1 POR DENTRO DA ABN Ações mobilizadoras da ABN A Academia Brasileira de Neurologia (ABN) inicia um ano de 2011 marcado fortemente por ações de cunho educacional e de valorização da atividade médica. Somente nesses primeiros meses, a entidade desempenhou duas mobilizações de conscientização – de sono e de Parkinson – voltadas ao público leigo, e se prepara para outras. Ainda no âmbito da difusão de informações, a ABN realizou, de 25 a 27 de março, a IV Reunião do Departamento Científico de Transtornos do Movimento. Promovido na capital paulista, o evento reuniu especialistas do Brasil e do exterior envoltos em palestras e discussões acerca de mais de 50 temas.. Defesa da especialidade e do bom atendimento O grande destaque do período, contudo, foi a paralisação de médicos ligados ao atendimento conveniado às operadoras de saúde suplementar, no dia 7 de abril. Apoiada pela Academia Brasileira de Neurologia, afora outras representações médicas, a ação tomou todo o País em decorrência dos baixos valores pagos por consulta – na neurologia, estima-se a média de R$ 42,00 – e elevado número de interferências das operadoras de planos de saúde no atendimento médico. Em comunicado que explicita a realidade dos neurologistas brasileiros, a Sociedade Mineira de Neurologia aponta que uma consulta neurológica não pode ser de curta duração. Segundo a entidade, para manter os consultórios e se atualizarem, os médicos têm de trabalhar muito, atender muito, na tentativa de atingir um patamar de rendimento que cubra as despesas e seja suficiente para uma vida em acordo com o seu investimento na carreira. A associação médica entende que os usuários dos planos de saúde não devem ser prejudicados por qualquer ato de manifestação dos médicos para pleitear uma remuneração justa, mas também sente-se responsável por expor para a sociedade em geral e para os usuários de plano de saúde a situação crítica na qual o sistema se encontra. E conclui que a atual política de remuneração não só desestimula como inviabiliza o exercício de uma neurologia clínica responsável e eficaz. Dotada de passeatas e outras mobilizações, a paralisação dos médicos recebeu ainda apoio do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (PRO TESTE). ABN NA MÍDIA Em se tratando de exposição da Academia Brasileira de Neurologia na mídia, em 2010, a meta da entidade foi ultrapassada, alcançando a marca de 2.548 matérias referentes ao assunto neurologia em diversos veículos de comunicação do País. Em 2011, a ABN continua com um dos seus objetivos primordiais: informar a população em torno de doenças neurológicas. O mote do trabalho neste início de 2011 foi alertar a população sobre os problemas demenciais provenientes do alcoolismo crônico e, em outra pauta, mostrar os riscos neurológicos da dengue tipo 4 – tema retomado por janeiro e fevereiro serem meses com índices elevados da dengue. No entanto, o interessante do relacionamento da Academia com a mídia é que a ABN vem sendo requisitada como fonte para diferentes matérias, inclusive de veículos importantes como a Folha de S. Paulo, Correio Braziliense, Diário do Nordeste, Zero Hora e as revistas Saúde é Vital e Viva Saúde. 2 DIRETORIA EXECUTIVA DA ABN Dra. Elza Dias Tosta da Silva Presidente Dr. Rubens José Gagliardi Vice-Presidente Dr. Gilmar Fernandes do Prado Secretário Geral Dra. Márcia Maiumi Fukujima 1º secretária Dra. Mônica Santoro Haddad Tesoureira Geral Dr. Luiz Henrique Martins Castro 1º Tesoureiro Aureo Dias de Oliveira Gerente Administrativo e Finaceiro Simone Regina Osti Assistente Administrativa Plena Lidiane Soares Lima Assistente Administrativa Jr. Patricia TTeixeira Assessora de Imprensa Academia Brasileira de Neurologia Rua Vegueiro, 1353 – 14º andar – sala 1404 São Paulo – SP – CEP 04101-000 Tel. e fax (11) 5084 9463 ou 5083 3876 www.abneuro.org e-mail: [email protected] COMISSÃO DE COMUNICAÇÃO E EDITORAÇÃO Dra. Márcia Maiumi Fukujima (Coordenadora) Dr. Antonio P. Gomes Neto (Suplente) Dra. Elza Márcia T. Yacubian Dr. Hélio Afonso Ghizoni Teive PRODUÇÃO Trixe Comunicação Empresarial www.trixe.com.br Av. Nazaré, 1139 – cj. 107 | Ipiranga 04263-100 – São Paulo | SP Tel.: (11) 5052 4072 Jornalista responsável e editora Patrícia TTeixeira – MTB. 51.202/SP [email protected] Repórter Edson Raphael Julyane Stanzioni Raphaella Rodrigues Diagramação Bia Prado Revisão Isabel Menezes COMERCIAL Editora Omni Farma Ltda. Av. Américo Brasiliense, 2171 - cj.109 - São Paulo SP | CEP 04715-004 • PABX: (11) 5181 6169 [email protected] ISSN2175-1080 Residência Médica ou Estágio: diferenças e desafios Segundo a definição do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), a residência médica, que foi instituída no Brasil em 1977, é uma modalidade de ensino de pós-graduação destinada a médicos, sob a forma de curso de especialização, ou seja, somente médicos formados podem fazer residência. Com a orientação de profissionais médicos de elevada qualificação ética e profissional, a residência acontece em instituições de saúde que mantêm programas e concursos de residência médica nas diversas especialidades médicas. Durante as décadas de 1970 e 1980, a procura pelas vagas de residência médica era muito grande, as vagas eram escassas para toda a demanda. Devido a isso, as instituições médicas de ensino criaram um regulamento instituindo vagas para estágios com o objetivo de suprir a falta de vagas para residentes. Porém, esses estagiários executavam as mesmas funções e o mesmo trabalho que os residentes (exceto a realização do plantão). No entanto, a criação do estágio não previa uma remuneração. As discussões sobre a adequação da residência médica e do estágio são recorrentes, pois, apesar de terem as mesmas funções, o estágio não é reconhecido legalmente como é a residência. Segundo Victor Fernando Soares Lima, presidente da Associação Nacional dos Médicos Residentes, a importância da residência médica não é questionada, tanto que os residentes são, hoje, responsáveis por 70% dos atendimentos nos hospitais. Para o delegado do Cremesp e consultor em residência médica do Ministério da Educação (MEC) Dr. Renato Antunes dos Santos, a residência médica tem um papel fundamental na formação do médico. “Além de ser o momento em que o indivíduo acostumado com a prática discente durante o curso passa a ter em suas mãos as decisões e responsabilidades da prática médica, é também o primeiro contato com a especialidade ou a carreira e com o tipo de vida que deseja traçar.” Dra. Márcia Chaves, neurologista e chefe do Serviço de Neurologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, concorda com o discurso do Dr. Renato. “A residência médica é importantíssima para a formação do médico, considerando que está cada vez maior a carga de conhecimento da medicina e as exigências reguladoras das práticas profissionais”, afirma. Segundo o Dr. Renato Antunes, a existência do estágio paralelamente à residência médica é uma anomalia grave não apenas em relação ao ensino médico, mas é também uma anomalia jurídica. “A diferença é que o estagiário não é categoria como o médico residente. Ele não pode se associar, fazer greve, reclamar das condições de trabalho. O sujeito não tem regras claras de funcionamento e nem pode solicitá-las, pois pode ser expulso do estágio sem explicação.” Em 2008, após a Nova Lei do Estagiário (Lei nº 11.788), levantou-se uma discussão para adequações do estágio médico. Para os especialistas, o número de estágios na área de saúde – especialmente em medicina e enfermagem – caiu desde que a Lei do Estágio entrou em vigor, sendo o maior problema a carga horária, limitada na nova lei a seis horas/dia, trinta horas semanais. A jornada pode ser cumprida em mais de uma organização concedente, desde que não exceda, no total, o limite legal permitido. Mas, para os educadores, o ideal é que os estudantes tenham mais tempo em campo, o que seria benéfico para a sua formação profissional. Na opinião da Dra. Maria Valeriana Leme de Moura Ribeiro, primeira residente médica de neurologia da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto e, atualmente, professora titular de neurologia infantil pela Faculdade de Ciência Médica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o estágio foi uma alternativa desvantajosa oferecida pelas instituições. “Hoje o aluno se forma e vai para o mercado sem o conhecimento necessário, e com isso enfrentamos um grau tão sério na competência do médico que o paciente ao ir ao hospital não sabe mais por quem está sendo atendido. O governo deveria dar condições financeiras, arcar com o complemento de formação prática por mais dois anos para depois distribuir os recém-formados aos locais necessários.” Já para o Dr. Renato Antunes, o ideal seria que os locais que fornecem estágios corrigissem suas falhas e tornassem o estágio uma residência médica. “Os locais não querem se adequar às normas da residência médica, pois é preciso ter um projeto pedagógico, uma carga de trabalho, remuneração, etc.” 3 ATUALIDADES ATUALIDADES PRODUÇÃO CIENTÍFICA NO BRASIL CRESCE, MAS PESQUISADORES Há 30 anos, o Brasil representava menos de 0,3% da produção científica mundial. Hoje, com 2,12%, a produção brasileira cresce 8% ao ano, mais do que a média mundial, que gira em torno de 2%. A quantidade de verbas dedicadas à pesquisa nesse período também cresceu muito e o número de pesquisadores e grupos de pesquisas saltou significativamente. Mesmo ocupando o 14º lugar no ranking de produção científica mundial segundo o Relatório Mundial SIR 2010 – ano 2008, que analisou 2.833 instituições de pesquisas, em 87 países (o ranking é elaborado de acordo com o número de publicações e a quantidade de citações dos artigos produzidos pelas instituições de pesquisa em outros trabalhos), a queixa da comunidade acadêmica referente às dificuldades encontradas para as pesquisas percorre diversos campos, entre eles, o financiamento e a burocracia. Segundo o diretor científico da Academia Brasileira de Neurologia (ABN), Dr. Joaquim Pereira Brasil Neto, as maiores dificuldades para as pesquisas na área de neurologia e neurociências dizem respeito às dificuldades de financiamento e de importação de equipamentos. “É preciso prever, já no projeto de pesquisa, a incidência de várias taxas e impostos e são muitas as etapas para a liberação das importações. Uma política de isenção de certos impostos quando a importação fosse feita por universidades e outros centros de pesquisa seria um grande avanço”, diz. Para o neurologista Dr. Denis Bichuetti, premiado com bolsa de estudos da ABN em parceria com a Merck Serono, há uma questão cultural a ser discutida. “No Brasil há, em geral, a imagem de que o pesquisador é um profissional de segunda linha e que tem que trabalhar por ideologia, e assim muitos o fazem como voluntários ou com remuneração inadequada”, afirma. O que, para ele, remete a um problema de financiamento e alocação de recursos, mas sendo necessário, também, mudar a ideologia para valorizar o profissional de pesquisa. foto: stock.xchng AINDA ENCONTRAM DIFICULDADES PARA FAZER PESQUISA no caso de pesquisas médicas, pode conter biólogos, químicos, estatísticos, fisioterapeutas, enfermeiros, funcionários administrativos entre outros, além dos próprios médicos. A atividade de pesquisa deve ser realizada em ambiente propício, técnica e arquitetonicamente planejado para o atendimento de pacientes quando é o caso de pesquisa clínica, por exemplo, ou com equipamentos adequados quando se trata de análise laboratorial”. MERCADO A Universidade de São Paulo ocupa a 16ª posição no ranking mundial das instituições de pesquisas na área de saúde, de acordo com o Relatório Mundial SIR 2010. Unânime é o papel que elas representam no apoio às pesquisas científicas e no desenvolvimento do conhecimento no País. “As universidades são fundamentais, pois pesquisar faz parte da atividade acadêmica”, afirma a neurologista da ABN e chefe do Serviço de Neurologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Dra. Márcia Lorena Fagundes Chaves. Para ela, toda universidade – seja particular ou pública – deveria ter uma política clara de incentivo à pesquisa: da iniciação científica à pós-graduação, passando pela qualificação do corpo docente, apoio a laboratórios, grupos de pesquisas, etc. “Acho que um dos papéis da universidade é acolher o pesquisador com decência, oferecendo espaço e infraestrutura. No mundo de hoje é importante o estímulo à interação com diferentes instituições, favorecendo a troca de conhecimentos e práticas”, acredita o Dr. Bichuetti. Para esse crescimento da produção científica brasileira foi determinante o apoio de agências governamentais como o CNPq e a Capes. Um dos maiores órgãos de financiamento à pesquisa no País é o CNPq, fundação vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia e que tem os investimentos coordenados de acordo com os interesses de outros ministérios como o da Defesa e o do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, por exemplo. São mais de 93 mil bolsas e projetos em vigência pelo órgão. Já a Capes, com um orçamento total de R$ 820 mil, em 2008, e que, em 2009, tinha mais quase 7 mil bolsas concedidas na área de saúde no Brasil, é vinculada ao Ministério da Educação (MEC). Os critérios gerais para se conseguir uma bolsa pelas agências de fomento estatais são parecidos. A solicitação do auxílio deve ser feita por pesquisadores ou estudantes de acordo com as normas de cada modalidade e é preciso que o solicitante tenha o aval da universidade/ instituição de execução do projeto para desenvolvê-lo. Desde julho de 2010, os bolsistas da Capes ou do CNPq podem ter outras fontes de renda desde que não sejam oriundas de agências de fomento. Essas instituições de incentivo à pesquisa exigiam de seus bolsistas dedicação exclusiva, não permitindo que trabalhassem durante o tempo do benefício. De acordo com as regras das agências de financiamento, estrangeiros residentes no Brasil com a situação regularizada também podem concorrer aos auxílios, desde que se encaixem nas regras gerais e específicas para a concessão da bolsa. Além disso, brasileiros podem ter bolsa para estudar no exterior de acordo com os critérios de cada agência. No caso da bolsa de “Doutorado Pleno no Exterior” oferecida pela Capes, é necessário que a pesquisa não possa ser realizada – total ou parcialmente – no Brasil e a bolsa deve ser solicitada de acordo com as regras da instituição estrangeira pretendida. De acordo com o Dr. Brasil Neto, “o ideal é que pesquisadores brasileiros troquem experiências e conhecimentos com seus pares no exterior, já que em muitas áreas o Brasil tem conhecimentos que em nada ficam atrás dos países tradicionalmente tidos como líderes da pesquisa”. No âmbito político, o Ministério de Ciência e Tecnologia inicia algumas mudanças para melhorar a posição do País no que diz respeito às pesquisas científicas. Aloizio Mercadante, ministro da pasta, convidou o neurocientista Dr. Miguel Nicolelis para chefiar a “Comissão do Futuro”, a qual será responsável por definir os rumos da ciência e da inovação no País a longo prazo. “O Brasil tem uma chance única de revolucionar a forma como a ciência é feita em prol da humanidade”, segundo o Dr. Nicolelis. Instituições estatais e federais como a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e as fundações regionais de amparo à pesquisa, além do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) são as formas mais utilizadas para fomentar as pesquisas científicas no Brasil. “Existem, também, outras opções de patrocínio como o de empresas e particulares para incentivar os estudos”, afirma o diretor científico da ABN. Para que não haja questionamentos éticos no financiamento de pesquisas por empresas ou particulares aos médicos, é necessário que as pesquisas sejam aprovadas pelo Comitê de Ética em Pesquisas (CEP, no Brasil) do país de origem da empresa e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP). “O médico atuará como um pesquisador, dentro desse projeto de pesquisa, tendo obrigação de se reportar periodicamente ao sistema CEP-CONEP. A pesquisa deve se pautar pela Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que regulamenta as pesquisas com seres humanos no Brasil”, esclarece o Dr. Brasil Neto. No entanto, segundo o Dr. Bichuetti, a solução não está apenas na distribuição de bolsas de estudo. Investir em um ambiente adequado para o atendimento nos hospitais universitários, investir em professores e profissionais dispostos a permanecerem nesse ambiente, oferecer equipe técnica e administrativa de suporte, permitir a ida a congressos nacionais e internacionais para aprimoramento e intercâmbio de ideias são maneiras de elevar o nível das pesquisas científicas no Brasil e propagar os estudos nacionais em outros centros de pesquisa no mundo. Ainda de acordo com ele, é relevante destacar que “um trabalho de pesquisa envolve uma equipe, que, 4 5 ESPECIAL Mulheres ganham espaço na neurologia specialidade com predominância masculina tem atraído as mulheres no curso de medicina Nos últimos anos, o Brasil tem assistido a uma contínua mudança de perfis e valores ligados ao papel da mulher na sociedade e, por consequência, na medicina. Desde 2006, elas são maioria dentre as novas inscrições no Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo. Em esfera nacional, correspondem a 39,9% dos cargos ocupados em consultórios – um aumento de quatro pontos percentuais em comparação há dez anos – de acordo com o Conselho Federal de Medicina. Especificamente na neurologia, uma mulher ocupa o cargo máximo da entidade que representa sua especialidade, outras desafiam a sociedade e a si mesmas na busca por melhores atendimentos, acesso e qualidade de trabalho. Esse cenário otimista, entretanto, é muito recente. Ao longo do último século, a figura feminina viu-se envolta de buscas por devido reconhecimento, valorização e acesso ao trabalho e estudo. O expressivo aumento no número de faculdades de medicina no País – de quatro centros de estudo em 1912 para 27 em 1959 – contribuiu significativamente para iniciar o processo de universalização do espaço acadêmico. A paulista Maria Valeriana Leme de Moura Ribeiro (à época, apenas Maria Valeriana Salvador Leme) foi uma dessas primeiras beneficiadas. Opondo-se ao senso vigente nos dourados anos 50, Maria Valeriana ingressou na quarta turma de medicina da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Ao seu lado, apenas outras três mulheres figuravam na turma de 54 integrantes. Apesar das mentes abertas e do clima amistoso do universo acadêmico, era clara para a estudante a necessidade de mostrar sua capacidade e qualidade para desafiar os homens. Em contrapartida ao sexismo dominante, o estado de pós-guerra possibilitou-lhe o contato direto com grandes personalidades médicas mundiais, como o belga Dr. Lucien Lison. As aulas com o biomédico mostraram-se determinantes para que a futura médica decidisse enveredar-se pelos estudos neuronais. Os quarto e quinto anos, por sua vez, renderam-lhe uma segunda paixão, a pediatria. Durante a clínica médica, era grande o volume de pequenos com problemas de aprendizado, epilepsia e doenças degenerativas. Seguindo o molde dos trabalhos iniciados pelo Dr. Antônio Frederico Branco Lefèvre e unindo suas duas áreas de interesse, a Dra. Maria tornouse especialista, pesquisadora e docente em neurologia infantil. À época não poderia imaginar, mas, pouco a pouco, tornar-se-ia uma referência em sua área de atuação. Força feminina Em recente pesquisa com 200 mil empresas brasileiras, a companhia de recrutamento de pessoal Catho Online constatou um mercado mais receptivo à presença e liderança femininas. O número de mulheres em cargos de presidência ou outros equivalentes saltou de 15% em 2001 para 23%, 6 foto: divulgação ESPECIAL neste ano. Contudo, 42% delas revelam que o preconceito e a recorrente necessidade de comprovar competência são os maiores entraves à liderança. Situação, todavia, utilizada como um motivador para atingirem seus objetivos. Estímulo semelhante somado a um perfil marcadamente obstinado levaram a mineira Dra. Elza Dias Tosta ao posto mais alto da Academia Brasileira de Neurologia, em 2008. Segunda mulher a ocupar o cargo – no ano de 1990, a Dra. Newra Tellechea Rotta tornou-se a primeira mulher a chegar a tal posição –, a Dra. Elza conseguiu expandir o trabalho e valor da neurologia brasileira em âmbito internacional. Dentre as conquistas mais recentes, sob sua tutela, a entidade promoveu o primeiro Simpósio Euro-brasileiro de Neurologia, além de fechar acordo de cooperação com a Association of British Neurologists que possibilitará maior e melhor intercâmbio de informações entre profissionais de ambos os países. Na capital pernambucana, outra figura ganhou destaque, nos últimos anos, por seu empreendedorismo e capacidade de liderança. A Dra. Maria Lucia Brito Ferreira aparece como um dos principais nomes ligados à estruturação do serviço de neurologia no Hospital da Restauração e posterior criação do Centro de Referência Estadual em Atenção ao Paciente Portador de Doença Desmielinizante (CRAPPD-HR) no mesmo hospital. Dra. Sheila Martins Dra. Maria Lúcia Brito Ferreira “A união de profissionais de diferentes especialidades mostrou-se fundamental também no campo das emergências.” As iniciativas surgiram após um período de estudos na University of London e na University of San Francisco. Num total de oito meses fora do País, a Dra. Maria Lucia absorveu, entre outros conceitos, as principais diretrizes para a organização do serviço de saúde neurológica. Ao regressar para Recife, a neurologista iniciou um projeto de separação das atividades de neurologia e neurocirurgia no Hospital da Restauração como forma de elevar a qualidade da assistência ofertada nos dois serviços. Simultaneamente, começou a ver indícios de esclerose múltipla em diferentes pacientes que buscavam atendimento. Ao dividir a situação com colegas, montou uma equipe multidisciplinar e juntos apresentaram à Secretaria Estadual de Saúde um plano para a concepção do que seria o atual Centro de Referência. De maneira concomitante, uma portaria autorizou o emprego de medicamentos específicos para o tratamento da esclerose múltipla. Estavam estabelecidas as bases fundamentais para um salto qualitativo no atendimento da esclerose múltipla no estado de Pernambuco e uma referência para o Brasil. Dra. Newra Tellechea Rotta Dra. Elza Dias Tosta A união de profissionais de diferentes especialidades mostrou-se fundamental também no campo das emergências. À frente da ONG Rede Brasil AVC, desde 2008, a gaúcha Dra. Sheila Ouriques Martins visita governos e hospitais de todo o País a fim de sistematizar a assistência a vítimas de acidente vascular cerebral – doença que, ano após ano, mais vitima brasileiros. Junto a representantes das esferas estaduais e municipais, a jovem que outrora não gostava de ter contato com sangue representa, agora, colegas neurologistas, fisioterapeutas, fonoaudiólogos entre outros, a fim de criar centros de excelência no atendimento ao AVC, estruturação para uso de telemedicina e treinamento de equipes do Serviço de Atendimento Móvel de Emergência (Samu). 7 8