Luiz Hermano retorna trilha do construtivismo Saturados da paródia neo-expressionista dos anos 80, os artistas voltam à velha ordem construtivista. Trata-se de uma metamorfose geométrica da estética minimalista, referência maior desse revival. O espectador pode pensar em Sol LeWitt, mas também em John Mc-Cracken, quando vê as 16 esculturas de Luiz Hermano expostas, a partir de hoje, na Valu Oria Galeria de Arte (alameda Gabriel Monteiro da Silva, 1.403, f-883-0173). De outro lado, a originalidade da obra do artista cearense chega a ser desconcertante. Hermano nunca deixou de pôr a expressão antes do conceito, ao contrário dos minimalistas. Jamais abriu mão dela. Agora, com essas esculturas e objetos que retomam a trilha do construtivismo, ele volta ao passado em busca da herança deixada pela obra de Oiticica e Lygia Clark. Cubo, uma escultura de alumínio, tem algo a ver com os “bichos” articuláveis de Lygia Clark. Os exemplos da assimilação do construtivismo brasileiro são inúmeros e revelam um escultor de nobre filiação. Luiz Hermano é, hoje, um dos artistas jovens de maior presença em coleções particulares e museus. Sua obra já foi exposta em Paris, Berlim, Madri, Lisboa, Havana, Seul, Santiago, e Porto Rico, destacando-se na 21.ª Bienal de São Paulo, um ano antes de ganhar uma viagem da Fundação Mokiti Okada para estudar em Nova York, em 1982. Amorfologia dos objetos e esculturas de sua exposição na Valu Oria tem muito da arte dos minimalistas, mas o aspecto formal dessas peças não foi ditado por uma premissa minimal, freqüentemente uma armadilha. Ou seja, elas não oscilam entre o formalismo e a desmaterialização. São peças que revelam o sujeito, trazem referências à infância do artista, ao mundo místico de Preaoca, mas nada têm de folclóricas. O Ex-Voto de Hermano, feito de cobre, não é mera reprodução de um fragmento do corpo, mas uma tentativa de criar um espaço amalgamado, saturado de uma experiência vivida. “Esse retorno ao construtivismo é um sintoma, uma necessidade de organizar o mundo dentro de princípios geométricos, mas conservando uma desordem necessária”, observa Hermano. Essa atitude construtiva, segundo o artista, “é uma tentativa de diálogo com a geração de Oiticica e Lygia Clark”. Ele provoca essa disposição com a peça Quadrado (1997), delicada transcriação em cobre de um metaesquema de Oiticica, em que as placas quadradas são presas por tênues fios à beira do colapso. Peças musicais – Em outras obras, como Tamarindos (1997), o contato entre pequenas peças de cobre produz sons. São frutos de um exuberante exercício de diálogo com a música, traduzindo a eleição do objeto como termo de equiparação. Sua estrutura material persegue não uma representação do tamarindo, como sugere o título, mas a abstração musical. Há uma série de peças “ressonantes”, incluindo a já citada Ex-Voto (1996). Essa série foi exposta em Santiago no fim do ano passado e surpreendeu os críticos chilenos. “Trouxe o cobre de lá e a surpresa da crítica deve-se ao uso artístico desse material, abundante no Chile, mas desprezado pelos escultores”, diz. Outro aspecto que aproxima Hermano dos minimalistas – especialmente da obra de Larry Bell – é a seleção e redução de valores plásticos. Bell usava cubos transparentes que refletiam a figura do espectador. No início de junho, Hermano participa de outra exposição, uma coletiva na Casa da Rosas, em que vai mostrar suas “caixinhas de pandora” numa sala escura. São peças metálicas que refletem a luz. Aí sim, é possível falar em desmaterialização da obra de arte, como no trabalho do artista californiano Larry Bell. Antônio Gonçalves Filho O Estado de São Paulo/Caderno 2 Quinta-feira, 8 de maio de 1997