Doenças cardiovasculares e farmacologia DOENÇAS CARDIOVASCULARES E MEDIADORES FARMACOLÓGICOS CARDIOVASCULAR DISEASES AND PHARMACOLOGICAL MEDIATORS Claudia Roberta de Andrade [email protected] Faculdades INTA RESUMO Doenças cardiovasculares causam danos à circulação cerebral sendo os processos de estenose arterial os principais fatores envolvidos. Nesse contexto, o sistema cardiovascular é revestido internamente por uma camada única de células, o endotélio, que apresenta importante função na manutenção do fluxo sanguíneo pela liberação de fatores vasoativos, que agem causando relaxamento ou contração. O endotélio pode produzir e liberar substâncias vasodilatadoras (prostaciclinas e óxido nítrico-NO) e vasoconstritoras, como endotelina-1 e angiotensina II, que possuem ações importantes na fisiopatologia cardiovascular. Sendo esses dois peptídeos envolvidos na proliferação celular que causa redução do lúmem vascular. Esses processos de estenose podem causar alterações no fluxo sanguíneo e consequente efeito no endotélio vascular devido ao estresse por estiramento. Evidencias sugerem que a estenose, total ou parcial, causa alterações de fluxo nos sistemas arteriais contralaterais e colateral (carótida e basilar) e essas alterações parecem ser associadas a mudanças na resposta a agentes vasoativos. Entretanto, ainda não é clara a relação fluxo-reatividade nas artérias responsáveis pela irrigação sanguínea cerebral. Assim, o estudo de fatores envolvidos na obstrução do fluxo carotídeo, e suas consequências sobre fluxo sanguíneo e reatividade das artérias carótidas, obstruída e normal e basilar, tem se tornado importante para o entendimento dos fatores envolvidos nessas patologias. Palavras-chave: Patologias vasculares; Estenose vascular; ET-1; Reatividade vascular. ABSTRACT Cardiovascular diseases impair cerebral circulation and arterial stenosis processes are the main factors involved in these pathologies. In this way, the cardiovascular system is internally lined by a single layer of cells, the endothelium, which has an important role in maintaining the blood flow by releasing vasoactive factors, that triggers relaxation or contraction. Endothelium can produce and release vasodilator substances (prostacyclin and nitric oxide-NO) and vasoconstrictors, endothelin-1 and angiotensin II, which have important actions in cardiovascular pathophysiology. These peptides are also involved on cell proliferation which causes reduction of the vascular lumen. Stenosis cause changes in blood flow which affects the vascular endothelium due to shear stress. Some evidence suggests that total or partial stenosis, evokes changes in blood flow of stenotic vessels as well as the contralateral and collateral arteries (carotid and basilar), and these changes appear to be associated with alterations in response to vasoactive agents. Despite these evidences, the relationship between blood flow-reactivity in the arteries responsible for cerebral blood supply. Thus, the study of factors involved in obstruction of the carotid flow, and its effects on blood flow and reactivity of the carotid arteries, stenotic and normal, and basilar, are important for understanding the factors involved in these pathologies. Keywords: Cardiovascular diseases; Vascular stenosis; ET-1; Vascular reactivity. Revista Formar Interdiciplinar, Sobral - v.1, n.1, p.37-44, Jul - Dez. 2012 - p.37 DE ANDRADE C. R. INTRODUÇÃO Doenças cardiovasculares são a causa de óbitos de aproximadamente 36% da população mundial. Essas patologias geralmente são associadas à disfunção endotelial, sendo aterosclerose, hipertensão e hiperhomocisteinemia fatores envolvidos nos processos de comprometimento das funções vasculares, uma vez que acarretam lesão endotelial. A disfunção endotelial leva a uma liberação alterada de mediadores, entre eles, endotelina-1, um importante peptídeo envolvido na manutenção do tônus vascular. Estrutura arterial Para se entender os efeitos fisiopatológicos desses fatores que levam a lesão endotelial e consequentemente aterosclerose, a parede de uma artéria é composta por três camadas morfologicamente distintas. A mais externa, é a camada adventícia, formada principalmente por fibroblastos intercalados por células musculares lisas entre os feixes de colágeno e envolvidas por proteoglicanas A camada média é composta por células musculares lisas, orientadas diagonalmente e envolvidas por quantidades variáveis de colágeno, fibras elásticas e proteoglicanas. A camada íntima é a mais interna e é delimitada por uma camada simples e contínua de células endoteliais e uma lâmina de fibras elásticas (Figura 1). Entre esses limites, há vários componentes de tecido matricial conectivo extracelular (JAVID, 1979). Figura 1: Estrutura da parede de uma artéria (Adaptado de Silverthorn, 2010). O endotélio vascular não é somente uma estrutura anatômica de proteção mecânica e, sim, uma importante estrutura na liberação de fatores de manutenção do fluxo sanguíneo. Em condições fisiológicas, o endotélio está envolvido no metabolismo, coagulação e processos de transporte (FURCHGOTT e ZAWADZKI, 1980). Além disso, a camada endotelial ocupa uma posição importante entre o sangue circulante e o tecido muscular, controlando o tônus e a proliferação das subcamadas de células musculares lisas. Nas últimas décadas, tem sido mostrado que a disfunção endotelial é um fenômeno comum em muitas doenças cardiovasculares, como aterosclerose (ROSS, 1999), hipertensão e diabetes (ANGUS, 1996; MOMBOULI e VANHOUTTE, 1999), e as possíveis causas dessa disfunção incluem aumento do nível plasmático de LDL modificado (NAVAL et al., 1996) e homocisteína (NIGÄRD et al., 1997), hipertensão (CHOBANIAN e DZAN, 1996) e infecção por microorganismos (LIBBY et al., 1997), entre outras. A aterosclerose é caracterizada por um processo inflamatório e de proliferação das células da musculatura lisa vascular, que culminam em redução do lúmem da artéria, comprometendo o fluxo sanguíneo (Figura 2) (ROSS, 1993; 1999; KOGA e AIKAWA, 2012). No homem é um processo que progride lentamente com o envelhecimento, podendo afetar a reatividade e a hemodinâmica de vários vasos sanguíneos (BRIZZOLARA et al., 1994). Esse processo afeta mais frequentemente as artérias coronárias e cerebrais, e pode interferir progressiva ou abruptamente no fluxo sanguíneo, particularmente no coração e no cérebro (MOMIYAMA et al., 2012) e, normalmente, leva a consequências clínicas como infarto cardíaco e doenças vasculares cerebrais (ROSS, 1999). As lesões decorrentes do processo aterosclerótico ocorrem inicialmente em artérias de médio calibre, sendo a carótida externa a mais afetada; porém, artérias de pequeno calibre, como a Revista Formar Interdiciplinar, Sobral - v.1, n.1, p.37-44, Jul - Dez. 2012 - p.38 Doenças cardiovasculares e farmacologia basilar (BERGDAHL et al., 2003), parecem ser poupadas dessas lesões, o que não necessariamente exclui esses pequenos vasos de apresentarem mudanças na reatividade vascular (BRIZZOLARA et al.,1994; Suzuki et al., 2006). A bifurcação da artéria carótida é um local comum de mudanças ateroscleróticas, onde a distribuição topográfica das lesões não varia significativamente com a idade ou sexo, apesar da incidência das mudanças nessa artéria serem extremamente altas em indivíduos idosos. Essas lesões começam com a formação da camada gordurosa e progridem gradualmente para lesões obstrutivas ulcerativas (Figura 2) (JAVID, 1979). Entretanto, em humanos, a formação de placas ateroscleróticas induz uma redistribuição compensatória da massa da parede do vaso para manter o tamanho do lúmem. Esse processo de remodelamento permite que o fluxo sanguíneo continue normal até que se exceda o limite de adaptação (GLACOV et al., 1987). Permeabilidade endotelial Migração de leucócitos Migração de Formação células de de “foam músculo liso cells” Macrofagos Adesão endotelial Adesão de leucócitos Ativação de Agregação células T plaquetaria Formação de centro necrotico Aderência e entrada de leucocitos Formação de capa fibrosa Figura 2: Desenvolvimento da placa aterosclerótica (Adaptado de ROSS, 1999). O estresse por estiramento (shear stress) e seu efeito no endotélio foram propostos como mediadores primários no remodelamento induzido pelo fluxo, uma vez que a desnudação endotelial limita o remodelamento vascular (LANGILLE e O’DONNELL, 1986). O desenvolvimento de grandes artérias envolve remodelamento contínuo da parede vascular que ajusta o diâmetro do vaso de acordo com a demanda de fluxo sangüíneo (LANGILLE, 1995). Adicionalmente, aos fatores de risco conhecidos, fatores genéticos podem influenciar a habilidade de remodelamento vascular em casos de doenças cardiovasculares, como aterosclerose, hipertensão e restenose (MIYASHIRO et al., 1997). A aterogênese é afetada pelo remodelamento vascular induzido pelo fluxo sanguíneo em vários níveis. O estreitamento do lúmem vascular pelas lesões ateroscleróticas e o aumento do fluxo sangüíneo pelas lesões aumentam o estresse por estiramento (GLACOV et al., 1987). Outras evidências sugerem também que elevações da concentração plasmática de homocisteína são potenciais fatores de risco para a aterosclerose, uma vez que foi mostrado que níveis elevados desse aminoácido precedem o desenvolvimento da doença (ARNESEN et al., 1995; STAMPFER et al., 1992). A relação entre o aumento do nível plasmático de homocisteína e doenças cardiovasculares vem sendo estudada desde a década de 60 (MUDD et al., 1966). Fatores genéticos ou adquiridos podem influenciar os níveis plasmáticos de homocisteína, sendo que a mais comum das causas genéticas da hiperhomocisteinemia e homocisteinuria congênita homozigótica é a deficiência da enzima cistationaß-sintetase (MUDD, 1985). Essa patologia também pode ser causada pela deficiência nutricional que leva à redução dos níveis plasmáticos de folato ou vitamina B (B6 e B12). Estas duas substâncias, sozinhas ou associadas, reduzem efetivamente os níveis plasmáticos de homocisteína por atuarem como cofatores enzimáticos do metabolismo desse aminoácido (LOBO et al., 1999). Essa alteração enzimática causa bloqueio da conversão da homocisteína em cistationina, resultando no acúmulo de aminoácidos sulfonados, como a homocisteína e metionina, além de redução de cisteína nos líquidos corporais (REDDY et al., 1982; WALL et al., 1980). Indivíduos com deficiência da enzima cistationa-ß-sintetase apresentam desenvolvimento progressivo de doenças arteriais, como oclusão aterosclerótica das artérias coronárias, renais e pulmonares, sendo que essas lesões vasculares normalmente são iniciadas Revista Formar Interdiciplinar, Sobral - v.1, n.1, p.37-44, Jul - Dez. 2012 - p.39 DE ANDRADE C. R. na infância, frequentemente resultando em óbito devido à formação de trombos em órgãos vitais (MUDD et al., 1966). Existem evidências de que a hiperhomocisteinemia seja um importante fator envolvido no desenvolvimento do processo ateroclerótico nas artérias coronárias e cerebrais (BOUSHEY et al., 1995). ReatividadeVascular As alterações na resposta dos vasos sanguíneos a diferentes vasoconstritores podem ocorrer como uma consequência de mudanças na elasticidade do vaso ou estrutura da musculatura lisa decorrentes do envelhecimento e aterosclerose (BRIZZOLARA et al., 1994; de ANDRADE et al., 2008; 2009) e a modulação endotelial da vasoconstrição induzida pelas fibras adrenérgicas ou autacóides de ação local, ocorre através da liberação de vasodilatadores, sendo o óxido nítrico (NO) um dos principais fatores de relaxamento derivados do endotélio (EDRFs), juntamente com a prostaciclina (PGI2) (VANHOUTTE,1997; de ANDRADE et al., 2006). Em geral o NO e a PGI2, são potentes vasodilatadores, e são liberados sob condições basais em resposta a vários estímulos, como lesões, fatores de coagulação e hormônios (LUSCHER, 1992). Além dos fatores de relaxamento, as células endoteliais podem produzir outros EDCFs (fatores de constrição derivados do endotélio), os quais incluem ânions superóxido, endoperóxidos e tromboxana A2 e endotelinas, sendo que a mudança da liberação normal de EDRF para EDCF pode estar relacionada à aterosclerose (VANHOUTTE, 1997; de ANDRADE et al., 2009). A endotelina, um peptídeo composto por 21 resíduos, tem sido descrita como um potente vasoconstritor, de ação duradoura, liberada quando da estimulação por fatores físicos e químicos (YANAGISAWA et al., 1988). Nessa família de peptídeos existem quatro isoformas: ET-1, ET-2, ET-3 e ET-4; que diferem entre si pela posição dos aminoácidos nas cadeias. Essas isoformas interagem com três receptores conhecidos, um que apresenta elevada afinidade pelo peptídeo (ETA), um de menor afinidade (ETB) e um terceiro específico para ET-3 (McMILLEN e SUMPIO, 1995). A síntese da endotelina ocorre a partir do peptídeo conhecido como big endotelina, que é clivado pela enzima conversora de endotelina (ECE). As células endoteliais parecem ser a maior fonte de produção de endotelina, sendo a isoforma predominante, ET-1. No entanto, a biossíntese desse peptídeo também pode estar localizada em outros tipos celulares, incluindo células da musculatura lisa vascular, células não endoteliais dos tratos respiratório, gastrointestinal, renal e genito-urinário e em algumas células nervosas (MASAKI et al., 1995). A ET-1 também está presente no plasma humano e animal e elevadas concentrações plasmáticas têm sido detectadas em estados fisiopatológicos como insuficiência cardíaca congestiva e disfunção renal (HAUG et al., 1996). Por sua potente e prolongada ação, esse peptídeo causa uma elevação na pressão arterial, podendo também ser uma das causas da hipertensão (GOTO et al., 1996). ET-1 age diretamente na contratilidade de miócitos cardíacos, na regulação vasomotora das artérias coronárias, na produção do peptídeo natriurético atrial e indiretamente intensificando a resposta contrátil induzida por outros agentes vasoconstritores, como catecolaminas e angiotensina II e no aumento da resistência vascular periférica (McMILLEN e SUMPIO, 1995). Além de regular o tônus vascular, ET-1 apresenta-se como mitógeno para a proliferação celular, sendo por isso associada à aterosclerose. No entanto, o antagonismo de ET-1 não exerce o efeito anti-aterosclerótico desejado (HAHN et al., 1993). Na circulação em geral, a contração é mediada pelos receptores ETA localizados nas células da musculatura lisa, ao passo que o relaxamento é resultante da ativação de receptores ETB (VATTER et al., 1998; de ANDRADE et al., 2009). Na circulação cerebral, os efeitos vasomotores das endotelinas são mediados pela ativação de subtipos de receptores ETA e ETB. Em artéria basilar isolada de rato, a coativação dos receptores ETA e ETB resulta em efeitos opostos, mas o efeito vasoconstritor se sobressai em condições fisiológicas normais. Receptores específicos de membrana que produzem a ação vasoconstrictora de ET-1 têm sido localizados nos elementos vasculares cerebrais, sendo de grande importância identificar totalmente a função desse peptídeo no sistema microvascular cerebral (YAKUBU et al., 1996). A distribuição de receptores ET-1 depende da espécie do animal, do leito vascular e do tipo de vaso. Na maioria dos vasos (principalmente os cerebrais), a vasoconstrição normalmente é atribuída à ativação de receptores ETA (baseado na relativa potência do peptídeo e no seu antagonismo seletivo - BQ123 atenuando a resposta) (TOUZANI et al., 1997). ET-1 tem sido implicada nas patogêneses de várias doenças vasculares devido a seu grande poder vasoconstritor e sua propriedade de promover o crescimento endotelial (RUSCHITZKA et al., 1997), uma vez que, em altas concentrações, ET-1 Revista Formar Interdiciplinar, Sobral - v.1, n.1, p.37-44, Jul - Dez. 2012 - p.40 Doenças cardiovasculares e farmacologia induz contrações na maioria dos leitos vasculares pela ativação de receptores ETA, e os estímulos vasoconstritores dependentes do endotélio incluem hipóxia, estímulos físicos, como pressão e estiramento, e mediadores neurohormonais (VANHOUTTE, 1997). Em pacientes com aterosclerose, ET-1 pode ser detectada no endotélio e na camada íntima utilizando-se imunohistoquímica. No plasma, os níveis de ET aparecem elevados na mesma proporção da extensão anatômica da doença (LERMAN et al., 1991). O aumento na produção de endotelina na aterosclerose foi sugerido por estudos demonstrando a imunorreatividade do peptídeo em placas ateroscleróticas coronárias por investigações imunohistoquímicas e concentrações plasmáticas elevadas de endotelina foram encontradas em indivíduos com aterosclerose (ZEIHER et al., 1995). A produção de ET-1 pelas células endoteliais é regulada por vários fatores. Forças hemodinâmicas como o estresse por estiramento causado pelo fluxo sanguíneo, estiramento do leito vascular ou pressão sanguínea podem estar envolvidos na expressão de RNA mensageiro para ET-1 (HAYNES et al., 1996). Fatores químicos como angiotensina II e citocinas, que são produzidos localmente, também modulam a expressão e liberação de ET-1 pelo endotélio (MASAKI, 1995), de Oliveira et al. (1995) e Viswanathan et al. (1997) observaram aumento na expressão de receptores para endotelina-1 (ETA) após a injúria vascular da carótida por catéter balão em ratos, e esse aumento é revertido aos níveis normais após 16 dias da angioplastia. O efeito mitógeno de ET-1 é mediado pela ativação de receptores ETA com subsequente estimulação da expressão de fatores de crescimento e oncogenes (VISWANATHAN et al., 1997). Em humanos, a formação de placas ateroscleróticas induz uma redistribuição compensatória da massa da parede do vaso para manter o tamanho do lúmem. Esse processo de remodelamento permite que o fluxo sanguíneo continue normal até que se exceda o limite de adaptação (GLACOV et al., 1987). Foi mostrado ainda, que o aumento no fluxo sanguíneo e o estresse por estiramento interferem no diâmetro do lúmem vascular, uma vez que as propriedades do endotélio a nível celular e ultraestrutural são sensíveis ao estresse por estiramento (KAMIYA e TOGAWA, 1980). Atualmente há consideráveis evidências de que o tamanho do vaso sanguíneo e o tônus vascular sejam dependentes da intensidade local do estresse de estiramento na parede do vaso, e que as células endoteliais medeiam a resposta dos vasos a mudanças no fluxo (KOLLER e KALEY, 1991). Tem sido proposto que ET-1 exerce seus efeitos predominantemente nas manutenções parácrina e autócrina, mostrando o peptídeo como mitógeno de alguns tipos celulares, incluindo musculatura lisa vascular (BATTISTINI et al., 1993), sendo a proliferação dessas células o evento principal para o desenvolvimento das lesões ateroscleróticas (FUSTER et al., 1992). A agregação plaquetária na parede dos vasos ateroscleróticos em artérias carótidas ou vertebrais, induz oclusões que podem ser responsáveis por deficiências na irrigação cerebral (MILLIKAN, 1979). Patologias vasculares oclusivas são a maior causa de morte entre indivíduos com idade em torno de 50 anos em países desenvolvidos (VAARTJES et al., 2010), sendo que a causa mais comum de acidentes vasculares cerebrais é a formação de trombos que causam oclusão da artéria carótida interna (MEAD et al., 1998). O desenvolvimento da aterosclerose em artéria carótida interna pode levar a isquemia cerebral, aumentando o risco de doenças vasculares cerebrais (NICHOLLS et al., 1986), uma vez que a estenose causada pela aterosclerose em carótida interna pode reduzir a irrigação cerebral resultando em redução de suprimento sanguíneo e consequente redução de oxigênio para o cérebro (FÜRST et al., 1992). Barnett et al. (1978) mostraram que patologias oclusivas na artéria carótida comum ou carótida externa proximal em relação à oclusão podem dar origem a embolias, favorecendo a compensação do fluxo através da circulação colateral. Nesses processos de estenose, a gravidade do comprometimento neurológico associado à oclusão da artéria carótida interna é muito variável e pode ser compensada pelo suprimento sanguíneo colateral (FIELDS e LEMAK, 1976). A oclusão carotídea induz diferentes efeitos hemodinâmicos dependendo do lado da artéria ocluída, tais como um aumento do fluxo sanguíneo na artéria contralateral à oclusão e uma outra via colateral não carotídea, possivelmente a via vertebral (NORRIS et al., 1990). As alterações no fluxo arterial cerebral e na artéria carótida interna são proporcionais à porcentagem de oclusão que ocorre na artéria carótida contralateral (MEGURO et al.,1998). Em pacientes com oclusão ou estenose grave da artéria carótida interna, a redução da reatividade vascular se relaciona estreitamente à capacidade de autorregulação das artérias cerebrais (RINGELSTEIN et al., 1994). Revista Formar Interdiciplinar, Sobral - v.1, n.1, p.37-44, Jul - Dez. 2012 - p.41 DE ANDRADE C. R. A incidência de acidentes vasculares cerebrais ipsilaterais em casos de estenose severa é maior quando comparada com pacientes que apresentam estenose leve, que provoca apenas alterações na reatividade das porções distais à estenose em carótidas internas (YONAS et al., 1993). As alterações no fluxo sanguíneo podem promover alongamento das células endoteliais e consequentemente, secreção de ET-1 dessas células (BEVAN e HENRION, 1994). Além disso, a liberação de ET-1 pode estar relacionada a alterações na reatividade vascular, através de dessensibilização de receptores no vaso. Nesse contexto, o aumento ou redução no fluxo arterial cerebral e na artéria carótida interna são proporcionais à porcentagem de estenose que ocorre na artéria carótida contralateral (MEGURO et al., 1998). Nesse processo de estenose, os efeitos máximos de contração induzidos por ET-1, serotonina, fenilefrina, cloreto de potássio e noradrenalina se apresentam bastante comprometidos (ANTONACCIO et al., 1994). Casos de estenose na artéria carótida comum, em humanos, aumentam o fluxo sangüíneo na artéria basilar, mas causam uma redução na reatividade das artérias carótidas e basilar a agonistas simpatomiméticos (KEUNEN et al., 1998). Li et al. (1989) mostraram em cães, que a estenose pode sensibilizar a artéria carótida ao efeito vasoconstritor da noradrenalina (NA), com conseqüente redução no fluxo sanguíneo. No leito arterial, as lesões causadas no processo aterosclerótico tendem a se estabilizar; com exceção das artérias cerebrais, onde há uma progressão contínua das lesões, que se apresentam de acordo com o avanço da idade (WEBER et al., 1988). Déficits neurológicos que ocorrem simultaneamente ou subsequentemente à oclusão da artéria carótida interna podem depender da adequação da circulação cerebral colateral. Aparentemente, a compensação do fluxo pelas artérias carótida comum direita e basilar juntas é suficiente para manter o fluxo cerebral em níveis normais, mesmo em uma situação de estenose severa na artéria carótida esquerda (SCHNEIDER et al., 1988). CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando-se o conjunto de observações nos estudos citados, embora os processos de estenose da artéria carótida apresentem um mecanismo de compensação para manter o fluxo sanguíneo cerebral, ainda não está claro se esse mecanismo de adaptação desencadeia alterações na reatividade das artérias estudadas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGUS, J.A. Role of the endothelium in the genesis of cardiovascular disease. Clin Exp Pharmacol Physiol. 1996. Aug; 23(8):S16-22. ANTONACCIO, M.J.; NORMANDIN, D.; FERRER, P. Reduced contractile function after balloon denudation of rat carotid arteries. Eur J Pharmacol. 1994. Apr; 11; 256(1): 17-21. ARNESEN, E. et al. Serum total homocysteine and coronary heart disease. 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