Compliance Ambiental
Michelle Sanches Barbosa
Advogada.
Assistente Técnica da Defensoria Pública Geral do Estado de São Paulo.
Mestranda em Direitos Difusos e Coletivos.
Sumário: 1 – Introdução. 2 – Compliance. 3 – Objetivos do Compliance. 4 – Atuação
do Compliance. 5 – Implantação do Programa de Compliance. 6 – Criminal
Compliance. 7 – Compliance Ambiental. 8 – Conclusão. 9 - Bibliografia.
1.
Introdução
O presente artigo possui a finalidade de abordar a posição atual das pessoas jurídicas e
seus mecanismos de controle, prevenção e reparação dos danos causados ao meio
ambiente em decorrência de suas atividades, tendo em vista o rápido crescimento de
novas tecnologias, assim como o despertar social para o denominado consumo
sustentável, que parece impulsionar tanto pessoas como empresas na busca por condutas
preservadoras do meio ambiente.
Com o surgimento da sociedade moderna e, conseqüentemente o aumento do consumo,
o setor empresarial se destacou como o grande propulsor da era em que a pessoa
jurídica tornou-se responsável pelo atendimento da variada gama dos desejos humanos,
desde o fornecimento dos itens necessários até a aquisição de surpéfluos, porém, o
rastro negativo deixado à Natureza tem sido um problema a ser enfrentado pelos entes
morais.
Desta forma, cada vez mais necessária a adoção de práticas que coadunem com a
integração: Natureza, sociedade, empresa, consumo e ética, que a princípio pode soar
como utopia, no entanto, por meio do denominado compliance, uma possibilidade dessa
realidade se tornar efetiva apresentou-se, ainda que tal instituto seja originário do setor
bancário e novo na seara ambiental, constitui um inovador programa que visa evitar a
prevenção de riscos, a criminalização de condutas no âmbito da pessoa jurídica, a
correta aplicação da legislação ambiental, bem como a implantação de boas práticas
corporativas a fim de alcançar o almejado equilíbrio entre preservação ambiental e
desenvolvimento econômico.
2.
Compliance
No decorrer da história, o Direito sempre caminhou em consonância com o avanço da
sociedade e das indústrias, progredindo por meio de suas normas e disposições que
visam regrar as condutas sociais, resguardando a vida como um dos bens mais caros às
pessoas.
Outrora, a Natureza parecia demonstrar uma faceta que refletia inesgotabilidade,
todavia, com o advento do modelo capitalista, que caracterizou a atividade que
determina a posse ou a carência dos meios de produção, baseando seus preços na lei da
oferta e da procura.
A distribuição de riquezas são regidas pelo mercado, os proprietários de empresas
investiram nos bens por meio da compra da força do trabalho para a produção que, após
a venda cumpre a finalidade principal que reside em ter o capital investido de volta,
porém, com um lucro excedente.
Esse conceito foi implementado após o período pós-Revolução Industrial, oriundo do
processo de crescimento populacional que gerou um aumento na demanda e,
conseqüentemente a possibilidade de crescimento da oferta, gerando um modelo de
produção em série que deu ensejo à diminuição dos custos, atingindo maior número de
pessoas1.
Com o decorrer dos anos, a produção foi sendo aperfeiçoada atingindo grandes níveis de
lucros e diversos setores, todavia, tal crescimento econômico não foi pensado em
consonância com a preservação dos recursos naturais, que desde então vêm sofrendo
muitos danos e perdas irreparáveis oriundas da sede do lucro desmedido.
1
Rizzatto Nunes, Curso de Direito do Consumidor, p. 3.
Assim, desenvolveu-se nas empresas, no âmbito do planejamento de suas ações, a
valorização da prevenção de riscos em diversas áreas, tais como, tributária, trabalhista,
cível, administrativa e penal, atentando-se às leis vigentes a fim de resguardar sua
imagem e patrimônio. Entretanto, ainda que os recursos naturais sejam fundamentais
para as atividades empresariais, poucos constituíam os entes morais que detinham entre
seu planejamento o meio ambiente no rol de suas atenções.
Por outro lado, muito embora estejamos em pleno século XXI, ainda existem empresas
que não consideram tal assertiva importante, fato é que tal realidade vem sendo
radicalmente modificada.
Diante do domínio do mercado globalizado, o esgotamento dos recursos naturais e o
desenvolvimento sustentável, a sociedade tem despertado seu interesse da sociedade,
que opta por empresas que executam suas atividades em harmonia com a Natureza.
Desta feita, a pessoa jurídica que não adotar uma postura preventiva e cuidadosa em
relação às questões ambientais dificilmente conseguirá sobreviver em meio ao mercado
de consumo vigente.
Isso porque, tal mercado, ao mesmo tempo em que esgota os recursos naturais
demonstra a ânsia de preservá-lo, remetendo a ambigüidade da culpa e castigo ou até
mesmo uma fuga consciente das inconsciências cometidas em detrimento do meio
ambiente.
Assim, muito embora exista uma farta legislação protetiva do meio ambiente em nosso
país, a preocupação com a Natureza pelas empresas tem assumido caráter de
essencialidade em exigência a uma sociedade contrastante e consumista que vem
requerendo investimento das empresas em sustentabilidade.
Tais atitudes demonstram que os tempos modernos impõem sua perpetuação pautada na
qualidade ambiental, muito embora tal exigência seja tardia, constitui grande avanço
para o Direito, para as presentes e futuras gerações, para a sociedade, empresas e para a
preservação da vida, em todas as suas formas.
Para tanto, medidas de adequação para as empresas são cada vez mais necessárias, nesse
sentido, a prevenção de riscos se traduz em medida muito mais satisfatória e econômica
do que o enfrentamento de litígios oriundos da não observância da legislação, bem
como à reparação dos danos causados à Natureza pela atividade poluidora ou outras
práticas cometidas pela pessoa jurídica em prejuízo do meio ambiente.
Com a evolução do Direito Ambiental e a degradação do meio ambiente por parte da
atividade industrial, mostrou-se necessário o desenvolvimento de um instituto que
tivesse como finalidade precípua o equilíbrio entre a preservação da Natureza e o
desenvolvimento econômico. Algo que complementasse os princípios que norteiam a
aplicação do Direito Ambiental, que saísse do âmbito teórico da legislação vigente e
viesse oferecer plena efetividade à prevenção de riscos na esfera empresarial.
Desta forma, uma possível e real solução se revelou por meio do chamado compliance.
O termo compliance origina-se do verbo inglês to comply, que
significa cumprir, executar, obedecer, observar, satisfazer o que lhe
foi imposto. Compliance é o dever de cumprir, de estar em
conformidade e fazer cumprir leis, diretrizes, regulamentos internos
e externos, buscando mitigar o risco atrelado à reputação e o risco
legal/regulatório2.
O compliance passou a existir a partir da década de noventa através da Lei 9.613/1998 e
da Resolução nº 2.552/1998 do Conselho Monetário Nacional.
De acordo com um estudo realizado pela FEBRABAN3, a função de compliance teve
origem no início dos anos 70, com a criação do Comitê da Basiléia 4, que objetivava
supervisionar bancos, fortalecendo o Sistema Financeiro por meio de maior
2
Manual de Compliance, p. 2.
A Função de Compliance, Febraban. Disponível em
<http://www.febraban.org.br/arquivo/Destaques/destaque-compliance.asp>
Acesso realizado em 2 de outubro de 2012.
4
O Comitê de Supervisão Bancária de Basileia (Basel Committee on Banking Supervision) é uma
organização que congrega autoridades de supervisão bancária, visando fortalecer a solidez dos sistemas
financeiros. Desde 1974 é composto pelos presidentes dos bancos centrais dos países do Grupo dos Dez
(G-10), reunindo-se no Banco de Compensações Internacionais, na Basileia, Suiça, onde se localiza sua
secretaria permanente. Nesse comitê, são discutidas questões relacionadas à indústria bancária, visando
estabelecer padrões de conduta, melhorar a qualidade da supervisão bancária e fortalecer a solidez do
sistema bancário internacional.
3
conceituação sistemática de suas atividades, utilizando como padrão a adoção das boas
práticas financeiras, empregando procedimentos de prevenção na sua atuação.
Em meio a este cenário, as Instituições Financeiras do Brasil enfrentavam cada vez mais
a concorrência por um lugar de destaque no mercado. Tal competitividade contribuiu
para a quebra de algumas instituições que, dentre diversos fatores não adequaram seus
controles em consonância com o risco da atividade financeira.
No cenário internacional, alguns fatos como o escândalo financeiro em Wall Street em
2002, acabaram por despertar as instituições para a necessidade de haver uma
regulamentação efetiva e de rápida aplicação em diversos países, a fim de gerir os riscos
aos quais tais instituições estão sujeitas.
Diante de tal quadro, as Instituições Financeiras tiveram que planejar o início de um
ciclo de mudanças radicais acerca de sua reestruturação, incluindo mudanças
organizacionais, tecnológicas e implementação de processos constantes de reciclagem.
O objetivo era buscar a otimização do recurso humano, incrementando o treinamento e
fortalecendo a Política de Controles Internos e o Código de Ética e Normas de Conduta.
Com isso, as Instituições Financeiras buscavam a construção de uma imagem forte junto
a seus clientes e fornecedores, visando alinhar um conjunto de informações em meios de
comunicação eficazes e processos internos.
Buscou-se facilitar o acesso das informações institucionais por todas as pessoas
pertencentes à empresa, integrando-os na busca por melhores resultados.
Historicamente, a adoção de um sistema financeiro seguro e estável foi marcada com a
criação do Banco Central Americano em 1913, todavia, somente em 1060, o termo
Compliance ganhou destaque.
Tal época ficou conhecida como a “Era Compliance”, ocasião em que foram
contratados os primeiros compliance officers, para criar procedimentos internos de
controles; treinar pessoas e monitorar, com o objetivo de auxiliar as áreas de negócios a
ter a efetiva supervisão.
O compliance surgiu a fim de garantir a imagem das instituições financeiras por meio de
um programa que visava o fiel cumprimento de leis atinentes às práticas bancárias,
minimizando riscos e prevenindo-os no âmbito de atuação da empresa, visando evitar
também a publicidade negativa perante aos clientes, mantendo seu bom desempenho,
lucratividade e credibilidade.
O sucesso do programa de compliance no setor financeiro, onde se tornou obrigatório,
acabou por levar outros segmentos a se interessarem por tal sistema, aplicando-o em
conformidade com a área de desempenho, mas preservando os princípios éticos e as
normas de conduta que regem o compliance. Assim,
(...) a função de compliance recebeu o impulso inicial nas
instituições financeiras, para as quais se converteu em requisito
regulatório. Na sequência, deste movimento em prol do compliance
(...) expandindo-se, mais recentemente, para os mais diversos
setores; e isto porque o compliance é uma questão estratégica, que
se aplica a todos os tipos de organizações5.
As regras básicas serão as mesmas para todas as instituições, todavia, cada uma delas
deverá aplicá-las de acordo com sua área e local de atuação, em consonância com os
objetivos e complexidade de operações, garantindo as boas práticas das organizações no
mercado financeiro.
Denota-se que o surgimento do compliance guarda relação direta com a prevenção de
crimes no âmbito empresarial, isso porque inicialmente as instituições financeiras
assistiram seus dirigentes submetidos a processos criminais oriundos de crimes
econômicos e do gerenciamento das instituições desprovido de conceitos éticos, bem
como de um eficiente programa de prevenção de riscos.
O compliance pode representar uma alternativa viável na prevenção de delitos
ambientais e de prevenção à responsabilização penal da pessoa jurídica ante a previsão
5
Marcelo de Aguiar Coimbra, Manual de Compliance, p. 1.
de tal instituto, traduzindo um novo modelo jurídico à implementação do cumprimento
das normas atinentes a padrões éticos, preventivos e jurídicos aos quais a atividade
empresarial ainda não está adaptada.
Vale lembrar que em relação às normas ambientais ainda não previsão legal da atuação
do compliance no âmbito empresarial, muito embora a responsabilização penal da
pessoa jurídica tenha previsão expressa na Constituição Federal de 1988 e na Lei dos
Crimes Ambientais, todavia,
O Brasil, ao instituir a responsabilização criminal das pessoas
jurídicas na Lei ambiental (Lei 9.605/98), de forma lacônica e
lacunosa, perdeu, na ocasião, grande chance de pensar hipóteses
minorantes e excludentes de responsabilidade corporativa, caso
medidas internas de prevenção fossem adotadas segundo
programas sérios de atuação ética preventiva6.
A pessoa jurídica deve buscar por meio da implantação de um programa de compliance
a prevenção de riscos por meio da adoção de um programa contínuo que vise a proteção
da empresa e seus membros da responsabilização penal ou a redução de
responsabilidades através da possível detecção de atos ilegais antes de seu cometimento.
Para tanto, é primordial que a atuação do compliance minimize e repare danos, a fim de
mitigar possíveis penalidades oriundas da não observância das boas práticas
coorporativas.
3.
Objetivos do Compliance
A finalidade da função de compliance foi disciplinada em um texto elaborado pela
Associação Brasileira dos Bancos e pela Federação Brasileira de Bancos. No Sistema de
Controles Internos, a Função Compliance possui a seguinte aplicabilidade:
1.
Leis – certificar-se da aderência e do cumprimento;
2.
Princípios Éticos e de Normas de Conduta - assegurar-se
da existência e observância;
6
Sérgio Salomão Shecaira e Pedro Luiz Bueno de Andrade, Compliance e o Direito Penal, , Boletim
IBCCRIM, ano 18, n º 222, maio, 2011, p. 2.
3.
Regulamentos e Normas - assegurar-se da implementação,
aderência e atualização;
4.
Procedimentos e Controles Internos - assegurar-se da
existência de Procedimentos associados aos Processos;
5.
Sistema de Informações - assegurar-se da implementação e
funcionalidade;
6.
Planos de Contingência - assegurar-se da implementação e
efetividade por meio de acompanhamento de testes periódicos;
7.
Segregação de Funções - assegurar-se da adequada
implementação da Segregação de Funções nas atividades da
Instituição, a fim de evitar o conflito de interesses;
8.
Prevenção à Lavagem de Dinheiro - fomentar a cultura de
Prevenção à Lavagem de Dinheiro, através de treinamentos
específicos;
9.
Cultura de Controles - fomentar a cultura de Controles em
conjunto com os demais pilares do Sistema de Controles Internos
na busca incessante da sua conformidade;
10.
Relatório do Sistema de Controles Internos (Gestão de
Compliance) – Avaliação dos Riscos e dos Controles Internos –
elaborar ou certificar-se da elaboração do referido relatório com
base nas informações obtidas junto às diversas áreas da instituição,
visando apresentar a situação qualitativa do Sistema de Controles
Internos em atendimento à Resolução n.º 2554/98;
11.
Participar ativamente do desenvolvimento de políticas
internas, que previnam problemas futuros de não conformidade e a
regulamentação aplicável a cada negócio;
12.
Relações com Órgãos Reguladores e Fiscalizadores –
Assegurar-se de que todos os itens requeridos pelos reguladores
sejam prontamente atendidos pelas várias áreas da Instituição
Financeira assertivamente e com representatividade e
fidedignidade.
Nesta esteira, os objetivos dos compliance officers visam à redução de riscos no que
tange à responsabilização penal e à investigação e descoberta de funcionários que
possam se revelar maléficos para a atividade empresarial, acabando por tornarem-se
uma espécie de garantidores da empresa, sendo responsabilizados caso não cumpram
com sua posição de vigilância e cuidado assumidos na prevenção empresarial. Assim,
esses controles internos pretendem prevenir a responsabilidade penal, todavia, sua
concretização cria condições para que dentro da empresa se forme uma cadeia de
responsabilização penal”7.
Ressalte-se que o planejamento da prevenção de riscos dentro da empresa pode não
garantir cem por cento de resultado, todavia, é capaz de prevenir riscos que seriam
desnecessários à atividade empresarial, razão pela qual, por meio do planejamento, a
margem de acertos da pessoa jurídica se torna alta, destacando que não é possível
acautelar e educar sem um plano de ação que inclui a precaução, a segurança e a
prevenção de riscos.
4.
Atuação do Compliance
A atuação do compliance na seara ambiental vai além da verificação das normas
ambientais aplicáveis a determinada empresa. A ele cabe implementar estratégias por
que sejam capazes de medir o desempenho de todas as ações destinadas ao controle
ambiental, com a finalidade de prevenir autuações, multas, instaurações de processos
administrativos, cíveis e criminais.
Ainda que muitas empresas apresentem resistência no cumprimento da legislação
ambiental por acreditarem que a adoção de medidas preventivas constitui algo custoso
que não traz benefícios, a realidade demonstra que tal postura condenará a empresa na
parte que lhe é mais cara: o consumidor. Todavia, a grande maioria das empresas tem
enxergado oportunidades onde outras visualizam despesas.
Assim, para muitas empresas a questão ambiental constitui um investimento atraente de
publicidade que eleva sua imagem frente aos consumidores, investidores, fornecedores e
todos os envolvidos direta ou indiretamente com sua atividade.
Por outro lado, pode ocorrer, na busca pelo cumprimento de metas e lucro, o estímulo
dos integrantes das pessoas jurídicas, principalmente os membros de sua direção, a
instigar seus funcionários a praticar atos que violem as boas práticas coorporativas, bem
como a ética exigida pelo programa de compliance.
7
Giovani A. Saavedra, Reflexões Iniciais sobre Criminal Compliance. Boletim IBCCRIM, ano 18, nº
218, janeiro, 2011.
É importante que o compliance elabore um programa que seja incorporado eticamente
por dirigentes e empregados, levando em conta o fator humano que é passível de falhas,
pois, não há como exercer controle absoluto sobre os atos praticados pelas pessoas.
Contudo, em conjunto com a atuação do compliance os dirigentes das empresas devem
atrair seus funcionários por meio de objetivos que os incentivem o crescimento da
instituição até o limite permitido pela legislação vigente em seu âmbito de atuação,
consolidando a posição da empresa e, conseqüentemente de cada um de modo
individual.
Destaque-se que a atuação do compliance deve abranger todos os membros pertencentes
à pessoa jurídica, bem como a qualidade externa, monitorando o relacionamento dos
empreendimentos, de seus fornecedores e terceirizados, tentando abranger todos que
guardem relação com a atividade empresarial desenvolvida.
Para tanto, é primordial que o compliance direcione uma parte do programa para a
comunicação entre os diversos setores que integram a pessoa jurídica, haja vista que
para o sucesso de sua atuação e a efetiva prevenção de riscos, é necessário que todos
tenham consciência e ciência do cumprimento das responsabilidades da empresa como
ente coletivo que acaba por resultar na responsabilidade individual de cada um de seus
membros.
De bom alvitre se mostra a implantação de um código de política de prevenção de
riscos, destacando que tal atuação é restrita à área de operação da empresa, com prévio
estudo de sua estrutura, quadro de funcionários, delimitação de setores, atuação,
procedimentos adotados, desenvolvimento e análise de regras às quais estará submetida
dentro do desenvolvimento de sua atividade.
O trabalho do compliance, por envolver total responsabilidade pela prevenção e
reparação de danos ambientais, deve ser efetuado de modo contínuo, atentando-se
sempre a possíveis mudanças de legislações, ocorrências diárias, negociações e riscos
oriundos da atividade da empresa.
Para tanto, é imperiosa a obtenção da integração de todos os setores, isso porque, a
empresa possui existência e personalidade próprias, todavia, age por meio de pessoas
físicas que acabam por externar em meio à atividade profissional, suas potencialidades e
fraquezas.
Por tais razões, o investimento primeiro do compliance deve consistir no treinamento e
gestão dos integrantes da pessoa jurídica a fim de alcançar benefícios individuais que
devidamente valorizados e integrados resultarão em benefícios coletivos.
5.
Implantação do programa de Compliance
A implantação de um programa de compliance dentro da empresa deve ser
cuidadosamente estudada e planejada, pois, a responsabilidade de sua execução abrange
não somente seu idealizador e condutor, mas todos os envolvidos na atuação e rotina da
pessoa jurídica, desde sua criação até sua condução e monitoramento.
Sua finalidade precípua deve ser a aplicação de procedimentos, revisão de condutas e
políticas habitualmente utilizadas, bem como à conscientização acerca das normas
aplicáveis na área de atuação da empresa, da comunicação com diversas áreas que
envolvem o negócio desenvolvido e a garantia de aderência por meio da ética e o
comprometimento de todos.
O programa de compliance deve primeiramente adotar políticas claras, de fácil
entendimento e acesso, mantendo atualização periódica e integração entre membros e
setores da empresa. De acordo com Vanessa Alessi Manzi, no programa de compliance
os principais tópicos a serem contemplados são:
1.
Estar em consonância com as leis, normas e políticas
internas, isso inclui a maneira como o compliance garantirá a
conformidade com tais normas e políticas internas, a maneira como
estes serão comunicados e a acessibilidade de tais instrumentos aos
profissionais da instituição;
2.
O compliance deve participar do fluxo de aprovação de
produtos e processos, objetivando a avaliação da conformidade da
regulação, mitigando o risco de compliance;
3.
Reportar os riscos para a alta administração estabelecendo
de que maneira os casos de não conformidade identificados são
endereçados a fim de definir ações corretivas e acompanhamento
de prazos;
4.
Atuar junto à área de negócios, tendo em vista que a
função de compliance cada vez mais assume o papel consultivo
junto a tais áreas com a finalidade de fornecer informações de
acordo com as regulações e boas práticas, assim como à mitigação
do risco atrelado à reputação da empresa;
5.
Cabe ao compliance disseminar altos padrões éticos,
definindo as atividades relacionadas a um código de ética e canais
de denúncia;
6.
Definir um plano de treinamento relacionado a compliance
dentro do âmbito de atuação da empresa, certificando a
participação e aproveitamento dos profissionais pertencentes ao
quadro da instituição;
7.
Por meio do programa de compliance fortalecer os
controles internos, visando mitigar os riscos relacionados à
reputação e imagem da empresa, bem como às sanções
regulatórias;
8.
etc.
Definir monitoramentos, planos de treinamento, comitês
O programa deve ser estabelecido com base em três frentes primordiais de atuação,
quais sejam, prevenção da prática de infrações; (detecção das eventualmente cometidas
no menor prazo possível; e a repressão aos atos praticados, com imposição interna de
penalidades.
Obviamente, o que se busca em primeiro lugar é a prevenção em sua forma pura.
Entretanto, não se pode desconsiderar a possibilidade de que atos ilegais sejam
praticados. Por isso, também devem ser criados mecanismos que auxiliem na rápida
detecção dos mesmos, permitindo a minimização dos danos, bem como que a empresa
se valha do acordo de leniência. 9 Entretanto, existem determinadas limitações inerentes
a esse tipo de medidas, destacando-se:
(i) a dificuldade em saber se todos os funcionários efetivamente
receberam as instruções, o que fica ainda mais prejudicado em
empresas com alta rotatividade; (ii) a dificuldade de atualização
dos manuais e seminários, o que também se mostra custoso do
ponto de vista econômico; e (iii) a necessidade de controle póstumo
a respeito da compreensão do programa pelos funcionários que
costuma ser feita por meio de testes escritos, os quais não tendem a
ser bem aceitos. Para suprir essas deficiências, diversas empresas
especializadas e escritórios de advocacia vêm oferecendo
“Programas de Compliance” online, cujas principais vantagens são
(i) facilidade de uso; (ii) flexibilidade de adequação às
especificidades da empresa; (iii) possibilidade de implementação
de exercícios interativos; (iv) possibilidade de acesso rápido e
constante; bem como (v) facilidade de atualização do conteúdo do
programa, com redução de custos8.
Desta forma, quanto maior a empresa, mais formal deve ser o programa, com políticas
claras e por escrito a respeito dos padrões e procedimentos a serem seguidos. De
maneira geral, os “Programas de Compliance” têm como base a circulação de um
manual impresso, bem como a realização periódica de seminários e treinamentos a
respeito do tema.
6.
Criminal Compliance
O conceito de compliance constitui algo recente, surgido na década de noventa,
tornando-se alvo da atenção e estudos jurídicos ainda de maneira tímida, porém,
definitiva. Por outro lado, de acordo com Giovani A. Saavedra, o desenvolvimento do
compliance tem se dado à margem do Direito Penal e da Criminologia, sendo tal
instituto discutido no âmbito internacional. Assim, há um movimento de estímulo ao
debate sobre a necessidade prévia de conhecimentos jurídicos-penais para sua aplicação,
razão pela qual esse novo ramo
(...) de pesquisa tem sido designado pela doutrina internacional
como criminal compliance, ou seja, o estudo dos controles internos
e de outras medidas que podem ser adotadas em empresas e
instituições financeiras com o fim de prevenção de crimes9.
8
Maria Beatriz Martinez, Programas de Compliance e a Defesa da Concorrência: Perspectivas para o
Brasil, Revista dos Tribunais Online. Revista do IBRAC , Direito da Concorrência, Consumo e Comércio
Internacional, vol. 12, p, 153, janeiro, 2005.
9
Reflexões Iniciais sobre Criminal Compliance, Boletim IBCCRIM, ano 18, nº 218, janeiro, 2011, p. 11.
O denominado criminal compliance, a princípio foi confundido com o Direito Penal
Econômico, tendo em a persecução penal de empresários e instituições financeiras, pois,
com o decorrer do tempo as investigações e processos penais revelaram a necessidade
do estudo da prevenção criminal no campo das atividades da pessoa jurídica.
O criminal compliance objetiva prevenir riscos por meio das boas práticas corporativas,
bem como pela aderência à ética como elemento de atuação da empresa, por outro lado
também visa identificar possíveis crimes e criminosos na esfera de atuação da pessoa
jurídica.
Para tanto, o responsável pelo compliance assume uma posição de garantia, tendo em
vista que sua atuação engloba a responsabilidade pelos resultados, obrigação de zelo e
vigilância frente ao cumprimento das normas e prevenção de riscos nas instituições.
Portanto, a primeira característica atribuída ao termo criminal
compliance é prevenção. Diferentemente do Direito Penal
tradicional, que está habituado a trabalhar na análise ex post de
crimes, ou seja, na análise de condutas comissivas e omissivas que
já violaram, de forma direta ou indireta, algum bem jurídico digno
de tutela penal, o criminal compliance trata o mesmo fenômeno a
partir de uma análise ex ante, ou seja, de uma análise de controles
internos e das medidas que podem prevenir a persecução penal da
empresa10.
No Brasil, o compliance ainda constitui um instituto em desenvolvimento, mas de
ordem obrigatória às instituições financeiras, avançando de maneira tímida no que tange
a outras áreas. Assim,
Em que pese o conceito tenha surgido na década de noventa, o
tema ainda não recebeu o merecido destaque no Brasil, sendo
praticamente desconhecido na academia e na doutrina jurídicopenal (especialmente no âmbito da Criminologia). Mais: no âmbito
empresarial, os potenciais atingidos também parecem não ter se
dado conta das fortes conseqüências jurídico-penais desse novo
instituto para o desenvolvimento de suas atividades11.
10
Giovani A. Saavedra, Reflexões Iniciais sobre Criminal Compliance, Boletim IBCCRIM, ano 18, nº
218, janeiro, 2011, p. 11.
11
Ibid., mesma página.
Outrossim, o denominado criminal compliance ainda constitui um tema novo no Brasil,
mas que sinaliza uma evolução obrigatória diante do aumento da fiscalização às
empresas, à concorrência industrial, à necessidade de prevenção e aderência às normas
que regulam a atividade empresarial dentro de seu ramo de atuação, assim como a
integração de todos os setores da pessoa jurídica a fim de prevenir riscos e a
responsabilização penal da empresa e das pessoas que dela fazem parte.
7.
Compliance Ambiental
O êxito dos programas de compliance na área financeira acabou por incentivar outros
campos a adotar tal sistemática, buscando a garantia do cumprimento das normas
vigentes em consonância com o campo de atuação, bem como manter a imagem da
empresa e torná-la apta para o competitivo mercado atual, que objetiva equilibrar
desenvolvimento econômico e preservação ambiental. Isso porque, a sociedade tem
exigido cada vez mais das empresas que transpareçam preocupação na preservação do
meio ambiente, assim como adotem práticas sustentáveis que visem causar o menor
impacto possível na Natureza.
Todavia, tal preocupação não advém somente dos consumidores, abrange fornecedores,
órgãos governamentais, terceiro setor e toda espécie de segmento que de alguma forma
esteja envolvida com a atividade exercida pela pessoa jurídica.
Nesta esteira, frente ao número cada vez maior de normas ambientais, bem como o
aumento da procura por produtos e empresas ambientalmente corretas, a pessoa jurídica
é impulsionada a buscar a cautela de seus atos e atividades, a fim de se adequar às
normas vigentes, assumindo uma postura de prevenção de riscos e passivos
desnecessários oriundos da não observância da legislação ambiental.
No Brasil, a legislação ambiental é farta, porém, complexa, repleta de leis consideradas
avançadas e com uma Constituição Federal (1988) que favorece o meio ambiente. Na
prática tal quantidade de normas acaba por desmotivar muitas empresas que mantém um
pensamento arcaico ao considerar que o investimento nesta área é algo custoso,
desnecessário e que não oferece retorno, visando somente o lucro. Por outro lado, há
empresas que detém a consciência da importância do atendimento à legislação
ambiental e adotam condutas no sentido de cumprimento das normas vigentes,
garantindo assim sua imagem perante consumidores e fornecedores.
Ademais, visam aumentar seu valor de mercado em decorrência de práticas
sustentáveis, elevando seu conceito junto ao público devido às estratégias de marketing,
tornando-a apta ao propagado mercado sustentável. Tal objetivo tende aliar o
desenvolvimento econômico à preservação do meio ambiente, evitando futuras
demandas judiciais decorrentes de possíveis danos ambientais por meio da prevenção de
riscos típicos das empresas. Nesse contexto, surgiu o termo Compliance Ambiental que,
(...) tem o escopo de monitorar e assegurar que as empresas estejam
cumprindo rigorosamente as leis e normas ligadas ao meio
ambiente aplicáveis a cada negócio, prevenindo e controlando
riscos inerentes. Por meio do Compliance, qualquer possível desvio
ou a mínima desconformidade em relação à legislação ambiental
são identificados, controlados e devidamente evitados ou
minimizados12.
O programa de compliance ambiental será responsável pela identificação dos pontos
vulneráveis da empresa no âmbito de sua área de atuação, para tanto, é importante que
todos os setores e pessoas pertencentes ao quadro empresarial estejam cientes da esfera
de abrangência do programa e incluídos nos esforços para cumprimento da legislação
ambiental. Assim,
(...) a grande vantagem do Compliance consiste na antecipação a
eventuais irregularidades e, por conseguinte, em evitar
acontecimentos danosos ao meio ambiente e problemas com órgãos
fiscalizadores de proteção ambiental, autuações e aplicações de
sanções, assim como litígios13.
A função do compliance deve abranger não somente a antecipação das irregularidades,
mas estabelecer um programa a fim de evitar o surgimento delas, abrangendo não
somente os riscos inerentes à atividade da empresa, mas abarcando também a prevenção
12
Compliance ambiental, Caio Márcio Ebhart
Disponível em: <http://www.parana-online.com.br/colunistas/237/51046/>
Acesso realizado em 10 de setembro de 2012.
13
Compliance ambiental, Caio Márcio Ebhart
Disponível em: <http://www.parana-online.com.br/colunistas/237/51046/>
Acesso realizado em 10 de setembro de 2012.
ao meio ambiente através de práticas que visem resguardar a Natureza que, por diversas
vezes é deteriorada sob o fundamento do desenvolvimento econômico.
A adesão ao programa, mesmo pela alta direção da empresa é de suma importância, pois
todo o sistema financeiro da corporação deve pensar em consonância com o compliance
a fim de implementar uma espécie de contabilidade ambiental, planejando gastos e
lucros em acordo com a preservação ambiental.
Destaque-se também a importância da integração do compliance ambiental com a
auditoria, que deverá avaliar documentos e atuação da empresa, atentando-se a todos os
detalhes pertencentes ao quadro da pessoa jurídica, desde suas instalações às práticas
operacionais exercidas por seus membros. Interessante seria a análise de vertente que
vinculasse às empresas ao programa de compliance, talvez com força normativa e
coercitiva traduzida pela edição de lei específica que disciplinasse a forma e
obrigatoriedade da atuação da figura do compliance no âmbito das empresas.
8.
Conclusão
Para a obtenção do êxito do programa de compliance é necessário como investimento
precípuo à valorização do potencial humano, pois, somente por meio dele a preservação
do meio ambiente estará garantida, através do respeito, da educação ambiental e da
conscientização de que pertencemos apenas a mais uma espécie da Natureza.
A pessoa jurídica se apresenta como um agente eficiente e capaz de importantes e
pontuais transformações por meio de sua atuação frente ao mercado de consumo, fato
que expande sua responsabilidade frente à influência social. Desta forma, o compliance,
ainda que de modo tímido revela-se uma via eficaz para integração das pessoas físicas e
jurídicas visando atingir um objetivo comum, traduzindo a efetiva contribuição para a
reparação dos danos causados ao meio ambiente, bem como sua preservação por meio
de ações reais que contribuirão para a diminuição dos impactos ambientais, garantindo
assim, a tão almejada harmonia entre o progresso humano e a preservação da Natureza.
9.
Bibliografia
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Paulo: Saint Paulo, 2008.
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SAAVEDRA. Giovani A. Reflexões Iniciais sobre Criminal Compliance. Boletim
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Compliance Ambiental Michelle Sanches Barbosa Advogada