Tratado
de Amesterdão:
o que mudou
na Europa
Índice
A União Europeia e os cidadãos
Os direitos dos cidadãos
Respostas às preocupações dos cidadãos
O emprego e a política social
A segurança, a liberdade e a justiça
O meio ambiente, a saúde e os direitos dos consumidores
Os valores e as aspirações dos cidadãos
Os poderes políticos dos cidadãos
A identidade externa da União
A Política Externa e de Segurança Comum
Os processos de decisão
As estruturas
A defesa
A política comercial comum
As instituições
9
9
10
10
12
13
15
16
17
17
18
18
19
20
O Parlamento Europeu
Os parlamentos nacionais
O Conselho
A Comissão Europeia
O Tribunal de Justiça
O Tribunal de Contas
O Comité Económico e Social
O Comité das Regiões
Os processos de decisão
A «comitologia»
A cooperação reforçada
21
21
22
22
24
24
25
25
25
26
27
27
E a seguir?
28
UE
Assinatura do Tratado
de Amesterdão, em 2 de
Outubro de 1997
O dia 1 de Maio de 1999 ficou assinalado pela entrada em vigor do Tratado de Amesterdão, que altera o
Tratado da União Europeia. Em certa
medida, a União Europeia transformou-se. São-lhe confiadas novas
missões, acentua-se o papel dos
cidadãos, reforça-se o carácter democrático das instituições. Enquanto
que, historicamente, a construção
europeia se desenvolveu em torno de
objectivos económicos, dá-se agora
ênfase às responsabilidades políticas
da União, tanto internamente como
em relação ao resto do mundo.
A génese do novo Tratado remonta a
Junho de 1994, com a convocação de
um grupo de reflexão. Depois de uma
conferência intergovernamental que
se prolongou por mais de um ano, o
Tratado de Amesterdão foi finalizado
na noite de 17 para 18 de Junho de
1997 e assinado no dia 2 de Outubro
seguinte.
Porquê um novo Tratado, sucedendo
tão de perto a duas outras grandes
alterações das competências e das
instituições da União, em 1986 (Acto
Único Europeu) e em 1992 (Tratado
de Maastricht)? Porque, a seguir a
estes dois tratados, era ainda
necessário dar resposta a várias
questões que permaneciam em
aberto. Estas questões referiam-se ao
papel e aos direitos dos cidadãos
europeus, à eficácia e ao carácter
democrático das instituições europeias e às responsabilidades internacionais da União.
O Tratado de Maastricht instituíra,
nomeadamente, uma cidadania europeia, ou seja, um quadro de direitos e
deveres suplementares dos cidadãos
dos Estados-Membros. No entanto,
não lhe dera um verdadeiro
conteúdo. Por ocasião da ratificação
do Tratado, particularmente nos
países onde esse acto foi objecto de
referendo, os cidadãos mostraram-no
sem ambiguidades: no futuro, não
seria possível qualquer progresso da
construção europeia sem que fossem
mais tidas em conta as questões dos
cidadãos, as suas esperanças, as suas
críticas e as suas inquietações.
5
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
Por outro lado, o Tratado de Maastricht, ao aprofundar a obra empreendida com o Acto Único, melhorou o
funcionamento das instituições
comunitárias e reforçou os poderes
de co-decisão legislativa e de
controlo do Parlamento Europeu.
Mas o trabalho não estava concluído.
Ele tornou-se tão mais complexo que
as instituições deviam agora corresponder a uma dupla exigência: por
um lado, a decorrente da gestão de
uma moeda única, o euro, e da
cooperação em matéria de política
económica; por outro, a da perspectiva de um alargamento da União ao
conjunto ou, pelo menos, a uma
grande parte do continente europeu.
Maastricht
em traços gerais
O Tratado de Maastricht alterou os
tratados originais dos anos 50 que
instituíram as Comunidades Europeias. Além disso, reuniu o conjunto das disposições desses tratados, bem como novos elementos
relativos à Política Externa e de
Segurança Comum e à cooperação
em matéria de Justiça e Assuntos
Internos num só tratado, o Tratado
da União Europeia. Este Tratado
está estruturado com base em três
«pilares», dotados de regras e de
procedimentos diferentes, e de
uma «arquitrave» comum. Esta
estrutura foi mantida no Tratado
de Amesterdão.
Tratado
da União Europeia
Disposições comuns e disposições finais
Comunidades Europeias
Política
Externa
e de Segurança
Comum
(Comunidade Europeia,
Comunidade Europeia
do Carvão e do Aço,
Comunidade Europeia
da Energia Atómica)
Os três «pilares» da União Europeia
6
Justiça
e Assuntos
Internos
Por último, a divisão do mundo em
dois blocos passara a ser uma recordação do passado. Era necessário,
portanto, reorganizar a presença da
Europa num tabuleiro internacional
em evolução muito rápida. O Tratado
de Maastricht começara a definir
estruturas e procedimentos nesta
matéria. Deixava, contudo, a porta
aberta a novas reformas, tanto no
domínio da política externa como no
da defesa.
Os vários grupos de pressão, os sindicatos e as organizações não governamentais acompanharam o desenvolvimento dos trabalhos com propostas, ideias e mesmo manifestações públicas.
O Tratado de Amesterdão apresenta-se como uma revisão dos Tratados
fundadores da União Europeia, tal
como eles próprios haviam sido alterados pelo Tratado de Maastricht.
Após uma fase de preparação, foi
então necessário respeitar o procedimento previsto para uma tal revisão.
Como mostra o calendário dos trabalhos, as negociações foram longas e
complexas. À volta da mesa sentavam-se os 15 Estados-Membros, a
Comissão Europeia e, frequentemente, os observadores do Parlamento Europeu. A negociação foi
estruturada em três níveis:
• os representantes pessoais dos
ministros dos Negócios Estrangeiros,
que são altos-funcionários ou personalidades políticas (ministros,
secretários de Estado…), reuniam-se,
geralmente, uma vez por semana, ao
longo da Conferência;
• os ministros dos Negócios Estrangeiros encontravam-se, em princípio,
uma vez por mês;
• os chefes de Estado e de Governo
debateram, em várias ocasiões,
aspectos essenciais.
Além disso, a negociação decorreu de
forma muito mais pública do que a
preparação do Tratado de Maastricht.
7
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
Amesterdão:
calendário dos trabalhos
• Junho de 1994:
convocação, pelo Conselho Europeu reunido em Corfu,
de um Comité de Reflexão composto por 15 representantes dos ministros dos Negócios Estrangeiros dos Estados-Membros, um representante da Comissão Europeia e
dois observadores do Parlamento Europeu.
Para tornar mais evidente a arquitectura do Tratado de Amesterdão, tal
como resulta do texto e do método de
negociação, o seu conteúdo será
apresentado seguindo três eixos principais:
• a União Europeia e os cidadãos;
• a identidade externa da União;
• as instituições.
• 2 de Junho de 1995:
primeira reunião do Comité.
• Dezembro de 1995:
apresentação do relatório ao Conselho Europeu de
Madrid.
• 8 de Janeiro de 1996:
decisão de convocar uma Conferência Intergovernamental.
• Fevereiro-Março de 1998:
pareceres da Comissão e do Parlamento Europeu.
• 29 de Março de 1999:
primeira reunião da Conferência a nível de chefes de
Estado e de Governo, em Turim.
• 17 e 18 de Junho de 1997:
encerramento da Conferência pelos chefes de Estado e
de Governo, em Amesterdão.
• 2 de Outubro de 1997:
assinatura do Tratado de Amesterdão.
• 19 de Novembro de 1997:
resolução do Parlamento Europeu sobre o Tratado.
• 1998-1999:
ratificação pelos 15 Estados-Membros.
• 1 de Maio de 1999:
entrada em vigor do Tratado.
8
A União Europeia e os cidadãos
Os direitos dos cidadãos
O Tratado de Amesterdão insiste em
três aspectos essenciais:
Os primeiros tratados europeus instituíram um conjunto de direitos
específicos dos cidadãos, essencialmente assente na liberdade de circulação das pessoas entre os países
membros. O Tratado de Maastricht
acrescentou-lhe os direitos eleitorais
para as eleições europeias e municipais. O Tratado de Amesterdão, por
seu lado, concentrou-se nos direitos
fundamentais, ou seja, nos direitos
que estão na base dos regimes
constitucionais nacionais e que
dizem respeito a todos os cidadãos.
Destas disposições decorre um sistema de direitos bastante completo.
• a União obriga-se a respeitar os
direitos fundamentais, tal como os
garante a Convenção Europeia para a
Protecção dos Direitos do Homem e
das Liberdades Fundamentais, firmada pelo Conselho da Europa em
1950. Os Estados-Membros que, de
forma grave e sistemática, desrespeitarem esses direitos podem sofrer
sanções, indo até à suspensão do seu
direito de voto no Conselho. Para os
países candidatos, o respeito pelos
direitos fundamentais é uma condição para a sua adesão à União;
• é reconhecido à União o direito de
tomar medidas para combater qualquer discriminação em razão do sexo,
raça ou origem étnica, religião ou
crença, deficiência, idade ou orientação sexual;
PHOTO STOCK BVBA
Combater a
discriminação em
razão do sexo, raça
ou origem étnica,
religião ou crença,
deficiência, idade
ou orientação
sexual
9
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
• a União obriga-se a promover em
todas as suas políticas a igualdade
de oportunidades entre homens e
mulheres, para além das regras já inscritas nos tratados europeus sobre o
respeito e a promoção da igualdade
em matéria social e laboral. Neste
último domínio, o Tratado abre a
porta a «discriminações positivas»,
nos casos em que um dos dois sexos
esteja manifestamente desfavorecido.
Este dispositivo é completado pelo
reconhecimento do direito à protecção dos dados de carácter pessoal em
poder das instituições, um direito
cuja importância aumenta com os
progressos da informática.
Esta estrutura é muito rica, pois permite e convida mesmo a desenvolvimentos na definição e na protecção
dos direitos. Constitui uma primeira
resposta à solicitação de vários Estados-Membros e de muitos cidadãos
que desejam dotar a União de um sistema de direitos fundamentais, a
acrescentar à jurisprudência já feita
pelo Tribunal de Justiça. Permanecem
em aberto duas questões: será
necessária a adesão oficial da União
à Convenção Europeia dos Direitos
do Homem? Será necessário que a
União estabeleça a sua própria lista
de direitos fundamentais?
Respostas
às preocupações
dos cidadãos
O Tratado de Amesterdão não se limitou a tratar os direitos dos cidadãos
de forma abstracta. Contém também
respostas às inquietações que sentem
quando alguns dos seus direitos são
postos em causa por situações que
devem ser corrigidas. São vários os
10
domínios em relação aos quais a
União deve agir segundo novas
regras, e que podem ser agrupados
em quatro sectores:
• o emprego e a política social;
• a segurança, a liberdade e a justiça;
• o meio ambiente, a saúde e os
direitos do consumidor;
• a expressão de determinados
valores e aspirações dos cidadãos.
O emprego e a política social
O emprego é um dos primeiros motivos de inquietação na nossa sociedade. Muitas pessoas, muitos jovens
e mulheres, não têm emprego ou correm o risco de o não ter. O problema
afecta todos os Estados da União; é,
portanto, necessário que a União aja.
O problema foi considerado tão premente que, em paralelo com a adopção do Pacto de Estabilidade das
Finanças Públicas e de Crescimento,
destinado a acompanhar o nascimento do euro, os Estados-Membros
decidiram antecipar a aplicação
desta parte do Tratado, mesmo sem
esperar pela sua ratificação. Concretamente, foram introduzidas três
novidades:
• a definição, pela União, de uma
estratégia europeia e, pelos Estados-Membros, de programas nacionais
de emprego, avaliados anualmente
pelo Conselho, à luz da estratégia
estabelecida em comum;
• o direito da União de tomar determinadas medidas que encorajem a
cooperação entre os Estados-Membros e que completem a sua acção;
• a criação de um Comité do
Emprego, para promover a coordena-
Deste modo, conciliaram-se dois
princípios: um compromisso específico da União em matéria de emprego
— inovação que fora objecto de
contestação durante toda a Conferência Intergovernamental — e o
respeito pelas responsabilidades
nacionais neste domínio.
De um modo mais geral, a União
Europeia poderá empenhar-se nas
matérias sociais mais do que lho permitia o Tratado de Maastricht. O novo
Tratado elimina, desde logo, a anomalia de uma política social de que
se excluíra um Estado-Membro, o
Reino Unido, e que agora inclui todos
os membros da União. Além disso, é
estabelecido que a União pode
apoiar e complementar os esforços
nacionais no vasto domínio dos direitos sociais fundamentais definidos
pelo Parlamento Europeu em 1989.
Por último, o Tratado confia à União
responsabilidades no combate à
pobreza e à exclusão social. Aperfeiçoa também disposições anteriores
relativas, em especial, à igualdade de
oportunidades entre homens e mulheres.
Para melhorar a
situação do emprego,
uma estratégia europeia
complementada por
programas nacionais
ISOPRESS, M. RENDERS
ção das políticas em matéria de
emprego e de mercado de trabalho
entre os Estados-Membros.
11
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
A segurança, a liberdade e a justiça
A liberdade de circulação, um dos
principais objectivos da Comunidade
Europeia desde os anos 50, está em
grande parte concretizada. Os acordos de Schengen, que reúnem todos
os Estados-Membros, com excepção
da Irlanda e do Reino Unido, permitiram suprimir a maioria dos controlos
nas fronteiras internas. Tornaram
também mais visível uma liberdade
de que os cidadãos já dispunham,
mas que continua a deparar-se com
alguns entraves. Ao mesmo tempo, a
opinião pública preocupa-se cada vez
mais com a segurança interna,
devido, nomeadamente, à difusão da
grande criminalidade internacional e
de todo o género de tráficos ilegais.
Fazendo um número crescente de vítimas, eles tornam mais imperativa
uma cooperação eficaz entre os Estados europeus.
Ainda não foi dada resposta a todos
estes problemas, que têm na origem,
nomeadamente:
Conjunto para melhor
combater a criminalidade internacional e os
tráficos ilegais
EKA
• divergências entre as legislações
nacionais em matéria de direito civil
e de processo civil, que criam obstáculos à liberdade de circulação;
12
• legislações diferentes em matéria
de imigração e de direito de asilo;
• insuficiente eficácia no domínio da
cooperação judiciária penal, bem
como no da cooperação policial face
à criminalidade internacional e aos
tráficos ilegais.
A União já se ocupava destas
questões, mas com um sucesso relativo, desde o Tratado de Maastricht,
no quadro da cooperação intergovernamental em matéria de Justiça e
Assuntos Internos. O controlo democrático era limitado, as capacidades
de acção fortemente reduzidas
devido à necessidade de decisões
unânimes e o controlo jurisdicional
inexistente a nível europeu. Mesmo
assim, foram obtidos alguns resultados, como por exemplo a criação da
Europol, que constitui um embrião de
cooperação policial. Mas era preciso
dar um novo impulso à acção comum
nestas matérias. Foi por essa razão
que o Tratado de Amesterdão introduziu três novidades que abrem
caminho à realização de um programa ambicioso:
• segurança e justiça. O Tratado
define um programa de cinco anos
que deve permitir às instituições
europeias tomar as medidas necessárias. Trata-se de assegurar a liberdade
de circulação e de estabelecer normas comuns para a imigração e o
direito de asilo, assentes no respeito
pelos direitos fundamentais, e que
assegurem, a prazo, a livre circulação
dos imigrantes na União. Trata-se
também de desenvolver a cooperação em matéria de direito civil e de
processo civil (veja-se os problemas
levantados pelos numerosos divórcios
«transnacionais»), bem como a
cooperação administrativa e aduaneira. Durante esta primeira fase de
cinco anos, é exigida a unanimidade
no Conselho mas, em seguida, deve
passar-se para um sistema assente na
maioria qualificada e na co-decisão
Parlamento-Conselho, sistema no
qual o Parlamento Europeu, a
Comissão e o Tribunal de Justiça
desempenharão plenamente os seus
papéis;
• em segundo lugar, os Estados-Membros poderão passar a adoptar
normas de carácter vinculativo no
domínio da cooperação intergovernamental em matéria penal e policial. O
princípio da unanimidade será temperado pela possibilidade de tomar,
pelo menos, decisões de execução por
maioria qualificada. Além disso, o
Tratado admite formas de «cooperação reforçada», isto é, o estabelecimento de regras que, pelo menos
numa primeira fase, só se aplicam
aos Estados-Membros que as tiverem
aprovado. É igualmente introduzida
uma competência facultativa do Tribunal de Justiça; a grande maioria
dos Estados-Membros já a aceitaram;
• por último, o Tratado permite a
integração dos acordos de Schengen
e do seu acervo no âmbito da União
e da sua ordem jurídica. À Dinamarca, Irlanda e Reino Unido foi
A deliberação por maioria
qualificada no Conselho
No Conselho, a maioria qualificada é de 62 votos em 87,
quando a decisão deva ser tomada sob proposta da Comissão
Europeia. Nos outros casos é de 62 votos que exprimam o
voto favorável de, pelo menos, 10 Estados-Membros. A Alemanha, a França, a Itália e o Reino Unido dispõem de 10
votos cada, a Espanha de oito votos, a Bélgica, a Grécia, os
Países Baixos e Portugal de cinco votos cada, a Áustria e a
Suécia de quatro, a Dinamarca, a Irlanda e a Finlândia de três
e o Luxemburgo de dois.
dada a faculdade de só ulteriormente
aplicarem estas disposições.
O meio ambiente, a saúde
e os direitos dos consumidores
Estes são três domínios que têm
impacto directo, quotidiano, na vida
dos cidadãos e que, por diferentes
razões, estão no centro das atenções:
uma vida sã num ambiente são
constitui, certamente, uma das aspirações humanas mais comuns. Por
isso, não é surpreendente que os
cidadãos reajam fortemente às
ameaças que pesam sobre a sua
saúde, o meio ambiente ou a qualidade dos produtos que consomem. A
liberdade de circulação dos produtos
no interior do grande mercado europeu, a abertura deste ao mercado
mundial e o rápido desenvolvimento
das tecnologias aumentam a necessidade de uma acção comunitária nestas matérias. É por esta razão que o
Tratado de Amesterdão reforça os
meios da União, através da nítida
melhoria de uma série de regras.
13
SIPA PRESS, E. HADI
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
Viver num meio
ambiente são: uma
exigência dos europeus
— No domínio do meio ambiente, a
medida essencial consiste em introduzir a obrigação de a União ter em
consideração as exigências da protecção do meio ambiente na definição e
na aplicação de todas as suas políticas. Além disso, o Tratado faz do
desenvolvimento sustentável, que
constitui a nova perspectiva das políticas do ambiente, um dos objectivos
essenciais da União. Foi na esteira do
impulso assim dado por um tratado
assinado, mas ainda não ratificado,
que a partir de 1998 a União pôde
tomar na cimeira mundial de Quioto,
posições muito firmes para o saneamento do meio ambiente planetário.
— No que se refere aos consumidores,
o Tratado inclui entre as competências da União a promoção do direito
à informação e à educação dos consumidores e, sobretudo, à organização para defesa dos seus interesses.
Trata-se do reconhecimento do papel
essencial das organizações de consumidores.
— Por último, em matéria de saúde, o
Tratado reforça nitidamente as res14
ponsabilidades da União, na sequência dos dramas suscitados pela crise
das «vacas loucas» e pelo caso do
sangue contaminado pelo vírus da
sida. Os princípios estão bem definidos, e a União passa a ter a responsabilidade de legislar em certos
casos, para assegurar um nível elevado de protecção da saúde. O Parlamento Europeu e o Conselho, por
proposta da Comissão, poderão
assim aprovar regras relativas:
• a órgãos e substâncias de origem
humana, incluindo o sangue e seus
derivados;
• a problemas veterinários e fitossanitários relacionados com a saúde
pública.
Nos outros casos, a União poderá
apoiar a acção dos seus Estados-Membros, sem poder harmonizar as
disposições legislativas que mantenham diferenças significativas entre
um e outro Estado, especialmente em
matéria de assistência sanitária.
Os valores e as aspirações
dos cidadãos
A par com os problemas já mencionados, os cidadãos têm outras preocupações, directamente relacionadas
com as suas maneiras de pensar, os
seus valores, as suas ideias, as representações que têm do mundo e do
que ele devia ser.
• o papel das instituições públicas
de crédito e de certas formas de
poupança (por exemplo, na Alemanha, na Áustria e no Luxemburgo);
• a protecção dos animais.
É certo que o Tratado não pode dar
respostas normativas a estas questões. No entanto, os negociadores
interessaram-se por elas, optando por
fazer referência a esses valores e aspirações, tal como a determinados
aspectos práticos, nos protocolos ou
declarações anexos ao Tratado. Estes
textos nem sempre constituem disposições vinculativas, mas traduzem
compromissos políticos. Vale a pena
mencionar alguns. Referem-se a
matérias tão variadas como:
No cerne do Tratado de
Amesterdão: os direitos,
as aspirações e os poderes
dos cidadãos
• a abolição da pena de morte;
• o reconhecimento do papel do
voluntariado;
• as necessidades das pessoas portadoras de deficiência;
• o papel das igrejas e das organizações não confessionais;
• a situação específica das regiões
insulares;
• a função social do desporto;
• a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão nos outros
meios de comunicação social;
EKA, MERNE
• a missão do serviço público de
radiodifusão e de televisão;
15
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
Os poderes políticos
dos cidadãos
O cidadão é o actor político principal
de qualquer sociedade democrática.
Formada por Estados que, pelas suas
constituições e, agora, também por
força do próprio Tratado, só podem
ser democráticos, a União Europeia
deve, à medida que vão aumentando
as suas responsabilidades, basear
cada vez mais nitidamente a sua
organização nos princípios da democracia.
Essa é a razão pela qual os poderes
do Parlamento Europeu foram progressiva e sensivelmente reforçados
desde o Acto Único Europeu de 1986,
ao mesmo tempo que é cada vez mais
invocado o papel europeu dos parlamentos nacionais. Paralelamente,
têm sido feitos esforços no sentido de
aumentar os direitos eleitorais dos
cidadãos, em especial nos Estados
onde não são nacionais. Foram também desenvolvidos os meios a que
podem recorrer, instituindo um Provedor de Justiça europeu, a par com os
juízes nacionais e europeus.
O Tratado de Amesterdão prosseguiu
nessa direcção, nomeadamente reforçando, como veremos adiante, as
capacidades de acção dos parlamentos. Além disso, o Tratado:
• confirma e define de forma mais
precisa o princípio da subsidiariedade, segundo o qual as decisões
devem ser tomadas a um nível tão
próximo quanto possível dos cidadãos;
• reconhece o direito de acesso dos
cidadãos e dos residentes aos documentos emanados das instituições
europeias, segundo regras definidas
pelo Parlamento e pelo Conselho, sob
proposta da Comissão. Este direito
16
constitui um elemento chave da
transparência que é legítimo esperar
das instituições. A jurisprudência do
Tribunal de Justiça já reconhecera a
sua necessidade, pelo que é lógica a
sua consagração no Tratado;
• dá garantias quanto ao reforço do
combate às fraudes que afectem os
interesses financeiros da União, o que
deve conduzir a uma melhor utilização do dinheiro dos contribuintes,
graças, nomeadamente, à acção da
nova Organização Europeia de Luta
Antifraude (OLAF).
A identidade externa da União
Desde o início da construção europeia que os seus promotores ambicionam dotá-la de uma política externa.
A Política Externa
e de Segurança Comum
É certo que os tratados originais
dotavam a Comunidade de importantes competências nos domínios do
comércio eterno e da ajuda ao desenvolvimento, às quais se veio juntar a
componente externa das políticas
internas. No entanto, não diziam
uma palavra sobre a diplomacia ou a
defesa.
Face à perspectiva de um novo alargamento da União, que põe ainda
mais em evidência a necessidade de
uma Política Externa e de Segurança
Comum, os negociadores do Tratado
de Amesterdão quiseram desenvolver
o acervo de Maastricht, reforçando
Em 1954 e 1961, houve tentativas
falhadas de colmatar essas lacunas.
Em 1970, na sequência do primeiro
«Relatório Davignon», os Estados-Membros estabeleceram uma plataforma de cooperação política que, no
entanto, só seria inscrita nos tratados
em 1986, com a aprovação do Acto
Único. Em seguida, num contexto
internacional marcado pelo fim da
divisão do mundo em dois blocos, o
Tratado de Maastricht codificou um
conjunto de regras relativas a uma
Política Externa e de Segurança
Comum (PESC), incluindo, a prazo, a
política de defesa.
SIPA PRESS, A. BOULAT
«A tragédia do Kosovo
demonstra de forma dramática que a
União Europeia é chamada a
assumir um papel cada vez mais
importante para garantir a
segurança e a democracia em
áreas que são decisivas para
o nosso futuro»
(Romano Prodi,
presidente da Comissão Europeia,
perante o Parlamento Europeu,
em 13 de Abril de 1999)
17
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
também a sua coerência com a acção
externa tradicional da Comunidade.
decide por consenso as estratégias e
as orientações comuns;
O Tratado de Amesterdão estabelece,
em primeiro lugar, os princípios que
devem orientar a política externa e de
segurança da União:
• o Conselho, constituído pelos
ministros dos Negócios Estrangeiros,
decide as acções e as tomadas de
posição comuns. Pronuncia-se por
maioria qualificada quando se trate
de operacionalizar uma estratégia
comum aprovada pelo Conselho
Europeu, admitindo-se que um
Estado-Membro que esteja em desacordo pode pedir que a decisão seja
reenviada ao nível dos chefes de
Estado e de Governo. Nos outros
casos, o Conselho toma normalmente
as suas decisões por unanimidade,
mas pode não ter em conta as abstenções «construtivas», desde que
estas não ultrapassem um terço dos
votos.
• por um lado, a salvaguarda dos
valores comuns, dos interesses fundamentais, da independência e da integridade da União, bem como da sua
segurança;
• por outro lado, a manutenção da
paz, o reforço da segurança e da
cooperação internacionais, da democracia, do Estado de direito e dos
direitos fundamentais.
A promoção destes princípios deve
ser feita de acordo com a Carta das
Nações Unidas e os acordos europeus
relativos à paz e à segurança. Ela
implica compromissos da parte dos
Estados-Membros e, acima de tudo,
obrigações de lealdade e de solidariedade mútuas.
Para aplicar estes princípios, o Tratado de Amesterdão reforça os processos de decisão e as estruturas
competentes, antes de se interessar
pelos problemas da defesa.
Nestes processos decisórios participam igualmente a Comissão Europeia, que deve velar especialmente
pela coerência entre a acção comunitária e a PESC, e o Parlamento Europeu, que é chamado a dar pareceres e
a aprovar as dotações orçamentais
necessárias.
As estruturas
Uma verdadeira política externa
comum exige processos de decisão
eficazes. O Tratado de Amesterdão
tomou em conta algumas das críticas
formuladas às disposições do Tratado
de Maastricht. O esquema essencial
do processo decisório assenta em
dois níveis:
A aplicação efectiva de uma política
comum implica estruturas políticas e
administrativas. O Tratado de Amesterdão dá um rosto à Política Externa
e de Segurança Comum, ao prever a
nomeação de um alto-representante
(«Sr. ou Sr.a PESC») que dirige a acção
da União neste domínio, de acordo
com as decisões do Conselho e no
quadro de uma tróica que inclui também os representantes da presidência
do Conselho e da Comissão.
• o Conselho Europeu, constituído
pelos chefes de Estado e de Governo
e pelo presidente da Comissão,
Esta personalidade, que tem o estatuto de secretário-geral do Conselho,
é assistida por uma Unidade de Pla-
Os processos de decisão
18
neamento de Política e de Alerta Precoce, encarregada, em especial, de
centralizar e analisar as informações
provenientes dos Estados-Membros,
da Comissão Europeia e da União da
Europa Ocidental (UEO).
A defesa
Como o demonstram as numerosas
crises internacionais recentes, uma
política externa exige uma capacidade militar. O mesmo se aplica a
algumas missões humanitárias e às
missões de manutenção ou de restabelecimento da paz, que se inserem
explicitamente no âmbito da política
externa e de segurança definida pelo
Tratado de Amesterdão
No entanto, esta é uma matéria bastante complexa para os Estados-Membros. Um dos factores dessa
complexidade é a diferente posição
desses Estados. Quatro deles são
constitucional ou tradicionalmente
neutros e, portanto, não participam
em alianças militares, enquanto que
os outros 11 são aderentes à Aliança
Atlântica. Além disso, muitos dos
Estados-Membros desenvolveram
entre si formas de cooperação militar
bilateral ou multilateral. Mas nem
por isso o Tratado de Amesterdão
deixa de prever, a prazo, uma verdadeira política de defesa comum.
A União da
Europa Ocidental
A UEO reúne 28 países, para os
quais constitui um verdadeiro quadro de diálogo e de cooperação em
matéria de segurança e de defesa.
Entre estes países, 10 têm a qualidade de Estados-Membros; eles
são igualmente signatários dos
Tratados da União Europeia e do
Atlântico Norte. Os restantes cinco
países da União Europeia têm
estatuto de observadores; são eles
a Dinamarca e os quatro Estados-Membros da UE que não pertencem à NATO: Áustria, Finlândia,
Irlanda e Suécia. Fazem ainda
parte da UEO, como membros
associados ou parceiros associados, os membros europeus da
NATO não membros da UE, bem
como os países da Europa Central
e Oriental que assinaram acordos
europeus com a UE.
Javier Solana, secretário-geral do Conselho e primeiro alto-representante
da UE para a Política
Externa e de Segurança
Comum
ISOPRESS, CLAJOT
Actualmente, a União Europeia já
pode dispor de capacidade militar
operacional, recorrendo aos meios da
UEO. Ainda que não haja uma coincidência perfeita entre as filiações nas
duas organizações, o Tratado de
Amesterdão estatui que a UEO faz
parte integrante do desenvolvimento
da União Europeia. Por outro lado, o
Tratado permite a plena integração
da UEO na União Europeia.
19
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
Em concreto, o Tratado prevê um processo que permite desde já a cooperação entre as duas organizações:
• o Conselho Europeu pode definir
orientações para uma acção comum
que implique o recurso à UEO;
• os Estados-Membros da União que
não sejam membros da UEO mas que
contribuam para uma acção comum
participarão plenamente e em pé de
igualdade no planeamento e na
tomada de decisões no âmbito da
UEO.
Vários protocolos bem como decisões
da UEO definem as modalidades
específicas desta cooperação.
A política comercial
comum
Desde a sua origem, a União Europeia dispõe de uma política comercial comum, decidida com base na
maioria qualificada do Conselho, sem
necessidade do acordo unânime dos
seus membros. Formuladas nos anos
20
50, as regras do Tratado foram ultrapassadas pelo desenvolvimento
económico e pela expansão do
comércio internacional em determinados sectores antes negligenciados.
Surgiram assim áreas de incerteza em
relação à propriedade intelectual, aos
serviços e aos investimentos. Tal não
impede a União de participar plenamente nos trabalhos da Organização
Mundial do Comércio, mas tem de
fazê-lo em conjunto com os seus Estados-Membros actuando em unanimidade, o que torna as negociações
mais complexas e, por vezes, menos
eficazes.
Este problema foi evocado em Amesterdão, mas a sua solução foi diferida
para mais tarde. Com efeito, o Tratado confere ao Conselho a faculdade de decidir por unanimidade a
extensão do âmbito de aplicação da
política comercial comum às questões relativas aos sectores dos serviços e aos direitos de propriedade
intelectual. Tal decisão permitiria à
União negociar também nestas matérias acordos internacionais com base
em procedimentos internos regidos
pela regra da maioria qualificada.
As instituições
Desde a primeira eleição do Parlamento Europeu por sufrágio universal directo, em 1979, a integração
europeia fez novos progressos, que
impunham o reforço do seu carácter
democrático. As responsabilidades
crescentes da Europa implicam que,
ao mesmo tempo, se melhore a eficácia dos seus processos de decisão.
• foram reforçadas a legitimidade e
a eficácia da Comissão;
O Tratado de Amesterdão inovou
nestes dois sentidos, ao integrar os
acervos do Acto Único e do Tratado
de Maastricht. Foi deste modo que:
•foram abertas possibilidades de
cooperação reforçada nos casos
em que a maioria dos Estados-Membros o desejem.
• foi reforçado o papel do Parlamento Europeu;
O Parlamento Europeu
• foram alargados os domínios em
que o Conselho delibera por maioria qualificada;
•foram melhorados alguns procedimentos;
As reformas relativas ao Parlamento
Europeu incidem em quatro aspectos:
• o seu poder de estabelecer o estatuto e as condições gerais de exercí-
O Parlamento
Europeu em sessão
UE
• foi melhorado o controlo pelos parlamentos nacionais;
• foram alargados os papéis do
Comité das Regiões e do Comité
Económico e Social;
21
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
cio das funções dos seus membros,
após parecer da Comissão e
mediante aprovação do Conselho,
deliberando por unanimidade. O Parlamento poderá assim reduzir as diferenças decorrentes do facto do
estatuto dos seus membros ser ainda
determinado, em grande parte, por
disposições nacionais;
• os seus poderes de participação na
nomeação da Comissão. Anteriormente, o Parlamento podia apenas
emitir um parecer sobre o candidato
designado pelos governos para a presidência do executivo europeu. O Tratado dispõe agora que a designação
do presidente da Comissão seja aprovada pelo Parlamento Europeu. Este
poder vem juntar-se a um direito
essencial que o Parlamento já tinha
consignado no Tratado de Maastricht: o de aprovar a nomeação do
conjunto da Comissão;
• os seus poderes legislativos. Como
veremos mais adiante, o processo de
co-decisão foi simplificado e alargado; o Conselho já não pode adoptar um acto em co-decisão sem o
acordo do Parlamento Europeu;
• os seus poderes de controlo orçamental, que foram alargados ao
domínio da PESC.
Globalmente, a autoridade do Parlamento Europeu fica, portanto, reforçada e, com ela, o carácter democrático da União.
Os parlamentos
nacionais
As decisões da União são tomadas
pelo Conselho ou pelo Parlamento
Europeu e pelo Conselho, em co-decisão. Desde os finais dos anos 80,
os parlamentos nacionais insistem
em poder pronunciar-se antes que os
22
governos o façam no âmbito do
Conselho. Pretendem também ter
uma visão geral do funcionamento
da União. Estes problemas tinham já
sido objecto de uma declaração, por
ocasião do Tratado de Maastricht.
Um protocolo anexo ao Tratado de
Amesterdão fixa regras de grande
importância nesta matéria:
• o Parlamento Europeu e os parlamentos nacionais são convidados a
desenvolver a sua cooperação;
• todos os documentos de consulta
da Comissão (livros verdes e livros
brancos, etc.) bem como as suas propostas legislativas devem ser enviados aos parlamentos nacionais dos
Estados-Membros. Estes dispõem de
um prazo de seis semanas para se
pronunciarem, antes da deliberação
do Conselho;
• em determinados domínios (liberdade, segurança e justiça) é reconhecido um interesse especial às
opiniões que possam ser emitidas
pelos parlamentos nacionais.
Estas disposições completam as
regras dos Tratados que já atribuíam
responsabilidades aos parlamentos
nacionais, como por exemplo, para
ratificar as revisões dos Tratados,
para definir os recursos da União ou,
ainda, para transpor as directivas
europeias para o direito nacional.
O Conselho
As regras de funcionamento do
Conselho foram apenas ligeiramente
alteradas pelo Tratado de Amesterdão. No entanto, em determinadas
matérias, estas alterações facilitam a
tomada de decisões, ao preverem que
já não sejam tomadas por unanimidade, mas por maioria qualificada
(ver destaque supra). O mesmo se
aplica a determinadas decisões relati-
UE
Uma reunião do
Conselho
vas à liberdade de estabelecimento e
à investigação e desenvolvimento.
Novas competências atribuídas em
diversos domínios pelo Tratado de
Amesterdão e novos processos instaurados em matéria de política
externa são também submetidos à
regra da maioria qualificada. Além
disso, são confiadas determinadas
responsabilidades decisórias ao
Comité dos Representantes Perma-
nentes dos Estados-Membros, responsável pela preparação das sessões
do Conselho.
Por outro lado, importa recordar que
o secretário-geral do Conselho passa
a ser o alto-representante da União
para a PESC e que é criada no âmbito
do Conselho, e para o assistir, uma
Unidade de Planeamento de Política
e de Alerta Precoce.
23
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
A Comissão Europeia
O papel da Comissão Europeia permanece inalterado. O seu direito de
iniciativa, em particular, não foi
modificado. No entanto, no novo
capítulo relativo à liberdade, segurança e justiça (ou seja, os domínios
comunitários do «terceiro pilar» definido em Maastricht), este poder só se
tornará exclusivo cinco anos depois
da entrada em vigor do Tratado.
Em contrapartida, o Tratado modifica
estruturalmente esse órgão colegial
que é a Comissão. A legitimidade
pessoal do seu presidente é acrescida
pelo facto da sua designação passar
a ser submetida a uma votação especial de aprovação pelo Parlamento
Europeu. Daí resulta um reforço
sensível do seu papel:
• determina as orientações políticas
da Comissão.
O Tribunal de Justiça
o Tratado de Amesterdão não altera
nem o papel nem a composição do
Tribunal de Justiça das Comunidades
ou do Tribunal de Primeira Instância
que o assiste. No entanto, passam a
ser mais numerosos os casos em que
o Tribunal é chamado a intervir:
• compete-lhe controlar o respeito
pelos direitos fundamentais por
parte das instituições europeias;
• o presidente da Comissão participa na escolha e designação dos
membros desta, de comum acordo
com os Estados-Membros;
• passa a ser competente para julgar
questões relativas ao capítulo sobre a
liberdade, a segurança e a justiça.
Neste domínio, no entanto, apenas
os órgãos jurisdicionais nacionais
cujas decisões não sejam susceptíveis
de recurso judicial previsto no direito
interno podem pedir ao Tribunal que
se pronuncie a título prejudicial;
• dispõe de amplos poderes para
atribuir ou alterar as tarefas no seio
do colégio;
• como vimos anteriormente, qualquer Estado-Membro pode decidir
reconhecer a competência do Tribu-
CE, M. REBESCHINI
Romano Prodi,
presidente da
Comissão Europeia
24
UE
Uma audiência no
Tribunal de Justiça
nal em questões relativas à cooperação judiciária penal e à cooperação
policial.
O Tribunal de Contas
Responsável por verificar se as despesas da União são efectuadas em
conformidade com a sua regulamentação orçamental e com os seus
objectivos, o Tribunal de Contas
beneficia de um alargamento das
suas possibilidades de acção:
• tal como as outras instituições,
passa a poder apresentar recurso perante o Tribunal de Justiça para a salvaguarda das suas prerrogativas;
• as suas actividades de controlo
passam a ser alargadas a todos os
beneficiários de dotações comunitárias.
O Comité Económico
e Social
Este Comité vê a sua função consultiva um pouco alterada e reforçada
no âmbito do sistema institucional
da União, dado que passa a poder ser
consultado directamente pelo Parlamento, e já não apenas pela
Comissão e pelo Conselho.
O Comité das Regiões
Novas disposições reforçam o papel
do Comité das Regiões, que representa o ponto de vista das autoridades regionais e locais, cada vez
mais interessadas nas actividades
comunitárias. Há três pontos a reter:
• é reforçada a capacidade de auto-organização do Comité, que anteriormente era controlada pelo
Conselho;
• são multiplicados os domínios
sobre os quais o Comité é chamado a
emitir pareceres;
25
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
• o Parlamento Europeu passa a ser
formalmente destinatário destes
pareceres e pode pedir ao Comité
pareceres específicos.
Os processos de decisão
Os processos de decisão comunitários
mantêm-se, em princípio, os mesmos
que estavam previstos no Tratado de
Maastricht; no entanto, foram introduzidas alterações substanciais para
melhorar o seu carácter democrático
e eficácia. A este respeito, foram
tomadas duas decisões importantes:
• o processo de cooperação introduzido no Acto Único de 1986, e que
prevê uma dupla leitura das propostas da Comissão no Parlamento e no
Conselho, quase desapareceu
(excepto em dois casos relativos à
União Económica e Monetária) e foi
O novo processo de co-decisão
O processo de co-decisão passa a ser estruturado do seguinte
modo:
a) se o Parlamento e o Conselho chegarem a acordo sobre
uma proposta da Comissão, esta é aprovada;
b) se houver desacordo, o Parlamento pode, em alternativa,
aceitar a posição comum do Conselho, rejeitá-la ou alterá-la, deliberando por maioria dos membros que o compõem;
c) se o Conselho não aceitar as alterações, convoca uma reunião de conciliação, depois da qual o Parlamento e o
Conselho votam o acordo obtido; em caso de desacordo, o
acto proposto não é adoptado.
26
substituído pelo processo de co-decisão;
• este processo de co-decisão, que no
Tratado de Maastricht representa o
progresso mais importante para o
reforço do papel do Parlamento Europeu, não tem apenas alargado o seu
âmbito de aplicação. Ele torna-se
também mais eficaz e ainda mais
positivo para o Parlamento:
— o Parlamento e o Conselho podem
agora decidir após uma única leitura do texto, enquanto anteriormente eram necessárias duas
leituras em cada um dos órgãos,
mesmo nos casos em que os dois
ramos da autoridade legislativa
estivessem facilmente de acordo,
— o Parlamento pode rejeitar em
segunda leitura a «posição
comum» do Conselho, sem passar
por um processo suplementar de
conciliação com este último,
— em caso de fracasso da conciliação
com o Parlamento após a segunda
leitura, o acto proposto é considerado não adoptado e o processo é
encerrado.
A «comitologia»
Para além dos processos de decisão
previstos para a adopção dos actos
de base, os Tratados conferem ao
Conselho e à Comissão as competências de execução necessárias para a
aplicação e desenvolvimento das
políticas comuns. Na prática, o exercício das competências de execução
cabe à Comissão, segundo modalidades muito variáveis e de acordo
com um sistema de consulta muito
complexo, que obriga a recorrer a
uma constelação de comités de funcionários nacionais encarregados de
a assistir para esse efeito.
Este sistema, designado por «comitologia», codificado pela primeira vez
em 1987, não foi alterado pelo Tratado de Amesterdão. Não porque não
fosse sentida a necessidade de uma
reforma, tanto para aumentar a
transparência do funcionamento institucional como para ter em conta os
novos poderes do Parlamento Europeu desde a entrada em vigor do Tratado de Maastricht, em 1993. O
Conselho Europeu reunido em Amesterdão limitou-se a pedir à Comissão
que apresentasse uma proposta de
alteração dos procedimentos em
vigor. Em Junho de 1998, foi apresentada uma proposta neste sentido.
A cooperação reforçada
A questão da integração diferenciada
ou flexível não é nova. Tem acontecido frequentemente que alguns
Estados-Membros desejam progredir
na via da integração europeia,
enquanto outros estão mais reticentes. Se, no passado, sempre se
encontrou solução para este problema, como aconteceu com o Protocolo Social e com a União Económica
e Monetária, estes exemplos serviram, no entanto, para mostrar a
necessidade de estabelecer um quadro jurídico objectivo, em vez de
recorrer a excepções caso a caso.
É por esta razão que o Tratado de
Amesterdão contém disposições relativas às condições e aos mecanismos
que permitem instaurar uma cooperação reforçada entre vários Estados-Membros durante um certo período
de tempo, sem que sejam postos em
causa os princípios do Tratado e,
nomeadamente, a liberdade de circulação e os direitos dos cidadãos.
Neste caso, se a maioria dos Estados
o desejarem, é agora possível, por
deliberação da maioria qualificada
dos Estados-Membros, instaurar, nas
condições definidas pelo Tratado,
cooperações reforçadas, tanto no
domínio propriamente comunitário
como no da cooperação penal e policial. A PESC está excluída do âmbito
de aplicação da cooperação reforçada, sendo a possibilidade de uma
«abstenção construtiva» o único
mecanismo de «flexibilidade» autorizado neste caso.
27
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
E a seguir?
Com o intuito de responder às
questões que haviam justificado a
convocação da Conferência Intergovernamental, o Tratado de Amesterdão alterou as disposições do
Tratado da União Europeia numa
série de domínios, entre os quais os
da cidadania em sentido amplo, da
Política Externa e de Segurança
Comum, da organização e do funcionamento das instituições. Era compreensível que não abordasse outras
questões que correspondem a um
calendário e dinâmica próprios, tais
como a criação do euro ou as perspectivas de alargamento da União.
Deixou, entretanto, várias questões
em aberto, como a da adaptação das
instituições ao alargamento e determinados aspectos da política
externa.
UE
Tratado de Amesterdão:
uma perspectiva das
últimas páginas
28
A evolução da integração europeia
exigirá, pois, a breve prazo, outras
reformas. Algumas poderão ser realizadas sem alteração do Tratado,
outras necessitarão de uma nova
Conferência Intergovernamental. O
novo Tratado abriu, assim, uma série
de debates:
• Será necessário confirmar num
documento «constitucional» os direitos e os deveres dos cidadãos, tal
como o compromisso das instituições
europeias a terem em conta as suas
preocupações em matéria de
emprego, ambiente, etc.?
• Será necessário dar uma identidade própria e personalidade jurídica à União Europeia, seja qual for o
seu domínio de acção, incluindo as
relações internacionais?
• Será necessário criar uma Europa
da defesa para salvaguardar a paz e
os direitos fundamentais, pelo menos
em redor das fronteiras da União?
Será necessário, para esse efeito,
integrar a União da Europa Ocidental na União Europeia, tal como é
permitido pelo Tratado de Amesterdão?
se não será necessário aprofundar a
reflexão sobre as estruturas institucionais, para as adaptar melhor aos
desafios do século XXI e, mais precisamente, às necessidades de uma
União que espera uma integração de
carácter político, mesmo que os alargamentos que se preparam a orientem para uma dimensão continental.
• Em matéria de política comercial, o
Conselho aproveitará as aberturas do
Tratado para dar à União o direito de
negociar acordos internacionais relativos aos serviços e à propriedade
intelectual, deliberando por maioria
qualificada?
Este debate é pleno de actualidade: o
Conselho Europeu reunido em Colónia em 3 e 4 de Junho de 1999 decidiu, com efeito, iniciar os trabalhos
de preparação de uma nova Conferência Intergovernamental, que tratará, durante o ano 2000, da reforma
prevista pelo «protocolo institucional».
• Em matéria institucional, há escolhas a fazer. Um protocolo anexo ao
Tratado indica as mais urgentes. Na
perspectiva do alargamento da
União a novos Estados, este «protocolo institucional» anuncia uma
revisão da composição da Comissão
Europeia. A Comissão, que conta
actualmente com 20 membros, ficaria, com efeito, demasiado numerosa
se se mantivessem as regras actuais,
que prevêem o mínimo de um
comissário por cada Estado-Membro
e a possibilidade de um segundo
comissário para os Estados mais
populosos. Está igualmente prevista
a revisão da ponderação do voto dos
Estados-Membros no Conselho, que
actualmente varia entre os 10 votos
de cada um dos quatro Estados mais
populosos até aos dois votos do
Luxemburgo. Conscientes dos riscos
de bloqueio criados pelos numerosos
casos em que o Conselho tem ainda
de decidir por unanimidade, três
Estados-Membros pronunciaram-se
mesmo por um alargamento do
âmbito das deliberações por maioria
qualificada antes de qualquer novo
alargamento.
Esta Conferência deve ser concebida
como uma primeira etapa de um processo global que conduza à melhor
definição do projecto político de uma
União Europeia alargada, tal como
havia anunciado o Conselho Europeu
de Cardife, em Junho de 1998. A
Conferência deve ocupar-se prioritariamente dos temas institucionais
deixados explicitamente em aberto
pelo Tratado de Amesterdão e de
todas as outras alterações ao funcionamento das instituições europeias,
que a perspectiva de alargamento
torna necessárias.
Para além destes problemas, que são
já evidentes, podemos interrogar-nos
29
Tr a t a d o d e A m e s t e r d ã o : o qu e m u d o u n a E u ro p a
Europa, a Europa na Internet
Para mais informações, pode-se consultar, via Internet, o
servidor
http://europa.eu.int/abc/obj/amst/fr/index.htm
Além do texto do Tratado e diversos comentários, encontra-se neste site
um «guia do cidadão», uma série de perguntas e respostas e um «modo do
usar» http://europa.eu.int/scadplus/leg/fr/s50000.htm
bem como um glossário
http://europa.eu.int/scadplus/leg/fr/cig/g4000.htm
O texto oficial pode também encontrar-se em:
http://ue.eu.int/Amsterdam/fr/treaty/treaty.htm
Para os Tratados anteriores (Tratado de Paris de 1951, Tratado de Roma de
1957, Acto Único de 1987, Tratado de Maastricht de 1992, etc.) ver
http://europa.eu.int/abc/obj/treaties/fr/frtoc.htm
A versão «consolidada» dos Tratados europeus, incluindo as alterações
introduzidas pelos Tratados de Maastricht e de Amesterdão,
encontra-se em
http://www.europa.eu.int/eur-lex/fr/treaties/index.html
30
Comissão Europeia
Tratado de Amesterdão: o que mudou na Europa
Série: A Europa em movimento
Luxemburgo: Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias
1999 — 30 p. — 16.2 x 22.9 cm
ISBN: 92-828-7404-4
Entrado em vigor em 1 de Maio de 1999, o Tratado de Amesterdão introduz
nos tratados europeus que o precederam uma série de alterações tendentes a
reforçar os direitos dos cidadãos, a corresponder melhor às suas aspirações, a
desenvolver a Política Externa e de Segurança Comum e a melhorar o funcionamento das instituições europeias. Sendo, em alguns aspectos, uma obra
inacabada, o Tratado contribui, por isso mesmo, para lançar o debate sobre o
futuro da União Europeia.
Download

Tratado de Amesterdão: o que mudou na Europa