não existe o valor em si enquanto coisa, mas o valor é sempre uma relação entre o sujeito que valora e o objeto valorado. De ond V'II o leu ? o mundo dos valores c 7 Todo mundo já ouviu falar no "jeitinho brasileiro": poder, não pode, mas sempre dá-se um jeito ... Muitos até chegam a achar que se trata de virtude a complacência com a qual as pessoas "fecham os olhos" para certas irregularidades e ainda favorecem outras tantas. Certos 'jeitinhoe " parecem inocentes ou engraçados, e às vezes até são vistos como sinal de vivacidade e esperteza: por exemplo, quando se fura a fila do ônibus 011 do cinema. Ou, então, para pegaro filho na escola, que mal há em parar em fila dupla? Outros "jeitinhos" não aparecem tão às claras, mas nem por isso são menos tolerados: notas fiscais com valor declarado acima do preço para o comprador levar sua comissão, compras sem emissão de nota fiscal para sonegar impostos, concorrências públias om "cartas marcadas", I O lfue intriga nessa história toda é que as Pf' oas que estão sempre "dando um jeilinho" sabem, na maioria das vezes, que tran gridem. padrões de comportamento. MU8 meio lnam omo se iS80 fosse obsoluIOií/fl//tc ttarnutl, vi to qll comum: s6 eu? c o UIII;'o ? Iutlu II/11/n/v ag' a sim, quem ti fi fiz 'r () H/N}Ino I mil ai quem não gosle/ tlt' I '(N/I t/lllllsem '/11 l/tdu? Não mais considerando apenas o famigerado "jeitinho", ações de outro ti~ também podem ser consideradas reprováveis, como mentir, roubar, matar, explorar o trabalho alheio e assim por diante. Estamos diante dos fatos que pretendemos analisar. Certas ações são objeto de valoração: podemos considerá-Ias justas ou injustas, certas ou erradas, boas ou más. E, em função de tais avaliações, são dignas de admiração ou desprezo. Porém o que é valorar? O que são valores? o que é valor Olhe à sua volta. Escolha um objeto ou pessoa e faça um juízo de realidade: a) esta caneta é azul; b) esta caneta é nova; c) Maria saiu por aquela porta; d) a barraca está cheia de frutas; e) João foi à igreja. . Observe também que, ao mesmo tempo, é inevitável fazer juízos de valor: a) esta caneta azul não é tão bonita quanto a vermelha; b) a caneta antiga escrevia melhor que esta; c) Maria não deveria ter saído antes de terminar o trabalho; d) as frutas fazem bem à saúde; e) orar reconforta o espírito. No primeiro caso trata-se de avaliação estética, ·no segundo considera-se o valor de utilidade, no terceiro parece ocorrer a transgressão de um valor moral, no quarto há referência ao valor vital e, no último, ao valor religioso. Já, portanto, o mundo das coisas e mundo dos valores. Mas não podemos dizer que os valores são dá mesmo maneira que as coisas são. Isto é, 105 I n [ d I. t ma nece sidade formal de ref.\1'II Jl\Ofll! . formalmente ()rr~to que "cor 11-'.1'01 melhor que a 'oyurdla, que I 1111I 'I, IIlt t~ 11m valor d j, v ~Ientre () lll~ IIIho d UI1IWlIf'U. No ntan1(1, I l'orlllV'1l\ t" run y .101' formal cujo ('01\[- 'lIdq vurl . 'J'o!J\ n10Hum exemplo 'l)I·dtl1.WII"Il, nlnd que n o referente à mOI'" propr im ní dita: se alguns ri nn :Iv "IIpir" om m do de atravesar f1V nlda n grande cidade, certa111 nt S rá ele qu rirá do citadino assustado orn sapos e cobras na fazenda. Transportando o exemplo pata o camp da moral, a coragem do guerreíro da tribo é certamente diferente da coragem do homem urbano desafiado, por exemplo, pelos riscos da corrupção. Se a amizade é um valor universal, a sua expressão varia conforme os costumes. Na sociedade patriarcal, em que a mulher se encontra confinada ao lar e subordinada ao homem, é ímpensavel que ela tenha amigos do sexo masculino fora do círculo de amizades do seu próprio marido ou distante do seu olhar benevolente. Isso muda nos núcleos urbanos, após a liberação da mulher para o trabalho fora do lar. e Social e pessoal do vital e ficam caducas e sem sentido. A sociedade passa, então, por um momento de crise moral para cuja superação são exigidas inventividade e coragem, a fim de ser recriada uma moral verdadeiramente dinâmica e comprometida com a vida. Geralmente as morais conservadoras se petrificam quando a s~ciedade se ~vide em grupos antagomcos nos qUaIS certos setores desejam manter privilégios. Nesses casos, o que é mostrado como bom para todos na verdade só é bom para os que se acham no poder. (Conferir a definição de ideologia no Capo 4, O senso comum.) Para manter o status quo, isto é, a situação vigente de forma inalterada, predominam a intolerância e a negação do pensamento divergente. Por exempl~, o fanatismo religioso considera herético todo pensamento que se distancia da ortodoxia. Nas sociedades escravistas, muito tempo após a abolição da escravatura, persistem os preconceitos rel~tivos à raça escravizada. Cem anos apos a Lei Áurea, os negros brasileiros ainda têm de lutar não só contra os julgamentos depreciativos que os brancos fazem deles, mas também contra a própria auto-imagem mutilada pela herança de submissão. A _At''''' o"'•..• or;,; •.•_..• ,.."" efetiva da vida moral ....• ..•..•.•.....•• - -.. , supõe, portanto, o confronto contínuo entre a moral constituída (isto é, os valores herdados) e a moral constituinte, representada pela crítica aos valores ~trapassados. O esforço de construçao da vida moral exige a discussão constante dos valores vigentes, a fim de verificar em que medida sua re~ação_se faz em favor da vida ou da ahenaçao. A o sujeito Se cada um pudesse fazer o que bem entendesse, não haveria moral propriamente dita. O sujeito moral tem a intuição dos valores como resultado da intersubjetividade, ou seja, da relação com os outros. Não é o sujeito solitário que se toma moral, pois a moral se funda na solidariedade: é pela descoberta e pelo reconhecimento do outro que cada homem se descobre .fI si mesmo. Intuir o valor é descobrir aquel que convém à sobrevivência e felicidade do sujeito enquanto pertencente a um grupo. O que acontece com freqüência é que, em certas épocas, não há condições de se perceber alguns valores por exemplo, que a escravidão é desprezível-, e outras épocas em que valores fundamentais são esquecidos: na cidade grande, o individualismo exacerbado torna as pessoas menos generosas e mais desconfiadas. O sujeito moral surge quando, ao responder à pergunta como devo viver?", o faz com pretensão de validade universal. Ou seja, o sujeito moral não é o eu empírico, individual, egoísta, mas é o eu enquanto capaz de r conhecer o Outro como sendo um OutroEu: o Outro é tão importante quanto u sou. Ninguém nasce moral, mas tom -Rí' moral. Há uma longa carnlnhade I percorrida para a aprendizagem de d ~ • centralização do eu subjetivo, a fim d\ superar o egocentrismo lnfantll (' tornar-se capaz de on-viv 1'''. 11 11 o homem moral Seriam então os valores, além de relativos ao lugar e ao tempo, também subjetivos, isto é, dependentes das avaliações de cada indivíduo? 107 108 virtuoso 1\1 d 1\1 S até c,4.R.MSA! ""li QUE ANGIJSTI. ""USA I!I€N\ ' o NIEU PllÓPRJ . ,. Grau de articulação entre interesses colet!~os e pessoais: .enquanto nas tribos prirnítivas o coletivo predomina sobre o pessoa~, r:a~ Sociedades contemporâneas o mdlvldualismo exacerbado tende.a .descon~iderar os interesses da 0let1V~dade.E importante que o desen~olvlm~nto de 'cada um não seja feito a r~veha do desenvolvimento dos demais, o o o 1\ I dI r\.lllli:t:n o. N ont nto, imPOIJS{v I tend r L dos o d ti 'joa por ser m lnúm tOS 'antagônicos, e também porque a vida em comum seria ín- viável. A moral surge pois do controle do desejo. Evídentemente, não se trata da repressão do desejo, pois o que se busca não é a sua anulação, mas a consciência clara do indivíduo que escolhe e decide o que deve ser feito em determinada situação. O ato voluntário resulta da conscíênII : da da obrigação moral. Só que o dever moral não pode ser entendido como constrangimento externo, como coação de uns sobre outros, pois a submissão ao dever precisa ser livremente assumida. Ou seja, só há autêntica moral quando o indivíduo age por sua própria iniciativa, enguanto ser de hberdade. Autonomia (de auto, "próprio") significa autodeterminação, capacidade de decidir por si próprio a partir dos condicionamentos e determinismos. Por isso, todo ato moral está sujeito a sanção, ou /3~ja,merece aprovação ou desaprovação, elogio ou censura. O senso 'moral r ag porque nossa afetivldad foi atinglda: rtos atos consíd radoa irnor' IR, mo por exemplo o nssa n to um dança, provocamno ndlgn li' o. No ~ (talo 9 voltaré- ! mo hUII, IJf'i) ,t r t I' U U\ t. mo 1 t O da Hb rdade 80 quando se dá um avanço com meIhoria de qualidade. Isso significa que certos valores antigos não precisam ser considerados necessariamente ultrapassados, da mesma forma que valores dos "novos tempos" algumas vezes podem não indicar progresso. Quais seriam então os critérios para avaliar o progresso moral? Examinemos alguns deles. • Ampliação da esfera moral: certos atos, cujo cumprimento antes era garantido por força legal (direito), por constrangimento social (costumes) ou por imposição religiosa, passam a ser cumpridos por exclusiva obrigação moral. Por exemplo, um pai divorciado não precisaria da lei para reconhecer a obrigação de continuar sustentando seus filhos menores de idade, Por outro lado, certas sítuàções em que as pessoas fazem o bem tendo em vista a recompensa divina s~o indicações de diminuição da esfera moral, porque, nesse caso, o estímulo para a ação não é a obrigação moral, mas uma certa "barganha" visando recompensa. • Caráter consciente e livre da ação: a responsabilidade moral está na exigência de um compromisso livremente assumido, Responsável é a pessoa que reconhece seus atos como resultantes da vontade e responde pelas conseqüências deles. Quando adultos, como mulher s e escravos, permanecem tutelados, resultado é o empobrecimento moral das relações humanas. 1tV\ O últ~mo item nos faz refletir sobre as relaç?es entre política e moral. Embora sejam campos de ação diferentes e sem dúvida autônomos, política e moral esta~ estreitamente relacionadas. . A política diz respeito às ações relativas ao poder e à administração dos assur:tos públicos. Quando há desequilfbrio de poder na sociedade, e a maior p~rte das p~sso~s não atinge a cidadarua p~ena, ~s~oe, não tem formas de atu,aça? pohtIca, isso repercute na moral,~di':Idual de inúmeras maneiras: as exigencías de competição para manter ou a~c~nç~rprivilégios e a luta pela 50brev1Ve~Cla,n~ sociedade desigual elevam a ruveis mtoleráveis o egoísmo c DROPES 1 Basta um quase-nada, um não-s 1_ f", . cálculo sórdido Se 50 qu PIíIUlf!1I o 11li , ti, 111"""" lu II . U generoso paTU tJu 'IOlIvolIlIlI1 I I II I me amem, meus atos não possu 11 I I I lU /{1I111111 I, lI! mento de Jankélévitc~'.) , 111 I VI' !lU!" 1)10 H'IIIIP'I, 111/1111111111 Trata-se de que ' id a1 O . " mars urnn V(''', li Ilnuu 111 I I" 111, 11 l'tll'l acr entaí. homem I' U. I titutivo do h d>( U 11111 l/I VI'I:PII ll1ltllllll dll 111 1I I amem, I ('r('nt/'lIh'III,' d,. 111I111 1\ di 11111 de se perder na 1 (I I11 de d" v "I II 111'li, ti 1111111 dI' 1I1lllllNIIIII I I per a, re~op r r (\l1l'rllll'II"1I1111 1'11/1 '1111 I '11tlllllI d ~::~et.~sentlr-s pl'rddlt !t11~Ullfl'"III""1I1I 111111 Age de tal m saldeconduta./\ 110 I.) 1]11 11 1111 111 ,I \""lhl'ICIIIIII 11 '111I1 111 I1 " 'li 11111111 11 IJ 111 I li! 1I It I' r 'vl·l(' 1110 1111(1 puni que '1\ 11111 111'11 8- II I 1/lIIIHIIIIII! I 1I 1111 I '1'11111111 "I' "I' 1111 11/1 11' públi a das vontad 111' r 00 . A . sernprc de tal modo que trates a Humanidade, tanto na tua orno na do outro, com fim c não apenas como meio. (Kant.) 4 ou imorais. Livros são coisas bem escritas ou mal escri111 ux I{ .ros 1. Faça o (( hnrm-nro do 2. p(tlllo anote as principais dúvidas. Jo'llÇU duas dísscrtec cs a partir dos temas a seguir: n) (I UNO. i\NT ANDRÚ-SP) "A solidão é oficina de idéias." b) (FUVE 01'-89) "Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena." (Fernando Pessoa.) 3. T ndo em vista o fato de que a escravidão já foi legal, mas nem por isso pode ser considerada moral, dê outros exemplos de atos (de hoje ou de outras épocas) que também sejam legais, mas imorais. 4. De acordo com o dropes 1, em que consistiria para Descamps a generosidade verdadeira? 5. Releia o dropes 2, de Ortega y Gasset, e explique o que o autor quer dizer com o sentido positivo e "não-acidental" do "perder-se" humano. Faça referência ao comportamento moraL 6. A partir da citação de Kant, no dropes 3, responda: a) Em que sentido Kant, ao referir-se ao sujeito, não o considera como indivíduo? b) Explique a citação a partir do conceito de autonomia. 7. Leia o texto complementar "Valores morais e não-morais", de Sánchez Vásquez e resolva estas questões: a) Um mesmo objeto pode ter diversos valores. Explique e dê exemplos. b) Quando se pode falar em valor moral propriamente dito? ) Leia a citação de Oscar Wilde, no dropes 4, e a explique usando os argumentos do texto de Sánchez Vásquez. LEITURA COMPLEMENTAR Valores morais e não-morais o obj tos valiosos podem ser naturais, isto é, como aqueles que existem oriÇJinar'im nt m rgem ou independentemente do trabalho humano (o ar, a água ou lima pl nta IIv tre), ou artificiais, produzidos ou criados pelo homem (como ' oi es út I ou s obras de arte). Mas, desses dois tiposde objetos. não , pode dizer qu [arn bons de um ponto de vista moral; os valores que encaro n JTI ou r allzarn aO,'m asos distintos. os da utilidade. ou da beleza. As vezes stum rall;lr da "bondad "desses objetos e, por essa razão, empregam-se xpressõ m 8 oulnt" : "este é um bom relógio", "a água que agora estarnos bcbonrto (. bon", "X ('~ r v li um bom poema" etc, Mas o uso de "bom" m scmcth nlNI cxp .flll()CII FI o possui nenhum significado moral. Um "bom" r 1 gl um r ,I 01 que r' 111 positivamente o valor correspondente: o da uti111