pág. 65 Ao Senhor Mário de Sá-Carneiro É antes do ópio que a minh'alma é doente. Sentir a vida convalesce e estiola E eu vou buscar ao ópio que consola Um Oriente ao oriente do Oriente. Esta vida de bordo há-de matar-me. São dias só de febre na cabeça E, por mais que procure até que adoeça, já não encontro a mola pra adaptar-me. Em paradoxo e incompetência astral Eu vivo a vincos de ouro a minha vida, Onda onde o pundonor é uma descida E os próprios gozos gânglios do meu mal. […] Eu, que fui sempre um mau estudante, agora Não faço mais que ver o navio ir Pelo canal de Suez a conduzir A minha vida, cânfora na aurora. Perdi os dias que já aproveitara. Trabalhei para ter só o cansaço Que é hoje em mim uma espécie de braço Que ao meu pescoço me sufoca e ampara. […] A vida a bordo é uma coisa triste, Embora a gente se divirta às vezes. Falo com alemães, suecos e ingleses E a minha mágoa de viver persiste. Eu acho que não vale a pena ter Ido ao Oriente e visto a índia e a China. A terra é semelhante e pequenina E há só uma maneira de viver. Pertenço a um género de portugueses Que depois de estar a Índia descoberta Ficaram sem trabalho A morte é certa. Tenho pensado nisto muitas vezes. […] O “Opiário”, é um poema decadente. Dedicado a Sá-Carneiro, imita-lhe desde a nostalgia do além, a morbidez snob de um saturado da civilização, a embriaguez do ópio e dos sonhos de um Oriente que não há, o horror à vida, o realismo satírico de certas notações, até ao vocabulário entre precioso e vulgar, às imagens, aos símbolos, ao estilo confessional brusco, amimado e divagativo. Este Campos situa-se também muito próximo de Pessoa paúlico, uma vez que também utiliza imagens, metáforas, símbolos, que por vezes se sobrepõem. No poema, “Opiário”, cruzam-se vários motivos ou vectores temáticos: Doença da alma Busca de caminhos de evasão. Esta busca é inviabilizada por causas diversas: Predestinação familiar e pátria Abulia Incapacidade de agir Esquema rimático •Interpolada (abba) Ex.:” Pertenço a um género de portugueses Que depois de estar a Índia descoberta Ficaram sem trabalho A morte é certa. Tenho pensado nisto muitas vezes.” Métrica A métrica é irregular: ex.: ex.: “Sen/tir/ a /vi/da/ com/va/les/ce e es/ti/o/la.” (11 sílabas métricas) “ A/ vi/da/ sa/be/-me a/ ta/ba/co/ lou/ro.” (10 sílabas métricas) Figuras de estilo: •Metáfora: •Comparação: •Imagem: •Interjeição: ex: “Moro no rés-do-chão do pensamento” ex: “Que é hoje em mim uma espécie de braço” ex: “Meu coração é uma avòzinha que anda” ex: “Ora! “(estrofe 19 verso 1 pág.66) Enumeração/adjectivação expressiva: ex: “Ser herói, doido, amaldiçoado ou belo!” Anáfora: Frases reticentes: ex:”E afinal o que quero é fé, é calma,” ex: “A minha vida mude-a Deus ou finde-a…” Interrogação retórica: ex: “Não terão como eu o horror à vida?” Frase exclamativa: ex: “Ah que bom que era ir daqui de caída!” Análise Morfossintáctica Verbos: •Predominam os verbos no presente: ex: “Escrevo estas linhas. Parece impossível” Adjectivos: •Predominam os adjectivos qualificativos: ex:”Ser herói, doido, amaldiçoado ou belo!” Trabalho realizado por: Cátia Coelho Cátia Santos Tânia Maçorano Fanny Azevedo