ARS DO CENTRO SUB-REGIÃO DE SAÚDE DE COIMBRA CENTRO DE SAÚDE DE GÓIS SAÚDE ORAL EM SAÚDE ESCOLAR A experiência do Centro de Saúde de Góis Autores: Avelino J. S. Pedroso * Ana Isabel F. Caldas Silva ** Cristina Baeta Contente *** Equipa de Saúde Escolar: Avelino J. S. Pedroso Cristina Baeta Contente José M. Alves **** Fernando Simões ***** Colaboradores: Sandra G. Machado ****** Adriana C. Geraldes****** * Delegado de Saúde, ** Médica Interna do Internato Geral, *** Enfermeira de Saúde Pública, **** Técnico Auxiliar Sanitário, ***** Administrativo, ****** Estagiária do Curso de Higiene e Saúde Ambiental. _________________________________________________________ Trabalho apresentado nas "II Jornadas de Saúde Oral de Castelo Branco - I Jornadas Nacionais de Saúde Oral" e publicado na monografia da Sub-Região de Saúde de Coimbra, "Espelho", Nº 27 - Junho 1998. _________________________________________________________ Correspondência: Dr. Avelino de Jesus Silva Pedroso Centro de Saúde de Góis 3330 GÓIS Telefone: 035-772.322 035-772.253 Fax: 035-771.581 _________________________________________________________ 1. INTRODUÇÃO 1.1 O concelho de Góis O concelho de Góis, de características rurais pertence ao distrito de Coimbra, distando da capital de distrito cerca de 43 Km, tem uma área de 288,7 Km² e possui cinco freguesias. A mais distante, Alvares fica a cerca de 30 Km e a mais próxima, V. N. do Ceira fica a 5 Km da sede do concelho. O clima é temperado de características continentais. Quanto à orografia o relevo é bastante acidentado e a drenagem das linhas de água faz-se para o rio Ceira (a norte), bacia hidrográfica do Mondego e para o rio Unhais (a sul), bacia hidrográfica do Zêzere. A densidade populacional é de 18 hab./Km² . Relativamente à população, têm-se verificado um decréscimo progressivo desde 1911 (12.466), que foi mais acentuado na década de 1960-70, cerca de 29%. Esta baixa está relacionada com fenómenos migratórios (Lisboa). A população apurada pelo Censo de 91 foi de 5379 hab., tendo-se verificado um decréscimo de cerca de 16% relativamente à década anterior, o que estará relacionado com a baixa natalidade. Atendendo à distribuição da população por freguesias verifica-se o seguinte: QUADRO I - Distribuição da população do concelho de Góis (5.379) por freguesias LUGAR MAIS POPULOSO FREGUESIA Freguesia População Lugar N.º Habit. % ALVARES 1273 Cortes 267 21 CADAFAZ 363 Cabreira 138 38 COLMEAL 326 Colmeal 67 20 GÓIS 2323 Góis 763 33 V.N.CEIRA 1094 Várzea Grande 362 33 Fonte: Censo 91 A população activa do concelho pelo censo de 81 era de 2195 e distribuía-se do seguinte modo, relativamente aos sectores de actividade: 1. Sector primário - 45.67% 2. Sector secundário - 32.19% 3. Sector terciário - 22.13% 1.2. Programa de saúde escolar O programa de saúde escolar, no âmbito da saúde oral, atendendo ás características do concelho de Góis, tem incidido sobre toda a população escolar das pré - escolas e escolas do 1º ciclo do ensino básico, num total de 249 crianças. QUADRO II - Distribuição dos alunos por escolas e por freguesias FREGUESIAS ESCOLAS Alvares ALUNOS MASCULINOS FEMININOS TOTAL Alvares 2 1 3 Amieiros 1 2 3 Amioso do Sr. 4 3 7 Chã de Alvares 2 0 2 Cortes 5 5 10 Milreu 7 1 8 subtotal 6 33 Cadafaz Cabreira subtotal 1 Colmeal Carvalhal 1 3 4 Colmeal 2 1 3 4 2 6 6 subtotal 2 7 Gois Bordeiro 6 9 15 Cerdeira 5 4 9 Gois 31 31 62 Gois - PréEscola 15 23 38 P.te Sótão 9 3 12 P.te Sótão Pré 7 7 14 subtotal 6 V.N. Ceira Carapinhal 7 3 10 V.N. Ceira 12 16 28 V.N. Ceira Pré 10 5 15 subtotal 3 TOTAL 18 150 53 130 119 249 Estes 249 alunos distribuem-se por 3 pré - escolas e 15 escolas do 1º ciclo do ensino básico. As escolas com maior n.º de crianças situam-se nas freguesias de Góis e Vila Nova do Ceira, embora as dos lugares mais periféricos tenham menos alunos. O programa de saúde oral engloba as seguintes actividades: ① Observação de todas as crianças; Promover a aquisição de hábitos alimentares e de higiene oral correctos, designadamente a forma como devem ser lavados os dentes; ③ Distribuição pelos alunos de escovas, pastas e suplemente de flúor (comprimidos de fluoreto de sódio); ④ Envio dos alunos em risco à consulta de estomatologia no âmbito dos protocolos estabelecidos. O envio é processado de acordo com um sistema de prioridades tendo em conta critérios de gravidade da patologia encontrada em função do n.º de consultas atribuído por concelho. 1.3. A cárie dentária. É uma das doenças mais frequentes na nossa população, muitas vezes traduzida nas suas complicações imediatas: pulpite, abcesso, piorreia, gengivite, periodontites e extensão local ou sistémica destas infecções, bem como distúrbios do tracto gastrointestinal e repercussões na nutrição. A desintegração gradual patológica e dissolução do esmalte do dente e dentina com eventual envolvimento da polpa resulta essencialmente da interacção de três factores: a superfície susceptível do dente, a microflora adequada e um substrato apropriado a esta flora. Açucares mono e dissacarídeos servem como o principal substrato para o processo, contribuindo para a formação da placa dentária que favorece a proliferação bacteriana (em especial os streptococcus mutans) de microrganismos acidófilos e a aderência à superfície do dente. Os hidratos de carbono da dieta têm papel importante na formação da cárie dentária , daí a justificação da adopção de medidas de educação alimentar tendentes a reverter ou impedir essa situação. Outra acção visa que essa aquisição seja complementada por medidas de higiene oral, porquanto a placa bacteriana não é deslocada pela acção da musculatura oral ou pela saliva. Assim, a lavagem dos dentes é a única maneira de remover as partículas de comida e a placa bacteriana de todas as superfícies dentárias, devendo ser efectuada pelo menos uma vez ao dia, recorrendo também ao uso do fio dental nos acessos mais difíceis.. Também se preconiza a aplicação de flúor aos dentes irrompidos, o que se consegue , na maioria das situações, com o uso diário de um dentrifico contendo flúor e a eventual aplicação periódica de um gel. Esta prática aumenta os benefícios do flúor sistémico que deve ser administrado (tendo em conta o teor de flúor das águas de consumo e outras fontes possíveis) enquanto os dentes estão em desenvolvimento, do nascimento até quando se complete a erupção da dentição permanente (11 a 13 anos). Este suplemento tem como objectivo reforçar a trama mineral do dente tornando-o mais resistente, nomeadamente em relação á acção bacteriana acidófila (dissolução do cálcio e fósforo a pH de 5,5). No caso de estes cuidados, designadamente os fluoretos, não serem eficazes na prevenção da cárie de depressão ou fissuras deve ser utilizado um selante apropriado. 2. MATERIAL E MÉTODOS Este trabalho é um estudo descritivo que incidiu sobre toda a população escolar que frequentava, no ano lectivo de 1997/98, as pré - escolas e escolas do 1º ciclo do ensino básico do concelho de Góis. A pesquisa recaiu sobre os dados constantes das fichas de saúde oral e mapas de saúde escolar, nomeadamente: • • Observação dos dentes - nº dentes, tipo de dentição e seu estado (dentes sãos, cariadas, obturados e perdidos, não se recorreu aos testes de pesquisa de placa bacteriana) Elaboração de uma matriz, relativamente a variáveis como: idade, sexo, freguesia, escola, escolaridade dos pais, distribuição percentil em relação ao peso, envio a cuidados de especialidade, e posterior tratamento informático. 3. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A população em estudo estava compreendida entre as idades dos 3 aos 12 anos, com uma distribuição mais homogénea no grupo etário dos 6 aos 9 anos (Fig.1). A prevalência de cárie dentária (dentes destruídos) encontrada foi de cerca de 51 %, no que concerne à dentição temporária, tendo-se verificado os piores resultados nas escolas de Carvalhal, Chã de Alvares, Colmeal, Milreu, Ponte de Sótão, Carapinhal, Alvares e Vila N. do Ceira (Fig.2). Relativamente aos dentes definitivos a prevalência de cárie dentária encontrada foi de 9 %, com piores resultados, em termos percentuais, nos alunos das escolas de Cabreira, Cerdeira, Cortes, Carvalhal e Carapinhal (Fig.3). Analisando a distribuição do índice de dentes cariados, perdidos e obturados (ICPO somatório dos dentes cariados, perdidos e obturados a dividir pelo n.º de observados) segundo a idade e o sexo, na dentição decidual, verifica-se até aos cinco anos um predomínio no sexo feminino, verificando-se o inverso dos 7 aos 11 anos (Fig. 4). No que concerne aos dentes permanentes o ICPO é mais elevado no sexo masculino até aos 8 anos de idade sendo inferior ao sexo masculino no grupo etário dos 10 anos (Fig.5). Relativamente ás idades verificou-se um agravamento do ICPO, no que concerne aos dentes permanentes, atingindo os valores mais altos no grupo etário dos 10 e 11 anos (Fig.6). Em relação ás freguesias são as freguesias de Alvares e de Cadafaz que apresentam índices CPO mais elevados no que respeita a dentes permanentes (Fig.7). No que concerne a análise dos valores de ICPO em relação ás escolas, relativamente aos dentes deciduais os valores mais elevados verificaram-se nas escolas de Milreu , P.te de Sótão e Carvalhal. Em relação aos dentes permanentes os piores resultados registaramse nas escolas de Cabreira, Amioso do Senhor, Carapinhal, Milreu e Cortes (Fig. 8). A análise dos gráficos anteriores levou-nos a pensar que eventualmente as escolas mais periféricas, com menor n.º de alunos, teriam piores resultados, verificando-se a existência de valores mais elevados de ICPO nas escolas com menos de 10 alunos, o que estará relacionado com factores de ordem sociocultural (Fig. 9). Na pesquisa de outros factores, nomeadamente de origem alimentar procurou-se estabelecer alguma correlação entre a distribuição percentil dos alunos em relação ao peso, não se tendo verificado diferenças relevantes relativamente aos percentis extremos (Fig. 10). No entanto e na sequência da impressão do que referimos relativamente ao penúltimo gráfico podemos verificar que as freguesias mais centrais , Góis (sede de concelho) e Vila Nova do Ceira, apresentavam níveis mais elevados de escolaridade dos pais das crianças (Fig.11). No que concerne ao seguimento das crianças com problemas de saúde oral, estas são enviadas para consultas de referência, no âmbito de protocolos estabelecidos, via Medicina Pedagógica e Coordenação distrital de saúde escolar de Coimbra, de acordo com o mapa de vagas atribuído por concelho, o que obriga a estabelecer prioridades em função da gravidade da patologia encontrada, sobretudo em dentes definitivos e da idade da criança. Neste momento andam cerca de 85 crianças em consulta, representando 34% da nossa população escolar (Fig. 12). Procura-se também privilegiar o seguimento das crianças com menor acesso a consultas de especialidade e as escolas das freguesias em maior risco, como se pode ver no gráfico, designadamente em relação ás freguesias de Colmeal, Alvares e Cadafaz. O maior nº de crianças em seguimento corresponde à freguesia de Góis onde algumas andam a ser seguidas a nível particular, nomeadamente na vila (Fig. 13). Dos dados relativos ao seguimento das crianças em consulta da especialidade verificouse que cerca de 14% dos alunos tinham dentes obturados. Em termos percentuais a maior frequência verificou-se nas escolas de Milreu, Chã de Alvares, Cabreira, Amioso do Senhor, Ponte de Sótão, Bordeiro e Carapinhal (Fig. 14). Os grupos etários onde se registou maior n.º de tratamentos foi nos dos 8, 9 e 10 anos, o que em parte é reflexo do trabalho desenvolvido em anos anteriores, traduzindo a par da noção da gravidade do problema da cárie dentária, a preocupação de tratar as crianças destes grupos etários, prevenindo e evitando a perda de dentes definitivos (Fig. 15). 4. CONCLUSÕES • • • • • • Verifica-se ainda uma elevada prevalência de alunos com dentes cariados, sobretudo os temporários (51%), e também dos permanentes (9%); O índice CPO apresenta algumas variações em relação ao sexo e idade, mas é nos grupos etários dos 10 e 11 anos que atinge os valores mais elevados; São sobretudo as freguesias mais periféricas, e as escolas mais periféricas que apresentam os piores resultados , o que estará relacionado com hábitos alimentares e de higiene desadequados, onde terão influência factores sociais, sobretudo de ordem cultural e nível de escolaridade; Não foi possível relacionar a maior prevalência de cárie com outros factores de risco, designadamente a desnutrição ou a sobrealimentação; Verifica-se que já existe um número significativo de alunos (34%) a ser seguido em consultas de estomatologia, com tratamentos efectivos, dirigidos sobretudo aos grupos e escolas em maior risco. Dos Alunos tratados, ou seja, com dentes obturados, verifica-se que é o grupo etário dos 8 aos 10 anos que apresenta maior número de tratamentos, o que traduz a eficácia do programa instituído. 5. RECOMENDAÇÕES 1. Prosseguir com o programa de Saúde Oral em curso, de acordo com os objectivos estabelecidos e a rectificar, visando promover a aquisição de hábitos alimentares correctos e cuidados de higiene oral por parte das crianças em idade escolar; 2. Proceder à visita às escolas e à observação sistemática dos grupos em maior risco; 3. Fornecimento de escovas, pastas, e suplemento de flúor de acordo com as necessidades objectivas; 4. Encaminhamento precoce dos alunos para cuidados de especialidade (selantes, obturações, remoção da placa ...). 5. Dotar os Centros de Saúde ou grupos de Centros de Saúde, com profissionais habilitados, designadamente, Estomatologistas ou Médicos Dentistas e Higienistas Orais 6. BIBLIOGRAFIA DIRECÇÂO - GERAL DA SAÚDE - DIVISÃO DE SAÚDE ESCOLAR: Saúde Escolar, Programa Tipo, Lisboa, 1996. DIRECÇÃO - GERAL DOS CUIDADOS DE SAÚDE PRIMÁRIOS: Orientações Técnicas - Saúde Oral em Saúde Materna e Infantil, 2ª edição, Lisboa, Maio 1991. FERREIRA, F. A. GONÇALVES - Moderna Saúde Pública , 5ª edição. Lisboa. Fundação Calouste Gulbenkian, 1982. ISSELBACHER, KURT J. E AL - Harrison' s / Principles of Internal Medicine, 13 Th ed. McGraw - Hill, Inc. 1995. MANUAL MERCK DE MEDICINA: Diagnóstico e Tratamento / Robert Berkow, editor - chefe. - São Paulo: Roca, 1989. 7. FIGURAS