(Se você quer uma imagem do futuro, imagine uma bota prensando um rosto humano para sempre") G.Orwell - 1984, 1949 1984 – George Orwell Por: Carla G Meassi Março de 2010 O Big Brother de Orwell George Orwell, escritor inglês falecido em 1950, desencantado com o socialismo, especialmente com o stalinismo, causa que abraçara para melhor lutar contra o nazi-fascismo, dedicou os últimos anos de vida a denunciar o comunismo stalinista. Para tanto publicou dois livros, nos anos de 1945 e 1949, ambos com impressionante projeção, e que fizeram por acirrar ainda mais o feroz debate ideológico entre comunistas e democratas que dividiu o mundo intelectual na época da guerra fria. Um deles intitulava-se Animal Farm (A revolução dos bichos), e o outro simplesmente tinha um número na capa, o Nineteen Eigthy Four ("1984"), no qual apareceu pela primeira vez o onipresente Big Brother, o Grande Irmão. George Orwell (1903-1950) Como tantos intelectuais da sua geração, a crise dos anos 30, seguida da espantosa ascensão do nazi-fascismo, quando ditadores como Hitler, Mussolini e Franco, passaram a servir de exemplo e inspiração para tantos outros candidatos à tirania, Orwell inclinou-se pela resistência a eles. Nunca, entretanto, foi um militante comunista. Considerava-se um independente, um companheiro de viagem da causa. E assim o foi. Em dezembro de 1936, ele, como tantos outros estrangeiros, apresentou-se como voluntário para deter o golpe direitista do general Franco, na Espanha. O caldo entornou de vez quando, ainda que ferido na garganta quanto lutava ao lado dos milicianos de esquerda, em maio de 1937, ele foi, justamente por não ser um enquadrado, considerado um fora-da-lei pelos comunistas espanhóis alinhados a Moscou. Construindo a docilidade pela medicina Enquanto o ex-bolchevique Zamiatin, que foi o verdadeiro profeta da sociedade anti-utópica, chamou de benfeitor o ditador do seu Estado Uno, Orwell batizou-o de Big Brother. Era o Grande Irmão, que tudo via, tudo sabia e tudo previa, o invisível senhor de uma máquina política totalitária que movia guerra ao mundo e aos seus poucos opositores. Também recorreu a outro best-seller da distopia (isto é uma anti-utopia ou contra-utopia, que visualiza o futuro como um pesadelo), o Brave New World, o Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, que descrevia o funcionamento de uma sociedade pavloviana inteiramente controlada por recursos biológicos e farmacêuticos, publicado em 1931. Tendo o controle das comunicações, fazendo da televisão, omnipresente, o seu poderoso olho policial, o Grande Irmão dobrava todos à sua vontade. O lema do regime era Big Brother is Watching You, o Grande Irmão te vigia. Nada, portanto, lhe escapava. Invertendo a lógica do aparelho televisor, obrigatoriamente ligado, sem outras alternativas de programas, era por meio do tubo que ele controlava os cidadãos rebaixados a servos obedientes. Um idioma próprio Stalin, modelo do Grande Irmão A coesão interna do sistema era obtida não só pela opressão. Lá fora, além do perímetro da Oceania, como Orwell designou aquele paraíso da repressão, o regime enfrentava os seus inimigos eternos sustentando uma guerra interminável na Eurásia e na Eastasia, tudo justificado pela invenção de uma nova linguagem: a novilíngua. Este idioma totalitário, obra-prima dos filólogos a serviço do Grande Irmão - parente próximo do politicamente correto dos nossos dias -, tinha o dom de transmudar em outra coisa todas as palavras com significado desagradável ao regime. Não contente com isso, o Grande Irmão, para extravasar as emoções, promovia sessões de ódio, nas quais, numa tela gigante, aparecia a imagem do principal inimigo dele (Emanuel Goldstein, isto é, Trótski) para que todos descarregassem a fúria sobre aquele satã. Situações estas intercaladas com outras cenas enternecedoras, nas quais os súditos, perfeitamente lubrificados pela eficaz e condicionante engrenagem da propaganda, lançavam loas e agradecimentos mil ao Grande Irmão. As intenções gerais de Orwell Além de ser uma espécie de acerto de contas com o regime comunista, Orwell pretendeu com o livro 1984 tecer certas considerações sobre a experiência socialista até então conhecida. Basicamente ele assegurou que: -A guerra, movida perpetuamente pelo regime, era importante para consumir os produtos do trabalho humano, pois se tal tipo de trabalho for usado na incrementar o padrão de vida, o controle do partido sobre o povo decai, pois a guerra é a base de uma sociedade hierárquica. Logo, a paranóia do regime stalinista tinha uma função clara de mobilizar os recursos nacionais permanente em função da interminável guerra contra o capitalismo, servindo isto de pretexto para a continuidade da ditadura partidária e do domínio absoluto do chefe sobre o todo. - Havia uma necessidade emocional em acreditar na vitória final do Grande Irmão. Para poder suportar o clima opressivo, as mentes deveriam estar concentradas num perspectiva psicológica otimista. - A guerra contínua tinha a função de garantir a ordem interna do regime. Desta forma Guerra significava Paz. Havia sempre três grandes graus na sociedade, o alto, o do meio e o de baixo, e nenhuma mudança afetou um milímetro sequer a desigualdade humana. Coletivismo não significa socialismo. Agora a riqueza pertence a uma nova " classe alta" , formada pela burocracia e pelos administradores . O coletivismo assegurou a permanente desigualdade. A riqueza não é transmitida de pessoa a pessoa, mas controlada pelo grupo dominante. As massas, (os ditos "proles" do livro de Orwell) ganharam liberdade de pensamento porque elas não pensam! O membro do partido não está autorizado a qualquer desvio de pensamento, havendo um treinamento mental para assegurar que isso não ocorra, um treinamento que pode ser sintetizado na concepção do duplo pensar, que faz com que a realidade sempre seja moldada de acordo com a teoria ou com as decisões programáticas do partido. E o que isso tudo tem ou não a ver com a realidade do século XXI? Ou...