou
com a palavra. – É certo que eu o
conheça melhor.
Raul permaneceu imóvel, o rosto
tenso e ilegível. Então ela capturou um
brilho nos olhos dele que a fez tremer.
– Exatamente o que eu tinha em
mente. – A voz dele baixou para um
tom sedutor. – Nos conhecermos
melhor. – Raul puxou-a para dentro do
hall acarpetado, e ela percebeu que eles
estavam na frente da suíte dele.
O brilho nos olhos verdes era
inconfundível. Desejo puro. Alguma
coisa feroz e perigosa enviou deliciosas
ondas de excitação através dela.
Luisa esperou que o orgulho que lhe
desse forças para rejeitá-lo. Em vez
disso, o desejo fechou sua garganta.
Ele a introduzira ao prazer, e ela era
muito inexperiente para esconder o fato
de que ansiava por mais.
Raul devia ter lido seus sentimentos,
porque sorriu. Sem palavras, ele abriu a
porta, impulsionou-a para dentro, e
encostou-se contra a madeira, fechando
a porta com seu corpo.
O fogo explodiu no sangue de Luisa.
E ela reprimiu a memória da desolação
daquela manhã, e a desconfiança de
que o desejo de Raul agora mascarava
uma determinação de fazê-la parar de
questionar sobre seu passado.
Neste momento, era a paixão de Raul
que ela queria. Talvez por causa do
vazio que vira nos olhos verdes, quando
ele falara sobre sua infância, que, para
ela, parecia assustadoramente fria. Ao
se casar com ele, Luisa estaria se
condenando a uma solidão similar?
Todavia, não era medo que a
impulsionava. Nem simples luxúria.
Luisa percebeu que queria entregarse ao seu marido na esperança de curar
um pouco da dor profunda que vira no
rosto dele por um momento.
– Luisa? Você quer isto?
– Sim.
Quando ele abaixou a cabeça para
roçar seu pescoço com os dentes, todos
os
pensamentos
de
Luisa
desapareceram.
Ela lhe segurou os ombros quando
Raul removeu seu casaco e desabotoou
sua blusa, abrindo as laterais.
– Você foi magnífica esta manhã –
sussurrou ele com voz rouca, então,
beijou-lhe o topo dos seios, antes de
remover-lhe a blusa aberta. Sua saia se
seguiu, momentos depois, e ela tremeu
em deleite quando mãos grandes
deslizaram para seus quadris.
– Eu só fiz o que era esperado. –
Entretanto, as palavras dele lhe
causaram prazer.
Luisa arfou quando ele levou a boca
ao seu sutiã de renda, provocando, até
que o bico estivesse ereto.
Ela tremeu de excitação, puxando-o
para mais perto, impressionada por sua
súbita necessidade de abraçá-lo e
confortá-lo. Este homem grande que
não precisava de ninguém.
Raul levantou a cabeça e encontrou
seus olhos.
Os dele
estavam
sombreados, entristecendo-a. Ele se
esforçava tanto para manter distância.
Nunca aprendera a compartilhar nada?
Ela era louca por pensar que eles
pudessem fazer o casamento dar certo?
No momento que Raul abaixou-a
sobre a cama e despiu ambos com uma
habilidade que falava de prática e
urgência, os pensamentos de Luisa
tinham quase se dispersado.
– Contracepção! – exclamou ela
quando estava abaixo dele. – Eu não
quero engravidar.
Ele arqueou as sobrancelhas.
– Nós estamos casados, Luisa. Ter
um filho ou uma filha é um resultado
natural.
Ela meneou a cabeça.
– Não. Eu não estou pronta. Tudo
aconteceu muito rapidamente.
Pelo que pareceu uma eternidade,
Raul olhou-a, como se a estivesse vendo
pela primeira vez. Finalmente, assentiu
e rolou para o lado, alcançando o
criado-mudo.
Quando retornou, ele não a cobriu
com seu corpo, imediatamente.
Para um homem que se casara por
necessidade, Raul tinha um jeito de
fazê-la se sentir o foco de seu mundo.
Como se nada existisse, exceto ela. A
concentração dele, a intensidade do
olhar, e o toque sedutor das mãos fortes
em seu corpo eram excitantes.
O olhar de Raul suavizou-se com
cada carícia, e Luisa sentiu alguma coisa
se mover em seu interior. Ela se
arqueou no toque, o coração disparado.
Ele sussurrou no seu ouvido, a
respiração como uma carícia em seu
lóbulo:
– Atinja o clímax para mim, Luisa.
Entregue-se às sensações.
Arfando, ela se focou nele, sentindo
a intensa conexão entre os dois. O rosto
de Raul estava sério, tenso em
concentração.
Do nada, o orgasmo veio, sacudindo
o corpo de Luisa e roubando-lhe o
fôlego. O calor inundou-a quando ele
abaixou a cabeça para tomar sua boca
num beijo longo que, de alguma
maneira, intensificou os espasmos do
prazer.
Sem forças, ela afundou na cama.
Agora,
ele
viria
para
ela.
Sonhadoramente, Luisa sorriu, seus
músculos internos pulsando, prontos.
Apesar de sua exaustão, era Raul que
ela queria.
Ele se moveu, mas não como ela
esperava. Chocada, ela o viu se
abaixando, roçando o rosto no interior
de suas coxas.
– Não! Eu quero...
O beijo de Raul silenciou-a. Ela não
deveria querer mais, depois do êxtase
que ainda ecoava através de seu corpo,
mas as carícias da língua, dos lábios de
Raul,
despertavam
seu
desejo,
novamente.
Aquilo era apenas o começo.
Atordoada, Luisa entregou-se às
sensações, até tudo que conhecia era
Raul e o prazer que ele dava ao seu
corpo ansioso. O gosto dele estava em
sua língua, o aroma, em suas narinas,
enquanto ela se sintonizava com os
toques e com o som da voz profunda.
Cegamente, virou-se para ele,
quando Raul finalmente tomou-a. Luisa
respirou fundo, aceitando o corpo
poderoso dentro do seu, enquanto
parecia absorver a essência dele em seus
poros.
Raul gritou, e o prazer inundou-a
diante do som de seu nome naquela
voz rouca. Instintivamente,
abraçou de maneira protetora.
ela
o
RAUL ESTAVA completamente exausto,
apenas com força suficiente para
abraçar mais Luisa, o corpo dela sobre o
seu.
Disse a si mesmo que o momento
após o orgasmo era sempre intenso, mas
sabia que mentia. Desde a primeira vez
que dormira com sua esposa, soubera
que sexo era diferente.
Por quê?, perguntou-se.
Porque ela não obedecia aos seus
desejos, docemente? Porque, apesar de
concordar com o casamento, Luisa
ainda era independente, não como as
mulheres que davam o que ele quisesse,
por causa do que Raul poderia lhes
proporcionar em retorno?
Com Luisa, ele tinha a sensação de
que segurava um presente precioso nos
braços.
Ela era muito mais do que um corpo
quente para saciar sua luxúria.
Este era um território desconhecido.
Ou, se fosse honesto consigo mesmo,
um pouco como os sentimentos que
descobrira em sua juventude, quando
acreditara em amor. O pensamento
deveria apavorá-lo. Não acreditava mais
em tais coisas.
Era por isso que seduzira sua esposa
assim que eles tinham voltado da
cerimônia civil. Não somente porque a
queria, mas também a fim de parar de
questionar o que ela o fazia sentir.
E a fim de parar as perguntas de
Luisa. Raul acariciou os cabelos sedosos.
Era possível que tivesse usado sexo para
evitar falar sobre seu passado? Mesmo
sobre algo tão simples como sua
infância?
Ele era realmente tão covarde?
Sua vida era um livro aberto. Tinha
sido dissecada pela mídia durante anos.
Todavia, o desconforto que ele sentira
respondendo as perguntas de Luisa o
surpreendera.
Assim como sua estranha vontade de
se abrir com ela o surpreendera.
Talvez experimentasse essa vontade
por achar que devia a Luisa, por ela ter
concordado com o casamento?
Qualquer que fosse a razão, quando
ela se moveu para se afastar, ele
deslizou a mão ao redor da cintura
delgada e pigarreou.
– Meu pai só estava interessado em
mim como herdeiro ao trono.
– Isso é horrível. – Ela murmurou as
palavras contra seu peito, sem olhar
para cima. De alguma maneira, aquilo
facilitou.
– Eu fui criado por empregados.
Sempre foi assim na família real. Ele
aparecia apenas para me lembrar que
eu tinha de me sobressair em tudo, e
estar pronto para usar a coroa, um dia.
– E você se pergunta por que eu não
estou pronta para ter filhos!
O choque o abalou. Ele falara
vagamente sobre a possibilidade de
gravidez, mas não absorvera a
realidade. Luisa, grávida com um bebê
seu...
– Nenhum filho nosso seria criado
dessa forma – declarou ele com firmeza.
– Verdade?
Raul assentiu. Ele passara anos
aderindo à tradição, enquanto lutava
para estabilizar a monarquia e a nação,
trabalhando por trás dos bastidores,
enquanto o foco de seu pai estava em
agradar sua jovem esposa caprichosa.
Tinha sido Raul quem tentara reparar
os danos depois do fiasco com Ana.
Mas algumas tradições precisavam
mudar.
– Você tem a minha palavra.
Talvez, ele não fosse um sucesso
como pai. Certamente, seu modelo de
amor paternal tinha sido distante e frio.
Pensou em Peter, o menino com seu
cachorro. Pelo menos, Raul sabia o que
não fazer. E Luisa compensaria por suas
falhas. Ela nascera para ser mãe.
Ele sorriu, satisfeito diante da
perspectiva.
– Conte-me... – Ela hesitou.
– Sim?
– Ontem, na recepção. Por que todos
olhavam para você e sua madrasta
como se esperassem uma cena?
Raul suspirou, a satisfação se
dissipando num instante. Mas Luisa
tinha o direito de saber. Como ela
apontara, era sua esposa. Melhor saber
dos fatos por ele do que através de
fofocas.
– Porque eles sabem que eu não
gosto dela.
– Por que não?
– Ela fingiu se casar com meu pai por
amor. Ele era orgulhoso e arrogante, e
nunca se apaixonara antes, mas não
merecia o que teve. – Raul não gostara
de ver seu pai sofrendo, definhando-se
numa sombra do homem que tinha
sido.
– Ele foi dispensado por uma
caçadora de fortunas com a metade de
sua idade, que queria riqueza e
prestígio. Ela passava a maior parte do
tempo com outros homens. Os últimos
anos de meu pai foram infernais.
Mesmo em sua raiva, Raul sentiu um
peso saindo de seus ombros. Guardara
suas opiniões para si mesmo por tanto
tempo, sabendo que uma palavra
descuidada inflamaria as fofocas e
especulações que ele tentara tão
arduamente conter. A verdade do
casamento de seu pai tinha sido
adivinhada por muitos, porém nunca
provada.
Ele trabalhara incansavelmente para
proteger a reputação de sua família,
ajudando seu pai, quando ele se tornou
menos capaz de controlar seu reinado.
Superando um desejo de expor Ana
pela bruxa que ela era. Seu país
precisava de fé na monarquia para
mantê-la segura.
– Há mais, não há? Mais que você
não está me contando?
Raul sentiu movimento, e baixou os
olhos para ver Luisa estudando-o.
Brevemente, ele hesitou. Então,
olhou para o teto e lhe contou:
– Eu conheci Ana quando tinha 20 e
poucos anos. Ela era da minha idade,
mas diferente de qualquer garota que
eu conhecia. Não era aristocrata. Não
sorria com afetação, não falava de
política e não se importava com fofocas.
Os lábios dele se torceram perante a
memória.
– Ela era um sopro de ar fresco.
Vibrante, extrovertida, engraçada. Não
tinha medo de embaraçar os cabelos
andando num conversível, ou de
apreciar um piquenique ao ar livre, em
vez de jantar num restaurante chique. –
Ou pelo menos, assim parecera.
– Eu me apaixonei. – Raul parou,
respirando fundo. Era a primeira vez
que admitia aquilo.
– Oh, Raul! – A tensão na voz e no
corpo de Luisa era óbvia. A história não
era bonita. De repente, ele queria
contar o mais rapidamente possível.
– Eu estava errado sobre Ana. Ela
parecia inocente e descomplicada, mas
não era realmente assim. Eu não fui o
único enganado. Apresentei-a ao meu
pai, e ele se apaixonou por ela com toda
a força de um velho tolo por uma
mulher jovem, linda e muito
inteligente.
Raul lembrava-se daquela época
vividamente. Ana o rejeitara quando
tinha o pai dele aos seus pés. Afinal de
contas, por que ter um príncipe,
quando um rei estava disponível, com
uma riqueza imensa à sua disposição?
– Meu pai casou-se com ela, quatro
meses depois.
Raul havia pensado que seu mundo
acabara. Ele se refugiara em dever,
mergulhando em qualquer coisa que
aliviasse a dor da traição. Tinha se
tornado hábito direcionar toda sua
paixão, todas suas energias para as
obrigações da realeza.
Aquilo funcionara. Durante anos, ele
renunciara à necessidade de elos
emocionais.
– Raul, eu sinto muito. Isso deve ter
sido devastador.
Luisa não imaginava o quanto. Mas o
sofrimento o tornara mais forte. Ele era
autossuficiente, e grato por isso.
Então, por que se sentia desnudado
de um jeito que não tinha nada a ver
com a falta de roupas?
– Você ainda... gosta dela?
Raul olhou-a.
– Gosto? – Ele quase cuspiu a
palavra. – Da mulher que me enganou
e instigou meu próprio pai a me trair?
Da mulher que riu de mim? Ela quase
destruiu a monarquia com seu
comportamento escandaloso. Destruiu
o orgulho e honra de meu pai, com seus
casos.
Raul balançou a cabeça.
– Eu aprendi uma lição valiosa com
Ana. Jamais confiar. Nunca ser
ingênuo, novamente. O amor é uma
armadilha para os descuidados.
Ocorreu-lhe que o que o atraíra em
Ana todos aqueles anos atrás era o que
o atraía em Luisa. A inocência dela
num mundo de maquinações políticas.
Seu jeito direto e honesto. Sua beleza.
Exceto que em Luisa, aquilo era real.
Em Ana, tinha sido falso, designado a
armar uma cilada.
Ana havia ido ao seu apartamento
uma manhã, poucos meses depois do
casamento, com a audácia de esperar
que Raul a satisfizesse no departamento
que seu pai não fora capaz de satisfazêla.
O desgosto o preencheu. Raul levara
muito tempo para banir a mancha
daquela memória, embora ele a tivesse
rejeitado, evitando-a sempre que podia.
No final, Ana lhe fizera um favor. Ele
nunca mais cairia na fantasia do amor.
A CABEÇA de Luisa girava com a
verdade chocante. A luz dura nos olhos
de Raul, quando ele falara da madrasta,
a fez tremer.
Ou isso era por causa da revelação de
que ele, um dia, amara Ana?
Ele ainda a amava? Apesar da
negação veemente de Raul, era
evidente que Ana ainda evocava
emoções fortes nele.
A náusea a envolveu. Raul a tomara
com a compulsão de um homem
declarando sua posse.
Ou um homem querendo apagar o
passado.
Ele realmente a quisera? Ou a paixão
voraz tinha sido pela mulher que o
rejeitara? Luisa era uma substituta?
Ela mordeu o lábio.
Raul dissera que não acreditava em
amor.
Já
se
apaixonara
tão
perdidamente por Ana que não podia
escapar de seus sentimentos?
E se não fosse isso, por que a ideia de
Raul, privado de amor quando criança,
e agora rejeitando amor enquanto
adulto, enchia Luisa de tristeza?
CAPÍTULO 11
LUISA
ESPIAVA,
através de olhos
estreitos, enquanto Raul se vestia.
Exausta, ela adormecera, apesar dos
pensamentos perturbadores que as
revelações tinham produzido.
Horas atrás, eles haviam alcançado o
paraíso, e ela sentira como se tivesse
encontrado a outra metade de sua alma
nos braços dele, especialmente quando
Raul começara a se abrir um pouco
sobre sua vida.
Mas as últimas revelações sobre Ana
tinham diminuído o prazer e lhe
causado dúvidas.
O que Raul sentia? Ela algum dia
saberia?
Ela suspirou. O melhor que podia
fazer por si mesma, e pelo homem que
temia estar gostando demais, era ser
sensata... viver um dia de cada vez e
tentar construir um casamento que
desse certo.
Nunca poderia haver amor entre
eles.
Raul fechara essa possibilidade. A
amargura que ele sentira em relação à
esposa do pai o abalara tanto que ele
admitira que nunca mais confiaria
numa mulher, ou amaria.
Quem poderia culpá-lo, depois da
traição devastadora que ele sofrera?
Não era de admirar que ele se
fechara atrás do dever e do excesso de
trabalho. E que preferisse casar-se sem
emoção.
Era possível que ele algum dia
aprendesse a confiar? A amar?
– Está acordada? – Olhos escuros a
fitaram e alguma coisa se derreteu
dentro de Luisa.
– Você precisa ir? – De onde tinha
vindo aquilo? Ela soava tão carente.
– Eu pretendia ficar aqui. – Um calor
brilhou nos olhos verdes quando ele
observou o formato dela sob o lençol. E
subitamente, Luisa sentiu aquela
familiar onda de desejo ganhar vida.
Tolice
ficar feliz porque
ele,
obviamente, não queria ir embora. Isso
apenas significava que seu marido era
viril, com apetite para sexo.
Um apetite muito saudável.
– Houve um telefonema. – Ele se
virou para pegar o paletó. – Negócios
urgentes.
Luisa quase perguntou que negócios
eram tão importantes para interromper
uma lua de mel, quando lembrou que
eles não estavam compartilhando uma.
Eles não tinham esse tipo de
casamento. A união deles era de
conveniência.
Ela se virou, lutando contra tristeza.
– Sinto muito, Luisa. – Ele a
assustou, falando do lado da cama. –
Esse é um assunto que eu não posso
ignorar. Tem a ver com a inquietação
que mencionei. Eu sou necessário.
Ela assentiu. Ele tinha um país para
governar. Essa sempre seria a prioridade
de Raul. Somente agora, Luisa
começava a entender como isso era
importante para ele. Durante as crises
pessoais, as responsabilidades da
realeza,
pelo
menos,
tinham
permanecido constantes. Elas haviam
oferecido consolo quando ele mais
precisara?
– Você tem uma agenda apertada –
murmurou ela para preencher o
silêncio.
– Você se acostuma. Eu fui
preparado para trabalhar desde que
tinha 4 anos.
O lembrete enviou um tremor pela
coluna de Luisa. Raul dissera que os
filhos deles seriam criados de modo
diferente, e ela lutaria com unhas e
dentes para que nenhum filho seu fosse
“moldado” daquela forma cruel. Ela
precisava defender-se e defender sua
família, se tivesse uma.
Luisa sentou-se contra a cabeceira,
puxando o lençol sobre os seios, e
tentando ignorar o brilho de interesse
nos olhos de Raul.
– Eu vou levantar, também. Tenho
planos para esta tarde.
– Planos? Não há compromissos
agendados.
– Eu quero encontrar Gregor e os
outros jardineiros. Você não faz objeção
que o jardim ornamental e alguns
outros espaços sejam renovados, faz? –
Foi uma decisão tomada naquele
momento, mas ela se recusava a passar
a tarde ali, pensando sobre o estado de
seu casamento.
– Não, é claro que não. A renovação
é uma boa ideia. Mas eu posso designar
alguém do meu staff para supervisionar
isso. O projeto precisará de consulta,
não apenas com os jardineiros, mas com
os historiadores do castelo, assim como
com o staff da cozinha e de eventos.
– Essa será uma boa maneira de
conhecê-los. – Luisa precisava de
alguma atividade na qual se focar, além
de Raul. Não queria pensar nas
emoções que ele inspirava, por medo do
que descobriria.
– Você não precisa trabalhar, Luisa.
Ela arqueou as sobrancelhas.
– Espera que não faça nada,
enquanto você trabalha no dia seguinte
ao nosso casamento?
– Lamento por isso. Eu preferiria
ficar.
– Eu preciso de alguma coisa para
fazer.
De
um
propósito.
Eu
enlouqueceria
sem
isso.
Estou
acostumada a trabalhar.
Raul levantou a mão para a gravata já
perfeitamente amarrada, e pareceu
desconfortável.
– Suas aulas não mantém você
ocupada?
– Não é o suficiente. – Ela nunca fora
boa em aulas formais. Suas habilidades
no idioma estavam melhorando, mas se
ela tivesse de aprender sobre mais um
monarca de Maritz, ou sobre a maneira
correta de cumprimentar um duque,
gritaria.
Ademais,
as
aulas
intensivas
evocavam memórias sobre a época que
ela estivera em Ardissia. A disciplina
rígida e os rostos críticos não estavam
lá, mas ela não podia livrar-se da
sensação de que jamais correspondia às
expectativas.
Raul
estudou-a,
a
expressão
inescrutável.
– Logo, você estará ocupada com os
deveres oficiais. Como minha consorte,
será requerida em muitos eventos.
– Ser vista em inaugurações e festas?
– Luisa meneou a cabeça. – Esta não
sou eu. – Usando aquelas roupas de
alta-costura, ela se sentiria uma fraude.
Não ela mesma.
Não ajudava lembrar que Raul a
comprara, assim como comprara lindas
roupas para ela.
– Eu começarei esta tarde. – Ela lhe
encontrou o olhar, quase o desafiando a
protestar.
Quando ele meramente assentiu,
Luisa respirou fundo.
Se ela ia recomeçar, havia mais uma
coisa que precisaria enfrentar.
– Eu estou planejando visitar
Ardissia, também. – Era hora de
enterrar o fantasma de seu avô. Talvez,
indo lá, confrontando o lugar que
significara tanto para ele, e que
continha memórias tão horríveis para
ela, ajudasse Luisa a enterrar seu ódio.
Ele franziu o cenho.
– Minha agenda está muito cheia no
momento.
Ela ergueu o queixo.
– Eu preciso esperar por você? Não
sou a princesa de Ardissia? É hora de
eu assumir minhas responsabilidades.
Raul aproximou-se da cama.
– O lógico é irmos juntos. As pessoas
esperarão isso.
– Mas você está ocupado todos os
dias. Acabou de dizer que não está
livre. – Após as grandes mudanças em
sua vida, Luisa também queria tempo
sozinha para se reorganizar. Estava
numa montanha-russa de emoções nas
últimas semanas.
– Há questões de protocolo e planos
a serem feitos. Membros da realeza não
aparecem simplesmente para visitar um
lugar ou alguém.
Por que ele estava contra sua ida?
– Não é perigoso, é?
Ele meneou a cabeça.
– Ardissia é segura.
– Ótimo. Tenho certeza que serei
bem-vinda. Eu avisarei que estou indo.
Em dois dias. Isso é suficiente? –
Quando ele ainda hesitou, Luisa
acrescentou: – Certamente, isso é a
coisa certa a fazer? É educado visitar,
agora que eu aceitei a minha herança.
As sobrancelhas baixas de Raul
disseram-lhe que ele não via aquilo
dessa maneira. Mas então ele
murmurou:
– O momento não é ideal, mas você
está certa. Uma visita faz sentido. Deixe
isso comigo.
Por que Luisa sentiu como se tivesse
perdido a discussão, quando ele
assentiu, virou-se e saiu do quarto, a
mente obviamente ocupada com
assuntos de trabalho?
Ela não esperara que ele a beijasse,
esperara?
– POR AQUI, Vossa Alteza. – O
camareiro conduziu Luisa para dentro
do estúdio de seu avô. Ela deixara isso
por último em seu tour pelo palácio real
de Ardissia.
Imaginou o velho homem ali,
sentado em sua enorme mesa, ornada
com ouro. Lembrava-se dele em sua
posição de príncipe, e da sua como a da
neta pobre e insatisfatória.
– Obrigada – falou ela para o
camareiro, sorrindo, apesar da rigidez
do homem. – Isto é tudo.
Quando ele se retirou, Luisa estudou
os retratos alinhados nas paredes.
Ancestrais com expressões distantes e
prepotentes. Ela olhou para o retrato do
homem que desonrara filha e neta,
quando elas não se dobraram diante do
seu domínio.
– Quem diria, avô? A filha do
fazendeiro é princesa, e logo será
rainha.
Contudo, não havia prazer no triunfo
vazio. Ela não fora lá para tripudiar,
mas para tentar deixar o passado para
trás e seguir em frente.
Cruzou os braços, suprimindo um
tremor. Apesar de sua determinação de
aceitar sua herança, de representar o
papel e seguir o protocolo, Luisa não
conseguia imaginar o futuro.
O que este lhe reservava?
Anos infinitos de recepções públicas
e conversas superficiais? Momentos de
deleite quando fizesse sexo com Raul?
Ela se agarraria a esses momentos,
desesperada pelo pouco que Raul podia
lhe dar, quando queria muito mais?
Sua vida seria estéril de amigos e
família?
Se ela tivesse filhos, como poderia
protegê-los do mundo que produzira
um monstro como seu avô? E Raul se
tornara um homem tão reservado
emocionalmente que Luisa tinha
dúvidas se algum dia construiria um
relacionamento com ele.
Um movimento lhe chamou a
atenção. Um grupo de jovens estava
atravessando o pátio. Num impulso,
Luisa abriu a janela. Risadas alegres
cortaram o ar, antes que elas entrassem
por uma porta nos fundos do pátio.
Qualquer que fosse o lugar para onde
elas estavam indo, parecia mais atraente
do que este estúdio frio. Ela fechou a
janela e dirigiu-se para a porta.
RAUL LEVANTOU a mão para as pessoas
alinhando a rua, enquanto a limusine
seguia para o palácio de Ardissia.
Estava ansioso por um intervalo,
depois daquela semana intensa.
Planejara
ir
dias
atrás,
mas
desenvolvimentos políticos tinham
impossibilitado isso. Agora, poderia dar
prazer a si mesmo.
Sentia prazer em ver sua esposa.
Ela estava fora há cinco dias. Sua
cama parecia tão vazia. Seus dias eram
organizados e previsíveis, apesar das
crises políticas que eles evitavam.
A vida parecia... menos, sem Luisa.
Ele se lembrou do dia que ela
anunciara que ia para Ardissia. Luisa
ficara sentada lá, a boca doce numa
linha determinada, exigindo ocupação.
Exigindo mais.
Claramente, ele não era o bastante
para satisfazê-la!
O orgulho masculino o feriu diante
do fato de que ela ficara inabalada pelo
que acontecera entre os dois, enquanto
ele saíra completamente do equilíbrio.
Estivera na ponta de sua língua suplicar
que ela não partisse.
Porque precisava de Luisa. Não só
sexualmente.
Nunca se sentira assim em relação a
uma mulher. Nem mesmo Ana, no
auge de sua atração, invadira seus
pensamentos dessa forma.
Raul suspirou. De noite, pegava-se
tentando tocar Luisa.
Sentia-se
desolado quando ela não estava lá.
Pior, era sua sensação de culpa,
pensou ele quando a limusine parou na
frente do palácio ancestral. Porque
aquela não era a vida que ela escolhera.
Era a vida que ele demandara, de
modo que pudesse herdar.
Sim, Maritz necessitava de um
monarca
forte
para
superar
dificuldades, e, com o apoio de um
governo democrático, evitar uma guerra
civil.
Mas também não era verdade que ele
necessitara ser rei? A monarquia havia
sido sua salvação, assim como seu
fardo, enquanto ele lutava para tirar seu
país do buraco que o casamento de seu
pai o colocara.
E por isso, Raul intimidara Luisa a
entrar no seu mundo.
Quisera acreditar que ela encontraria
uma vida satisfatória ao seu lado. Nas
últimas semanas, ele entendera que ela
poderia ser uma boa esposa, e fazer
uma enorme diferença para seu povo,
mesmo que seu jeito não fosse
tradicional.
Luisa poderia ser feliz lá?
Se ele pensara que ela estaria
esperando junto à grande escadaria
para cumprimentá-lo, enganara-se.
Quem o recebeu foi Lukas, que Raul
enviara para lá, a fim de que ele
apoiasse Luisa.
– Vossa Alteza, bem-vindo. E
parabéns pelos resultados de suas
recentes negociações.
Raul sorriu.
– Obrigado, Lukas. Espero que isso
signifique paz, novamente. – Ele olhou
ao redor, mas não viu sinal de Luisa.
– Sua Alteza planejava estar aqui. Ela
está atrasada, mas não deve demorar. –
Enquanto falava, ele se virou, andando
com Raul para dentro do palácio.
Era tão grandioso e sombrio quanto
Raul recordava.
Ele tremeu com o pensamento de
Luisa lá, uma adolescente inocente, à
mercê do velho malvado que a tratara
de modo tão horrível.
– Perdão?
– Eu disse que o camareiro requisitou
uma audiência.
Raul parou.
– Certamente, o assunto dele é com
minha esposa. Esta é a propriedade
dela.
Uma olhada para Lukas informou
Raul de que havia problema à frente.
Ele suspirou. Dias sem dormir estavam
causando efeito. Tudo que ele queria
era sua esposa e uma cama, nesta
ordem.
– RAUL! – LUISA parou à porta de sua
suíte. Planejara voltar mais cedo.
Arrumar-se, para cumprimentá-lo com
cortesia calma.
Uma olhada para ele, e sua
respiração já estava ofegante, seu
coração batendo freneticamente.
Ela estivera tão ocupada nos últimos
dias. Era ridículo que sentisse saudade
de Raul, mas sentia. Mais do que
esperara.
Se as coisas fossem diferentes, ela
correria para os braços dele e o beijaria.
Mas o semblante de seu marido era
sério, desaprovador.
– Luisa. – Ele inclinou a cabeça, mas
não se aproximou. – Como vai você?
– Bem, obrigada. – Ela endireitou a
gola do casaco que vestira às pressas. –
Como foi sua viagem?
– Excelente. – A tensão vibrava no ar.
– Todavia, assim que eu cheguei, seu
camareiro veio a mim.
Luisa franziu o cenho. Agora,
entendia a desaprovação de Raul. Sem
dúvida, o oficial fizera uma série de
reclamações. O homem tinha sido
negativo desde que ela chegara.
– Entendo. – Luisa respirou fundo.
Supunha que violara todo tipo de
regras. Mas recusava-se a ser
intimidada. Queria tomar suas próprias
decisões.
Ela fechou a porta e adentrou mais o
quarto. Gesticulou para uma poltrona.
Raul ignorou-a.
– Ele vociferou um número de
preocupações.
– Tenho certeza que sim. Com o que
ele começou? A proposta de abrir os
cômodos de recepção da propriedade
para eventos públicos?
– Não – replicou Raul. – Foi o seu
plano de transformar os apartamentos
privados do príncipe num museu.
Luisa ergueu o queixo.
– Eu nunca irei usá-los, então por
que não colocá-los em uso? – Ela
gesticulou a mão para englobar seu
quarto moderno, com sua vista para os
Alpes. – Isto é mais adequado para
quando eu visitar. Toda aquela
decoração pomposa no andar de baixo é
demais para mim.
– Para nós. – Raul aproximou-se.
– Perdão?
– Nós viremos juntos para cá, no
futuro.
O quê? Ele agora não confiava nela
para ir lá sozinha?
– A que mais ele protestou?
– Ele tinha uma lista. Está
preocupado sobre os planos de um
playground para a comunidade no
anexo leste.
A boca de Luisa comprimiu-se.
– O terreno é perfeito, e facilmente
acessível da praça principal. Talvez você
não saiba, mas não há provisões para
grupos comunitários nesta parte da
cidade.
Parecia que seu avô tinha frustrado
planos locais para apoiar a comunidade,
especialmente os jovens. A mentalidade
dele estivera enraizada no passado.
– E a escola de culinária?
Ela pôs as mãos nos quadris.
– Eu encontrei estudantes visitando
as velhas cozinhas. Os cômodos foram
danificados quando a fiação velha
causou um incêndio. O chef do palácio
ofereceu uso temporário das cozinhas. É
uma
combinação
perfeita.
As
instalações estão aqui, assim como a
especialidade. Não é como se fosse
haver muitos banquetes, uma vez que
eu não estou aqui, permanentemente.
– E o mesmo para os mecânicos?
Ela o olhou.
– Como você sabe sobre isso? – Luisa
acabara de voltar de uma reunião de
professores, no que tinham sido
estábulos, mas agora hospedava uma
oficina mecânica.
Raul aproximou-se mais um passo, e
deu-lhe um olhar que fez o corpo
inteiro de Luisa esquentar.
Ele levou a mão ao rosto dela. Luisa
tremeu em excitação.
– Foi um palpite. – Ele levantou a
mão para que ela visse uma mancha
escura. – Óleo de motor?
Ele estava tão perto que o calor do
corpo poderoso invadia seu espaço.
– Nós estávamos checando as
instalações, e eu fiquei um pouco...
envolvida.
Raul estreitou os olhos.
– Como você ficou envolvida ao ver
aquela vaca?
Luisa fechou as mãos. A imprensa
tivera um dia cheio com aquilo, e desde
então, ela vinha evitando ler jornais.
Um jornal em particular gostava de
retratá-la
como
voluntariosa
e
desrespeitosa, embora a maioria das
pessoas parecesse positiva.
O animal em questão era lindo, com
guirlandas de flores em volta do
pescoço e dos chifres, e um imenso sino
alpino.
– Aquilo era parte das boas-vindas
oficiais à Ardissia. Lukas explicou que
era um sinal de grande respeito da
população rural. Eu não podia recusar!
– Mas você precisava tirar leite da
vaca? – O maxilar de Raul estava tenso.
Ela deu de ombros.
– Certo, então não era um protocolo
apropriado. Sei que princesas reais não
sonhariam com isso. Mas nós estávamos
falando sobre gado leiteiro, e
subitamente eles me ofereceram um
banco e um balde... – Ela jogou as mãos
no ar. – Você insistiu neste casamento.
Não reclame agora, porque eu não sou
ortodoxa. Estou tentando. E – Luisa pôs
um dedo na camisa impecável dele –,
apesar de estar aberta para ouvir
sugestões para o palácio, a decisão final
é minha. De mais ninguém!
– Exatamente o que eu falei para seu
camareiro.
– Perdão? – Luisa estava tão confusa
que mal notou que Raul fechara a mão
sobre seu dedo cutucando-o.
– Eu disse a ele para guardar os
pensamentos para si mesmo, até que
tivesse a chance de compartilhá-los com
você.
Luisa estava atônita.
– Você não se importa?
– Eu me importo muito em ser
abordado por um oficial que critica sua
empregadora pelas costas dela. E estou
furioso. – Raul pausou. – Furioso
porque não tive o direito de demitir o
encrenqueiro na hora. Ele é seu
empregado, contudo, está mais
preocupado com o próprio prestígio do
que com o emprego!
– Raul? – Ele tinha usado o outro
braço para puxá-la para mais perto, e
ela inalou o aroma másculo inebriante.
– A decisão é sua, Luisa. Mas precisa
considerar encontrar alguém melhor.
Alguém que possa trabalhar com você
nos seus planos, em vez de frustrá-los.
– Você não se importa com o que eu
tenho feito? – Luisa tivera tanta certeza
da desaprovação de Raul que não
conseguia acreditar no que estava
ouvindo.
– Por que eu me importaria? – Ele
lhe alisou as costas em movimentos
circulares, relaxando-a. – É bom vê-la
se envolvendo e ouvindo seu povo.
Estou orgulhoso do que você conseguiu
em tão pouco tempo. Mas é sensata o
bastante para aceitar conselho, e não
tomar atitudes precipitadas sem a
devida consideração.
Ela piscou, fitando os olhos verdes
que brilhavam calorosamente.
Uma onda de calor, que não tinha
nada a ver com a proximidade de Raul,
envolveu-a. Um calor interno, que
vinha do conhecimento de que ele a
defendera para seu camareiro.
Que ele estava pronto para apoiá-la.
Que parecia importar-se.
Luisa colocou outra mão trêmula no
peito dele, abrindo os dedos para sentir
as batidas do coração ali. O braço de
Raul se apertou mais ao seu redor.
– Mas o que eu mais quero saber,
esposa, é o que o prefeito disse quando
você o presenteou com um balde de
leite morno.
Ela lhe estudou a fisionomia séria, e
percebeu que Raul estava tentando não
rir.
– Ele ficou muito impressionado, e
falou que eu tinha talentos escondidos.
– Luisa sorriu. – Então ele me mostrou
uma velha técnica que ajuda a agarrar
melhor a teta da vaca.
Raul inclinou a cabeça para trás e
deu uma gargalhada contagiante, que
fez os lábios de Luisa se curvarem num
sorriso, e seu coração dançar.
Uma sensação deliciosa a preencheu.
Felicidade.
CAPÍTULO 12
AQUELA
continuou. Era
como uma brasa brilhante, aquecendoa por dentro e destruindo o frio que a
envolvera por tanto tempo.
A cada semana, Luisa sentia-se mais
contente. Passou a gostar de seu novo
lar e do povo que vivia lá. A nação de
Maritz, e até o pequeno principado de
Ardissia estavam parecendo mais e mais
seu lar. Ela poderia ser feliz ali. Então
FELICIDADE
havia Raul. Ele podia ser gentil e
carinhoso, mas existia sempre uma
paixão explosiva entre eles que a
deixava sem fôlego. A intimidade física
deles era fora deste mundo, e, naqueles
momentos, ela sempre achava que
chegava mais perto do homem
verdadeiro por trás da fachada.
O homem que ela queria conhecer
melhor.
Raul era um solitário. Nada
surpreendente, considerando a infância
que ele tivera, criado por um staff, em
vez de por pais amorosos. Então, havia
a traição do pai com a mulher por quem
Raul se apaixonara.
Ele passara tanto tempo privado de
elos emocionais; os momentos quando
baixava a guarda com ela eram tão
especiais, tão preciosos.
Cada vez mais, Raul compartilhava
seu senso de humor, surpreendendo-a
e fazendo-a rir. A última coisa que ela
esperara do homem com quem se
casara para reivindicar a coroa.
Mas enquanto Luisa observava-o
trabalhar incansavelmente pelo país, e
via o povo responder a ele, soube que
Raul era o homem certo para o
trabalho.
Também sabia que Raul não era o
vilão insensível que ela o pintara uma
vez. Era apenas um homem ferido que
escondia sua vulnerabilidade atrás de
uma fachada.
Luisa sentia-se melancólica. Porque,
apesar de ele a apoiar, mesmo quando
ela não era ortodoxa com os deveres da
realeza, ela não podia esquecer que,
para Raul, ela era uma esposa
indesejada.
A esposa que ele precisava ter.
Com peito comprimido, Luisa olhou
cegamente para o jornal à sua frente,
sobre a mesa.
Aquilo doía porque ela fizera o
impensável.
Apaixonara-se.
Apesar da dor, a felicidade a
inundava. O amor era uma emoção
maravilhosa, que a fazia superar seus
medos.
Tinha de haver um jeito de fazer seu
casamento dar certo. Talvez um dia ele
pudesse amá-la, como ela o amava?
– Sentada sozinha, Luisa? – A voz de
Raul a fez virar-se.
Seu coração disparou. Ela ansiava por
se atirar nos braços dele. Declarar seus
sentimentos e exigir que ele a amasse,
também.
Se fosse tão simples.
– Minha aula de língua estrangeira
acabou, e eu estava tentando ler o
jornal. – Ela olhou para baixo,
escolhendo um arquivo qualquer. – Há
uma foto sua, mas as palavras são tão
difíceis.
Ele parou atrás dela.
– É um relatório judicial. Por que não
tenta algo mais simples? – A respiração
dele soprou no seu ouvido quando ele
se inclinou para ver o jornal.
Luisa fechou os olhos, querendo que
ele esquecesse o jornal e a abraçasse.
– Luisa?
Ela abriu os olhos.
– Sobre o que é o artigo?
– Sobre o tribunal de pessoas
estocando armas ilegalmente. Por que
nós não...
– Mas por que você foi uma
testemunha? – Ela finalmente entendeu
a legenda.
– Não é uma história emocionante.
Luisa franziu o cenho, agora se
concentrando no artigo.
– Fala alguma coisa sobre um assalto
armado. E uma trama. Um golpe. – Ela
apontou para o próximo parágrafo. –
Que palavra é esta?
Um suspiro moveu seus cabelos. Ele
hesitou por tanto tempo que ela pensou
que ele não responderia.
– Assassinato.
Luisa virou-se, arregalando os olhos
chocados.
– Quem eles queriam assassinar? – O
gelo percorreu seu corpo, enquanto ela
lia resignação na fisionomia de Raul.
– O gabinete. Quantos oficiais do
governo eles conseguissem. – Ele
endireitou o corpo e distanciou-se.
Luisa se levantou sobre pernas
trêmulas.
– E o príncipe? – As palavras não
passaram de um sussurro. – Eles
queriam matar você?
Para seu horror, Raul não negou
aquilo, apenas deu de ombros.
– Não se preocupe, Luisa, isso
aconteceu semanas atrás, quando você
foi para Ardissia.
Sentindo-se gelada, ela envolveu os
braços ao redor de si mesma.
– Você não me contou.
Ele se aproximou e esfregou-lhe os
braços rígidos.
– Você não tem o que temer,
honestamente. Está tudo acabado.
– Acha que eu estou preocupada por
mim?
Um brilho de choque surgiu nos
olhos verdes. Então Raul puxou-a para
mais perto. Sob sua orelha, Luisa ouviu
as batidas fortes do coração dele.
Deslizou as mãos por baixo do paletó,
sentindo o calor do torso musculoso.
Ele estava tão vivo. Tão vibrante. Se
alguma coisa acontecesse a ele...
Esse era o lado ruim do amor. Amava
tanto Raul que o pensamento de perdêlo era insuportável.
– Ouça, Luisa, a ameaça acabou. Era
apenas um grupo de lunáticos. A polícia
os estava monitorando por um tempo,
então não houve perigo. Na verdade, o
esquema deles fez um favor a todos.
– Como? – Ela se afastou um pouco
para encontrar os olhos dele.
– Eu lhe disse que havia inquietude.
Isso piorou nos estágios finais do
reinado de meu pai. – Raul pausou.
– Havia limites do que eu poderia
realizar como príncipe. Nos últimos
anos, enquanto o casamento de meu
pai se deteriorava, ele se tornou...
errático. Deixou os companheiros
adquirirem muito poder, e não pensou
estrategicamente sobre o bem-estar da
nação. Coligações poderosas estavam
competindo por posição.
– Lukas disse que você trabalhava
para manter a paz.
– Ele disse? Em determinado estágio,
pareceu que os diversos grupos
conseguiriam dividir o país. A notícia
de que elementos instáveis viam isso
como uma oportunidade para um
massacre fez todos repensarem e
perceberem como nossa paz e
democracia são importantes. Isso os
trouxe de volta para a mesa de
negociações. – Ele lhe acariciou os
cabelos.
– Quando a coroação acontecer e o
parlamento
for
retomado,
nós
trabalharemos juntos.
– Mas e quanto...
Raul pôs um dedo nos lábios de
Luisa, calando-a.
– Não há motivo de preocupação. –
Ele se virou para o jornal. – Deixe-me
encontrar uma leitura mais fácil para
você.
A mente de Luisa girava. Raul
correra risco de vida. Ela assumira que
o discurso dele sobre proteger o país era
exagerado para cobrir um desejo de
herdar a coroa.
Seu
estômago
se
revolveu,
percebendo que ela poderia tê-lo
perdido.
Que
Raul
não
considerara
compartilhar a verdade com ela.
Mesmo agora, ele não queria que ela
soubesse.
E Luisa pensara que eles estavam
construindo um entendimento.
Raul podia apoiar suas tentativas de
tornar-se princesa. Podia levá-la ao
paraíso com seu corpo. Mas quanto a
compartilhar alguma coisa mais
significativa...
A angústia inundou-a. Mesmo se ele
não gostasse mais de Ana, a
desconfiança de Raul era tão enraizada
que Luisa via poucas chances de ele se
conectar com ela.
Luisa enganara-se, acreditando que
depois de um tempo juntos, ele
começaria a sentir alguma coisa por ela,
também.
Ele não quereria ouvir sua declaração
de amor.
Raul não queria compartilhar quem
era.
Como ele reagiria se ela lhe contasse
que suspeitava que ele compartilhara o
bastante de si mesmo para criar um
filho com ela?
CAPÍTULO 13
– POR AQUI, Vossa Alteza.
Raul seguia o projetista urbano ao
longo do terreno gasto, ouvindo-o
exaltar as virtudes do local que se
tornaria um jardim comunitário. Outro
dos projetos de Luisa.
Tinha sido necessária apenas a
menção de um terreno público não
utilizado, numa área desvantajosa, para
que Luisa achasse um uso para o
mesmo. O staff do castelo emprestou
habilidade para ajudar a comunidade a
construir um lugar para que as pessoas
se reunissem, brincassem e plantassem.
Mas foi Luisa, com a ajuda de Lukas,
que checara zonas de restrições,
negociara com o conselho e se reunira
com residentes.
Sua esposa possuía habilidades
extraordinárias de organização. Ele a
vira, com prazer, colocar tais
habilidades em uso em Ardissia, e ali na
capital.
Raul admirava o jeito prático de sua
esposa, o incentivo para melhorar
coisas.
Quem pensaria que uma garota de
fazenda seria tamanho sucesso? Ela era
um sopro de ar fresco, violando o
protocolo conservador com um sorriso,
entretanto sensível o bastante para ver
quando a tradição era necessária.
O povo a amava, encantados pelo
charme e jeito caloroso de Luisa, e o
romance de conto de fadas era uma
fonte de prazer depois de tempos
políticos difíceis.
Raul direcionou o projetista para um
grupo no centro do terreno. Luisa
estava lá, usando suas roupas chiques
casuais, que eram sua marca registrada.
Ele reprimiu um sorriso, vendo duas
garotas em trajes quase iguais ao de
Luisa.
Os vestidos sofisticados de Luisa
agora só eram vistos em eventos
formais. Em vez disso, ela criara sua
própria marca, a primeira realeza de
Maritz a usar roupas casuais para
encontrar pessoas. Mas em Luisa,
roupas casuais ficavam bem. Hoje, ela
usava jeans justo, botas de salto baixo e
um lenço vermelho e uma jaqueta
combinando sobre uma blusa branca.
Ela estava elegante em suas roupas
de estilo. E pálida, notou ele.
Raul estreitou os olhos. Pálida
demais, certamente?
No geral, ela era a garota dourada
com
seu
bronzeado,
que
complementava o sorriso contagioso,
enquanto conversava com qualquer tipo
de pessoa.
Agora, apesar de cercada por pessoas,
ela parecia um pouco distante. E o
sorriso que ela usava não era o mesmo
que ele estava acostumado.
Ninguém mais parecia perceber
alguma coisa errada.
Mas ele passara a conhecer sua
esposa.
A tensão o envolveu, enquanto Raul
recordava-se das mudanças recentes
nas quais preferira não pensar. Vezes
quando Luisa se tornava mais fria,
exceto nos picos da paixão.
Então ela era toda sua, exatamente
como ele a queria.
Diversas vezes, Raul percebera que
ela não queria mais compartilhar coisas
pessoais, como se tentasse esconder a
mulher em quem ele passara a pensar
como a Luisa verdadeira. Aberta,
honesta e exuberante.
Ou como se esta Luisa deixara de
existir.
Uma terrível sensação de déjà vu o
preencheu.
Ele reprimiu o pensamento. Luisa
não era Ana. Apenas a imaturidade de
Raul e a cegueira do suposto amor o
tinham convencido um dia que Ana era
o tipo de mulher em quem ele podia
confiar.
Todavia, Raul não podia evitar um
pressentimento.
– ESTÁ TUDO bem?
Luisa virou-se das pessoas acenando
em despedida. Raul se movera do
banco oposto da limusine para se sentar
ao seu lado. E erguera a divisória de
privacidade.
A excitação a percorreu, enrijecendo
seus mamilos. Seu corpo a traía. Ela não
conseguia resistir a Raul, mesmo
sabendo que o relacionamento deles era
unilateral.
Ultimamente
também,
quanto mais ela tentava distanciar-se,
mais ele parecia determinado a invadir
seu espaço.
Entretanto, não havia ardor nos
olhos verdes agora, apenas uma
expressão preocupada.
– É claro. Tudo está bem. – Luisa
forçou um sorriso, enquanto mentia.
Sentia-se à beira do desespero. Tinha
dado seu coração a um homem que não
podia corresponder seus sentimentos. E
agora, parecia possível que houvesse
uma criança.
Suas emoções oscilavam. Num
momento, ela estava radiante com a
ideia de estar carregando um bebê de
Raul. No instante seguinte, o medo a
assolava diante da ideia de criar um
filho numa família tão diferente
daquela que sonhara. Amor para Raul
era uma impossibilidade, enquanto para
Luisa era seu segredo. Que tipo de
mundo era este para criar uma criança?
Era quando esperava que a gravidez
fosse um alarme falso, e a culpa a
corroía, por não desejar um presente
tão precioso.
Não podia culpar Raul. Com o
passado dele, não era de admirar que
ele evitasse emoções profundas. Talvez,
Raul nem mesmo acreditasse em amor!
– Luisa?
– Sim? – Ela olhou por sobre o ombro
dele e acenou. – O que você achou do
local do jardim? Tem potencial, não
acha? E as pessoas da região estão
muito entusiasmadas. – Ótimo. Agora,
estava tagarelando.
– O local é excelente. – Ele pausou. –
Você parece... não tão exuberante como
geralmente.
O estômago de Luisa se revolveu.
– Eu não pensei que exuberância
numa princesa fosse uma coisa boa. –
Nervosa, ela pensou num tópico neutro.
– O projeto está indo bem, não acha?
– Muito bem. Você deveria estar
satisfeita.
– Eu estou. Os voluntários têm
trabalhado duro.
– Você também tem trabalhado
muito. Não está exagerando, está?
Luisa arfou. Ele adivinhara? Ela saía
da cama cada dia mais cedo, pelo que
suspeitava que fosse enjoo matinal. Não
queria que Raul a visse pálida e com
náuseas. Especialmente quando não
sabia como ele reagiria à novidade.
Uma coisa era ele dizer que
quebraria a tradição no que dizia
respeito à criação dos filhos. Outra era
dar as boas-vindas ao bebê com o amor
que este merecia.
Naquele momento, Luisa decidiu. A
ideia de uma viagem para casa, a fim de
ver Mary e Sam, estava em sua cabeça
há dias. Agora, a necessidade do
carinho e apoio incondicional deles era
demais para resistir. Ela os visitaria e
marcaria uma consulta num médico,
algo que era impossível ali. Imagine
comprar um teste de gravidez numa
farmácia de Maritz! A notícia estaria na
imprensa antes que a noite caísse.
Luisa precisava de tempo e espaço
para lidar com as mudanças em sua
vida. Iria assim que a coroação
acabasse.
– É claro que eu não estou
exagerando. Sinto-me ótima.
Ele lhe cobriu as mãos com as suas, e
Luisa ficou tensa.
– Você não atravessou o terreno para
cumprimentar as pessoas do outro lado
do quarteirão.
Ela respirou fundo.
– Não deu tempo. Eu sei que você
tem uma reunião, e eu já estava lá por
um tempo, antes de você chegar.
– Ainda assim – ele a fitou com
intensidade –, você normalmente acha
tempo para todos.
– Você queria vê-las? – Ela estivera
tão ansiosa para escapar, a fim de poder
pensar.
– Não, você está certa. Eu estava sem
tempo. Apenas pareceu... tão diferente
de você.
Luisa flexionou os dedos, e ele lhe
liberou as mãos.
Uma dor apertou o peito dela.
Não era que ele quisesse tocá-la.
Exceto, é claro, quando eles faziam
sexo. Raul apenas queria se certificar de
que ela estava bem o bastante para
cumprir seus deveres.
A REUNIÃO de
Raul parecera
interminável, com ele consultando o
relógio frequentemente, calculando
quanto tempo antes que pudesse
escapar dali.
Deveria estar satisfeito. Estava tudo
pronto para a coroação na semana
seguinte, e negociações com os líderes
locais anteriormente difíceis tinham se
provado frutíferas.
Todavia,
ele
não
conseguia
concentrar-se. Luisa parecera tensa,
mais cedo. Esta manhã, Raul acordara
para encontrá-la fora de sua cama,
novamente. Aquilo parecia estar se
tornando um hábito.
Ele gostava de acordar com ela. Não
apenas pela satisfação física do sexo
matinal. Mas porque Luisa o fazia se
sentir bem. Relaxado. Contente.
Estranho, quando no passado, ele
preferira dormir sozinho. Mas tantas
coisas sobre este casamento eram
incomuns.
Como o jeito que ele observava
Luisa. Ela era vibrante e atraente,
embora não tão maravilhosa como
algumas mulheres que ele conhecera.
Todavia, ele a observava o tempo
inteiro, sorrindo quando ela sorria,
apreciando as interações dela com
outros, e a combinação de coragem e
inteligência durante discussões entre os
dois.
Embora não houvesse muitas dessas,
ultimamente. Seus dedos apertaram o
gargalo da garrafa gelada de
champanhe. Esta noite seria diferente.
Ele pôs a cabeça para fora do
escritório, antes de sair para os
apartamentos privados.
– Cancele meus compromissos para
os 15 dias após a coroação, por favor. –
Raul estava determinado a passar um
tempo sozinho com Luisa. Agora que as
coisas estavam estáveis, ele lhe daria a
lua de mel que ambos apreciariam.
Não podia pensar em nada que
quisesse mais do que estar com sua
esposa.
– Sim, senhor – respondeu a
secretária.
– Não marque nada na agenda de
minha esposa, também. Eu falarei com
ela sobre cancelar os compromissos.
Ele sorriu. Duas semanas no seu
retiro isolado perto do lago. O lugar
estaria lindo nesta época do ano. Luisa
adoraria, e eles poderiam ficar sozinhos.
– Sinto muito, senhor. – A garota
franziu o cenho. – A princesa tem um
voo marcado para o dia seguinte da
coroação.
– Um voo? Isso deve ser um engano.
– Não, senhor. Eu mesma fiz a
reserva, algumas horas atrás.
Raul experimentou uma curiosa
sensação de vazio no peito. Andou para
o computador.
– Mostre-me.
Silenciosamente, ela encontrou o
agendamento, então virou a tela para
ele. Um voo para Sidney, sem escalas.
Sem passagem de volta.
O vazio no peito de Raul expandiuse, causando-lhe falta de ar.
– Houve um telefonema da
Austrália? – Talvez fosse doença na
família. Luisa era próxima dos tios.
– Não que eu saiba, Vossa Alteza.
Raul forçou um sorriso.
– Tudo bem. Eu conversarei com ela
sobre isso. – Ele se virou, um sexto
sentido esfriando sua pele.
Uma passagem só de ida para Sidney.
Sozinha.
Ele reprimiu o pensamento de que
Luisa nunca o perdoara por ele a ter
levado para Maritz, e planejava partir
para sempre. Abandoná-lo.
Raul acelerou os passos.
Haveria uma explicação, pensou
enquanto se dirigia para os aposentos
reais.
Bateu à porta da suíte dela e esperou.
Estranho. Segundo a secretária, Luisa
tinha ido para lá, uma hora atrás, a fim
de descansar.
Ele bateu novamente, e girou a
maçaneta.
Talvez,
ela
tivesse
adormecido. Raul entrou e fechou a
porta.
Então congelou, bile subindo à sua
garganta, enquanto sua mente absorvia
os detalhes. Déjà vu. Aquilo já lhe
acontecera.
Exceto que desta vez era pior. Muito
pior. Esta era Luisa...
Luisa e Lukas.
Claramente não numa reunião de
negócios, mas em alguma coisa mais
íntima.
Luisa usava saia e blusa justa, as
mãos curvadas em volta dos ombros do
homem. Lukas, a quem ele teria
confiado sua vida! O homem que ele
designara para ajudar Luisa em tudo.
Os braços de Lukas estavam ao redor
da cintura dela, de maneira possessiva.
As cabeças louras dos dois estavam
muito perto.
Raul lembrou-se da frieza recente de
sua esposa, do jeito que ela deixava sua
cama e tentava se distanciar. Ele tinha
sido um covarde, ignorando sinais que
não queria ver? Luisa poderia tê-lo
traído como Ana o traíra?
Era como se alguém tivesse enfiado a
mão em seu peito e arrancado seu
coração.
Lukas removera o paletó e a gravata.
O colarinho estava aberto. Luisa
estivera começando a despi-lo?
A dor dilacerava Raul, até que ele
mal conseguisse ficar em pé.
Ele deve ter arfado ou produzido
algum ruído, porque subitamente o
casal virou suas cabeças e o viu.
O rubor cobriu o rosto de Luisa, e ela
baixou as mãos. Lukas endireitou o
corpo e liberou-a, ajustando o
colarinho.
A mente de Raul foi preenchida com
uma imagem de Ana e seu pai,
emergindo de um quarto, depois que o
velho homem tinha levado um visitante
de Raul num tour pessoal. Ana
enrubescera e desviara o olhar. Seu pai
endireitara o corpo, mexendo nas
abotoaduras.
O começo da traição deles.
Raul respirou fundo.
Estes eram Luisa e Lukas. Não Ana e
seu pai.
Ignorando
a
adrenalina
que
bombeava em seu sangue, ele adentrou
mais o quarto.
E viu o rosto rubro de Luisa
empalidecendo.
– Luisa. – Sua voz soou estranha.
– Vossa Alteza – começou Lukas,
apressadamente. – Eu sei que isto deve
parecer...
Raul levantou a mão para silenciá-lo.
Era com Luisa que precisava falar.
– Mas, Vossa Alteza... Raul...
Raul virou-se, focando em seu
secretário. Durante todos os anos que
eles trabalhavam juntos, Lukas insistira
na formalidade, recusando a sugestão,
que Raul fizera, mais de uma vez, de
chamá-lo pelo primeiro nome, quando
eles estavam sozinhos.
O medo o inundou por Lukas ter
escolhido este momento para atravessar
aquela lacuna. Para colocá-los em
posição igual.
Por quê? Porque ele e Luisa...?
– Deixe-nos a sós, Lukas.
Lukas não se moveu, mas olhou
nervosamente para Luisa.
– Vá, Lukas – sussurrou ela. – Tudo
ficará bem.
Finalmente, ele saiu, fechando a
porta silenciosamente. Entretanto, Luisa
não encontrou seus olhos.
Ele cerrou as mãos, forçando-se a
esperar até que ela estivesse pronta para
falar.
– Não é o que você pensa.
– Você não sabe o que eu estou
pensando. – Nessas alturas, o
pensamento racional estava quase além
da capacidade de Raul. Apenas a voz
que repetia em sua cabeça, dizendo que
Luisa era diferente, era sua, o manteve
são.
Ela levantou a cabeça e olhou-o.
– Você não vai perguntar sobre
Lukas?
– Eu sei que você vai me contar. – Ele
apenas rezou que fosse homem
suficiente para ouvir a verdade.
Ela começou a andar, desviando o
olhar.
– Ele estava me ajudando.
– Continue.
– Ele estava me ensinando a dançar.
– Perdão? – Raul ficou confuso pela
resposta inesperada.
– Ele estava me ensinando a valsar,
para o baile da coroação. – Luisa deu-
lhe um olhar desafiador. – Eu nunca
aprendi dança formal. E não queria
envergonhar você no seu grande dia.
Raul franziu o cenho. Havia alguma
coisa tão íntima sobre a ideia de ensinar
Luisa dançar.
– Você poderia ter me pedido para
ensiná-la.
O fato de ela pedir para seu secretário
ajudá-la, em vez de pedir ao marido,
dizia o que a respeito do casamento
deles?
Ela corou.
– E deixar óbvio que essa era mais
uma coisa que eu não sabia fazer? Tem
ideia de como é difícil tentar fazer tudo
certo... o protocolo, os costumes e o
idioma... e eu ainda cometo tantos
erros. – Luisa suspirou. – Além disso,
seria embaraçoso não saber algo tão
básico quanto dançar uma valsa.
Ela piscou contra as lágrimas e o
coração de Raul amoleceu.
– Eu não me importo se você não
sabe dançar.
– Mas eu me importo. Eu queria... –
Ela mordeu o lábio.
– Achou que alguém se importaria
com sua habilidade em dançar? Que eu
me importaria? Isto é absurdo!
– Absurdo? – Luisa meneou a cabeça
e recomeçou a andar.
Raul queria abraçá-la, mas o jeito que
ela passara os braços ao redor de si
mesma lhe disse que não era a hora.
– O que é absurdo é casar-se com
alguém que você não conhece.
Entregar-se a alguém que nunca irá
gostar de você. Que não a ama, porque
nunca superou os sentimentos pela
mulher que o feriu, anos atrás.
Raul estava chocado. Luisa acreditava
que ele não superara seus sentimentos
por Ana?
– Isso não é verdade!
Ele lhe pegou o braço, mas ela se
desvencilhou.
A angústia o preencheu diante da
rejeição.
– Tem ideia de como é saber que eu
não fui sua primeira escolha de esposa,
nem mesmo a segunda? Que você se
casou comigo por causa de quem meu
avô era?
Ela deu um suspiro trêmulo, e Raul
sentiu o peso do arrependimento por
tudo que fizera com esta mulher
vibrante e especial.
Durante todo o relacionamento
deles, suas necessidades tinham vindo
primeiro. Luisa lhe dera mais do que
Raul sonhara ser possível, e ela sofrera o
tempo inteiro.
A realidade atingiu-o como uma
facada no coração.
– Foi por isso que você reservou um
voo para Sidney, na próxima semana?
Luisa o olhou, boquiaberta.
– Você sabe sobre isso?
– Acabei de descobrir. Há alguma
emergência familiar?
Ela meneou a cabeça.
– Eu queria ir para casa.
– Aqui é a sua casa. – A voz de Raul
era rouca, a emoção evidente em cada
palavra.
Ela balançou a cabeça vigorosamente,
e o coração dele sofreu outro golpe.
– Eu preciso de tempo. Um tempo
longe daqui.
Um tempo longe dele.
Alguma emoção que ele não podia
nomear o inundou. Enganara-se ao
acreditar que ela passara a gostar dele?
Que eles haviam começado a
compartilhar alguma coisa especial?
Mas não podia desistir.
– Você pertence a este lugar, agora,
Luisa.
– Pertenço? – Ela se virou, os braços
cruzados sobre o peito. – Acho que
seria sábio se eu ficasse fora por um
tempo.
– Fugindo, Luisa?
– Você será coroado. Terá o que
quer. – A voz dela soou abafada.
E se fosse ela que ele quisesse?
Subitamente Raul percebeu, com a
força da absoluta verdade, que tudo
que mais queria era passar sua vida com
Luisa.
Por que não vira isso tão claramente
antes?
A coroa, mesmo seu país, não
significava nada sem Luisa.
Ele a perdera para sempre?
Uma imagem de Luisa e Lukas
surgiu em sua mente. Eles se
encontrariam na Austrália?
Raul recusava-se a considerar a
possibilidade.
– Você não pode partir no dia
seguinte da coroação. Pelo menos, adie
a viagem por um tempo. – Ele precisava
de tempo para convencê-la a ficar.
Ela enrijeceu.
– Eu pensei que devesse estar lá para
a cerimônia. Mas talvez, fosse melhor
se...
Ela parou quando o celular dele
tocou. Raul tirou-o do bolso e desligouo.
– É sua linha privada. É
provavelmente importante.
Ele aproximou-se.
– Isto é importante, Luisa.
Então, o telefone de Luisa tocou.
Antes que ele pudesse impedi-la, ela
atendeu, como se estivesse ansiosa pela
interrupção.
– É para você. – Ela lhe estendeu o
telefone. – O conselheiro legal do
governo diz que precisa lhe falar.
Raul hesitou. Eles precisavam discutir
aquilo agora. Mas o assunto no qual
seus advogados estavam trabalhando
certamente ajudaria seu caso com
Luisa. Ele estava desesperado o bastante
para se agarrar a qualquer coisa que
ajudasse.
Pegou o telefone.
LUISA OBSERVOU Raul, tão compenetrado
na notícia do advogado.
Estivera certa sobre as prioridades
dele. Como sua esposa, ela estava no
fim da lista.
Ele a desafiara sobre a viagem à
Austrália, e Luisa rezara para que ele
lhe pedisse para ficar, porque não
suportaria ficar longe dela.
Imaginara Raul envolvendo-a nos
braços e aprisionando-a ali. Porque a
amava, e recusava-se a libertá-la.
A realidade era tão diferente.
– Há um assunto do qual eu preciso
cuidar.
Ela assentiu. Havia sempre alguma
coisa mais importante do que o
casamento deles. Desolada, Luisa
pensou que talvez fosse melhor que
partisse e não retornasse.
– Luisa, você me ouviu?
– Perdão? – Ela olhou para cima e
descobriu-o já perto da porta.
– Eu disse que nós precisamos
conversar, propriamente. Voltarei assim
que possível.
Luisa assentiu, pondo sua máscara de
compostura, que agora parecia prestes a
se rachar? Ou era seu coração? Sua
última esperança de um casamento de
verdade acabara de espatifar-se.
CAPÍTULO 14
– OBRIGADO A todos. – Raul assentiu
para os juízes do Supremo Tribunal,
para o promotor do Estado e outras
testemunhas,
que
tinham
sido
chamadas com urgência duas horas
atrás,
com
sua
ordem
de
testemunharem este evento que
mudaria a história.
Em outras circunstâncias, ele estaria
excitado diante da perspectiva de iniciar
uma mudança tão significante. Mas
sentia-se impaciente para que todos
saíssem da sala e o deixassem sozinho.
Tão sozinho.
Sua mente formou a imagem de
Luisa, poucas horas atrás, no quarto
dela, pálida e tensa, enquanto falava da
necessidade de escapar. A mágoa que
ela sentia pelo papel que tinha na vida
dele.
Quão profundamente ele a ferira,
forçando-a para dentro de seu mundo.
Ele estaria fazendo a coisa certa
agora? Tentando amarrá-la a si mais
fortemente do que nunca? Raul olhou
para o pergaminho sobre a mesa,
assinado,
contra-assinado
e
testemunhado. O documento que
planejara como uma surpresa para
Luisa, um testemunho de sua
consideração por ela.
O documento que agora representava
sua última chance de convencê-la a
ficar.
Ele tinha o direito de tentar segurála, quando a vida com ele a fazia tão
infeliz?
Até hoje, ele pensara que Luisa
estivesse contente. Mais do que
contente: feliz.
Ele estava condenado a nunca
encontrar
aquela
proximidade
emocional da qual Luisa falava de
maneira
tão
desejosa?
Raul
simplesmente não era o homem certo
para fazê-la feliz?
O terror inundou-o diante do
pensamento da vida sem ela.
Mas quem poderia culpá-la? Ele
nunca experimentara amor verdadeiro,
e, sem dúvida, isso o deixara
emocionalmente incompleto. Seria
incapaz de oferecer o que Luisa
precisava num marido?
Se ela quisesse estar lá, seria
diferente. Juntos, eles enfrentariam
qualquer coisa. Se ela gostasse dele...
Sua risada irônica soou alta no
silêncio. Como Luisa podia gostar dele,
depois do que ele lhe fizera?
Raul virou-se para a janela e olhou
para o brilho das luzes da cidade,
abaixo. Normalmente, apreciava a vista
da capital que amava, o vale que era o
lar de sua família por séculos. Aquela
sensação de pertencer sempre trazia
conforto.
Não agora. Agora, tudo que sentia
era uma terrível solidão.
A vida sem Luisa.
Pensar nisso sempre criava um
imenso vazio em seu interior. Suas
mãos tremeram quando ele a imaginou
num avião para a Austrália, sem ele.
Deveria fazer a coisa honrosa e
deixá-la ir. Libertá-la da vida que ela
nunca desejara.
Todavia, a ideia de perdê-la era
insuportável. O suor brotou em sua pele
diante do pensamento de nunca mais
vê-la. Nunca mais abraçá-la.
Jamais contar a ela como se sentia.
Uma dor dilacerante inundou sua
alma.
Não, não poderia libertá-la. Isso era
mais do que Raul poderia suportar.
Ele pegou o pergaminho e enrolou-o
rapidamente. Virando-se, andou para a
porta.
LUISA ACORDOU devagar, agarrando-se a
um
sonho
surpreendentemente
maravilhoso.
Depois de horas andando de um
lado para o outro, ela se recolhera na
cama. E ainda se torturara ao reviver a
expressão indiferente no rosto de Raul,
quando ele a deixara. O fato de que ele
não ordenara que ela não fosse para
Sidney. Que ele não se importava.
Agora,
sentia-se...
segura,
aconchegada num paraíso quente que a
protegia de tudo. Não queria se mexer.
Mas não tinha escolha. Mesmo em
seu estado sonolento, registrou o enjoo,
a onda de náusea. Respirou fundo,
tentando reprimir aquilo, mas não
adiantou.
Ela se esforçou para se sentar, apenas
para descobrir seus movimentos
impedidos pelo homem grande
abraçando-a por trás, descansando uma
palma quente em sua barriga.
– Raul! – Foi um sussurro rouco. O
que ele estava fazendo ali? Quando
ele...?
Enjoada, ela afastou o braço dele,
pondo as pernas para fora da cama.
– Luisa! O que está errado?
Ela não tinha tempo para explicações.
Atravessou o quarto, uma das mãos no
estômago, a outra cobrindo a boca,
enquanto sentia o gosto de bile.
Milagrosamente, a porta do banheiro
estava aberta, e ela entrou correndo.
Suas pernas estavam tão bambas que
Luisa quase caiu.
Mas um braço rodeou-a, mantendo-a
ereta com a força formidável de Raul.
Ela sentiu o corpo quente e sólido, atrás
de si, ancorando-a.
Então, abaixou-se sobre o vaso
sanitário e deu vazão ao seu
desconforto, até que não restasse mais
nada em seu estômago.
Luisa desmoronou, tremendo e
exausta, os olhos fechados, enquanto
tentava reunir forças para se mover.
Sua cabeça girava, ou ela estava
imaginando movimento? Quando se
deu conta, estava sentada na lateral da
banheira, e suspirou agradecida quando
todos os seus músculos relaxaram. Raul
a segurava, e Luisa não tinha energia
para ordenar que ele saísse de lá. Não
quando ele era tudo que a impedia de
desmoronar.
Então, como uma benção, um pano
úmido roçou sua testa, suas faces, seu
pescoço, seus lábios secos.
– Beba isto. – Um copo foi colocado
contra seus lábios. Agradecida, Luisa
bebeu água gelada. O pano úmido
esfregou sua testa, novamente, e ela
quase gemeu de alívio. Estava fraca
como um gatinho.
Como poderia encarar Raul agora?
Por que ele estava lá?
Lágrimas inundaram seus olhos,
quando a exaustão a inundou.
– Você está doente. Eu chamarei um
médico. – Ela abriu os olhos para ver a
expressão preocupada no rosto de Raul.
– Não. Eu não estou doente. Isto é
perfeitamente normal. Um médico não
pode ajudar neste caso.
Atrasadamente, ela percebeu o que
dissera, ao ver as sobrancelhas de Raul
se arquearem. O choque cobriu-lhe as
feições quando ele leu as implicações de
sua náusea.
Ela pretendera lhe contar em breve.
Mas não assim.
– Por favor, eu preciso de privacidade
para me refrescar. – Ela se recusava a
ter aquela conversa na borda da
banheira, com seus cabelos colados à
testa úmida.
Luisa levantou-se e virou-se, não
querendo ver desconfiança nos olhos de
Raul. E depois de vê-la com Lukas, não
era impossível que Raul questionasse a
paternidade do bebê.
Raul saiu do banheiro sem uma
palavra.
Ela deveria ter ficado grata, mas
sentiu apenas desespero que ele
estivesse tão ansioso para ir embora.
Luisa fez o que tinha de fazer no
banheiro, mas quando abriu a porta,
Raul estava lá. Para seu espanto, ele se
aproximou correndo, erguendo-a nos
braços.
– Eu posso andar. – Mas o abraço
dele era mágico, mesmo que não
significasse nada.
Ele a colocou na cama, contra os
travesseiros que ajeitara na cabeceira.
Depois, cobriu-a e pegou alguma coisa
sobre o criado-mudo.
– Experimente isto. – Era um prato
de biscoitos de água e sal. Ele devia ter
pedido que alguém levasse, enquanto
ela estava no banheiro.
– Eu não estou inválida. – Luisa
empurrou o prato, e lutou para não
sucumbir ao doce encanto de receber
cuidados. Absurdamente, o gesto de
consideração levou lágrimas aos seus
olhos.
Não ajudava que Raul estava
maravilhoso, em jeans desbotado e um
suéter preto, com mangas enroladas,
para revelar braços poderosos. Estava
até mais lindo do que num de seus
ternos impecáveis. Então ela percebeu
que nunca o vira neste tipo de traje
antes.
Ele se sentou na cama, encarando-a.
– Você está grávida. – Era uma
afirmação.
– Eu acho que sim. Mas se eu estiver,
o bebê é seu. Isso não tem nada a ver
com Lukas.
Ele lhe afastou uma mecha de
cabelos da testa. Luisa arfou perante o
gesto carinhoso. Disse a si mesma que
era tola.
– Eu não pensei que tivesse.
– Oh. – Você foi a um médico?
– Não. Ainda é cedo. – Ela sabia
exatamente quando o bebê tinha sido
concebido: naquela primeira noite
tempestuosa do casamento deles,
quando ela descobrira sobre êxtase e
dor de um coração partido.
Mas a aceitação calma de Raul
surpreendeu-a.
– Então, você nunca pensou...?
Ele balançou a cabeça.
– Não posso mentir e dizer que isso
não me ocorreu. – Raul desviou o olhar.
– Mas quando você teria tempo para
um caso? É a minha cama que você
compartilha. Meu sofá. Minha mesa.
– Eu já entendi! – Ele não precisava
lembrá-la de como ela era carente por
ele. – Pensei que você acreditasse...
– Que minha esposa estava tendo um
caso com meu secretário? – Raul
cobriu-lhe a mão com a sua, e a
sensação foi tão boa que Luisa não
recolheu a mão.
– Admito que foi um choque
desagradável. – Ele respirou fundo,
expandindo o peito. – Mas eu passei a
conhecê-la, Luisa. Você nunca me
trairia com outro homem. É honesta e
tem consideração. Não se comportaria
dessa forma. – As palavras eram como
chuva nutrindo a alma seca de Luisa.
Ele acreditava nela?
Suas mãos tremeram com o choque
diante daquilo.
– Conheço Lukas, também –
continuou Raul. – Trabalhamos juntos
há anos. Como eu poderia acreditar no
pior, conhecendo vocês dois?
– Eu... – Palavras lhe faltaram. Tanta
confiança, quando Raul tinha sido tão
ferido antes, e diante de tal evidência,
impressionou-a. Ela esperara um
interrogatório, no mínimo. Seu coração
alegrou-se.
– Eu pensei que, depois de Ana...
– Esqueça Ana. Eu fui um tolo de me
acreditar apaixonado por ela, um dia.
Mas superei a tolice, anos atrás. Isto é
sobre você e eu, Luisa. Ninguém mais.
O alívio a percorreu diante do
conhecimento que a outra mulher não
era rival dos sentimentos de Raul. Luisa
temera aquilo por tanto tempo. Uma
sensação de leveza envolveu-a.
– Luisa. – Seu nome era um sussurro
rouco. – Eu quero que você fique. Aqui,
comigo. Não vá para Sidney.
O tremor das mãos de Luisa
intensificou-se, enquanto sua alegria
aumentava. Ele acreditava nela! Ele a
queria!
Ela levou um momento para
entender por quê.
A desilusão inundou-a. Luisa tentou
puxar as mãos, mas ele não permitiu.
– Por causa do bebê! Você quer seu
herdeiro. – Era por isso que Raul
mudara de ideia sobre sua ida.
– É claro que eu quero estar com o
bebê e você.
Ela meneou a cabeça, um peso
instalou-se em seu peito. A dor era pior
agora, mais intensa, depois de um único
momento de esperança. Luisa quase
chorou.
Não era Luisa que ele queria, apenas
seu bebê não nascido.
– Por favor, solte-me. Isto não vai dar
certo.
–
Ela
conseguiu
falar
calmamente, quando, por dentro, sentia
que estava desmoronando.
Pelo que pareceu uma eternidade,
ele continuou segurando suas mãos,
olhando-a fixamente. Então, liberou-a e
se virou, os ombros baixando em
aparente derrota.
Instantaneamente, Luisa sentiu falta
do calor, da força dele. Olhou para suas
mãos, e percebeu que não estava mais
tremendo.
Perplexa, olhou para Raul, para o
jeito distraído que ele passava a mão
pelos cabelos. E não acreditou no que
viu.
Era ele. Raul estava tremendo inteiro.
– Raul? O que foi isso?
Ele não respondeu, e ela pôs a mão
no ombro dele. Sentiu os tremores
percorrendo o grande corpo.
– Raul? – O medo a inundou. Ele
estava doente?
– Eu não posso. Eu... – A cabeça dele
abaixou entre os ombros.
Freneticamente, Luisa puxou-lhe o
braço, virando-o na sua direção.
Levantou-se sobre os joelhos e se
aproximou.
– O que houve? Por favor, conte-me.
Finalmente, ele ergueu a cabeça e
olhou-a. Raul estava abatido como ela
nunca o vira, a pele esticada sobre os
ossos. Somente os olhos pareciam vivos
no rosto pálido. Brilhavam muito.
– Eu não posso perder você, Luisa. –
A voz dele era um sussurro angustiado.
– Que Deus me ajude, mas não posso
deixá-la ir. Quando você disse que iria
embora, eu sabia que não podia forçá-la
a ficar. Mas...
– Raul. – Ela engoliu em seco. – Eu
não entendo. O que você está dizendo?
Luisa olhou, atônita, para o homem
que ouvira discursar em quatro
idiomas, charmoso, persuasivo, lutando
para pôr palavras para fora. Ela
afrouxou o aperto no braço dele e
alisou-o suavemente.
– Eu preciso cuidar de você, Luisa.
De você e do nosso bebê.
– Nós faremos algum acordo. – Por
mais que Luisa detestasse a ideia de
pais por meio período, sabia que o bebê
deles precisava de ambos.
– Eu não quero um acordo. – O
brilho nos olhos verdes mudou,
tornando-se quase perigoso. – Quero
minha esposa e meu filho. Aqui. – Ele
estendeu o braço para pegar um papel
enrolado aos pés da cama. – Isto
provará o quanto eu quero você aqui.
Com mãos trêmulas, ele lhe entregou
o pergaminho, quase o rasgando em sua
pressa de desenrolá-lo.
– Está tudo em maritzian. – Ela leu
uma olhada no documento, muito
distraída para se concentrar. Tudo que
absorveu foi a coluna de selos e
assinaturas
na
parte
inferior,
começando pela assinatura floreada de
Raul, e o selo de dragão da realeza.
– O que é isto, Raul? – Luisa nunca o
vira tão agitado, e queria aninhá-lo
contra si.
– Este documento autoriza uma
mudança na sucessão real, a partir do
momento que eu for coroado. No dia
que você se tornará rainha.
Ela franziu o cenho.
– Não há mudança.
Ele balançou a cabeça.
– Rainha, não consorte real. Você
será minha igual, minha parceira em
governar o reino. – Raul encontrou-lhe
os olhos, e a força neles aqueceu a alma
de Luisa. – De que outra forma eu
posso provar o que você significa para
mim? O quanto preciso de você, e
confio em você?
Ela arregalou os olhos.
– Mas você não pode fazer isso! Eu
não... não... eu não tenho a experiência.
Não saberia o que fazer. Eu...
Ele lhe pegou as mãos, novamente.
– Você aprenderá. Eu lhe ensinarei. –
Raul beijou-lhe a palma, e arrepios de
deleite a percorram.
– Mas Maritz não está pronto para
isso. Eu não sou boa em...
– Maritz irá se adaptar. Você é capaz,
honesta e amorosa. Será uma rainha
perfeita. Para meu país. Para mim. Para
nosso filho ou filha. – O olhar de Raul
baixou para a barriga dela.
– Mas eu violarei todas as regras.
– Às vezes, elas precisam ser violadas.
Há mais na vida do que protocolo,
sabe? – Ele sorriu, um sorriso tão
devastador que aqueceu Luisa da ponta
dos pés ao topo da cabeça.
– Você é uma princesa para deixar
todos orgulhosos. Nosso povo já a
respeita e a adora, porque percebem
como você se importa com eles. Você os
ajudou quando isso era importante.
Você me ajudou. Mudou a minha vida
e me ensinou a ter esperança.
A mente de Luisa estava girando. Era
coisa demais para compreender.
– Você pode me perdoar, Luisa? O
bastante para ficar e me dar outra
chance?
Ela o observou engolir em seco, e
investigou seu coração por uma
resposta. Amava-o, mas isso era o
bastante para enfrentar o futuro? Para
construir uma vida juntos, mesmo na
luz deste incrível gesto de fé?
Se ele a pegasse nos braços e a
envolvesse numa onda de paixão, seria
fácil dizer sim. Luisa ansiava por isso.
Mas a vida não era tão simples.
– Não se trata de esquecer o passado.
É sobre o futuro. – Ela respirou fundo,
imaginando se ele entenderia. – Eu
quero um casamento de verdade. Uma
família feliz. Quero que meu filho ou
filha aprecie a ser criança, com pais que
realmente se importam. Eu quero...
– Amor – terminou ele num sussurro
rouco. – E confiança e respeito. – Raul
assentiu. – Você merece isso, Luisa. É o
que eu quero lhe dar. Se você me deixar
tentar.
A respiração de Luisa ficou presa na
garganta perante a expressão nos olhos
dele.
– Eu a amo, Luisa. E quero você ao
meu lado.
Atordoada, Luisa o estudou. Havia
uma pulsação frenética no pescoço dele,
e outra na têmpora. Raul parecia
nervoso. Emocionado.
– Não pode ser – sussurrou ela.
– É verdade.
Luisa balançou a cabeça, com medo
de acreditar.
– Eu também não percebi. – Raul fez
uma careta. – Passei muito tempo
explicando minha falta de sentimentos,
porque a alternativa era muito
assustadora. Durante toda minha vida
adulta, trabalhei para fechar minhas
emoções. Então você apareceu. E me fez
sentir, tão intensamente.
Raul entrelaçou os dedos nos dela, e
continuou:
– Eu estava arrasado, arrependido
pelo jeito que eu a forcei a este
casamento. Entretanto, sabendo que,
no fundo, eu não podia lamentar,
porque isso a trouxe para mim, e eu não
poderia deixá-la ir. Quão egoísta é isso?
Ele passou a outra mão pelos cabelos
brilhantes num gesto distraído que fez
Luisa querer abraçá-lo.
– Eu disse a mim mesmo, por tanto
tempo, que o amor era para os tolos. E
aqui estou eu, apaixonado por uma
mulher que tem todos os motivos para
me odiar.
– Não odeio você – murmurou ela,
de forma entorpecida.
A esperança brilhou nos olhos
verdes.
– Então isso é mais do que eu
mereço. – Ele lhe acariciou o rosto. –
Tenho me torturado, dizendo a mim
mesmo que eu deveria encontrar forças
para libertá-la e deixá-la ser feliz.
Raul levou as mãos unidas de ambos
à boca e beijou-lhe o pulso.
– Mas eu não posso fazer isso. Preciso
lutar por você.
– Fale de novo – sussurrou Luisa,
emocionada. – Fale que me ama.
Raul soltou-lhe os dedos, então
emoldurou o rosto dela com as mãos.
– Eu a amo, Luisa. Nunca duvide
disso. Quero estar sempre ao seu lado.
Compartilhar com você, ser aquele para
quem você se volta. Ensiná-la a valsar e
qualquer outra coisa, se você
compartilhar seu calor e risada comigo.
– Oh, Raul! – A voz de Luisa era
rouca de emoção. – Eu o amo há tanto
tempo. Nunca pensei... – Ela piscou
contra as lágrimas.
– Verdade? – Ele sorriu, parecendo
maravilhado ao ouvir as palavras.
Ela assentiu, e dedos gentis secaram
as lágrimas de seu rosto.
– Verdade. Desesperadamente.
– Meu amor! – Olhos verde-escuros
encontraram os seus. – Eu não
pretendia fazê-la chorar, querida. Só
quero fazê-la feliz. Sempre.
– Você me faz. – Luisa piscou e
sorriu. – Eu sou feliz, aqui com você.
Ela viu dúvida e medo se
estamparem nas feições masculinas.
Insegurança no homem que entrara em
sua vida e agarrara seu destino em
mãos fortes. Que governava um reino
com uma facilidade que qualquer um
invejaria.
– Eu cometerei erros – admitiu ele. –
Isto é tudo muito novo para mim.
Nunca me senti assim, antes. – Raul
engoliu em seco. – Não sou um bom
risco, eu sei. Não tenho seu dom da
proximidade e seu jeito caloroso. Não
tenho experiência com vida em família.
Nenhum modelo de como ser um bom
pai...
Os dedos de Luisa nos lábios dele
pararam as palavras. Seu coração
apertou-se ao ver o homem que amava
tão inseguro.
Vendo a insegurança dele, Luisa
soube a verdade. Ela precisava superar
o próprio medo. Tinha de confiar, em
Raul, em si mesma, e deixar o passado
para trás.
– Eu estou disposta a tentar, se você
estiver – sussurrou ela com voz
emocionada.
O amor que ela viu nos olhos que
encontraram os seus apertou seu
coração.
– Luisa! – Raul puxou-a para mais
perto, beijando-lhe o pescoço, as faces.
Abraçando-a como se ela fosse a coisa
mais preciosa do mundo.
Aquilo era glorioso, mas não o
bastante. Não quando o coração dela
alçava voo, com alegria.
Luisa segurou-lhe o queixo e beijouo nos lábios. Instantaneamente, ele
respondeu, a boca sedenta, como se
fizesse uma eternidade que eles não se
beijavam. Como se nunca tivessem se
beijado.
Não realmente.
Não assim.
O beijo de Raul curava. Era exigente,
possessivo, e, ao mesmo tempo,
incrivelmente doce. Um dar e receber,
não apenas de deleite físico, mas de
amor. Amor verdadeiro.
Finalmente, eles se separaram para
respirar. Mas os braços de Raul a
rodeavam, e as mãos de Luisa
descansavam nos ombros largos.
Uma felicidade tão grande inundoua que ela se sentiu incandescente com o
sentimento.
– Eu não acredito que isto é real.
Olhos brilhantes encontraram os
seus, e o coração de Luisa deu
cambalhotas quando ela leu a ternura
ali.
– Deixe-me lhe mostrar quão real,
meu anjo. – Raul puxou-a para mais
perto e beijou-a, até que o mundo
girou.
EPÍLOGO
O
de bailes estava cheio. No
pátio do lado de fora, mais pessoas
estavam reunidas sob bandeiras da
realeza se agitando, guirlandas e
lanternas douradas.
Um barulho alegre reverberava nos
espelhos antigos e nas pinturas em
afresco do teto, enquanto a multidão
aplaudia seus novos reinantes: rei Raul
SALÃO
e rainha Luisa. Os primeiros monarcas
unidos na história de Maritz.
Os pelos nos braços desnudos de
Luisa se arrepiaram enquanto ela ouvia
os nomes deles sendo gritados uma,
duas, três vezes, primeiro pelo
anunciador, depois pelas vozes fortes da
multidão.
Em sua cabeça, havia uma delicada
coroa de ouro e diamantes brilhantes.
Em sua mão, descansava o globo
medieval adornado com joias, e na mão
de Raul, ao lado da sua, o cetro de
ouro.
Ela respirou fundo, mal ousando
acreditar que aquele momento era real.
Mas então, uma mão quente envolveu a
sua e apertou-a. Luisa virou-se e viu
puro amor nos profundos olhos verdes
de Raul.
Era real. A cerimônia, a multidão,
porém, mais importante de tudo, o
amor de Raul.
Ele lhe ergueu a mão e deu um beijo
fervoroso ali. Instantaneamente, a
excitação a percorreu. E a antecipação.
Raul sorriu, uma luz travessa nos
olhos, e ela soube que sua expressão a
entregara. Ele lera seus sentimentos por
ele no seu rosto. Luisa não se
importava. Deleitava-se no amor deles.
E este era apenas o começo...
Raul riu, e, através do mar de boasvindas, ela ouviu a multidão aplaudir
novamente.
Virou-se e olhou para baixo, de seu
trono. Lá estava Lukas, com a nova
secretária de Luisa, Sasha. Daquele
ângulo, parecia que eles estavam de
mãos dadas. Então havia Tamsin e
Alaric, seus sorrisos conspiratórios.
Mary e Sam estavam na fileira da
frente, em lugares de honra, sorrindo
para Luisa, como se o fato de ela estar
casada com um rei e governar um país
fosse a coisa mais natural do mundo.
Ela balançou a cabeça em
perplexidade.
– Você está pronta, querida?
Raul levantou-se e ajudou-a a fazer o
mesmo. Oficiais apareceram para pegar
o globo precioso e o cetro.
– Tão pronta como eu sempre estarei.
– Ele a conduziu do palco para o piso
abaixo, onde espaço foi aberto para eles.
– Você se sairá bem – murmurou
Raul, e envolveu-a nos braços. – Se
houver um problema, culpe seu
professor.
Luisa fitou-lhe os olhos, que reluziam
com amor, sentiu-o começar a movê-la
numa valsa e sorriu. A música tocava
suavemente, enquanto ela girava nos
braços do homem que adorava. Ela
estava em casa.
Maya Blake
O PREÇO DO SUCESSO
Tradução
Joana Souza
CAPÍTULO 1
OS
antes do acidente
passaram quase em câmera lenta. O
tempo parou, depois se estendeu
letargicamente no sol de domingo. E
mesmo que os carros estivessem
viajando a mais de 220 quilômetros por
hora, parecia haver uma simetria quase
hipnótica em seu movimento.
Sasha Fleming ficou olhando,
petrificada. Centenas de quilos de fibra
MOMENTOS
de carbono torcidos sobre si mesmo.
O carro de corrida de renome
mundial se lançou para o ar.
Inevitavelmente, a gravidade venceu.
– Ele bateu! Ele bateu! O atual
campeão mundial, Rafael de Cervantes,
bateu seu Espiritu DSII. Hoje mesmo
pela manhã os jornais disseram que este
carro não batia. Como puderam errar
assim?
Sasha arrancou seus fones de ouvido,
incapaz de tolerar o enorme rugido que
subiu no circuito de Hungaroring.
Seu coração estava batendo tão forte
e tão rápido que parecia prestes a
romper sua caixa torácica. Seus olhos
permaneceram colados nas telas e ela e
dois membros da equipe dos boxes
observavam os terríveis acontecimentos
se desenrolarem.
– Aumente o som – gritou alguém.
Contendo a necessidade selvagem de
negar a ordem, ela apertou os lábios e
cruzou os braços com força ao redor da
cintura. Memórias de outro tempo,
outro acidente, vieram à tona com o
desenrolar na tela.
“Às vezes, a única maneira de
sobreviver à dor é mergulhar nela.
Deixe-a comer viva. Ela a libertará
eventualmente.” Quantas vezes seu pai
lhe disse isso? Quando ela quebrou o
tornozelo andando de bicicleta.
Quando ela fraturou o braço ao cair de
uma árvore. Quando ela perdeu sua
mãe aos 10 anos de idade. Quando ela
sofreu as consequências desesperadoras
de se apaixonar pelo cara errado.
Ela passou por tudo isso. Bem...
Quase.
A perda secreta que ela havia
enterrado no fundo do seu coração
sempre estaria com ela. Assim como a
perda de seu pai.
A voz do comentarista invadiu seus
pensamentos.
– Não há nenhum movimento no
carro. A ambulância está a caminho,
mas até agora não vimos Rafael se
movendo.
Seu
engenheiro
está
freneticamente tentando falar com ele.
Devo dizer que o quadro não parece
bom...
Sasha forçou a respiração, os dedos se
movendo convulsivamente para soltar
sua roupa de corrida.
Lembrou-se de sua última conversa
com Rafael.
Ele estava tão zangado com ela. E as
acusações quando ela só estava
tentando ajudar...
Sua alma foi invadida pelo frio. Foi
culpa dela? Ela teve um papel no
acidente?
– A ambulância está lá agora. E
também o irmão de Rafael, Marco, o
dono da Equipe Espiritu. Ele está a
caminho do local do acidente...
Esperamos notícias em breve.
Marco. Outro choque percorreu seus
sentidos. Ela ainda não sabia que ele
finalmente havia chegado à Hungria.
Em seus dois anos como piloto da
Equipe Espiritu, Marco de Cervantes
não havia perdido uma única corrida,
até este fim de semana.
Pela resposta concisa de Rafael
quando ela perguntou sobre o
paradeiro de seu irmão, Sasha havia
concluído que os irmãos estavam
brigados.
Seu coração se apertou no peito ao
pensar que Marco havia chegado
apenas para testemunhar o acidente de
seu irmão.
Um ousado cinegrafista passou pelos
guarda-costas e filmou Marco. Com a
mandíbula contraída e apenas uma
simples sugestão de palidez, ele
manteve o olhar fixo, não revelando o
menor indício de seu estado emocional
enquanto caminhava em direção ao
carro.
Pouco antes de entrar no carro, ele
virou a cabeça. Seus profundos olhos
castanhos olharam diretamente para a
câmera.
Estranhamente, Sasha sabia que sua
emoção ia além dos eventos que se
desenrolavam
naquele
momento.
Independentemente da emoção que
Marco escondia, ia muito além do
horrível acidente de seu irmão.
Outro arrepio passou por ela.
Afastou-se
da tela,
procurando
cegamente uma fuga. A parte de trás da
garagem onde os pneus estavam
empilhados ofereceu um santuário
temporário.
Tom Brooks, seu assessor de
imprensa pessoal, separou-se do grupo
e foi direto a ela.
– Precisamos nos preparar para uma
entrevista.
Subiu uma náusea que se juntou a
todas as outras sensações que se
acumulavam dentro dela.
– Já? Não sei nem como Rafael está.
– Exatamente. Os olhos do mundo
estarão sobre esta equipe. Agora não é a
hora de jogar tudo no lixo – disse ele
sem simpatia.
Sasha mordeu o lábio. Sua negação
aquecida de um relacionamento com
Rafael há apenas uma semana havia
alimentado especulações da mídia e
trouxe um foco indesejado para a
equipe.
– Não é melhor estar bem informada
antes da entrevista?
Seu rosto escureceu.
– Você quer ser piloto reserva para
sempre?
Sasha fez uma careta.
– Claro que não...
– Bom, porque eu não quero ser
assessor de imprensa de piloto reserva
pelo resto da minha carreira. Você quer
ser um deles? Aqui está a sua chance de
provar isso.
Uma onda de raiva cresceu dentro
dela.
– Eu não preciso ser cruel para provar
nada, Tom.
– Ah, precisa. Você acha que
qualquer outro piloto hesitaria diante
da chance que foi apresentada?
– Que chance? Não sabemos nem
como Rafael está ainda!
– Bem, você pode deixar passar. Você
pode optar por tornar-se uma estatística
sem sentido ou pode se colocar no
assento do piloto e provar que os
rumores estavam errados.
Ela não precisava perguntar o que ele
queria dizer. Uma onda de dor cruzou
seu corpo.
– Não me importo com os boatos.
Sou um bom piloto.
– Você também é filha de Jack
Fleming e ex de Derek Mahoney. Se
quiser ser levada a sério, você precisa
sair das sombras. Faça a entrevista.
Por mais que ela não gostasse da
atitude mordaz de Tom, uma parte dela
sabia que ele estava certo.
– Eu tenho um repórter pronto
para...
– Não. Não vou dar entrevista até
saber como Rafael está.
Duas ambulâncias e três carros de
bombeiros já cercavam o carro
destruído.
Marco de Cervantes estava de pé a
certa distância, ignorando a todos, com
seu impressionante físico firmemente
plantado no chão, as mãos cerradas e o
olhar inabalável fixo em seu irmão. O
coração de Sasha se apertou com mais
força.
Por favor, esteja vivo, Rafael. Não se
atreva a morrer...
O olhar severo de Tom se suavizou
um pouco.
– Vou preparar alguma coisa
enquanto esperamos. Encontre um
lugar calmo. Recomponha-se. Esta é a
oportunidade pela qual você estava
esperando, Sasha. Não a desperdice.
MARCO DE Cervantes entrou no quarto
de hospital em Budapeste, com um
pavor em seu estômago. Ele cerrou os
punhos para parar o tremor em suas
mãos e forçou-se a caminhar para a
cabeceira de seu irmão. A cada passo, a
cena do acidente se reproduzia em sua
mente na forma de um pesadelo vívido,
horrível, que não iria parar. Havia
muito sangue no local do acidente...
Muito sangue...
Seu peito se apertou quando ele viu o
lençol branco puxado sobre o peito de
seu irmão.
Distraidamente,
ele
fez uma
observação para que os funcionários
substituíssem os lençóis por lençóis
verdes, a cor favorita de Rafael. Lençóis
hospitalares
brancos
pareciam...
Cheiravam... A morte.
Rafael não estava morto. E se
dependesse de Marco, aquela seria sua
última aproximação sem sentido com a
morte. Já era o suficiente.
Ele se emparelhou com a cama e
olhou para o rosto pálido do irmão.
Para o tubo inserido na boca, para
ajudá-lo a respirar.
Já era o suficiente.
A garganta de Marco estava fechada.
Ele havia escolhido dar a Rafael um
tempo para que recobrasse seus
sentidos, em vez de forçá-lo a ouvir a
razão. E, ao fazer isso, ele permitiu que
seu irmão assumisse o volante do carro
mais poderoso do mundo, enquanto
ainda se recuperava de uma rejeição
emocional.
Ao contrário dele, seu irmão nunca
fora capaz de separar as diferentes áreas
de sua vida, suprimir emoções
supérfluas que o levam a julgamentos
desnecessariamente nebulosos. Rafael
fundia felicidade, tristeza, vitória e
derrota, formando uma bagunça.
Adicione à mistura um carro de corrida
de 750 cavalos de potência e mais uma
vez ele era o incumbido de catar os
cacos.
Sua
respiração
estremeceu.
Estendendo a mão, ele pegou a mão
imóvel de Rafael e inclinou-se até que
seus lábios pairassem a uma polegada
da orelha de seu irmão.
– Você vai sobreviver, está me
ouvindo? Juro por tudo que é sagrado,
se você morrer eu vou segui-lo até o
inferno – esbravejou ele. – E eu sei que
você vai estar no inferno, porque com
certeza não vai para o céu com aqueles
olhares.
Sua voz falhou e lágrimas rolaram.
A mão de Rafael permanecia imóvel,
morna. Marco a apertou com mais
força, tentando desesperadamente
bloquear as palavras do médico... Seu
cérebro está inchando... Há hemorragia
interna... Nada a fazer a não ser
esperar...
Amaldiçoando, ele saiu de perto da
cama. A janela do moderno hospital
particular dava para um pátio sereno,
com fontes e flores com a intenção de
acalmar o paciente com problemas.
Marco não encontrava consolo na
vista. Sobretudo quanto avistou os
paparazzi perto do hospital com as
poderosas lentes treinadas para atacar.
Passando a mão pelo cabelo, ele
voltou
para
perto
da
cama,
concentrando-se na televisão, e viu o
acidente de Rafael novamente em
câmera lenta.
Sentiu um gosto amargo na garganta.
Após achar o controle remoto, viu outra
imagem na TV e sentiu o ódio subir-lhe
à cabeça. Cinco minutos depois,
desligou o aparelho.
– Eu sei que você provavelmente iria
discutir comigo, mi hermano, mas teve
sorte de escapar. Em mais de um
sentido.
Agradeceu aos céus por seu irmão
não ter ouvido a entrevista que havia
acabado de passar. Marco sabia do que
as pessoas eram capazes em sua busca
por fama e poder e o olhar de ambição
nos olhos de Sasha Fleming fez seu
peito arder em fúria e sua pele arrepiar.
Se ela queria um gostinho do poder,
ele daria a ela. Deixe-a ter o gostinho,
assim como deu o gostinho de si mesma
a Rafael.
Então, da mesma forma que ela
insensivelmente deixou Rafael de lado,
Marco se encarregaria de arrancar dela
tudo o que sonhava.
– DESCULPE-ME, VOCÊ pode me dizer em
qual quarto está Rafael de Cervantes?
Sasha disse com a autoridade que
conseguiu, apesar de saber claramente
que ela não deveria estar ali.
A enfermeira lhe lançou um olhar.
– Você é da família?
– Não, mas eu queria ver como ele
está. Ele era... É meu companheiro de
equipe.
– Companheiro de equipe...? Você é
Sasha Fleming!
Sasha incorporou
seu
sorriso
ensaiado.
– Sim – murmurou.
– Meu sobrinho ama você. Ele finge
que não, mas sei que ele acha você o
máximo. Ele vai ficar feliz quando eu
lhe disser que conheci você.
– Obrigada. Então, posso ver Rafael?
Serei breve, prometo.
– Desculpe, srta. Fleming. Você não
está na lista de visitantes autorizados.
Sasha limpou a garganta.
– Marco de Cervantes está aqui?
Talvez eu possa perguntar a ele.
Sasha tirou a imagem da frieza
implacável de Marco de sua mente. Ela
estava ali por Rafael. Certamente, como
sua companheira de equipe, seu irmão
não iria barrá-la.
– Não, ele saiu há meia hora.
– Ele foi embora?
A enfermeira assentiu.
– Ele não parecia muito feliz, mas
considerando as circunstâncias, acho
que é de se esperar.
Por um momento, Sasha se
perguntou se a enfermeira abriria uma
exceção. Mas desistiu.
Com o coração pesado, ela se voltou
para a porta do elevador, que estava
aberta, como se para tirá-la dali o mais
rápido possível.
– Espere.
A enfermeira acenou com um
movimento rápido.
– Talvez eu possa deixar você entrar
escondida por alguns minutos –
sussurrou ela.
Sasha se sentiu aliviada.
– Ah, muito obrigada!
– Você se importa de assinar um
autógrafo para o meu sobrinho?
Uma pontinha de culpa a atravessou,
mas a necessidade de ver Rafael
superou o sentimento. Com um sorriso
agradecido, Sasha pegou a caneta
oferecida.
– O QUE diabos você está fazendo aqui?
Sasha se virou com a voz áspera e
engasgou com a figura escura
enquadrada na porta. Há poucos
minutos, a enfermeira havia dito... Um
rápido olhar para o relógio confirmou
sua suspeita. Ela estava ali há quase
uma hora!
– Eu lhe fiz uma pergunta.
– Eu vim ver Rafael. Não havia
ninguém aqui...
– Então você pensou que poderia
entrar sem que ninguém soubesse?
– Quase! A enfermeira...
– A enfermeira o quê?
Marco avançou para o quarto, sua
presença formidável diminuiu o espaço.
Ela ficou de pé, mas ainda tinha que
inclinar a cabeça para ver seu rosto.
A expressão fria como aço secou sua
boca ainda mais.
Ela balançou a cabeça.
– Eu só queria ver como ele está.
– Há quanto tempo você está aqui?
Ela arriscou outro olhar para o
relógio e se encolheu.
– Será que realmente importa?
– Há quanto tempo? – rangeu ele,
com o olhar deslizando sobre seu irmão
como se avaliasse os danos.
– Por que você está olhando assim
para ele? Acha que eu o prejudicaria de
alguma forma? – desafiou ela.
Seus olhos castanhos se lançaram
para ela. Seu desprezo era evidente.
– Eu não acho! Eu sei que você já
prejudicou meu irmão.
Seu tom de voz era tão contundente
que Sasha se surpreendeu por ainda
estar inteira.
– Rafael lhe contou sobre a nossa
briga?
– Sim, contou. Só posso concluir que
a sua presença aqui é mais um truque
de mídia, não uma preocupação com
meu irmão.
– É claro que não!
– Foi por isso que a presença da
mídia nos portões do hospital dobrou
na última hora?
Seu olhar se desviou para a janela. As
persianas estavam fechadas contra o sol
de fim de tarde, mas não
completamente fechadas. Ela deu um
passo para olhar quando dedos de aço
se fecharam em seu pulso. Um calor lhe
subiu pelo braço. Foi uma reação tão
estranha que ela congelou.
– Se acha que vou deixar você usar o
meu irmão para promover seus próprios
objetivos,
está
redondamente
enganada.
Alarmada, ela olhou para ele.
– Por que você acha que eu faria
isso?
Um sorriso melancólico apareceu,
exibindo uma aparência tão assustadora
que ela estremeceu.
– A conferência de imprensa que
deu? Sobre o quanto você se importava
com ele? Como os seus pensamentos
estavam com ele e sua família? Sobre
como você está disposta a levantar a
equipe? Quais foram suas palavras
exatas? “Eu tenho a chance de correr em
tempo integral. Tenho provado que
tenho o necessário”.
Sasha engoliu em seco, incapaz de
desviar os olhos de seu olhar arrepiante,
mas estranhamente hipnótico.
– Eu... Eu não deveria ter... – O eco
do mal-estar que sentiu antes e durante
a entrevista retornou. – Eu não quis
dizer que...
– O que você quis dizer, então?
Como exatamente você, mera piloto
reserva, ganhou seu lugar na equipe?
Por que merece o lugar de Rafael e não
dos outros pilotos?
– Porque é a minha vez! Eu mereço a
chance.
Ela puxou seu braço capturado. A
mão dele apertou mais forte, enviando
outra onda de calor através de seu
corpo.
– Sua vez? Por quê? – desafiou ele,
novamente, aproximando-se, invadindo
seu espaço e sua capacidade de respirar.
– O que há de tão especial em você,
Sasha Fleming?
– Eu não disse que era especial.
– Não foi isso que entendi da coletiva
de imprensa. Na verdade eu deduzi
algo na linha de que a equipe estaria
cometendo um grande erro se você não
recebesse o posto de Rafael. Havia
ainda a ameaça velada de uma ação
judicial?
O pensamento de que aquela poderia
ser sua única chance de crescer na
equipe repercutiu no fundo de sua
mente, mesmo que ela se sentisse
enojada com a ideia de que o momento
era inapropriado.
– Nada a dizer?
Ela finalmente conseguiu puxar o
braço e deu um passo para trás.
– Sr. de Cervantes, este não é o
momento nem o lugar para discutir isto.
Seu olhar deslizou para Rafael, sua
garganta se fechou ao ver os tubos e o
bipe horrível das máquinas que o
mantinham vivo.
Marco seguiu seu olhar e congelou,
percebendo onde ele estava. Quando
seu olhar voltou para o dela,
vislumbrou um poço de angústia nas
profundezas castanhas e sentiu algo
amolecer. Marco de Cervantes, apesar
de suas palavras assustadoras e a
imposição de sua séria presença, estava
sofrendo. O medo do desconhecido, de
saber que a preciosa vida de alguém
que você ama estava por um fio era um
medo que lhe era dolorosamente
familiar.
Todos os pensamentos de seu
trabalho desapareceram enquanto ela o
observava lutar com sua dor. O desejo
de conforto, de um ser humano para
outro, momentaneamente superou o
seu instinto de autopreservação.
– Rafael é forte. Ele é um lutador. Ele
vai sair desta – murmurou ela.
Lentamente, ele respirou fundo, e
qualquer sinal de dor desapareceu. Seu
lábio superior se curvou em um sorriso
de escárnio.
– Sua preocupação é comovente, srta.
Fleming. Mas não precisa disto. Não há
câmeras aqui. A menos que tenha uma
escondida com você. – Seus olhos
deslizaram pelo corpo dela, estreitando
enquanto procuravam. – Será que
amanhã vou achar na internet imagens
do meu irmão no hospital?
– Isso é de mau gosto e repugnante
de se dizer – girando para longe, ela
correu para o sofá e pegou sua bolsa.
– Tanto quanto disputar seu lugar,
mesmo antes de saber ao certo se ele
estava vivo ou morto?
Sasha fez uma careta.
– Eu concordo. Não era o momento
perfeito para fazer uma entrevista.
Uma pitada de surpresa iluminou
seus olhos, mas seus lábios se firmaram
um segundo depois.
– Mas você fez, de qualquer maneira.
Culpar Tom teria sido fácil. E o
caminho mais covarde. A verdade era
que ela queria ser piloto principal.
– Eu pensei que estava agindo dentro
do interesse da equipe. E, sim, eu
também estava me colocando à frente
como a opção mais viável. Mas o
momento era errado. Por isso, peço
desculpas.
Aquele sorriso triste fez outra
aparição. Seu corpo estremeceu. Mesmo
antes de falar, Sasha teve a premonição
mais forte de que ela não iria gostar das
palavras que viriam a seguir.
– Você deveria ter tido mais tempo
para pensar, srta. Fleming. Porque,
como dono de equipe, eu finalmente
decidi o que é melhor para a Equipe
Espiritu. Não é você.
Marco passeou ao lado da cama de
seu irmão e ficou olhando para ele.
Sasha olhou para os dois. A
semelhança entre eles era marcante. No
entanto, eles não poderiam ser mais
diferentes. Enquanto Rafael era
selvagem e sociável, o irmão parecia um
vulcão adormecido. O temor de que ele
poderia entrar em erupção a qualquer
momento era uma ameaça muito real. E
deixava sua garganta seca e seu coração
disparado.
Finalmente, ele se virou para ela.
– A decisão é minha e só minha. Seu
tempo não estava errado. Estava
péssimo. O que também tornou minha
decisão incrivelmente fácil.
Seu coração parou.
– Que decisão?
– Tirá-la da equipe, é claro. – Seu
sorriso se expandiu. – Parabéns. Você
está demitida.
CAPÍTULO 2
– SAIA.
Sasha
permaneceu
congelada,
incapaz de atender o comando de
Marco de Cervantes. Finalmente, ela
forçou um suspiro.
– Não, você não pode fazer isto. Não
pode me demitir.
Em algum lugar no fundo da sua
mente, ela sabia que havia algo sobre
contratos e cláusulas... Mas seu cérebro
não conseguia pensar.
– Eu posso fazer o que eu quiser. A
equipe é minha.
– Sim, mas... – Ela respirou fundo e
forçou-se a se concentrar. – Sim, você é
dono da equipe, mas não é meu dono.
E você não pode me demitir. Eu não fiz
nada de errado. Claro, a entrevista
coletiva foi um pouco inoportuna. Mas
isso não é motivo para me demitir.
– Talvez eu tenha outros motivos.
– O que você está falando?
Marco olhou para ela por alguns
segundos. Então seu olhar deslizou para
seu irmão. Estendendo a mão, ele
cuidadosamente alisou o cabelo de
Rafael. A pungência do gesto e do
abrandamento momentâneo de seus
traços, machucou o coração de Sasha,
apesar de sua raiva por ele. Ninguém
merecia assistir a um ente querido
sofrer. Nem mesmo Marco de
Cervantes.
– Você está certa. A cabeceira do
meu irmão não é o lugar para discutir
isto.
– Está bem. Eu vou embora.
– Fugir? Seu passado lhe assusta, srta.
Fleming?
Ela engoliu, esforçando-se para
manter uma expressão neutra. Marco
de Cervantes não sabia. Ele não tinha
como.
– Eu não sei do que você está
falando. Meu passado não tem nada a
ver com o meu contrato com sua
equipe.
– Extraordinário – murmurou ele,
finalmente.
– O quê? – resmungou ela.
– Você mente tão bem. Nem mesmo
um cílio a trai. Não é à toa que Rafael
estava completamente apaixonado por
você. O que eu não entendo é o motivo.
Ele lhe ofereceu o que queria: dinheiro,
prestígio, um estilo de vida privilegiado
com que milhões sonham, mas apenas
poucos conseguem. Não é isso que
mulheres como você querem? A
oportunidade de viver no luxo
inimaginável de um castillo?
– Hum, eu não sei com que tipo de
mulher você anda, mas não sabe nada
sobre mim.
Incrivelmente, suas feições se
esfriaram.
– Eu sei tudo o que preciso saber.
Então, por que você apenas não ficou
com ele? Qual é o seu ponto de vista?
– Eu não tenho nenhum ponto de
vista...
– Chega de mentiras. Saia.
Seus olhos se voltaram para Rafael.
Sasha duvidava que fosse vê-lo
novamente.
– Diga a ele que eu vim vê-lo, por
favor?
– Com um pouco de sorte, no
momento em que o meu irmão acordar,
qualquer memória que ele tem de você
será varrida de sua mente.
Ela engasgou.
– Não sei exatamente o que Rafael
lhe disse, mas você realmente está
errado.
Marco deu de ombros.
– E você ainda está demitida. Adeus,
srta. Fleming.
– Por que razão? – desafiou ela,
esperando que desta vez sua voz saísse
com mais convicção.
– Tenho certeza que meus advogados
podem encontrar algo. Entusiasmo
inapropriado?
– Essa é uma razão pela qual você
deve me manter e não um motivo para
me demitir.
– Você acabou de provar que estou
certo. A maioria das pessoas sabe onde
traçar a linha. Parece que você não
sabe.
– Eu sei – ressaltou, erguendo a voz
junto com o nó apertado no peito.
– Esta conversa acabou.
Ele olhou incisivamente para a porta.
Ela saiu, sofrendo com o impacto de
suas palavras. Seu contrato era
hermético. Sasha tinha certeza disso.
Mas ela havia visto muitas equipes
descartarem motoristas perfeitamente
aptos e em condições, por razões muito
menores que as que Marco acabara de
lhe dar.
O pensamento de que ela poderia
perder tudo pelo que havia lutado
deixou sua boca seca. Ela lutou muito
pelo seu lugar na equipe de maior
sucesso na história do esporte. Ela se
sacrificou muito por muito tempo. De
alguma forma, tinha que convencer
Marco de Cervantes a mantê-la.
Ela se virou para enfrentá-lo e viu
um homem baixo de terno e com uma
expressão de bajulação correndo em
direção a eles. Ele entregou algo a
Marco e começou a falar em francês. O
crachá o anunciava como administrador
e o que dizia não estava tendo nenhum
efeito sobre Marco.
Marco o interrompeu. Quando o
administrador com surpresa começou a
olhar para a recepção, Sasha seguiu seu
olhar. A enfermeira que a deixou entrar
estava lá.
O administrador implorou de novo.
Marco o interrompeu de forma
contundente e dirigiu-se para os
elevadores.
Sasha correu atrás dele. Ao passar
pela recepção, ela vislumbrou a angústia
nos olhos da enfermeira. Outra onda de
pavor cruzou seu corpo, dando-lhe mais
impulso para correr atrás de Marco.
– Espere!
Ele apertou o botão do elevador.
Longe das luzes baixas do quarto do
hospital, Sasha o viu de verdade pela
primeira vez. Íntimo e pessoal, Marco
de Cervantes era impressionante.
Principalmente para quem gosta de
homens altos, imponentes e com uma
masculinidade pungente.
Foco!
– Podemos conversar, por favor?
Ele a ignorou. O elevador chegou e
ele entrou. Sasha correu atrás dele.
Quando as portas fecharam, viu a
enfermeira explodir em lágrimas.
Indignada, ela se virou para ele.
– Meu Deus. Você fez aquela
enfermeira ser demitida, não foi?
A raiva dissolveu seu instinto de
autopreservação e levou junto a
sensação estranha que ela se recusava a
reconhecer que era atração.
– Eu apresentei uma queixa.
– O que, vindo de você, é o mesmo
que mandar o administrador despedila!
– Ela tem que viver com as
consequências de suas ações.
– Portanto, não há meio-termo? Sem
misericórdia?
– Você não estava na lista de
visitantes autorizados. Ela sabia disso e
não o considerou. Você poderia ser
uma jornalista de algum tabloide.
Poderia ser qualquer um.
Seus olhos se estreitaram e Sasha
forçou neutralidade em sua expressão.
– Ou talvez ela soubesse exatamente
quem você era.
Ela abaixou as pálpebras conforme a
culpa tomava conta de seu rosto.
– Claro – provocou ele baixinho. – O
que você ofereceu a ela? Entradas grátis
para a próxima corrida?
Erguendo a cabeça, ela encontrou
seu olhar.
– Sabe, seu irmão estar gravemente
ferido não lhe dá o direito de destruir a
vida de outras pessoas.
– Perdão?
– Agora você está sentindo dor e
atacando, querendo que toda e
qualquer pessoa pague pelo que está
passando. É compreensível, mas não é
justo. Essa pobre mulher está agora
desempregada só porque você está com
raiva.
– Essa pobre mulher abusou de sua
posição e quebrou a política do hospital
para ganho pessoal. Ela merece.
– Não era para ganho pessoal. Ela fez
isso pelo sobrinho. Ele é fã. Ela queria
fazer algo de bom para ele.
– Meu coração está sangrando.
– Você faz o mesmo, e mais, para
milhares de fãs de corridas todos os
anos. O que há de tão diferente nisso?
Mais uma vez ela vislumbrou sua
fúria.
– A diferença, srta. Fleming, é que eu
não comprometo a minha integridade
para tal. E não coloco ninguém em
perigo só para conseguir o que quero.
– E a compaixão?
– Não tenho.
– Você vai acordar em breve
arrependido de suas ações hoje.
As portas do elevador abriram para
revelar o estacionamento subterrâneo,
onde o motorista aguardava perto de
seu carro, mas Marco não fez nenhum
movimento em direção a ele. Em vez
disso, olhou para ela com uma
expressão assustadoramente sombria.
– Lamento muito pelo que aconteceu
nas últimas 24 horas, ver meu irmão se
acidentar na pista de corrida porque
acreditava estar com o coração partido.
Uma coisa a mais não fará diferença.
– Você está se deixando levar pelas
emoções.
– Emoções? Eu não sabia que você
era a psicóloga da equipe.
– Zombe de mim o quanto quiser.
Isso não muda o fato de que você está
agindo como...
– Vamos, agindo como o quê?
– Como... Bem, como um idiota.
– Desculpe?
– Sinto muito. Você perguntou.
A raiva consumiu seu corpo. Sasha
preparou-se para a explosão em sua
cabeça. Em vez disso, ele deu um
sorriso triste.
– Já fui chamado de coisa pior. Esteja
avisada, minha doação muito generosa
a este hospital depende de você não
chegar perto do meu irmão novamente.
– Não pode fazer isso. Se você não
me ouvir, eu... Vou falar com a
imprensa novamente. Eu vou contar
tudo!
– Ah, estou contente de finalmente
conhecer você de verdade, srta.
Fleming.
– Dez minutos. É tudo que eu peço.
Deixe-me convencê-lo.
– Confie em mim, chantagem não é
um bom começo.
– Foi só um blefe. Não vou falar com
a imprensa. Mas quero pilotar. E sou a
melhor substituta que você encontrará
para Rafael.
– Você se valoriza muito, não é?
– Sim, apenas deixe que eu prove que
estou certa.
Seu olhar se estreitou em seu rosto,
em seguida, fez uma varredura
preguiçosa sobre seu corpo. Como
piloto do sexo feminino em um esporte
predominantemente masculino, ela
estava acostumada a ser o centro de
atração de olhos masculinos. Havia
aqueles que procuravam sinais de falhas
como piloto, prontos para usar
quaisquer deficiências contra ela. Havia
os predadores que
procuravam
fraquezas simplesmente porque ela era
mulher e, portanto, considerada
incapaz. Os mais cruéis eram aqueles
que esperavam que ela falhasse porque
era filha de Jack Fleming. Esses eram os
que ela mais temia. E para os quais ela
jurava que provaria que estavam
errados. O olhar de Marco de
Cervantes era uma combinação de
todos esses multiplicado por mil. E
havia outra coisa.
Algo que fez sua respiração pesar.
Algo que deixou suas mãos úmidas e
eriçou seus pelos da nuca.
– Entre no carro.
Sasha olhou para o escuro e luxuoso
interior do carro e hesitou. Os
sentimentos que aquele homem
engendrava nela não eram de medo.
Em vez disso, ela sentia um risco
emocional, e se ele descobrisse seus
piores medos, os usaria contra ela. Não
podia deixar isso acontecer.
– Se você quer que eu a ouça, vai
entrar no carro. Agora! – disse ele, com
seu tom intransigente.
Ela hesitou.
– Não posso.
– Não posso não é algo que eu goste
de ouvir – rosnou ele.
– Minha moto. – Ele arqueou uma
sobrancelha. – Prefiro não deixá-la
aqui.
Ele não acreditou ao olhar para a
scooter verde e branca surrada
inclinando-se precariamente contra a
parede do estacionamento.
– Você veio aqui com aquilo?
– Sim. Por quê?
– Você está usando o par mais
revoltante de jeans que eu já vi e um
lenço que já viu melhores dias. Óculos
de sol grandes e não preciso ser um
gênio para adivinhar que você estava
fazendo alguma tentativa equivocada
de fugir dos paparazzi. Estou certo? E
ainda assim você viajou no modo mais
lento de transporte motorizado
conhecido pelo homem.
Ela ergueu o queixo.
– Mas aí está a beleza, você não vê?
Consegui chegar sem uma única lente
com foco em mim. Você, por outro
lado... Diga-me como eles reagem
quando você passa neste seu carro
monstruoso?
Sua mandíbula se contraiu e ele
olhou para ela.
– Exatamente. Não vou deixar minha
moto.
– A segurança aqui é...
– Inadequada, de acordo com você.
Afinal, eu consegui passar, não é?
Ele segurou a porta do carro.
– Entre no carro ou não. Eu me
recuso a discutir com você sobre uma
pilha de lixo.
– É o meu lixo e eu não vou deixá-lo.
– Chaves?
– Por quê?
– Romano levará a scooter para o seu
hotel.
Os olhos de Sasha se arregalaram.
Romano pesava pelo menos cem quilos
de puro músculo. O pensamento de
que ele ia montar em sua pobre scooter
a fez estremecer.
– E antes que você comente sobre o
tamanho de Romano, pare e pense
sobre seus sentimentos – acrescentou
Marco ironicamente.
Touché, admitiu ela em silêncio.
Ela relutantemente entregou as
chaves. Marco as arremessou para seu
guarda-costas e, em seguida, levantou
uma sobrancelha imperiosa para ela.
Com um suspiro de resignação, Sasha
entrou na limusine.
Conforme
o carro saía do
estacionamento, ocorreu-lhe que ela
não tinha ideia de onde Marco a estava
levando.
Apesar de sua expressão sombria, seu
perfil era incrivelmente cativante. Os
contornos esculpidos de seu rosto
captavam a atenção de qualquer
mulher.
Sob
a
camisa
de
algodão
discretamente cara aqueles ombros se
moviam inquietos. Ela seguiu o
movimento, o olhar deslizando sobre
seu peito, passando pelo abdômen e
pousando em seu colo. A protuberância
sob o zíper criou um redemoinho de
calor em sua barriga.
– Você já viu o suficiente? Ou será
que você quer um striptease lento?
Suas
bochechas
coraram.
Mortificada, ela rapidamente arrancou
os óculos de sol do alto de sua cabeça e
colocou-os em seu rosto.
– Eu... Você não disse para onde
estamos indo.
– Eu convoquei uma reunião com
Russell e o engenheiro-chefe. Vou
soltar as rédeas temporariamente para
que eu possa me concentrar em
transferir Rafael para a Espanha.
– Você vai levá-lo?
– Ainda não, mas a equipe médica
está aguardando. Ele será transferido
quando for seguro.
– Entendo.
– Entende? Você queria uma última
oportunidade de reunião e ainda assim
está perdendo tempo exibindo falsa
preocupação com o meu irmão.
Ela respirou fundo.
– A minha preocupação não é falsa.
Eu daria qualquer coisa para Rafael não
estar naquele lugar.
– Na minha experiência, qualquer
coisa é um preço muito alto. Portanto,
muito cuidado com sua escolha de
palavras.
Sasha passou a língua pelos lábios, de
repente, incapaz de respirar com a
expressão em seus olhos.
– Acho que eu não sei o que você
quer dizer.
O olhar nos olhos dele endureceu.
– Você realmente deveria tentar uma
profissão diferente. Suas habilidades de
atuação são altamente louváveis.
– Pilotar me cai muito bem, obrigada.
Para onde estamos indo, exatamente?
– Meu hotel.
– Seu hotel? – Ela repetiu
estupidamente. Seus sentidos, ainda se
recuperando depois de ter sido pega
olhando para Marco de Cervantes,
ameaçavam desaparecer. O pensamento
de
estar
sozinha
com
ele,
verdadeiramente sozinha, cobria sua
pele de ansiedade.
– Não acho que seja uma boa ideia.
– Não tem escolha. Você queria esta
reunião.
– O resto da equipe se perguntará
onde estou. Talvez eles devam saber.
– A equipe estará lá fora fazendo o
que eles fazem depois de cada corrida
de domingo. Indo de bar em bar e
experimentando as meninas locais.
– Eu não acho que eles estarão
fazendo isso hoje à noite. Por causa do
Rafael...
– Chame-os se quiser. Diga-lhes para
onde está indo. E o porquê.
As circunstâncias de seu passado
tornavam impossível fazer amizade com
alguém da equipe. Os sussurros
constantes pelas costas, as conversas
que paravam quando ela entrava em
uma sala, tudo isso tornava difícil
confiar em alguém.
Tom só se preocupava em quanto
suas ações impactariam sua carreira. A
única pessoa que havia se importado,
de verdade, era Rafael. Uma onda de
dor e pesar a invadiu.
Fingindo indiferença, ela deu de
ombros.
– Falo com eles mais tarde.
– Chegamos.
Sasha sentiu sua boca cair aberta pela
opulência do deslumbrante hotel. Toda
a atmosfera brilhava e cintilava debaixo
de um enorme lustre giratório, que
jogava sua luz sobre as pessoas
elegantemente vestidas.
Ela permaneceu em seu assento,
consciente de como estava vestida de
forma inapropriada em seus jeans.
– Saia. E tire os óculos e o lenço.
– Não podemos apenas falar no
carro?
– Não, não podemos. Nós dois
sabemos que você não é tímida, então
pare de desperdiçar meu tempo.
Ela poderia argumentar, defender a
sua reputação pessoal contra o rótulo
que Marco decidiu colocar nela, mas
duvidava que fizesse diferença.
A única arma que tinha para lutar
era seu talento atrás do volante.
O tempo de seu pai foi cruelmente
interrompido, carimbado por mentiras
cruéis que o destruíram e a roubaram
de uma pessoa que realmente a amava
e acreditava nela.
Apertando os dentes, ela ignorou sua
mão e saiu do carro.
MARCO ATRAVESSOU o saguão de
mármore. Atrás dele, ouvia o barulho
apressado de saltos, conforme Sasha
Fleming lutava para manter-se no
mesmo ritmo.
Ele acelerou. Queria que aquela
reunião acabasse logo para que pudesse
voltar para o hospital.
Por um único momento, Marco
agradeceu a Deus por sua mãe não
estar viva. Ela não poderia suportar ver
seu filho querido em coma.
Já foi ruim o suficiente para ela ter
que lidar com a dor e o sofrimento do
acidente de Marco há dez anos.
Ele sentiu uma profunda vergonha e
arrependimento por ter deprimido
tanto sua mãe. Por ter perdido a noção
da realidade na época. De forma tola e
egoísta, ele achava que estava
apaixonado. O sorriso ensaiado de uma
manipuladora o cegou a ponto de ele
jogar toda a cautela para o espaço e, no
processo, isso foi prejudicial à sua
família.
Sua mãe se foi, sua morte ainda era
um peso em sua consciência, mas Rafael
estava vivo e Marco estava obstinado a
certificar-se de não deixar um raio cair
duas vezes no mesmo lugar.
– Hum, o bar é para o outro lado.
Ele parou tão de repente, que ela
esbarrou nele. Marco franziu o cenho
para a sensação momentânea dos seios
dela contra suas costas e o calor
imprevisível que surgiu em sua virilha.
Todo o seu corpo se contraiu em furiosa
rejeição.
– Eu não discuto negócios em bares.
E duvido seriamente que você queira
que a nossa conversa seja ouvida por
mais alguém.
Virando as costas, ele caminhou até o
elevador que o levaria à suíte
presidencial.
Desde o acidente de Rafael que ele
estava lutando contra a escuridão,
lutando contra memórias que não
tinham lugar dentro daquele caos.
– Estamos indo para sua suíte? Ok...
– Vejo que esse pensamento não lhe
incomoda muito.
A vontade de atacar, ferir, corria
dentro dele.
Silenciosamente, ele admitiu que ela
estava certa. Enquanto Rafael estava
lutando por sua vida, ele não conseguia
pensar direito. O impulso de fazer
alguém pagar fervia sob a superfície de
sua calma.
E Sasha Fleming colocou-se na frente
e no centro de sua mira.
– Você está certo. Eu realmente não
quero que nossa conversa esteja nas
manchetes de amanhã.
– Então você não está com medo de
entrar na suíte de um estranho?
– Você é estranho? Pensei que fosse
apenas o gênio da engenharia da
equipe.
– Sou imune à bajulação, srta.
Fleming, e a qualquer outra forma de
coerção que atravesse sua cabecinha.
– Que pena! Eu estava prestes a
jorrar alguma informação nerd para
fazê-lo gostar de mim.
– Você estaria perdendo seu tempo.
Tenho uma equipe especialmente
selecionada para lidar com bajuladores.
Ela respirou fundo e baixou o olhar.
Marco pegou-se a analisar o ângulo
de seu queixo, a linha sensual de seus
lábios carnudos. Contra sua vontade,
outra onda de calor subiu por ele.
Jogou um balde de água fria mental
para superar.
Aquela mulher pertencia ao seu
irmão.
O elevador abriu diretamente na sala
de estar com vista para o Danúbio.
– Então, o que seria necessário para
convencê-lo a me manter? – Ela se
dirigiu a ele, sem tirar os olhos da visão
da janela.
– Você é conhecida por ter relações
com seus companheiros de equipe.
– Um companheiro de equipe. Há
muito tempo.
–
Ele
também
bateu
em
circunstâncias extremas e parou de
correr, não é verdade?
–
Ele
se
aposentou
do
automobilismo, sim.
– E o lugar dele foi então dado a
você?
Seus olhos se estreitaram.
– Você está passando dos limites, se
acha que tenho alguma relação com o
que aconteceu com Rafael.
– Não é curioso que você traga o caos
a cada equipe que participa? Você é
azarenta, srta. Fleming?
– Como ex-piloto, tenho certeza que
você está familiarizado com acidentes
de pilotos. É uma realidade do esporte.
Na verdade, não foi um acidente que
encerrou sua carreira?
Expulsando as memórias, ele cruzou
os braços.
– É a sua situação que me interessa,
não estatísticas. Você terminou com
esse outro cara antes de uma corrida.
Este parece ser o seu modus operandi.
– Lamento muito. Achava que você
administrava sua equipe com base no
mérito e na integridade, não em
rumores e hipóteses.
– Aqui está a sua chance de dissipar
os rumores. Como quantos outros
companheiros de equipe você já
dormiu?
– Eu tive um relacionamento com
um. Derek e eu saímos por um tempo.
Depois, acabou.
– Mas esse... Relacionamento foi
bastante turbulento, não é verdade?
Tanto que acabou destruindo a carreira
dele, enquanto a sua prosperava.
Ela bufou.
– Eu não diria que prosperava,
exatamente. Mas caminhava com suor e
sangue.
– Mas você começou a ser piloto
reserva da equipe. E terminou com ele
quando o lugar ficou vago para você?
– É óbvio que você fez a sua lição de
casa. Mas eu não vim aqui para discutir
a minha vida pessoal com você, porque
ela não lhe interessa.
– Quando ela se relaciona ao meu
irmão e à minha equipe, interessa sim.
E suas ações nos últimos três meses têm
envolvido diretamente Rafael. – Ele
estendeu a mão até a caixa que estava
sobre a mesa. – Sabe o que há nesta
caixa? – perguntou abruptamente.
– Não, como saberia?
– Deixe-me esclarecer. Ela contém os
objetos pessoais que foram encontrados
com Rafael quando ele foi tirado do
carro.
Ele abriu a caixa. O interior estava
manchado com sangue. O sangue de
Rafael.
Sangue que ele derramou por causa
daquela mulher.
Ele levantou uma corrente de ouro
com um pequeno crucifixo.
– Minha mãe deu isto a Rafael
quando ele tinha 13 anos de idade. Ele
sempre usa durante as corridas. Para
dar sorte.
Em seu rosto, tristeza e uma pitada
de culpa, talvez. Colocando a mão no
bolso, ele pegou outra caixa, quadrada,
de veludo.
Ela ficou tensa.
- Sr. de Cervantes...
Seus lábios se contorceram.
- Você não é tão talentosa assim.
Porque a sua expressão em seu rosto me
diz tudo que eu preciso saber. Rafael
pediu você em casamento, não foi? –
perguntou ele.
– Eu...
– Meu irmão pediu você em
casamento. E você insensivelmente o
rejeitou, sabendo que ele teria de correr
logo depois. Não foi?
CAPÍTULO 3
SASHA CERROU
os punhos. Mesmo de
longe, ela podia sentir a raiva de Marco.
Seu coração bateu loucamente no
peito. Ela abriu a boca, mas nenhuma
palavra saiu.
– Aqui está a sua chance de falar,
srta. Fleming. – Marco abriu a caixa
para revelar um grande e deslumbrante
diamante rosa no interior de um círculo
de diamantes brancos menores.
– Você rechaçou meu irmão ou não?
– perguntou ele, com a voz baixa e
perigosa.
Suprimindo um arrepio, ela disse:
– Você entendeu errado. Rafael não
me pediu em casamento...
– Mentirosa. – Ele fechou a caixa. –
Ele me mandou uma mensagem ontem
à noite. Você disse que não.
– É claro que eu disse que não. Ele
não quis dizer...
Ele continuou como se ela não tivesse
falado.
– Rafael pensou que estava apenas se
fazendo de difícil. Ele iria tentar
novamente esta manhã.
Ela observou as narinas de Marco se
dilatarem com a mais profunda raiva
enquanto esperava sua resposta. Ela
lambeu
os
lábios,
escolhendo
cuidadosamente suas palavras, porque
estava claro que Rafael, por suas
próprias razões, não dera a Marco todos
os fatos.
– Rafael e eu somos apenas amigos.
– Você está achando que sou idiota,
srta. Fleming? Realmente espera que eu
acredite que você viu jantares
românticos a dois em Londres ou a
viagem para Paris no mês passado como
gestos inocentes de um mero amigo?
Outra pontada de surpresa passou
por ela.
– Fui jantar com ele porque Rav... A
namorada deu um bolo nele.
– E Paris?
– Fomos para nos divertir.
– Divertir? E então começou a dançar
a noite toda em seus braços? E as outras
vezes que foram flagrados juntos pelos
paparazzi? – perguntou ele.
– Sei que vocês dois são próximos,
mas não acha que está tendo um
interesse pouco saudável na vida
privada do seu irmão?
Sua cabeça se sacudiu como se ela o
tivesse esbofeteado. Seus olhos se
escureceram e seus ombros se
enrijeceram com a contenção de uma
emoção sombria.
– É meu dever proteger meu irmão.
– Rafael é um homem adulto. Ele
não precisa de proteção.
– Então por que meu irmão, o atual
campeão mundial, que raramente
comete erros, deliberadamente enfiou o
carro na parte traseira de um carro mais
lento?
– O acidente não foi deliberado.
Ela se recusava a acreditar que Rafael
teria agido de forma imprudente.
– Rafael não iria colocar a si mesmo
ou outro piloto em perigo.
– Eu vejo meu irmão correr desde
que ele tinha 6 anos de idade. Sua
habilidade é lendária. Ele nunca teria
sofrido aquele acidente se estivesse com
a cabeça no lugar.
Sasha não poderia refutar a alegação.
– Talvez ele pensasse que conseguiria
fazer aquela manobra – prosseguiu ela
sem entusiasmo.
– Ou talvez ele não se importasse.
Talvez já fosse tarde demais quando ele
entrou no carro.
– Claro que não. Por que você diz
isso?
– Ele me mandou uma mensagem de
uma hora antes da corrida para dizer
que pretendia ter o que queria. A todo o
custo.
O sangue de Sasha congelou.
– Eu... Não, ele não poderia ter dito
isso! Além disso, ele não quis dizer... –
Ela não trairia a confiança de Rafael. –
Somos apenas amigos.
– Você é venenosa. O que quer que
mantenha sobre seus companheiros de
equipe, termina agora.
Deslizando a caixa contendo o anel
de noivado em seu bolso, ele voltou
para a mesa. Vários papéis estavam
espalhados.
– Seu contrato termina na próxima
temporada. Meus advogados verão
como será a compensação nos próximos
dias. Mas a partir de agora os seus
serviços não são mais necessários para a
Equipe Espiritu.
– Você está me demitindo por que
sou amiga do seu irmão?
Se ela tivesse que gritar como uma
alma penada, ela gritaria para Marco de
Cervantes ouvi-la. Depois de anos
suportando sussurros viciosos e
insensíveis, ela não seria demitida tão
facilmente. Não quando sua chance de
restaurar a reputação de seu pai e
provar seu próprio valor estava tão
próxima.
– Você quer parar por um momento
e pensar no quão absurdo é isto? Você
realmente quer continuar com isto?
– Isto o quê?
– O sexismo. Ou você vai demitir
Rafael também quando ele acordar? Só
para nivelar as coisas?
Seu olhar endureceu.
– Sou dono desta equipe há quase
uma década e ninguém jamais foi
autorizado a causar tanta perturbação
antes.
– O que quer dizer?
– Eu avisei a Rafael sobre você, há
três meses. Eu disse a ele que você seria
um problema. Que ele deveria ficar
longe de você.
– Como se atreve?
– Infelizmente, com Rafael, você só
tem que sugerir que há algo que ele não
pode
ter
para
fazê-lo
ansiar
desesperadamente.
– Você é inacreditável, sabia? Acha
que pode brincar com a vida das
pessoas!
– Acredite em mim, não estou
brincando. Cinco milhões.
Confusa, ela franziu a testa.
– Cinco milhões... Para quê?
– Para ir embora. Dólares, libras ou
euros. Realmente não importa.
– Você quer me pagar para desistir
do meu lugar? Para desaparecer como
algum segredo sórdido, simplesmente
porque eu me tornei amiga do seu
irmão? Do que exatamente você tem
medo, sr. de Cervantes?
– Vamos apenas dizer que eu tenho
experiência com mulheres como você.
– Poxa, eu pensava que era só mais
uma. Gostaria de elaborar sobre essa
afirmação impressionante?
– Para você vender a história para o
primeiro tabloide? Dispenso. Cinco
milhões. Para se demitir e ficar longe do
esporte.
– Vá para o inferno.
– É esta a sua resposta final? –
perguntou ele.
– Sim. Eu não preciso telefonar para
um amigo e não preciso pedir uma
audiência. Minha resposta final é: vá
para o inferno!
Ele concordou com a cabeça. Então,
caminhou pelo quarto, aparentemente
sem palavras. Por fim, ele passou as
mãos pelo cabelo despenteado com um
olhar sexy que ela não conseguia
ignorar.
Ela não merecia aquilo. Tudo o que
fez foi tentar ser amiga de Rafael, um
companheiro de equipe que parecia
estar lutando contra os próprios
demônios.
Depois de sua experiência com Derek
e a dor devastadora de perder o bebê
que não sabia estar carregando, ela
jurou nunca misturar negócios com
prazer. O ciúme de Derek conforme ela
subia no ranking das corridas corroeu
quaisquer sentimentos que tinha por
ele, até não sobrar nada.
Felizmente Derek nunca havia
descoberto a única coisa que poderia ter
usado contra ela. A memória secreta de
seu bebê perdido foi enterrada.
O sorriso e os modos encantadores
de Rafael abaixaram sua guarda,
fazendo-a revelar alguns detalhes sobre
seu passado. Sua amizade foi um
bálsamo para a existência solitária que
ela viveu enquanto filha de Jack
Fleming.
– Sabe, eu achei que Rafael tinha lhe
contado sobre o meu passado. Mas foi o
contrário, não foi? – perguntou ela.
– Pelo que me lembro, fui socorrer
Rafael de um arranhão ou outro. Ele é
insanamente apaixonado por todos os
aspectos de sua vida. Infelizmente os
perigos
deste
mundo
parecem
encontrá-lo. Quando tinha 11 anos, ele
descobriu cogumelos em um campo em
León e decidiu comê-los. Seu estômago
teve que ser bombeado ou ele teria
morrido. Dois anos mais tarde, ele
matou aula de seu colégio interno para
correr com os touros em Pamplona. Ele
foi ferido no braço. Não fosse por uma
doação substancial para a escola e
minha garantia pessoal de que ele iria
melhorar, ele teria sido expulso
imediatamente. Eu posso listar mais
uma dúzia de episódios. Ele assume
muitos riscos.
– Como piloto, tinha que ser assim.
Você não escalou o Everest sozinho há
cinco anos, depois de todos em sua
equipe voltarem por causa de uma
nevasca? Isso é uma imprudência das
grandes.
– Eu sabia o que estava fazendo.
– Ah, tudo bem. Que tal continuar
mais da metade do rali Londres–Dakar
com um braço quebrado?
– Como...?
– Eu disse que tinha informações
sobre você. Possui a equipe de
automobilismo mais bem-sucedida na
história do esporte. Eu quero dirigir
para você. Eu fiz a minha lição de casa.
– Muito impressionante, mas mesmo
antes de Rafael pilotar um carro de
corrida ele era... Muito nervoso.
– Se você tem que controlá-lo, então
por que o deixou correr? Por que o
dono da equipe compromete o seu
bem-estar?
– Porque a corrida está em nosso
sangue. É o que fazemos. Meu pai
nunca teve a chance de se tornar piloto.
Corri para ele, mas porque eu tinha
talento. O mesmo acontece com Rafael.
Nunca houve qualquer dúvida de que a
corrida era o nosso futuro. Mas é
também meu trabalho cuidar do meu
irmão. Para salvá-lo de si mesmo. Fazêlo ver além de seus desejos imediatos.
– Você já pensou que, talvez, se
deixá-lo cometer os próprios erros em
vez de tentar controlar sua vida, ele vai
se tocar, eventualmente?
– Até agora, não.
– Ele é um homem adulto. Quando é
que você vai cortar o cordão umbilical?
– Quando ele me provar que não vai
se matar.
– E você está tão certo de que pode
salvá-lo a cada momento?
– Eu posso tomar medidas de
segurança.
Ela riu de sua arrogância.
– Você não é onipotente. Não pode
controlar o que acontece na vida.
Mesmo se você pudesse, Rafael acabaria
ressentido por ter a vida controlada.
Os lábios de Marco se comprimiram,
suas pálpebras se abaixaram. Ela deu
outra risada.
– Ele já se ressente, não é? Vocês dois
brigaram? Foi por isso que você não
estava na pista neste fim de semana?
Ele ignorou as perguntas.
– O que eu faço é para o bem dele. E
você não é boa para ele. Minha oferta
ainda está de pé.
O homem era tão impenetrável
quanto a sua riqueza era imensurável.
No final, tudo o que ela podia contar
era com sua firme convicção do certo e
do errado.
– Você não pode me demitir
simplesmente para me manter fora do
caminho de Rafael. Não é ético. Eu
acho que em algum lugar lá no fundo,
você sabe disso também.
– Eu não preciso de uma orientação
moral de alguém como você.
– Discordo. Porque está cometendo
um grande erro se acha eu vou embora
tranquilamente.
– Rafael me disse que estava malhumorada.
O que mais Rafael disse a ele?
Decididamente desconfortável com a
ideia de ser o assunto da discussão, ela
deu de ombros.
– Eu não cheguei onde estou hoje
sem lutar. Não vou abaixar a voz –
ressaltou novamente.
Alguns minutos de silêncio se
estenderam.
– Sente-se.
MARCO ESCONDEU um sorriso triunfante.
Ele nunca teve a intenção de demitir
Sasha Fleming. Não de imediato. Ele
queria que ela ficasse no limite com a
possibilidade de perder o que era,
evidentemente, tão precioso para ela.
A sede de vingança dentro dele se
apaziguava ao vê-la abalada. Ele
também queria testá-la, para ver até
onde ela iria para lutar por aquilo que
queria. Afinal de contas, quanto maior
o valor, mais doce seria arrancar dela.
Assim como arrancaram dele há dez
anos.
Impiedosamente, ele afastou a
lembrança da traição de Angelique e
focou-se em Sasha enquanto ela
caminhava em sua direção.
Mais uma vez, seus sentidos reagiram
a ela de uma forma que fez sua
mandíbula se contrair. A atração era
abominável. Rafael estava em coma,
lutando por sua vida. A última coisa
que Marco queria reconhecer era uma
atração pela mulher que causou todo
aquele caos.
– Independentemente do estado da
equipe, eu tenho uma responsabilidade
com os patrocinadores.
Ela assentiu com a cabeça.
– Rafael deveria aparecer em vários
compromissos patrocinados durante o
mês de agosto. Eles vão querer saber o
que está acontecendo.
Antes que ele pudesse responder,
bateram em sua porta. Eram Russell
Latchford, seu segundo comandante, e
Luke Green, engenheiro-chefe da
equipe.
Russell se aproximou.
– Acabei de ver Rafael. – Ele parou
quando viu Sasha. – Sasha. Não sabia
que você estava aqui.
– A srta. Fleming está aqui para
discutir as possibilidades futuras em
função do acidente de Rafael.
Como chefe de equipe, era o trabalho
de Russell escolher os melhores pilotos
para a equipe, com a aprovação final de
Marco. Ele viu o seu descontentamento,
mas Russell não disse nada.
– Você trouxe a lista que pedi? –
perguntou Marco a Russell.
– Eu já abordei discretamente os
cinco melhores, mas todos os pilotos
querem dirigir para nós e a quebra dos
contratos sairia caro. Um corredor de
equipes secundárias poderia ser mais
barato.
– Nossos patrocinadores acordaram o
pacote: Rafael e o carro. Não quero um
piloto de segunda classe.
Eu preciso de alguém igualmente
talentoso e carismático.
– Há também o problema da
limitação dos testes na temporada. Não
podemos simplesmente colocar um
novíssimo motorista no meio da
temporada e esperar que ele lide com o
carro como Rafael – disse Luke.
– Não, Rafael é insubstituível. Como
está o ex-campeão que se aposentou no
ano passado? Já entrou em contato com
ele?
Russell balançou a cabeça.
– Mesmo com a pausa de agosto, ele
não vai estar em forma quando a
temporada recomeçar em setembro.
– Então minha única opção é um
piloto de outra equipe?
– Não, não é. – A voz de Sasha era
baixa, mas intensamente poderosa e
rouca o suficiente para chamar a
atenção.
– Você tem algo a acrescentar?
Os ferozes olhos azuis dela se
voltaram para ele. Mais uma vez a força
do desejo era afiada, diferente de tudo
o que havia experimentado antes.
– Você sabe que sim. Eu conheço o
carro de dentro para fora. Eu sou o
piloto em todos os treinos de sexta-feira
desde a temporada passada. Acho que
sou a única maneira de você ganhar o
Mundial de Construtores. Além disso,
iria economizar muito dinheiro e litígios
desnecessários para conseguir um piloto
de outra equipe no meio da temporada.
Nos últimos treinos, meus tempos
foram quase iguais aos de Rafael.
Silenciosamente, Marco admitiu a
verdade de suas palavras.
Ele também sabia que corrida era
mais do que o carro certo nas mãos
certas.
– Sim, mas você está sob a pressão
dos treinos. Prefiro um motorista com
experiência real de corrida.
Russell limpou a garganta.
– Eu concordo, Marco. Acho que
Alan poderia ser uma opção melhor...
– Tenho superado sempre os tempos
de Alan, Luke sabe.
O encolher de ombros indiferente de
Luke deixou Marco irritado.
– Algum problema?
O outro homem pigarreou.
– Não é um problema, exatamente,
mas não sei como a equipe vai reagir a...
Você sabe...
– Não, eu não sei. Se você tem algo a
dizer, então diga.
– Ele quer dizer como a equipe vai
reagir a um piloto do sexo feminino –
declarou Sasha sem rodeios.
Recordando sua acusação de
sexismo, ele sentiu um surto de raiva.
Ele sabia das opiniões dos outros. Era
um
esporte
predominantemente
masculino, mas ele acreditava que
talento era talento, independentemente
do sexo.
O pensamento de que os principais
membros de sua equipe não
compartilhavam sua crença o irritou.
– Isto é tudo, senhores.
A surpresa de Russell era clara.
– Você precisa de tempo para
decidir?
Seu olhar se fixou no de Sasha. Mais
uma vez ele teve que forçar-se a não
olhar para os seus seios.
– Falarei com meus advogados pela
manhã. Informarei vocês da minha
decisão.
– Sr. de Cervantes... – começou
Sasha.
– Deixe-me esclarecer uma coisa. Eu
não estou recusando nada por causa de
seu sexo. Simplesmente por causa da
sua influência perturbadora dentro da
minha equipe.
– Ok. Mas eu queria...
– Preciso voltar para o hospital. Você
também saberá a minha decisão
amanhã. – Ele se virou para sair.
– Por favor. Eu... Preciso disso.
Um pedaço de seu cabelo preto
deslizou e cobriu metade do seu rosto.
Seus dedos coçaram para alisá-lo e
colocá-lo atrás da orelha para que ele
pudesse ver sua expressão.
– Por quê? Por que isso é tão
importante para você? – perguntou ele.
– Eu... Eu fiz uma promessa.
–Promessa? A quem?
Lentamente seus olhos subiram para
encontrar os dele.
– Não importa. Tudo o que você
precisa saber é que, se me der uma
chance, vou lhe dar o Mundial de
Construtores.
SASHA OUVIU o zumbido e amaldiçoou.
Como diabos uma vespa entrou em seu
quarto?
Dormir não foi uma tarefa fácil e
agora que tinha sido acordada por...
Seu telefone! Com um grito, ela
empurrou as cobertas e tropeçou
cegamente na bolsa que estava no chão.
– Ahn?
– Perturbei seu sono?
– Não – mentiu ela. – Que horas são?
– São nove e meia.
– O quê? Droga.
Ela não havia ouvido o despertador.
Mais uma vez.
– Você deveria estar em algum outro
lugar, srta. Fleming?
– Sim. Eu tenho que pegar um avião
de volta para Londres às 11. –
Felizmente ela não tinha um monte de
coisas para arrumar e o aeroporto era a
apenas dez minutos.
– Você pode querer rever este plano.
– E por quê?
– Tenho uma proposta para você.
Abra a porta.
– O quê?
– Abra a porta. Eu preciso olhar em
seus olhos quando descrever o meu
plano, assim não haverá nenhuma
dúvida.
– Você está aqui?
– Estou.
Sasha olhou para si mesma. De jeito
nenhum ela abriria a porta para Marco
de Cervantes vestida daquela forma.
– Eu... Você pode me dar dois
minutos?
– Tem cinco segundos.
– Não. Espere! – Mantendo o
telefone colado ao ouvido, ela correu
para a porta. Abrindo-a, ela colocou a
cabeça para fora, tentando proteger o
resto do corpo.
E lá estava ele, vestido com um terno,
com os impressionantes ombros ainda
mais imponentes.
– Posso entrar?
– Eu... Eu não estou vestida de forma
apropriada.
– Você tem o hábito de atender a
porta nua?
O calor se arrastou até seu pescoço e
invadiu seu rosto.
– Claro que não. Não estou nua.
– Prove.
– Tudo bem. Veja.
Quando seus olhos se voltaram aos
dela, Marco ficou sem ar. Seus olhos cor
de avelã ficaram escurecidos e sua
mandíbula se contraiu com mais força.
Ele parecia lutar contra uma emoção
assustadora.
Ela deu um passo para trás. Ele a
seguiu e fechou a porta.
O telefone caiu de seus dedos. Com a
boca seca, ela continuou recuando. E
ele continuou a segui-la.
– Eu faço questão de não acreditar
em rumores, mas parece que, neste
caso, os rumores são verdadeiros, Sasha
Fleming.
A maneira lenta com que proferiu
seu nome com um toque latino causou
arrepios em sua pele. Seus mamilos se
enrijeceram e o desejo enviou uma
onda úmida de calor para o ápice de
suas coxas.
– O que exatamente você acha que é
verdade sobre mim?
– O sexo é a sua arma – respirou ele.
– O único problema é que você a
controla não muito sutilmente.
– Perdão?
– Você precisa aprender a delicadeza
da sua arte.
– O que, em nome de Deus, você
está pensando?
– Nenhum homem gosta de ser
desafiado com sexo.
– Ou você é maluco ou está me
confundido com outra pessoa.
Ele continuou se aproximando.
Ela se recostou na cama e sentiu a
barra da camisa em suas coxas.
– Pelo amor de Deus, pare!
Ele parou, mas seu olhar persistia.
Sasha tinha certeza de que estava
prestes a entrar em combustão.
Desesperada, ela disse:
– Olhe... Imagino que Derek tenha
dito um monte de coisas desagradáveis
sobre mim quando nós terminamos.
Mas não sou o que... O que você acha
que eu sou.
– Mesmo que eu possa ver as provas
por mim mesmo?
Sasha arrastou-se para o lado da
cama e pegou o roupão.
Ela nunca seria uma das mulheres
que usavam a sua sexualidade para
seduzir os pilotos.
– Bem, não sei o que você pensa que
vê, mas o rumor não é verdadeiro.
Agora, será que podemos voltar para a
razão para a qual você veio aqui?
Suas palavras o despertaram.
Quando ele andou até a janela e
afastou a cortina, ela aproveitou para
amarrar o robe.
Ele se virou depois de um minuto
sem expressão.
– Eu decidi não contratar um novo
piloto. No meio da temporada não é
financeiramente viável. Além disso,
todos
eles
têm
contratos
e
compromissos de patrocínio para
cumprir.
– Então isto significa que eu tenho o
posto pelo resto da temporada?
– Você vai assinar um acordo
prometendo
honrar
todos
os
compromissos da equipe. Metade dos
patrocinadores concordou em deixá-la
cumprir os compromissos de Rafael.
– E a outra metade?
– Sem opção, eles vão concordar.
Meu pessoal está trabalhando neles.
Incapaz de conter a emoção
crescente, ela lutava para respirar.
Finalmente. A chance de ganhar o
respeito que tinha sido cruelmente
negado ela e tão insensivelmente
arrancado de seu pai.
– Eu... Agradeço – murmurou ela.
– Você não ouviu as condições.
– Eu concordo. Seja o que for, eu
concordo. – Ela não deixaria essa
oportunidade passar por ela.
– Ontem você prometeu que daria
qualquer coisa para que Rafael não
estivesse no hospital. Hoje você está
concordando com condições que
desconhece. Você é sempre tão
imprudente?
– Eu... Fale as condições.
– Gracias. Além de outros
compromissos, há dois em que estou
particularmente interessado. A Equipe
Espiritu tem que ganhar o Mundial de
Construtores. Estamos com oitenta
pontos de vantagem sobre o segundo
colocado. Espero que esses pontos só
aumentem. Entendido?
– Absolutamente.
– A segunda condição...
– Espere. Eu tenho uma condição
também.
– Déjà vu. Suponho que não devesse
estar surpreso.
Sasha o ignorou.
– Se... Quando eu ganhar o Mundial
de Construtores, quero que meu
contrato com a Espiritu seja prorrogado
por mais um ano.
– Vencer um campeonato significa
muita coisa para você?
– Sim, significa.
A tensão na sala aumentou.
– Muito bem. Se ganhar o Mundial
de Construtores, prorrogo o seu
contrato por mais um ano.
Ela não podia acreditar que ele tinha
concordado tão facilmente.
– Uau, foi fácil.
– Talvez seja porque eu não acredito
em discutir cada tópico exaustivamente.
Meu tempo é precioso.
– Sim, claro...
– Como estava dizendo, antes de ser
interrompido, minha segunda condição
é mais importante, srta. Fleming, então
preste atenção. Você não terá nenhum
contato pessoal com nenhum membro
masculino da equipe, você não vai
chegar perto do meu irmão. Qualquer
sinal de uma relação não profissional
com outro piloto ou alguém do esporte
e você estará imediatamente demitida.
CAPÍTULO 4
– SE VOCÊ terminou o café da manhã,
vou levá-la para um tour na pista de
corrida.
Sasha olhou por cima de seu prato
quase vazio para encontrar Marco na
porta que ligava a grande sala de estar
ao terraço da Casa de Leon.
Com suas paredes de estuque branco,
telhados de ardósia e grandes janelas, a
Casa de Leon era o sonho de qualquer
arquiteto. Lá fora, uma vista verde sem
fim, com jardins perfeitamente bemcuidados.
Percebendo que Marco esperava uma
resposta, ela desviou o olhar das longas
e musculosas pernas envoltas em calças
escuras.
– Claro. Só vou terminar o meu café.
Não quer nada?
Ele
veio
em
sua
direção,
poderosamente elegante e masculino.
– Vou tomar um café também.
Quando ele se sentou e não fez
nenhum movimento, ela levantou uma
sobrancelha.
– Sim, chefe. Com açúcar, chefe?
Seus olhos castanhos brilharam e
Sasha teve a nítida sensação de que ele
estava se divertindo.
– Puro?
– Sí. Duas colheres de açúcar.
– Engraçado, não achava que você
era do tipo que tomava com açúcar.
– E como você achava que eu
gostava?
– Puro, fervente e amargo.
– Porque minha alma é amarga?
– Ei, você que está dizendo.
– Gracias.
Ele pegou uma colher de prata e
agitou sua bebida, o pequeno utensílio
parecia muito delicado em sua mão.
Sasha se viu seguindo o movimento,
com o olhar percorrendo seus cabelos
escuros e curtos. Tentando não se
hipnotizar, ela pegou a xícara com a
mão decididamente trêmula.
– Como você está? – perguntou ele.
– Você realmente quer saber?
– Já deveria saber que eu nunca
pergunto nada que não queira saber.
– Estou bem. Tenho tudo o que
preciso aqui. Obrigada. Como Rafael
está?
O olhar de Marco esfriou.
– Eu concordei em ficar longe dele.
Não concordei em parar de me
preocupar com ele.
– A mudança de Budapeste correu
bem. Ele está agora sob os cuidados dos
melhores médicos espanhóis em
Barcelona.
– Já que você provavelmente vai
querer arrancar minha cabeça se eu
pedir para que mande cumprimentos,
deixe para lá. A pista é longe?
– Três quilômetros ao sul.
– É grande?
– Tudo ao redor. Cerca de 65
quilômetros quadrados.
– E você e Rafael são donos de tudo
isso?
– Sí. Pense, se você tivesse dito sim
tudo isso teria sido seu.
Ela não precisava perguntar o que ele
queria dizer.
– Bem, eu não sei. A pista de corrida
teria sido útil, mas o que diabos eu faria
com o resto do... O que mais há, afinal?
– Há um vinhedo em pleno
funcionamento e uma adega. E os
estábulos abrigam alguns dos melhores
puros-sangues da Andaluzia na
Espanha. Há também um exclusivo
resort e um spa no outro lado da
propriedade.
– Bem, tudo seu, então. Meu paladar
é atrozmente comum, sem contar que
se eu beber mais do que um copo de
vinho, fico com uma dor de cabeça
violenta. Quanto aos puros-sangues...
Não sei montar. Então, realmente, você
está muito melhor sem mim em sua
família. O spa parece bom, no entanto.
Uma menina pode sempre fazer uma
massagem nos pés depois de um árduo
dia de trabalho, embora eu ache que a
graxa das minhas unhas iria
amedrontar a sua equipe do resort.
– Você é sempre tão jocosa ou treina?
– Normalmente eu escondo esse meu
lado. Só mostro quando me pedem com
muito, muito carinho. Com o declínio
da conversa, aceito a oferta do tour.
– Você está aqui para treinar.
Conhecer a pista de corrida faz parte
dessa formação. Vou deixar o corretivo
que você merece para outra hora.
– Obrigada.
Sasha o seguiu, mantendo firme o
silêncio. Sem deixar de olhar e estar
intensamente consciente do homem ao
seu lado. Seu cheiro assaltou-lhe as
narinas, observou a forte musculatura
de seu torso e seus ombros poderosos.
A julgar pelo seu alto nível físico, ela
não se surpreendia que Marco houvesse
sido campeão há dez anos.
– Por que desistiu de correr? Você
renunciou de forma tão abrupta, e
ainda assim é óbvio que se recuperou
totalmente após o acidente.
– Isto não é assunto para discussão,
srta. Fleming. E aconselho que não
fique pensando sobre isto. Entendido?
Do lado de fora, dois carrinhos de
golfe estavam lado a lado. Ela se dirigiu
para o mais próximo.
– Aonde você vai?
Ela parou.
– Pensei que íamos assim.
Ele acenou com a cabeça para o
heliporto, onde um helicóptero preto e
vermelho brilhava ao sol da manhã.
– Vamos de helicóptero.
– Alguma chance de você me deixar
pilotá-lo?
Ele lançou um sorriso sem alegria
para ela.
– UAU, ISTO é incrível! Há quanto
tempo você tem esta pista de corrida?
Marco levantou o olhar dos controles
do helicóptero, então imediatamente se
arrependeu. Era ruim o suficiente ouvir
a emoção canalizada diretamente em
seus fones de ouvido. Os efeitos visuais
foram ainda mais perturbadores.
Na maioria dos aspectos, sua calça
branca poderia ser descrita como quase
pueril. Ele havia saído com mulheres
que usavam muito menos. Sua camiseta
verde-claro também era muito prática.
Ao mesmo tempo, Marco achou a
combinação de seu entusiasmo e sua
proximidade... Assustadora. Ainda mais
quando se lembrava dela recostando-se
na cama no quarto de hotel, revelando
uma pele tão tentadora...
– Eu a construí há dez anos.
– Depois de se aposentar?
– Não, pouco antes.
Ele observou a centelha da
especulação em seus olhos.
– Pensei que ia passar mais tempo
aqui.
Ele tinha sonhos tolos sobre sua vida,
sobre como tudo parecia perfeito. Ele
tinha o carro perfeito, a mulher
perfeita. – O que aconteceu?
– Eu bati.
Sasha apontou para seis carrinhos de
golfe transportando mecânicos.
– O que eles estão fazendo?
– A pista não é usada há algum
tempo.
Eles
estão
realizando
verificações de última hora nas partes
móveis para garantir que estão seguras.
– Não acredito que esta pista pode
ser reformulada para simular outras
pistas do circuito. Mal posso esperar
para correr!
Marco não conseguia deixar de olhar
para ela. Seus olhos se iluminaram com
um sorriso.
– A pista foi construída antes de os
simuladores serem verdadeiramente
eficazes. Uma pista de concreto serviria
apenas para tornar um piloto
especialista em uma pista particular, por
isso projetei uma pista intercambiável.
A outra vantagem é a experiência
adquirida na condução no asfalto.
– Confie em mim, não estou
reclamando. É uma ótima ideia. Só
estou surpresa que outras equipes não
copiaram a ideia. Ou não venderam
seus primogênitos para usar a pista.
– Já fizeram ofertas.
– E então?
– Eu ocasionalmente permito que
eles usem a pista que projetei. Mas,
para o pacote completo, eles também
precisam do carro que projetei.
Uma pequena risada explodiu de
seus lábios. O som era tão
inesperadamente agradável que ele
perdeu momentaneamente a linha de
raciocínio.
– O que você disse?
– Eu disse que é uma estratégia
inteligente. Quanto o Cervantes
Conquistador custa? Dois milhões?
– Três.
Ela assobiou e inclinou-se para a
frente. Ele estava errado sobre a camisa
ser prática. Seus seios pressionados
contra o algodão e as mãos sobre as
coxas enquanto olhava para baixo...
Marco engoliu em seco.
Sasha Fleming não era um bom
presságio, lembrou-se.
Rafael havia se envolvido com ela e
se prejudicou gravemente. Marco não
tinha a intenção de seguir o mesmo
caminho. Seu único interesse nela era
ter certeza que ela ganharia o Mundial
de Construtores.
Com o helicóptero em terra, ele
arrancou os fones de ouvido. Marco
andou em direção a Luke Green. Seu
engenheiro-chefe iria controlar os
ajustes do treino inicial.
Sasha se aproximava e seu perfume o
atingiu. As entranhas de Marco se
contraíram. A presença dela estava se
tornando insuportável.
– Está tudo em ordem? – perguntou
ele.
Luke assentiu.
– Estamos prestes a descarregar o
motor. O mecânico irá verificá-lo para
ter certeza de que não foi danificado
durante o voo.
– Demora três horas no máximo para
montar o carro, poderei testar esta
tarde, não é? – perguntou Sasha.
– Não, você vai começar a treinar
amanhã de manhã – rosnou ele.
– Ah, mas se o carro está aqui...
– Os mecânicos estão trabalhando
desde o amanhecer. Este motor não é
usado desde dezembro. Ele vai ter que
passar por testes rigorosos antes que
esteja pronto para correr. Isso vai até o
anoitecer.
Ele se virou para Luke.
– Eu quero ver as leituras do motor
por hora e um relatório final de
telemetria quando você terminar de
testar.
– Claro que sim, chefe.
Agarrando o braço de Sasha, ele a
guiou para longe da garagem. Vários
olhos os seguiram, mas ele não se
importou.
Abrindo a porta do passageiro do
Conquistador, ele a empurrou e se
sentou atrás do volante.
– Por que tenho a sensação de que
você está com raiva de mim?
– Não é sensação.
– O que eu fiz? – perguntou ela.
Ele olhou para ela e encontrou seus
olhos deslumbrantes atirando fogo
contra ele. O azul de seu olhar era tão
intenso, tão vívido, que ele queria ficar
olhando para ela para sempre.
Agarrando o volante, forçou-se a se
acalmar.
– Marco?
Quando ele dera permissão para usar
seu primeiro nome?
Dios, ele estava perdendo a cabeça.
O olhar dela ficou sobre ele,
conforme acelerava o carro esporte
verde e preto.
Depois de alguns minutos, quando se
sentiu suficientemente calmo, ele
abrandou.
– Não é você.
Ela não respondeu.
– É este lugar.
– Este lugar?
Sua mandíbula se apertou quando
ele tentou em vão conter as memórias.
– Este é o lugar onde minha mãe
morreu há oito anos.
– Ah, meu Deus, sinto muito. Não
sabia. Você deveria ter dito alguma
coisa.
– As pessoas fora da minha família
não sabem. Prefiro assim.
Ele não tinha certeza por que disse a
ela.
Sasha deu um aceno rápido.
– Claro. Pode confiar em mim.
Sasha permaneceu em silêncio até
que ele parou na frente da casa.
– Como aconteceu? – perguntou ela
em voz baixa.
As lembranças eram muito vivas. Ele
não precisava fechar os olhos para ver
sua mãe rindo com a bajulação
descarada de Rafael, os olhos castanhos
suaves brilhando momentos antes de
sair correndo de casa.
– No vigésimo primeiro aniversário
de Rafael, meu pai comprou uma
Lamborghini. Comemoramos em uma
boate em Barcelona. Depois eu voei até
aqui no helicóptero com meus pais.
Rafael decidiu dirigir de Barcelona
cinco horas seguidas. Ele chegou logo
após o café da manhã. Tentei convencêlo a dormir, mas ele queria levar meus
pais para dar uma volta no carro. Rafael
era o menino de ouro da minha mãe. É
claro que ela concordou. – Marco
sentiu um pouco a dor escoar e tentou
contê-la. – Meu pai insistiu mais tarde
que foi o sol que afetou a visão de
Rafael quando ele virou a curva, mas
uma testemunha confirmou que ele fez
a curva muito rápido. Eu ouvi o
estrondo da garagem. No momento em
que a ambulância chegou, minha mãe
já havia ido embora.
– Ah, Marco, não!
A voz de Sasha era um som suave e
calmante. A dor interior diminuiu, mas
não desapareceu.
– Eu deveria ter evitado, deveria ter
insistido para que ele dormisse um
pouco antes de pegar o carro de novo.
– Você não poderia saber.
– Mas eu deveria.
Vagamente, Marco se perguntou por
que ele estava se abrindo daquela
forma. Para Sasha Fleming, entre todas
as pessoas.
– E seu pai? O que aconteceu com
ele?
– Ele perdeu o movimento do
pescoço para baixo. Ele está confinado
em uma cadeira de rodas e continuará
assim para o resto de sua vida.
SASHA SE chocou com a revelação.
Agora os motivos de Marco estavam
claros. Sua atitude protetora com
Rafael, sua reação ao acidente, de
repente tudo fez sentido. Ver sua mãe
morrer na pista de corrida que ele
construiu deve causar um inferno cada
vez que ele pisa ali.
Então, por que ele ia?
Marco de Cervantes era um
engenheiro extraordinário, que se
sobressaiu na construção de carros de
corrida surpreendentemente rápidos,
mas ele poderia facilmente ter ido
embora e concentrado seus esforços em
carros igualmente bem-sucedidos para
sheiks árabes e oligarcas russos.
Então, o que o levava a viver em um
mundo que certamente causava
memórias de cortar o coração?
Ela lentamente subiu as escadas e
entrou na casa, com a mente girando.
Após o banho, vestiu uma calça jeans
e uma camisa azul listrada. Prendeu o
cabelo e enfiou os pés em suas
rasteirinhas.
Enquanto
descia
as
escadas,
encontrou Marco e seu já familiar
olhar.
– O almoço vai demorar a ficar
pronto, mas se você quiser algo leve
antes, Rosario pode preparar alguma
coisa.
A governanta apareceu no corredor
enxugando as mãos em um avental
branco.
– Não, obrigada. Não estou com
fome.
Com um olhar, dispensou a
empregada. Seu olhar se voltou a ela.
– Receberei uma chamada de vídeo
de Tom Brooks, meu contato com a
imprensa, em cinco minutos. Posso usar
o seu escritório?
– Por que ele ligará?
– Ele quer ver a programação de
patrocínio do próximo mês. Posso lhe
mostrar, se quiser.
Ela deliberadamente manteve sua
voz leve, não combativa. Algo lhe dizia
que Marco de Cervantes estava
procurando briga.
Silenciosamente, ela sustentou o
olhar.
– Vou ajustar para você.
Ela o seguiu até a sala e ficou
atordoada com o estilo.
– Será que o designer caiu em um
túnel do tempo quando planejou este
ambiente?
– Esta era a sala do meu pai, seu
espaço pessoal. Ele nunca permitiu que
minha mãe o redesenhasse.
– Ele não esteve aqui desde que ela
morreu, e eu... Eu não sinto nenhuma
necessidade de mudar as coisas.
Um poço de empatia por sua dor
aumentou dentro de Sasha.
– Isso é uma cabeça de veado na
parede?
– Sim. De um líder de rebanho.
– Ah, entendo. Se tiver que ter uma
monstruosidade em sua parede, só
serve ser for o líder?
Ele lhe lançou um olhar irônico.
– Esse é o pensamento geral, sim.
– Ugh.
Ele a viu estremecer e seu sorriso se
alargou.
O calor explodiu em seu peito,
abrangeu todo o seu corpo e tirou seu
fôlego. Sasha descobriu que não se
importava. A necessidade de aproveitar
o calor do seu sorriso deslumbrante
superava a necessidade de oxigênio.
Mesmo quando outra voz se intrometeu
ela não conseguiu desviar o olhar.
– Olá? Você pode me ouvir, Sasha? –
A voz de Tom demonstrava sua
habitual impaciência.
O sorriso de Marco desapareceu.
– Estou aqui, Tom.
– Sente-se – disse Marco, atrás dela,
empurrando uma cadeira enorme.
Tom pigarreou.
– Ah, eu não sabia que você iria se
juntar a nós, sr. de Cervantes.
– A decisão foi de última hora. Siga
em frente – instruiu Marco.
– Hum... bem... Sasha, você tem uma
entrevista no site da equipe na próxima
sexta-feira. Enviei por e-mail as
perguntas para você. Vou precisar das
respostas na quarta-feira, para revisar e
obter a aprovação dos advogados. Na
sexta-feira à noite você tem o prêmio
Children of Bravery em Londres. Terçafeira é a sessão de fotografia da Strut, e
depois a sessão da Linear em Barcelona.
No Domin... Algum problema? –
perguntou ele, irritado quando ela
balançou a cabeça.
– Isso não vai dar certo. Não posso
passar todo esse tempo apenas com
eventos de patrocínio.
– Foi essa a programação que
planejei. Você vai ter que lidar com
isso.
– Sério, acho que faz mais sentido
agrupar tudo no mais curto espaço
possível tempo.
– Eu sou o responsável pela sua
agenda. Eu que tenho que saber o que
faz sentido.
– A srta. Fleming está certa. – A voz
profunda de Marco soou atrás de seu
ombro. – Vários eventos durante uma
semana
significa
muito
tempo
desperdiçado viajando. Você não
concorda?
– Mas os patrocinadores...
– Os patrocinadores precisam
trabalhar de acordo com sua agenda e
não o contrário. Eles podem ter de
quinta a sábado da semana que vem.
Caso contrário, eles vão ter que esperar
até o final do mês. A srta. Fleming está
de folga aos domingos. Seu trabalho é o
de gerir o tempo dela corretamente.
Faça acontecer.
E desligou.
– Sou perfeitamente capaz de
organizar meu próprio horário, muito
obrigada.
– Não parecia assim.
– Só porque você não me deu uma
chance.
– Eu não gostei do jeito com que ele
falou com você – declarou ele.
Seu coração deu uma guinada. Sasha
repreendeu o sentimento tolo, porém
quanto mais ela tentava afastá-lo, mais
ficava forte.
– Acho que ele não gosta muito de
mim.
– Por que não?
– Provavelmente pelas mesmas
razões que você. Ele não acha que eu
tenho que ser piloto. Ele acredita que é
um motivo de chacota por associação.
– Porque você é mulher ou por causa
de suas imprudências do passado?
– De acordo com você, dá no mesmo,
não é? – respondeu ela.
– Eu disse em Budapeste que o seu
sexo não tinha nada a ver com a minha
decisão de demiti-la. Seu talento como
piloto ainda está para ser visto. Prove-se
como a piloto talentosa que você
pretende ser e vai ganhar o seu lugar.
Até então, eu me reservo o meu
julgamento.
– Mas você é juiz, júri e carrasco,
quando se trata da minha vida pessoal?
Um brilho frio e hipnotizante surgiu
em seus olhos.
– Nós concordamos que você não
terá vida pessoal até que seu contrato
termine, não foi? Não estaria pensando
em renegar esse acordo tão cedo, não é?
Ela se privou de dizer que já não
tinha vida pessoal. Não depois das
mentiras de Derek e da perda de seu
bebê. Rafael tinha sido seu primeiro e
único amigo.
– Sasha.
O aviso enviou um arrepio por sua
espinha. Ela olhou para ele e reprimiu
um suspiro.
Quando ele chegou tão perto?
Dentro de seus olhos, ela podia ver os
feixes verdes em sua íris. Lindos. Ele
tinha olhos lindos. Olhos que a atraíam
e enfeitiçavam.
Ela respirou fundo.
– Não, Marco. Sem vida pessoal.
Nem mesmo um Labradoodle para
abraçar quando estiver sozinha.
– Um o quê?
– É um cachorro. Um cruzamento
entre labrador e poodle. Eu tinha um
quando era pequena. Mas ele morreu.
– Animais de estimação não têm
lugar no circuito de corridas.
– Eu não estava pensando em trazer
um para trabalhar. Enfim, é um ponto
discutível, uma vez que na minha
agenda não há lugar para um.
Seu celular vibrou em seu bolso. Ela
o pegou. Vendo o e-mail de Tom, ela se
virou para sair.
– Aonde você vai? – perguntou ele.
Ela fingiu um sorriso para esconder
suas emoções perturbadoras.
– Ah, eu pensei que a inquisição
tivesse acabado. Tom enviou as
perguntas da entrevista e eu queria
fazer logo para não ocupar o tempo do
treino.
Seu tom sarcástico não passou
despercebido.
– A inquisição acabou. Mas me
reservo o direito de persegui-la depois.
– E eu me reservo o direito de não
participar da sua caça às bruxas. Eu li o
contrato e assinei na linha pontilhada.
Sei exatamente o que é esperado de
mim e pretendo honrar nosso acordo.
Você pode me deixar ir em frente ou
pode me impedir e nos causar
problemas. A escolha é sua.
Ela saiu, de cabeça erguida.
MARCO NÃO voltou para o jantar. E
Sasha ficou na expectativa de que
aparecesse.
Luke deixou os resultados dos testes
do motor, sobre os quais ela se
debruçou. Depois, colocou roupas de
ginástica e correu pelos extensos
jardins.
Depois do exercício, Sasha vagou sem
rumo, para deliberadamente esvaziar
sua mente de lembranças tristes. Até
quase tropeçar em um edifício de piso
único.
Prestes a entrar, ela saltou com o
toque de seu telefone na noite
silenciosa.
Rapidamente, ela o pegou, mas ele
ficou em silêncio antes que ela pudesse
atender.
Olhando para o prédio escuro, ela
voltou. Seus passos ecoavam no piso de
mármore.
– Onde diabos você estava?
A voz de Marco estava amplificada
na escuridão.
– Eu fui fazer exercícios e depois
caminhar.
– Da próxima vez que você decidir
sair de casa por um longo período,
tenha a cortesia de informar ao pessoal.
Dessa forma, não vou precisar colocar
pessoas atrás de você.
– Aconteceu alguma coisa? – Ela deu
um passo em direção a ele, com o
coração
dando
um
mergulho
vertiginoso por ele não responder de
imediato.
– Marco?
– Sí, aconteceu – disse ele em tom
estranho.
Ele deu um passo em direção à luz e
Sasha reprimiu um suspiro ao ver o
olhar atormentado em seu rosto.
– Rafael... É Rafael.
CAPÍTULO 5
O MEDO invadiu seu coração, mas ela
se recusou a acreditar no pior.
– Ele está...? – Ela engoliu em seco e
reformulou. – Ele está muito mal?
Marco enfiou o telefone no bolso e
seguiu para a sala de estar. Ele pegou
uma garrafa de cristal e levantou uma
sobrancelha. Quando ela balançou a
cabeça, derramou um pouco de
conhaque em um copo e bebeu em um
gole rápido.
– Ele sofreu outra hemorragia
cerebral. Eles tiveram que realizar uma
pequena operação para aliviar a pressão.
Os médicos... – Ele balançou a cabeça,
com a força da emoção reprimida. –
Eles não podem fazer mais nada.
– Mas a operação funcionou, não foi?
Ela não sabia de onde vinha o
instinto de continuar falando. Tudo
que ela sabia era que Marco tinha vindo
à procura dela.
– A hemorragia parou, sim. E ele foi
colocado em coma induzido até que o
inchaço diminuísse.
Ela se aproximou, com o coração
apertado pela dor que ele tentava
esconder.
– Isso é bom. Vai dar tempo para que
ele se cure.
Seus olhos ficaram mais sombrios. Ele
olhou em volta, como se procurasse
uma distração.
– Eu deveria estar lá – rosnou ele. –
Mas os médicos pensam que estou em
seu caminho. – Bufou. – Um deles até
me
acusou
de
comportamento
irracional, simplesmente porque eu pedi
por uma terceira opinião.
Sasha prendeu a respiração enquanto
seu olhar se aguçou sobre ela.
– Nada a dizer?
– Ele é seu irmão. Você o ama e quer
o melhor para ele. É por isso que
contratou os melhores médicos para
cuidar dele. Talvez você precise deixálos sozinhos para fazer seus trabalhos. –
Ele parecia pronto para morder a cabeça
dela. – E se ele está na UTI, eles
provavelmente precisam manter o
ambiente o mais estéril possível.
Certamente você não quer nada que
comprometa a sua recuperação.
Sua careta se aprofundou e ele
desviou o olhar.
– Vejo que não só faz às vezes de
psicóloga, mas também de diplomata e
voz da razão.
Embora Sasha não gostasse de seu
cinismo, ela se sentiu aliviada de que
sua voz não era mais atormentada pela
angústia crua.
– Sim, sou eu. Senhorita mil-e-umautilidades – brincou ela.
Aqueles olhos que momentos antes
estavam angustiados congelaram de
forma implacável.
– Sí. Infelizmente esse aspecto de sua
natureza não funcionou bem para o
meu irmão, não é? Rafael precisava que
você fosse uma coisa para ele. E você
falhou. Miseravelmente.
– Eu tentei incutir um pouco de
razão nele...
Rafael não entendeu bem quando ela
mostrou o quão absurda era sua
proposta repentina. Ele saiu de seu
hotel em Budapeste na noite antes da
corrida e ela não teve a chance de falar
com ele antes de seu acidente.
Marco se virou e a encarou.
– Não me diga que... Você
convenientemente não teve sucesso? –
zombou ele.
– Porque ele não queria aquilo.
– Por que um homem que pede uma
mulher em casamento não iria querer
se casar?
Quando ela não respondeu de
imediato, sua carranca se aprofundou.
No final, ela disse:
– Por causa de... Outras coisas que
ele disse.
– Que outras coisas? – Veio a tréplica
dura.
– Coisas particulares. Achei que ele
estava reagindo ao seu último término.
Ele fez um aceno com a mão.
– Rafael e Nadia se separaram há
dois meses. Você está sugerindo que era
uma recaída? – perguntou Marco
ironicamente. – A taxa de recaída do
meu irmão é normalmente duas
semanas.
Sasha fez uma careta.
– Rafael mudou, Marco. Para você,
ele pode parecer o de sempre, mas...
– Você está dizendo que eu não
conheço meu próprio irmão? –
perguntou ele.
Lentamente, Sasha balançou a
cabeça.
– Estou apenas dizendo que ele pode
não ter contado tudo o que estava
acontecendo com ele.
Sua respiração ficou presa com o
brilho zombeteiro que surgiu nos olhos
de Marco.
– Sua mensagem me disse tudo que
eu precisava saber. Ao negar seu
pedido, você não lhe deu outra escolha
a não ser ir atrás de você.
– É claro que não!
– Mentirosa!
– Esta é a segunda vez que você me
chama de mentirosa, Marco. Para o seu
próprio bem, espero que não haja uma
terceira. Ou vou ter um grande prazer
em bater no seu rosto. Com ou sem o
maldito contrato. Não sei o que Rafael
fez com que você acreditasse, mas eu
não o enganei ou encorajei a se
apaixonar por mim, o que eu não acho
que ele tenha feito. E eu certamente
não o irritei o suficiente para causar o
acidente. Parece que os demônios com
que Rafael estava lutando, finalmente o
alcançaram. Estou cansada de me
defender. Eu estava apenas sendo
amiga dele. Nada mais.
Com o coração martelando, ela se
sentou em um dos sofás e respirou
fundo para acalmar as emoções
turbulentas que a percorriam. Emoções
que ela se empenhava em suprimir, mas
que Marco parecia despertar tão
facilmente.
– Acho que é difícil acreditar que
suas ações a tenham levado ao mesmo
caminho duas vezes.
– Uma infeliz coincidência, mas é
tudo. Eu tenho que viver com isso. No
entanto, eu me recuso a deixar você ou
qualquer outra pessoa me rotular como
algum tipo de femme fatale. Tudo o que
eu quero é fazer o meu trabalho.
Ele se sentou em frente a ela.
Quando seu olhar se desviou para seu
corpo, ela lutou para combater as
alfinetadas de consciência que ele
acendeu ao longo do caminho.
– Você é uma lutadora. Admiro isso
em você. Há também algo sobre você...
Uma qualidade desconhecida que acho
difícil de identificar. Você dificilmente é
uma femme fatale, como diz. A maneira
indiferente
se
vestir,
sua
impetuosidade, tudo aponta para uma
falta de feminilidade...
Uma faísca puramente feminina se
incendiou dentro dela.
– Muito obrigada.
– E normalmente eu nem diria que
você é o tipo de Rafael. No entanto, na
noite antes do acidente ele estava
ferozmente convencido de que você era
a mulher da vida dele. Não me
interprete mal, ele disse isso algumas
vezes no passado, mas desta vez eu
sabia que algo não estava certo.
Apesar de sua acusação, a simpatia
brotou dentro dela.
– Vocês dois brigaram? Foi por isso
que não veio para o treino de sextafeira?
Seu aceno com a cabeça mostrava
pesar.
– Perdi a cabeça quando ele pediu o
anel.
– Estava com você?
– Sim. Pertencia à nossa mãe. Ela não
deixou especificamente para nenhum
de nós, ela só queria que o primeiro de
nós a casar desse à sua noiva. Eu
sempre soube que iria para o Rafael já
que eu nunca pretendi... – Ele parou e
respirou fundo. – Rafael afirmou estar
apaixonado por muitas meninas, mas
esta foi a primeira vez que ele pediu o
anel.
– E você estava com raiva porque era
eu?
Sua mandíbula se apertou.
– Você poderia ter esperado até que
a corrida terminasse – acusou ele, com
a voz áspera de emoção.
– Marco...
– Ele teria a pausa de agosto para se
recuperar, em um iate em St. Tropez ou
atrás de uma estrela de Hollywood em
Los Angeles, como da forma habitual.
De qualquer maneira, ele teria chegado
de volta do circuito, sorrido para você e
chamado você de pequeña porque
esqueceu seu nome. Em vez disso, ele
está em uma cama de hospital, lutando
pela vida!
– Mas eu não podia mentir –
retrucou ela. – Ele não me queria, não
de verdade. E não estou aberta a um
relacionamento.
Certamente
não
depois... – Levantou-se rápido, mas já
era tarde demais.
Ele se levantou e a puxou, pegou seus
ombros em um aperto firme.
– Depois do quê?
– Não depois do meu histórico.
– Você quer dizer sobre o que
aconteceu com seu namorado anterior?
Ela assentiu com relutância.
– Derek me pediu em casamento um
pouco antes de eu terminar com ele. Eu
sabia há algum tempo que não estava
dando certo, mas me convenci de que
daria. Quando não aceitei seu pedido.
Uma semana depois ele me acusou de o
estar usando. Ele disse que eu só não
havia aceitado porque queria me
vender para a maior proposta.
Derek repetiu aquela afirmação a
cada chefe de jornal e de equipe que
ouvisse e a carreira de Sasha quase
acabou. Ela afastou as memórias
dolorosas.
– Rafael sabia que não havia jeito de
eu
me
envolver
com
ele
romanticamente.
Marco apertou mais seu olhar,
percorrendo o rosto dela como se
quisesse desenterrar a verdade. Sasha se
obrigou a permanecer imóvel, mesmo
que o toque das mãos dele fosse tão
quente que ela quisesse gritar com a
sensação.
– Você sabe a última coisa que eu
disse a ele? – murmurou Marco.
Com o coração dolorido por ele,
Sasha balançou a cabeça.
– Eu disse para ele parar de brincar e
crescer. Que ele iria desonrar a
memória de nossa mãe, tratando a vida
como seu playground pessoal. – Suas
pálpebras velaram seu olhar por alguns
segundos e sua mandíbula se apertou,
suas emoções estavam muito perto da
superfície. – Se alguma coisa acontecer
com ele...
– Não vai acontecer nada.
Sem pensar, ela colocou a mão em
seu braço. Os músculos rígidos estavam
flexionados sob seus dedos. Seus olhos
se voltaram para o rosto, em seguida,
para a boca. Uma sensação aguda
atravessou sua barriga, fazendo a
respiração parar.
Sasha sentiu uma corrente elétrica de
consciência, a manifestação mais
profunda da consciência intensa que ela
sentia quando ele estava por perto.
Conforto, assegurou a si mesma. Estou
lhe oferecendo conforto. Nada mais. Esta
necessidade de tocá-lo era apenas uma
reação passageira.
– Ele vai acordar e vai ficar melhor.
Você vai ver.
Com o rosto tenso e os olhos tristes,
ele lentamente deixou as mãos caírem.
– Tenho que ir – disse ele.
Sasha deu um passo para trás,
trêmula.
– Você está voltando para o hospital?
– Estou indo para Madri.
Sua barriga se contraiu com a ideia
da perda.
– Por quanto tempo? – perguntou ela
suavemente.
– Pelo tempo que levar para
tranquilizar meu pai de que seu
precioso filho não está morrendo.
O MODERNO capacete não era páreo para
o sol espanhol. Sasha sentou na cabine
do Espiritu DSI, o carro com que Rafael
havia vencido o campeonato do ano
anterior. Com os olhos fechados, ela
refez o contorno da pista de corrida
belga, ansiosa.
O suor escorria pelo seu pescoço,
apesar do ar frio dentro do carro.
Quando completou mentalmente o
circuito, ela abriu os olhos.
Eles queimavam por falta de sono.
Ela estava acordada desde antes do
amanhecer. Durante horas, enroscou-se
aos lençóis de cetim, incapaz de ignorar
o olhar angustiado no rosto de Marco.
Ou o calor do toque dele em seu corpo.
Firmando
seus
lábios,
ela
forçosamente limpou a mente.
Ela colocou as mãos com luvas à
prova de fogo ao redor do volante e
pensou no trajeto. Manteve a respiração
constante e finalmente conseguiu a
calma mental que precisava para
bloquear o barulho dos mecânicos e da
garagem.
Quando veio o sinal, ela saiu da
garagem para a pista. A adrenalina
corria por suas veias conforme o
poderoso carro vibrava embaixo dela.
Freando na primeira curva, sentiu as
forças que empurravam sua cabeça para
a esquerda e sorriu. Aquela batalha
com as leis da física dava uma emoção
extra conforme ela voava pela pista, a
sensação de liberdade a tornando
indiferente ao estresse em seu corpo
volta após volta.
– Você está sendo muito dura com os
pneus, Sasha.
A voz de Luke saiu em seus fones de
ouvido e ela imediatamente ajustou o
equilíbrio do carro para ajudar a
manobrar melhor nas curvas.
– Assim é melhor. Em condições de
corrida você vai precisar deles por, pelo
menos, 15 voltas. Não pode se dar o
luxo de usá-los em apenas oito. É cedo
ainda, mas as coisas parecem boas.
Sasha sorriu pelo respeito relutante
na voz de Luke.
– Como é que o carro está?
– Er... ótimo. Está ótimo.
– Ainda bem. Venha e vamos dar
uma olhada nos tempos de volta juntos.
Ela voltou para a garagem e
estacionou. Mantendo seu foco em
Luke conforme ele se aproximava dela,
Sasha saiu e tirou o capacete.
– Nós não podemos compará-lo ao
desempenho do DSII, mas a partir
desses números as coisas estão
parecendo muito boas.
Lendo os dados, Sasha sentiu um
burburinho de excitação.
– O DSII é bom em curvas lentas,
então eu deveria ser capaz de ir ainda
mais rápido.
Luke sorriu.
– Quando você tem o melhor
aerodinamicista do mundo como chefe,
tem uma vantagem inicial. Vamos ter
uma batalha nas seções retas, mas se
você mantiver esse desempenho
devemos lidar bem o suficiente para nos
manter à frente.
Mais uma vez ela pegou a nota
alterada em sua voz.
Embora ela tentasse não pensar nisso,
durante todo o dia e nos dias seguintes,
durante os treinos, Sasha sentiu
lentamente a mudança de atitude de
sua equipe. Eles começaram a falar com
ela com menos condescendência.
E a primeira vez que Luke pediu sua
opinião sobre como evitar o problema
de direção que surgiu, Sasha se obrigou
a conter as estúpidas lágrimas que
ameaçaram surgir.
MARCO OUVIU o carro enquanto descia
as escadas.
Passos leves soaram segundos antes
de a porta da frente se abrir.
A silhueta de Sasha contra a luz fez
faíscas de desejo dispararem.
Cerrando os dentes contra a
intensidade desse desejo, ele teve um
vislumbre de um ombro suave. Seu
cabelo sedoso escuro estava amarrado
em um nó descuidado no topo da
cabeça.
Ela era alta, esbelta e tinha as pernas
bem torneadas em seu jeans.
Fechando a porta, ela tirou as botas e
as chutou em um canto.
Ela se virou e tropeçou, com a
respiração ofegante.
– Marco! Droga, você realmente
precisa parar de se esconder em
corredores escuros. Quase me matou de
susto!
– Eu não estava me escondendo. –
Ele ouviu a irritação em sua voz e se
forçou a se acalmar. – Onde você
esteve? Eu liguei várias vezes.
– Eu saí para tomar um drinque com
a equipe. Eles vão viajar amanhã de
manhã e eu queria me despedir. Eu sei
que não fazia parte do contrato,
socializar com eles, mas eles insistiram e
teria sido grosseiro recusar.
O aborrecimento o abalou. A última
coisa que ele queria era discutir sobre a
equipe ou o acordo que havia feito com
Sasha Fleming. Dios, ele nem ao menos
sabia por que havia voltado. Ele deveria
estar com seu irmão.
– E você estava muito ocupada e
decidiu não atender o telefone?
– Eu acho que está sem bateria.
– Você acha?
– Está chateado comigo. Por quê?
Ninguém em sua vasta organização
global se atreveria a falar com ele
daquele jeito. E pior... Ele descobriu
que gostava.
Caminhando em sua direção, sentiu
o cheiro do perfume dela invadir suas
narinas. Marco se viu desejando se
aproximar ainda mais.
– Por que se preocupar em ter
telefone se você não pode garantir que
ele vai funcionar?
– Porque ninguém me liga.
Para um homem que comandava um
império de bilhões de euros de seu
BlackBerry,
Marco
achou
surpreendente sua observação.
– Ninguém liga para você?
– Meu telefone nunca toca. Acho
que você foi a última pessoa a me ligar.
Recebo mensagens ocasionais de Tom
ou Charlie, meu fisioterapeuta, mas
fora isso... Nada.
A perplexidade de Marco aumentou.
– Você não tem amigos?
– Obviamente nenhum deles se
importa o suficiente para ligar. E, antes
que você sinta pena de mim, estou bem
quanto a isso.
– Você está bem sendo solitária?
– Sendo sozinha. Há uma diferença.
Então, há outra razão para você estar
chateado comigo?
Ela ergueu o queixo de uma forma
desafiante que atraiu seu olhar.
– Não estou irritado. Estou cansado.
E com fome. Rosario já havia ido para a
cama quando cheguei.
– Ah, bem, isso é bom. Não a parte
de estar cansado e com fome. A parte
de não estar irritado. – Ela mordeu o
lábio, os olhos arregalados enquanto ele
se movia para ainda mais perto. – E
sobre Rosario... Espero que você não se
importe, mas eu disse a ela para não
esperar por mim.
Marco balançou a cabeça.
– Então, onde foi o drinque?
Ele se esforçou para manter a voz
casual.
– Em uma bodega perto da Plaza
Mayor, em Salamanca.
Ele balançou a cabeça, ansioso para
alisar o fio de cabelo que tinha caído na
têmpora dela.
– E você aproveitou a noite?
– Leon é bonito. Gostei de sair daqui.
– Você não gosta daqui?
– Eu não me importo com a
proximidade com a pista, mas eu estava
cansada de andar por aqui sozinha.
Marco endureceu.
– Você quer ir para o hotel com o
resto da equipe?
Ela pensou.
– Não. A equipe e eu estamos
quebrando o gelo, mas não quero me
tornar excessivamente próxima deles.
– Sábia decisão. Às vezes manter
distância é a única maneira de chegar à
frente.
– Você, obviamente, não pratica esse
dogma. Está sempre rodeado por uma
multidão.
– A Corrida X1 Premier é um esporte
de milhões de espectadores. Eu não
posso existir em um vácuo.
– Ok. Hum... Pode acender as luzes?
Parece que estamos criando o hábito de
conversar no escuro.
– Às vezes pode-se encontrar
conforto na escuridão.
Enfrentar a dura luz da realidade
após o acidente, há dez anos, o fez
desejar que tivesse ficado inconsciente.
A expressão satisfeita de Angelique
certamente o fez desejar a escuridão.
Sasha deu uma leve risada e os olhos
de Marco recaíram sobre seus lábios,
fazendo-o experimentar o desejo de
beijá-la.
– Qual é a graça?
– Ou você está com muita fome ou
está muito cansado, porque parece
muito enigmático.
Ele estava com fome. E não apenas
por comida.
– Eu poderia fazer um lanche. Você
quer?
– Você cozinha?
– Sim. Morar sozinha significava
aprender ou morrer de fome. Então, fiz
um curso intensivo de culinária, há dois
anos.
Abrindo a geladeira, ela começou a
retirar ingredientes.
– Sanduíche de rosbife? Ou se você
quiser algo quente eu posso fazer
macarrão carbonara.
Marco puxou uma cadeira, sem
conseguir tirar os olhos dela.
– Aceito o sanduíche.
– Ok.
Parte do sedoso cabelo escorregou
para acariciar seu pescoço.
Ela se moveu pela cozinha com
movimentos rápidos, eficientes. Em
menos de cinco minutos ela colocou um
prato e uma garrafa de água mineral na
frente dele. Marco deu uma mordida,
mastigou.
– Está muito bom.
Seu olhar de prazer enviou outra
onda de calor através dele.
Marco esperou até que ela se sentasse
em frente a ele.
– Então, há quanto tempo você mora
sozinha?
– Desde que... – Ela hesitou. – Desde
que meu pai morreu há quatro anos.
Ela desviou o olhar, mas não antes de
ele observar sombras de dor nas
profundezas azuis de seus olhos.
– E sua mãe? Ela não está por perto?
Ela balançou a cabeça e pegou o
sanduíche.
– Ela morreu quando eu tinha 10
anos. Depois disso, foi apenas meu pai e
eu.
A dor aguda de perder sua própria
mãe veio à tona. Impiedosamente, ela a
afastou.
– A equipe está se perguntando como
está Rafael – disse Sasha, puxando-o
para longe de seus pensamentos
perturbadores.
– Só a equipe?
Ela encolheu os ombros.
– Estamos todos preocupados.
– Sim, eu sei. Sua condição não
mudou. Eu atualizei Russell. Ele vai
falar com a equipe.
Ele não queria falar sobre o irmão.
Porque falar de Rafael só o lembrava do
motivo pelo qual aquela mulher que fez
o melhor sanduíche que ele já havia
provado estava sentada na frente dele.
– Como seu pai está?
Ele não queria falar sobre o pai
também.
– Viu o acidente do filho ao vivo na
TV. Como você acha que ele está?
Um flash de preocupação escureceu
seus olhos azuis.
– Será que ele... Que ele sabe sobre
mim?
– Será que ele sabe que a causa do
acidente de seu filho é a mesma pessoa
que toma o seu lugar? – Ele riu. –
Ainda não.
O olhar de Sasha procurou o seu,
quase implorando.
– Eu não causei o acidente, Marco.
Uma raiva frustrada queimou em seu
peito.
– Não?
Ela balançou a cabeça e o nó de seu
cabelo
finalmente
se
desfez
completamente. Escuros, sedosos e em
cascata sobre seus ombros. O desejo de
Marco surgiu como fogo em suas veias.
– Então, o que causou? Algo deve ter
acontecido.
Seus lábios se franziram. Seu olhar
estava relutante. Então ela suspirou.
– Vi-o logo antes da corrida. Ele
estava discutindo com Raven.
Marco franziu a testa.
– Raven Blass? Sua fisioterapeuta?
Ela assentiu com a cabeça.
– Tentei me aproximar dele, mas ele
se afastou. Eu pensei em deixá-lo se
acalmar e falar novamente após a
corrida.
Marco murmurou um palavrão. Ele
entrou na alcova em que estavam seus
vinhos.
– Preciso de uma bebida. Branco ou
tinto?
– Não posso. Já bebi uma cerveja.
Ela colocou uma mecha de cabelo
atrás da orelha.
Observando o movimento, ele teve
várias
ideias
incrivelmente
imprudentes. Estendendo a mão, ele
pegou a garrafa mais próxima.
– Não gosto de beber sozinho. Beba
um pouco comigo.
– O grande Marco de Cervantes está
admitindo um ponto fraco?
– Ele está admitindo que seu irmão o
deixa loco.
– Tudo bem. Eu ia acrescentar mais
20 minutos aos meus exercícios para
equilibrar as tapas incríveis que comi.
Acrescento meia hora.
O olhar de Marco deslizou sobre ela.
– Você está em boa forma.
Outra risada feminina doce se
formou em seus lábios.
– Charlie discorda de você.
Aparentemente o meu índice de massa
corporal está muito acima dos níveis
aceitáveis.
– Quantas horas por dia você faz
exercícios?
– Tecnicamente três horas, mas
Charlie me mantém até que eu grite de
agonia ou esteja prestes a desmaiar. Ele
normalmente para quando estou
completamente pingando de suor.
Todo o seu corpo congelou, preso
pela imagem do corpo tonificado de
Sasha suado.
Dios, aquilo estava ficando ridículo.
Ele não deveria estar se sentindo
daquela forma, especialmente não por
uma mulher que era como Angelique:
implacavelmente ambiciosa, que não se
importa com nada que estivesse em seu
caminho. Sasha quase destruiu seu
irmão da maneira como Angelique
havia destruído o desejo de Marco de
estabelecer uma relação duradoura.
Ele respirou fundo e se controlou.
Enquanto seu irmão estava em coma, a
única coisa na qual ele precisava se
concentrar era em vencer o Mundial de
Construtores. E dar uma lição em Sasha
Fleming.
– Eu vi os relatórios dos treinos. Você
terá que abaixar três décimos de
segundo em Eau Rouge para ter uma
chance decente ou vai ficar exposta à
ultrapassagem. A Bélgica é um circuito
difícil.
– O DSII vai lidar melhor com as
curvas.
– Você não parece nervosa.
Outra risada.
Madre de Dios. Há tempos ele não
tinha sexo bom à moda antiga. A
frustração sexual tornava a tentação
desagradável, mas aquele... Aquele
anseio era insano.
Mentalmente, folheou sua agenda e
encontrou
vários
nomes.
Mas
rapidamente descartou todos eles.
– Acredite em mim, eu fico muito
nervosa. Mas não me importo.
– Porque ganhar é tudo, não importa
o custo? – provocou ele.
Seus olhos se escureceram.
– Não, porque o nervosismo tem um
propósito. Ele faz você se lembrar que é
humano, aguça seu foco. Eu ficaria
apavorada se não estivesse nervosa. Mas
18 anos de experiência também
ajudam. Faço isso desde que tinha 7
anos. Ter um pai protetor que
descaradamente ignorou o fato de eu
não ser um menino ajudou com a
minha confiança também.
– Não são todos os pais que
concordam que seus filhos corram.
Você teve sorte.
Ela sorriu.
– Eu ficava com raiva cada vez que
ele ameaçava me deixar com a babá.
Ganhei eventualmente. Apesar de eu
ter a sensação de que ele estava me
testando para ver o quanto eu queria.
– E você foi aprovada. Bravo.
– Opa, eu detectei certo cinismo,
Marco?
Ele cerrou os dentes enquanto seu
controle caiu mais um ponto.
– Alguém já disse para você não ser
tão direta?
– Eu fui? Pensei que estivéssemos
tendo uma conversa para nos
conhecermos melhor. Pelo menos até
você ficar um pouco estranho.
– Perdón. Não era minha intenção
ficar estranho.
Ele tomou um grande gole de vinho.
– Primeiro admite um ponto fraco.
Agora pede desculpas. Uau, deve ser
minha noite de sorte. Está se sentindo
bem? Talvez ajudasse falar sobre o que
assustou você.
Talvez fosse o efeito do vinho. Talvez
fosse o fato de ele não ter uma conversa
envolvente como aquela há um tempo.
Marco ficou surpreso quando se viu
rindo.
– Não me lembro de ter me
assustado. Mas, só por curiosidade, qual
papel você está interpretando nesta
conversa? Diplomata ou psicóloga?
– Que tal o de amiga? – perguntou
ela.
Sua risada secou.
Ela queria ser sua amiga.
Marco não conseguia se lembrar da
última vez que alguém havia lhe
oferecido amizade. Sempre havia
traição por trás. Ele aprendeu bem e
completamente essa lição.
Ele deu outro gole no vinho.
– Eu respeitosamente recuso sua
oferta. Obrigado mesmo assim.
Um pequeno sorriso se curvou em
seu lábio.
– Ai. Pelo menos você não riu na
minha cara.
– Teria sido cruel.
– E você não é cruel? Chegou muito
perto de ser no passado.
– Você era uma ameaça para o meu
irmão.
– Era? Não estou mais sob esta
suspeita?
Percebendo o deslize, ele fez uma
pausa.
Você não pode controlar o que
acontece na vida... Rafael vai se ressentir
de você por controlar sua vida...
– Estou disposto a suspender o meu
julgamento até que Rafael seja capaz de
interpretar os fatos por ele mesmo.
Seu sorriso desapareceu.
– Você não confia em mim mesmo,
não é?
– A confiança é conquistada. Vem
com o tempo. Assim me ensinaram.
Até o momento, ninguém havia
resistido ao teste do tempo. Sasha
Fleming já tinha falhado. Ela só estava
sentada em frente a ele por causa do
que poderia lhe dar.
– Bem, então chegamos ao ponto de
ganhar confiança. E nos tornarmos
amigos.
Marco não respondeu, parte dele
lamentava o fato de que a amizade
entre eles nunca seria possível.
CAPÍTULO 6
– ASSIM, SASHA!
– Aqui!
– Sorria!
O prêmio Children of Bravery ocorria
no mês de agosto em um dos hotéis
mais chiques em Mayfair. No ano
passado, Sasha chegou em um táxi com
Tom, que a ignorou pelo resto da noite.
Dessa vez, os flashes explodiram em
seu rosto no momento em que Marco a
ajudou a sair da parte de trás de seu
deslumbrante Rolls-Royce prata.
Piscando várias vezes, ela viu que
Tom havia se materializado ao lado
dela. Antes que pudesse falar, Marco
entrou na frente dele.
– A srta. Fleming não vai precisar de
você hoje. Desfrute da sua noite.
A dispensa se deu com uma voz
suave, envolta em aço.
– Isso não foi muito legal –
murmurou ela, embora secretamente
houvesse ficado satisfeita. – Mas
obrigada.
– De nada – murmurou ele com uma
voz suave e profunda.
Quando ele a pegou pelo braço, a
sensação se intensificou, em seguida,
transformou-se em um tipo diferente
de calor, como um sentimento de estar
protegida, amada...
Ela usou freios mentais para evitar
que seu cérebro entrasse em colapso.
– Pela primeira vez eu concordo com
os paparazzi. Sorria. Seu rosto parece
congelado – disse Marco lentamente,
completamente à vontade em ser objeto
de intenso escrutínio.
Ele parecia perfeitamente bem com
centenas de fãs do sexo feminino
gritando seu nome por detrás das
barreiras, enquanto ela só podia pensar
sobre a cerimônia e as lembranças que
iria ressuscitar.
– Provavelmente porque estou. Além
disso, você não pode falar. Não está
sorrindo.
– Não sou a estrela do show. – Ele a
olhou mais de perto. – O que você tem?
Não disse uma palavra no caminho e
agora está pálida.
– É porque eu não gosto de estar
aqui. Odeio usar estas roupas e a
maquiagem faz com que meu rosto
fique estranho.
– Você está bonita. Mais do que
bonita. A estilista escolheu bem.
– Ela não escolheu este vestido. Eu
escolhi. Se eu tivesse vindo com o que
ela escolheu, eu estaria seminua com
uma fenda até o meu... – Ela limpou a
garganta. – Por que você me mandou
uma estilista, aliás?
– Eu não queria correr o risco de que
você aparecesse aqui em calças jeans e
um top hippie.
– Eu nunca teria feito isso...!
Ela viu o brilho de diversão em seus
olhos e relaxou.
Outro fotógrafo gritou o nome de
Sasha e ela ficou tensa.
– Relaxe. Você escolheu bem. – Seu
olhar deslizou sobre ela mais uma vez. –
Você está linda.
– Obrigada.
Ela passou a mão nervosa sobre o
vestido, grata por seu novo contrato vir
com uma remuneração lucrativa para
pagar pelo vestido de seda preta que
usava.
– Pare de ficar se mexendo –
ordenou ele.
– É fácil para você dizer. De qualquer
forma, por que está aqui? Eu não
preciso de um guarda-costas.
– Eu peço desculpa, mas não
concordo. Este evento está hospedando
muitas personalidades do esporte,
incluindo os outros pilotos do circuito.
A única coisa que você precisa é um
guarda-costas.
– E você é isso? Não tem mais o que
fazer?
– A equipe sofreu com a ausência de
Rafael. Vai ser bom para os
patrocinadores eu estar aqui.
O calor de seus braços desapareceu.
Ela sentiu seu olhar penetrante
conforme aliviava o aperto.
– Quanto tempo temos que ficar aqui
fora?
O
centro
das
atenções
definitivamente não era seu lugar.
– Até que o problema com o assento
esteja resolvido.
Ela virou para ele.
– Que problema com o assento?
O alívio a inundou quando ele a
conduziu para longe das câmeras e do
tapete vermelho do hotel de cinco
estrelas.
A multidão pareceu fazer uma pausa,
homens
e
mulheres
olhando
avidamente conforme entravam.
Alheio à reação, Marco pegou duas
taças de champanhe e entregou uma a
ela.
– Parece que temos uma linha
cruzada.
– Quer dizer que fui rebaixada
porque meu sobrenome é Fleming e
não de Cervantes?
Ele olhou perplexo.
– Por que seu nome importa?
– Qual é? Sei como isso funciona.
Sasha sabia que estava sendo julgada
pela desonra de seu pai.
– O seu sobrenome não tem nada a
ver com isso – respondeu Marco,
mandando cumprimentos a várias
pessoas que tentavam chamar sua
atenção.
– Quando o comitê da premiação
soube que eu estaria presente, eles
naturalmente presumiram que eu
estaria com mais alguém.
– Ah, então eu deveria fazer sala para
sua convidada. Não é por que...?
Ele levantou uma sobrancelha.
– Por que...?
Balançando a cabeça, Sasha tomou
um gole de seu espumante.
– Então, por que não? Por que não
trouxe uma convidada? Sei que
certamente não é por falta de
pretendentes. Quero dizer, um homem
como você...
– Um homem como eu? Quer dizer
O Idiota? – perguntou ironicamente.
– Não, não quis dizer isso. Um
homem incrivelmente rico, bemsucedido, que é decente de se olhar...
– Gracias... Eu acho.
– Você sabe o que eu quero dizer.
Mulheres escalam claraboias, arriscam a
vida para estar com você, pelo amor de
Deus.
– Escalar claraboias é um pouco
demais para mim. Prefiro que minhas
mulheres usem a porta da frente.
Convidadas por mim.
Um calor acendeu em seu corpo. Ele
se inclinou sobre ela. Como se... Como
se... Seu olhar caiu sobre os lábios. Ela
engoliu em seco.
O champanhe desceu mal.
Ela tossiu, limpou a garganta e tentou
desesperadamente encontrar algo para
dizer para dissipar a atmosfera.
– Para responder sua pergunta, este é
um evento especial para homenagear as
crianças. Não é um evento para trazer
uma convidada que vai passar a noite
verificando joias de outras mulheres ou
celebridades.
– Que incrivelmente superficial! Ah,
eu não quis dizer que você sai com
mulheres superficiais... Quero dizer...
Inferno, troquei os pés pelas mãos?
O sorriso que ela havia vislumbrado
ameaçou se quebrar.
– Seu papel de diplomática está indo
por água abaixo, Sasha. Acho que
devemos entrar antes de me insultar
um
pouco
mais
e
destruir
completamente o meu ego.
– Eu não acho que isso seja possível –
murmurou ela baixinho.
– Sério, você deveria sorrir mais.
Parece quase humana quando sorri.
O retorno da risada baixa e profunda
percorreu deliciosamente sua pele,
insinuando-se em seu coração. Quando
a mão dele tocou suas costas para dirigila até o salão, ela foi tomada por um
imenso prazer.
O sentimento foi pateticamente
curto. As imagens de crianças
penduradas no teto do salão com
candelabros foi como um soco. Sua
respiração ficou presa conforme a dor a
dilacerava. Se seu bebê estivesse vivo,
teria 4 anos.
– Tem certeza de que está bem? –
perguntou Marco em voz baixa.
– Sim, estou bem.
Recusando-se a arriscar seu olhar
incisivo, ela correu para a mesa e
cumprimentou um ex-jogador de
futebol, que recentemente tinha sido
condecorado por seu trabalho com
crianças.
Respirando com dificuldade por
causa da dor que sentia, ela levou um
momento para perceber que era alvo de
olhares e sussurros das outras duas
ocupantes da mesa.
– Oi, sou Lisa. Esta é minha irmã,
Sophia – disse a esposa-troféu do
jogador.
Marco balançou a cabeça como
forma de saudação e apresentou Sasha.
Sophia lançou um sorriso a Marco,
quase o devorando, e mal olhou para
Sasha.
Uma forma diferente de mal-estar
assaltou Sasha, enquanto observava as
mulheres se derreterem sob o carisma
deslumbrante de Marco. Seus olhos
ávidos
comandavam
seu
físico
imponente, a beleza dura de seu rosto,
a boca sensual e um ar de autoridade e
poder que camuflava.
Ele murmurou algo que fez Sophia rir
com prazer. Quando seu olhar
encontrou Sasha, tinha um toque de
triunfo que a fez querer arrancar o
aplique da mulher. Em vez disso, ela
manteve o sorriso e se virou para o
homem mais velho.
Se Marco gostava de silicone e cílios
postiços, podia ficar.
MARCO CERROU o punho e se forçou a se
acalmar.
Ele
nunca
foi
tão
completamente ignorado por uma
acompanhante em sua vida.
Então Sasha não era tecnicamente
sua acompanhante. E daí? Ela chegou
com ele. E sairia com ele. Será que era
muito esforço para ela conversar com
ele em vez de se envolver em uma
discussão aprofundada sobre a atual
Premier League?
Lentamente afrouxou seu punho e
pegou sua taça de vinho.
Sasha riu. Toda a mesa parecia estar
em uma pausa para beber, mesmo as
duas mulheres que tão rudemente a
ignoravam.
No momento em que os pratos do
jantar foram retirados, ele não
aguentou.
– Sasha.
Ela deu um sorriso para o homem
mais velho antes de se voltar a ele.
– Sim?
Ao ver seu sorriso largo e genuíno, o
mesmo que havia usado quando
ofereceu sua amizade na Casa de Leon,
algo em seu peito se contraiu. Obrigou-
se a se lembrar da razão pela qual Sasha
Fleming estava ali ao lado dele. A razão
pela qual ela estava em sua vida.
Rafael. O irmão mais novo que ele
sempre havia cuidado.
Mas ele não é mais uma criança...
Marco suprimiu a voz inquietante.
– A cerimônia está prestes a começar.
Você apresentará o segundo prêmio.
Seus olhos se arregalaram, então
foram tomados de ansiedade.
– Sim, é claro. Eu... O discurso está
pronto. É melhor eu ler mais uma vez,
vai que... – Suas mãos tremiam quando
ela pegou um pequeno pedaço de papel
de sua bolsa.
Sem pensar, ele cobriu a mão dela
com a sua.
– Respire fundo. Você vai ficar bem.
Seus olhos se travaram nos dele, e
Sasha balançou a cabeça lentamente.
– Eu... Agradeço.
O apresentador subiu ao palco e
anunciou o primeiro prêmio. Sasha
sorriu
e
bateu
palmas,
mas,
observando-a de perto, Marco teve um
vislumbre da dor em seus olhos.
Forçando-se a se concentrar no
discurso, ele ouviu a história de uma
criança de 4 anos que havia salvado a
vida de sua mãe ligando para uma
ambulância e dando indicações
precisas, depois que sua mãe havia
caído em um barranco.
O gelo tomou seu peito enquanto
observava a menina no palco com roupa
azul brilhante e o rosto envolto em
sorrisos. Esforçando-se para não pensar
no passado, ele se virou para avaliar a
reação de Sasha.
Ela estava congelada, com o corpo
todo tenso.
Franzindo a testa, ele se inclinou em
direção a ela.
– Isto é ridículo. Diga-me o que está
errado. Agora.
Ela pulou, com os olhos arregalados,
obscuramente
assombrados,
com
lágrimas não derramadas. Forçou um
sorriso, só que faltava calor ou
substância.
– Eu disse a você, estou bem. Ou
estaria se tivesse me lembrado de trazer
um lenço.
Sem dizer nada, ele enfiou a mão no
paletó e lhe entregou um lenço, com
um milhão de perguntas ateando fogo
em sua mente.
Aceitando, ela enxugou os olhos.
– Se eu estiver horrível, não me conte
até que eu volte do palco, certo? –
implorou ela.
– Certo.
Marco a observou se recompor.
Esticou a coluna e um olhar de
determinação caiu sobre seu rosto. No
momento em que ela subiu para
apresentar o prêmio, seu sorriso estava
no lugar.
Observando o jogo de luzes sobre seu
cabelo escuro, iluminando as belas
feições e a curva generosa dos seios,
Marco sentiu o aperto familiar em sua
virilha e reprimiu um grunhido de
frustração.
– Como a maioria de vocês sabe,
Rafael de Cervantes deveria apresentar
o prêmio Toby hoje à noite. Em vez
disso, ele está fugindo desta situação
em algum lugar na ensolarada Espanha.
Risos ecoaram pela sala.
– Não, sério, assim como Toby fez
uma oração antes de sair correndo para
sua casa em chamas para salvar sua
irmã e irmão, todos nós devemos
também tirar um momento para fazer
uma oração pela recuperação rápida de
Rafael. Toby lutou por sua família para
viver. Em nenhum momento ele
desistiu. Mesmo quando a equipe de
resgate disse que não havia nenhuma
esperança para seu irmão mais novo.
Ele ignorou e o salvou. Por quê? Porque
ele tinha prometido à mãe que iria
cuidar de seus irmãos. E ele nunca se
afastou da promessa. Há lições para
todos nós na história de Toby. E a
principal é: nunca desistir. Não importa
o quão grandes ou pequenos sejam seus
sonhos, não importa o quão difícil ou
impossível pareça o caminho, nunca
desista. Tenho muito prazer em
apresentar este prêmio a Toby Latham,
por sua bravura excepcional diante das
probabilidades.
A voz de Sasha quebrou nas últimas
palavras. Embora tentasse esconder,
Marco viu a tensão em seu rosto e a dor
por trás do seu sorriso, mesmo quando
muitos aplausos irromperam no salão.
Automaticamente, Marco seguiu o
exemplo, mas dentro dele, um gelo
cortava seu coração, até que ele não
pudesse respirar. Era sempre assim
quando ele se permitia lembrar o que
Angelique tinha tirado dele. O que sua
fraqueza lhe custou. Ele deixou de
cuidar de si mesmo.
Nunca mais, jurou silenciosamente.
Sasha desceu do palco e voltou para o
seu lugar. Apesar da onda de
memórias, ele não conseguia tirar os
olhos dela. Na verdade, ele queria
pular, agarrar a mão dela e levá-la para
longe do salão.
Ela chegou à mesa e sorriu para ele.
– Graças a Deus, eu não me
embaralhei.
Deslizando graciosamente para a
cadeira, ela colocou o cabelo atrás da
orelha. Naquele momento, Marco,
lutando para respirar e amaldiçoandose, sabia que ele a desejava.
Incrivelmente. Desesperadamente.
SASHA PERCEBEU a expressão no rosto de
Marco e seu coração parou.
– Qual é o problema? Ah, meu Deus,
se me disser que tenho comida presa
nos dentes eu mato você – jurou ela
febrilmente.
Desesperadamente
afastando
lágrimas ameaçadoras, ela tentou conter
as memórias dolorosas que olhar para o
rosto de Toby Latham tinha trazido. Ela
não podia permitir que Marco visse sua
dor.
– Seus dentes estão bem – respondeu
ele com uma voz profunda e áspera.
– Então o que é? Meu discurso foi
tão ruim assim?
– Não. Seu discurso foi... Perfecto.
Seu coração deu uma guinada em
sua pequena pausa. Antes que ela
pudesse questioná-lo, o apresentador
apresentou o próximo convidado. Sem
escolha,
manteve
um
silêncio
respeitoso, e cruzou as mãos trêmulas
no colo.
Freneticamente, ela tentou recordar
seu discurso palavra por palavra. Marco
estava, obviamente, reagindo a algo que
ela disse. Ela errou ao mencionar
Rafael? Sua piada foi muito grosseira?
Uma onda de vergonha tomou conta
dela com o pensamento.
Ela esperou até que o próximo
prêmio fosse apresentado, em seguida,
inclinou-se.
– Desculpe – sussurrou ela em seu
ouvido.
Sua cabeça girou para ela. Sua
mandíbula roçou sua bochecha,
milhares de pequenas correntes
elétricas correram por ela.
– Pelo quê? – perguntou ele.
– Eu não deveria ter feito a piada
sobre Rafael. Foi de mau gosto...
– Seria exatamente o que o próprio
Rafael teria feito se a situação fosse
inversa. Todos estão contornando o
assunto ou fingindo que não está
acontecendo nada. Você deu às pessoas
a liberdade de reconhecer o que
aconteceu e deixá-las à vontade. Já não
sou objeto de olhares compadecidos e
especulações. Eu é que deveria
agradecer.
– É mesmo?
– Sí – afirmou ele.
– Então por que você parece tão...
Desligado?
Seus olhos escureceram.
– Suas palavras foram poderosas.
Fiquei tocado. Não sou feito de pedra,
Sasha, ao contrário do que se poderia
pensar.
A reprovação em sua voz a
envergonhava.
– Ah, desculpe. É só que... Eu
pensei...
– Esqueça.
Ele deu um sorriso tenso e dirigiu-se
a Sophia.
Assim que o último prêmio foi
entregue, Sophia se virou para Marco.
– Estamos indo dançar, adoraríamos
que você se juntasse a nós, Marco.
Sasha rangeu os dentes, mas
permaneceu em silêncio. Se Marco
queria ir para a festa com as Irmãs
Falsificadas era escolha dele. Sasha
prendeu a respiração enquanto
esperava pela resposta, odiando-se
enquanto o fazia.
– Dançar não é a minha, mas
obrigado pelo convite.
– Ah, não tem que ser dançar. Talvez
possamos fazer alguma coisa... Outra
coisa?
Sasha se levantou e foi embora antes
que pudesse ouvir a resposta de Marco.
Ela quase chegou às portas do salão
quando sentiu sua presença ao lado
dela. A onda de alívio que inundou seu
corpo ameaçava enfraquecer seus
joelhos.
– Tem certeza de que você não
preferiria ter saído com a Fal... Sophia?
Ela parecia muito ansiosa para estar
com você. Sério, eu posso pegar um
táxi.
Sua limusine parou. Ele a levou para
dentro, em seguida, sentou-se ao lado
dela.
– Eu prefiro terminar minha noite
sem silicone, gracias.
Ela riu.
– Exigente, exigente! A maioria dos
homens não se importaria.
Seus dentes perfeitos brilhavam na
semiescuridão da limusine.
– Não sou como a maioria dos
homens. Sem dúvida, você vai
acrescentar isso à minha lista de pontos
fracos?
Seus olhos desceram para os seios
dela, cortando sua risada.
– Melhor que você não esteja
tentando ver se eu tenho silicone. Estes
aqui são naturais.
– Confie em mim, sei perceber a
diferença – disse ele, em voz baixa,
intensa.
Ela engoliu em seco. Freneticamente,
tentou pensar em um assunto seguro.
– Então você não gosta de dançar?
– Não é assim que eu escolho passar
uma noite, não.
– Deixe-me adivinhar, você é do tipo
que gosta de ópera?
– Errado de novo.
Ela estalou os dedos.
– Eu sei, você gosta de ficar em casa e
assistir programas de auditório.
Ela recebeu um riso baixo.
– Relatórios de telemetria e cálculos
aerodinâmicos?
– Agora você está ficando quente.
– A-ha! Eu sabia que você era um
nerd enrustido!
Ele lhe lançou um olhar irônico.
– Eu prefiro chamar de paixão.
Ela encolheu os ombros.
– Um nerd apaixonado que se
envolve com uma multidão, mas
mantém distância.
Ele endureceu.
–
Está
me
analisando
psicologicamente de novo.
– Você facilita.
– E você faz suposições infundadas.
– Boa tentativa, mas não pode me
congelar com esse tom. Eu pesquisei
sobre você. Tem mais dinheiro do que
jamais poderia gastar em dez vidas e
ainda assim não deixa que ninguém se
aproxime. Você tem algumas relações
estranhas, mas nada que dure mais do
que algumas semanas. Há um limite de
tempo para cada relacionamento.
– Você não deve acreditar em tudo
que lê, especialmente na imprensa
sensacionalista.
– Diga-me qual parte é falsa –
desafiou ela.
Seu olhar endureceu.
– Eu vou dizer qual parte é
verdadeira:
todo
relacionamento
termina. Para sempre é um conceito
feito para vender romances.
– Você não teve um relacionamento
duradouro quando ainda corria? Qual
era o nome dela...? Angela? Ange...?
– Angelique – rosnou ele, com o
rosto congelado como se fosse talhado
em pedra.
– E não foi um relacionamento.
Fomos noivos.
– Ela deve ser a razão, então.
– A razão?
– Pela qual você é assim.
– Será que Derek Mahoney a
transformou na mulher intrusiva que
você é hoje?
– Eu gostaria de encontrá-lo e
estrangulá-lo.
Sasha sabia que deveria deixar para
lá. Mas de alguma forma ela não podia.
– Sim. Não. – Ela suspirou e olhou
pela janela para a vida noturna de
Kensington. – Putz, eu queria fumar.
– Por quê?
– Porque tentar ter uma conversa
com você é exaustivo o suficiente para
levar as pessoas a beberem. Mas como
tenho que acordar cedo amanhã e
cheguei ao meu limite bebendo uma
taça, o tabagismo seria a outra opção, se
eu fumasse. – Abandonando a vista, ela
se virou para ele. – Onde eu estava?
Um sorriso melancólico surgiu no
canto de sua boca.
– Você estava dissecando a minha
vida e achando-a muito deficiente.
– Sarcasmo? É esse o seu modo
padrão?
Marco baixou o olhar para os seus
lábios e suas entranhas se contorceram.
A limusine virou uma curva fechada.
Ela agarrou seu braço para tentar se
equilibrar. Tarde demais, ela percebeu
que a ação fez com que seus seios
saltassem. O olhar de Marco caiu. Um
calor se agrupou em sua barriga. Seus
seios doíam e ela se sentia mais
completa do que nunca.
Ele se inclinou mais. Seu coração
trovejou.
– Não, Sasha – disse ele com a voz
rouca. – Este é o meu modo padrão.
Suas mãos fortes seguraram o rosto
dela com firmeza. Cheios de calor, seus
olhos olhavam dentro dos dela, sua
intensidade chocante acendia um fogo
profundo dentro dela.
Sasha prendeu a respiração, quase
com medo de se mover no caso... No
caso...
Ele prendeu sua boca na dela,
dando-lhe um beijo nada gentil que fez
com muito sangue corresse por suas
veias. Tinha gosto de calor e vinho,
força e desejo latino. De paixão
vermelho-sangue e prazer inebriante.
Sasha sentiu um gemido em sua
garganta e o reprimiu. Ela não era assim
tão fácil. Embora, naquele momento,
com a boca de Marco causando estragos
insanos em sua pressão arterial, ser fácil
era deliciosamente tentador.
Sua língua acariciou a dela e o
gemido escapou, ecoando na caverna
escura do carro em movimento. Uma
das mãos dele escorregou para a nuca,
inclinando sua cabeça. Embora ele não
precisasse. Ela estava disposta a inclinar
a cabeça cada vez mais, para melhor
aprofundar a pressão e o prazer do
beijo. Sua boca se abriu, corajosamente,
convidando-o.
O gemido dele a fez triunfante e
fraca ao mesmo tempo. Em seguida, ela
perdeu todo o raciocínio, mergulhando
no beijo.
Toda a noção de tempo foi perdida.
Até que ouviram o baque de uma
porta.
Seus lábios se separaram com um alto
ruído que atingiu o ápice de suas coxas.
Marco olhou para ela, com a
respiração ofegante.
– Dios – murmurou ele depois de
alguns segundos tensos.
Você pode dizer isso de novo.
Felizmente, as palavras não se
materializaram em seus lábios. Os olhos
caíram para sua boca, ainda molhados
do seu beijo e o calor entre as pernas
aumentou mil vezes.
Controle-se, Sasha. Ela se freou e se
afastou. Tinha beijado Marco de
Cervantes.
– Chegamos – murmurou ele,
soltando seu cabelo.
– S-sim – sussurrou ela, encolhendose por sua voz sair baixa e encharcada
de desejo.
Com um último olhar, ele empurrou
a porta e a ajudou a sair.
Eles entraram no exclusivo complexo
de apartamentos em silêncio, e foram
até a cobertura em silêncio.
Depois de fechar a porta do
apartamento, ele se virou para ela.
Sasha prendeu a respiração, a culpa e o
desejo se misturavam freneticamente
dentro dela.
– Eu acordo cedo...
– Sasha...
Marco fez um gesto para ela ir
primeiro.
Sasha limpou a garganta, mantendo o
olhar baixo para que ele não visse as
emoções conflituosas em seus olhos.
– Eu acordo cedo amanhã. Então...
Hum... Boa noite.
Depois de uma pausa longa e pesada,
ele assentiu.
– Acho que é uma boa ideia. Buenas
noches.
Sentiu seus olhos sobre ela durante
todo o caminho pelo corredor. Mesmo
depois de fechar a porta, sua presença
permanecia. Deixando a bolsa cair, ela
cruzou os dedos sobre os lábios. Ainda
formigavam, junto com cada centímetro
de seu corpo. Descansando a cabeça
contra a porta, ela prendeu a respiração
desesperada.
Sua mão vagou da barriga para a
pélvis, onde o desejo a agarrou de
forma insuportável. Desejo que tinha
toda a intenção de negar.
Querer Marco de Cervantes foi um
erro. Mesmo se houvesse a mais remota
possibilidade de uma relação entre eles,
seria uma questão de semanas para
acabar. E ela sabia, sem sombra de
dúvida, que também significaria o fim
de sua carreira.
Sua experiência com Derek a havia
ensinado que ninguém valia o preço
dos seus sonhos.
CAPÍTULO 7
– CAFÉ...
cheiro de café –
murmurou ela no travesseiro. – Por
favor, Deus, faça com que haja café
quando eu abrir os olhos.
Com cuidado, ela abriu um olho.
Marco estava ao pé de sua cama, em
uma camiseta verde-escura e calça
jeans, com uma caneca fumegante na
mão.
SINTO
– Se eu exigir saber o que está
fazendo no meu quarto tão cedo, você
vai negar esse café para mim?
Não houve sorriso.
– Não é cedo. São oito horas.
Com um gemido, ela se alavancou
para cima.
– Oito horas é o raiar do dia, Marco.
– Ela estendeu a mão para o copo. Ele
não se moveu. – Por favor – resmungou
ela.
Com um movimento estranho, ele
contornou a cama e entregou o café a
ela.
Sasha tomou o primeiro gole, gemeu
de prazer e caiu contra o travesseiro.
– Você não é uma pessoa da manhã,
não é?
– Ops, meu segredo foi revelado.
Acho que quem decretou que qualquer
coisa era importante o suficiente para
começar antes das dez da manhã
deveria ser pendurado e esquartejado. –
Ela embalou a caneca quente na mão. –
Certo, eu acho que agora estou
acordada o suficiente para perguntar o
que você está fazendo no meu quarto.
– Eu bati. Várias vezes.
Ela fez uma careta.
– Eu durmo como uma pedra, às
vezes. Como você sabia que era para me
trazer café?
– Eu sei tudo sobre você – respondeu
ele.
Seu coração balançou. Marco não
sabia sobre seu bebê. E ela queria que
assim fosse.
– Eu esqueci. Você tem habilidades
místicas loucas.
– Não místicas. Apenas habilidades
loucas. Quanto ao porquê de eu estar
aqui... Tenho uma reunião na cidade
em 45 minutos.
– Em um sábado? – Ela percebeu seu
olhar irônico. – Ah, não importa.
– Eu queria falar sobre ontem à noite
antes de sair.
Sua respiração parou.
– Sim. Ontem à noite. Nós nos
beijamos.
Um silvo agudo foi emitido de seus
lábios.
– Sí, nós nos beijamos.
Ela bravamente encontrou seu olhar,
mesmo que seu coração estivesse
batendo forte.
– Antes de me condenar, você
precisa saber que isso não é um hábito
para mim.
– E, no entanto, aconteceu.
– Podemos culpar o vinho? Ah,
espere, você mal tocou seu copo a noite
toda.
– Como você sabe? Estava distraída
na discussão da Premier League.
Ela suspirou.
– O que posso dizer? Eu amo o
futebol. Para qual time você torce?
– Barcelona.
Ela fez uma careta.
– Claro. Você parece o tipo que torce
para o Barcelona.
Ele balançou a cabeça.
– Eu não quero nem saber o que isso
significa.
O silêncio os envolveu.
Marco levantou a cabeça e olhou
para ela. O brilho em seus olhos
atormentados a fez parar de respirar.
– O que aconteceu ontem à noite não
vai acontecer novamente.
Apesar de pensar a mesma coisa, ela
sentiu um desapontamento.
– Eu concordo.
– Você pertence ao meu irmão –
continuou ele, como se ela não tivesse
falado.
– Eu não pertenço a ninguém.
Seu olhar espetou o dela.
– Isso não pode acontecer
novamente.
– E eu concordei com você. Está
tentando convencer a mim ou a si
mesmo?
Ele balançou a cabeça.
– Sabe, nunca conheci alguém tão
franca.
– Eu não sou de ninguém. Você
precisa saber disso agora. Beijo quem eu
quiser. Mas beijar você foi um erro. E
eu espero que isso não venha a
prejudicar meu contrato.
Seu olhar endureceu.
– Você valoriza sua profissão mais do
que as relações pessoais?
– Nunca tive sucesso com
relacionamentos, mas sou um piloto
brilhante. Eu acho que é sábio escolher
o que eu faço melhor. E eu prefiro não
perder meu emprego porque você se
sente culpado por um simples beijo. Eu
também entendo se você tem algumas
reservas por causa de seu irmão.
Realmente, não é grande coisa. Não
precisa se martirizar por isso.
Aquela era outra razão pela qual ela
odiava as manhãs. Naquela altura do
dia, a barreira natural entre seu cérebro
e sua boca estava severamente
enfraquecida.
– Dios, isso não tem nada a ver com o
seu contrato. Se você fosse minha, eu
não teria reservas. Nenhuma. As coisas
que eu faria a você. Com você.
Ele nomeou algumas.
Sua boca se abriu.
O desejo chamuscou o ar. Seus dedos
se fecharam em torno da caneca.
Silenciosamente, desesperadamente, ela
quis que ele fosse embora. Debaixo de
sua camiseta, seus mamilos reagiram às
suas palavras.
– Uau! Isso é... Hum... Muito
impertinente.
– E isso é só o começo – murmurou
ele.
Em outra vida, em outro momento...
Não! Mesmo em um universo
paralelo, Marco seria uma má notícia.
– Eu ouvi um porém em algum lugar
aí. Ou você ainda acha que sou
venenosa ou é outra coisa. Diga-me. Eu
posso aguentar.
– Ontem à noite, na premiação, você
falou de Rafael como um amigo.
– Porque é o que ele é. Apenas um
amigo.
Sua mandíbula se apertou.
– Está me pedindo para acreditar em
você e não no meu irmão?
– Não exatamente. Estou dizendo
para nos dar o benefício da dúvida.
Veja aonde isso pode levá-lo.
Ele balançou a cabeça.
– Enquanto Rafael a considerar dele,
não poderá haver nada entre nós.
– A mensagem foi recebida. Mais
alguma coisa?
Por um minuto, ele não respondeu.
– Não quero que pense que o beijo
trouxe a você algum privilégio especial.
– Quer dizer, como esperar que você
me traga café todas as manhãs? –
respondeu ela sarcasticamente.
– As minhas expectativas de você
como piloto não mudaram. Na verdade,
nada mudou. Entendido?
– Tudo isto é angústia por um
simples beijo, Marco?
– As mulheres têm o hábito de ler
mais em uma situação do que
realmente existe. Mas eu quero ser
muito
claro,
não
entro
em
relacionamentos.
– Não estou procurando por um.
Todo o seu corpo se enrijeceu.
– Então não haverá problema.
– Mais uma vez percebo um porém.
– Porém... Por alguma razão, eu só
penso em você.
A declaração foi feita com franqueza,
sem alegria. No entanto, seu coração
saltou.
– E você está aborrecido com isso?
O olhar dele passou seu rosto
lentamente.
– Lívido. Frustrado. Intrigado.
Intensamente excitado.
Ela engoliu em seco conforme o calor
se derramava por todo o seu ser.
Olhando para fora, ela murmurou:
– Não faça isto.
– Eu estava prestes a exigir o mesmo
de você.
– Não estou fazendo nada. Você, por
outro lado, você...
– Eu o quê? – perguntou ele, em voz
baixa, feroz.
– Você está cismado... E feroz... E
com raiva... E... Excitado. Está
amaldiçoando o seu desejo por mim e
seus olhos ainda prometem todos os
tipos de sedução.
Seus olhos correram de volta para a
protuberância nas calças dele e um nó
se formou em sua garganta.
– Eu... Eu acho que você deveria sair.
– Você não parece muito certa sobre
isso.
– Estou. Não quero você. E mesmo se
eu quisesse, não posso, lembra? Então
você não pode... Não pode me
apresentar... Isto.
– Eu nunca disse que a situação era
simples.
– Bem, a solução é fácil. Você me
contratou para fazer um trabalho, então
me deixe fazê-lo. Não temos que nos
ver até que a temporada termine e nós
ganhemos o Mundial de Construtores.
Nós ficaremos no topo do pódio e nos
jogaremos champanhe. Então vamos
seguir caminhos separados até a
próxima temporada começar.
– E você vai cumprir esta promessa?
– Em parte, sim.
– Para quem você fez a promessa?
Ela deixou de olhá-lo nos olhos, a
súbita necessidade de contar tudo a
chocou pela intensidade. Mas ela não
podia. Marco não confiava nela. E ela
não estava preparada para confiar-lhe a
memória sagrada de seu pai.
– Não é da sua conta. Você vai me
deixar em paz para seguir em frente?
– Tenho que ficar de olho. Você já se
mostrou...
– Sim, eu já ouvi tudo isto antes. Não
enfeitice
ninguém
da
equipe.
Especialmente o chefe. Mensagem
recebida e entendida. Talvez você possa
levar suas frustrações a outro lugar.
– Dios. Ninguém nunca lhe disse a
diferença entre estar de mau humor e
ser uma megera?
– Ninguém se atreveu.
– Bem, então eu digo. Você precisa
parar de atirar cegamente e aprender a
escolher suas lutas. Romano a levará
para seu compromisso e a trará de volta.
– Isso não é necessário. Eu aluguei
uma scooter.
Ele se virou para encará-la.
– Não. Romano vai levá-la.
Seu tom não admitia discussão.
– Sério, Marco, você precisa deixar
para lá essa coisa de ser homem das
cavernas...
– E você precisa assumir uma maior
responsabilidade pelo seu bem-estar. Se
você cair da scooter e quebrar um braço
ou uma perna, o resto da temporada
está terminado. Eu pensei que você
quisesse pilotar? Ou acha que é
invencível sobre essas pequenas pilhas
de lixo em que gosta de viajar?
Ela reprimiu uma réplica aquecida.
Marco estava certo.
– Tudo bem. Vou usar o carro.
Sasha se recusou a olhar para o rosto
dele.
– Eu preciso me preparar para as
sessões de fotografia.
– Seu café da manhã será servido em
meia hora. – Ele se moveu em direção à
porta. – Ah, e Sasha...?
Incapaz de se conter, ela olhou.
Emoldurado na porta, sua figura era
impressionantemente
masculina
e
absolutamente cativante.
– Sim? – respondeu ela asperamente.
– A menos que você queira que as
coisas saiam de controle, não use aquela
camisola
na
minha
presença
novamente.
A SESSÃO de fotos foi terrivelmente
tediosa. Mas o resultado final a
surpreendeu.
Após pressionar o botão para o
elevador, ela pescou as fotos de sua
mochila, chocou-se mais uma vez por
como estava diferente, como a
maquiagem pode transformar o simples
em quase... Sexy.
Abrindo a porta da suíte, ela parou
com o jazz que flutuava pelo ambiente.
Seguindo o som, ela viu Marco
descansando no sofá, com um tablet e
um copo de vinho nas mãos.
– Eu pensei que você fosse se atrasar.
Seu olhar se concentrou nela.
– Eu adiantei as coisas.
– E você não poderia encontrar
alguém com quem passar a noite na sua
agenda?
– São apenas 7h30. A noite é uma
criança – respondeu ele.
– Isso é típico. Vai ligar para alguma
infeliz mulher do nada e esperar que
ela esteja pronta para largar tudo e sair
com você, não é?
Um canto de sua boca se curvou.
– Felizmente, as mulheres que eu
conheço são gentis o suficiente para
querer largar tudo por mim.
Ela bufou.
– Pare com isso. Nós dois sabemos
que isso não tem nada a ver com
gentileza.
Como tinha visto em primeira mão
na cerimônia de premiação, as
mulheres se rastejam por Marco.
– Talvez não – admitiu ele, sem um
sinal de arrogância à vista. – Como foi a
sessão?
– Além dos sapatos de cortesia, foi
um pé no saco – respondeu ela.
– Claro – concordou gravemente.
Então, sem aviso, ele estendeu a mão
e tirou as fotos de seus dedos.
Ele parou de falar, enquanto olhava
para as fotos. E parecia que tinha
parado de respirar.
– Marco... Marco, eu não quero que
você fique. Eu tenho planos.
– Quais são os planos? – perguntou
ele, em tom áspero.
Sasha não conseguia pensar em como
responder.
– Deixe-me ir – murmurou ela com a
sua voz crua de desejo.
– Quais são os planos?
– Tem certeza que quer saber? Você
pode não aprovar.
A mão dele apertou seu braço, seus
olhos se escureceram em nuvens de
tempestade que ameaçavam trovões e
relâmpagos.
– Então pense bem antes de falar.
Ela suspirou.
– Tudo bem. Você me pegou. Eu ia
pedir ao seu chefe que me fizesse bife e
salada, seguido de pavê de chocolate
para sobremesa. Mais tarde penso sobre
as calorias. Depois eu pretendo ter um
encontro com Joel, LuAnn e Logan.
– Perdão?
Alcançando a bolsa pendurada no
ombro, ela tirou o box de sua série de
vampiros favorita.
Ele a soltou.
– Aceite o conselho, pequeña. É um
erro me incitar. As consequências serão
maiores do que você jamais esperaria.
Sasha sentiu um arrepio passar por
ela.
Naquele momento, o olhar no rosto
de Marco a alertou para o perigo.
– Entendido. Deixe-me ir.
A surpresa iluminou seus olhos.
– Preciso de um banho. Acho que
você já terá ido quando eu sair.
Aproveite a noite.
Descaradamente, ela fugiu.
MARCO A observou indo, frustração e
confusão lutavam dentro dele.
Orgulhava-se
de
conhecer
e
compreender as mulheres. Depois de
Angelique, estava determinado a nunca
ser pego de surpresa novamente.
Mulheres gostavam de pensar que eram
criaturas complicadas, mas suas
necessidades eram básicas,
não
importava o quanto elas tentassem
esconder.
“Eu quero fama, Marco. Eu quero
emoção! Não posso estar com um
homem cujo sucesso está no passado.”
Seus olhos seguiram a figura alta e
magra de Sasha pelo corredor.
Ela o surpreendeu, ele admitiu com
relutância. Ela também o enfureceu. Ela
fazia seu sangue ferver de uma maneira
tão básica, tão... Sexual, mesmo sem
aquelas fotos...
Dios! Com um grunhido, ele se virou
para a janela.
Apesar de estar totalmente envolvida
no beijo, tanto quanto ele, Sasha se
afastou na noite anterior. Uma situação
que nunca tinha encontrado antes.
Era porque ela realmente não o
queria? Ou ela estava apenas esperando
seu irmão acordar para que pudesse
continuar de onde tinham parado?
Seu estômago se corroeu com o
pensamento. Mas mesmo o efeito
corrosivo não poderia camuflar o desejo
sexual latente.
MARCO PASSOU a última hora comendo e
bebendo com uma mulher cujo nome
ele não se lembrava.
Olhava para seus lábios escarlates e
pensava em outros lábios. Lábios
recém-beijados. Lábios que haviam
correspondido ao seu beijo de forma a
enviar um potente pulso de excitação
por ele.
Lábios proibidos.
No final, ele derrubou o seu
guardanapo.
– Você vai me desculpar, mas sou
uma terrível companhia esta noite. Eu
não deveria ter perturbado você.
– Sabe que eu perdoo você por
qualquer coisa, Marco.
Candy? Candice? se inclinou para a
frente em outra pose cuidadosamente
calculada, criada para mostrar o seu
corpo.
– Ouça, tenho uma ideia. Eu sei o
quanto você gosta de café. Quando eu
estava filmando no Brasil no mês
passado, eu me apaixonei pelo café de
lá e trouxe um pouco comigo. Por que
não pulamos a sobremesa e voltamos
para minha casa para que você prove?
– Desculpe, mas fica para a próxima.
Ele a levou para fora em meio a
protestos suaves e mais promessas. Mas
café ou sexo com Candy/Candice era a
última coisa em sua mente.
Sua fome repentina por pavê de
chocolate se tornou insuportável.
– Leve o meu carro. Eu vou a pé –
disse ele.
E lá estava ele, escondendo-se fora
de seu próprio apartamento como um
adolescente hormonal em seu primeiro
encontro.
Ele entrou e se aproximou da sala de
estar.
Ela estava encolhida no sofá, com
uma tigela de pipoca no colo. Sua
cabeça se virou em direção a ele. Como
se estivesse procurando por ele
também. O pensamento lhe agradou
mais do que deveria.
O azul impressionante de seus olhos
o paralisou.
– Você ainda está acordada.
Excelente, Marco. Primeiro lugar em
constatação do óbvio.
Ela piscou.
– São apenas 9h15.
– Cadê o pavê de chocolate, afinal?
– O rosto de desaprovação de Charlie
me assombrou. Pipoca é mais saudável.
– Ela desviou o olhar. – Então, como foi
o encontro?
– Você realmente quer saber?
Seus lábios sensuais se contraíram e
ela balançou a cabeça.
A necessidade de avaliar seus
verdadeiros sentimentos o puxou para
mais perto.
– Ciúmes?
Ela respirou fundo.
– Achei que não estávamos fazendo
isso.
Seus olhos caíram sobre os lábios
dela.
– Talvez eu tenha mudado de ideia.
– Bem, mude de novo. Nada mudou
desde esta manhã. Não posso lidar com
seu... Fardo. E não quero um
relacionamento. De nenhuma espécie.
Marco abriu a boca para dizer que
não queria nada dela também. Mas ele
sabia que estava mentindo. Sua
presença nesta sala desmentia isso.
Proibida ou não, ele a desejava com
uma necessidade compulsiva. Mas
querer não é poder. Ele era conhecido
por seu controle. Sentou-se ao lado
dela, sentiu seu cheiro e simplesmente
forçou-se a não reagir.
Para forçar o corpo a relaxar, ele
acenou com a cabeça em direção à
televisão.
– Você gosta de vampiros?
– Quem não gosta?
Ele queria olhar para ela, mas
manteve o olhar fixo à frente.
– Qual é a história?
Ela hesitou, inquietou-se e sentou-se
de frente para a TV. Pelo canto do
olho, ele a viu lamber os lábios. O calor
fervilhou em suas veias.
– Ah, você sabe, é o enredo de
sempre. Dois irmãos apaixonados pela
mesma garota.
Alguma coisa se apertou em seu peito
e os músculos do estômago se
contraíram.
– Entendi.
– Você não precisa assistir.
– Por que não? Estou intrigado. – Os
dois protagonistas masculinos se
enfrentavam na tela, com os dentes
arreganhados. – O que eles estão
fazendo agora?
Mais uma vez, ela hesitou.
– Eles estão prestes a lutar até a
morte por ela.
Seus músculos se contraíram mais.
– Você está torcendo para qual deles?
– perguntou ele, com a nuca contraída
enquanto esperava a resposta.
Ocorreu-lhe o quão absurda era
aquela conversa.
– Nenhum dos dois.
Ilogicamente, seu interior ficou oco.
– Você não se importa se um deles
morrer?
– Não foi isso que eu disse. Eu disse
nenhum dos dois porque eu sei que eles
não vão se matar. Eles podem se rasgar
aos pedaços, mas no final eles se amam
demais para permitir que uma mulher
fique entre eles. Eu sei que eles vão
resolver isso. É por isso que eu amo o
seriado. Pipoca?
Ele se recusou e acenou para a tela
quando uma personagem feminina
apareceu.
– Quem é ela?
Sasha riu.
– Sim. LuAnn, a extraordinária
femme fatale. Com aqueles enormes
olhos castanhos e um corpo que poderia
seduzir qualquer homem. Dentro e fora
da tela.
– Ela pode parecer inocente na tela,
mas fora é outra conversa.
Suspirou.
Seu controle falhou e seus olhos
encontraram
os
olhos
azuis
impressionantes de Sasha. Marco se
perguntou se ela sabia como eles eram
apaixonantes. Cativantes. Como ela era
mais bonita que LuAnn.
– Você conheceu ela?
– Rapidamente. Em uma das festas
de Rafael.
Seus olhos se voltaram para a tela.
– Por mais que eu esteja morrendo
de vontade de saber os detalhes
sórdidos, eu realmente não quero ter a
ilusão estragada. Você se importa?
Mais uma vez Marco foi atingido por
um contraste de Sasha e das outras
mulheres com que saía. Elas o teriam
atropelado por sua menção a uma
celebridade, morrendo de vontade de
saber todos os detalhes. Sua refrescante
atitude indiferente o fez relaxar um
pouco mais.
Quando ele se viu comendo pipoca,
ficou surpreso.
Quando foi a última vez que ele
relaxou daquela forma.
Ele olhou para Sasha. Seus olhos
estavam grudados na tela, o lábio
inferior preso entre os dentes.
Marco pegou outro bocado de pipoca
e sua mão roçou na dela. Sua respiração
ficou presa, mas ela não desviou o olhar
da tela. Quando ele relutantemente
forçou-se a tirar os olhos dela, viu
LuAnn em uma cena picante com Joel.
Como um homem de 35 anos de
idade, que sabia que o sexo na tela era
simulado, ele não deveria achar a cena
erótica.
No entanto, quando a respiração de
Sasha parou pela segunda vez, ele se
virou para ela, com o coração batendo
alto de forma que ele não conseguia
ouvir mais nada.
– Você deveria estar olhando para a
tela, não para mim.
Seu murmúrio rouco vibrou direto
em sua virilha.
– Eu nunca fui muito um espectador.
Eu prefiro ser um participante.
Dios! Ele estava muito excitado.
No entanto, ele não podia se mover.
Não conseguia desviar o olhar daquela
mulher que sabia que não podia ter.
Seus olhos encontraram os dele.
– Marco...
Novamente foi uma súplica rouca.
– Por que não consigo tirar você da
minha cabeça? Eu levei uma mulher
bonita para jantar, mas eu mal consigo
me lembrar de como ela era agora. Eu
comi, mas não senti o gosto. Só
conseguia pensar em você.
– Quer que eu peça desculpas?
– Você quer pedir?
– Provavelmente não. Mas acho que
tenho uma explicação para você. Talvez
compartilhe um traço da personalidade
do seu irmão. Se algo é negado a você,
passa a querer mais?
Marco não precisava pensar para
responder.
– Não. A diferença entre mim e
Rafael é que ele não teria hesitado em
arcar com as consequências. Ele vê algo
que quer e pega para ele.
– Enquanto você agoniza sem parar,
negando a si mesmo? É quase como se
estivesse se testando, se punindo.
Seus olhos escureceram quando ele
congelou.
Marco
não
conseguia
falar,
necessitava de cada grama de
autocontrole.
– Talvez você devesse aprender a
ceder um pouco... Aceitar o que está
sendo oferecido? O que está sendo
oferecido gratuitamente?
– Eu parei de acreditar em
gratuidade há muito tempo, Sasha. Há
sempre um preço.
– Eu não acredito nisso. O riso é de
graça. O amor é de graça. Assim como o
ódio que devora você por dentro. A
amargura que distorce sentimentos se
você deixar. E, não, não estou
filosofando. Eu experimentei isso.
– É mesmo?
– Para quem você fez a sua
promessa? – perguntou ele, com a
necessidade de conhecê-la tão forte
quanto o desejo em suas veias.
A desconfiança escureceu seus olhos.
– Meu pai.
– O que você prometeu a ele?
– Que eu ganharia o campeonato
para ele.
– Parece-me um senso de
responsabilidade equivocado.
A raiva brilhou através de seus olhos.
– Não é responsabilidade. É amor. E
é tão equivocado quanto sua
necessidade de mimar Rafael.
– Há uma diferença entre a
responsabilidade e seu amor ilusório –
rebateu ele, irado com essa virada da
conversa.
– Sofro ilusões. Meu pai me amava
incondicionalmente, eu também o
amava.
– Então você teve sorte. Nem todo
mundo está imbuído de amor
incondicional por seu filho ou filha.
Alguns chegam a usar seus filhos
nascituros como instrumentos de
barganha.
Sua respiração ficou presa.
– Será que você...? Está dizendo a
partir da sua experiência?
A realidade caiu sobre ele e o quão
perto estava de revelar tudo.
– Eu estava apenas argumentando.
Por mais que eu queira você, Sasha, eu
nunca vou tê-la. As consequências
seriam muito grandes.
CAPÍTULO 8
AS
CONSEQUÊNCIAS
seriam
muito
grandes.
Sasha tentou bloquear as palavras
enquanto ajustava a tração em seu
volante. O tremor nos dedos
aumentava e ela cerrou os punhos
enquanto se lembrava de todos os
ajustes necessários.
Seu coração martelava, emoção e
adrenalina disparavam através dela
enquanto passava pelo ritual rigoroso
de visualizar todas as curvas da corrida.
Em sua terceira tentativa, o medo
aumentou para conviver com suas
emoções.
Ela garantiu a pole position pela
primeira vez em sua carreira de piloto,
mas, apesar da euforia da equipe, ela
percebeu um aumento na especulação
sobre se ela poderia fazer seu trabalho.
Sasha viu em seus rostos, ouviu na voz
de Luke, quando ele passou com ela a
estratégia da corrida pela milionésima
vez.
Consequências... Responsabilidade...
Última chance...
O suor escorria pelo seu pescoço e ela
rapidamente tomou um gole de água.
Ela não podia ficar desidratada. Não era
possível se dar o luxo de perder o foco.
Na verdade, ela não tinha condições de
fazer nada menos do que vencer.
Além das luzes brilhantes do circuito
que transformaram a noite em dia no
Grande Prêmio de Cingapura, milhares
de fãs estariam assistindo.
E Marco também.
Ele não tinha falado com ela desde a
noite em seu sofá, em Londres, mas
esteve presente em cada corrida desde
que a temporada havia retomado, e
Sasha sabia que ele estava em algum
lugar acima dela, na suíte presidencial.
Em algum momento durante as
noites de insônia, quando ela estava
olhando para a pista de corrida de seu
quarto de hotel, ela se perguntava se ele
se preocuparia em aparecer. Ou se ele
estaria muito preocupado entretendo a
filha loura de um magnata da indústria
têxtil italiana, que sempre estava ao seu
lado nos últimos dias.
Ela
tentou
desesperadamente
bloqueá-lo de sua mente. A pole era
um sonho que ela perseguia por mais
tempo do que podia lembrar, isso
deveria deixá-la extasiada. Ela estava a
um passo de retirar a sombra da
vergonha do pai da mente das pessoas.
Para, finalmente, retirar-se da sombra
de Derek.
No entanto, só conseguia pensar em
Marco e em sua conversa, em Londres.
A voz de Luke canalizada através de
seu
capacete
atrapalhou
seus
pensamentos.
– Ajuste a embreagem...
Ela ajustou antes que ele terminasse
de falar. A força de sua vontade de
vencer era um campo de força ao seu
redor.
Concentrada, ela seguiu as luzes
vermelhas. A adrenalina correu mais
rápido em suas veias conforme ela
apontava para a primeira curva.
Ela passou raspando pela dianteira
do segundo colocado. Seu estômago se
revirava volta após volta, mesmo depois
de estabelecer uma distância saudável
entre ela e o carro de trás.
Depois de uma eternidade, ela ouviu
a voz de seu engenheiro no ouvido.
– Você ganhou! Sasha, você venceu o
Grande Prêmio de Cingapura!
Lágrimas apareceram em seus olhos.
O rosto de seu pai flutuava em sua
mente e uma sensação de paz pairou
momentaneamente sobre ela. Foi
quebrada um segundo depois pelo
barulho ensurdecedor da multidão.
Saindo do carro, entre os flashes dos
paparazzi e a multidão que gritava seu
nome, Sasha buscou aqueles familiares
olhos castanhos.
Nada de Marco.
Uma pontada de decepção a abateu.
Com um sentimento de desapego, ela
aceitou os cumprimentos de seus
companheiros e chorou durante o hino
nacional britânico.
Papai ficaria orgulhoso, lembrou-se.
Ele era tudo o que importava. Com um
sorriso no rosto, ela recebeu o troféu do
primeiro-ministro.
Era aquilo que ela queria. Pelo que
ela lutou.
– Eu sabia que você conseguiria!
Prepare-se, Sasha. Seu mundo está
prestes a virar de cabeça para baixo!
A
conferência
de
imprensa
obrigatória para os três primeiros
colocados levou meia hora. Quando ela
saiu, Tom a pegou pelo braço e a levou
para o banco de repórteres que
esperavam por trás das barreiras.
– Tom, eu realmente não quero...
– Você acaba de ganhar sua primeira
corrida. “Eu realmente não quero” não
deve figurar no seu vocabulário. O
mundo é sua ostra.
Mas eu não quero o mundo, gritou
ela em silêncio. Eu quero Marco. Quero
não me sentir sozinha em uma noite
como esta.
Sentindo que ia chorar, Sasha
rapidamente se conteve quando um
microfone foi empurrado em seu rosto.
– Qual é a sensação de ser a primeira
mulher a ganhar o Grande Prêmio de
Cingapura?
Do fundo ela convocou um sorriso.
– Maravilhosa, como a do primeiro
homem que ganhou, espero.
Ao lado dela, ouviu a crítica aguda
de Tom.
Comporte-se, Sasha.
– Você ainda está envolvida com
Rafael de Cervantes? – perguntou um
repórter odioso que ela reconheceu ser
de um canal de esportes do Brasil.
– Rafael e eu nunca estivermos
envolvidos. Somos apenas amigos.
– Então, agora que ele está em coma,
não há nada que a impeça de ser amiga
de seu irmão, não é?
Tom deu um passo adiante.
– Ouça, amigo...
Sasha o deteve.
– Não, tudo bem.
Ela olhou para o repórter.
– Marco de Cervantes é um
engenheiro de classe mundial e um
visionário em seu campo. O incrível
design de seu carro de corrida é a razão
pela qual venci a corrida de hoje.
Chamá-lo de amigo seria uma honra. –
Ela deu outro sorriso e observou o rosto
de decepção do repórter.
Tom acenou para um repórter
britânico.
– Próxima pergunta.
– Como vencedora da corrida, você
será a convidada de honra para o show.
O que vai vestir?
Um leve choque passou por ela,
seguido rapidamente por um profundo
senso de vazio. O show era obrigatório
para as celebridades. Sem dúvida,
Marco estaria lá com sua última
namorada.
– Não importa o que estarei vestindo
porque não vou.
SASHA CORREU para o saguão de seu
hotel de seis estrelas, grata quando os
dois porteiros corpulentos bloquearam
os paparazzi.
O abismo cada vez maior de vazio
que ela não conseguia afastar ameaçou
dominá-la. Rapidamente, ela tirou a
roupa e tomou banho.
A batida na porta veio quando ela
estava se enxugando. Por um segundo,
ela considerou não atender.
Uma sensação de déjà vu a golpeou
quando ela viu uma estilista carregando
um monte de roupa.
– Eu acho que você está na suíte
errada.
A diminuta mulher asiática em um
terno rosa simplesmente sorriu e
entrou. Seguida de sua assistente que
segurava um buquê grande e belíssimo
de lírios roxos e rosas creme.
– Para você.
Escolha um vestido e elas sairão.
Romano está
esperando lá
embaixo.
Sasha olhou para o rabisco ousado de
Marco com descrença. Quando olhou
para cima, as mulheres sorriram e
começaram a puxar os cabides de
roupa.
– Não, espere!
– Nada de “Não, espere”. Vinte
minutos.
– Mas... Para onde vou? – perguntou
ela.
A estilista deu de ombros e vibrou
uma ordem em mandarim.
Vinte minutos depois, Sasha saiu do
carro frio para outro tapete vermelho.
Desta vez, sem Marco, ela estava ainda
mais autoconsciente do que antes. Em
uma noite quente e abafada de
Cingapura, o vestido de seda creme que
ela havia escolhido a deixava mais
exposta do que na segurança de seu
quarto de hotel. À primeira vista, ela se
recusou a usar o minivestido porque...
Bem, porque não tinha parte de trás.
Mas, então, a estilista fixou um material
drapeado em toda a sua parte inferior
das costas e Sasha se sentiu... Sexy,
como uma mulher, pela primeira vez
em sua vida.
Seu cabelo estava preso, suas unhas
polidas e reluzentes. O visual estava
completo com as sandálias de salto
douradas que ela nunca tinha sonhado
que seria capaz de usar, mas que achou
surpreendentemente fácil.
Romano apareceu ao seu lado,
lembrando que Marco estava esperando
por ela.
A área VIP estava repleta de estrelas
do rock e princesas do pop. Ela tentou
jogar
conversa
fora
enquanto
sorrateiramente procurava Marco na
multidão. Alguém colocou uma taça de
champanhe em sua mão.
– Sasha? Você está indo para o palco,
certo?
Tom agarrou seu braço e a deteve.
– O... O palco?
– Sua banda favorita está prestes a
tocar. Marco fez com que eles voassem
até aqui só para você.
– Ele o quê?
Um tipo diferente de atordoamento
parou seu coração.
– Vamos lá, não quer que eles
comecem sem você.
Mil perguntas correram por sua
mente, mas ela não teve tempo de
expressar nada até ser impulsionada ao
palco e para os braços do vocalista da
banda.
Dividida entre o temor de dividir o
palco com sua banda favorita e a
felicidade por não haver interpretado
errado o bilhete de Marco, os dez
minutos seguintes foram os mais
surreais de sua vida. Mesmo ver-se nos
telões gigantes não a assustou tanto
quanto imaginava.
Ela saiu do palco para o rugido
ensurdecedor da multidão. Tom sorriu
quando a ajudou a descer as escadas.
– Você já viu Marco? – Sasha
atribuiu sua falta de ar no palco à
emoção, não à sua vontade em ver
Marco de Cervantes.
– Hum, ele estava por aqui há um
momento...
– Onde ele está?
– Sasha...
Ele suspirou e apontou para a área
isolada
com
três
guarda-costas
corpulentos.
No início, ela não o viu, sua visão
ainda difusa pelas brilhantes luzes do
palco.
Quando ela finalmente conseguiu
focar e ver o que sua mente se recusava
a aceitar, Sasha estava convencida de
que seu coração tinha sido arrancado
do peito.
Cada passo que ela dava para fora do
show era como uma caminhada para
um abismo. Mas Sasha forçou-se a
continuar, a sorrir, a reconhecer os
elogios e respeito que ela finalmente
teve de sua equipe.
Mesmo que por dentro ela estivesse
entorpecida e congelada.
A BATIDA aconteceu menos de dez
minutos depois.
Marco encostou-se no lintel. Os
botões de sua camisa ainda estavam
abertos, seu cabelo estava despenteado.
Como se mãos, mãos femininas,
tivessem percorrido seu corpo várias
vezes. Ele ficou lá, arrogantemente
imponente.
Ela o odiava mais do que podia
expressar coerentemente.
– O que você quer?
Vestindo um biquíni, seu olhar era
intenso e irritado.
– Por que você deixou o show?
– Por que você não está lá sendo
acariciado por sua musa italiana?
– Você foi embora porque me viu
com Flavia?
– Sabe o que dizem: dois é bom, três
é demais. Agora, se me dá licença... –
Ela pegou a caixa que continha um
colar de diamantes. – Aqui, leve isto de
volta. Eu não quero.
– É seu. Cada membro da equipe
recebe um presente pela vitória. Este é o
seu.
– Você está brincando comigo?
– Não. Aonde você vai?
Ela olhou para a caixa, não sabendo
como recusar o presente.
– Mergulhar, não que isso seja da sua
conta.
– Mergulhar? A esta hora?
– Cingapura é a corrida mais longa
do calendário. Ainda mais quando você
está ganhando e tentando defender a
sua posição. Se eu não me aquecer e
fizer meus exercícios, meus músculos
não aguentam. Era isso que eu tinha
planejado fazer antes... Enfim, você
pode, por favor, sair da minha frente?
Seu olhar caiu sobre as pernas dela.
Um som rouco retumbou em sua
garganta.
– Marco, eu disse...
– Eu ouvi.
Ainda assim, ele não se afastou.
Sasha deixou a caixa cair na cama e
respirou profundamente. Seus sentidos
estavam muito acelerados, prontos para
explorar todo o potencial de seus
sentimentos conflituosos por aquele
homem.
– Vamos.
Ele finalmente saiu do vão da porta.
– Não vou a lugar nenhum com você
até que me diga o que está fazendo aqui
– respondeu ela.
– Importa por que estou aqui, Sasha?
Você está feliz em me ver?
Ela odiava o fogo que corria em suas
veias.
– Há menos de meia hora, tinha
outra mulher em cima de você.
Ele xingou baixinho.
– Sabe, você é a mulher mais difícil e
irritante que conheci.
Apesar da veemência rouca em sua
voz, ela sorriu.
– Obrigada.
Ele a pegou pelo braço e a levou para
o elevador.
– Não foi um elogio.
– Eu sei. Mas eu vou entender como
um.
O elevador os levou para cima. Pelo
canto do olho, ela o viu pegar o telefone
e enfiá-lo no bolso.
As portas se abriram em um espaço
que era tão bonito que Sasha não
conseguiu falar por alguns segundos.
– Está vazio.
Não havia uma única alma no
terraço.
– Sí.
A maneira como ele respondeu a fez
encará-lo.
– Você tem alguma coisa a ver com
isso?
– Por quê? Esta é a centésima
pergunta que você faz desde que eu bati
na sua porta. Eu não queria que o seu
mergulho fosse interrompido.
Ela chutou seus chinelos, sua
temperatura subiu mais um pouco
quando seu olhar caiu sobre seus pés
descalços.
– Esta piscina é três vezes o tamanho
de uma piscina olímpica.
– Eu queria privacidade.
Ele abriu o último botão de sua
camisa e revelou um abdômen
definido.
O calor a inundou. Sob o biquíni,
seus mamilos se apertaram e seus
músculos
tremeram
com
uma
necessidade tão forte que ela mal podia
respirar.
– Entendo. Você vai rosnar para
mim, se eu perguntar por quê?
– Sim – rosnou ele.
Avançando sobre ela, Marco tirou
sua canga. Em seguida, prendeu seu
cabelo no topo da cabeça.
Novas ondas de desejo ameaçaram
afogá-la.
– Marco...
– Quantos minutos você precisa
nadar para ficar menos tensa?
– Uns vinte.
Ela não conseguia tirar os olhos da
beleza de seu rosto, da sensualidade de
sua boca.
– Vinte minutos, então. – Ele tirou a
camisa, em seguida, abriu o cinto.
Seus olhos se arregalaram.
– O que você está fazendo?
– O que lhe parece?
– Hum...
Sem aviso, ele se inclinou e cheirou a
pele entre seu pescoço e seu ombro.
– Você está cheirando ao perfume do
rock star. E eu a um enjoativo perfume
italiano. Que tal tirar o cheiro de outras
pessoas e depois conversar, sí?
– Marco...
Ele xingou baixinho.
– Vá, Sasha. Eu preciso me refrescar
ou Dios me ajude, eu não serei
responsável por minhas ações.
Ela foi, com o peso do olhar dele
escaldando sua pele.
A água foi um alívio bem-vindo, mas
temporário, das sensações entre eles.
Marco mergulhou atrás dela, um
segundo depois, acompanhando-a.
Quando ela nadou mais rápido, para
escapar de sua necessidade frenética,
ele se manteve com ela.
– Fora – ordenou secamente, com a
mão segurando uma toalha como um
toureiro.
Ela saiu da piscina. Ele enrolou a
toalha em volta dela, usando
movimentos bruscos enquanto a secava.
Duas espreguiçadeiras cobertas de
seda estavam lado a lado, separadas por
uma mesa com vários pratos de comida,
de iguarias locais a caviar.
Marco a colocou na espreguiçadeira e
pegou uma garrafa. Sasha forçou-se a
tirar os olhos de seus músculos e olhou
para a mesa.
– Há o suficiente aqui para alimentar
um exército.
Em busca de um prato pequeno, ela
pegou camarões grelhados e arroz.
– Você não gosta de caviar?
Ela fez uma careta.
– Tem um cheiro engraçado e gosto
nojento. Eu não sei por que as pessoas
comem.
Ela comeu um pouco de sua comida
e sentiu a explosão de texturas em sua
língua. Felizmente ela conseguiu
engolir sem engasgar.
– Agora, isto aqui é celestial.
Marco se sentou em frente a ela e
estendeu uma taça de champanhe, seu
olhar nunca deixando os dela.
– Marco...
– Coma. Falaremos quando você
terminar.
Como posso comer? Ela queria
perguntar. Especialmente quando os
olhos dele seguiam cada movimento
seu. Mas as palavras se recusavam a se
formar em seus lábios.
Era como se ele tivesse lançado
algum tipo de feitiço sobre ela.
Contendo sua respiração, ela colocou
o prato de lado.
– Vamos falar agora. Você me
convidou para o show, então me
ignorou para ficar com sua namorada.
O que mais há para falar?
– Flavia não é minha namorada e
não estávamos ficando. Ela estava me
parabenizando pela vitória da equipe,
assim como um monte de gente fez esta
noite.
– Ela estava em cima de você. E você
não parecia se importar.
– Eu estava... Preocupado.
Ela bufou.
– Evidentemente.
– Por el amor de Dios! Eu estava
esperando você na sala VIP! O
primeiro-ministro apareceu quando eu
estava prestes a encontrá-la. Eu tentei
fugir o mais rápido possível, só para
descobrir que você estava mais
interessada na sua estrela de rock
favorita. Era muito evidente que você
estava sem sutiã, mas, diga-me, você
estava sem calcinha?
A raiva tingiu suas maçãs do rosto.
– Você estava com ciúmes?
Sua mandíbula se apertou.
– Se era aquilo o que eu esperava
quando chamei a banda para você?
Não. Se eu quero quebrar todos os
ossos daquele magrelo? Sí. Para
começar.
O ar se espessou entre eles.
Mil perguntas diferentes correram
em sua mente. Uma emergiu.
– Não sou estúpida, Marco, sei onde
isto vai dar. Mas e as consequências? As
que fizeram com que você me evitasse
nas últimas três semanas?
– Vê-la nos braços de outro homem
simplificou a minha decisão. Pelo bem
da minha sanidade mental e para evitar
acusações de assassinato, não vou mais
ficar longe – murmurou ele.
– Certo. Bem, estou feliz por você e
sua sanidade. Mas e o que eu quero?
Seus olhos caíram para os lábios.
– Se você sabe onde isso vai dar,
então sabe o quanto eu quero beijar
você. Venha aqui.
Sua boca, objeto de intenso
escrutínio, vibrava tanto que ela teve
que conter a vontade de mordê-lo.
– Eu quero o que eu disse em
Londres.
Eu
não
quero
um
relacionamento.
Um olhar duro passou por seus
olhos.
– Eu não quero um relacionamento
também.
– E a sua cláusula?
– Não sou um piloto de corridas e
não trabalho para a equipe, estou
isento. Venha aqui, Sasha.
– Não. Você não está distorcendo as
regras?
– Posso citá-las na íntegra para você
mais tarde. Agora eu quero que venha
aqui e me beije.
Sua respiração se encurtou.
– E se eu não quiser?
Seu olhar escureceu.
– Então eu vou voltar para o show,
encontrar sua estrela do rock
esganiçada e decorar a sala VIP com
ele.
Um rugido subiu a poucos
quilômetros de distância. O pulsar do
concerto de rock ecoou de forma
soberba enquanto ele continuava a
observá-la.
– Eu espero que você não ache que
eu vou salvá-lo da cadeia.
Ele deu de ombros.
– Eu espero um monte de coisas,
querida.
Neste
momento estou
esperando que você pare de discutir e
venha para o meu colo. Ajudaria se eu
dissesse que não passei um dia destas
últimas três semanas sem pensar em
você?
– Talvez isso ajude. Um pouco...
Sem aviso, ele estendeu a mão sobre
a mesa e a pegou. Colocando-a em seu
colo, ele libertou seu cabelo e suspirou
de prazer quando as pesadas mechas
caíram em suas mãos.
Apesar de seu biquíni ser discreto,
Sasha nunca se sentiu mais exposta em
sua vida enquanto os olhos e os dedos
preguiçosos dele percorriam seu corpo.
– Você está fazendo isto de novo –
disse em voz sensual.
– O quê? – murmurou ele, com os
olhos descansando no topo de suas
coxas.
Por baixo, a ereção pressionava sua
carne, fazendo com que se contraísse
em antecipação febril.
– O que você faz com os olhos. E
mãos. E corpo.
– Se você quiser que eu pare, vai ter
que me beijar.
– Talvez eu não queira que você
pare. Talvez eu me permita isso antes
de decidir que é uma péssima ideia.
– Você acha que é uma péssima
ideia?
– Meu último relacionamento deixou
um monte de cicatrizes.
Ele ficou tenso.
– Derek machucou você fisicamente?
– Não, mas ele influenciou muita
gente contra mim. Incluindo você.
Ele balançou a cabeça.
– Ninguém me influencia. Se você
realmente não quiser, diga e eu paro.
O pensamento de negar a si mesma
fez seu coração dar uma guinada
dolorosa.
Seu corpo se aproximou.
– Se você pretende parar, assim não é
uma boa ideia, querida.
Sasha teve o suficiente. Marco tinha
passado muito da sua vida controlando
tudo. Pela primeira vez ela desejava vêlo perder o controle. Ela se contorceu
novamente.
Seus olhares se conectaram. A fome
escura em suas profundezas fez a
respiração dela parar. Cedendo ao
impulso, ela deslizou a mão por sua
nuca e inclinou sua cabeça.
Ele assumiu o controle de seus lábios
em um beijo tão impulsionado, tão
desesperado, que ela gritou contra sua
boca. Ele colocou a mão em seu cabelo
para mantê-la imóvel e a outra mão
deslizou para arrastá-la para mais perto.
Sasha foi de boa vontade, seu corpo
era como um barco à deriva do desejo.
Ela poderia estar arriscando tudo
para experimentar algumas horas de
prazer, mas Sasha não conseguia mais
afastar Marco. Ela lidaria com o
arrependimento pela manhã.
Perdendo-se
no
beijo,
ela
corajosamente enfiou a língua contra a
dele. Seu corpo estremeceu, fazendo
um pequeno arrepio de prazer correr
por ela.
Quando os dedos dele apertaram
suas nádegas, ela gemeu.
– Você gosta disto? – murmurou ele
com o olhar pesado.
Ela assentiu com a cabeça e lambeu
os lábios, já sentindo falta da sensação
de sua boca contra a dela.
– Diga-me do que mais você gosta,
mi tentación.
Ele tirou o laço da parte de cima do
biquíni dela e arrastou a boca sobre sua
pele.
– Você... Com menos roupa... – disse
ela ofegante.
Outro rugido do show rasgou o ar da
noite. Momentaneamente ela se
lembrou de onde estavam.
– Por outro lado, talvez isso não seja
tão ruim...
– Nós não seremos perturbados.
O arranhão de seus dentes sobre um
mamilo derreteu a última de suas
reservas. Deixando seus sentimentos
sem rédea, ela deslizou a mão sobre
seus ombros, tocando a pele suave de
sua nuca antes de explorar seu cabelo
úmido.
A urgência dela alimentava a dele.
Com o vigor renovado, ele a beijou
novamente. Invertendo as posições, ele
a colocou na espreguiçadeira, em
seguida, puxou a calcinha de seu
biquíni.
Na luz suave, no ambiente acolhedor
em que estavam, sua pele formigava ao
toque.
– Eu quero tocar em você inteiro.
As palavras acaloradas saíram antes
que ela pudesse detê-las.
Seu rosto se contorceu em uma
careta de dor. Inclinando-se, ele passou
a língua sobre sua boca.
– Eu acho que mencionei que estive
próximo à loucura nestas últimas
semanas. Tocar meu corpo inteiro não é
uma boa ideia no momento.
A respiração se tornou cada vez mais
afobada.
– Ah, então eu acho que não é um
bom momento mencionar que eu
também pretendo morder alguns
lugares estratégicos.
– Faça-me um favor, mi tentación.
Mantenha seus pensamentos para si
mesma, por enquanto. Você tem a
minha palavra. Eu vou deixar você se
expressar como quiser mais tarde.
Descendo, ele envolveu um mamilo
exposto em sua boca. Palavras não mais
podiam expressar as sensações. Um
calor líquido se agrupou no topo de
suas coxas, a carne do sexo inchava e
pulsava com a força do desejo.
Quando, ao deslizar sua boca, ele
mergulhou abaixo do umbigo, ela
congelou.
Sentindo que se travou, ele levantou
a cabeça.
– Você não quer isto?
– Eu quero. – Tanto que a força de
seu desejo a deixou chocada. – Eu
quero... Mas se você não quiser...
Suas palavras fracassaram no calor
escaldante dos olhos dele.
– Eu passei noites intermináveis
imaginando seu gosto, Sasha. – Ele
abriu mais suas pernas, lambeu a pele
sensível dentro da coxa, seus olhos
escureceram em um gemido sem fôlego.
– Mas eu sempre preferi a realidade aos
sonhos.
Ele se aprofundou nela, lentamente,
trabalhando a língua sobre os milhões
de terminações nervosas saturadas com
receptores de prazer. Sasha gritou e veio
em uma onda de prazer tão intensa que
todo o seu corpo tremeu.
Antes
que
seu
orgasmo
desaparecesse, Marco surgiu sobre ela.
Seu beijo era menos frenético, mas não
menos exigente. E, assim como o motor
de um carro afinado, seu corpo
respondeu às demandas.
A tensão gritava através do corpo de
Marco quando ele se levantou do beijo
inebriante. O som de orgasmo de Sasha
ecoou em sua cabeça como o chamado
de uma sereia, prometendo-lhe prazer
além da medida.
Felizmente a sanidade prevaleceu na
hora certa.
Sasha se moveu inquieta debaixo
dele, com o olhar sensual firme quando
ele separou suas coxas.
A verdade era que ele nunca desejou
uma mulher da forma que desejava
Sasha. Ele parou de tentar decifrar o
que a fazia tão irresistível. Era ela.
Apenas. Ele também tinha feito
perguntas discretas e verificou que ela
dissera a verdade, ela não tinha se
envolvido com Rafael.
Sasha Fleming estava sob sua pele
como nenhuma outra mulher esteve e
aquela era a conclusão inevitável. Suas
coxas se separaram, ela pousou um
olhar sensual sobre o seu. Exatamente
como ele tinha sonhado...
Com um gemido, ele se afundou
nela.
– Ainda bem – gemeu ela. – Por um
segundo eu pensei que você estava
prestes a mudar de ideia.
Como que para impedi-lo, seus
músculos se apertaram com força ao
redor dele.
Outro gemido escapou de sua
garganta.
– Eu pensei que eu tivesse dito para
ficar quieta.
Ele se afastou e subiu nela, mais uma
vez, sentindo um prazer inédito.
– Eu vou... Eu vou... Só, por favor,
não pare.
Cravando as unhas em suas costas,
ela apertou mais.
Ele não poderia, nem mesmo se
quisesse. Não havia retorno.
– Dios, você é maravilhosa –
murmurou ele.
Inevitavelmente, ele chegou ao ápice
do prazer. Êxtase cavalgou seu corpo,
cegando-o com a satisfação gloriosa da
paixão desenfreada.
Com seu grito de felicidade,
esvaziou-se nela.
Marco caiu sobre ela, que estava
macia, com o corpo escorregadio de
suor. Ali permaneceu até sua respiração
se acalmar. Rolando na espreguiçadeira,
ele a colocou ao seu lado.
Logo, a primeira pontada do
inevitável arrependimento apareceu.
Ele sucumbiu à tentação. Agora,
haveria o preço a pagar. E, pela primeira
vez em sua vida, Marco estava com
medo.
CAPÍTULO 9
– QUE...?
– SASHA se
sacudiu,
acordando.
Seu corpo sólido estava ao redor dela
e seu o braço a impedia de cair da
espreguiçadeira. Abrindo os olhos, ela
se deparou com o olhar acusador de
Marco.
– Você adormeceu.
Ela teve relações sexuais com Marco.
Relações selvagens, inacreditáveis,
cheias de prazer. Depois...
– Você adormeceu – apontou ele de
novo, com um sentimento de afronta
estampado no rosto.
– Ah... Desculpe...
– Tenho a sensação de que você não
quis dizer isso.
– E eu tenho a sensação de que não
estou entendendo aonde você quer
chegar.
Antes que ela pudesse evitar, um
grande bocejo irrompeu.
Seu olhar escureceu.
– Eu não agradei você?
Ele parecia genuinamente perplexo e
um pouco inseguro.
– Claro que agradou – disse ela.
Erguendo as mãos, ela emoldurou
seu rosto.
– Eu nunca senti mais prazer com
ninguém.
– Foi tão bom que você adormeceu
logo depois?
– Tome isso como um elogio. Você
me desgastou.
Suas pálpebras velaram seus olhos.
– Você é a primeira, eu admito.
– Que se desgasta? – perguntou ela,
espantada.
– Claro que não. A parte de
adormecer.
Uma risada borbulhou dentro dela.
Inclinando-se, ela pressionou seus
lábios contra os dele em um beijo leve.
Marco o transformou em um beijo
longo e profundo.
– Como eu disse, desculpe. O que
posso fazer para compensar?
Ela deslizou a mão por ele e o
agarrou com força. Seus lábios se
separaram em outro gemido. Ela
acariciou para cima e para baixo,
maravilhada com sua tensão.
Sua boca se arrastou sobre o rosto
dela, indo para a junção entre o pescoço
e o ombro. Um calor erótico passou
através dela.
Quando sua tensão aumentou, sua
respiração estremeceu.
– Sí, mi querida, este é o caminho
certo.
Um calor líquido se reunia entre suas
coxas. Ela estava incrivelmente excitada
pelo prazer que dava a ele.
Em mais uma carícia, de repente, ele
se ergueu.
– Você está se deixando levar.
Ela deslizou suas coxas por cada lado
dele e abaixou-se até que seu calor
úmido o tocou. A sensação de mãos
fortes deslizando por suas costas a fez
estremecer de prazer.
– Então eu ficar por cima não foi
uma boa ideia, não é?
Seu olhar predatório tomou conta
dela, demorando-se em seus seios.
– É hora de você aprender que eu
posso controlá-la independentemente
da posição.
Ele
cresceu
dentro
dela,
preenchendo-a tão completamente que
estrelas explodiram atrás de suas
pálpebras fechadas. Ele segurou sua
nuca, forçou-a para baixo e tomou sua
boca em um beijo ardente.
Seu ritmo era frenético. Ela gemeu
quando ele libertou sua boca, antes que
pudesse suspirar. A sensação saiu do
controle
com
uma
velocidade
impressionante.
– Abra os olhos. Deixe-me ver seus
olhos enquanto você goza.
Ela obedeceu.
– Marco...
– Sí, estou sentindo também.
Ela acreditou nele. O brilho do suor
revestia sua pele, a mão trêmula
acariciava seu rosto; tudo atestava o fato
de que ele também estava apanhado
naquele turbilhão incrível.
O prazer arrebatou seu coração,
forçando-a a gritar uma última vez
quando um orgasmo explodiu através
dela.
Abaixo dela, ainda controlando seu
prazer, Marco era empurrado para sua
libertação, gemendo com a própria
satisfação.
Suas respirações ofegantes se
misturavam, seus corações trovejavam
conforme a brisa refrescava as peles
suadas. Longe dali, outra explosão de
fogos de artifício iluminava o céu.
A intensidade do seu prazer
compartilhado provocou uma ameaça
de medo por ela.
Para mascarar seus sentimentos, ela
escondeu o rosto em seu ombro.
– Eu adoraria compor um soneto
para você agora. Mas eu não tenho
palavras.
Um pequeno estrondo de risadas
ecoou em seu peito aquecido.
– Sonetos são superestimados. Seus
gritos de prazer são uma recompensa
suficiente.
Sasha suspirou, colocou a cabeça no
peito dele e tentou respirar. O alarme
que tinha criado raízes naquela
pequena parte do seu cérebro cresceu.
Algo aconteceu entre o primeiro e o
segundo ato de amor.
Então, ela se sentiu segura o
suficiente para adormecer nos braços de
Marco. Naquele momento... Naquele
momento ela se sentia exposta. Com as
emoções cruas, nuas.
Espontaneamente, lágrimas surgiram
em seus olhos. Ela se arrastou para
esconder, mas Marco percebeu seus
sentimentos.
– Você está chorando. Por quê?
Como poderia explicar algo sobre o
que ela não tinha conhecimento?
Quando ela tentou dar de ombros,
ele balançou a cabeça.
– Diga-me.
– Estou me sentindo um pouco
sobrecarregada. É isso.
Depois de um segundo, ele balançou
a cabeça e passou a mão pelo seu rosto.
– Sí. Esta é a sua primeira vitória.
Esse sentimento nunca pode ser
igualado.
Por vários segundos Sasha não
entendeu o que ele falava. Quando
percebeu que ele estava falando sobre a
corrida e não sobre as consequências
turbulentas de sua vida amorosa, seu
coração balançou.
– Eu queria que meu pai estivesse lá.
Marco assentiu.
– Ele ficaria orgulhoso de você.
A surpresa arregalou seus olhos.
– Você sabe quem era o meu pai?
– Claro. Eu vi todas as corridas dele.
É evidente que você herdou seu talento.
O elogio inesperado a fez se sentir
ainda mais chorosa. Ela tentou se
afastar, mas ele a pegou de volta,
abaixou a cabeça e a beijou.
– Você sabe o que aconteceu com
ele, então?
– Ele apostou que outro carro
venceria e deliberadamente bateu.
A convicção em sua voz enviou um
arrepio gelado por sua espinha.
Ela se afastou com força.
– Era mentira!
Marco cruzou os braços atrás da
cabeça.
– Não de acordo com o tribunal que
o considerou culpado.
– Ele nunca conseguiu refutar as
alegações. Mas eu acreditei nele. Meu
pai nunca teria feito isso. Ele adorava
correr para bater de propósito pelo
dinheiro.
– Eu estava no conselho que analisou
as imagens, Sasha. A prova era difícil de
refutar.
Choque e raiva se contorceram em
seu intestino.
– Você foi uma das pessoas que
decidiu que ele era culpado?
Marco pôs os pés no chão.
– Ele não fez muito para se defender.
Levou semanas para reconhecer as
acusações.
– E isso faz dele automaticamente
culpado? Ele ficou arrasado! Sim, ele
deveria ter respondido às alegações
antes, mas as acusações partiram seu
coração.
Sua voz embargou conforme as
lembranças foram surgindo.
– Então ele desistiu? E a deixou
carregar o peso de sua culpa?
– Claro que não!
– Por que você prometeu o
campeonato a ele?
– Meu pai começou a beber muito
depois do julgamento. A única vez que
ele parou foi quando fui para o
Mundial de Fórmula Dois. Quando bati
e tive que ficar um tempo no hospital,
ele começou a beber novamente.
– Você foi para o hospital? E o pai
que a amava incondicionalmente não
estava lá para você?
Lágrimas brotaram em seus olhos,
mas ela se recusou a deixá-las cair. Em
seus momentos mais sombrios, mais
dolorosos, depois de perder o bebê, ela
fez a si mesma a mesma pergunta.
– Independentemente do que você
quiser provar, Marco, faça isso sem ser
um completo idiota.
– Você contratou outro advogado
para recorrer?
– É claro que sim. Ele... Meu pai
morreu antes do segundo julgamento.
Seu olhar se suavizou.
– Como ele morreu?
– Ele jogou seu carro de uma ponte
perto da nossa casa. – A dor cobriu suas
palavras. – Todo mundo acha que ele
fez isso porque era culpado. Ele estava
apenas... Devastado.
– E você se sente culpada por isso?
– Se eu não tivesse me envolvido com
Derek, eu teria ganhado um
campeonato antes. Talvez isso salvasse
meu pai...
– A vida é sua. Você não pode vivê-la
para outra pessoa. Nem mesmo seu pai.
– Quem está fazendo o papel de
psicanalista agora?
Sua sobrancelha se ergueu.
– Pimenta nos olhos dos outros é
refresco.
Sasha tentou conter a onda de culpa
que se erguia dentro dela. Após o
julgamento ela sugeriu que seu pai não
fosse às suas corridas, porque ela o via
deslizar mais profundamente em
depressão depois de cada uma.
– O que quer que ele fosse, ele não
era uma fraude. E eu pretendo honrar a
sua memória.
Marco
se
levantou
da
espreguiçadeira, completamente alheio
à sua beleza masculina pura e ao efeito
que teve sobre suas emoções
emaranhadas. Sasha queria enterrar-se
no casulo morno de seus braços. Mas
ela se forçou a ficar onde estava.
– Venha aqui.
Ela balançou a cabeça.
– Não, eu não estou gostando muito
de você agora.
Seu sorriso era zombeteiro.
– Isso não é verdade. Você não
consegue tirar seus olhos de mim.
Assim como eu não posso tirar os meus
de você.
– Marco...
Ele segurou seu queixo e levantou
seu rosto.
– Você fez sua promessa por culpa...
– Não, eu quero ganhar o Mundial.
– Às vezes, o melhor negócio é deixar
para lá.
– Eu não pretendo. Portanto, não
fique no meu caminho.
– Determinação é uma qualidade
que eu admiro, querida. Mas lembre-se
de que não vou tolerar nada no
caminho dos meus desejos.
Puxando-a firmemente em seus
braços, ele a fez esquecer-se de tudo,
exceto dele. Incluindo o fato de que ele
jamais acreditaria na inocência de seu
pai.
MARCO FOI às duas corridas seguintes,
viajando da Espanha, onde Rafael ainda
estava em coma. Quando ela venceu no
Japão, ele levou toda a equipe para
comemorar, depois levou Sasha para
seu apartamento para uma celebração
particular.
Depois de um início complicado, ela
garantiu na Coreia mais uma vitória.
Mas um olhar para a expressão tensa de
Marco, depois da conferência da
imprensa, mostrou que não haveria
celebrações daquela vez.
– Marco?
– Vamos embora. Agora.
Ele a levou do circuito de Yeongam
em seu helicóptero, seus dedos
possessivos tensos sobre os dela durante
todo o voo por uma deslumbrante praia
nos arredores da cidade de Seul, onde
ele começou a retirar sua roupa de
corrida.
– Você sabe que essa sua atitude de
me arrastar assim na frente da equipe
deixou nossa situação clara, não é? –
perguntou ela.
Ele afastou um cacho úmido de sua
bochecha e estudou seu rosto.
– Isso incomoda você?
Ela pensou brevemente no assunto.
– Havia especulação mesmo antes de
estarmos juntos.
Ele se afastou um pouco.
– Isto não responde à minha
pergunta.
Eles sabiam que eu era um bom
piloto antes de começar a dormir com
você. Eles simplesmente não queriam
reconhecer por causa de quem eu sou.
Eu só me importo com o que pensam
de mim como piloto. O que pensam de
mim, pessoalmente, não importa.
Nunca importou.
– Você é uma lutadora – disse ele
com uma expressão reflexiva.
– Eu tive que lutar por aquilo que
consegui. – Ela lançou um olhar
divertido a ele. – Como você bem sabe.
Quando ele não sorriu de volta, uma
nuvem apareceu no horizonte da sua
neblina feliz.
– Você se incomoda que eu não me
importe com o que as outras pessoas
pensam sobre mim?
– A obstinação tem o seu lugar.
– Eu sinto um porém em algum
lugar.
– Perseguir um único sonho é
arriscado. Quando ele lhe for tirado,
você não terá mais nada.
– Quando? Não se? Você está
tentando me dizer alguma coisa?
– Nada dura para sempre.
– Você deve estar sob o efeito do jetlag, porque está muito enigmático
comigo. Estou há três corridas de
garantir o Mundial de Construtores
para você. A não ser que eu não
termine mais nenhuma corrida e nosso
rival mais próximo ganhe todas elas,
estamos praticamente conseguindo.
Ele saiu da cama e vestiu sua cueca,
enviando um arrepio de desconforto
por sua espinha.
– Não tem nada garantido.
Sua ansiedade aumentou.
– Chega. O que está acontecendo,
Marco?
Marco andou até o balde de prata
com um espumante, encheu uma taça e
trouxe de volta para ela.
Colocou um uísque para ele e bebeu
de uma só vez.
Ele bateu o copo e girou em sua
direção.
– Madre de Dios, você quase bateu
hoje!
Seus dedos se apertaram em torno da
haste delicada de sua taça. O carro dela
tinha parado no início da corrida,
fazendo-a lutar para manter a pole
position. Seus rivais não hesitaram em
tentar tirar proveito da situação. Ela
tocou pneus com alguns carros e quase
perdeu a asa dianteira.
– Eu estive em uma situação
complicada. Eu lidei com isso. – Ela
olhou para ele. – Você estava
preocupado?
– Que minha amante acabaria em
uma pilha de metal amassado assim
como o meu irmão há poucas semanas?
O que você acha? – grunhiu ele.
Ela tremeu com a dureza em seu tom
de voz, mesmo quando uma parte
secreta se emocionasse por ele estar
preocupado.
– Eu sei o que estou fazendo, Marco.
Eu fiz isso quase toda a minha vida.
– Rafael sabia o que estava fazendo
também. Olhe onde ele foi parar. Você
não pode fazê-lo para sempre. Você
sabe, não é?
Sasha
deliberadamente
evitava
quaisquer pensamentos sobre o futuro.
Até o final da temporada ela não
pensaria nisso. Se por algum puro golpe
de má sorte, ela perdesse o Mundial de
Construtores, ela estaria desempregada.
Se ela ganhasse, seu futuro
profissional estaria assegurado por mais
um ano. Mas e o seu futuro pessoal?
A realidade era que tinha caído na
cama de Marco esperando pouco mais
de um caso de uma noite. Mas a cada
dia que passava ela estava sendo
consumida
pela
magia
que
experimentava.
Sem
nenhuma
preocupação com o futuro...
– Sim – sussurrou ela finalmente. –
Sei que nada dura para sempre.
– Bueno – respirou ele, como se a
resposta lhe satisfizesse. – Você vai
beber isso? Depois de assistir você quase
bater, sinto uma necessidade urgente
de reafirmar a vida com você
novamente. Repetidamente.
Ela passou a taça a ele e abriu os
braços.
Depois de uma sequência de
orgasmos de abalar a alma, ela ficou
tensa.
– Marco!
– O quê?
– Nós não... Nós nos esquecemos...
Ela começou a freneticamente fazer
cálculos de datas.
– Dios. Por favor, me diga que você
está tomando pílula – murmurou ele.
Sua voz era um som engasgado.
Tranquilizada com as datas, ela
balançou a cabeça, em seguida, notou
sua palidez.
– Ei, está tudo bem. Mesmo que a
pílula não funcione, é o momento
errado do mês.
– Você tem certeza? – perguntou ele.
Franzindo a testa, Sasha colocou uma
mão em seu rosto, que estava frio e
úmido.
– Tenho certeza. Relaxe.
MARCO SE afastou de Sasha, contra o seu
protesto gutural quando ele saiu da
cama. Puxando um roupão, ele entrou
em seu escritório. Seu laptop estava
sobre a mesa, as pastas dispostas
ordenadamente por seu assistente.
Atirou-se no sofá de couro e passou a
mão pelo rosto.
Ele não queria perder a calma com
Sasha como fez antes.
Mas vendo-a quase bater o deixou
encurralado de medo e raiva, e ele não
foi capaz de ignorar. Agora, sua perda
de controle o fez esquecer sua única
regra de vida: contracepção. Sempre.
Ele não tinha deslizado uma vez em
dez anos. Até esta noite. Graças a Deus,
Sasha era contra acidentalmente
conceber um filho como ele...
Tomando as rédeas do seu controle,
que parecia estar indo embora, ele
caminhou até sua mesa e pegou uma
pasta. Um pedaço de culpa aumentou
dentro dele, mas ele o anulou.
Basta. Ele fez o que precisava ser
feito. Ele se recusava a se sentir culpado
por proteger o que era importante para
ele. Nada importava, exceto manter a
sua família segura.
Ele pegou o telefone e ligou para os
médicos de seu irmão. Uma vez que ele
tinha sido informado sobre o quadro de
Rafael, ele fez outra chamada.
Quinze minutos depois, ele bateu
com a tampa do seu laptop e se afastou
da mesa, em paz com a sua decisão.
Sentindo um senso de retidão, ele
voltou para o quarto e deslizou para a
cama, seu desejo por Sasha superava a
necessidade de deixá-la descansar. Com
um suave murmúrio ela o abraçou. O
senso de retidão aumentou, fazendo
sua cabeça girar.
– Senti sua falta. Onde você esteve?
Outra onda de culpa o atingiu, mais
do que antes. Inalou seu perfume
sedutor, afastando o sentimento
perturbador.
– Eu precisava cuidar de algo. –
Inclinando a cabeça, ele colocou seus
lábios contra a pele macia do pescoço
dela. Seu corpo se agitou, transmitindo
sua mensagem persistente.
– Hum. E você sentiu minha falta? –
murmurou ela.
– Sí. – Sua voz surgiu. – Está tudo
resolvido.
CAPÍTULO 10
SASHA ASSISTIU Marco virar a página de
seu jornal, a carranca de antes havia se
suavizado novamente. Observá-lo se
tornou uma espécie de prazer não tão
secreto nas últimas semanas.
Como se sentisse seu olhar, seus
olhos se encontraram por cima do
jornal.
– Você quer voltar para a cama?
Ele riu de sua sacudida de cabeça
pouco convincente. Os restos do café da
manhã estavam espalhados sobre a
mesa, há muito esquecidos conforme se
deleitavam com o sol sul-coreano.
– Eu não sabia que você podia ler
coreano – disse ela, ansiosa por algo
para destilar o calor sufocante do desejo
que nunca saía da superfície.
Marco sorriu e dobrou o jornal.
– É japonês. Nunca dominei
completamente o coreano.
– Uau. Você está admitindo outra
falha? Chocante!
Ele deu de ombros.
– Foi uma escolha de qual era o mais
útil.
Ela torceu o nariz.
– Útil? Você nunca faz nada apenas
por prazer?
Seu olhar divertido a fez corar.
– Além de sexo – murmurou ela.
– Sexo com você é todo o prazer que
anseio, mi corazón.
– Você tem outros interesses, não é?
Todo mundo tem.
Sua risada gutural fez o pulso dela
bater com mais força.
– O que você tem em mente?
– Algo cultural. Uma exposição. Algo
diferente...
Perturbada, ela acenou com a mão
em direção à cama desarrumada.
Inclinando-se, ele deslizou a mão ao
redor de sua nuca e a puxou para um
beijo quente.
– Eu prefiro passar o dia com você na
cama. Mas se você insiste...
– Insisto.
Sasha acordou aquela manhã com
um profundo medo em seu coração. Ela
estava correndo o risco de desenvolver
sentimentos por Marco de Cervantes.
Sentimentos que ela não ousava
nomear. Sentimentos que ameaçavam
dominá-la quanto mais tempo ela
passasse trancada em seu abraço.
Ele também acreditava que seu pai
era culpado de fraude, uma pequena
voz acrescentou.
Uma dor aguda a perfurou. Ela não
tinha sido capaz de levantar o assunto
com Marco desde aquela noite em
Cingapura.
– Você tem 15 minutos para ficar
pronta.
Ela despertou para encontrar Marco
encerrando uma ligação.
– Pronta para o quê?
Ele jogou o celular em cima da mesa.
Faíscas de prazer iluminaram sua pele.
– Você quer cultura, mi encantadora.
A Coreia aguarda você.
– AH, MEU Deus – sussurrou Sasha
enquanto seus pés descalços tocavam as
pedras molhadas que levavam ao
templo antigo do lago, incapaz de
afastar o olhar da vista magnífica diante
dela.
– Percebi que não gosto que você use
essa expressão, a menos que ela se
relacione diretamente a mim, pequeña
– reclamou Marco, soltando sua mão
quando ela saltou para a pedra
seguinte.
– Você está com ciúmes? –
perguntou ela com uma risada.
Ele levantou uma sobrancelha
zombeteira.
– Da sua adoração insana por
templos e monumentos antigos? Não
mesmo. Mas eu sugiro que você altere a
sua fraseologia, porque cada vez que
você diz “Ah, meu Deus” naquele tom
sexy, eu quero subir em você na
superfície mais próxima.
– Não.
Ela se afastou com relutância. Ele
franziu o cenho.
– Qué diablos?
– Shh, estamos em um lugar sagrado
– sussurrou ela. – Nada de beijo. Ou
palavrões.
Ela riu abafado e pulou o resto das
pedras até chegar à frente do templo.
– Uau.
– Uau dá para aceitar.
– Você vai ter que aceitar. Não tenho
outras palavras.
De onde estavam, o pequeno templo
parecia flutuar na água. À luz do sol
que morria, enormes nenúfares
brilhavam.
– É tudo tão bonito. Deslumbrante. –
Com passos reverentes Sasha se
aproximou das portas do templo. –
Podemos entrar?
Ele acenou com a cabeça.
– Não é normalmente aberto aos
visitantes. Mas nesta ocasião...
Espontaneamente, um caroço subiu
para sua garganta.
– Obrigada.
– De nada. Vá, explore o quanto
quiser.
Com pernas que tremiam e um
coração que martelava, Sasha fez uma
pausa para enxugar os pés, em seguida,
entrou no templo.
Como todo lugar em que Marco a
levava, o templo era de tirar o fôlego.
Os pergaminhos shoji que revestiam as
paredes pareciam de papel fino e frágil,
fazendo-a prender a respiração para
não danificar nada. Examinando um,
ela desejava ter um tradutor para
explicar os símbolos a ela.
– “Paz através da sabedoria.
Sabedoria através da perspicácia” –
murmurou Marco atrás dela. – Este
templo era originalmente japonês. Ele
mudou de dono algumas vezes antes de
os monges Shaolin assumirem no século
IV.
– Deixa tudo em perspectiva, não é?
– É mesmo?
– Você disse que nada dura para
sempre. Este templo revela que algumas
coisas duram.
Por um longo momento, ele não
respondeu.
– Vamos, é hora de sair. Romano vai
pensar que você me sequestrou.
– O quê? Pequena deste jeito?
Ele riu.
– Romano sabe que você é faixa preta
em jiu-jitsu.
– Eu ainda pensaria duas vezes antes
de chutar um homem do tamanho dele.
Então, você está seguro comigo.
– Gracias.
Ele enfiou os dedos nos dela, então
sinalizou a Romano para trazer o carro.
Ela esperou até que eles estivessem
no carro antes de se inclinar e colar seus
lábios nos dele.
– Obrigada por me mostrar Seul.
– O tour ainda não acabou. Tenho
uma última surpresa para você.
– É mesmo?
– A noite está apenas começando. Eu
conheço um pequeno lugar onde, se
você for realmente gentil para os
funcionários, eles criam um prato em
sua homenagem. Permita-me mostrar
para você?
Ele pegou e beijou sua mão.
Sasha experimentou aquele medo
irracional de novo. Só que daquela vez
era dez vezes pior. Seu coração
martelava e seu pulso disparou por suas
veias.
Não. Ela não estava se apaixonando
por Marco de Cervantes. Porque isso
seria estúpido.
E imprudente.
Os lábios dele acariciaram a pele
sensível do seu pulso.
No seu suspiro impotente, ele sorriu.
– Pensando bem, uma refeição com
um chef famoso na praia soa muito
atraente.
Resistir à tentação era quase
impossível. Mas Sasha se forçou a falar.
– Não é justo mostrar a oportunidade
de ter um prato com o meu nome e
depois retirá-la. Agora está na minha
lista de desejos.
– Eu só tenho uma coisa na minha
lista de desejos.
– Você é insaciável – respirou ela,
incapaz de parar de gemer quando o
polegar dele passou sobre seu mamilo.
Inclinando a cabeça, ele trouxe seus
lábios para perto dela.
– Só por você que eu tenho este
desejo – murmurou ele densamente. –
E, por favor, não me negue.
Ele se aproximou até que suas
respirações se misturassem.
– E o jantar... O prato...? – sussurrou
ela.
– Iremos lá – prometeu ele. – Só
que... Mais tarde.
Com um gemido abafado, ele se
aproximou mais, selando-os em um
casulo quente de desejo febril.
O casulo durou todo o caminho
durante seu tórrido ato de amor na
cama de Marco e no chuveiro, onde ele
explorou cada centímetro de seu corpo,
como se a visse pela primeira vez.
O telefone tocou enquanto se
vestiam para o jantar. No início, ela
pensou que era uma ligação de
negócios. Então ela notou sua palidez.
Seu casulo tinha sido quebrado.
– Quem era? – perguntou ela,
mesmo que parte dela soubesse a
resposta.
– Era do hospital. Rafael sofreu outra
hemorragia.
– O QUE diabos você está fazendo aí
embaixo? Consumindo o óleo do
motor?
Sasha congelou ao ouvir a voz que
não ouvia há seis longas noites sem
dormir e se forçou a respirar.
– Dê-me a chave inglesa.
– A equipe não lhe falou que não é
permitido ninguém aqui?
A dura censura na voz dele
machucou seus nervos.
– Eles provavelmente tentaram.
– Você não ouviu, não é?
– Eu não falo espanhol, lembra?
Você vai me dar a chave inglesa ou
não?
Seus pés se moveram e uma chave
apareceu por baixo do corpo do
Berlinetta de 1954.
– Não esta. A retrátil.
– Obrigada.
Ela enganchou a chave no parafuso e
puxou. Nada aconteceu.
– Vamos, saia daí.
– Não.
– Sasha...
Sua voz tinha mais do que um toque
de aviso.
Sua boca se apertou. Ela não queria
ver seu rosto, não queria sentir seu
cheiro. Na verdade, ela queria negar
tudo que tivesse a ver com Marco.
Negar que cada átomo de seu ser
ansiava por atirar-se nos braços dele.
– Precisamos conversar.
Seu coração se apertou.
– Então fale.
Uma jaqueta de corte fino pousou a
poucos metros de sua cabeça, seguida
por Marco.
– O que você está fazendo?
Ele a ignorou.
– Dê-me a chave e afaste-se.
– Por quê? Por que você acha que é
maior e mais forte do que eu?
– Eu sou maior e mais forte do que
você.
– Porco sexista.
– Verdade simples.
– Vejo que ainda vivem na Idade das
Trevas.
– Só quando se trata de proteger o
que é meu.
Percebendo que ele não estava indo
embora, ela deu de ombros.
– Tudo bem. Divirta-se.
– Não há argumentos, querida? É
assim que funciona entre nós
geralmente, não é? Eu digo alguma
coisa, então você argumenta até a morte
e eu a beijo para que fique quieta.
– Eu não argumento para ter seus
beijos, se é isso que você está
insinuando. Na verdade, eu adoraria
que me deixasse em paz – sugeriu ela. –
Você conseguiu isso com bastante
sucesso por quase uma semana.
Silenciosamente, ele estendeu a mão.
Com alguns toques firmes, ele soltou o
parafuso.
– Exibido – brincou ela. – O que você
quer?
– Eu pensei que você iria querer uma
atualização sobre Rafael.
Seu olhar ficou intenso na dela.
– Eu pensei que não pudesse.
– Se eu ainda acreditasse que você e
ele estavam envolvidos, eu não teria
levado você para a minha cama.
– Certo. Então, como ele está?
– Ele está melhor. Os médicos
conseguiram parar o sangramento. Eles
esperam que ele acorde a qualquer
momento.
– Esta é uma ótima notícia.
– Sí.
A intensidade a deixou apreensiva.
Sem aviso, seu olhar caiu sobre os lábios
dele. Tardiamente Sasha percebeu que
ela estava se lambendo. Parou. Mas o
espaço apertado debaixo do carro
tornou-se menor. O ar ficou mais
rarefeito.
– Você não precisava voltar aqui para
me dizer isso. Um simples telefonema
teria bastado. Eu vou arrumar minhas
coisas e sair esta tarde.
Ele endureceu.
– Por que você faria isso?
– Rafael vai precisar de você quando
voltar para casa. Eu não posso estar
aqui.
– É claro que você pode. Eu quero
que fique aqui.
– Essa não foi a impressão que tive
nos seus seis dias de silêncio.
Ele prendeu a respiração e, pela
primeira vez, ela percebeu as linhas de
tensão ao redor dos seus olhos.
– Eu não esperava ficar longe por
tanto tempo. Desculpe.
Quando sua boca se abriu em
surpresa com o pedido de desculpas, ele
fez uma careta.
– Eu sei. Eu devo estar perdendo o
jeito.
– Como você entrou aqui? A porta
está trancada.
– Rosario me deixou entrar. Ela
reconhece a loucura quando vê.
Então... Vinte e cinco carros antigos
trancados em uma garagem? Comente.
Ele respirou fundo.
– Eu me recuso a ter esta conversa
debaixo de um carro, com graxa
pingando em mim.
– Devia ter pensado nisso antes de se
arrastar até aqui.
– Dios, eu senti falta do seu jeito
insuportável. – Ele fez uma pausa. –
Esta é a sua chance de me dizer que
sentiu também.
A necessidade gritante de fazer
exatamente isso a assustava.
– Você tem certeza que não quer que
eu vá embora? Eu posso ir para casa por
alguns dias, antes que a equipe saia
para Abu Dhabi na próxima semana.
Talvez seja melhor assim.
– E talvez você precise se calar. Só por
um maldito momento – rosnou ele, em
seguida, agarrou seu braço e a abraçou.
O calor de sua boca devorava a dela.
Seus dedos agarraram sua nuca,
deleitando-se com a pele lisa. De boa
vontade, ela deixou a boca aberta,
permitindo que a língua dele invadisse
e deslizasse deliciosamente contra a
dela.
Sasha queria estar perto. Mais perto.
Física e emocionalmente. Porque...
Porque...
Infinitamente feliz, ela explorou a
grande extensão de seus ombros.
Contra a sua barriga, ela sentiu a
força de sua ereção.
– Você percebe que nós estamos
debaixo de um carro, não é? –
perguntou ela com voz rouca.
– É a única coisa que me impede de
puxá-la para cima de mim e me
enterrar dentro de você. Diga-me que
sentiu minha falta.
– Senti sua falta.
– Bueno. – Ele a beijou mais uma
vez.
No momento em que ele a libertou e
a puxou de debaixo do carro, seu
cérebro havia se tornado uma extensão
inútil de seu corpo em busca apenas do
prazer que ele podia proporcionar.
Quando ele a despiu e a levou até a
porta de um Rolls-Royce de 1938, ela
era uma escrava voluntária, pronta para
satisfazer todos os seus desejos.
– Você não tem ideia de há quanto
tempo eu queria fazer isto.
– O quê?
Sua boca mergulhou e se deteve
entre o ombro e o pescoço, onde seu
pulso trovejava freneticamente.
O sangue subiu. Quando os dentes
dele roçaram sua pele, ela gritou. O
erotismo era tão intenso que o calor
líquido escorria entre suas pernas, onde
ela pulsava.
Por fim, satisfeito, ele a empurrou de
costas no assento do carro. Ele a seguiu,
caindo em seus braços, fazendo-a se
sentir delicada e cuidada. Como se ela
fosse preciosa. O que era bobagem. Para
Marco, era apenas sexo. Mas para ela...
– Eu pensei que você me quisesse por
cima.
– Daqui a pouco, mi tentación.
Temos um longo caminho a percorrer.
Agora, não se mova.
Ele segurou seus seios, brincando
com seus mamilos, torturando-a por
tanto tempo que ela se contorceu de
prazer.
– Eu disse que para não se mover. –
Ele trincou os dentes com o tesão
estampado em seu rosto.
– Você espera que eu fique aqui
como uma prostituta barata?
– Nunca fui agraciado com o
atendimento de uma prostituta barata,
não posso responder isso. Mas se você
não parar de me atormentar com o seu
corpo, eu não serei responsável por
minhas ações.
– Ah, agora você está me ameaçando.
– Dios, mulher. Sua boca...
– Você quer beijá-la?
Sua cabeça se levantou do assento em
busca da boca dele.
Marco se afastou.
– É uma arma de destruição do
homem.
Ela gemeu.
– Você sempre pode me beijar para
me calar.
Ele resmungou algo baixo e conciso.
E então a beijou.
Um longo tempo depois, estendida
ao lado de Marco no banco de trás do
carro, ela finalmente admitiu seus
sentimentos.
Ela estava feliz.
Era uma felicidade fadada ao
desastre e a uma curta duração.
Olhando para baixo, ela notou que a
carteira de Marco caiu do carro.
Espionando uma imagem que caiu, ela
pegou a carteira e olhou mais de perto.
O cabelo comprido e rebelde era
desconhecido, assim como o fundo.
Mas a determinação e o orgulho feroz
naqueles olhos castanhos pareciam
familiares.
– Sua foto é adorável. Agora eu sei
como seus filhos serão. – Ela tentou não
deixar que a dor do pensamento
surgisse em seu rosto. – Aposto que eles
vão ser pilotos como você e Rafael.
Marco endureceu, seus olhos ficaram
frios e desolados.
– Não. Não haverá crianças.
A certeza dura em sua voz gelou sua
alma.
– Por que você diz isso?
Por
um
momento
longo,
interminável, ele não respondeu. Então
ele pegou a carteira. Alcançando a sua
calça, ele abriu a porta do carro, saiu e a
puxou.
– Venha comigo.
Apesar de já sentir falta dos seus
braços ao redor, ela se sentou.
– Para onde vamos?
O olhar em seus olhos ficou mais
sombrio.
– Não muito longe. Coloque suas
roupas. Eu não quero me distrair.
Ela queria distraí-lo, se isso
significasse que ele não iria parecer tão
frio e ameaçador. Mas ela fez o que ele
mandou.
Marco a levou para o outro lado da
garagem. Introduziu um código de
segurança, abriu a porta e entrou,
puxando-a.
Com um clique do interruptor, a luz
banhava o quarto. Sasha olhou em volta
e engasgou com o conteúdo dos
armários de vidro.
– São todos seus? – sussurrou ela.
Andando, ela abriu o primeiro
armário e ergueu o primeiro troféu.
– Sí. – A voz de Marco estava rouca
de emoção. – Comecei a correr quando
tinha 5 anos.
Havia mais troféus do que ela podia
contar, enchendo quatro armários
enormes.
– Eu sei.
Ele caminhou até o armário mais
distante e pegou o troféu solitário que
estava sozinho.
– Este foi o meu último troféu.
– Você nunca me disse por que
desistiu de correr – murmurou ela.
Quando ele se esticou ainda mais, ela
foi até ele e segurou seus punhos
cerrados.
– Diga-me o que aconteceu.
Seus olhos perfuraram os dela, como
se a julgassem para ver se ele podia
confiar a ela sua dor. Depois de uma
eternidade, sua mão se afrouxou o
suficiente para segurar a dela.
– Eu tive o meu primeiro contrato
como piloto quando tinha 18 anos. Aos
21 anos eu ganhei dois campeonatos e
conquistei um diploma em engenharia.
Eu estava na lista de cada equipe e
tinha a opção de escolher para qual
delas iria pilotar. Uma semana depois
de entrar para a equipe dos meus
sonhos, conheci Angelique Santoro. Eu
tinha 24 anos e tolamente acreditava
em amor à primeira vista. Ela era...
Diferente. Inteligente, sexy, excitante e
muito mais madura do que seus 25
anos. Tudo o que eu queria era correr e
estar com ela. Angelique me convenceu
a demitir meu empresário e colocá-la
em seu lugar. Seis meses depois ficamos
noivos e ela engravidou.
Um arrepio de medo percorreu
Sasha. Profundamente dentro de seu
peito um nó de dor, enterrada, mas não
esquecida, se contraiu.
Não haverá crianças.
– Você não queria o bebê?
Ele riu. Um som áspero, torturado,
que contorceu seu coração.
– Eu queria mais do que eu jamais
quis alguma coisa na minha vida.
Sasha fez uma careta.
– Mas... O que aconteceu?
– Eu reorganizei toda a minha vida
em torno da promessa de uma família.
Eu projetei a pista da Casa de Leon para
que eu pudesse treinar lá, em vez de ir
embora para treinar em outras pistas.
Meus pais se mudaram para cá. Minha
mãe estava em êxtase para ser avó.
– Angelique não estava satisfeita?
– Ela concordava plenamente com
tudo. Até que bati.
Sua mão apertou a dele.
– Eu não entendi. O acidente foi
grave, sim, mas nada que você não
pudesse se recuperar.
– Eu fiquei em coma por nove dias. A
equipe contratou alguém para me
substituir quando os médicos disseram
aos meus pais e Angelique que era
improvável que eu voltasse a correr
novamente.
– Eles devem ter ficado devastados
por você.
– Meus pais ficaram.
A tristeza tocou sua alma.
– Sinto muito. Eu não posso imaginar
o que você deve ter passado.
Ele deslizou um dedo sob seu queixo.
– Nem eu quero que você saiba. Mas
isso... – Ele a puxou para mais perto. –
Isso ajuda.
Com um sorriso, ela ergueu a boca
até a dele.
– Estou contente.
O beijo foi suave, um bálsamo sobre
suas revelações turbulentas.
Quando se separaram, ela olhou
novamente para os troféus.
– É por isso que você não deixa
ninguém vir aqui? Por que lembra que
sua carreira de piloto acabou?
– Quando eu aceitei que essa parte
da minha vida tinha acabado, eu a
tranquei.
Ele a puxou para fora do gabinete.
– Espere. Você disse que seus pais
ficaram devastados. E Angelique?
Ele endureceu novamente.
– Quando eu fiquei destinado a criar
carros, em vez de pilotá-los, ela perdeu
o interesse – disse ele, mas seu tom era
oblíquo.
– Isso não é tudo, não é?
A dor tomou conta de seu rosto antes
que ele pudesse esconder.
– Antes do acidente, Angelique
estava com quase três meses de
gravidez. Quando eu acordei do coma,
ela não estava mais grávida.
O suspiro horrorizado de Sasha
ecoou pela sala.
– Ela fez um aborto?
Seus olhos se voltaram quase pretos
de dor.
– Sí. Dois meses depois, ela se casou
com o chefe da minha antiga equipe.
Uma onda de terror a invadiu.
– Tem mesmo certeza de que ela
estava grávida, antes de tudo?
Os movimentos de Marco ficaram
estranhamente espasmódicos conforme
ele pegou sua carteira. Atrás da foto,
um pequeno quadrado cinzento
deslizou para fora. À luz da sala de
troféus, Sasha viu o contorno de um
corpo minúsculo em um exame de prénatal.
Lágrimas se reuniram em seus olhos
e caíram antes que pudesse detê-las.
Com as mãos trêmulas, ela tirou a foto
dele, a lembrança de sua própria perda
marcou seu coração tão drasticamente
que ela não conseguia respirar.
– Eu estava lá no dia que este exame
foi feito. A questão era que o tempo
todo eu suspeitava que Angelique fosse
capaz disso. Ela era extremamente
cruel, chegando a ponto da obsessão.
Mas desde que ela canalizou tudo isso
para ser minha empresária, eu escolhi
ver isso como algo mais.
– Amor? – sugeriu ela com voz rouca.
Sua mandíbula se apertou.
– Eu me ceguei para suas verdadeiras
intenções. Minha mãe tentou me avisar,
mas eu não quis ouvi-la. Eu quase a
tirei da minha vida por causa de
Angelique. – Ele respirou fundo. – Eu
perdi o meu filho... Ela perdeu seu
neto... Porque eu escolhi enterrar a
cabeça na areia. Ela ficou arrasada e eu
não acho que ela realmente superou o
estrago que causei para a nossa família.
– Por que você guarda isso?
– Eu falhei em proteger meu filho.
Isso me faz lembrar de nunca deixar
minha família novamente.
CAPÍTULO 11
MARCO
outra vez no dia
seguinte e não voltou por mais dois.
Quando voltou, Sasha o encontrou no
corredor. Ele a arrastou para o seu
escritório e começou a beijá-la com uma
necessidade brutal.
Sua confissão na garagem tinha lhe
proporcionado um vislumbre do
homem que era. Ela naquele momento
realmente entendia por que ele tão
PARTIU
ferozmente protegia Rafael. E por que
ela não podia descobrir a verdadeira
profundidade de seus sentimentos.
Respirando fundo, ela se forçou a
dizer o que não conseguiu por telefone
na noite anterior.
– Marco, acho que eu deveria ir
embora. Você pode ficar em Barcelona
e não ficar viajando para cá para me
ver.
Seu rosto encobriu uma dura
expressão.
– O que diabos você está falando? –
Ele a puxou em seus braços e a beijou
novamente. – Você não vai a lugar
nenhum.
Ela tentou se afastar, mas ele a
segurou com facilidade.
– Mas...
Seu sorriso estava tenso de cansaço.
– Rafael acordou brevemente na
noite passada. Só por alguns minutos.
Mas ele parecia lúcido e me
reconheceu.
O alívio em sua voz era palpável.
Sasha sorriu.
– Estou contente. Mas eu acho que é
ainda mais um motivo para você ficar
em Barcelona. E se ele acordar de novo,
quando você não estiver lá?
Deixando-a livre, ele enfiou a mão
pelo seu cabelo.
– Ele foi transferido para uma suíte
privada
e
eu
configurei
videoconferência, por isso tenho uma
transmissão ao vivo de seu quarto.
Nada vai acontecer com ele sem o meu
conhecimento. Eu também contratei
um pessoal extra 24 horas para quando
ele chegar em casa, inclusive aquela
enfermeira que foi demitida do hospital
em Budapeste. Então, veja você, não
sou tão idiota assim.
– Eu sei que você não é. Mas está se
dividindo em dois quando na verdade é
Rafael que mais precisa de você agora.
– Talvez eu queira colocar as minhas
necessidades à frente de Rafael pela
primeira vez na vida. – Ele levantou as
mãos. – O que exatamente você quer de
mim, Sasha?
Ela não estava preparada para a
pergunta. Mas ela se perguntava a
mesma coisa.
– O que você quer de mim? Qual é a
verdadeira razão pela qual quer que eu
fique aqui? Estou aqui apenas para que
você possa ter relações sexuais na hora
que quiser ou é algo mais...?
Ela vacilou, com muito medo de
expressar as palavras que brotavam em
sua mente.
Seus olhos se estreitaram.
– Não creio que esta seja uma boa
hora para uma conversa sobre os rumos
deste relacionamento.
– Há sempre uma hora certa para
isso? Aliás, você não entra em
relacionamentos, lembra?
Ele tirou a jaqueta e a colocou em
uma cadeira próxima.
– Eu quero você aqui comigo. Não é
o suficiente? – murmurou ele.
Outra pergunta para a qual ela não
estava preparada. Não porque não
soubesse a resposta, mas porque sabia
que a resposta era não. Querer não era
mais suficiente. Ela estava apaixonada
por Marco: pelo garoto cujo coração
havia sido partido por uma mulher fria
e o homem formidável que amava seu
filho que não havia nascido tão
completamente que fechou o coração
para qualquer emoção.
Ela o amava. E isso a assustava. O
desejo de recuar a golpeou. A óbvia
relutância de Marco para discutir a
relação a assustava. Mas olhando para
ele, sabia que não podia partir. Ainda
não. Não quando ele ainda estava tão
preocupado com Rafael.
– Eu vou ficar – disse ela.
Seus olhos refletiram o alívio.
– Gracias.
Ele a puxou para seus braços.
– Não mencione ir embora
novamente.
Mesmo
o
simples
pensamento me faz querer vomitar.
Ela se odiava pela emoção de prazer
que percorreu seu corpo.
– Foi para o seu próprio bem, mesmo
que você não queira vê-lo.
E não apenas pelo bem de Marco. Ela
precisava encontrar forças para ir
embora. Porque quanto mais tempo ela
ficava, mais corria o risco de perder
tudo.
– Se você quiser sugestões sobre o
que é bom para mim, eu tenho vários
ideias.
Ele parou, amaldiçoando quando seu
telefone começou a tocar.
– Antes que comece a reclamar, vou
para a garagem. Seu Impala de 1965
precisa de polimento.
– Ele também tem bancos da frente
muito largos, se bem me lembro.
O desejo a debilitou.
– Marco...
– Tudo bem. Mas antes que você
vá...
Ele juntou seus lábios nos dela e
começou a mostrar o quanto era tola
sua decisão de ir embora.
Sasha sabia que seu coração estava
em sérios apuros.
MESMO QUE ela tenha mudado de ideia
sobre ir embora, Marco sentiu um
afastamento em Sasha que ele não
conseguia ignorar. Era quase como se o
iminente aparecimento de Rafael tivesse
causado uma tensão entre eles.
Mas por quê? Se não havia nada
entre eles, Sasha deveria estar feliz
porque Rafael estava se recuperando. A
menos que...? O pensamento de que
Sasha tinha sentimentos por Rafael
enviou uma onda de raiva e ciúme.
Não, ele descartou a ideia.
Ela o ouviu desnudar sua alma, o
segurou em seus braços enquanto ele
revivia a traição de Angelique. Sasha
derramou lágrimas por ele. Marco se
recusava a acreditar que a dor que tinha
visto em seus olhos não era real.
Mas ele não podia negar que havia
algo errado.
Somente quando fizeram amor,
quando ele a abraçou, sentiu a
verdadeira Sasha de volta. Mesmo
naquele momento, poucas horas antes
de ela partir para Londres, ela se
trancou na garagem, teimando em
restaurar seus carros antigos. Enquanto
ele estava às voltas com a confusão e o
desejo implacável que sentia por ela.
O que sentia por Sasha era
diferente... Mais profundo... Mais
puro... Do que o que já havia sentido
na vida. Marco endureceu, sua
respiração travou enquanto tentava se
familiarizar com seus sentimentos. Mas
quanto mais ele tentava desvendar o
sentimento desconhecido, mais caótico
e frenético ele ficava.
DURANTE TODO o caminho até sua suíte,
Sasha se forçou a respirar. Apesar do
nódulo frio de pedra no estômago, ela
precisava fazer aquilo.
Ela entrou na suíte e ouviu o
chuveiro ligado. Sem parar, ela
atravessou o cômodo e abriu a porta.
A água escorria pelo corpo nu de
Marco. A necessidade que sentiu
ameaçou
enfraquecer
sua
determinação.
Demorou
alguns
segundos até que pudesse falar.
– Marco, eu... Eu decidi... Não vou
voltar aqui depois da próxima corrida.
Ele girou, sua mandíbula se contraiu.
– Eu pensei que nós já tivéssemos
conversado sobre isto.
– Eu tentei falar. Você estipulou as
regras.
Ele pegou uma toalha e saiu do
chuveiro.
– Você cronometrou perfeitamente,
não foi?
– Desculpe?
– Sua estratégia de saída. No começo
eu não queria acreditar, mas agora faz
todo o sentido.
Ela franziu a testa.
– Todo o sentido... O que você está
falando?
– Pode deixar a pretensão de lado.
Eu falei há 20 minutos com Raven
Blass.
Seus olhos se arregalaram de
surpresa.
– Raven? Por quê?
– Ela está em Barcelona. Ela quer ver
Rafael. Eu dei a permissão ao hospital
para deixá-la vê-lo, mas curiosamente
ela estava mais preocupada com como
você se sente sobre a sua visita.
– Marco...
– Aparentemente, você é muito
territorialista com Rafael. Ela disse algo
sobre o aviso que você deu a Rafael
para ficar longe dela no dia do acidente.
– Não foi isso...
– Qual era o plano? Usar-me como
um paliativo até que Rafael estivesse
bem e voltar para ele?
– Claro que não!
– Você começou a ficar distante no
momento em que eu disse que Rafael
estava prestes a acordar. Bem, estou
contente por ter sido útil. Mas se você
tem planos com meu irmão, pode
esquecê-los. Ele não gosta de mulheres
usadas.
Ela engoliu seu suspiro. Por um
momento ele pareceu se arrepender de
suas palavras, então sua expressão
endureceu novamente.
– Uau. Certo, acho que você já está
convencido.
– Estou falando sério, Sasha. Chegue
perto de Rafael e eu vou esmagá-la
como um inseto.
Sentiu um peso esmagador no peito.
– Eu suspeitava disso e vejo que
estava certa. Rafael sempre virá em
primeiro lugar com você, não importa o
quanto diga que se coloca na frente. Eu
só espero que não tenha que desistir de
algo que você queira.
Ele franziu o cenho.
– Não há nada que eu queira mais do
que minha família segura.
– Bem, isso diz tudo, não é mesmo?
Girando, apressou-se para sair do
cômodo, amaldiçoando as lágrimas
estúpidas que brotaram em seus olhos.
Em seu quarto, ela pegou a mala e
colocou seus pertences dentro.
– O que você está fazendo?
– Indo embora. Obviamente.
– Seu voo não é nem daqui a quatro
horas.
– Ah, é? E daí? Você quer uma
última transa em nome dos velhos
tempos...?
Os olhos dele escureceram de uma
forma familiar, mesmo quando sua
mandíbula se contraiu.
Uma risada atordoada escapou.
– Deixe-me ver se entendi. Você
quer mais sexo comigo mesmo que eu
seja uma mulher usada que você não
deixará que seu irmão toque?
– Não coloque dessa forma.
– Sabe quando eu disse que você não
era
um
idiota?
Eu
estava
estupendamente errada! Você é o
maior idiota do universo.
Ela caminhou em direção à porta.
– Sasha...
– E pensar que eu me enganei
achando que estava apaixonada por
você. Não merece amor. E certamente
não merece o meu!
SASHA VOOU para casa após o GP da
Índia, a um passo de ganhar o Mundial
de Construtores.
Voltar para casa pela primeira vez em
meses era amargo. Olhar o ambiente
familiar da casa em que ela havia
crescido, a fazia querer chorar.
Marco havia mostrado a ela que iria
lutar até a morte para proteger sua
família. E provou que para ele não valia
a pena lutar por ela. O pensamento
doeu mais do que podia suportar.
Com a mão, enxugou as lágrimas. Ela
se recusava a ficar mal por ele. Seu
único objetivo naquele momento era
terminar a temporada.
Cansada, ela se arrastou até a
cozinha e ligou a chaleira. A sra. Miller,
sua vizinha, havia enviado uma
mensagem para ela para informar que a
geladeira estava totalmente abastecida.
Sasha abriu a geladeira, sentiu o
cheiro de queijo e seu estômago
embrulhou. Ela quase não conseguiu
chegar ao banheiro antes de vomitar.
Enxaguando a boca, ela decidiu abrir
mão do chá em favor do sono.
Arrastando-se para o chuveiro, ela
tomou um banho e caiu na cama.
ELA SUSPEITAVA que o problema do
estômago fosse algo da Índia e, assim
como metade da equipe, não melhorou
imediatamente, mas quando chegou ao
Brasil três semanas e meia depois,
estava em plena saúde.
E a três pontos de garantir o
campeonato. O GP de São Paulo foi
vibrante e emocionante.
Sasha bancou a covarde e se
escondeu em seu quarto de hotel até o
último minuto, para não esbarrar com
Marco. Em Abu Dhabi ela recusou o
convite para uma festa pós-corrida no
iate dele.
Com uma pontada aguda, ela
percebeu que Marco estava certo
quando disse que sua culpa quanto ao
seu pai a tinha cegado para o fato de
que ela não precisava provar para
ninguém que era boa o suficiente. Nem
precisava defender a integridade de
Jack Fleming. Com a sua aproximação
da equipe, ela descobriu que a maioria
das pessoas se lembrava de Jack
Fleming pelo grande piloto que ele
havia sido.
Primeiro, ela teria que passar pelas
entrevistas com a imprensa antes e
depois da corrida.
Sasha viu Tom se dirigindo a ela
enquanto colocava sua roupa de
corrida. Ela estremeceu com a
sensibilidade de seus seios com o aperto
da roupa.
Ela fez uma pausa e de repente
começou a calcular datas loucamente.
Entrou em pânico.
– Você está bem? Você ficou pálida.
Aqui, um pouco de água.
Tom pegou um copo de água e
entregou a ela.
– É o calor – respondeu ela,
colocando o copo de lado. – Estou bem
– enfatizou ela enquanto ele continuava
a olhá-la em preocupação.
– Certo. Sua última entrevista é com
a TV local. – Ele revirou os olhos. – É
aquele que a entrevistou em Cingapura.
Eu iria cortá-lo, mas como estamos em
sua casa, não temos escolha. Não se
preocupe. Se ele entrar em território
proibido, eu o impeço.
Ela finalmente conseguiu se lembrar
das datas e deu um suspiro de alívio.
Ela teve seu último breve período ainda
pouco antes de deixar Leon. E seu ciclo
era irregular.
Sossegada, ela seguiu Tom e falou
com os jornalistas.
A corrida em si foi sem
intercorrências. Com seus oito segundos
de vantagem após as primeiras seis
voltas, cruzou para a vitória, garantindo
a volta mais rápida já feita no circuito
de Interlagos. Ela conseguiu manter um
sorriso estampado em seu rosto através
de todas as celebrações e entrevistas
que se seguiram, suspirando de alívio
quando foi para sua última entrevista.
– Não se preocupe, srta. Fleming. Vai
dar tudo certo.
A nota de insinceridade no sotaque
do entrevistador deveria ter sido o seu
primeiro aviso.
As primeiras perguntas foram bem.
Até que...
– Como é a sensação de estar
namorando o chefe da equipe? Você já
teve alguma vantagem?
Pelo canto do olho, viu Tom levantar
de seu assento.
Seu “sem comentários” o fez relaxar
um pouco.
– Depois de vencer o Mundial de
Construtores, certamente o seu lugar
para o próximo ano está garantido,
certo?
– Sem comentários.
Ele deu de ombros.
– E seu ex, Derek Mahoney? Você já
ouviu falar que ele está retornando às
corridas?
Sasha ficou tensa.
– Não, não ouvi.
– Ele nos deu uma entrevista esta
manhã. E mencionou algo muito
interessante.
Um pavor penetrou sua espinha.
– Seja o que for, tenho certeza que
não tem nada a ver comigo.
– Pelo contrário, tem tudo a ver com
você.
Seu entrevistador esfregou o queixo
de uma forma que provavelmente
deveria fazê-lo parecer inteligente.
– O sr. Mahoney afirma que estava
grávida dele quando se separou e que
você deliberadamente bateu para
perder o bebê, porque você não queria
que um filho dificultasse sua carreira.
Qual é a sua resposta para isso?
Tudo começou a girar ao redor dela.
Vagamente, ouviu Tom gritar com o
câmera para parar de filmar. Por
dentro, ela estava congelada, com medo
de se mover. O burburinho na sala
ficou mais alto. Alguém agarrou seu
braço e a levou para outro lugar.
– Sasha... Eu... Deus, que bagunça –
gaguejou Tom. – Você vai ficar bem?
Eu preciso garantir que as imagens...
– Por favor, vá. Eu... Eu vou ficar
bem – conseguiu dizer através dos
lábios congelados.
Ele rapidamente se retirou e ela
estava sozinha.
Deixando cair a cabeça entre as
coxas,
ela
tentou
respirar
uniformemente,
desesperadamente
desejando não desmaiar. A TV
cantarolava no fundo, mas ela não
tinha forças para andar para desligá-la.
Deus, como Derek descobriu? Não
que isso importasse mais. Seu segredo
foi revelado. Lágrimas brotaram em
seus olhos. Derek era baixo, mas ela
não imaginava que fosse tanto.
A porta se abriu e Marco entrou.
Seu olhar se chocou com o dele e
cada coisa que ela disse a si mesma
durante as últimas três semanas foram
por água abaixo.
Ele havia emagrecido. A diferença no
colarinho de sua camisa azul-clara
mostrava mais de suas clavículas e o
paletó estava frouxo. Mas ele
continuava lindo e seu coração pulou
de alegria ao vê-lo.
– Eu preciso falar com você – disse
ele tenso.
Ela lambeu os lábios secos.
– Eu... Eu preciso dizer a você...
Como ela conseguiria? Ela não havia
expressado sua dor.
– O que é isto? – Ele se aproximou e
pegou suas mãos. – Seja o que for, me
diga. Eu posso lidar.
Aquilo lhe deu um pouco de força.
– Você promete?
– Sí. Preciso dizer algumas coisas
também, mi corazón. As coisas que eu
disse em Leon... – Ele fez uma pausa e
balançou a cabeça, com uma expressão
de pesar em seus olhos. – Você estava
certa. Sou um idiota.
– Eu não...
Eu não quis dizer aquilo, ela começou
a confessar, mas seus olhos se
desviaram para a TV. Lá, como um
pesadelo cíclico, a entrevista estava
sendo repetida.
Marco seguiu seu olhar.
Apenas a tempo de ouvir a maldita
pergunta do entrevistador.
– Não! É mentira. Não é, Sasha? Não
é? – gritou ele, quando ela não podia
falar.
– Eu...
Ele empalideceu conforme se afastou
dela.
– Marco, por favor, não foi assim.
Ela finalmente encontrou sua voz.
Porém já era tarde demais.
Ele tinha se afastado mais, como se
não pudesse suportar respirar o mesmo
ar que ela.
– Você quis correr sabendo que
estava grávida?
Insistiu ele, com a voz áspera.
– Não no dia que Derek falou...
– Mas você correu sabendo que
estava grávida?
– Eu suspeitava que estivesse...
– Dios mío! –
– Eu já tinha perdido o bebê no dia
do acidente. Foi por isso que bati!
Correr era a única coisa que eu sabia.
Depois que o médico me disse que eu
havia perdido o bebê, eu não sabia mais
o que fazer.
– Então você voltou em seu carro?
Você nem sequer teve tempo de
lamentar a perda de seu filho? –
condenou ele.
De alguma forma, ela encontrou
forças para resistir e enfrentá-lo.
– O médico disse que não foi minha
culpa. A gravidez não podia ter
começado. Mas eu ainda chorei até
dormir todas as noites por anos depois.
Se você está perguntando se eu tenho
uma foto para me punir ou como
desculpa para afastar as pessoas, não,
não tenho. Ela mora no meu coração...
– Ela?
Sua voz era torturada.
Lágrimas caíram de seus olhos e ela
assentiu.
– A minha era menina também. Ela
mora no meu coração. Você diz que
não vive no passado, mas é exatamente
isso o que está fazendo. Você está me
julgando pelo que lhe aconteceu há dez
anos.
Ele respirou fundo.
– E você me provou até onde vai. Eu
disse a você sobre Angelique, sobre o
meu filho, e você não disse nada.
Porque uma coisa pequena como uma
gravidez perdida é menos importante
do que a sua próxima corrida, não é?
– Você sabe por que eu queria correr!
– Eu fui um idiota por acreditar que
você estava tentando preservar a
memória de seu pai. Você estava
realmente
apenas
buscando
se
promover.
Dor invadiu seu coração.
– Não finja que você não acha que
ele era culpado.
– Eu disse que ele foi considerado
culpado. Eu não disse que concordava
com o veredito.
– Mas...
Ele cortou suas palavras.
– Meus advogados investigaram o
caso. Alguns dos testemunhos não
batem. Se o seu pai houvesse passado
menos tempo sentindo pena de si
mesmo e mais tempo conversando com
seus advogados, ele teria percebido isso.
Essa é uma das coisas que eu vim aqui
para lhe dizer.
Lágrimas ardiam em seus olhos, a
garganta se entupia de palavras não
ditas.
– Marco, por favor, podemos não
falar sobre isso?
Ele concordou.
– Não estou interessado em nada que
tenha a dizer. Apenas grato por nunca
ter engravidado você. Eu não acho que
poderia sobreviver tendo mais um filho
com a vida tão cruelmente negada por
uma questão de ambição impiedosa.
Seu interior se congelou quando suas
palavras cortaram sua pele.
Com
um
último
olhar
de
condenação, ele se dirigiu para a porta.
Ela entrou em pânico.
– Marco!
Ele se acalmou, mas não se virou,
com a mão na maçaneta da porta.
– O que mais você veio para me
dizer?
A malícia fria em seus olhos quando
ele se virou fez seu coração apertar.
– Vendi a equipe há seis semanas. Na
Coreia. A papelada foi finalizada hoje.
Há uma hora o seu contrato não é mais
válido.
CAPÍTULO 12
ELA ESTAVA grávida
de Marco. Sasha
teve certeza assim que Marco a deixou
em São Paulo. Fazer o teste de gravidez
só estabeleceu o que ela já sabia em seu
coração.
Não havia nenhuma dúvida em sua
mente de que ela iria dizer que ele
estava prestes a se tornar pai. O único
problema era quando.
Ele deixou seus sentimentos claros.
Suas próprias emoções eram muito
cruas para que ela enfrentasse outro
confronto com Marco. Ela duvidava
que ele acreditasse no que tinha a lhe
dizer.
Acariciou sua barriga suavemente
com os dedos. O médico confirmou que
ela estava de quase três meses de
gestação. Angelique havia abortado o
filho de Marco de três meses. A tristeza
brotou dentro dela enquanto se
lembrava do rosto de Marco.
Antes que perdesse a coragem, ela
pegou seu telefone. Seus dedos tremiam
enquanto ela discava os números.
– Sí?
Veio a voz profunda.
– Marco, sou eu.
Silêncio.
– Eu sei que você não quer falar
comigo... Mas há algo que eu preciso
contar.
– Não estou mais no negócio do
automobilismo, então você está
desperdiçando seu tempo.
A linha ficou muda.
Sasha olhou para o telefone, com
raiva e dor.
– Idiota.
Ela jogou o telefone, prometendo
fazer Marco implorar para estar perto
de seu filho.
DOIS DIAS depois, Sasha estava em sua
geladeira empilhando mantimentos
quando ouviu o som dolorosamente
familiar das hélices do helicóptero. A
aeronave sobrevoava diretamente sobre
sua pequena casa de campo antes de
pousar em um campo a 800 metros de
distância.
Mesmo que ela se obrigasse a
terminar sua tarefa, todos os seus
sentidos estavam em sintonia com a
batida que ocorreu menos de cinco
minutos depois.
Seu coração martelou, ela abriu a
porta para encontrar Marco ali de pé,
alto, moreno e descabelado.
– Você sabe que meus vizinhos vão
especular sobre sua espetacular
chegada, não é? O que diabos você está
fazendo aqui? Lembro-me de você não
querer nada comigo.
– Deixe-me entrar, Sasha.
– Eu não convido gente sem coração
para a minha casa. Você pode ficar
exatamente onde está. Melhor ainda,
volte para o seu veículo.
– Não vou embora até você ouvir o
que tenho a dizer. Eu não me importo o
que seus vizinhos pensam, mas tenho a
sensação de que você se importa. Há
uma senhora de cabelo azul olhando
para nós agora.
Ele acenou para a sra. Miller, que
descaradamente acenou de volta e se
manteve olhando para eles.
Firmando os lábios, Sasha recuou e
acenou para ele entrar.
– Você se acha muito esperto, não é?
– Não, eu não acho que sou esperto.
Na verdade, agora, sou a pessoa mais
idiota que conheço.
Sua boca se abriu.
Sua careta se aprofundou.
– Sim, eu sei. Chocante.
– Marco...
Ela parou e finalmente fez o que
estava morrendo de vontade de fazer
desde que ele bateu em sua porta. Ela
deixou seus olhos o devorarem. Deixe
seu coração se deleitar.
Ele a olhou de volta, uma infinidade
de emoções que ela estava muito medo
de nomear passaram por seu rosto. Ele
abriu a boca algumas vezes, mas,
aparentemente perdeu a coragem de
falar.
Por fim, ele enfiou a mão no bolso do
casaco.
– Isto é para você. – Sasha pegou os
papéis.
– O que é isto?
– Depoimentos de dois ex-pilotos
que juram que seu pai não estava
envolvido na fraude. Ele foi o bode
expiatório.
Agitando
as
mãos,
leu
os
documentos.
– Como...? Por quê...?
Lágrimas obstruíram sua garganta.
Finalmente ela poderia limpar o nome
de seu pai.
– Como não importa. O porquê é que
você merece saber.
Ela não percebeu que estava
chorando até que a primeira lágrima
pousou em sua mão.
– Eu... Eu realmente não sei o que
dizer. Depois do que aconteceu... – Ela
olhou para os papéis novamente e
engoliu. – Obrigada, Marco – disse ela
com voz rouca.
– De nada – respondeu ele.
– Você não precisava entregar
pessoalmente, no entanto.
Seu olhar se intensificou.
– Eu não precisava. Mas eu precisava
de uma desculpa para vê-la.
– Por quê? – sussurrou ela, com
muito medo de ter esperança.
Ele engoliu em seco.
– Rafael acordou de vez ontem.
O coração dela deu uma guinada.
– Ele está bem?
Marco assentiu.
– Eu fui vê-lo esta manhã. Ele me
contou o que aconteceu em Budapeste.
Sasha suspirou.
– Eu sei que era estúpido.
– Você quer dizer deliberadamente
usar a sua amizade para deixar Raven
com ciúmes?
Ela assentiu com a cabeça.
– Eu acho que ela se apaixonou por
Rafael quando entrou pela primeira vez
para a equipe. Isso mudou quando ela
descobriu que ele tinha namorado a
maioria das mulheres de lá. Ela se
recusou a ter qualquer coisa com ele
depois disso.
Marco franziu os lábios.
– E ele, claro, achou desafiador
quando ela continuou recusando. Por
que você não me contou? – perguntou
ele.
– Você me contou o significado do
anel de sua mãe. Eu não acho que
precisava saber que Rafael tinha a
intenção de usá-lo para...
– Tentar a sorte? – Ele fez uma
careta, depois ficou sério. – Ele superou
agora, eu acho. Ele parece diferente,
mais... Maduro. Eu acho que o acidente
foi uma chamada para ele.
Sua expressão estava sombria.
– Para mim também. Você estava
certa.
– Eu estava?
Ele se moveu em direção a ela, de
repente.
– Sí. Eu estava vivendo no passado.
Eu sabia, mesmo antes de sair de Leon.
Eu sabia quando vim vê-la em São
Paulo. Ouvir Rafael me dizer o que eu
já sabia, como você é ótima, como foi
amiga quando ele precisou... – Ele
parou e engoliu em seco. – Eu
mencionei que sou a pessoa mais idiota
que conheço?
– Hum, talvez.
– O que eu disse em São Paulo foi
imperdoável... – Seu olhar ansioso se
enlaçou ao dela. – Eu estava em
choque, mas nunca deveria ter dito o
que disse. Uma pena você ter perdido o
bebê. Acho que você teria sido uma
mãe maravilhosa.
– Você acha?
– Sí. Eu vi como o Prêmio Children
of Bravery afetou você. Vê-la no palco
com as crianças me fez desejar que o
meu filho tivesse uma mãe como você.
As lágrimas encheram seus olhos.
– Ah, Marco...
Ela mal conseguia falar.
Outra careta cortou seu rosto.
– Eu já fiz você chorar de novo. – Ele
se sentou ao seu lado e gentilmente
limpou as lágrimas. – Não era isso o que
eu queria vindo aqui.
– Por que você veio aqui, Marco?
Ele prendeu a respiração.
– Para dizer que eu amo você. E para
implorar seu perdão.
– Você me ama?
Ele assentiu.
– Fiquei destroçado ao saber que eu
tinha tido o seu amor e o perdi porque
fui idiota. Quando você ligou há dois
dias...
– Quando você desligou na minha
cara?
– Entrei em pânico. O hospital tinha
acabado de ligar por causa de Rafael.
Eu pensei que você sabia e estava
ligando para pedir para vê-lo. – Ele
franziu o cenho. – Por que você ligou?
– Eu tinha algo para lhe dizer.
Quando você desligou na minha cara,
eu escrevi uma carta.
– Uma carta?
– Bem, era mais uma lista.
Enfiando a mão no bolso, ela tirou o
papel.
– Aqui.
Ele olhou para o papel, mas não
aceitou, com o rosto pálido.
– Tem perdão em algum lugar desta
lista, por acaso?
Seu olhar se aguçou sobre ele.
– Perdão?
– Sim. O perdão para os idiotas que
não conhecem o dom especial do amor,
da beleza e da bondade quando
recebem.
– Er... – Ela olhou para a lista, o seu
batimento cardíaco ecoava em seus
ouvidos. – Não, mas então eu só tive
dois dias para pensar.
Ele segurou o rosto dela entre as
mãos.
– Então considere isto um pedido
especial, por favor. Eu sei que não agi
certo julgando você duramente desde o
início.
– Você estava machucado. E estava
certo. Eu estava agindo por culpa.
– Não, você estava fazendo o que
fosse preciso para seguir em frente...
Enquanto eu deixava o primeiro
obstáculo me impedir. Sinto muito por
isso.
– Os golpes que você levou seriam
suficientes para derrubar qualquer um.
– Mas eu deixei isso turvar meu
julgamento. Eu disse a mim mesmo que
tinha me recuperado. Até você ir para
Leon, eu não havia entrado naquela
garagem. Você abriu meus olhos para a
vida estéril que eu levei até então.
– Olhe a carta, Marco.
Ele respirou fundo.
– Não, se você vai me condenar,
prefiro ouvir isso de você.
– Você pode querer se sentar.
Ele enfiou os dedos nos bolsos do
casaco, mas não antes que ela
percebesse o tremor de suas mãos.
– Apenas me diga.
– Tudo bem. Mas se você desmaiar
de choque não espere que eu o ajude.
Você é muito grande...
Quando ele fez um som incoerente,
ela desdobrou o papel.
A ansiedade a percorreu. Ele disse
que a amava, mas e se Marco realmente
não quisesse outro filho?
– Sasha, Por favor.
– Esta é a segunda vez que você diz
“por favor” nos últimos cinco minutos –
sussurrou ela.
Quando seus olhos escureceram, ela
leu em voz alta.
“Marco, você foi um idiota por
desligar o telefone na minha cara, mas
eu acho que você deve saber... Você vai
ser pai.”
Por um minuto ele não se mexeu.
Não respirava, não piscava. Em seguida,
ele tropeçou na cadeira. Suas mãos
visivelmente tremiam quando ele
estendeu a mão e acariciou sua
bochecha.
– Sasha. Por favor, me diga que isto
não é um sonho – murmurou ele.
– Isto não é um sonho. Estou grávida
de um filho seu.
Um olhar de reverência completa
caiu sobre o seu rosto e sua barriga.
– Você está bem? Está tudo bem? –
perguntou ele.
– Quer dizer com o bebê?
– Com vocês dois.
– Sim. Eu fui ao médico. Tudo está
bem. Isso quer dizer que você quer o
bebê?
– Mi corazón, você me deu a segunda
chance que nunca tive coragem de
buscar sozinho. Pode não me querer
mais, mas, sim, eu quero este bebê. –
Seus olhos caíram para sua barriga. –
Por favor, eu posso tocar?
– Você quer tocar minha barriga?
– Se você me permitir.
– Sabe que o bebê não é maior do
que o seu polegar direito agora, não é?
– Sí, mas é o que meu coração quer.
Por favor?
Lágrimas bloquearam sua garganta
quando ela balançou a cabeça e
desabotoou a calça jeans.
Os dedos quentes dele acariciaram
sua barriga. Observando seu rosto, ela
sentiu a respiração de alegria no peito.
Em seguida, com os olhos presos nos
dela, seus dedos deslizaram sob o
suéter, aquecendo a carne nua.
Relutante, ela se retirou do seu calor
sedutor.
– Marco, eu não terminei de ler a
carta.
Um olhar de incerteza entrou em
seus olhos.
– Eu sei que você é muito
argumentativa. Mas existe algum espaço
para a negociação?
– Você precisa ouvir o que está na
carta primeiro.
Ele deu um aceno relutante.
“Se for menino, eu gostaria de
homenagear meu pai. Com pelo menos
um dos nomes.”
– Assim será.
“Eu quero que o nosso filho nasça na
Espanha. De preferência em Leon.”
Ele engoliu em seco.
– Concordo.
Ela levantou os olhos do papel.
“Quero ficar lá depois que o bebê
nascer. Com você.”
Seus olhos se arregalaram e ele parou
de respirar.
– Você quer ficar em Leon? Comigo?
Com o coração na garganta, ela
acenou com a cabeça.
– Nosso filho merece dois pais que
não vivam em países separados.
A decepção pairou em seu rosto.
– Você está certa.
– Nosso filho também merece pais
que se amem.
Seus olhos escureceram de dor.
– Eu pretendo fazer tudo ao meu
alcance para ganhar o seu amor de
novo, Sasha.
Ela encolheu os ombros, com o
coração na garganta.
– Você precisará concentrar suas
energias em outras coisas, Marco.
Porque eu amo você.
Ele respirou fundo.
– Você me ama...?
– Sim – reiterou ela com
simplicidade. – Eu sabia que amava em
Leon, mesmo estando convencida de
que não iria dar certo.
– Eu não facilitei, exatamente. Senti
minha vida se desfazer e fiquei
desesperado.
Uma onda de choque a percorreu.
– Foi por isso que vendeu a equipe?
Ele fez uma careta.
– O acidente de Rafael e a sua quase
batida na Coreia me convenceram de
que era hora de sair da corrida. Mas eu
deixei de lado um pequeno detalhe a
respeito de sua demissão.
– Ah, é?
– O contrato de venda incluía uma
estipulação de que você teria
preferência para ser piloto titular. Se
você quisesse.
Levantando as mãos, ela embalou
seu rosto.
– Você não leu o comunicado da
imprensa do Tom, na semana passada?
– Comunicado da imprensa?
– Eu estou aposentada do
automobilismo.
Ele franziu o cenho.
– E a sua promessa para seu pai?
– Ele teria ficado orgulhoso de saber
que ajudei você a ganhar o Mundial de
Construtores. Mas o que ele realmente
queria era que eu fosse feliz.
– E você é?
– Diga-me que me ama de novo e eu
conto para você.
– Estou profundamente, loucamente
apaixonado por você, Sasha Fleming, e
mal posso esperar para que seja minha.
Ela passou os braços em volta do seu
pescoço.
– Então, sim, sou muitíssimo feliz.
EPÍLOGO
– FELIZ ANIVERSÁRIO, mi preciosa.
Sasha se virou de onde estava
assistindo outro deslumbrante pôr do
sol de Leon e colocou o cobertor em
torno de seu bebê de dois meses de
idade.
– Shh. Você vai acordá-lo.
Marco se juntou a ela no berço. Com
um olhar de completa adoração em seu
rosto, ele passou um dedo pelo rosto
macio de seu filho.
– Jack Alessandro de Cervantes
dorme como uma pedra, assim como
sua mãe. – Ele deu um beijo na testa de
seu filho, em seguida, estendeu a mão
para ela. – Venha comigo.
– Marco, você não vai me dar outro
presente, não é? Já me deu seis. Ah,
deixe para lá.
Ela sabia que não adianta dissuadir o
marido quando ele estava em uma
missão.
– Sí, agora você está aprendendo.
Conforme Marco a levava para o
quarto, ela olhou para o grande anel de
diamante que ele lhe deu pelo
aniversário de sete meses de casamento.
Não passava uma semana sem que
Marco lhe desse um presente de algum
tipo. Na semana passada, ele a
presenteou com o mais lindo cachorro
Labradoodle e depois resmungou
quando
ela
imediatamente
se
apaixonou pelo cão.
– Eu espero que não seja outro
diamante.
– Não é um diamante. Este presente
é muito mais... Pessoal.
Ele fechou a porta e a puxou para
mais perto, seus olhos castanhos
ficaram dramaticamente mais escuros
ao ver que vestia uma camiseta de
vampiros com os dizeres “Morda-me”.
Ela deu uma risada sexy.
– Dios, você é impiedosa.
– Só quando se trata de você. Adoro
deixá-lo excitado.
Esticando-se, ela colocou os braços
em volta do pescoço dele, deleitando-se
com o seu longo beijo até que ela
relutantemente se afastou.
Em seu protesto, ela balançou a
cabeça.
– Eu tenho algo para lhe mostrar,
antes que nos empolguemos demais.
Alcançando sua mesa de cabeceira,
ela lhe entregou uma folha de papel.
Ele leu todo o documento antes de
olhar para ela.
– É isto?
A felicidade explodiu em seu peito.
– Sim. A prefeitura enviou uma
confirmação
esta
tarde.
Sou
oficialmente patrono da Caridade da
Infância De Cervantes. Meu programa
para ajudar as crianças desfavorecidas
que estão interessadas em ser piloto!
– Entre isso e você ser a porta-voz
para as mulheres que pilotam, vejo o
meu plano de mantê-la ocupada na
minha
cama
fazendo
bebês
rapidamente desaparecer.
Ele ficou sério.
– Tem certeza de que não quer voltar
a correr? Você sabe que tem o meu
apoio.
Sasha piscou os olhos para afastar as
lágrimas e pressionou sua boca contra a
dele.
– Obrigada, mas essa parte da minha
vida acabou. A oportunidade de
trabalhar com crianças é outro sonho.
Quanto a fazer mais filhos com você,
essa é minha prioridade número um.
Junto com amar você para sempre.
Seus olhos se escureceram.
– Eu também amo você, mi corazón.
– O suficiente para tirar proveito da
instrução da minha camiseta? –
perguntou ela atrevidamente.
Com um grunhido, ele lhe jogou na
cama e demonstrou o quão bom era em
receber instruções.
RETORNO AO PASSADO
Lindsay Armstrong
Mia Gardiner estava sozinha em casa,
preparando jantar para sua mãe,
quando a tempestade chegou com
muito pouco aviso.
Num minuto, ela estava abrindo
massa, no minuto seguinte, estava
correndo em volta da grande casa,
conhecida como West Windward, e lar
da
próspera
família
O’Connor,
fechando janelas e portas, enquanto
pingos de chuva batiam no telhado
como balas de revólver.
Foi quando ela chegou à porta da
frente, a fim de fechá-la, que viu uma
figura grande e molhada na escuridão
do lado de fora, andando com
dificuldade na sua direção.
Por um momento, seu coração
disparou de medo, então ela
reconheceu a figura.
– Carlos! É você. O que está
fazendo... Carlos, você está bem? – Ela
o olhou, notando que havia sangue
escorrendo pela testa dele, de um corte
aparentemente profundo. – O que
aconteceu? – perguntou ela, e segurouo, quando ele balançou no lugar.
– Um galho caiu da árvore quando
eu estava atravessando da garagem para
a casa. Bateu na minha cabeça – disse
ele, de modo indistinto. – É uma
tempestade feia – acrescentou.
– Você não está errado. – Mia pôs a
mão no braço dele. – Venha comigo. Eu
cuidarei de sua cabeça.
– O que eu preciso é de um drinque
forte! – Mas ele balançou novamente
enquanto falava.
– Venha – murmurou ela, e
conduziu-o através da casa para a sala
de estar da governanta, que ficava
anexa à cozinha.
Era pequena, porém confortável.
Mia tirou o tricô de sua mãe de cima
do sofá, e Carlos O’Connor sentou-se,
grato. Na verdade, ele deitou-se, gemeu
e fechou os olhos.
Mia entrou em ação. Meia hora
depois, tinha limpado e coberto o
ferimento na cabeça dele, enquanto,
não apenas água, mas também granizo
caíam do lado de fora.
Então, a eletricidade acabou e ela
praguejou, principalmente
porque
deveria ter esperado isso. Eles tinham
frequentes falhas de eletricidade no
bairro quando havia tempestades.
Felizmente, sua mãe mantinha
alguns lampiões a querosene à mão,
mas no escuro, ela tropeçou ao redor
até localizá-los. Então, acendeu dois e
levou um para a sala de estar.
Carlos estava deitado imóvel, os
olhos fechados, e parecia muito pálido.
Ela o olhou, e sentiu uma onda de
ternura inundando-a, porque a verdade
era que Carlos O’Connor era
maravilhoso.
Com mais de 1,80m, era magro e
forte, com cabelo escuro, testemunho
de sua herança espanhola, que ele
sempre afastava dos olhos... aqueles
olhos verdes que, às vezes, brilhavam
de maneira travessa para você...
Mia tinha uma paixão secreta por
Carlos desde seus 15 anos... como
poderia não ter? , às vezes se
questionava. Como alguém poderia ser
imune àquela aura sexy arrasadora? Ele
podia ser dez anos mais velho do que
seus 18 anos, mas certamente ela
poderia acompanhá-lo.
Não que tivesse visto muito Carlos
nos últimos cinco anos. Ele não morava
na fazenda, mas ela acreditava que ele
crescera lá; ele morava em Sidney, mas
voltava de tempos em tempos.
Geralmente, era apenas por alguns dias,
mas ele montava, não apenas cavalos,
como também quadricículos, e porque
Mia tinha permissão de manter seu
cavalo no estábulo da fazenda, e porque
ficava de olho nos cavalos dele, quando
ela estava em casa, eles tinham algumas
coisas em comum.
Ela fizera cavalgadas maravilhosas
com Carlos, e se ele alguma vez
adivinhara que, às vezes, fazia seu
coração bater freneticamente, nunca
dera sinal disso.
No começo, seus devaneios haviam
sido infantis, mas nos últimos dois anos,
ela passara a alternar entre dizer a si
mesma para esquecer tudo sobre Carlos
O’Connor... ele era um multimilionário,
ela era apenas a filha da governanta... e
alguns devaneios mais sofisticados.
Entretanto, ele estava fora de seu
alcance. O que ela poderia lhe oferecer
mais do que as mulheres deslumbrantes
que, às vezes, o acompanhavam nas
visitas de Carlos?
– Mia?
Ela saiu de seus pensamentos, com
um susto, e viu que os olhos dele
estavam abertos.
– Como você se sente? – Mia
ajoelhou-se ao seu lado, e pôs o
lampião no chão. – Está com dor de
cabeça? Ou com visão dupla? Ou
qualquer sintoma estranho?
– Sim. – Ele pensou por um
momento.
Ela esperou, então, perguntou:
– O que foi? Conte-me. Eu não acho
que vou conseguir que um médico
venha nesta... – Mia gesticulou em
direção à cacofonia no telhado acima. –
Mas...
– Eu não preciso de um médico –
murmurou ele, e estendeu o braço para
tocá-la. – Somente disto. Você cresceu,
Mia. Cresceu e tornou-se linda...
E leia também em Passado &
Vingança, edição 239 de Harlequin
Jessica, Vingança máxima, de Dani
Collins.
237 – HORA DA
VERDADE
Preço da vingança – Trish
Morey
Valentina Henderson foi a única
mulher que ousou abandonar o
milionário Luca Barbarigo. Anos
depois, ela volta lhe pedindo ajuda. Ele
está disposto a cooperar, mas por um
preço: uma noite de luxúria.
Pedido inesperado – Catherine
George
O magnata italiano Dante Fortinari
descobriu que tinha uma filha, fruto de
uma noite inesquecível com Rose
Palmer. Não havia outra opção além do
casamento. Mas Rose teme que ele só a
queira por dever.
239 – PASSADO &
VINGANÇA
Retorno ao passado –
Lindsay Armstrong
Carlos O’Connor queria retomar o
romance que teve com Mia Gardiner,
mas ela estava relutante. Então, ele a
faz uma proposta audaciosa. Será que
ela vai aceitar?
Vingança máxima – Dani Collins
Aleksy Dmtriev é um homem
ambicioso. Quando conheceu Clair
Daniels, decidiu que iria possuí-la.
Mesmo sendo uma mulher inocente,
ela tinha o seu preço, e Aleksy estava
disposto a pagar…
240 – CORAÇÕES DE
PEDRA
Não incomodar – Anna
Cleary
Mirandi Summers mal podia acreditar
que o bad boy Joe Sinclair se tornara
um CEO renomado. Mas, ao
trabalharem juntos, Mirandi logo
descobrirá que o lado malicioso de Joe
está apenas escondido por debaixo do
terno e gravata.
Apenas negócios – Anne Oliver
Abby Seymour foi enganada! Sem
dinheiro e sem lugar para morar, ela
aceita a ajuda do empresário Zak
Forrester. Eles irão dividir um teto… e
uma cama.
241 – TEMPO DE
PAIXÃO
Amante leiloada – Annie
West
Callie Manolis havia virado um premio
em um jogo de poder. Agora, será a
amante de Damon Savakis. Ele achou
que ela era apenas uma jovem
ambiciosa, mas ao conhecê-la melhor,
decidiu transformá-la em sua esposa.
Vestido secreto – Ally Blake
Paige Danforth não acreditava em
casamento, mas tudo mudou quando
encontrou o vestido de noiva perfeito!
Agora, só precisava achar um noivo. E
Gabe Hamilton era o candidato ideal.
Só tinha um problema: ele não quer
compromisso…
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE
LIVROS, RJ
W537e
West, Annie
Escândalo & sucesso [recurso
eletrônico] / Annie West, Maya Blake; tradução
Deborah Mesquita de Barros, Joana Souza. - 1.
ed. - Rio de Janeiro: Harlequin, 2014.
recurso digital
Tradução de: Prince of scandal + The
price of success
Formato: ePub
Requisitos do sistema: Adobe Digital
Editions
Modo de acesso: World Wide Web
ISBN 978-85-398-1675-0 (recurso
eletrônico)
1. Romance australiano. I. Blake, Maya.
II. Barros, Deborah Mesquita de. III.
Souza, Joana. IV. Título.
14-17287
CDD: 828.99343
CDU:
821.111(436)-3
PUBLICADO MEDIANTE ACORDO COM
HARLEQUIN BOOKS S.A.
Todos os direitos reservados. Proibidos a
reprodução, o armazenamento ou a
transmissão, no todo ou em parte.
Todos os personagens desta obra são fictícios.
Qualquer semelhança com pessoas vivas ou
mortas é mera coincidência.
Título original: PRINCE OF SCANDAL
Copyright © 2011 by Annie West
Originalmente publicado em 2011 por Mills &
Boon Modern Romance
Título original: THE PRICE OF SUCCESS
Copyright © 2012 by Maya Blake
Originalmente publicado em 2012 por Mills &
Boon Modern Romance
Projeto gráfico de capa:
Nucleo i designers associados
Arte-final de capa:
Isabelle Paiva
Produção do arquivo ePub: Ranna Studio
Editora HR Ltda.
Rua Argentina, 171, 4º andar
São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ — 20921-380
Contato:
[email protected]
Capa
Texto de capa
Querida leitora
Rosto
Sumário
PRINCESA SELVAGEM
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Epílogo
O PREÇO DO SUCESSO
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Epílogo
Próximos lançamentos
Créditos
Download

Escandalo & Sucesso - Harlequin