UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
LINHA DE PESQUISA: POLÍTICAS PÚBLICAS E PRÁTICAS EDUCATIVAS
DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO:
Calça Quadrada, Cabeça Redonda?
MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA
Orientadora: Profª. Dra. Adelaide Alves Dias
JOÃO PESSOA
2010
1
MARGARIDA SÔNIA M. MONTE SILVA
DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO:
Calça Quadrada, Cabeça Redonda?
Tese apresentada ao Programa de PósGraduação em Educação da Universidade
Federal da Paraíba como requisito parcial
para obtenção do grau de Doutora em
Educação, sob a orientação da Profª. Dra.
Adelaide Alves Dias.
JOÃO PESSOA
2010
2
S586d
Silva, Margarida Sônia M. Monte
Desenho animado e educação: calça quadrada, cabeça redonda?/
Margarida Sônia M. Monte Silva. – João Pessoa : UFPB, 2010.
167 f.: il.
Orientadora: Adelaide Alves Dias.
Tese (Doutorado) – UFPB /CE.
1. Pedagogia crítica. 2. Desenho animado. 3. Representação
simbólica. 4. Internalização. 5. Resistência.
UFPB/BC
CDU: 37.013(043)
3
MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA
DESENHO ANIMADO E EDUCAÇÃO:
Calça Quadrada, Cabeça Redonda?
Aprovada em: ____/____/______
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________
Orientadora: Profª. Drª. Adelaide Alves Dias – UFPB
___________________________________________________
Profº. Dr. Walter Matias Lima – UFAL
____________________________________________________
Profª. Drª. Glória das Neves Dutra Escarião – UFPB
____________________________________________________
Profª. Drª. Sônia de Almeida Pimenta – UFPB
____________________________________________________
Profº. Dr. José Vaz Magalhães Neto – UFPB
JOÃO PESSOA
2010
4
A Gilberto, lugar seguro das minhas lembranças.
A João Gabriel, filósofo e razão da minha vida.
A Sarinha, anjo e alegria do meu viver.
Dedico
5
AGRADECIMENTOS
Ao Deus misericordioso, por ter me concedido mais uma vitória na minha
vida.
Aos meus queridos pais, José e Giselda, obrigado por tudo que me
ensinaram e me apoiaram por toda uma vida.
Aos meus irmãos: Hildebrando, Edmundo e Leonardo em cuja determinação
eu me espelho.
Às minhas irmãs, companheiras e amigas, fontes de apoio incondicional,
Lúcia, Helena e Zelinha, que carinhosamente chamo de: As três Marias.
A João Gabriel que, com sua “filosofia infantil”, me motivou a escolher o
tema desse trabalho e pelas suas sugestões durante o percurso de elaboração.
A Sarinha, que com alegria, serenidade e companheirismo tornou menos
árdua a caminhada.
À direção, ao corpo docente e aos funcionários da Escola de Educação
Básica da Universidade Federal da Paraíba, pela acolhida carinhosa e por
permitirem a realização da pesquisa.
Às amadas crianças participantes da pesquisa de campo, que com seu
conhecimento e capacidade me conduziram a saber mais sobre elas.
A Michelle Kely Batista Silva, pelo seu excelente trabalho de filmagem das
rodas de conversa.
À profª. Drª. Adelaide Alves Dias que orientou esse trabalho, obrigada pelo
profissionalismo eficiente, pela justiça e principalmente pela amizade.
À amiga Nazaré Zenaide sempre presente em minha vida com sua ajuda
eficiente, amizade grandiosa, incentivo constante e humildade edificante. Obrigada
por permanecer minha amiga.
A Mara Simões, que com bondade esteve presente, de maneira prestimosa
sem reclamar diante dos meus inúmeros limites.
A todos os colegas da turma 26 do Doutorado em Educação pelo incentivo e
companheirismo.
Finalmente, a todos que contribuíram para a realização deste trabalho.
6
SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Desenho animado e educação: Calça
quadrada, cabeça redonda? 2010. 180p. Tese (Doutorado em Educação) –
Programa de Pós-Graduação em Educação. Universidade Federal da Paraíba.
Universidade Federal da Paraíba – UFPB, João Pessoa, 2010.
RESUMO
A tese contém uma análise da relação entre os conteúdos transmitidos pelo
desenho animado Bob Esponja e a formação da subjetividade infantil utilizando os
conceitos de representação simbólica, internalização e resistência, baseados em
Piaget (1978) Vygotsky (2007) e Giroux (1986), respectivamente. Nesta
investigação, participaram 62 crianças de 03 a 05 anos, alunos da Escola de
Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba, matriculados nos turnos
manhã e tarde em 2009. A pesquisa etnográfica utilizou a observação direta,
entrevistas com os alunos e rodas de conversa antes e depois que os mesmos
assistiram ao vídeo do desenho animado Bob Esponja. Os dados obtidos e
submetidos a análise indicam que os conteúdos do referido desenho interferiram na
subjetividade dos espectadores infantis de 03 e de 04 anos, em proporção maior do
que naqueles de 05 anos. Esta interferência é demonstrada pela preferência em
“ser” o personagem principal do desenho, adotando atitudes e comportamentos
padronizados, no entanto, não os impedindo de acrescentar aos conteúdos do
desenho animado um sentido próprio. A tese defende ainda que a educação escolar
tem potencial para capacitar os alunos no sentido de educar para mídia televisiva,
especificamente os desenhos animados, através do diálogo e análise crítica,
procedimentos adotados pela pedagogia crítica. Concluímos que devemos integrar à
escola os estudos de educação para a mídia televisiva, como instrumento
pedagógico e como objeto de estudo para que se desenvolva nos alunos uma
postura crítica diante dela.
Palavras-chave: Desenho animado – Representação simbólica – Internalização –
Resistência – Pedagogia crítica.
7
SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Cartoon and education: square pants,
round head? 2010. 180p. Thesis (Doctorate in Education) – Post-graduation Program
in Education. Federal University of Paraíba. Federal University of Paraíba – UFPB,
João Pessoa, 2010.
ABSTRACT
The thesis presents an analysis of the relation between the contents transmitted by
the SpongeBob animated series and the infantile subjectivity formation using the
concepts of symbolic representation, internalization and resistance based on Piaget
(1978) Vygotsky (2007) and Giroux (1986) respectively. In this investigation sixty-two
children, between 03 and 05 years old, took part. They were students from the Basic
Education School of the Federal University of Paraíba, enrolled in the morning and
afternoon shifts in 2009. The ethnographic research used the direct observation,
interviews with the students and dialogues in circle before and after they watched the
SpongeBob series video. The data obtained and submitted to analyses indicate that
the contents, of the mentioned cartoon, intervened in the subjectivity of the infantile
spectators, between 03 and 04 years old, in a proportion higher than in those who
were 05 years old. Such interference is demonstrated by the preference of “being”
the main cartoon character, adopting standardized attitudes and behaviors.
Nevertheless, this does not prevent the children from adding their own meaning to
the cartoon’s contents. The thesis still advocates that the school education has the
potential to prepare the students as concerns educating them by means of the
television media, specifically, the cartoons, through the dialogue and the critical
analysis; procedures adopted by the critical pedagogy. We concluded that we should
integrate to school the educational studies for the television media as both a
pedagogical instrument and a study object so as to promote a critical behavior in the
students in regard to the media.
Keywords: Cartoon – Symbolic representation – Internalization – Resistance –
Critical pedagogy.
8
SILVA, Monte Margarida Marinho Sonia. Dibujos animados y educación:
¿pantalones cuadrados, cabeza redonda? 2010.180p. Tesis (doctorado en
educación) – Programa de posgrado en educación. Universidad Federal de Paraíba.
Universidad de Federal de Paraíba – UFPB, João Pessoa, 2010.
RESUMEN
La tesis presentada contiene un análisis de la relación de los contenidos transmitidos
por el dibujo animado Bob Esponja y la formación de la subjetividad infantil mediante
los conceptos de representación simbólica, internalización y resistencia, basados en
Piaget (1978), Vygotsky (2007) y Giroux (1986) respectivamente. En esta
investigación han participado 62 niños de 3 a 5 años, alumnos de la Escuela de la
Educación Básica de la Universidad Federal de Paraíba, matriculados por la mañana
y por la tarde en el año de 2009. La investigación etnográfica ha utilizado la
observación directa, entrevistas con estudiantes y ruedas de conversación antes de
que ellos hubieran visto el video del dibujo animado de Bob Esponja como también
después de que lo habían visto. Los datos obtenidos y sometidos a análisis indican
que los contenidos de ese diseño, interfiere en la subjetividad de los espectadores
infantiles de 3 y de 4 años en una proporción más amplia que en los de 5 años. Esa
interferencia es demostrada por la preferencia en "ser" el personaje principal del
diseño, adoptando actitudes y conductas estandarizadas, sin embargo, no les impide
añadir a los contenidos del dibujo animado un sentido propio. La tesis sostiene
todavía que la educación escolar posee el potencial para habilitar a los alumnos
hacia la educación de los medios de televisión, específicamente los dibujos
animados, mediante el diálogo y el análisis crítico, procedimientos adoptados por la
pedagogía crítica. Hemos llegado a la conclusión de que debemos integrar a la
escuela, los estudios de educación para los medios de televisión, como una
herramienta pedagógica además de un objeto de estudio para que se desarrolle en
los aprendices una postura crítica frente a ella.
Palabras clave: Dibujo animado – Representación simbólica – Internalización –
Resistencia - Pedagogía crítica.
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – D. A. Popaye .......................................................................................33
Figura 2 – D. A. Pockemon...................................................................................34
Figuras 3 – Desenhos Animados Disney .............................................................38
Figuras 4 – Contos de Fadas ...............................................................................39
Figura 5 – Maurício de Sousa e seus personagens .............................................39
Figura 6 – D. A. Pockemon ..................................................................................40
Figura 7 – Criança assistindo televisão ................................................................41
Figura 8 – Heróis de desenhos antigos ................................................................42
Figuras 9 – Produtos com ilustrações de desenhos animados ............................45
Figura 10 – D. A. As meninas super poderosas ...................................................46
Figura 11 – D. A. O Laboratório de Dexter ...........................................................47
Figura 12 – D. A. Dragon Ball-Z ...........................................................................47
Figura 13 – D. A. Pica-Pau ...................................................................................48
Figura 14 – D. A. Jimmy Nêutron ........................................................................48
Figura 15 – D. A. Tom e Jerry ..............................................................................49
Figuras 16 – D. A. Bob Esponja Calça Quadrada ...............................................50
Figura 17 – D. A. Bob Esponja .............................................................................51
Figura 18 – Morada de Bob Esponja ...................................................................51
Figura 19 – Patrick ...............................................................................................52
Figura 20 – Lula Molusco .....................................................................................53
Figura 21 – Sr. Siriguejo .......................................................................................54
Figura 22 – Sandy ................................................................................................54
Figuras 23 – Produtos com ilustrações de Bob Esponja .....................................83
Fotos 1 – Brindes da lanchonete Burger King ......................................................83
Figuras 24 – Ilustrações de vários desenhos animados.....................................104
Figuras 25 – Ilustrações referentes ao d.a. Bob Esponja...................................105
10
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Nº total de alunos de 3 a 5 anos (2009) ..........................................102
Quadro 2 – Número de meninos e meninas pesquisados quanto ao
reconhecimento do desenho animado Bob Esponja, seus
personagens e sua preferência por eles. .......................................103
Quadro 3 – Caracterização das crianças em função do reconhecimento do
desenho animado Bob Esponja e sua preferência. .........................106
Quadro 4 – Número de alunos por turma e turno que participaram da segunda
fase da pesquisa: ............................................................................110
11
LISTA DE SIGLAS
UFPB – Universidade Federal da Paraíba
EEB – UFPB – Escola de Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba
D. A. – Desenho Animado
CEMC – Cultura Educacional Mundial Comum
AGEE – Agenda Globalmente Estruturada para a Educação
12
SUMÁRIO
1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA ....................................................................13
1.1 Criança e Visibilidade Social.......................................................................21
2 CULTURA INFANTIL E DESENHO ANIMADO................................................30
2.1 A Televisão e o Telespectador ..................................................................30
2.2 Desenhos Animados ....................................................................................37
2.2.1 Um pouco da história...................................................................................37
2.2.2 Os desenhos animados e a criança ............................................................40
2.2.3 Se liga nessa!..............................................................................................44
2.2.4 Bob Esponja Calça Quadrada ...................................................................50
3 SUBJETIVIDADE E DESENVOLVIMENTO INFANTIL ....................................57
3.1 Construção, Interação, Cognição – Jean Piaget: Um olhar......................58
3.2 Construção, Interação, Cultura – Lev, Vygotsky: Outro olhar .................65
3.3 Globalização, Indústria Cultural e Consumo .............................................72
3.4 Construção, Interação, Cultura, Resistência – Henry Giroux: Olhares
que se cruzam ..............................................................................................88
4 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA ..............................................98
4.1 Natureza e Lócus da Pesquisa ...................................................................98
4.2 Procedimentos na Construção e Análise dos Dados..............................100
4.3 Descrição e Análise da Primeira Fase da Pesquisa – Aproximação e Busca..102
4.4 Descrição e Análise da Segunda Fase da Pesquisa – Interação e Registro .108
4.4.1 Escolha do episódio ..................................................................................108
4.4.2 Assistindo ao episódio...............................................................................110
4.4.3 Roda de conversa e confecção dos desenhos..........................................111
4.4.4 Você quer ser Bob Esponja? “Falas” das crianças.....................................113
4.4.5 Fazendo arte – fantasia e realidade .........................................................114
4.4.6 Na pista dos saberes.................................................................................155
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................159
REFERÊNCIAS...................................................................................................161
APÊNDICES .......................................................................................................168
Apêndice 1....................................................................................................169
Apêndice 2....................................................................................................170
13
1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA
Estudiosos das mais diversas áreas de conhecimento dedicaram-se e ainda
se dedicam a pesquisar sobre desenhos animados e sua relação com a
comunicação, educação, brincadeiras e jogos, sexualidade, violência, estados
psicológicos e imaginário infantil. Os efeitos dos desenhos animados sobre quem os
assiste são incontestáveis. O que desejamos conhecer é como ocorre tal influência
numa determinada faixa etária do desenvolvimento humano.
Os desenhos animados são parte integrante da mídia televisiva que, hoje,
assume, junto à escola e à família, papel significativo na educação das novas
gerações. Com esta afirmativa não estamos atribuindo falta de autonomia aos
telespectadores diante da mídia televisiva. Apesar de sabermos que os textos
midiáticos são carregados de sentido e servem a propósitos e interesses
preestabelecidos, investigamos aquele que os recebe e sua relação com eles. A
criança, quando assiste aos desenhos animados, constrói sentido para o que vê na
televisão. O que nos interessa investigar é como eles influenciam a subjetividade de
crianças de 3 a 5 anos de idade. O desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada
é o instrumento midiático que utilizamos para estudar essa relação. Diante de tais
concepções instituímos como tese para essa investigação:
O desenho animado Bob Esponja com seus conteúdos, ao mesmo tempo
que diverte, interfere na formação da subjetividade de crianças de 3 a 5
anos de idade que, por sua vez, constroem sentido para o que assistem
mediante o contexto social em que estão inseridas.
Nossos objetivos, nesse estudo são: investigar como ocorre o processo de
construção de sentidos em crianças de 3 a 5 anos de idade ao assistirem o desenho
animado Bob Esponja, isto é, como ele influencia em suas subjetividades; verificar
qual a frequência com que crianças de 3 a 5 anos assistem ao desenho animado
Bob Esponja, e a preferência em relação ao mesmo dentre outros desenhos
animados; atribuir à criança a condição de receber e participar como autora das
produções
culturais; e,
por último, pretendemos
incentivar educadores a
desenvolverem o hábito de relacionar-se criticamente diante da mídia televisiva,
14
especificamente diante dos desenhos animados, tornando-os em meios que
contribuam para o desenvolvimento infantil de forma emancipatória.
Apresentamos o trabalho de pesquisa através de 4 (quatro) capítulos. O
primeiro deles, que ora estamos escrevendo, intitula-se “Contextualizando o Tema”,
que contém a exposição da tese, objetivos, justificativa e considerações sobre os
capítulos desenvolvidos. Ainda nesse primeiro capítulo, dissertamos sobre a criança
e visibilidade social, a televisão e o espectador, os desenhos animados, contando
um pouco da história dos mesmos, sua relação com as crianças e descrevemos
alguns desenhos animados veiculados pela televisão brasileira. O desenho animado
Bob Esponja, que foi escolhido como instrumento na pesquisa, também é descrito
nesse primeiro capítulo. Bob Esponja Calça Quadrada é um desenho animado
veiculado através da televisão brasileira, desde 1999 e tem sido objeto de estudo de
dissertação de Mestrado, artigos de periódicos e de trabalho de conclusão de curso.
Citamos alguns desses estudos no desenvolvimento dessa investigação, a exemplo
de Boutin (2006) que apresentou a dissertação de Mestrado: “Aspectos Pedagógicos
do Desenho Animado Infantil Bob Esponja” à Universidade Metodista de São Paulo
em São Bernardo do Campo. Pillar (2009) com o artigo: “Efeitos de humor de Bob
Esponja” e Medeiros (2009) que apresentou: “Produções de sentido em Bob Esponja
Calça Quadrada”. Ainda Lira (2005) escreveu “O Merchandising Capitalista no
Desenho Bob Esponja” e Silva (2008) apresenta “Desenho Animado: Instrumento de
Manutenção Social”, ambos os trabalhos apresentados na conclusão de cursos de
Graduação.
Quanto a forma como abordamos a infância é concedendo-lhe visibilidade,
captando suas opiniões e concepções, não interpretando suas falas nem tampouco
transcrevendo-as. Consideramos que há a necessidade de não esquecer a criança
como sujeito, cidadã, que tem voz e que produz cultura. As crianças têm o direito de
dar um sentido diferente aos conceitos e ações e produzir uma nova leitura do
mundo, e queremos garantir a elas esse direito.
Estudar a mídia através de um desenho animado é investigar como ocorre a
relação entre mídia e ficção no desenvolvimento infantil. Lembramos que as
pesquisas revelam os desenhos animados como preferência das crianças, dentre
outras narrativas ficcionais (FANTIN, 2006). O desenho animado Bob Esponja Calça
Quadrada que é como instrumento na nossa pesquisa tem um dos maiores índices
15
de audiência no Brasil, se comparado aos outros 170 países em que é veiculado
(PILLAR, 2009).
Como motivação pessoal, ao exercermos o magistério superior, temos
estudado o papel do desenho animado como estratégia pedagógica, acompanhando
o trabalho de conclusão de Curso de Pedagogia de alguns alunos estagiários.
Também apresentamos artigos em simpósios e congressos que tratam do desenho
animado como texto, e como seus conteúdos são compreendidos pelas crianças. O
interesse pelo estudo do desenho animado remonta ainda à constatação no seio
familiar, ou seja, nos filhos, da preferência desse tipo de mídia televisiva e a inerente
necessidade em acompanhar o desenvolvimento dos mesmos.
Outra justificativa podemos encontrar no papel que a televisão exerce na
vida das pessoas. Como meio de comunicação de massa ela tem um papel
importante na formação do sujeito como veículo de informação e comunicação junto
com outros meios (MOLINA e PRADOS, 2009). Às
vezes
é
reconhecida
como
estimuladora da violência, apatia e consumo, porém, também é reconhecida como
estimuladora do conhecimento, informação e diversão (FERNANDES, 2003). Advém
dessa dicotomia, a escolha do título da tese em questão. Quando apresentamos a
indagação Calça Quadrada, Cabeça Redonda?, estamos nos referindo à
possibilidade dos conteúdos do desenho animado Bob Esponja em homogeneizar
ou não o pensamento daqueles que o assistem. A realidade das crianças brasileiras
quanto à preferência pela televisão, além de outros meios midiáticos, é
acrescentada à preferência também de muitos pais, pois estando a criança
assistindo TV em casa, estaria, em termos, longe dos riscos que a rua oferece como
drogas, prostituição, roubo, violência, dentre outros, no horário oposto ao que
frequentam a escola. No Brasil, o tempo de permanência na escola ainda é inferior
ao que a criança permanece fora da escola.
Na escola, a TV não é utilizada como estratégia pedagógica na maioria das
vezes e, assim, os alunos assistem a filmes infantis, documentários, entrevistas,
desenhos animados, apenas como entretenimento. Quando bem planejada, essa
atividade alcança o objetivo proposto, e os alunos correspondem com prazer e
aprendizagem. Portanto, cabe aos educadores considerar a cultura da mídia como
uma força educacional substancial, uma pedagogia pública, como afirma Giroux
16
(2003), e utilizá-la para a construção de conhecimento crítico, reflexivo e
emancipatório dos alunos.
Vejamos através dos tempos, como chegamos aos dias de hoje à cultura de
imagens.
Desde a Antiguidade Clássica até o Renascimento a tradição oral
prevaleceu na organização do conhecimento. Sem registros escritos, a fala
preenchia, além da função de comunicação, a de conservação do conhecimento.
Era a supremacia auditiva que, mesmo após o surgimento da escrita, perdurou por
muito tempo, pois o conhecimento da mesma era então monopólio de uma elite de
escribas alheia às massas iletradas. Até o século XV, a literatura existia para ser
narrada em público, e o manuscrito era apenas um instrumento acessório dessa
vasta e influente cultura oral.
A cultura tipográfica introduziu a visão como o primeiro dos sentidos na
hierarquia, tomando o lugar da audição. A linguagem escrita liberou o homem da
dependência da memória do falante para a aquisição do conhecimento. Por meio de
caracteres, a escrita conservaria o conhecimento.
Séculos depois, os meios eletrônicos estenderam e extrapolaram os limites
usuais da visão e da audição, alterando nossa realidade cotidiana. Uma
sensibilidade nova parece se instalar no indivíduo contemporâneo, cada vez mais
incapaz de viver sem estímulos audiovisuais.
Os meios de comunicação como jornal, rádio, televisão, trem, carro, moeda,
etc. são verdadeiras extensões do homem, pois servem para vinculá-lo aos outros
homens. Eles são mensagens que podem exercer efeitos distintos sobre a mente.
As
sociedades
contemporâneas
industrializadas
são
consideradas
sociedades de massa, ou seja, compostas por grande número de indivíduos
anônimos. As instituições dominantes, escolas, igrejas, etc., tentam prover as
necessidades dessa multidão de pessoas. Essas instituições também criam outras
perspectivas, da mesma forma em que desenvolvem mecanismos eficazes para
controlar essas massas humanas, fazê-las produzir, consumir e se conformar.
Uma sociedade assim, exige mecanismos culturais adequados, capazes de
transmitir informações com rapidez para o maior número de pessoas possível. São
mecanismos que transmitem uma visão de mundo dos diferentes povos,
17
ultrapassando barreiras de espaço físico e social. Tais instrumentos são
principalmente o rádio, a televisão, a imprensa e, mais recentemente, a informática,
que fazem parte da cultura niveladora, homogeneizadora, produto da indústria
cultural.
A indústria cultural, centrada nesses meios de comunicação de massa, tem
um ritmo acelerado de produção e consumo e constitui uma esfera da atividade
econômica. Ela ainda exerce um papel fundamental na organização social e está,
sem dúvida, associada ao exercício do poder e à ordenação da vida coletiva.
Os meios de comunicação de massa penetram em todas as esferas da vida
social moderna, no meio urbano ou rural, na vida profissional, nas atividades
religiosas, no lazer, na educação, na participação política. Eles também difundem
maneiras de se comportar, propõem estilos de vida, modos de organizar a vida
cotidiana, de se vestir, de construir sua casa, maneiras de falar e de escrever, de
sonhar, de sofrer, de pensar, de lutar, de amar.
Eles ainda funcionam de forma homogeneizadora dirigindo mensagens
comuns a todos, gerando necessidades e expectativas massificadas. “A lógica de
sua maneira de funcionar é o amaciamento dos conflitos sociais: A indústria cultural
parece homogeneizar a vida e visão do mundo das diversas populações” (SANTOS,
2005). Percebemos, no entanto, que a própria indústria cultural também está
suscetível a contradições na vida social. Sobre as mensagens transmitidas o
controle não é total, pois por mais homogêneo que seja o conteúdo delas não é
possível substituir integralmente a percepção das pessoas.
Os meios de comunicação, e, em particular a televisão, exercem alguma
influência sobre quem deles faz uso e utilizam a linguagem como instrumento. São
as palavras que levam os indivíduos a se modificarem, como também os gestos e as
imagens. A linguagem em geral, portanto, além de ser um conjunto de estímulos
(sinais) visuais compreende, ainda, o modo como as pessoas se organizam. Daí,
também, sabe-se que a “leitura” de elementos idênticos ou semelhantes pode ter
muitas possibilidades. Por conseguinte as consequências da linguagem podem ser
negativas ou positivas, dependendo do seu uso e dos meios que são utilizados para
transmiti-la. A linguagem exerce um papel importantíssimo na vida das pessoas.
18
As novas tecnologias da comunicação introduziram outras linguagens,
invadindo com imagens, som e informações, de maneira tão forte, intensa e
insistente, quase todos os cantos e recantos do Planeta e de nossa
privacidade (CARLOS, 2006).
É o texto – imagem, que reeduca o olhar, o perceber do espectador. A
imagem tem um papel fundamental na leitura de mundo, tanto para os letrados como
para os iletrados e, comprovadamente, mais para estes últimos.
Os programas televisivos têm o poder de ativar a percepção para os
diferentes níveis de consciência crítica. A ética presente na escolha das imagens
das imagens transmitidas pela televisão e cinema pode inibir ou estimular estilos de
conduta. O filósofo brasileiro Brissac Peixoto, 1992 (apud PAIVA, 2005) mostra a
potência do imaginário vigilante do cinema, orientando estilos de gosto e formas de
conduta, configurações ético-estéticas no cenário urbanizado das grandes cidades.
Com certeza, o telespectador tem a liberdade de exercer sua faculdade de julgar,
porém, devemos nos lembrar da possibilidade menor de que dispõem as crianças,
ainda, de utilizar seu senso crítico. Os desenhos animados povoam o imaginário
infantil de heróis e vilões que representam figuras sedutoras e poderosas, mas, às
vezes, estranhas e mesquinhas. Essa ambiguidade, pode não ser percebida pela
criança. A TV exerce uma ação de sedução e condicionamento sobre ela a ponto de
se transformar uma necessidade fundamental como alimentar-se ou divertir-se.
Através da TV são difundidas imagens junto às diversas culturas locais,
como um tipo de padronização do imaginário e estilo de vida, mobilizando momentos
preciosos de investimento afetivo. O caráter da interculturalidade dos programas
televisivos exibidos internacionalmente merece também atenção, quando nos
reportamos à mídia televisiva e à objetividade infantil.
As imagens televisivas trazem consigo outro tipo de ambiguidade, ou seja,
apresentam uma sátira dos costumes como também uma apologia das convenções
(PAIVA, 2005). Estaria de acordo com o caráter ambíguo da globalização, isto é,
inovar e conservar.
A outra reflexão que podemos destacar é que a dicotomia entre o bem e o
mal muitas vezes torna-se banal nos desenhos animados e para as crianças pode
não ficar claro o que é certo e errado. Nota-se que, nas tramas dos desenhos
animados, os humilhados e desgraçados pela ação do destino ou pela maldade dos
poderosos absorvem o espírito individualista, adquirem uma consciência ressentida
19
do mundo e a partir de um plano pessoal partem para destruir seus algozes
(COSTA, 2002).
Passamos a descrever o segundo capítulo onde desenvolvemos o marco
teórico cujo título é Subjetividade e Desenvolvimento Infantil, e foi subdividido em
quatro sessões ou itens. Os conceitos de representação simbólica definido por Jean
Piaget (1978) e de internalização apresentado por Vygotsky (2007) (sessões 1 e 2
deste capítulo) são importantes para a compreensão desse processo, como também
o conceito de indústria cultural (sessão 3), criado por Adorno e Horkheimer (1985),
sociólogos participantes e fundadores da Escola de Frankfurt, juntamente com
outros estudiosos da Teoria Crítica da Sociedade (sessão 5). Outro elemento
conceitual importante está contido nos estudos de Giroux (1986), que nos possibilita,
através dos conceitos de resistência e pedagogia crítica, uma visão não tradicional
da escola (sessão 4).
A representação simbólica é a característica marcante do segundo estágio
de desenvolvimento cognitivo proposto por Piaget (1978). Nesse estágio, a
compreensão e o pensamento simbólico são reorganizados, porém, não há lógica. O
pensamento da criança geralmente é egocêntrico, sendo, incapaz de considerar
outras perspectivas que não sejam as suas e animista, atribuindo motivação e
características humanas a objetos inanimados e aos animais. Ainda nesse estágio, a
criança tem dificuldade para distinguir entre fantasia e realidade, e essencialmente,
baseia suas conclusões no pensamento intuitivo.
Os estudos sobre mídia que utilizam a teoria piagetiana, em sua maioria,
focalizam-se nas características cognitivas do pensamento pré-operacional (2 a 7
anos, apesar de as crianças desse estágio apresentarem progressos espetaculares
em relação ao anterior no âmbito de vários saberes como linguagem, desenho e
atividades práticas de vida diária. É nesse estágio que elas apresentam maior
suscetibilidade de serem influenciadas pelos estímulos simbólicos provocados pelos
conteúdos da TV, inclusive com possibilidades de criar ou reforçar padrões já
existentes de consumo. É fundamental que percebamos como a mídia televisiva
atua na construção e produção das memórias infantis estando seus conteúdos
presentes nas áreas econômica, social, familiar, escolar, etc (FISCHER, 2007).
O conceito de internalização é por Vigotsky explicado não como um
determinismo social sobre o individual. Ao contrário, a criança se apropria do social
20
de uma forma muito particular, de maneira que internalização e transformação
interagem constantemente. Nas pesquisas sobre subjetividade e mídia televisiva, a
teoria vygotskyana (2007) ajuda a explicar como realmente a qualidade das trocas
provindas dos conteúdos cognitivos influencia decisivamente na forma como as
crianças tornam mais complexo o seu pensamento e processam novas informações.
O conceito indústria cultural foi empregado pela primeira vez em 1947,
quando foi publicado o livro Dialética do Esclarecimento de Adorno e Korkheimer.
Esse conceito, explicaram eles, visava substituir “cultura de massas”, pois esta
expressão induz ao engodo que satisfaz aos interesses dos detentores dos veículos
de comunicação de massa. Estes últimos querem dar a entender que cultura de
massas é como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias massas. Para
Adorno (2002), tal não ocorre, pois afirma ele que a indústria cultural é quem adapta
seus produtos ao consumo das massas e determina o próprio produto, e, o conceito
de indústria cultural dá base à intencionalidade de formação de um tipo de cultura.
Adorno e Horkheimer (1985) expõem de modo bem claro que a cultura se
converteu em mercadoria. A proposição advém da expressão desenvolvida por eles
de indústria cultural, a qual refere-se às indústrias interessadas na produção em
massa de bens culturais, ressaltando que a expressão não diz respeito às empresas
produtoras nem às técnicas de difusão de bens culturais, e sim a um movimento
histórico-universal.
Os desenhos animados, como um tipo de mídia televisiva, encerram duas
possibilidades: a produção de sentido por parte do espectador, como também, são
dotados de intencionalidade que corresponde aos interesses das classes
dominantes. Perpassando sobre essas possibilidades apresentamos a sessão:
Globalização, Indústria Cultural e Consumo.
Por último, no item 4, ainda como base teórica, concentramos a atenção nos
estudos de Henry Giroux (1986), que tratam da resistência e pedagogia crítica em
Educação. Ele analisa a escola como um local de dominação e reprodução, mas
que, ao mesmo tempo, permite um espaço de resistência. Nesse âmbito, nos
presenteia com a possibilidade da pedagogia crítica. Tais elementos conceituais se
apresentam necessários quando, na consecução de um dos objetivos da pesquisa,
almejamos alertar para a necessidade da reflexão crítica frente à mídia televisiva,
especificamente frente aos desenhos animados.
21
O quarto capítulo transcorre como, metodologicamente, conduzimos a
pesquisa e o intitulamos: Organização dos Dados da Pesquisa. Está subdividido
em: Natureza e Lócus da Pesquisa; Procedimentos na Construção e Análise dos
Dados; Descrição da Primeira Fase da Pesquisa – Aproximação e Busca e
Descrição da Segunda Fase da Pesquisa – Interação e Registro..
Nas considerações finais, intencionamos enfatizar os aspectos conclusivos
da pesquisa, como também opiniões e sugestões relativas às conclusões.
1.1 Criança e Visibilidade Social
Um dos objetivos dessa investigação é contribuímos, para a afirmação de
que a criança produz e é produzida na/pela cultura. Dentro dessa concepção
sociocultural, o conceito de criança é uma construção histórica e sua constituição se
dá mediante interações sociais. A criança não é um ser passivo e deve ser
compreendida como um ser capaz de experimentar, criticar e julgar (DIAS, 2009).
Atualmente, está também se tornando um consenso entre os investigadores
da infância que, em suas pesquisas, devem revelar o ponto de vista da criança
(VASCONCELOS e SARMENTO, 2007). Isto significa que não damos voz à criança,
posto que a ela já está atribuída esta capacidade, mas nos empenhamos em escutála. Para tanto, os estudos investigativos sobre a infância precisam colocar a criança
no centro da indagação, considerando-a interlocutora privilegiada e co-autora nas e
das pesquisas. As pesquisas devem buscar conhecer as crianças por meio do que
elas mesmas expressam, observando a vitalidade de suas ações em diferentes
contextos da atualidade. Assegurando visibilidade às numerosas formas de
pensamento e ações das crianças, os pesquisadores atentam para falar com as
crianças e não falar por elas. Isto significa considerá-las atores sociais plenos,
constituindo um desafio teórico-metodológico para os estudiosos da infância.
Constitui uma perspectiva sociológica que considera não só as adaptações e
internalizações dos processos de socialização, mas também “os processos de
apropriação, reinvenção e reprodução realizadas pela criança” (DELGADO e
MÜLLER, 2005).
22
Nas suas pesquisas, os sociólogos da infância assumem o lugar de
aprendizes deixando-se levar pelas mãos e pelas vozes das próprias crianças e é
assim que conduzimos a presente investigação. Sarmento (2007) postula que:
a infância tem sofrido um processo de ocultação. Esse processo decorre
das concepções historicamente construídas sobre as crianças e dos modos
como elas foram inscritas em imagens sociais que tanto esclarecem sobre
os seus produtores (o conjunto de sistemas estruturados de crenças, teorias
e idéias, em diversas épocas históricas) quanto ocultam a realidade dos
mundos sociais e culturais das crianças, na complexidade da sua existência
social.
Mais uma vez reforçamos que a condução da nossa pesquisa com crianças
é contextualizando-as socialmente, atribuindo importância a sua participação.
O interesse histórico pela infância é relativamente recente. A referência
histórica à infância aparece tardiamente e essa é, aliás, uma das razões que
levaram Áries (1981) a afirmar a “ausência da consciência da idéia da infância” até o
início da modernidade.
Os estudos dos sociólogos da infância atuam em dois campos:
− Estrutura e ação: substitui o reducionismo biológico pelo reducionismo
sociológico.
− Ser em devir: considerar que a criança é um “vir a ser” é esquecer que
caráter inacabado da vida dos adultos é tão evidente quanto o das
crianças.
A historiografia mais recente sobre a infância tem considerado que:
mais do que ausência da consciência da infância, na Idade Média e na prémodernidade existiam concepções que foram profundamente alteradas pela
emergência do capitalismo, pela criação da escola pública e pela vasta
renovação das idéias com a crise do pensamento teocêntrico e o advento
do racionalismo. Os séculos XVII e XVIII, que assistem a essas mudanças
profundas na sociedade, constituem o período histórico em que a moderna
idéia da infância se cristaliza definitivamente, assumindo um carácter
distintivo e constituindo-se como referenciadora de um grupo humano que
não se caracteriza pela imperfeição, incompletude ou miniaturização do
adulto, mas por uma fase própria do desenvolvimento humano
(SARMENTO, 2007).
23
Expomos, em seguida, as concepções apresentadas por Sarmento (2007)
sobre as imagens sociais da infância, frisando que a criação de sucessivas
representações das crianças ao longo da história produziu um efeito de
invisibilização da realidade social da infância.
Baseando-se nos estudos de Jenks & Prout, o autor citado anteriormente
destaca dois períodos quanto à construção da imagem da criança: a pré-sociológica
e a sociológica. Segue uma suscinta explanação de cada uma delas.
1. Imagens da criança pré-sociológica:
− A criança má (the evil child) – baseada na idéia do "pecado original", a
imagem da criança má está associada a toda uma conceitualização do
corpo e da natureza como realidades que necessitam de serem
controladas; é a teoria de Hobbes sobre a exigência de controle dos
"excessos".
− A criança inocente – contrapondo-se à criança má, essa concepção
fundamenta-se no mito romântico da infância como a idade da
inocência.
− A criança imanente – essa imagem considera a idéia de um potencial
de desenvolvimento da criança, não a partir de uma natureza
intrinsecamente boa, mas da possibilidade de aquisição da razão e da
experiência, a qual aparece na formulação filosófica da teoria da
sociedade de John Locke.
− A
criança
naturalmente
desenvolvida
–
a
psicologia
do
desenvolvimento, a partir, especialmente, dos trabalhos de Piaget,
constitui-se
como
o
principal
referencial
de
entendimento
e
interpretação da criança no século XX, com profunda influência na
pedagogia, nos cuidados médicos e sociais, nas políticas públicas e na
relação cotidiana dos adultos com as crianças.
2. Imagens da criança sociológica
A criança inconsciente – essa imagem social tem Freud como figura de
referência, e atribui ao inconsciente o desenvolvimento do comportamento humano,
com incidência no conflito relacional na idade infantil, ocorrendo na relação com as
24
figuras materna e paterna. A criança é vista como um preditor do adulto, mais do
que como um ser humano completo e um ator social com sua especificidade, de
modo que a psicanálise introduziu um viés interpretativo que impede a análise da
criança a partir do seu próprio campo. Acresce ainda o determininismo que leva,
frequentemente, a atribuir comportamentos desviantes a vivências infantis, o que
não deixa de ser uma derivação da imagem da “criança má”, que se revela quando
adulta...”
As distintas representações da infância se caracterizam singularmente pelos
traços de negatividade, mais do que pela definição de conteúdos (biológicos ou
simbólicos) específicos. A criança é considerada como o não-adulto e este aspecto
nega as características de um ser humano completo. A infância como a idade do
“não”, localiza-se desde o significado dessa fase em latim, ou seja, infans: o que não
fala.
Na segunda metade do século XIX, desenvolveu-se e consagrou-se a
infância como a idade da não-razão, em torno da qual, se institucionalizou a escola e
se “inventou” o aluno.
Com a Revolução Industrial e a consequente necessidade de especialização
de mão-de-obra, as crianças foram exploradas em múltiplas atividades produtivas.
Nesse período, o sentimento de infância está vinculado a um ideal abstrato, fundado
nas noções de inocência e moralização.
Assim, produz-se uma idéia de criança abstrata, frágil, inocente, indefesa,
incapaz, incompleta, que precisa sofrer processos de socialização,
mediante formação em instituições escolares, para poder tornar-se, no
futuro, uma pessoa capaz de atuar na sociedade (DIAS, 2009).
No período entre as duas guerras mundiais (1918 a 1939), as crianças foram
retiradas das fábricas (mas, sobretudo nos países centrais da Europa e da América
do Norte), e foram consideradas como seres afastados da produção e do consumo,
sendo a infância investida da natureza da idade do não-trabalho.
Hoje em dia as formas específicas de trabalho das crianças – a
aprendizagem escolar, ajuda familiar, algumas atividades sazonais, por exemplo –
tornaram-se ocultas na análise da divisão social de trabalho e produziram essa idéia
generalizante, afinal ilusória, de que as crianças não trabalham (SARMENTO, 2007).
25
Nos dias atuais, mais e mais se afirma uma indústria cultural para as
crianças, frequentemente dominada pela comunicação da violência, pela erotização
induzida, pela difusão de modelos de referência transmitidos pelos meios de
comunicação. De uma forma geral, cresce a complexificação das condições de vida
das crianças, “com estruturação dos seus cotidianos segundo dinâmicas indutoras
de comportamentos agressivos, competitivos e agonísticos” (SARMENTO, 2007).
Assim referem dados, tem se produzido a ideia que as crianças atuais vivem,
definitivamente, um processo de adultização precoce e irreversível, e, por
consequência, habitam a idade da não-infância.
Com efeito, a infância deve a sua diferença não à ausência de
características (presumidamente) próprias do ser humano adulto, mas à presença de
outras características distintivas que permitem que todas as crianças do mundo
tenham algo em comum, nas áreas física, mental, psicológica e social. Tal distinção
vai além de todas as outras operadas pelo fato de pertencerem a diferentes classes
sociais, ao gênero masculino ou feminino, ou seja qual for o espaço geográfico onde
residem, à cultura de origem e etnia.
A infância não é a idade da não-fala. Todas as crianças, desde bebês, têm
múltiplas linguagens, porque se expressam. A infância não é a idade da não-razão.
Para além da racionalidade técnico-instrumental, hegemônica na sociedade
industrial, outras racionalidades se constroem, designadamente nas interações de
crianças, com a incorporação de afetos, da fantasia e da vinculação ao real. A
infância não é a idade do não-trabalho. Todas as crianças trabalham nas múltiplas
tarefas que preenchem os seus cotidianos.
A infância é, simultaneamente, uma categoria social, do tipo geracional, e
um grupo social de sujeitos ativos, que interpretam e agem no mundo, construindo e
desconstruindo seus pressupostos através das culturas infantis.
Sarmento (2007) ainda nos fala da invisibilidade cívica da criança,
decorrente do afastamento do mundo da infância do mundo dos adultos, da
separação de áreas de atividade, reservadas para a ação exclusiva dos adultos e
inacessíveis, por consequência, à ação das crianças. A invisibilidade cívica também
decorre da colocação, sob forma direta (especialmente no espaço familiar) ou sob
forma institucional (especialmente no caso da escola), das crianças sob proteção
adulta. O confinamento da infância a um espaço social condicionado e controlado
26
pelos adultos produziu, como consequência, o entendimento generalizado de que as
crianças estão “naturalmente” privadas do exercício de direitos políticos, por
exemplo votar para eleger os dirigentes.
A restrição de direitos políticos à infância, característica da modernidade
ocidental, não tem, todavia, um caráter universal. Sociedades e comunidades
radicadas no Oriente e no hemisfério sul, ou mesmo grupos étnicos minoritários na
Europa, não se caracterizam pela exclusão das crianças da vida coletiva e, inclusive,
integram as crianças nas assembléias e espaços de decisão coletiva, com efetiva
participação cívica.
Entrementes, a participação política não se restringe ao poder de voto. O
que importa aqui, é acentuarmos o fato de que as crianças privadas de direitos
políticos diretos tendem a ser, em consequência da sua ausência forçada da cena
política
representativa
(governo,
parlamento,
câmaras
municipais
etc.),
invisibilizadas como atores políticos concretos. Por conseguinte, não é de ausência
de ação política que se trata, mas de invisibilização na cena pública.
Não votando nem sendo eleitas, as crianças são tematizadas fora do quadro
do
referencial
de
destinatários
políticos,
os
designam
como
“cidadãos”,
“contribuintes”, “patrícios” ou mesmo “povo”. A invisibilidade é, no caso, homóloga
da exclusão: as crianças são o grupo geracional mais afetado pela pobreza, pelas
desigualdades sociais e pelas carências das políticas públicas. Para a recusa da
compreensão das crianças como atores sociais com competências políticas concorre
um conjunto de fatores.
Em primeiro lugar, a noção moderna de cidadania. O estatuto de membro da
comunidade impõe, ao mesmo tempo, obrigações e deveres do cidadão para com a
comunidade, todavia, a concepção clássica de cidadania recusa o estatuto político
às crianças.
Em segundo lugar, a escola foi sendo historicamente tematizada pela
modernidade como o lugar da formação de jovens cidadãos, plenos de direitos,
capacidade e competência, para competirem e/ou se solidarizarem numa sociedade
com igualdade de oportunidades. A escola corresponde à institucionalização
histórica de processos de disciplinação da infância, que são inerentes à criação da
ordem social dominante. Contudo, a escola permanece como um palco conflitual de
27
projetos políticos e pedagógicos que tanto orienta-se para uma efetiva ampliação
dos direitos das crianças, quanto sustentar-se em lógicas de ação que perpetuam a
inscrição histórica da dominação.
Ao mesmo tempo em que a modernidade introduziu a escola como condição
de acesso à cidadania, realizou um trabalho de separação das crianças do espaço
público. As crianças são vistas como os cidadãos do futuro; no presente, encontramse afastadas do convívio social amplo, salvo no contexto escolar, e resguardados
pelas famílias da presença plena na vida da sociedade dos “adultos”.
A imagem da criança com um cotidiano superpreenchido, ilustra bem uma
atividade dependente e vigiada sob controle adulto, numa extensão
custodional do poder familiar, agora alargado às múltiplas agências de
ocupação infantil (SARMENTO, 2007).
Sarmento (2007) ainda nos fala sobre a (In)visibilidade científica, que o
construtivismo psicológico coloca sob suspeita o pensamento infantil, porque
pressupõe a sua incompletude e imperfeição. É mais de uma falha do que de uma
realização que se trata, sempre que se ouve o significado que as crianças dão aos
seus gestos ou experiências. “Escutar a voz das crianças consiste, em última
análise, em escutar a voz do adulto que se revela num discurso previamente
interpretado”.
De modo semelhante, se as teorias dominantes da socialização rasuraram a
ação interpretativa das crianças, não deixaram de criticamente enunciar,
pertinentemente, muitos dos processos mais ou menos ostensivos ou mais ou
menos sutis de dominação, de inculcação normativa e comportamental e de
exercício da violência simbólica.
Até hoje, a fixação de imagens sociais das crianças contribuiu para que se
regulassem a vida das crianças, se fixassem pontos de referência para a
interpretação da mesma, se padronizassem as relações entre crianças e adultos, se
definissem os programas institucionais e os procedimentos, prescrições e interdições
face à ação das crianças.
Um campo científico interdisciplinar – os estudos da infância – não pode
abdicar da “imaginação metodológica”, que faça da voz das crianças não o outro da
28
voz dos adultos, mas a expressão de uma autoria que faz a diferença com os
adultos.
As concepções de outros estudiosos da sociologia da infância, que
apresentamos alguns deles logo a seguir corroboram a idéia de Sarmento (2007),
reafirmando que a construção do ser social, ocorre por meio de múltiplas
negociações com seus próximos, e na identidade do sujeito. Essa noção estimula a
compreensão das crianças como atores sociais capazes de criar e modificar
culturas, embora inseridas no mundo adulto. Para consolidar um campo de estudo
que defende a escuta, enfocando a infância e a cultura infantis, os estudiosos da
infância
utilizam,
em
suas
pesquisas,
referenciais
teóricos-metodológicos
desafiadores. O nosso trabalho se insere tanto teórica como metodologicamente
neste campo de estudo.
Podemos citar Javeau (2005), que estudou em que dimensões se designa o
conceito de infância. Para esse autor, se conceito de infância é reduzido ao termo
“criança”, entra-se no campo psicológico; se é reduzido ao termo “infância”, entra-se
nos campos demográfico e econômico; e se se fala de “crianças”, entra-se no campo
antropológico ou socioantropológico.
Mollo-Bouvier (2005) também questiona a delimitação das concepções de
infância, enfatizando a socialização da criança na qualidade de sujeito social que
participa de sua própria socialização, mas também da reprodução e da
transformação da sociedade.
Indagando a respeito de qual o lugar que pode ocupar a questão da
“deficiência” no quadro da sociologia da infância, Plaisance (2005) analisa, ao
mesmo tempo, a história da infância dita “deficiente” e as evoluções recentes, a
partir de 1975, em matéria de escolarização. O autor levanta as hipóteses de que a
representação da criança portadora de deficiência é dominada pela representação
da deficiência, mais do que a representação da criança, como criança e que a
alteridade da criança com relação ao adulto é redobrada no caso da criança
deficiente.
Outros autores também se articulam teoricamente à sociologia da infância. É
o caso de Alderson (2005) que faz uma revisão da literatura internacional
considerando: as etapas do processo de pesquisa, nas quais as crianças podem
29
estar envolvidas; os níveis de participação das crianças e o uso de métodos que
podem aumentar o envolvimento delas na pesquisa, respeitando seus direitos.
Também Corsaro (2005) relata pesquisas etnográficas comparativas com
crianças de pré-escola nos Estados Unidos e na Itália. O autor deu enfoque à
entrada no campo, ao estabelecimento do status de participante e à coleta de dados.
Ele ainda discute como passou a fazer “pesquisa com, e não mais sobre crianças”.
Montandon (2005) nos apresenta em seu artigo, que não basta examinar as
práticas educativas de seus educadores, mas que é necessário compreender as
perspectivas das crianças. Isto quer dizer que é preciso analisar não apenas o que
os educadores fazem com as crianças, como também o que estas fazem com o que
se faz com elas.
Gullestad (2005) trata em seu artigo das “infâncias imaginadas”, que são
lembranças da infância trazidas pelo adulto e que compõem uma parte central e
natural da representação da pessoa adulta. As histórias de vida, as análises da
relação entre a narratividade e o social, o trabalho de memória e de textualização
são fontes que se tornam essenciais para a compreensão das experiências infantis
e, em particular, para entender o ponto de vista das crianças.
Rayou (2005), com a preocupação de escapar do adultocentrismo, discute
as estratégias metodológicas que utilizou durante doze anos em pesquisas sobre
socialização das crianças e dos jovens com diferentes níveis de escolarização.
Os estudos dos sociólogos da infância citados nesta sessão, nos fazem
perceber seu empenho em seguir a concepção de que a infância é um conceito
constituído
sócio-historicamente e
que criança
participa
ativamente dessa
construção.
Sob este ponto de vida, buscar conhecer as crianças além das imagens e
idéias construídas socialmente ao longo da história, torna-se um movimento de
desconstrução dos fundamentos e concepções existente, e, como anteriormente
falamos, conduzimos nossa investigação teórica e metodologicamente nessa intenção.
A televisão é um dos meios de comunicação de maior acesso dos
indivíduos, fazendo parte, com frequência, de seu contexto social. No segundo
capítulo: Cultura Infantil e Desenho Animado, discutimos como se dá a relação entre
a TV e o Telespectador.
30
2 CULTURA INFANTIL E DESENHO ANIMADO
2.1 A Televisão e o Telespectador
Debates e discussões a respeito do papel e influência da televisão, têm
ocorrido no mundo todo, por ser ela, um dos meios de comunicação mais utilizados
por significativa parcela da população. Às vezes é considerada responsável por
males que afligem a sociedade como violência, apatia e consumo. Sua programação
é vista como instrumento de alienação e transmissora da ideologia dominante.
Porém, esta é apenas uma das formas de perceber o papel da televisão no contexto
atual (MESQUITA e SOARES, 2008).
Primeiramente, temos que concordar que a televisão faz parte da vida diária
de milhões de pessoas nos mais diferentes locais e nas mais variadas culturas e
que, também, na vida das crianças atua como presença marcante. A mídia
televisiva, por exemplo, individualiza seus consumidores, pois estuda seus hábitos e
gostos de consumo para assegurar uma vendagem rápida e direcionada os meios
de comunicação podem levar os indivíduos a se modificarem, influenciando na sua
maneira de pensar e agir. Eles utilizam a linguagem como instrumento. São as
palavras, gestos e imagens, que levam os indivíduos a se modificarem. A linguagem
em geral, portanto, além de ser um conjunto de estímulos (sinais) visuais (como
cores, sons, formas, movimentos, materiais, etc.) compreende ainda, o modo como
as pessoas se organizam. Daí, constatamos que a “leitura” de elementos idênticos
ou semelhantes pode ter muitas possibilidades.
A televisão surge como um meio de comunicação que veicula informações,
com intenção de informar e também convencer os telespectadores. Como a
televisão utiliza a linguagem, ela comunica, mas também através da palavra a
televisão argumenta, relata, discute, entra em relação com as pessoas que
aprendem, ensinam, amam, odeiam, etc. Em geral, quando “se toma” a palavra não
se quer apenas comunicar alguma coisa, se quer também persuadir o outro,
convencendo-o de que suas razões são as melhores. Nesse aspecto, interfere na
ação do outro, “vendendo-lhe” uma ideia, uma imagem, um estilo de vida. Aqui se vê
a palavra como mercadoria e que, para tanto, é transmitida de diferentes maneiras
com o objetivo de sempre vender mais. As ideias explicam a realidade das coisas
31
como se fosse sua essência, mas é a sua aparência. Somente a capacidade de
discernimento do receptor fará com que ele perceba a diferença entre aparência e
essência, entre causa e efeito.
Atualmente, somos bombardeados pelo discurso persuasivo na política, na
propaganda, nos meios econômicos, nas telenovelas, nos filmes importados da TV.
Essas produções desejam mostrar produtos, expor conceitos ou apresentar
histórias, bem como expor idéias e modos de viver. Tentando alcançar as pessoas
em sua vontade e ação, elas não são apenas convencidas pelos conteúdos
televisivos a acreditar; passam a considerar que essas idéias são verdadeiras e
únicas. É bem comum ouvir alguém dizer: “É verdade, eu vi na televisão”.
A TV exerce uma ação de sedução e condicionamento sobre as pessoas de
todas as idades, a ponto de se transformar numa necessidade fundamental como
alimentar-se ou divertir-se. No entanto, a esse respeito Freitag (2006) nos alerta que
crianças e adolescentes expostos aos conteúdos televisivos agem e reagem aos
estímulos expostos, fazendo uma seleção do que lhes interessa ou não, daquilo que
lhes parece procedente ou improcedente o que embasa nossa tese de que as
crianças produzem sentido ao assistirem TV.
As crianças e adolescentes não podem ser encaradas como massa informe,
amorfa, que podem ser modeladas à revelia de sua vontade e
independentemente de sua consciência, nem devem ser encarados como
“passivos”. Eles agem e reagem aos estímulos de diferentes maneiras e de
acordo com o seu nível de compreensão da situação. Não se prestam a um
treinamento de “estímulo e resposta” preconcebida ou intencionada. São
seres criativos capazes de aprendizagem de julgamento próprio,
resguardadas as etapas de sua formação ou gênese intelectual e moral.
Mas, também, não podem ser tratadas, antes do tempo, como adultos que
já poderiam ou deveriam ter atingido maturidade biológica, linguística,
moral, cognitiva, em suma: a autonomia moral (FREITAG, 2006)
Corroborando as ideias da autora anteriormente citada, também Molina e
Prados (2009), afirmam que a televisão, por ser um fenômeno básico da civilização
dos meios de comunicação de massa, é necessário estudá-la em suas
manifestações. Apesar dela não exerce um papel determinante na formação do
sujeito como veículo de informação e comunicação, mas pode influenciar no
processo educacional pelos seus conteúdos. Porém, ela, a TV, não exerce sozinha
esse papel. Muitos outros fatores sociais e culturais estão criando condições para
mudar o ambiente da infância na atualidade. Os modos de circulação da informação
32
atualmente são muitos e variados formando um complexo multimídia do qual
participam a própria TV, agora com canais a cabo, diferentes revistas, jornais, CDrooms, vídeo-games, computadores, etc. (FERNANDES, 2003). A TV não é a única
fonte de informação, mas é a mais acessível e a mais reconhecida publicamente, e
isto é consenso entre os pesquisadores. Quando a TV é criticada negativamente, ela
é considerada estimuladora da violência, apatia e consumo. Citamos algumas
pesquisas que demonstram essa influência negativa da TV.
Durante os programas e nos intervalos comerciais estímulos intencionais,
porém, velados, são apresentados com o objetivo de maior consumo de produtos. O
próprio nome (intervalo comercial) já indica a intenção, lembrando que são esses
produtos que patrocinam os programas. Decorre uma espécie de cópia dos padrões
consagrados pela televisão. Desde chaveiros a material escolar, roupas e calçados,
até garotos que falam gírias ou garotas que tentam imitar a cantora adolescente,
seguem um padrão televisivo. São as chamadas “febres” e “manias”.
Devido à excessiva exposição de crianças e adolescentes que veem
televisão até oito horas diárias estes grupos podem agir de forma semelhante ao
que assistem. Essas pessoas compartilham de uma rede de significados transmitida
pela TV, e, portanto, tendem a repetir comportamentos de pessoas e personagens
apresentados (HAMBURGER, 2003).
As pessoas costumam, ainda, incorporar a seu vocabulário palavras de
origem inglesa equivalente em nosso idioma: chamam de bike a bicicleta, de fashion
a moda, de bus o ônibus. São os meios de comunicação de massa e,
principalmente, a televisão que homogeniza. Os padrões mundiais se tornam os
padrões que ela mostra. A verdade do mundo passa a ser aquela exibida pela TV, e
todo mundo, de uma forma global, cabe dentro da tela do aparelho receptor de
televisão. As pessoas copiam porque, aquilo que é mostrado na tela aparece como
algo socialmente consagrado, como um caminho para o reconhecimento e para o
sucesso. A situação da cultura, tal como ela é colocada pela mídia, não premia a
originalidade, mas a cópia e por isso vemos programas semelhantes e grupos
musicais idênticos (CARVALHO, 2007).
Através da televisão, a mídia pode utilizar mensagens subliminares para
vender produtos e ideologias. Seja de forma clara ou não, alguns programas de
auditório, telenovelas e também desenhos animados apresentam produtos que
33
serão inconscientemente percebidos com probabilidades de aumentar seu consumo.
O experimento de Jim Vicary (1956) demonstra muito bem esse fenômeno. Tal
experimento consistia em colocar em um cinema de New Jersey (EUA) durante a
exibição dos filmes, propaganda taquicoscópica, ou seja, diretamente nos filmes
exibidos, eram embutidos legendas estimulando o consumo de determinados
produtos. Essas legendas eram exibidas de maneira tão rápida, que só se poderia
percebê-las inconscientemente (ou subliminarmente). O resultado é que o consumo
de tais produtos, nos intervalos dos filmes, aumentou em 60%. Outro exemplo, é o
do desenho Popaye que ajudou ao governo americano a acelerar o consumo de
uma supersafra de espinafre. Algumas crianças, apesar de não gostarem muito de
verduras em geral, passaram a acreditar que ficariam fortes como o Popaye, se
consumissem espinafre (1929).
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 1 – D. A. Popaye
Outros dois episódios também demonstram o efeito dos meios de
comunicação sobre indivíduos ou sobre as massas: o pânico Pockemon e a
transmissão radiofônica da guerra dos mundos em 1938.
34
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 2 – D. A. Pockemon
O pânico Pockemon (1997) ocorreu no Japão, precisamente em 16 de
dezembro de 1997, quando um desenho animado, do mesmo nome, após ser
transmitido, várias crianças foram vítimas de convulsão. Isto ocorreu devido à rápida
mudança de cores, em uma velocidade taquicoscópica, e o cérebro da criança não
foi capaz de assimilar, provocando assim a convulsão.
A guerra dos mundos ocorreu em 1938, quando o ator/diretor Orson Wells
(EUA), aterrorizou milhares de estadunidenses relatando uma invasão fictícia de
marcianos, através do rádio. O episódio acarretou o êxodo das pessoas fugindo de
extra-terrestres num verdadeiro terror coletivo.
Cada um desses eventos mostra o poder que têm os meios de comunicação
de massa de influenciar diretamente na vida das pessoas.
As horas dedicadas à TV não são devidas ao fato desta oferecer às crianças
programas que muito apreciam, mas também porque os pais não incentivam os
filhos para outras atividades. O excesso de obrigações dos mesmos é um dos
motivos, como também, o desinteresse dos pais por “coisas de criança”, ou seja, o
não reconhecimento dos adultos do seu papel como mediador entre a mídia
televisiva e os telespectadores crianças (FERNANDES e OSWALD, 2005). O
resultado
pode
ser um
tanto
alarmante
como,
por
exemplo,
atrasar
o
desenvolvimento físico motor das crianças. A Academia Norte Americana de
Pediatria divulgou que a TV pode afetar a saúde física e social dos jovens. De
35
acordo com o estudo, a TV não é indicada para os bebês, pois é uma atividade na
qual há pouca interatividade com os pais e com outras pessoas (1999).
Autores como Armand Mattelart e Ariel Dorfman (1980) escreveram no
período Allende, no Chile, o livro: Para ler o Pato Donald – Comunicação de Massa
e Colonialismo. O livro é fruto da pesquisa dos autores sobre a influência exercida
pelos produtos Disney na Educação e no relacionamento social de crianças de todo
mundo. É uma crítica bem forte ao imperialismo norte-americano, defendendo a tese
de que a leitura das histórias em quadrinhos não era tão inocente assim como se
pensava. O que os autores mostram é que, através desse produto cultural,
pode-se enviar mensagens ideológicas que estimulam a dependência
cultural e reforçam valores típicos da economia capitalista. Eles denunciam a
ideologia subjacente aos quadrinhos, à medida que confirmam os valores da classe
dominante, deformam a visão do trabalho, encobrem conflitos e levam à passividade
política. Na década de 1990, esses autores relativizaram parte de suas
conclusões.
No Brasil, um grupo de professores da Universidade Federal de Santa
Catarina, formou o Ateliê da Aurora (2007), que se destaca desde 2000 com teses,
dissertações, resenhas e artigos orientados para o tema: Criança, media e
imaginação. Um deles, já publicado em livro, trata da representação social da
criança e reprodução da ideologia dominante, organizado pela professora Elza Dias
Pacheco e se intitula: “Televisão, criança, imaginário e educação: dilemas e
diálogos”. Neste livro os vários textos enfatizam a influência dos desenhos animados
na forma como as crianças reagem socialmente, escolhem seus heróis, refletem
sobre seu futuro, ou seja, constroem seu pensamento. Nesse mesmo livro, a autora
escreveu o capítulo: As metáforas do Pica-Pau: efeitos da ideologia dos desenhos
animados nas crianças que, em outro momento, transformou em livro após pesquisa
aprofundada. O livro se intitulou: “O Pica-pau: herói ou vilão? Representação social
da criança e reprodução da ideologia dominante”.
Finalizamos esse capítulo apresentando dez teses ou proposições sobre as
crianças e a TV, de Bob Yodge e David Tripp (1986), publicadas na Inglaterra sob o
título: “Children and Television: a Semiotic Approach” (Crianças e televisão: uma
abordagem semiótica). Essas proposições já viraram clássicas na língua inglesa de
36
tanto serem citadas na bibliografia da área e resumem a nossa visão sobre a relação
TV e telespectador infantil:
1.
A criança é capaz de decodificar a TV de forma ativa e poderosa; mas
nem todos os programas e modos de assisti-los trazem o mesmo
benefício;
2.
As respostas e a interpretações das crianças mudam conforme a idade
3.
A TV para crianças contém formas ideológicas dominantes, mas
também algumas alternativas a elas.
4.
A habilidade de julgar o que é realidade na TV só pode ser adquirida
pela própria experiência com o meio.
5.
As crianças têm necessidade tanto de programas com fantasia como de
programas com a realidade.
6.
A violência nas mídias é qualitativamente diferente da violência real.
7.
As crianças reformulam os significados adquiridos por meio da TV.
8.
As formas ideológicas têm um efeito determinante na interpretação da
televisão.
9.
A família é uma instância ativa na determinação dos significados da TV.
10. A escola é um lugar onde a televisão deveria ser compreendida e
incorporada.
A nossa investigação contribui para a afirmação dessas proposições acima
citadas. O meio que escolhemos para analisar a relação mídia televisiva e formação
da subjetividade infantil é o desenho animado Bob Esponja.
A sessão seguinte é dedicada a descrever o conceito, um pouco da história
e a relação dos desenhos animados com a criança, a descrição de alguns desenhos
animados veiculados pela televisão brasileira, dentre eles, Bob Esponja Calça
Quadrada.
37
2.2 Desenhos Animados
2.2.1 Um pouco da história
A criança não faz sua interpretação do mundo apenas através da família e da
escola, ela o faz, também através do seu ambiente, dos grupos de mesma idade e,
com certeza, dos “media” que estão presentes nas suas horas livres, em suas ações
e representações infantis cotidianas.
Os desenhos animados fazem parte da vida das crianças desde muito cedo.
Eles podem ser definidos como “todo o conteúdo de animação, desenvolvido sem a
utilização constante e predominante de personagens representados por atores
humanos (Classificação Indicativa, 2006, p. 217). Na classificação geral da televisão,
os Desenhos Animados compõem um gênero que engloba a categoria de
entretenimento. É uma sequência de desenhos, cada qual ligeiramente diferente do
seguinte, dispostos de tal maneira que, uma vez filmados e projetados sobre a tela,
são vistos como se estivessem em movimento. Expressam em sua maioria, os
movimentos das coisas, seres, ações, de uma forma exagerada, caricaturada,
sobretudo quando se trata de desenhos humorísticos, são os chamados “cartoons”.
O animador de desenhos animados deve ter a habilidade do cartunista para criar
seus personagens em movimento, a habilidade de expressão dramática e rítmica
numa perfeita sincronização de imagens móveis e sons (FUSARI, 1985, p. 33).
Desde o seu inventor, Émile Reynaud, em primeiro de dezembro de 1888, o
desenho animado foi idealizado para crianças, mas, nos últimos tempos sofreram
alterações de linguagem e conteúdo para conquistar o público de outras faixas
etárias. Hoje, os desenhos animados também são empregados em charges que
tratam, com humor, de questões políticas e de assuntos de interesse público.
A arte da animação consiste em conhecer a fundo o movimento natural dos
seres e interpretá-lo de forma criativa. Na maioria dos filmes de animação realizados
nos Estados Unidos da América, as cabeças dos personagens têm proporção maior
que a realidade e, dentro delas, os olhos dos personagens também são
aumentados, facilitando detalhes de expressão.
38
Os desenhos animados estão vinculados, como técnica e expressão:
•
Ao desenho de imagens – registro de movimentos e sons.
•
À fotografia – “escrita da luz”
•
À cinematografia – “escrita do movimento”
•
À televisão – recebe e transmite imagens e sons mediante sinais
eletromagnéticos.
O outro termo vinculado ao desenho animado é anime, que provem de
mangá. O mangá, no Japão, é uma ilustração de uma história ou conto que pode ir
para TV em forma de “anime”. Assim, as historinhas saem da revistas e chegam à
TV em forma de desenhos animados.
O movimento inverso também ocorreu, quando um desenho animado, na
década de 1930, nos EUA, passou depois para as revistas de quadrinhos. Estamos
nos referindo ao Mickey Mouse, o ratinho que deu origem ao império Disney e a
inúmeros outros personagens como o Pato Donald, Tio Patinhas, Margarida, Zé
Carioca, Minie, João Bafodeonça e outros tantos mais.
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 3 – Desenhos Animados Disney
39
Disney, na produção de desenho animado, levou às telas alguns contos de
fadas, até então, conhecidos somente através de livros. Contos como Cinderela e
Branca de Neve, hoje são conhecidos mais pelos desenhos animados do que pelos
livros (BIBE – LUYTEN, 1985).
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 4 – Contos de Fadas
Quanto ao Brasil, a experiência em cinema de animação, tem mostrado,
sobretudo, a existência de tentativas isoladas e as enormes dificuldades de
produção e distribuição. Quem tem se destacado nessa área é Maurício de Sousa
que, iniciando com histórias em quadrinhos em 1959, com os personagens Bidu e
Franjinha, realizou trabalhos de cinema de animação na década de 1970, os quais
continua até hoje. Nessa época ele criou a personagem Mônica e outros como
Magali, Cebolinha, Cascão, Tina, etc. (FUSARI, 1985), representando crianças e
suas histórias. Recentemente, em 2008, Maurício de Sousa conta a história dessas
mesmas crianças na adolescência, para atingir o público adolescente que na
infância acompanhou os personagens como crianças.
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 5 – Maurício de Sousa e seus personagens
40
2.2.2 Os desenhos animados e a criança
Neste item, descrevemos a relação dos desenhos animados e a criança
quanto aos conteúdos por eles abordados.
Nos últimos 25 anos, a quantidade de desenhos infantis aumentou,
consideravelmente, pois também aumentou o número de canais que oferecem
múltiplas opções durante 24 horas, ininterruptas, na TV, a cabo, somando-se
àqueles exibidos nos canais abertos. Poucos pais e mães conhecem a variedade e
quantidade de desenhos infantis, ficando à margem desse mundo dos filhos. As
dificuldades também se dão quanto ao conteúdo dos desenhos animados, que antes
apresentavam a luta entre o bem e o mal, dos vilões e heróis de forma linear com
começo, meio e fim. Hoje os desenhos não terminam num mesmo capítulo e os
vilões e heróis são “mutantes”. Eles se modificam, se transformam em personagens
com características mais resistentes, constituindo o que chama-se de evolução.
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 6 – D. A. Pockemon
A antropóloga e professora da Universidade de São Paulo – USP, Esther
Hamburger (2003), afirma que “a lógica da mutação é uma das novidades dos
desenhos de hoje”. Em outras palavras, os personagens contemporâneos não
morrem, eles se transformam. É preciso que os adultos e crianças compreendam as
subdivisões, micro-evoluções e ″digivoluções″ desses personagens. São desenhos
41
de argumento complicado, que invadiram o país com sua complexidade oriental,
mais precisamente japonesa.
Os estados psicológicos tais como expectativa, excitação, medo, fascínio e
outros, são apresentados pelas pessoas desde muito cedo. São estados que fazem
parte da relação dos indivíduos com o mundo, inclusive, com a televisão que
constitui uma boa parte do universo existencial das pessoas. É também através da
televisão que as crianças começam a perceber o mundo que as rodeia. São as
experiências sensoriais na infância tão importantes e marcantes, que tais
impressões são as últimas a sobreviverem, quando o cérebro se desorganiza por
senilidade, traumatismos físicos e mentais etc. São também as primeiras a voltarem
à recordação, após o período de amnésia. Concordamos, assim, quão fortes e
persistentes são as imagens e impressões vivenciados e presenciados na infância.
As crianças, ao assistirem desenhos animados, ficam atentas quando eles
são atraentes o suficiente para tanto. Muitas vezes, alimentam-se assistindo TV,
realizam as tarefas escolares e outras atividades.
Os adultos sentem dificuldade em se comunicar com as crianças nessas
ocasiões. Parecem “hipnotizadas” pelas mensagens televisivas, mergulhadas no
mundo da fantasia.
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 7 – Criança assistindo televisão
Os desenhos animados apresentam cada vez mais semelhanças com a
realidade. Isto pode se constatar quando observamos os heróis dos desenhos
42
animados de décadas anteriores, e os de hoje em dia. Hoje, temos como heróis,
crianças com superpoderes como é o caso das Meninas Superpoderosas e de
Goku, em Dragon Ball; pequenos gênios como Dexter e Jimmy Neutron; meninos e
meninas astutas, que desafiam o medo e enfrentam qualquer
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 8 – Heróis de desenhos antigos
obstáculo com sua sabedoria e estratégias. Os super-heróis do passado como
Batmam,
Superman e Mulher Maravilha eram heróis adultos (imagens cima). Os
heróis-mirins de hoje vão à escola, recebem bronca dos pais, ficam de castigo,
desobedecem, reclamam por carinho e atenção, burlam as leis dos adultos e são
capazes de grandes feitos. Os heróis-mirins realizam feitos impossíveis para os
adultos como salvar a cidade de inimigos poderosos, criar maquinarias e aparatos
eletrônicos que permitem comunicações interplanetárias, manipular com destreza os
segredos do mundo virtual e isso tudo e muito mais sem o suporte dos adultos.
Nesta correlação, essa aproximação de realidade e fantasia, tendo como centro as
crianças como heróis, faz com que os desenhos animados tenham uma estreita
relação com o imaginário infantil. É bom ressaltar que a autonomia e independência
desses heróis-mirins despertam os mesmos desejos nas crianças que os assistem.
Quando os desenhos são violentos a criança poderá considerar que o “mais forte é
quem tem razão” e que se obtém o que se pretende quando se detém o “poder”. A
quantidade de violência presente nos desenhos animados principalmente de ação e
aventura chega a ser mais elevada do que nos programas destinados a adultos em
horário de grande audiência (CARVALHO, 2007).
Os desenhos animados são objeto de estudo nas mais diversas áreas, ou
seja, na educação, na psicologia, na política, em ciências da comunicação, na
sociologia etc. Citamos alguns desses trabalhos dentre os muitos existentes.
43
Mesquita e Soares (2008) investigaram, com base em alguns episódios dos
desenhos Jimmy Nêutron e o laboratório de Dexter, quais as visões de ciência são
veiculadas por meio desses episódios. Para os autores, é importante compreender
como se desenvolveu e tem desenvolvido o pensamento científico em nossa
sociedade. Eles sugerem o uso de desenhos animados como alternativa para
motivar debates que privilegiem a construção do conhecimento científico.
Molina e Prados (2009) estudaram a informação e os sentidos dos discursos
manifestados no desenho animado veiculado na televisão. Segundo a metodologia
semiótica, o desenho pode ser visto como um texto, em que se pressupõe um
processo de enunciação e que analisado, possibilita uma discussão sobre a
educação e a cultura. O desenho animado utilizado nessa pesquisa é Cyberchase, a
corrida do espaço – que faz parte do mercado cultural infantil exibido pela TV
Cultura de São Paulo – Brasil.
Ricon (2009), por sua vez, procurou identificar e analisar as representações
sociais contidas na figura dos cientistas, expressas nos discursos e produções de
um grupo de crianças em articulação com personagens apresentadas como
cientistas em desenhos animados de grande audiência. Ele possibilitou, em sua
análise, estudar questões relevantes e decisivas para a compreensão da “geração
mídia” (media generation).
Santiago (2009) objetivou estudar a intencionalidade de conteúdos dos
desenhos animados dos estúdios Disney, entre 1938 e 1940, cujas temáticas
abordavam insultos e desprezo político dos Estados Unidos da América para com as
potências do eixo europeu – Itália, Alemanha e Japão. O objetivo era aproximar e
alinhar as outras nações no esforço de guerra. Os motivos que levaram o
pesquisador a organizar esse texto foi reconhecer o papel ideológico, veiculado nos
enredos dos filmes de desenhos animados, exibidos diariamente nos principais
canais de televisão da época.
As pesquisadoras Silva e Gomes (2009) corroboram as ideias acima citadas
ao analisar representações artísticas e ideológicas presentes em desenhos
animados, em especial nas produções do estúdio Disney, que demonstram
situações do cotidiano como diversidade, comportamento e relacionamento
interpessoal. As autoras afirmam que os desenhos animados são importantes para a
44
formação da identidade do indivíduo já que a imagem transmite objetividades, além
de subjetividades.
A produção de sentidos da criança sobre os desenhos animados é o artigo
escrito por Fernandes (2003). Nele, a autora parte do pressuposto de que a criança
é um sujeito ativo, produtor de significados na sua relação com a cultura televisiva.
Em procedimento, busca investigar como as crianças dão significados e se
apropriam do que veem na telinha, não esquecendo de que a televisão não exerce
influência sozinha. Muitos outros fatores sociais e culturais estão criando condição
para mudar o ambiente da infância, na atualidade.
Fernandes e Oswald (2005) estudaram as relações adultas e infantis na
contemporaneidade, focalizando a recepção dos desenhos animados. Os autores
recusam a idéia de passividade das crianças diante da TV. Afirmam que elas são
produtoras de cultura e que, de acordo com as mediações, a recepção é
influenciada assim como a produção de sentidos sobre o que assistem. O artigo
analisa os depoimentos de crianças na faixa etária dos 9, 10 anos, de duas escolas
(pública e privada), relativos aos desenhos animados, apontando as mediações que
determinam desencontros e encontros entre crianças e adultos.
Os artigos aqui descritos não se esgotam. A nossa intenção é demonstrar o
interesse pelo estudo dos desenhos animados nas mais diversas áreas como
também compartilhar com as idéias apresentadas pelos autores.
O item a seguir apresenta informações sobre alguns desenhos animados
difundidos na televisão brasileira, os quais vamos utilizar como instrumentos com as
crianças participantes da pesquisa.
2.2.3 Se liga nessa!
Os desenhos animados, além das funções de entretenimento e lazer, tem
também as funções mítica e fabuladora, características das obras de ficção. Eles
constituem os líderes de preferência entre crianças de diferentes faixas etárias.
Todavia, os desenhos animados estão conquistando adolescentes e adultos
dependendo dos conteúdos abordados.
Periodicamente, os produtores lançam desenhos animados com novos
personagens e enredos. Os de maior sucesso ganham versão para cinema e vídeo
45
e passam a ilustrar uma série de outros produtos: capas de caderno, mochilas,
chaveiros, camisetas e bonés. Os personagens principais do desenho tornam-se
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 9 – Produtos com ilustrações de desenhos animados
ainda bonecos. Trazendo embutidos padrões culturais e de consumo, os desenhos
animados fazem parte do quadro pertinente a um contexto cultural que prega a
globalização que, na maioria das vezes, não considera as diferenças e
particularidades de cada ser humano; pelo contrário, estimula a massificação, a
mecanização e a automatização. Quanto à sociedade, esta é representada como
una, estática, harmônica, sem antagonismo de classes, e a “ordem natural” do
mundo é quebrada apenas pelos vilões que, encarnando o mal, atentam geralmente
contra o patrimônio. Os “bons” defendem a si mesmos e aos outros, derrotando os
“maus”. Essa é uma forma simplista que reduz todo conflito à luta entre o bem e o
mal, sem considerar quaisquer opiniões e interesses divergentes das pessoas. Pelo
exposto, o conflito é reduzido ao nível individual como se tudo fosse resultante de
problemas morais e não, também, de problemas políticos e sociais.
A assistência televisiva torna possíveis vários fenômenos como a imitação
individual, e depois, coletiva. A ação televisiva sobre o imaginário infantil aparece
nos jogos, nas atitudes, nas produções de textos e desenhos. Sob um aspecto
lógico, os adultos têm-se inquietado cada vez mais com a influência da televisão
sobre as crianças.
Apresentamos algumas informações referentes a desenhos animados que
são difundidas na televisão brasileira. Eles podem ser vistos em diferentes canais,
ou através da televisão a cabo – sinal captado mediante um pagamento de uma
46
assinatura, ou da televisão aberta – sinal que pode ser sintonizado por qualquer
aparelho de TV. Alguns desenhos animados são exibidos em ambos os canais.
A televisão brasileira exige desenhos animados classificados como
educativos e outros classificados como desenhos animados para entretenimento. Os
canais educativos mais populares no Rio de Janeiro são a TV Futura e Multirio.
A emissora educativa do Estado de São Paulo, a TV Cultura, criou nos anos
90, o Castelo Rá-Tim-Bum. Apesar de hoje em dia não serem transmitidos mais
episódios inéditos, é ainda muito elogiado pelos pais e considerado um programa
educativo de qualidade.
As emissoras brasileiras que transmitem desenhos animados em circuito
aberto são o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT), Rede Globo de Televisão (TV
Globo), Rede Bandeirantes de Televisão (BAND), e Rede Record e Rede TV.
Os canais das TVs pagas nos lares brasileiros já não são tão raros. Dentre
eles, podemos citar aqueles que exclusivamente transmitem programas infantojuvenis, inclusive desenhos animados: Disney Channel, Fox, Discovery Kids,
Nickelodeon, Jetix, Cartoon Netword e outros.
Segue-se uma breve descrição de alguns desenhos animados exibidos nos
canais brasileiros, utilizados na construção de dados com o objetivo de detectar o
reconhecimento dos mesmos pelas crianças.
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 10 – D. A. As meninas super poderosas
As Meninas Superpoderosas – Essas mini-heroínas são barulhentas,
bravas e lutam como gente grande. Lindinha, Florzinha e Docinho são três garotas
especiais, que moram na pacata Townsville, com seu criador, Professor Utônio. Elas
frequentam o jardim-da-infância local e, nas horas vagas, protegem a cidade contra
47
o malvado Macaco Loco, que tem o cérebro aparente (Cartoon Network e TV
Globo).
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 11 – D. A. O Laboratório de Dexter
O Laboratório de Dexter – Dexter é um menino prodígio que, de dentro de
seu laboratório, elabora mil planos e máquinas para salvar o mundo ou enfrentar
valentões na escola. Seu lema é: Todo dia é um grande dia para a ciência! Quem
não dá folga para o geniozinho e adora sabotar as invenções dele é a saltitante
bailarina Dee Dee, sua irmã mais velha (Cartoon Network).
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 12 – D. A. Dragon Ball-Z
DragonBall-Z – As Dragon Balls são sete esferas de cristal que, juntas,
invocam o poderoso Dragão. Quem conseguir uni-las tem um desejo concedido. O
herói Goku, com a ajuda de outros guerreiros terrestres e do filho Gohan, tenta
manter as Dragon Balls longe de mãos erradas. Ao todo, são 22 personagens no
48
desenho, que também tem outra versão com oito a menos, a DragonBall GT. Nesta,
o guerreiro Goku volta a ser criança por causa de um feitiço inimigo. (TV Globo e no
Cartoon Network).
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 13 – D. A. Pica-Pau
Pica-Pau – Esse desenho animado foi criado em 1940 e estrelou vários
curta-metragens de animação e só na década de 1950 passou a ser exibido na
televisão. O Pica-Pau tem voz e risada inconfundíveis. No início o Pica-Pau
representava um personagem violento. Depois ele ganhou uma personalidade mais
tranquila e menos agressiva, porém é provocador e faz deboche dos outros
personagens (TV Record).
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 14 – D. A. Jimmy Nêutron
Jimmy Nêutron – É um garoto gênio, mas que tem problemas para se
adaptar com os colegas de sala e, por isso, conta com a ajuda de seus amigos Caio
e Sheen. Jimmy inventa um monte de coisas, e quando acham que ele está
49
dormindo, na verdade está voando por aí e inventando novas coisas para tornar a
vida mais fácil. Sempre que tem uma idéia genial fala: “Idéias a mil!. “Seu laboratório
secreto fica no subsolo do quintal de sua casa (NicKelodeon)
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 15 – D. A. Tom e Jerry
Tom e Jerry – A trama desse desenho animado se baseia geralmente em
tentativas frustradas do gato Tom de capturar o rato Jerry. Por causa das
habilidades do engenhoso ratinho e por ser menos esperto, Tom não consegue
pegar Jerry em nenhum episódio. Também são utilizadas diversas armadilhas e
truques que, no final, não dão resultado satisfatório e sempre se seguem o caos e a
destruição. Alguns episódios deixaram de ser exibidos, pois foram considerados
racistas (Boomerang).
Esses desenhos animados, descritos anteriormente, nos revelam um
panorama recente daqueles exibidos pela TV brasileira, pois os criadores renovam
seu acervo ou ainda surgem novos criadores de desenho animados.
O meio pelo qual estudamos a mídia televisiva é o desenho animado.
Escolhemos dentre muitos aqui descritos ou não, o desenho animado Bob Esponja,
Calça Quadrada, o qual descrevemos com detalhes no item a seguir.
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2.2.4 Bob Esponja Calça Quadrada
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 16 – D. A. Bob Esponja Calça Quadrada
Temos como objetivo neste item, descrever o desenho animado que serviu
de objeto de estudo em nossa investigação. Tratamos aqui, de sua origem,
personagens principais e dinâmica dos conteúdos.
Bob Esponja Calça Quadrada, atualmente é exibido pelo canal Nickelodeon
(TV a cabo), de segunda a sexta-feira, em horários variados. Na TV aberta, também,
de segunda a sexta-feira pela manhã, é exibido no programa TV Globinho da Rede
Globo.
Bob Esponja foi criado em 1999, por Stephen Hillenburg, nos Estados
Unidos e já foi traduzido para 25 idiomas chegando a 170 países. Dentre estes, o
Brasil é um dos países com maior índice de audiência do desenho (Pillar, 2009).
Hillenburg é ex-professor de Biologia marinha e tem estudos na área de Recursos
Marinhos. Seu objetivo em criar Bob Esponja Calça Quadrada é combinar seu
conhecimento em Biologia marinha, com seu amor pela animação. A vida de seus
personagens se passa no fundo do mar, no lugar chamado Fenda do Biquíni, logo
abaixo de uma pequena ilha no oceano Pacífico, pertencente ao Atol de Biquíni, que
aparece no início de cada episódio do desenho.
Os personagens do Bob Esponja não são heróis com superpoderes como
Superman e Batman. Eles são seres com vida normal, que trabalham, se divertem,
brincam, vão à escola etc. Os animais não nadam, mas caminham sobre o solo;
cozinham com fogo, há velas acesas em bolos de aniversário, há neve no inverno e
51
vão à praia no verão apesar de estarem submersos. É o mundo da fantasia
representando o mundo real.
Bob é uma esponja do mar, embora possua a mesma forma quadrada das
esponjas industriais. Diferente da esponja natural que fica enraizada ao solo
marinho, Bob “caminha” e tem cor amarela. Usa calças marrons, camisa de mangas
curtas branca, gravata vermelha, meias brancas até a altura do joelho e sapatos
pretos; tem grandes olhos azuis e boca enorme. Está sempre sorrindo
demonstrando personalidade alegre.
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 17 – D. A. Bob Esponja
Sua casa tem formato de abacaxi. Possui um bichinho de estimação,
chamado Gary, que é um caramujo marinho. Gary não fala, mas é capaz de se
fazer compreender por Bob. Bob Esponja trabalha como cozinheiro na lanchonete
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 18 – Morada de Bob Esponja
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“Siri Cascudo” e adora seu trabalho. Também brincar com
seu melhor amigo
Patrick Estrela é a atividade favorita dele. Eles sempre estão se metendo em
encrencas. Sua personalidade é marcada pelo otimismo. Ele acredita que vive num
mundo bom e com a sua ingenuidade, às vezes é ludibriado. Parte do pressuposto
que todos são bons. Ele é simpático, tolerante e bem-humorado. Repete sempre:
“Estou pronto!” seja para trabalhar ou para brincar. Está envolvido, em quase todos
os episódios, em confusões, mas tudo dá sempre certo no final (BOUTIN, 2006).
O grande amigo de Bob Esponja, Patrick, é uma estrela do mar que não
consegue fazer nada direito e para todos é na verdade, um fracassado. Ele vive à
sombra de seu amigo Bob Esponja. Não vai à escola nem trabalha. Há um episódio
intitulado: “O grande fracassado cor-de-rosa (Brincando com Bob Esponja, 2003),
que com sua falta de habilidade, provoca o riso dos personagens e telespectadores.
Ele está sempre querendo resolver os conflitos, mas, acaba dando conselhos e
opiniões que não são as mais acertadas, na concepção da maioria dos adultos.
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 19 – Patrick
Ele não consegue trabalhar e espera Bob Esponja sair do serviço para brincarem
juntos. Seus pais aparecem num episódio – Sou pelos idiotas (Bob Esponja 2ª
temporada, 2001), no qual Patrick confidencia a Bob que até seus pais o consideram
um idiota. Patrick veste-se com uma bermuda colorida (verde de flores roxas) como
as bermudas usadas pelos surfistas, e tem o corpo todo cor-de-rosa. Ele mora
embaixo de uma pedra, próximo à casa de Bob Esponja.
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Lula Molusco é uma lula (animal marinho) azul. Enquanto Bob Esponja é um
empregado ideal, nunca reclama do salário e considera o patrão um bom líder, até
arriscando sua vida por ele, Lula Molusco vive reclamando de tudo. Ele não trabalha
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 20 – Lula Molusco
nada além do estritamente necessário e faz tudo para viver longe de Bob Esponja e
Patrick. Toca clarineta, mas muito mal, sempre emitindo acordes desafinados. Ele
não chega a ser um vilão, mas é o oposto de Bob Esponja. O antagonismo entre as
personagens está presente em todos os episódios. Ele é o personagem malhumorado do desenho. Nada está bom pra ele, ficando resmungando pelos cantos,
reclamando do trabalho, de Bob, de Patrick e das brincadeiras. Bob e Patrick só
pioram seu mau-humor, pedindo desculpas pelas grosserias que o próprio Lula
comete. Lula Molusco não é realizado profissionalmente, pois ele se considera um
artista, porém, sobrevive trabalhando como caixa na lanchonete “Siri Cascudo”.
Adora tocar clarineta, mas, só o Bob tem paciência para ouvi-lo. Ele até gostaria de
brincar com Bob e Patrick, pois observa-os de longe de sua janela. Apesar de ser
convidado, não vai brincar. Prefere manter uma postura distante e desinteressada.
Seu Siriguejo é um siri de corpo e olhos vermelhos que usa calças e camisa
azuis. Ele é dono da lanchonete Siri Cascudo, portanto patrão de Bob Esponja,
Patrick e Lula Molusco. Ex-militar, busca ter um comportamento exemplar, entretanto
age mal quando o assunto é dinheiro, pois é extremamente avarento. Sua
lanchonete vende o famoso hambúrguer de siri. Este sanduíche tem um ingrediente
secreto e o seu sabor delicioso atrai muitos clientes. Plâncton é dono de um
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restaurante, o “Balde de Lixo” e o único concorrente de seu Siriguejo. Ele quer
roubar a receita secreta do hambúrguer de Siri.
Seu Siriguejo tem temperamento agitado, fica todo tempo dando ordens aos
funcionários e contando dinheiro. A exploração a que submete seus empregados
faz do Sr. Siriguejo um homem rico, não se importando com eles. Faz com que seus
Fonte:
http://images.google.com.br
Figura 21 – Sr. Siriguejo
subalternos trabalhem muito e paga pouco. As histórias de Hillenburg nos passam,
ainda, a idéia que o Sr. Siriguejo lutou muito para chegar onde chegou, superando
obstáculos. É o mito capitalista da superação de si mesmo, onde o homem nasce
pobre e pode enriquecer por seus esforços e merecimento. É o self-made man
citado por Dorfman e Mattelart (1980).
Fonte: http://images.google.com.br
Figura 22 – Sandy
Em Bob Esponja, o filme (2004), o Sr. Siriguejo é entrevistado quando
inaugura uma nova lanchonete. Suas primeiras palavras são: ”Olá, eu gosto de
55
dinheiro”. Guarda também como amuleto sua primeira moeda. Ele é viúvo,
apaixonado por uma personagem chamada Srª. Puff, que é professora de Bob
Esponja na escola de pilotagem. Tem uma filha chamada Pérola, uma baleia que
raramente aparece nos episódios porque está sempre passeando com os amigos.
Outra personagem do desenho animado Bob Esponja é Sandy Bochechas.
Ela é uma esquilo fêmea que vive no mar e para sobreviver usa uma roupa especial.
Ela está sempre à procura de aventuras e Bob gosta muito de brincar com ela.
Outros personagens como os super-heróis da TV da Fenda do Biquíni – o Homemsereia e seu ajudante Mexilhãozinho – e mais alguns participam dos episódios de
vez em quando para dar maior dinamismo ao desenho.
Para concluir este item sobre o desenho animado Bob Esponja Calça
Quadrada, podemos dizer que a Fenda do Biquíni funciona como uma sociedade,
onde homens organizados trabalham para garantir sua subsistência. Pode-se
concluir que é uma cidade localizada nos Estados Unidos da América, cuja língua
falada é o inglês e a moeda corrente é o dólar, tendo o trabalho como valor, em
função de um mercado.
Também concluímos que, entre Lula Molusco, Patrick e Bob Esponja, fica
evidente que o personagem ideal é Bob com o qual o autor quer que as crianças se
identifiquem. Embora o Lula cumpra suas obrigações, não o faz com prazer como o
Bob, contudo, ambos trabalham em função de um mercado. Lula Molusco raramente
demonstra algum tipo de sentimento positivo por qualquer coisa e faz sempre
questão de deixar em evidência seu desprezo por Bob Esponja. Este, ao contrário, é
um empregado que não se importa de receber salários. Seu prazer é o trabalho e a
ele estaria dedicado 24 horas se fosse necessário. No episódio: Siriguejo nasce de
novo (Histórias... 2003) Bob Esponja diz: “Hora de fechar (o restaurante), a hora
mais triste do dia” ou no episódio: Como na TV (O Natal... 2002) ao acordar: “Hora
de fazer minha coisa predileta no meu local predileto”, ou seja, iniciar o dia
trabalhando no restaurante.
Até julho de 2009 o autor do desenho havia concluído 152 episódios. Para
comemorar os dez anos de sua criação, aos telespectadores foram apresentados
100 (cem) episódios, durante 48 horas, sem interrupção pelo canal Nickelodeon (TV
56
a cabo). O desenho animado Bob Esponja Calça Quadra será retomado para análise
como instrumento utilizado na metodologia desta pesquisa.
O conteúdo do capítulo seguinte constitui os elementos conceituais da
pesquisa e se intitula Subjetividade e Desenvolvimento Infantil.
57
3 SUBJETIVIDADE E DESENVOLVIMENTO INFANTIL
A Psicologia do Desenvolvimento e o estudo da Mídia devem andar de mãos
dadas. Isto porque as teorias do desenvolvimento vão além de simplesmente
analisar o conteúdo apresentado pela mídia, incluindo também a natureza única da
criança como a idade dela, quantidade de tempo gasto com cada mídia e o conteúdo
ao qual ela foi exposta. Essas teorias podem identificar os mecanismos potenciais
que explicam por que os efeitos das mídias ocorrem e orientam as previsões sobre
qual faixa etária há mais riscos para alguns efeitos específicos. As teorias da
psicologia do desenvolvimento também ajudam a explicar como as crianças
percebem o conteúdo da mídia e como a sua compreensão se modifica com a idade.
As teorias desenvolvimentistas podem ser organizadas em categorias
(SCHEIBE, 2009), ou seja, de acordo com o que enfatizam:
a) comportamentos adquiridos;
b) cognição
(atenção,
aprendizagem,
memória,
compreensão
e
julgamento);
c) personalidade e emoções;
d) funcionamento e respostas do cérebro;
e) ambientes múltiplos e interativos.
f) Influências inatas, biológicas ou inconscientes;
g) Influências ambientais.
Scheibe (2009) afirma que existem quatro maneiras básicas pelas quais
uma criança pode aprender:
1. Experiência direta, que é a aprendizagem por meio do condicionamento
operante, ou seja, a criança será recompensada ou punida de acordo
com o comportamento apresentado;
2. Aprendizagem pela observação, isto é, envolve o aprendizado ao assistir
alguém executar o comportamento e então imitá-lo, ou não, dependendo
das consequências do comportamento da pessoa observada;
58
3. Aprendizagem simbólica, que envolve a aprendizagem de crianças mais
velhas, adolescentes e adultos através da linguagem escrita ou falada;
4. Aprendizagem cognitiva, onde o aprendizado se baseia nas
informações que as crianças já possuem e na sua compreensão
global das questões envolvidas.
As quatro formas pelas quais a criança aprende, acima citadas se
aplicam especificamente com relação ao uso da mídia para adquirir informações,
para interpretar mensagens e para compreender a mídia em geral.
No presente estudo, as teorias de desenvolvimento aprofundam o
paradigma construtivista-interacional de Jean Piaget (1978) e o paradigma
sócio-cultural de Lev. Vigotsky (2007), ambas consideradas teorias cognitivas,
visando sedimentar a compreensão da construção do pensamento da criança.
3.1 Construção, Interação, Cognição – Jean Piaget: Um olhar
Iniciamos nossa exposição teórica com a proposta criada por Jean Piaget
(1978), que nos favorece o estudo da compreensão da mídia pelas crianças,
discutindo o processo cognitivo de representação simbólica. Inicialmente, fazemos
uma breve síntese da teoria piagetiana.
Piaget observou, passo a passo, a evolução do comportamento da criança
desde o dia do nascimento até a idade de 2 anos. De início, com seus filhos e,
depois, ele e seus colaboradores observaram crianças do mundo inteiro. Os
primeiros resultados dessas observações, Piaget publicou no livro “O nascimento
da inteligência na criança”, em 1936, a qual mais tarde completou com as obras:
“A formação do símbolo na criança” e “A Construção do Real na Criança”. A
essas publicações se somam muitas outras, pois Piaget se destaca como um dos
autores que mais escreveu e publicou suas pesquisas.
A teoria de Piaget (1978) formalizou o funcionamento cerebral humano
identificando as operações básicas de classificação, seriação ou ordenação, ligados
entre si pela implicação. O segundo aspecto de sua teoria foi demonstrar a
ontogênese desse funcionamento por intermédio de uma embriologia mental,
popularmente conhecida como “estágios do desenvolvimento da inteligência”
59
(CHIAROTTINO, 2005). Estudando esses estágios, Piaget objetivou captar os
indícios de transformações sucessivas na construção do funcionamento das
estruturas mentais, ou seja, como essas transformações se refletem nas ações dos
indivíduos, seja criança, adolescente ou adulto.
Piaget (1978) afirma também, que as crianças constroem ativamente a sua
compreensão do mundo por meio de processos contínuos de assimilação
(incorporando novas informações ao conhecimento já existente) e acomodação,
(reorganizando as formas de entendimento para levar em conta as informações
novas), passando de um estágio a outro através de mudanças qualitativas e
quantitativas do pensamento.
O autor enfatiza o papel da própria criança no desenvolvimento dos
esquemas cognitivos, não acreditando que o mesmo ocorra geneticamente numa
linha de tempo predeterminada e conectada ao cérebro humano. Ao se desenvolver,
a compreensão do mundo pela criança não apenas se amplia gradualmente como é
qualitativamente diferente nas diferentes idades.
De acordo com a teoria piagetiana, a formação dos símbolos mentais se dá
a partir da imitação. Inicialmente, a criança imita determinados comportamentos de
forma tateante e sem interiorização. Estas primeiras ações imitativas são imprecisas
e rudimentares, mas, pouco a pouco, a criança vai aperfeiçoando seus movimentos,
até ser capaz de reproduzir internamente tais ações. A função simbólica percorre
desde as formas iniciais de representação, da imitação e do símbolo lúdico
onírico até o esquema verbal e as estruturas pré-conceptuais elementares. Como
afirma Piaget (1978) o termo “representação” é empregado em dois sentidos muito
diferentes.
No sentido amplo:
... a representação confunde-se com o pensamento, isto é, com toda a
inteligência que
já não se apóia simplesmente nas percepções e
movimentos (inteligência sensóriomotora) e sim num sistema de conceitos
ou esquemas mentais (p. 87).
No sentido restrito:
... a representação reduz-se à imagem mental ou à recordação – imagem,
isto é, à evocação simbólica das realidades ausentes ... poder-se-á admitir
que todo pensamento se faz acompanhar de imagens, portanto, se pensar
consiste em interligar significações, a imagem será um “significante” e o
conceito um “significado” (p. 87).
60
Concordamos com as reflexões teóricas piagetianas admitindo que, falar de
representação simbólica significa ir além do que se vê superficialmente, é
compreender o que está no pensamento humano, conhecer sua essência, sua
historicidade, sua lógica, ou seja, conhecer sua subjetividade. Através das
representações, o conhecimento é construído na interação dos sujeitos com a
realidade implicando construção de sentidos.
As representações infantis são construídas nas relações sociais e culturais
que a criança estabelece, onde exerce o papel de ator e, outras vezes, de
espectador:
Cotidianamente,
enfrentamos
novas
situações
que
demandam
comportamentos únicos e pessoais, que dependem principalmente da nossa relação
com o meio social ao qual pertencemos. As representações estão presentes em
todas as vivências do ser humano como conversas familiares e sociais, brincadeiras,
programas televisivos, etc. Conhecemos e codificamos o mundo através de imagens
que se transformam em representações. Tais representações são diferentes para
cada indivíduo e ele reage aos acontecimentos sociais, levando em conta sua
história de vida, portanto as representações são dinâmicas e abrangentes.
Piaget (1978) destaca que, quando a criança associa a representação ao
representado ela está construindo um sistema de relações recíprocas entre o
significado e o significante. A capacidade de simbolizar supõe, por conseguinte, a
distinção e a complementação no estabelecimento dessas relações.
Para a criança, é importante ter condições de atribuir significação ao mundo,
condições para se perceber como significativa para esse mundo, levando-a a buscar
interação e estrutura sociais.
Para compreendermos como as representações se configuram no
desenvolvimento
cognitivo,
apresentamos
em
seguida,
as
fases
desse
desenvolvimento através da teoria piagetiana.
O autor em referência se dedicou a estudar os estágios do desenvolvimento
da criança em termos de compreensão do mundo físico, entrementes, sua teoria
também pode ser aplicada à compreensão das informações sociais fornecidas pela
mídia e as diferenças de interpretação do conteúdo da mesma que as crianças
constroem com o passar dos anos.
Quanto às etapas do desenvolvimento cognitivo, Piaget (1978) argumenta
61
que o objetivo da criança é adquirir a capacidade de reversibilidade, ou seja, a
possibilidade da operação inversa, onde se percebe, no âmbito do mundo físico, a
ida e a volta como dois aspectos da mesma ação, a possibilidade de fazer e
desfazer, que permitirá, no futuro, compreender, ao lado dos fenômenos reversíveis,
aqueles que são irreversíveis como condição da aquisição da responsabilidade
referente às suas ações em relação ao outro.
São quatro os estágios do desenvolvimento cognitivo que sempre ocorrem
na mesma sequência, embora possa variar a idade na qual as crianças avançam de
um estágio para o seguinte:
1. Estágio sensório-motor (do nascimento aos dois anos), no curso do qual
se constituem os sistemas de esquemas que prefiguram operações, mas sem
nenhuma reversibilidade operatória. Com 2 anos, as crianças já desenvolveram uma
representação interna de esquemas que inclui a capacidade de imitação adiada,
uma compreensão da permanência do objeto, uma compreensão básica de causa e
efeito, o início da linguagem e a consciência de si mesma.
2. Estágio pré-operacional (dos 2 aos 7 anos). É também chamado de
período do pensamento intuitivo, onde as ações sensório-motoras implicam em
representação, imagem mental e já se nota a presença de regulações semireversíveis. Aqui, a compreensão e o pensamento simbólico são reorganizados,
porém, é ilógico e utiliza uma abordagem não-sistemática na solução de problemas.
Durante o início desse estágio, o pensamento da criança é geralmente egocêntrico
(incapaz de considerar outras perspectivas que não sejam as suas) e animista
(atribuindo motivação e características humanas a objetos inanimados e aos
animais). O julgamento da criança, nesse estágio, reflete centralização, isto é,
focaliza uma característica central de um objeto ou pessoa, com exclusão de outras.
Ainda é característica do estágio pré-operacional, a dificuldade da criança para
distinguir entre fantasia e realidade e, essencialmente, baseia suas conclusões no
pensamento intuitivo.
Os sujeitos da pesquisa em questão, são crianças de 3 a 5 anos,
consequentemente pertencentes ao estágio descrito anteriormente. No sistema
educacional brasileiro, são crianças que devem estar frequentando a Educação
Infantil, nas séries do Jardim I e II. A escolha por essa faixa etária se deve por
possuir características do pensamento que favorecem a análise sobre o alcance da
62
mídia, ou seja, como ocorre a aquisição da função simbólica ou de representação.
Este período é marcado pelo interesse pelas causas dos fenômenos (idade dos
porquês), começam a distinguir a fantasia da realidade, são capazes de reproduzir
situações vividas e assistidas e transformam o mundo através das fantasia para
satisfazer seus desejos.
A maioria das pesquisas sobre mídia que utilizam a teoria piagetiana é
focalizada nas limitações cognitivas do pensamento pré-operacional, pois as
crianças que se encontram nesse estágio têm dificuldades para compreender
integralmente a natureza da televisão e seu conteúdo. Um estudo mostrou que
crianças de 2 e 3 anos geralmente acreditam que os personagens vivem dentro do
aparelho de TV (NOBLE, 1975 apud SCHEIBE, 2009). Isto ocorre, porque embora
elas saibam brincar de "faz de conta", se confundem quanto a uma coisa ser real ou
apenas ficção na televisão. Este aspecto foi estudado por outros pesquisadores,
interessados no comportamento do consumidor infantil. No impacto da violência na
mídia, reações de medo das crianças a cenas de monstros e bruxas, etc.
Outras limitações pré-operacionais são pesquisadas em estudos sobre a
compreensão que as crianças desse estágio têm dos processos mentais de outras
pessoas. A criança, nessa fase, acredita que os adultos sabem o que ela sabe, tem
dificuldade para compreender conceitos como falsas crenças e sonhos, como
também distinguir entre aparência e realidade. Quanto aos conceitos abordados nos
desenhos animados, é evidente que a criança, desse período, conquista o
entendimento dos mesmos, no entanto, adotando, em momentos que se alternam o
pensamento lógico e ilógico. É o momento do conflito o qual Piaget considera o
momento que a criança cresce cognitivamente, atingindo a equilibração. “Em
consequência da equilibração, a criança, independente de qualquer outra
experiência, tende a reorganizar suas crenças num sistema coerente, harmonioso e
equilibrado” (BALDWIN, 1973, p. 279).
Para Piaget (1976), há três tipos de equilibração. Levando em consideração
a interação entre o sujeito e os objetos, primeiramente ocorre a assimilação dos
objetos a esquemas e ações e a acomodação do sujeito aos objetos. Há, em
segundo lugar, uma equilibração que assegura as interações entre os subsistemas,
isto é, decorrentes dos desequilíbrios, que ocorrem progressivamente em
63
velocidades diferentes, mais ou menos importantes. Por último, há o tipo de
equilibração, em que ocorre o equilíbrio progressivo da diferenciação e da
integração, ou seja, a hierarquização das relações que unem subsistemas a uma
totalidade que os engloba.
Esses três tipos de equilibração apresentam em comum o duplo aspecto de
serem todas relativas ao equilíbrio entre a assimilação e a acomodação, e de
conduzir os caracteres positivos pertencentes aos esquemas, subsistemas ou
totalidade em jogo (PIAGET, 1976, p. 16). É necessário lembrar que a equilibração
de cada uma das estruturas consideradas tem uma correspondência, a partir da
qual se determinará a natureza das afirmações e das negações ou os caracteres
positivos e negativos das mesmas.
Essas considerações nos levam a pensar: Qual a razão por que ocorrem os
desequilíbrios? Piaget nos afirma no seu livro “A Equilibração das Estruturas
Cognitivas” (1976, p. 18):
Está realmente claro que numa perspectiva de equilibração, uma das
fontes de progresso no desenvolvimento dos conhecimentos deve ser
procurado nos desequilíbrios como tais, que por si só obrigam um sujeito a
ultrapassar seu estado atual e a procurar o que quer que seja em direções
novas. Contudo, não é menos evidente que, se os desequilíbrios
constituem um fator essencial, mas em primeiro lugar motivacional, não
poderiam todos representar o mesmo papel formador e não o conseguiriam
senão com a condição de dar ocasião a avanços, próximos de serem
superados e de chegarem assim a reequilibração específica.
Em conformidade com o exposto, constatamos que a teoria piagetiana
considera que sem os desequilíbrios, o conhecimento permaneceria estático. A
seguir, serão descritas as duas últimas etapas do desenvolvimento cognitivo
propostas por Piaget (1978).
3. Estágio das operações concretas (dos 7 aos 12 anos). É o estágio em
que as crianças demonstram habilidade para manipular mentalmente objetos e
aqueles que se pode perceber. O pensamento ainda não pode raciocinar apenas por
operações verbais e necessita da manipulação. As operações permanecem ligadas
à ação, daí a sua denominação de operações concretas.
4. Estágio das operações formais (dos 12 anos em diante). Nesse estágio, a
maioria dos adolescentes consegue demonstrar um pensamento abstrato. A partir
64
de então, pode-se prescindir da ação e refletir sobre operações. É o pensamento
desligado da ação, quer dizer, é a área da lógica e da dedução matemática.
Tecendo ainda alguns comentários sobre o paradigma construtivista
interacionista, seu princípio é que o pensamento, como progresso cognitivo, é a
expressão da interação do homem com o meio e com ele mesmo.
O ser humano age sobre o meio, donde recolhe os dados iniciais que lhe
permitirão conhecê-lo. A partir dos dados iniciais, percorre um caminho de
análises e de sínteses através de um conjunto de operações, que se
constroem gradualmente, obtém uma representação desse mundo, pode
atuar sobre ele, modificando-o, a reiniciar o caminho ante cada mudança
(SANTOS, 1977, p. 33).
A investigação sobre mídia e subjetividade em crianças de 3 a 5 anos, nos
leva ainda a buscar subsídios na teoria piagetiana sobre a natureza individual ou
social da lógica. Baseando-se em Durkheim, o qual afirmava que o pensamento
individual era formado pelo grupo devido à linguagem e às coações de cada geração
sobre as seguintes; Piaget (1973) expõe suas considerações que complementam
esse postulado. Ele assegura que: "... um todo coletivo não é idêntico à soma dos
indivíduos que o compõem, pois este todo exerce sobre as consciências coações
que as modificam..." (p. 166).
Existem, todavia, três interpretações possíveis sobre a natureza da lógica.
Primeiramente ordem, se não houvesse sociedade, existiria o individualismo
atomístico, ou seja, o todo é a simples resultante das atividades individuais. Existe,
em segundo lugar, a interpretação do realismo totalitário onde o todo impõe sua
lógica e modifica os indivíduos. Pode-se conceber em terceiro lugar, que a lógica
social advém não da soma dos indivíduos, mas da soma das relações entre os
indivíduos. Cada relação ou interação constituiria um todo, já a partir de dois
indivíduos, e a sociedade seria a expressão do conjunto destas interações entre
indivíduos.
No presente estudo consideramos os pressupostos piagetianos discutidos
logo acima, importantes para observarmos a interrelação mídia televisiva e
subjetividade infantil. Como estamos falando de relações interindividuais, queremos
dar destaque às que são dos tipos das mesmas que irão determinar as relações
sociais. Existem as relações coercitivas que implicam uma autoridade e uma
65
submissão as quais conduzem à heteronomia, e existem as relações de
cooperação que implicam a igualdade de direito ou autonomia, e a reciprocidade
entre personalidades diferenciadas.
Ao descrever a ação coercitiva sobre os indivíduos que integram o estágio
pré-operacional e cujo pensamento é egocêntrico, Piaget revela que a coerção
exerce influência negativa considerável no sujeito que busca a equilibração. Isto
ocorre, pois o sujeito pré-operacional não é capaz ainda da propriedade da
reversibilidade completa que supõe o simbolismo, ou seja, "porque só é por uma
referência à evocação possível dos objetos ausentes que a assimilação das coisas
dos esquemas da ação e a acomodação dos esquemas às causas atingem
equilíbrio permanente e constituem, assim, um mecanismo reversível" (PIAGET,
1973, p. 195).
No item seguinte prosseguimos aprofundando como ocorre a construção do
pensamento da criança à luz do paradigma sócio-cultural de Vygotsky (2007).
3.2 Construção, Interação, Cultura – Lev Vygotsky: Outro olhar
O psicólogo russo Lev Vygotsky (1896 – 1934) morreu precocemente vítima
de tuberculose aos 37 anos, mas sua obra muito tem ainda a ser descoberta e
debatida em várias partes do mundo, inclusive no Brasil.
Vygotsky procurou superar tanto um idealismo cego a condições históricas
de constituição do sujeito quanto um materialismo mecanicista, que reduz a psique
a determinações empíricas. Para ele, a consciência não é simples reflexo da
história, pois a própria materialidade histórica é formada pela ação das consciências
envolvidas em processos de interação social.
A abordagem sociocultural cognitiva proposta por Vygotsky almeja integrar,
numa mesma perspectiva, o ser humano como corpo e mente, como ser biológico e
cultural, como membro de uma espécie animal e participante de um processo
histórico.
Ele defende a idéia de contínua interação entre as mutáveis condições
sociais e a base biológica do comportamento humano. A partir de estruturas
orgânicas elementares, determinadas basicamente pela maturação, novas e mais
complexas funções mentais se formam, dependendo da natureza das experiências
66
sociais a que as crianças estão expostas.
Para Vygotsky (2007), o fundamento do funcionamento psicológico humano
é cultural e, portanto, histórico. Nessa teoria, é dada importância às possibilidades
que o indivíduo dispõe no ambiente em que vive e que acesso tem a instrumentos
físicos como a enxada, faca, mesa e a instrumentos simbólicos, como a cultura,
valores, crenças, costumes, tradições, conhecimentos, desenvolvidos por outros
indivíduos no passado ou no presente nas relações interpessoais.
Os sistemas simbólicos e, particularmente, a língua exercem um papel
fundamental na comunicação entre os sujeitos e no estabelecimento de
significados compartilhados que permitem interpretações dos objetos, eventos e
situações do mundo real (OLIVEIRA, 2005).
Vygotsky (2007) atribui o surgimento da linguagem à necessidade de
intercâmbio dos indivíduos durante o trabalho, atividade especificamente humana.
Como filiado marxista, vem daí a importância que ele dá ao trabalho na história da
espécie humana. É o trabalho que, pela ação transformadora do homem sobre a
natureza, une homem e natureza e cria a cultura e a história humanas. As relações
sociais ocorrem na atividade coletiva do trabalho como também ocorrem a criação
e utilização de instrumentos, ampliando as possibilidades de transformação da
natureza. É através do trabalho que os indivíduos planejam e agem, isto é, utilizam
a comunicação e troca de informações precisas e compartilhamento de
significações. Nessa inter e autocomunicação dos indivíduos surge a consciência
que, por conseguinte não é um estado interior preexistente, mas uma construção
de natureza histórico-cultural, intimamente relacionada ao processo compartilhado
de construção de signos e significações.
O sujeito humano é constituído por aquilo que é herdado fisicamente e pela
experiência individual, mas sua vida, seu trabalho, seu comportamento
também se baseiam claramente na experiência histórica e social, isto é,
aquilo que não foi vivenciada pessoalmente pelo sujeito, mas está na
experiência dos outros e nas conquistas acumuladas pelas gerações que o
precederam (OLIVEIRA, 2005).
Assim, podemos considerar que a teoria vygotskyana têm aplicações
no estudo da mídia em geral. Tratando-se da mídia televisiva, o conhecimento
que os indivíduos adquirem poderá advir da mesma, onde anúncios, histórias
67
de ficção, desenhos animados e outros programas se "incorporam" aos
conhecimentos anteriores ou os transformam.
Vygotsky, no entanto, não teve intenção de colocar uma possível
interpretação determinista da abordagem histórico-cultural. Em contraponto a
isto, ele postula a existência de um mundo interior em constante movimento, e
de uma margem de controle do próprio sujeito sobre sua vida psicológica,
sendo esta a sua autonomia enquanto sujeito.
Esta última conclusão vygotskyana é importante, pois nos faz constatar
que é impossível controlar o fluxo da produção psicológica, ou seja, o mundo
interior do sujeito. Como humano e, mergulhado na cultura e na história,
através do compartilhamento de signos e significados com seus interlocutores,
o indivíduo estará sempre imbuído de consciência.
É importante, aqui, também, a organização dinâmica da consciência: a
mudança nas inter-relações entre as funções psicológicas superiores,
mais do que o aperfeiçoamento das funções isoladas, é o principal
responsável pelo desenvolvimento da consciência (OLIVEIRA, 2005).
Quanto aos instrumentos e signos no desenvolvimento psicológico,
Vygotsky (2007) enfatiza a importância dos chamados meios artificiais para o
controle de processos psicológicos. Esses meios artificiais são produto do
desenvolvimento histórico e reorganizam, no interior da cultura, as funções
psicológicas humanas, modificando-as ou não.
Os processos educacionais são mecanismos culturais de desenvolvimento,
que introduzem novas funções, alterando o curso dos processos naturais. Tais
processos culturais podem se apresentar com uma intencionalidade educativa, como
na relação pedagógica na escola, ou em contextos onde não se percebe essa
intencionalidade, por exemplo, através dos meios de comunicação de massa
(televisão, rádio, internet, etc.). Qualquer que seja a relação, se promove o reequipamento do sujeito cultural, pela introdução de meios artificiais em seus
processos
psicológicos.
A
mídia
televisiva
pode
ou
não
expressar
sua
intencionalidade. Porém consideramos que como citação exposta pelo ex-comissário
Nicholas Johnson: "Toda a televisão é uma televisão educativa. A questão é: o que
está ensinando?" (Citações sobre a Televisão, 2006, apud MAZZARELLA, 2009).
Após essa visão geral do paradigma sociocultural de Vygotsky,
68
apresentamos como o psicólogo russo explica a interiorização progressiva das
orientações advindas do meio social.
Como já foi comentado, a teoria vygotskyana não é marcada por um
determinismo social sobre o individual. Ao contrário, a criança se apropria do social
de uma forma muito particular, de maneira que interiorização e transformação
interagem constantemente. Ela, a criança, é capaz de se integrar ao social e ao
mesmo tempo também posicionar-se frente ao mesmo, ser seu crítico e seu agente
transformador.
Ao internalizar instruções, as crianças modificam suas funções
psicológicas: percepção, atenção, memória, capacidade para solucionar
problemas. É dessa maneira que formas historicamente determinadas e
socialmente organizadas de operar com informação influenciam o
conhecimento individual, a consciência de si e do mundo (DAVIS e
OLIVEIRA, 1994).
A título de exemplo, podemos citar como em diferentes épocas a
sociedade apresenta sua visão e forma de interagir com as crianças. A concepção
de crianças dos séculos XV a XVIII, difere profundamente da concepção das
crianças do mundo moderno, fortemente influenciadas pelos meios de comunicação
de massa. Estamos nos referindo a crianças que apresentam formas diferentes de
organizar, planejar e atuar sobre a realidade. Tal visão contemporânea encontra-se
respaldada pela teoria vygotskiana, quando ele postula que as funções mentais
superiores aparecem primeiramente no plano social e depois surgem no plano
psicológico. A construção do real pela criança, isto é, a apropriação que ela faz da
experiência social, parte do social – da interação com os outros – e paulatinamente,
é internalizada por ela.
Para Vygotsky (2007) a aquisição de um sistema linguístico reorganiza os
processos mentais infantis. Através da palavra atribuída a um objeto, a criança·
especifica as principais características desse objeto, as generaliza e relaciona-as em
determinadas categorias. Daí a importância da linguagem para o pensamento: ela
sistematiza a experiência direta da criança e serve para orientar o seu
comportamento.
A fala externa, acompanha frequentemente o comportamento infantil até
cerca de três anos de idade. A partir dessa idade, é comum se observar que a fala
69
precede a ação, ou seja, a criança anuncia o que irá fazer a seguir. Essa é a função
de planejar a ação, de guiar as atividades da criança, que faz parte do pensamento
complexo. Após a idade de seis anos, pouco se ouve a criança falar para si em voz
alta, porém, quando há confronto com situações – problemas de difícil solução, a
fala externa volta a aparecer, auxiliando a atividade cognitiva. Para o referido autor,
pensamento e linguagem se interligam e utiliza a expressão "pensamento verbal"
para designar a interseção entre eles.
Divergindo de Piaget (1978), Vygotsky (2007) não aceita a possibilidade de
existir uma sequência universal de estágios cognitivos. Para ele, os fatores
biológicos preponderam sobre os sociais, apenas no início da vida das crianças. As
condições e as interações humanas é que afetam grandemente o pensamento e o
raciocínio nas múltiplas oportunidades que se abrem para cada criança no
transcorrer da infância.
Para Vygotsky (2007), o processo de formação de pensamento é
despertado e acentuado pela vida social e pela constante comunicação que se
estabelece entre crianças e adultos, as quais permitem a assimilação da
experiência de muitas gerações. Como já foi dito, na interação social ocorrem
situações de aprendizagem, das quais as crianças se apropriam e podem passar a
usá-las de modo independente. Nessa apropriação, elas utilizam a inteligência que,
para Vygotsky (2007), é uma habilidade do homem de entender e utilizar a
linguagem, e não como outras concepções de que a inteligência é resultante de
aprendizagens prévias.
A
teoria
vygotskyana
ainda
apresenta
o
conceito
de
"zona
de
desenvolvimento potencial" para se referir à distância entre o nível de
desenvolvimento atual e o nível potencial de desenvolvimento. O primeiro, diz
respeito ao que sujeito é capaz de realizar sem ajuda, e o segundo é medido através
da solução de problemas sob a orientação ou em colaboração com as crianças mais
experientes.
Nessa concepção, é possível afirmar que a diferença entre as crianças
deve-se, em grande parte, à diferença qualitativa em seu ambiente social, ou seja,
as diferentes formas de se relacionarem com as pessoas em seus ambientes.
As diferenças encontradas nos diferentes ambientes sociais das crianças
70
promovem aprendizagens diversas que podem ativar processos de desenvolvimento
também diversos. "Assim, a aprendizagem precederia o desenvolvimento intelectual
ao invés de segui-lo ou de ser com ele coincidente" (DAVIS e OLIVEIRA, 1994).
Para a investigação sobre mídia televisiva e subjetividade, a teoria
vygotskyana ajuda a explicar como realmente a qualidade das trocas provindas dos
conteúdos cognitivos influencia decisivamente na forma como as crianças tornam
mais complexo o seu pensamento e processam novas informações.
A atividade favorita de toda criança é brincar que, para Vygotsky (2007), tem
como uma das· funções permitir que a criança aprenda a elaborar e resolver
situações conflitantes do seu cotidiano, através de capacidades como observação,
imitação e imaginação. Quando a criança assiste aos desenhos animados, para ela
é lazer, é brincadeira.
É na brincadeira que a criança reproduz sua própria vida. No jogo de “faz de
conta”, ela dirige seu comportamento pelo mundo imaginário, assim, o pensamento
está separado dos objetos e a ação surge das idéias. Para Vygotsky (2007), a
imitação e o “faz de conta” permitem à criança alcançar a internalização que é o
processo
onde ocorre
a
reconstrução interna
daquilo
que
é
observado
externamente.
Ao assistir desenhos animados que fazem parte do cotidiano da maioria das
crianças, elas criam para si um universo fantástico que mistura o sonho, ficção e
aventura com a realidade. Elas assumem o papel do herói ou da heroína, acreditam
poder realizar todas as peripécias do personagem, inclusive salvar a humanidade.
O processo de desenvolvimento é, então, a apropriação ativa do
conhecimento disponível na sociedade em que a criança se encontra. Ela aprende e
integra à sua forma de pensar o conhecimento da sua cultura.
Necessário se faz, diante do presente estudo, nos determos na concepção
vygotskyana da natureza cultural do desenvolvimento humano.
Duas importantes premissas são extraídas de seus estudos. Primeiro: a
cultura é uma produção humana e, segundo, essa produção humana tem duas
fontes simultâneas: a vida social e a atividade social do homem. Isto quer dizer que,
para Vygotsky (2007), a cultura é o conjunto das obras humanas dotadas de
significado e que, entre ela e a natureza, existe uma linha divisória que, ao mesmo
71
tempo, as separa e as une, pois essa linha passa pelo homem, que é,
simultaneamente, obra da natureza e agente de sua transformação.
Ao dizer que o desenvolvimento humano (psicológico) é de natureza
cultural, Vygosky (1993) está teorizando que as funções psicológicas superiores,
que têm sua origem no plano social, e não no plano biológico, têm que se constituir
no plano pessoal. Como afirma Pino (2005): "o desenvolvimento cultural do
indivíduo supõe, portanto, uma transposição de planos, permanecendo o objeto
dessa transformação no plano de origem".
Para
que
essa
transposição
de
planos
se
processe,
ocorre
a
internalização, que corresponde ao trajeto que vai do exterior para o interior do
indivíduo, ou como Vygotsky (2007) coloca: "é a reconstrução interna de uma
operação externa".
Na tentativa de maior esclarecimento, sabemos que o que ele denominou de
internalização é um processo de natureza semiótica, ou seja, está sob a ordem
abstrata da significação. Entender esse processo é muito importante para se
entender como ocorre a constituição cultural do ser humano. O campo da
significação não é algo homogêneo, todos pensam ou tendem a pensar de forma
igual. O que ocorre no campo da significação é o delineamento de áreas de maior
estabilidade e unidade como os significados socialmente instituídos, e áreas de
maior instabilidade e diversidade, que é o caso do sentido que os significados
culturais instituídos têm para indivíduos e grupos diferentes. Resumindo, podemos
dizer que a constituição cultural do ser humano se dá quando ele converge os
significados culturais da sociedade em significados próprios, não como simples
reprodução, mas como interpretação por parte do sujeito que pode atribuir aos
significados culturais um sentido próprio.
Ainda, necessário se faz ressaltarmos na teoria histórico-cultural do
desenvolvimento humano dois pontos importantes. Primeiro, Vygotsky apresenta
em seus escritos, que no ser humano existe ao mesmo tempo, continuidade e
ruptura entre o biológico e o cultural. "Continuidade porque o cultural supõe o
biológico para poder constituir-se; ruptura porque o biológico é transformado sob a
ação do cultural" (PINO, 2005). Segundo, que Vygostky, embora considere as
significações culturais (aquelas atribuídas pelos homens às suas obras) a matériaprima do psiquismo humano, decorre disto que os homens de todos os tempos têm
72
em comum aquilo que define como humano sua natureza. Ele, por outro lado,
também afirma que os homens são todos diferentes, pois cada um deles é uma
versão singular da natureza cultural dos homens. Só para reafirmar: a
internalização das significações culturais passa pela interpretação que cada
indivíduo apresenta em relação a essas significações.
Podemos assim afirmar que a subjetividade fica salvaguardada, não fica
comprometida. Isto ocorre como Vygotsky assevera, pois a conversão das
significações culturais em significações pessoais garantem a subjetividade e a
identidade pessoal de cada indivíduo.
Toda a função aparece duas vezes, em dois níveis, ao longo do
desenvolvimento cultural da criança; primeiramente entre pessoas, como
categoria interpsicológica e depois dentro da criança, como categoria
intrapsicológica (VYGOTSKY, 2007).
Tal concepção da constituição humana nos liberta da temerosa
coletivização do psiquismo e da ameaça de destruição da subjetividade.
Acrescentando a essa concepção, reforçando e/ou contrapondo, nos
próximos itens, desenvolvemos os temas da análise da cultura na Teoria Crítica,
abordando globalização, indústria cultural e consumo. O desenvolvimento desse
item se faz necessário pela investigação sobre mídia televisiva e formação da
subjetividade por estarem intrinsecamente ligadas aos referidos conteúdos.
3.3 Globalização, Indústria Cultural e Consumo
Vivenciamos, em pleno século XXI, a era da imagem que, produzida por
especialistas, torna-se impactante. No caso dos desenhos animados, os grandes
especialistas são os Estados Unidos da América, a França e o Japão, que exibem
suas criações em seus países de origem, e também exportam para tantos outros
através das TVs abertas e por assinatura.
Ao optarmos pelo título acima citado – globalização, indústria cultural e
consumo – deparamo-nos com um dilema, pois surgiu a questão: “Qual a ordem em
que devemos discutir os termos? A conclusão a que chegamos é que os termos
referem-se a fenômenos sociais inerentes à vida de qualquer indivíduo, com uma
73
relação
intrínseca
de
retroalimentação em
que
cada
um
ocorre
numa
interdependência contínua, num movimento perene de ida e de volta, não
importando a ordem de apresentação dos mesmos.
Introduzimos nossa discussão, apresentando o termo globalização para
designar determinados fenômenos sociais, econômicos e culturais ocorridos na
contemporaneidade.
Para
Scocuglia
(2006),
a
nomenclatura
deveria
ser
mundialização, dado o seu aspecto histórico, porém, como a literatura consagrou o
termo globalização como definição do processo, o autor o adota.
A globalização é um fenômeno complexo que mobiliza um conjunto de
fatores multidirecionais de ordem econômica, política e cultural, cujos efeitos
também são problemáticos. No entanto, a globalização tem reestruturado a
arquitetura do Estado, das sociedades, das organizações e dos indivíduos, e sua
influência afeta e modela as reformas sociais, dentre elas, as políticas e práticas em
educação. Essa influência da globalização sobre a educação e a cultura ocorre de
forma dupla: dando oportunidades de reajustamento face às exigências do mercado
e, também, oportunidades de resistência ou de mobilização.
Esses conceitos aqui são apresentados, pois nossa pesquisa investiga a
relação entre subjetividade e conteúdos dos desenhos animados que fazem parte da
mídia televisiva e que, por sua vez, participam dos processos de globalização.
Feitas estas considerações mais gerais, vamos nos deter nas interrelações
do processo de globalização nos campos da cultura e da educação. Vários
estudiosos utilizam esse tema como objeto de estudo. Apresentamos um dos mais
significativos, disseminado e traduzido em vários países, inclusive no Brasil,
realizado por Dale (2004) o qual examina a relação globalização – educação –
considerando
duas
abordagens
teóricas.
A
primeira
denominada
“Cultura
Educacional Mundial Comum” (CEMC) foi elaborada por John Meyer e seus colegas
da Universidade de Stanford (Califórnia) e a segunda, desenvolvida pelo próprio
Dale (2004), é designada como “Agenda Globalmente Estruturada para Educação”
(AGEE).
A abordagem CEMC defende que o desenvolvimento dos sistemas
educativos nacionais e das categorias curriculares, ocorrem através de modelos
universais de educação, de estado e de sociedade, mais do que através de fatores
74
nacionais distintivos. O argumento central é de que as instituições do estado –
nação e o próprio estado são moldados através da ideologia do mundo dominante
(ou Ocidente) e não como criações nacionais autônomas e únicas (DALE, 2004). O
estado seguindo a uma ideologia dominante, submete as normas, a cultura e as
categorias curriculares a uma homogeneidade.
Para a CEMC a educação e o currículo das escolas estão ligados aos
modelos ditados pela sociedade que se tornaram padronizados a nível mundial.
As pretensões da CEMC são fundamentalmente a respeito da existência e da
natureza de um conjunto universal de normas, idéias e valores que
independentemente de qualquer delas informam e modelam a própria
natureza dos estados, assim como das suas políticas (DALE, 2004).
A outra abordagem, essa desenvolvida pelo próprio Dale (2004), designada
Agenda Globalmente Estruturada para a Educação (AGEE), considera a mudança
de natureza da economia capitalista mundial, como a força diretora da globalização
e ainda procura estabelecer os seus efeitos sobre os sistemas educativos. Na
abordagem AGEE, a globalização é construída através de atividades econômicas,
políticas e culturais, relacionadas entre si, que podem ser caracterizadas como
hiper-liberalismo, governação sem governo e mercadorização e consumismo,
respectivamente. Para AGEE, a educação não é um reflexo da economia, ou sua
consequência como postula a primeira abordagem, Dale (2004) considera que é
necessário uma análise das relações da educação com a desigualdade social em
nível global como nacional, e alerta para a não neutralidade da prática curricular. O
currículo é o processo de determinar o conteúdo desejável para a educação; e as
metodologias são ditadas pelo sistema educativo como parte de um quadro nacional
regulador mais amplo. Nesse ponto, ele reafirma que “as variações nacionais
continuam fortes, que a cultura mundial está longe de ser homogênea e que a
incorporação do modelo pode acontecer a um nível meramente ritual”.
Resumindo a relação da globalização com a educação da CEMC e da
AGEE, Dale (2004) afirma que as pretensões das duas abordagens são muito
diferentes. Ele considera que a CEMC:
... (trata) fundamentalmente a respeito da existência e da natureza de um
conjunto universal de normas, idéias e valores que independentemente de
75
qualquer delas informam e modelam a própria natureza dos estados, assim
como das suas políticas (...)
E que a AGEE, por sua vez, pretende:
... ter identificado uma mudança de paradigma, um nível novo e
qualitativamente sem precedentes de globalização que tem mudado o papel
do estado tanto nacional como internacionalmente. Esta mudança afetou
diretamente, mas de uma forma mais significativa, indiretamente, através do
impacto da globalização sobre o estado, os sistemas e políticas educativas
usando mecanismos que podem ser espeficiados e seguidos (...)
Como vimos, ambas as proposições muito tem a contribuir para a
compreensão de como a globalização afeta a educação
Podemos acrescentar, ainda sobre o fenômeno da globalização, que o
mesmo contém aspectos contraditórios (positivos e negativos). É bom lembrar que a
globalização é um processo que vem se desenvolvendo nas sociedades há muitos
anos com mudanças significativas.
Pela própria evolução do capitalismo, ao longo de vários séculos, diversos
aspectos vem se alterando: o ritmo, a intensidade, a velocidade, o próprio
alcance graças às recentes e incessantes conquistas científicotecnológicas, graças ao processo de reestruturação produtiva e à
reorganização dos processos de trabalho, o fenômeno se tem
complexificado sobremaneira, ao longo das últimas décadas (CALADO,
2003).
Quanto ao aspecto contraditório do processo de globalização, nos referimos
à positividade e à negatividade que ela acarreta ao mesmo tempo. No âmbito
mundial, podemos assistir a sinais promissores de mudança qualitativa de vida e
situações humanísticas protagonizadas pela globalização. Da mesma forma, a
globalização pode promover um mundo economicamente injusto, politicamente
desigual e culturalmente opressor. Quanto a essa contradição, Calado (2003) afirma
que o que se deve combater é a natureza perniciosa que o capitalismo vem
imprimindo às relações sociais, em escala mundial. Quanto à globalização, devemos
nos empenhar em nos tornarmos protagonistas de um processo alternativo de
globalização. O autor apresenta alguns pontos – desafio como propostas, mas
adverte que não servem como “receita”. São caminhos e atitudes alternativas seja
no âmbito pessoal, seja no âmbito dos movimentos sociais e organizações de base.
76
No âmbito pessoal o autor sugere como valores alternativos dentre outros: a vida
(humana e do planeta), relações horizontais e coletivas, cooperação como chave
para o sucesso de todas, trabalho como auto-realização e, este, deve ser realizado
com a mente e com as mãos, etc.
No âmbito dos movimentos sociais e de organizações de base o autor
elenca vários pontos – desafio tais como: conscientização das raízes estruturais,
mais do que simplesmente conjunturais, não se deixar vencer pela sedução dos
caminhos fáceis; fazer incessante leitura crítica da realidade social, etc. (CALADO,
2003).
Esses e outros caminhos são apresentados e debatidos quando tratamos de
pedagogia crítica e resistência. Passemos a analisar o segundo termo proposto – a
indústria cultural.
A expressão indústria cultural foi utilizada pela primeira vez em 1947, por
Adorno e Horkheimer, dois sociólogos do Instituto de Pesquisa Social de Frankfurt,
quando publicaram o livro Dialética do Esclarecimento.
A evolução do programa de pesquisas do Instituto de Pesquisa Social de
Frankfurt pode ser dividida em três fases distintas: a fase do “materialismo
interdisciplinar” (1932 – 37), a abordagem da “teoria crítica” (1937 – 1940) e a
“crítica da razão instrumental” (1940 – 1945) (BENHABIB, 1996). Durante essa
trajetória, o objetivo foi sempre elaborar um programa de pesquisa social
interdisciplinar para dar base a uma teoria crítica da sociedade. Nos anos 60, já com
alguns membros do grupo radicalizados nos Estados Unidos, a esses teóricos e seu
conjunto de idéias possibilitou-se falar na Escola de Frankfurt.
Adorno e Horkheimer pretendiam estigmatizar a reprodução em série dos
bens culturais, que eles consideravam colocar em perigo a criação artística. O termo
indústria cultural para eles visava substituir a expressão “cultura de massa”, pois a
mesma induz ao engodo que satisfaz aos interesses dos detentores dos veículos de
comunicação de massa. Estes últimos querem dar a entender que cultura de
massas é como uma cultura surgindo espontaneamente das próprias massas. Para
Adorno, tal não ocorre, pois afirma ele que a indústria cultural é quem adapta seus
produtos ao consumo das massas e determina o próprio produto.
77
Adorno e Horkheimer (1985) expõem de modo bem claro que a cultura se
converteu em mercadoria. A proposição advém da expressão desenvolvida por eles
de indústria cultural, a qual refere-se às indústrias interessadas na produção em
massa de bens culturais, ressaltando que a expressão não diz respeito às empresas
produtoras nem às técnicas de difusão de bens culturais, e sim a um movimento
histórico-universal. Para melhor entendermos esse movimento podemos dizer que,
com a civilização, os indivíduos foram retirados do barbarismo, pois ela (a
civilização) é geradora de avanços, porém, ao mesmo tempo, é geradora de “novas
sujeições e dependências responsáveis pelo aparecimento de sintomas regressivos
na cultura e de uma silenciosa coisificação da humanidade” (RÜDIGER, 1999).
De formal geral, a Escola de Frankfurt destacava os aspectos negativos da
modernidade industrial, considerando-a incapaz de transmitir uma cultura que
atingisse os sujeitos em sua profundidade, reduzida à padronização superficial. A
Teoria Crítica realçava a necessidade de valorização do sujeito em seus desejos e
opiniões, a despeito do que denominou racionalidade instrumental.
Esse fenômeno ganhou status de paradigma da sobrevivência e passou a
dominar todas as esferas da sociedade, principalmente na passagem do século XIX
para o XX. O capitalismo passou, então, do estágio da livre iniciativa para o da
competição corporativa, tendo o Estado como interventor. Tudo concorria para que
os novos burgueses fossem abalados por um processo de massificação, pois os
fatos sociais passariam a ter como explicações idéias padronizadas. Daí, a
necessidade da crítica da economia política ser suplantada por uma crítica da
indústria cultural.
A cultura como mercadoria favorece a idéia de que é possível fazer-se
sujeito por meio da compra de bens de consumo. Quanto mais se consome, mas a
indústria tem que produzir ou vice-versa, criando um círculo vicioso cada vez mais
abrangente, compondo o princípio do “consumo estético massificado”. Já não se
detecta um único produto, mas uma produção em série. Não se diferencia mais
entre criação ficcional e prática de mercado. Nas obras de ficção se encaixam os
produtos a serem vendidos, o que se denomina merchandising ou estratégias de
mercado.
No desenho animado vários elementos que o compõem são pensados e
produzidos para encantar, porém, também fazem parte de “uma estratégia comercial
78
e discursiva que a emissora chama de entretenimento” (PIROLA, 2006). Os
elementos a que nos referimos dizem respeito à plástica corporal, loccus
frequentado, características de personalidade dos personagens centrais, vilões ou
heróis dos desenhos. São sujeitos padronizados que só mudam na imagem, mas
que se repetem em quase todo desenho animado. As pesquisas de mercado
identificam os valores e expectativas do “leitor modelo”, seja ele criança, jovem ou
adulto. Usam técnicas de captura, de aproximação e de identificação do
telespectador com o desenho. Esse telespectador, do outro lado da telinha, migra
para dentro da trama porque se identifica com os valores ali colocados (está no seu
imaginário). Além do mais, esse encantamento está revestido de valores positivos.
Em se tratando do desenho animado, a imagem é um espetáculo recheado de
cores, brilho, formas, figuras, embaladas pelo som e movimento. A imagem é ainda
um entretenimento, e esse aspecto lúdico advém do fato de ser simplesmente uma
imagem. Os recursos tecnológicos estão cada vez mais refinados, a exemplo da
perolização dos corpos em computação gráfica, a linha transparente e brilhosa que
circunda os desenhos em três dimensões e o contraste das cores.
Resumindo, as mercadorias culturais são criações artísticas e literárias, que
englobam, a partir de então, a ordem econômica. Os meios de comunicação
cumprem um papel determinante nessa dinâmica, quando promovem publicamente
os artigos que “devem” ser consumidos como veículos de determinados valores
comuns. Os produtos da indústria passam a ser produzidos e vendidos como bens
simbólicos e, pouco a pouco, assumem o caráter de mercadorias culturais
tecnológicas. As propagandas de automóveis, veiculadas pela televisão, por
exemplo, transmitem imagens belíssimas de pessoas alegres, bem sucedidas,
saudáveis e que “sabem” o que querem, pois fizeram uma boa escolha, ao
comprarem aquele carro. Assim se procede com todas as mercadorias sejam
produções tecnológicas ou culturais.
Essa última situação percebemos quando se aproxima a exibição de um
novo programa televisivo. A televisão utiliza anúncios insistentes e chamativos (daí o
nome técnico de chamada) que o telespectador se sente impelido a assistir, ficando
impossível de se distinguir o que é arte e o que é anúncio. Esse processo é o que
denominamos indústria cultural, ou seja, “o conjunto de práticas através das quais se
79
expressam as relações sociais que os homens entretém com a cultura no
capitalismo avançado” (RÜDIGER, 1999).
Em última instância, constatamos que é, cada vez mais difícil, distinguir se
estamos cantarolando uma música da moda porque gostamos de sua melodia ou
porque insistentemente a campanha publicitária “nos convenceu a gostar”. Embora
concordando com essa idéia, lembramos que o capitalismo criou um mercado de
bens culturais que permitiu aos artistas e intelectuais libertarem-se das autoridades
políticas e religiosas e passaram, como puderam, a viver por conta de sua atividade
criadora. Pode surgir, ainda, o fato de o artista conquistar espaço por meios
inescrupulosos, como assinar obras que não são suas. O mercado da cultura
sempre foi ambivalente na medida em que permitiu a liberdade de criação dos bens
culturais, mas, por outro lado, suscitou a necessidade de esses bens darem lucro
para os que com eles negociavam, levando à sua adaptação o padrão de gosto dos
compradores. O homem torna-se vítima, quando considerado que se instauraria o
seu poder sobre a ciência e sobre a técnica; vê-se dominado por elas, mesmo que
ele não permita essa dominação.
Nas palavras de Adorno (2002) “a indústria cultural impede a formação de
indivíduos
autônomos,
independentes,
capazes
de
julgar
e
de
decidir
conscientemente“. Até mesmo fora do ambiente de trabalho, na diversão e no lazer,
a indústria cultural utiliza esse espaço com o fim de mecanizar o indivíduo. Ele
“absorve” o conteúdo como um prolongamento do trabalho, isto é, tudo ocorre numa
lógica contínua de: preciso do lazer, preciso do trabalho. Nessa concepção, para
Adorno “a diversão é buscada pelos que desejam esquivar-se ao processo de
trabalho mecanizado para colocar-se, novamente, em condições de se submeterem
a ele”. Exemplificando, podemos lembrar dos conteúdos temáticos dos programas
televisivos, das peças de teatro, dos filmes, ou de atividades físicas de lazer. Todos
são fabricados como cópias ou reproduções do trabalho. O suposto conteúdo é uma
simples fachada: o que lhe é dado é regulado. Parece sinistro e aterrorizante
perceber que sempre haverá uma idéia subjacente nos produtos culturais e que o
homem está sob o poder da mecanização até no seu tempo livre. Para Adorno,
(2002), “só se pode escapar ao processo de trabalho na fábrica e na oficina,
adequando a ele o ócio.”
80
A indústria cultural cria condições para a implantação de um comércio, no
qual os consumidores podem ser continuamente enganados em relação ao que lhes
é prometido, mas não é cumprido. A exemplo disso, podemos voltar a propaganda
do automóvel. Ela anuncia que: “algumas pessoas já nascem sabendo o que
querem” e apresentam um bebê dormindo muito confortavelmente no interior do
carro. Porém, a situação demonstra a atitude dos pais para expressarem seu desejo
de “ter” o automóvel e de fazerem calar o choro do filho. O bebê irá continuar a não
saber o que quer, e os pais a se dobrarem pela ilusão de o “ter” ser sinônimo de
“poder”.
Criando “necessidades” ao consumidor, a indústria cultural organiza-se para
que ele compreenda sua condição de mero consumidor, instaurando-se a
dominação natural e ideológica. Essa dominação está intimamente ligada ao desejo
de posse, constantemente renovado pelo progresso técnico e científico e controlado
eficazmente pela indústria cultural. Diante desse contexto, o universo social é um
universo de “coisas” e o homem estaria fascinado com os mistérios do valor e o
poder do dinheiro dessas “coisas”. É o caráter alienado da produção, reflexo
subjetivo da separação entre a capacidade de trabalho do homem e a maneira de
ele se apropriar dos seus resultados na sociedade capitalista.
De acordo com Adorno, o movimento da indústria cultural coincide com o da
publicidade: “a publicidade é o exibir da vida da indústria cultural” (apud RÜDIGER,
1999). Com isso, as pessoas atribuem um valor muito maior às obras de arte, do
que essas obras possuem, pois o que elas estão consumindo é a imagem social que
lhe deu a máquina da propaganda.
Observando as pessoas nos grandes magazines ou “shoppings centers”,
pode-se detectar um prazer no ato de comprar, onde são desprendidas muitas
horas, e não se percebe o tempo passar. Essas pessoas se confundem com os bens
simbólicos, pois esses bens, através da indústria cultural, se assemelham a eles
mesmos. As necessidades passam a coincidir com o exercício, direto ou indireto do
poder de compra. Os valores culturais passam a ser gerados pelo próprio mercado
através dos mecanismos de oferta e procura e a ação da publicidade.
Todos os hábitos de consumo do homem moderno encontram-se
precondicionados pelos esquemas da cultura mercadológica. Todos nós já nos
tornamos, hoje, “filhos” da indústria cultural.
81
Por fim, vamos falar sobre consumo que, por sinal, intrinsecamente já foi
abordado quando falamos de globalização e de indústria cultural.
Olmos (2006) nos alerta que a criança nos dias atuais é educada para o
consumo, pois
quando assiste
televisão
é
submetida às estratégias
de
entretenimento e aceitação de produtos veiculados pela mídia no interior da
programação televisiva, ou apresentados em banners, outdoors, etc.
Esse processo educando para o consumo, permite a construção de valores
a partir de modelos que lhe são apresentados por uma sociedade que só
reconhece quem tem poder de compra e exclui quem não pode ter acesso
aos bens de consumo (OLMOS, 2006, p. 173).
Baseados neste conceito, desde cedo, a criança é tratada como um
consumidor e existe um mercado poderoso destinado a ela. Os estímulos dos meios
de comunicação bombardeiam as pessoas, criando-lhes uma necessidade imperiosa
de consumir.
O mercado contempla a todos, pois oferece uma resposta para cada
ansiedade seja qual for, desde aqueles que seguem o padrão “novela das oito”, que
corresponde à grande massa, até àqueles que contestam esses modelos e não se
identificam com os personagens. O mercado tenta satisfazer a todos diversificando
suas produções.
A oferta do mercado é não somente algo externo, que atua de fora para
dentro, mas também uma representação interna no mundo mental das pessoas.
Quando eles não conseguem comprar um determinado produto que comporia a
imagem ideal, sentem-se excluídos do grupo de “pertença”. Essa é uma estratégia
de indução ao consumo onde griffes1 se confundem com identidades. A experiência
de não ser adequado(a) é devastadora, e o mercado oferece o objeto que produz a
adequação. Nessa abordagem, os objetos adquirem características humanas e seu
consumo preenche desejos, vazios, carências, sensação de abandono.
A imagem, que está ligada ao produto, é central, nesse mecanismo de
colocar um objeto no lugar da carência, de adicionar prazer a sensação de
vazio, de trazer alívio ao sentimento de desamparo, de sentir euforia no
lugar da dor mental (OLMOS, 2006, p. 179).
1
Griffe S. M. Marca de certos artigos de luxo, em especial dos de vestuário, por via de regra com a
assinatura do fabricante.
Fonte: FERREIRA, A. B. H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
82
Se relembrarmos o que foi colocado no capítulo 2, do Embasamento teórico,
vemos o posicionamento teórico de Jean Piaget sobre o desenvolvimento cognitivo
infantil: a criança é um ser em processo de desenvolvimento, com necessidades
próprias em cada faixa etária, e o meio ambiente deve proporcionar estímulos para
que esse desenvolvimento seja integral. O mercado, no entanto, procura estratégias
mais eficientes para conduzir essa criança ao consumo, estimulando-a a não
pensar.
Enquanto Piaget queria alimentá-la com estímulos que potencializassem sua
própria capacidade de pensar, o mercado conta com o inverso, a sua atitude
passiva de não pensar: “STOP THINKING: DRINK COCA-COLA” ou “NIKE:
DO I’T!” (OLMOS, 2006, p. 180).
Os meios de comunicação concorrem grandemente na condução ao
consumo, gerando modelos de identificação de atitudes, valores, procedimentos,
costumes, música, comportamento, ritmo, cotidiano. Quando se publica a
propaganda de um produto, ela só é lícita se o consumidor puder identificá-la de
forma imediata. Com a criança telespectadora, na maioria das vezes, essa
identificação não ocorre, pois ela não distingue o programa da mensagem comercial,
nem reconhece o caráter persuasivo da publicidade. É um crime invisível, porém,
muito poderoso, pois a criança não pode se defender da publicidade diluída no
entretenimento.
Nos episódios do desenho animado Bob Esponja, ele trabalha para a
lanchonete Siri Cascudo, fazendo hamburguer de siri, cuja fórmula só o seu patrão,
o Sr. Siriguejo, sabe e a guarda como um tesouro, pois dela depende seu lucro na
lanchonete. A mensagem comercial embutida nos conteúdos, pode incentivar as
crianças a frequentar lanchonetes de fast-food onde, além dos sanduíches, são
vendidos brindes que formam um kit (McLanche Feliz, por exemplo). Esse
acompanhamento de sanduíche e brinde com o boneco Bob Esponja vestido como
caipira, lembrando as festas juninas comemoradas principalmente no nordeste do
Brasil, fez parte das vendas da lanchonete Burger King entre os meses de maio e
junho de 2009, em todo o Brasil (fotos 1 e 2). A idéia tende a produzir a ligação do
personagem Bob Esponja com o caipira reverenciado pela cultural local.
Consideramos que é uma estratégia de mercado eficaz, pois os indivíduos
83
consumidores podem não perceber quando a publicidade está imbuída no produto,
como também a propaganda reveste-se da cultura local como atrativo.
Fonte: Acervo de fotos da pesquisadora
Fotos 1 – Brindes da lanchonete Burger King
Essa propaganda compõe a campanha publicitária elaborada pelo criador e
pelos produtores para a comemoração dos 10 anos de criação do desenho Bob
Esponja. O personagem das aventuras marinhas, tornou-se presente em muitos
produtos destinados ao publico infantil. O personagem do desenho animado Bob
Esponja, tornou-se marca de DVDs, roupas, shampoos, cremes para bebês, e
também em alimentos como sucrilhos, leite fermentado com lactobacilos, iogurte etc.
Dessa forma, torna-se um ciclo vicioso, onde o assistir ao desenho animado leva a
criançada a comprar produtos ligados ao desenho e vice versa.
Fonte: Imagens retiradas de panfletos publicitários de lojas e supermercados
Figuras 23 – Produtos com ilustrações de Bob Esponja
84
Quanto à venda de lanche e brinde, o Instituto de Defesa do Consumidor
(IDEC) no ano de 2008 serviu de referência para o projeto lei nº 4815/09, em
tramitação na Câmara dos Deputados aqui no Brasil, proibindo a venda de lanches
ou refeições em conjunto com brinquedos ou brindes. De autoria do Dr. Nechar (PV
– SP) essa prática atinge diretamente o publico infantil, induzindo-o ao consumo e
violando o Código de Defesa do Consumidor (CDC) que proíbe: “o uso profissional e
calculado da fraqueza ou da ignorância do consumidor infantil” (JORNAL CORREIO
DA PARAÍBA – 24/05/2009, p. E6).
É interessante observamos os motivos pelos quais se justificou a criação do
projeto de lei: “... fraqueza e ignorância do consumidor infantil”. Tal justificativa
condiz com uma concepção exclusivista e arcaica sobre as crianças, que
fundamenta o seu não conhecimento do mundo e consequente fragilidade.
O uso gradual da cultura infantil para vender produtos diretamente para as
crianças é uma tendência que se desenvolveu desde o início da era industrial.
Antes, os brinquedos e jogos industrializados direcionavam-se para os pais
como mercado, mas do que para as próprias crianças... com o passar dos
anos, as companhias desenvolveram linhas de brinquedos que eram
criadas para se transformarem em programas de televisão (McALLISTER,
2009).
Na contemporaneidade, a cultura infantil está cada vez mais mercantilizada.
Um fator que acentua esse fenômeno é a utilização de novas tecnologias de mídia,
como a internet, os sistemas de videogames, os DVDs, as mídias móveis, como os
tocadores de mp3, mp4, mp5..., e os telefones celulares com opções de mídia para
download2. Todas essas técnicas podem ser usadas para transmitir comerciais de
produtos, gerando lucros indiretos por meio da propaganda possibilitando, inclusive,
a mercantilização da cultura infantil.
Nos países que possuem legislação de proteção à infância quanto à
programação televisiva, o tempo da propaganda e o merchandising dirigido às
2
Download – Transferência de arquivo de um determinado servidor para o computador do usuário.
Copiar arquivo. Baixar da internet.
Fonte: http://www.cebinet.com.br/pessoais/escada/frcuriosidades01.htm
85
crianças é regulamentado. No Brasil, os programas infantis são repletos de
inserções publicitárias (TV Globinho, TV Xuxa e outros).
O Ministério da Justiça no Brasil entre 2005 e 2008, promoveu vários
debates
sobre
aspectos
relacionados,
direta
ou
indiretamente,
ao
dever
constitucional de exercer a classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas
e programas de rádio e televisão. Duas publicações de livros foram realizadas sobre
esses debates, tratando da necessidade de uma nova Classificação Indicativa:
material imprescindível para os profissionais que lidam “com a complexa relação
entre liberdades e responsabilidades no universo da comunicação e da cultura
(ROMÃO, J. E. E. et al., 2006).
Tratamos até aqui da Globalização, Indústria Cultural e Consumo. Um dos
produtos que serve ao mercado da cultura é a fantasia. É sobre a mercantilização da
fantasia que tratamos em seguida.
Os desenhos animados, além da função de entretenimento e lazer, têm
ainda a função mítica e fabuladora, características das obras de ficção. Eles
constituem os líderes de preferência entre crianças de diferentes faixas etárias.
Como os desenhos animados veiculam imagens de violência, expressão de poder,
de assuntos os mais variados, eles estão conquistando um público que inclui,
também, adolescentes e adultos.
Seguindo a lógica da indústria cultural que produz, periodicamente, os filmes
de desenhos animados, novos personagens e enredos são lançados. Muitos desses
filmes transmitidos como episódios pela TV, passam a ilustrar uma série de outros
produtos como capas de caderno, mochilas, chaveiros, camisetas, bonés, etc. Os
personagens principais do desenho tornam-se bonecos vendidos nos grandes
magazines ou distribuídos como “brindes” nas lanchonetes fast-food3. Os desenhos
animados trazem embutidos padrões culturais e de consumo, e fazem parte do
quadro pertinente a um contexto cultural que prega a globalização. Com o desenho
animado Bob Esponja ocorre o mesmo, inclusive quando se produz caracterização
do desenho, levando-se em conta a cultura local. (Veja item anterior). Podemos,
assim, denominar a estratégia econômica como mercantilização da fantasia.
3
Fast-food – Tipo de alimentação, preparada de modo padronizado e para rápido atendimento,
servida em lanchonetes e restaurantes.
Fonte: Dicionário Aurélio Eletrônico.
86
Alguns produtores dos filmes de desenhos animados trabalham para
grandes empresas da mídia como a Disney, que constitui uma corporação
multinacional. Ela, dentre outras empresas, representa a força motriz por trás da
cultura da mídia, tornando cada vez mais difícil manter o que a indústria do
entretenimento se propõe que é proporcionar os momentos de prazer e de fuga que
as pessoas desejam. Dessa forma a cultura empresarial está reescrevendo a
natureza da cultura infantil. A indústria cultural, com as múltiplas formas de mídia e
tecnologias, transformaram a cultura em uma força fundamental a ponto de “moldar
o significado e o comportamento humanos e regular nossas práticas sociais a todo
momento” (HALL, 1995).
O que nos resta fazer diante dessas máquinas de ensinar, tamanho é seu
impacto e alcance, é promover oportunidades às crianças e adolescentes de uma
leitura crítica das mensagens (GIROUX, 2003, p. 126).
Imagens massificadas preenchem nossas vidas cotidianas e condicionam
nossos mais íntimos desejos e percepções. O que está em questão para os pais,
educadores e outras pessoas, é a maneira como a cultura, particularmente a cultura
da mídia, tornou-se uma força educacional substancial, senão a principal, na
regulação de significados, de valores e de gostos, que estabelecem as normas e as
convenções que oferecem e legitimam determinadas posições de sujeito. O que
poderia estar em questão é como a escola vem se apropriando da cultura sem,
contudo, deixar-se conduzir pela cultura midiática.
Crianças do mundo inteiro têm acesso às produções midiáticas sabendo-se,
no entanto, que, estatisticamente, a distribuição é de forma bastante desigual. Em
muitos países europeus e na América do Norte, no Japão e na Austrália, é bastante
comum as crianças terem todas as formas possíveis e imagináveis de tecnologia de
mídia em suas casas. Em outros países, no entanto, a mídia é bem menos difundida
como nas áreas rurais da África, da Ásia e da América Latina.
Nos lares brasileiros temos constatado a preferência pela televisão dentre
outras tecnologias de mídia. Nas pesquisas sobre crianças e mídia, foram
detectadas influências benéficas como a intensificação do aprendizado, das
capacidades percepto-motoras, da competência social e da tolerância. As
pesquisas, porém, concentram seus estudos sobre as influências nocivas
principalmente no tópico: violência e mídia. Outras influências porém, também são
87
investigadas, por exemplo quais concepções são passadas às crianças sobre os
papéis dos gêneros, idosos, famílias, etc. e se seus conteúdos levam ao isolamento,
negligência das tarefas escolares e das atividades ao ar livre, a distúrbios
alimentares e ao consumismo (BUCHT e FEILITZEN, 2002).
Giroux (2003) nos alerta quanto ao consumismo que as mensagens
pedagógicas transmitidas pela programação televisiva, que visam ensinar aos
jovens a serem consumidores. Através da televisão, a mídia utiliza-se de mensagens
sublimares para vender produtos e ideologias. Seja de forma clara ou não alguns
programas de auditório, telenovelas e também desenhos animados apresentam
produtos que são inconscientemente percebidos com probabilidades de aumentar
seu consumo.
A Disney, por exemplo, constitui uma megacorporação produtora de filmes
infantis e de desenhos animados, como também é produtora de correlatos da
indústria da propaganda. Nesse cenário, a Disney, transforma os sonhos de uma
criança em lucros potenciais. A Disney Corporation controla 20 estações de
televisão, 21 estações de rádio, possui canais de televisão, TV a cabo, editora de
livros, parques temáticos, companhias de seguro, revistas, etc. Crianças, jovens e
adultos do mundo todo gostariam de conhecer a Disney World. Portanto, bem mais
que, mercantilizar os sonhos das crianças, também explora o adulto, evocando a
criança que existe em cada indivíduo, levando-os ao consumo uniformizado e
alienante.
Entretanto, alguns estudiosos relativizam esse ponto de vista, como Warnier
(2003) que apresenta três argumentos embasando seu posicionamento:
− primeiramente,
afirma
que
as
generalizações
sobre
o
caráter
uniformizado e alienante do consumo de massa não eram baseados em pesquisa de
campo. Através de algumas outras pesquisas, o autor observa que os elementos
culturais globalizados são singularizados e contextualizados de acordo com a
tradição local. As pessoas dão uma “roupagem” diferente aos elementos culturais
globalizados.
− em segundo lugar, apesar de aqueles que apóiam os teóricos da Escola
de Frankfurt subestimarem a capacidade de criação, de inovação e de imaginação
dos sujeitos, esses mesmos sujeitos são motivados por desejos que lhe dão
88
imagens, social e culturalmente construídas do objeto desejável. Como assegura
Castoriadis (1982), o imaginário socializado produz criação e diversificação culturais.
E, esse imaginário varia consideravelmente de uma comunidade para outra e se
apóia sobre o que falta na sociedade. Sendo assim, ele produz criando e
diversificando e não apenas reproduzindo.
− o terceiro argumento apresentado por Warnier (2003) contra a premissa
de que a padronização da produção leva a homogeneização do consumo é de que a
indústria coloca no mercado produtos cada vez mais numerosos, porém cada vez
mais diversificados, conforme pequenos grupos ou mercados de “nichos”. A
concorrência leva as empresas a explorar mercados estreitos gerando “uma
fragmentação e dispersão das referências culturais mais do que a homogeneização
destas referências” (WARNIER, 2003).
Concordamos em parte com os posicionamentos, pois, o mercado da
fantasia leva ou não ao consumo uniformizado e alienante. Consideramos que as
estratégias de mercado sempre existiram e não vão deixar de existir, entanto, a
percepção das mesmas pelo consumidor e sua opção em aderir ou não, constitui
tema a ser estudado, impreterivelmente, pelos teóricos da educação. Abordamos,
portanto no próximo item, Os olhares que se cruzam sobre a pedagogia crítica e
outras considerações.
3.4
Construção, Interação, Cultura, Resistência – Henry Giroux: Olhares que
se cruzam
Anteriormente, abordamos no embasamento teórico, mais precisamente nos
capítulos 2 e 3, a construção da compreensão do mundo pelas crianças à luz das
teorias piagetiana e vygotskyana. A primeira descreve que o desenvolvimento infantil
ocorre em uma série de estágios, com mudanças qualitativas e quantitativas do
pensamento da criança. Ela própria, interagindo com o meio em que vive,
desenvolve-se ampliando gradual e qualitativamente sua compreensão do mundo.
Por sua vez, a teoria vygotskyana pontua que, dependendo das experiências sociais
a que as crianças estão expostas, novas e mais complexas funções mentais se
formam. Para ele, o fundamento psicológico humano é cultural e, portanto, histórico.
89
Diante de tal afirmação, a consciência humana é uma construção de natureza
histórico-cultural, intimamente relacionada ao processo compartilhado de construção
de signos e significações. À interação piagetiana, Vygotsky (2007) acrescentamos a
internalização da cultura, por isso, dissemos para teoria piagetiana – Um olhar –, e
para a teoria vygotskyana – Outro olhar.
No presente estudo sobre mídia televisiva e subjetividade, outros olhares se
voltam na tentativa de aprofundar o conhecimento. Para tanto abordamos:
Globalização, Indústria Cultural e Consumo. Decorrente da abordagem desses
temas, no presente item apresentamos os olhares que se cruzam. Todos os
conceitos até agora debatidos são usados na compreensão teórica de Henry Giroux
(1986) que nos apresenta considerações sobre cultura, política e práticas
educativas. O estudo da mídia televisiva, através dos desenhos animados, e
subjetividade não poderia deixar de tratar de tais conceitos.
Henry Giroux (1986) coloca como necessária a prática de uma pedagogia
radical, que deve agir de forma aversiva contra todos os tipos de dominação. Para
ele, também é mister desenvolver críticas que proporcionem uma ação social e uma
transformação emancipatória. Essas proposições nos fazem lembrar Paulo Freire4
que afirma: “estar no mundo e com o mundo significa exatamente experienciar
continuamente a dialética entre subjetividade e objetividade”. Ele vai mais além e
nos alerta que jamais devemos “sobreestimar” a subjetividade em detrimento da
objetividade e vice-versa.
Oposta à pedagogia radical, encontra-se a pedagogia tradicional que, na sua
práxis, desconhece conceitos como subjetividade, mediação, classe, luta e
emancipação. Giroux (1986) em defesa de uma teoria crítica da educação, busca
bases teóricas desenvolvidas pela Escola de Frankfurt, cujos representantes:
Adorno, Horkheimer, Marcuse e outros revelam e rompem com as estruturas de
dominação existentes. Para eles, as contradições da sociedade são fonte de análise
que proporcionam distinguir entre o que é e o que deveria ser, portanto, posicionamse contra a supressão da subjetividade, da cultura e da consciência na história.
4
Tal citação foi retirada do prefácio elaborado por Paulo Freire do livro: Teoria Crítica e Resistência
em Educação de Henry Giroux (1986).
90
A Teoria Crítica da Sociedade nos traz elementos valiosos para a análise de
como a subjetividade é constituída, e de que maneira a cultura e a vida cotidiana
podem representar um novo terreno de dominação.
De início, Adorno e Horkheimer em “Dialética do Esclarecimento” expressam
uma forte crítica quanto “a fé inabalável do modernismo na promessa da
racionalidade iluminista de salvar o mundo dos grilhões da superstição, da
ignorância e do sofrimento” (apud GIROUX, 1986, p. 26). Para esses autores, o
Iluminismo sempre teve como objetivo libertar os homens do medo e proclamar sua
soberania, baseando-se na racionalidade, o que a fez tornar-se presente em todos
os âmbitos desde o século dezessete, penetrando em todos os aspectos da vida
cotidiana, seja nos meios de comunicação de massa, na escola ou no trabalho.
De acordo com a Escola de Frankfurt, a razão contém várias dimensões.
Marcuse, por exemplo, acredita que a razão possui um elemento crítico que é ainda
capaz de reconstruir a história. Já Adorno considera que a razão, para demonstrar
poderes, tem que ser crítica e negativa. Quando ela perde sua faculdade crítica, na
busca de uma harmonia social, torna-se um instrumento da sociedade e entra em
crise.
Para a Escola de Frankfurt a crise da razão se refere a dois aspectos:
− a necessidade em desenvolver uma noção mais autoconsciente de
razão, que contenha elementos de crítica como de vontade humana e de
ação transformativa e,
− atribuição à Teoria a tarefa de resgatar a razão à lógica do positivismo. O
resultado da racionalidade positivista e sua concepção tecnocrítica da
ciência representam uma ameaça à noção de subjetividade e ao
pensamento crítico. Na racionalidade positivista, não se reconhece
fatores por trás do “fato”, os seres humanos e a história são ignoradas.
Assim, em nome da neutralidade, o conhecimento científico e toda Teoria
se tornam racionais e desconhecem categorias fundamentais bem como
sua dicotocomia: consciência e autoconsciência, subjetividade e
objetividade, aparência e essência.
Giroux (1986), ao apresentar a análise da cultura na Escola de Frankfurt,
afirma que a mesma rejeitou a noção sociológica central de que a cultura existia na
91
forma autônoma, sem relação com os processos vitais políticos e econômicos da
sociedade. A visão frakfurtiana é de que a cultura assume um papel – chave na
criação da experiência histórica e na vida cotidiana. Adorno e Horkheimer (1985)
argumentaram que a dominação vinha assumindo uma nova forma:
Ao invés de ser exercida primariamente através do uso da força física (o
exército e a polícia), o poder das classes governantes era agora
reproduzido através de uma forma de hegemonia ideológica; isto é, era
estabelecida primariamente através do consentimento e mediada via
instituições culturais como as escolas, a família, os meios de comunicação
de massa, as igrejas, etc.
De acordo com a Escola de Frankfurt, a cultura como tudo o mais na
sociedade capitalista, havia se transformado em um objeto. Ela, a cultura, havia se
convertido numa outra indústria, que não somente produz bens, senão que também
legitima a lógica do capital e suas instituições. O termo “indústria cultural” foi
adotado então como resposta à reificação da cultura, para por fim à ideia de que a
cultura surge espontaneamente das massas, e atribuí-la à concentração econômica
e aos determinantes políticos que controlam a esfera cultural em favor da dominação
social e política.
Adorno e Horkheimer (1985) criticam a arte como expressão cultural, quando
esta exclui os princípios de resistência e oposição, ao invés de enfatizar a distinção
entre a realidade e a possibilidade de uma verdade superior ou de um mundo
melhor.
As mensagens e os discursos da indústria cultural são moldados pelas
técnicas e formas advindas da racionalidade positivista e da mutilação dos poderes
da imaginação. Impera a padronização, seja através de excesso de enredos, piadas
e histórias. A mensagem é o conformismo, e o meio para obtê-la é a diversão já
completamente despojada do senso crítico. Há uma redução da cultura à diversão
como também uma consequente divisão estrutural entre trabalho e brincadeira.
Dessa forma, o trabalho se torna enfadonho, tedioso e sem poder aos olhos da
maioria das pessoas, e a cultura se torna o caminho através do qual se escapa do
trabalho. Para Adorno e Horkheimer (1985): o que ocorre é que os indivíduos, na
tentativa de escapar de um processo de trabalho mecanizado, buscam a diversão,
no entanto, no capitalismo moderno, a diversão é extensão do trabalho.
92
Adorno (2002), ao discutir a questão do tempo livre e o que as pessoas
fazem com ele, afirma que o tempo livre é acorrentando ao seu oposto, ou seja,
aquele que é preenchido pelo trabalho. Na sua análise, o autor afirma que não
deveria ser assim. O tempo livre não pode ser sinônimo de liberdade organizada,
pois seria coercitivo ter um hobby como obrigação. É fugir da iminência do tédio
que, no entanto, “só existe em função da vida sob a coação do trabalho e sob a
rigorosa divisão do trabalho” (ADORNO, 2002). O tédio está intimamente
relacionado ao sentimento de impotência (não poder fazer) e, também, à falta e ao
atrofiamento da fantasia o que decorre em deixar as pessoas desamparadas em seu
tempo livre. Aqui se faz conveniente lembrar um episódio do desenho animado Bob
Esponja, intitulado: Férias Desastrosas (2007), onde relata que Bob Esponja nunca
tirou férias do trabalho. Para evitar ser multado, o Sr. Siriguejo, seu patrão, o obriga
a tirar folga. Todo o enredo do episódio transcorre na descrição do desespero do
Bob Esponja em não saber o que significa férias e o que ele irá fazer com seu tempo
livre. O episódio demonstra claramente o que Adorno afirma: é a ideologia que
domina e controla, de fato, a consciência e a inconsciência daqueles aos quais se
dirige. No caso do desenho animado referido, a ideologia capitalista prega que só
vale aquele que produz, aquele que trabalha. Tempo livre é desperdício para muitos,
e para outros uma espécie de “esmola”. Alguns indivíduos não percebem como
estão acorrentados ao trabalho e ao sistema, que seguem dessa forma sem
perceber que já não necessitaria desse trabalho. Ainda no episódio Férias
Desastrosas (2007), o autor apresenta Bob Esponja preocupado com a produção de
sanduíches da lanchonete em que ele trabalha. Ele considera que só ele poderá
fazer sanduíches saborosos. Esse é um dos mitos do capitalismo, que faz o
empregado se sentir insubstituível dedicando-se integralmente à empresa, inclusive
defendendo-a como a melhor. Esse mecanismo, tão popularmente conhecido como
“vestir a camisa da empresa” concorre para que alguns empregados negociem suas
férias com a empresa, durante vários anos. Mas não é só isso: negocia-se também
porque se ganha pouco e se quer consumir muito, num intricado jogo simbólico que
é o capitalismo.
Até o momento, falamos nesse capítulo sobre as considerações teóricas
frankfurtianas, apresentadas por Giroux, a respeito da dinâmica social, onde a
cultura existe como resultado da relação entre os processos vitais políticos e
93
econômicos da sociedade. Como proposta, Giroux (1986) vai além, apresentando
uma visão radical da Educação. É sobre essas práticas educativas que tratamos a
seguir, o que nos proporciona uma forma alternativa de percebermos a realidade.
Giroux (1986) ao analisar as práticas sociais nas escolas, ressalta que é
imprescindível explicar como o poder e a ação humana interagem nessas práticas.
De início, ele argumenta que:
... sempre houve um compromisso poderoso e profundo para com uma
visão da escola e da pedagogia de sala de aula em termos que separam o
poder do conhecimento, enquanto simultaneamente abstraem a cultura da
política (p. 103).
Para ele, a teoria educacional, seja na versão conservadora como na liberal,
sempre se refugiou na lógica da necessidade e da eficiência, apresentando um
discurso político de integração e consenso. Como consequência dessa atitude, a
teoria educacional tradicional elimina a perspectiva histórica, não oferece bases
reais para a compreensão da relação entre problemas, tais como ideologia,
conhecimento e poder, pois a preocupação é pelo controle, produção e
observação. Nessa perspectiva, o que as escolas definem como “verdadeiro”
conhecimento não reflete o desenvolvimento histórico desse conhecimento, nem
como foi selecionado, usado e legitimado. É preocupante sabermos que é ignorado
o modo pelo qual o poder distribui funções na sociedade. Geralmente, o poder é
distribuído em função do interesse de ideologias e formas de conhecimento
específicos a fim de apoiar grupos e classes nas suas preocupações econômicas e
políticas.
A teoria educacional tradicional, como parte da sociedade em geral, trata a
cultura como uma categoria neutra das ciências sociais. Em contrapartida, a teoria
crítica da educação enfatiza que a cultura se refere a processos específicos que
envolvem
relações
antagônicas
vivenciadas
entre
diferentes
grupos
socioeconômicos. Os referidos grupos têm acesso desigual aos meios de poder e,
como resultado, uma desigual habilidade de produzir, distribuir e legitimar seus
princípios e suas experiências. Essa discussão nos leva a tentar entender como as
escolas produzem subjetividades e significado, e qual a sua relação com o poder e o
controle. A chamada “nova sociologia da educação” (GIROUX, 1986) não separa
94
conhecimento de poder e argumentam que todo e qualquer conhecimento em
qualquer meio social, constitui relações específicas de poder. Este posicionamento
levou os estudiosos a se preocuparem não com o que determinava a consciência
dos professores, mas com as estruturas políticas e econômicas da sociedade maior.
Por isso, essa perspectiva ajudou a reproduzir os próprios mecanismos de
dominação que contestavam, como também ignoraram os espaços ideológicos e
culturais que falam de resistência e de promessa de uma pedagogia crítica
transformativa.
Giroux (1986), criticando as tentativas da nova sociologia da educação em
superar posições estruturalistas e culturalistas anteriores, denominou-as de teorias
da reprodução.
As teorias de reprodução tomam como sua preocupação central a questão
de como as escolas funcionam no interesse da sociedade dominante...
focalizam como o poder é utilizado para mediar entre as escolas os
interesses do capital, ... como as escolas utilizam seus recursos materiais e
ideológicos para reproduzir as relações sociais e atitudes necessárias para
manter as divisões sociais de trabalho, essenciais às relações de produção
existentes (GIROUX, 1986, p. 107).
No presente trabalho não nos detemos nos posicionamentos de Giroux
sobre as teorias de reprodução social que ele toma como exemplo, nem nos
trabalhos de Althusser (1969, 1971), de Bowles e Gintis (1976 e 1980) nem nas
teorias de reprodução cultural com o foco nos trabalhos de Bourdieu e seus
contemporâneos (1977) e de Basil Bernstein (1971, 1981). O nosso enfoque será
em suas críticas a essas teorias de reprodução social e cultural, onde ele ressalta a
importância da resistência, designando-a como um conjunto de elementos de
oposição parcialmente conscientes, que impede a reprodução e, como construto
teórico e ideológico, fornece um foco importante para se analisar as relações entre a
escola e a sociedade maior. É através do estudo sobre resistência, que podemos
avaliar o fracasso educacional experimentado pelos grupos subordinados, e também
nos possibilita pensar e reestruturar as formas de pedagogia crítica.
É necessário precisão acerca do que é e do que não é resistência. A mesma
redefine as causas e o significado da conduta de oposição ao argumentar que tem
pouco a ver com desvio, patologia ou aprendizagem deficiente. Tem muito a ver com
a lógica da moral e da indignação política.
95
Giroux (1986) afirma que, para compreender as complexas relações entre
escolarização e sociedade dominante, é imprescindível buscar redefinir a
importância de poder, ideologia e cultura como construções centrais e tomar como
pontos de partida para análise, os conceitos de conflito e resistência.
A noção de resistência indica a necessidade de se entender mais
completamente as maneiras complexas pelas quais as pessoas medeiam e
respondem à intersecção de suas próprias experiências de vida com as
estruturas de dominação e coerção (GIROUX, 1986).
São categorias centrais que emergem da problemática da resistência:
intencionalidade, consciência, o significado do sentido comum e a natureza e valor
do comportamento não discursivo.
A resistência amplia a noção de poder, considerando-o multidimensional, ou
seja, ele não só é exercido como um modo de dominação, mas também como um
ato de resistência ou ainda como produção cultural e social criativa.
Na base da noção da resistência deve existir sempre uma esperança
expressa como um elemento de transcendência para uma transformação radical. Ela
tem que se situar numa perspectiva que adote a noção de emancipação como seu
importante guia. A resistência deve ter uma função reveladora, que apresente uma
crítica à dominação, ofereça as oportunidades teóricas para a auto-reflexão e lute
pela emancipação.
Comportamentos de oposição podem ser usados para melhorar a vida
humana ou para a sua destruição e desvalorização. Não podemos permitir que o
conceito de resistência se torne uma categoria indiscriminada. Pelo contrário,
resistência deve reunir o sentido crítico e o interesse no aumento de consciência
radical e na ação crítica coletiva.
Todo comportamento de oposição deve ser analisado se constitui ou não
resistência. Também é importante lembrar que todo comportamento de oposição
representa uma base para o diálogo e para a análise crítica.
A resistência tem ainda valor como princípio educacional que reside em
definir as noções de estrutura e ação humanas, bem como os conceitos de cultura e
de autoformação em uma nova problemática.
96
O conhecimento educacional, os valores e as relações sociais estão agora
colocados dentro do contexto de relações antagônicas vividas, e precisam
ser examinados conforme são expressas dentro das culturas dominantes e
subordinadas que caracterizam a vida escolar (GIROUX, 1986, p. 151).
O estudo sobre resistência proporciona, ainda, dar voz aos alunos e escutálos para que mantenham e estendam as dimensões positivas de suas próprias
culturas e histórias, bem como, chama atenção para modos de pedagogia que
revelam os interesses subjacentes nos vários sistemas de mensagens da escola,
particularmente no currículo, metodologia e procedimentos de avaliação.
Educação e emancipação humana estão ou deveriam estar em íntima
relação. “O maior objetivo da educação é formar pessoas capazes de tomar parte
em sua própria liberação” (CONNELL et alli, 1982, apud GIROUX, 1986).
Concordando com essa premissa, é conveniente, portanto, tratarmos de resistência
e pedagogia crítica como categorias intrínsecas e valiosas para o nosso estudo.
Concluindo os comentários sobre resistência, falemos sobre pedagogia crítica
enfatizando, a priori, a conexão entre esses dois construtos teóricos.
Concordando com Giroux (1986), consideramos fundamental entendermos
que as escolas não são apenas locais de reprodução sócio-cultural, são também
lugares envolvidos em contestação e luta. Como esta referência, constatamos ser
imprescindível sabermos como atuar dentro e fora das escolas, promovendo
condições para que os agentes sociais (pais, educadores, crianças, etc.)
compreendam a si próprios, sua situação sócio-histórica e conheçam suas
possibilidades de ação.
As escolas e a pedagogia crítica deveriam se basear em pressupostos
importantes. O primeiro deles é a necessidade de um discurso crítico que mostre
seres humanos oriundos de diferentes classes sociais, reagindo ou não às
dificuldades.
O segundo pressuposto é que as escolas devem ser vistas como locais
sociais contraditórios, e não locais de pura acomodação, mas sim ambiente de luta
propiciando ensino, conhecimento e práticas emancipatórias. Uma escola é lugar de
pluralidades contraditórias que geram possibilidades tanto para a mediação quanto
para a contestação das ideologias e práticas dominantes.
97
Um terceiro requisito é que a finalidade da escolarização e da pedagogia
crítica é promover a capacitação das pessoas das classes oprimidas a reivindicar
suas próprias vozes e, com isso, suscitar o interesse coletivo para a reconstituição
de uma sociedade maior.
Realizadas as considerações sobre resistência e pedagogia crítica,
finalizamos o percurso teórico da pesquisa. Passamos a descrever a metodologia da
mesma de forma pormenorizada, visualizando os diversos passos do processo.
98
4 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA
4.1 Natureza e Locus da Pesquisa
Trata-se de uma pesquisa de caráter etnográfico, realizada na Escola de
Educação Básica da Universidade Federal da Paraíba (EEB – UFPB) – Campus I –
João Pessoa, que atende crianças de 02 (dois) a 08 (oito) anos de idade. A situação
sócio-econômica varia, pois há alunos filhos de professores, funcionários, de alunos
dessa instituição e também aqueles residentes nos bairros próximos a ela. A
situação sócio-econômica varia então desde alunos filhos de classe média, até
alunos oriundos de famílias com menor poder aquisitivo.
Como abordagem qualitativa, a pesquisa etnográfica busca os dados
diretamente na fonte e tem o pesquisador como seu principal instrumento “... a
pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com o
ambiente e a situação que está sendo investigada, via de regra através do trabalho
intensivo de campo” (LÜDKE e ANDRÉ, 1986).
Na coleta de dados o pesquisador deve estar atento ao maior número
possível de elementos, pois um aspecto que lhe pareça trivial, poderá ser essencial
para a melhor compreensão do problema que está estudando. Sua preocupação
deve ser maior com o desenvolvimento processual da pesquisa do que com os
resultados, interessando-se em verificar como o problema se manifesta nas
atividades, nos procedimentos e nas interações cotidianas.
Na pesquisa etnográfica há sempre o cuidado de se considerar os diferentes
pontos de vista dos participantes, e a análise dos dados tende a seguir um processo
indutivo, ou seja, não há uma definição rígida e a priori de hipóteses. Não implica, no
entanto, que não haja um planejamento e um embasamento teórico, apenas o
propósito de não tomar uma atitude inflexível diante do problema investigado.
Coletamos pessoalmente os dados, para que se garanta “a riqueza do contato
íntimo e pessoal com a realidade estudada” (p. 14).
A abordagem etnográfica nos permite combinar vários métodos de coleta. A
presente pesquisa utilizou a observação direta das crianças, entrevistas, conversas
em grupos, videoteipes dessas conversas e outros métodos que colaboraram para
99
fornecer um quadro completo da situação estudada, ou seja, a análise da opinião
das crianças sobre um episódio do desenho animado Bob Esponja.
Os dados coletados apresentam material produzido pelos pesquisados,
sendo, histórias, frases tiradas das entrevistas, desenhos e outros que ilustrem a
perspectiva dos participantes, valorizando a voz infantil. Nessa pesquisa,
priorizamos a concepção da criança capaz, produtora de cultura, abandonando o
ponto de vista consolidado ao longo do tempo que repudiava ou desconfiava das
capacidades infantis e de sua maturidade para opinar sobre suas vidas.
O pressuposto teórico para a escolha da abordagem etnográfica
fundamentamos na perspectiva de compreensão do comportamento humano,
tentando entender o quadro referencial onde ocorre tal comportamento. Nessa
abordagem o pesquisador precisa fazer um mergulho no contexto cultural dos
sujeitos pesquisados. A investigação etnográfica desenvolve-se em três etapas:
exploração, decisão e descoberta (LÜDKE e ANDRÉ, 1986).
Na fase de exploração definimos o problema a ser estudado, a escolha do
local onde foi realizado o estudo e estabelecimento dos contatos. Também nessa
fase foram realizadas as primeiras observações.
Para o local da pesquisa foi escolhida uma escola, pois é de interesse
observar crianças em grupo e promover conversas sobre o desenho animado
assistido. Entendemos que a escola revela valores sociais e culturais que compõem
a socialização dos seus educandos, porém, em se tratando da educação infantil,
somente conhecendo muito bem a escola é que o pesquisador identificará a
identidade dessa escola. Portanto, fazemos parte do quadro efetivo de professores
dessa instituição e também já realizamos acompanhamento pedagógico de alunos
de estágio do curso de Pedagogia na EEB – UFPB.
O quadro de pessoal da Escola de Educação Básica da UFPB, durante a
pesquisa (2009), é composto por 11 professores efetivos, 13 professores bolsistas,
01 pedagoga, 02 assistentes sociais, 02 nutricionistas, 01 enfermeira, 02 auxiliares
de enfermagem, 01 copeira, 01 cozinheira, 02 recreacionistas e 03 funcionários
administrativos.
A Escola de Educação Básica se localiza na Cidade Universitária de João
Pessoa, que situa-se entre os bairros Bancários e Castelo Branco. Configura-se
100
como campo de ensino no desenvolvimento de suas práticas educativas,
contribuindo para o processo de produção do conhecimento na graduação e pósgraduação e efetivação do compromisso social da Universidade.
A Escola passou por uma reforma em 2008 em sua estrutura física,
ampliando o pátio principal, criando duas áreas de convivência e a construção de
mais duas salas de aula, perfazendo atualmente um total de sete. Conta ainda com
o espaço lúdico composto pela brinquedoteca, sala de jogos, sala de leitura e sala
de TV. Na área externa, os brinquedos foram deslocados para o pátio e há previsão
para construção de quadra de esportes, e um novo prédio ao lado do atual onde
funcionará o Ensino Fundamental.
4.2 Procedimentos na Construção e Análise dos Dados
Escolhemos a análise de conteúdo para efetuar o tratamento dos dados,
pela natureza intrínseca dessa técnica, a manipulação de mensagens (conteúdo e
expressão desse conteúdo), para dar evidência dos indicadores que propiciam inferir
sobre uma outra realidade que não a da mensagem.
A presente pesquisa trata da produção de sentido frente ao D.A. Bob
Esponja. Achamos conveniente compreendermos sua conexão no desenrolar do
procedimento através da análise de conteúdo.
A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das
comunicações e se organiza em três fases: pré-análise, exploração do material e,
por último, a fase do tratamento dos resultados, ou seja, a inferência e a
interpretação (BARDIN, 1977).
A pré-análise é a fase da organização propriamente dita, onde escolhemos
os documentos a serem analisados, formulamos a(s) hipótese(s) e os objetivos. A
leitura flutuante dos primeiros dados coletados só foi possível após os contatos com
os indivíduos a serem pesquisados através de observação direta no parque da
escola e em sala de aula, em conversas informais com professores e demais
profissionais da escola que nos acolheram com receptividade nos dois turnos. Pouco
a pouco, a tese da investigação foi se delineando:
101
O desenho animado Bob Esponja com seus conteúdos ao mesmo tempo
que diverte, ele interfere na formação da subjetividade de crianças de 3 a 5
anos de idade e que, por sua vez, constroem sentido para o que assistem
mediante o contexto social em que estão inseridas.
Concomitantemente, os objetivos da pesquisa foram definidos, como já
apresentamos anteriormente.
a) Investigar como ocorre o processo de construção de sentidos em
crianças de 3 a 5 anos de idade ao assistirem o desenho animado Bob
Esponja e como ele influencia em suas subjetividades.
b) Verificar qual a frequência com que as crianças de 3 a 5 anos assistem
ao desenho animado Bob Esponja e a preferência em relação ao mesmo.
c) Atribuir à criança a condição de receber e participar como autora das
produções culturais.
d) Incentivar educadores a desenvolverem o hábito de relacionar-se
criticamente diante da mídia televisiva, especialmente diante dos
desenhos animados.
À medida que transcorriam a interação com o locus e com os sujeitos, com
os documentos ou fontes para análise, foi sendo construído o corpus da pesquisa:
entrevistas, desenhos e falas da roda de conversa. Esse corpus, submetido aos
procedimentos analíticos, gerou indicadores para a codificação e subsequente
categorização, no intuito de alcançar os objetivos.
Para a categorização consideramos grupos de elementos constitutivos de
um conjunto previamente designado. Escolhemos as categorias empregando o
processo designado de procedimento por “caixas – aplicável no caso da organização
do material decorrer directamente dos funcionamentos teóricos hipotéticos”
(BARDIN, 1977). As categorias corresponderam aos conceitos teóricos do nosso
embasamento: representação – Piaget, internalização – Vygotsky e resistência –
Giroux.
Descrevemos, em seguida, os procedimentos adotados em campo, os quais
são divididos em primeira e segunda fases. Na primeira fase tratamos como
definimos os sujeitos participantes que teriam que ter conhecimento prévio do
desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada. Denominamos essa fase de
102
Aproximação e Busca e coletamos dados sobre o reconhecimento do referido
desenho entre outros e de seus personagens.
Na segunda fase da pesquisa, nós a denominamos de Interação e
Registro. Nela descrevemos o processo de escolha do episódio a ser assistido, as
falas das crianças na roda de conversa e seus desenhos. Simultaneamente a cada
apresentação dos dados realizamos a análise de conteúdo.
4.3 Descrição e Análise da Primeira Fase da Pesquisa – Aproximação e Busca
Foram escolhidos dentre o universo total de alunos da escola, os sujeitos de
3 a 5 anos de idade, que já tinham conhecimento prévio sobre o desenho animado
Bob Esponja.
Quadro 1 – Nº total de alunos de 3 a 5 anos (2009)
IDADE
3 ANOS
4 ANOS
5 ANOS
MANHÃ
12
A = 11 / B = 10
11
TARDE
13
A = 12 / B = 12
14
TOTAL
25
45
25
TURNO
TOTAL GERAL
95
Fonte: Secretaria da EEB – UFPB
Nos primeiros contatos da pesquisa, objetivamos o conhecimento e
aproximação do ambiente físico, da equipe administrativa, da dinâmica de
funcionamento da escola e das crianças que
constituiriam os sujeitos
participantes.
O consentimento da direção da Instituição (Termo de Anuência) e dos pais
das crianças participantes da pesquisa foram providenciados previamente (Termo de
103
Consentimento – Apêndice 1). Às crianças também foi indagado, oralmente, se elas
se dispunham a participar da pesquisa, e se os desenhos sobre o vídeo poderiam
ficar com a pesquisadora. Com o objetivo de detectar se as crianças de 3 a 5 anos
reconhecem os personagens principais do desenho animado Bob Esponja,
utilizamos um boneco de pelúcia Bob Esponja e dois bonecos de borracha
representando Bob Esponja e Patrick, o melhor amigo de Bob Esponja. Quando os
personagens foram “apresentados” às crianças os questionamos: “Quem é esse?
Qual é o desenho animado que ele participa?
Como previamente tínhamos perguntado e escrito o nome de cada aluno, ao
se pronunciarem quando questionados, anotações ao lado dos nomes das crianças
eram realizadas. Para elas, as respostas foram dirigidas aos bonecos e não à
pesquisadora. Após os questionamentos, cada criança ficou um “pouquinho” com os
bonecos, abraçando-os, conversando com eles ou brincando com os colegas.
Participaram dessa dinâmica os alunos que estavam presentes na escola no
momento de sua realização como descrito no Quadro 2.
Quadro 2 – Número de meninos e meninas pesquisados quanto ao reconhecimento
do desenho animado Bob Esponja, seus personagens e sua preferência
por eles.
Idade
e Sexo
3 anos
Turno
M=3
F=7
5 anos
4 anos
Turma A
M=6
F=5
F=5
MANHÃ
TARDE
M=6
F=3
Turma B
M=2
F=7
Turma A
M=3
F=5
M=6
F=5
Turma B
TOTAL
TOTAL GERAL
M=3
19
38
M=8
F=3
19
76
Fonte: Dados da pesquisadora
Quanto ao reconhecimento do desenho animado Bob Esponja, dentre
outros, utilizamos gravuras de vários personagens de desenhos animados e
104
apontando perguntávamos: Quem é esse? Qual é o desenho animado que ele
participa? (Figuras 24).
Fonte: http://images.google.com.br
Fonte: http://images.google.com.br
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 24 – Ilustrações de vários desenhos animados.
O Bob Esponja foi apresentado dentre outros personagens que também
fazem parte do desenho, e a cada criança solicitamos relacionar as gravuras com a
história do mesmo (Figuras 25) perguntando: “Quem é esse personagem? O que ele
faz no desenho?
105
Fonte: http://images.google.com.br
Figuras 25 – Ilustrações referentes ao desenho animado Bob Esponja
Na obtenção dos dados até agora descritos foram necessários vários
encontros até que todas as turmas fossem pesquisadas.
Para que a pesquisa prosseguisse, necessitávamos do consentimento
esclarecido dos pais. Durante essa “espera”, de aproximadamente um mês, fizemos
contato direto e efetivo com as crianças e professoras. Participamos, por exemplo,
por convite das próprias crianças e professores, do Dia da Família e de atividades
recreacionais na escola.
O quadro 3 apresenta os dados obtidos nessa primeira fase da pesquisa.
Constatamos que apesar de todas as crianças reconhecerem os personagens do
106
referido desenho em todas as turmas, a preferência ficou abaixo de 50%,
aproximando-se apenas nas turmas de 3 e 5 anos.
Quadro 3 – Caracterização das crianças em função do reconhecimento do desenho
animado Bob Esponja e sua preferência.
Crianças por turma
Reconhecem o d.a. Bob
Esponja
Tem preferência pelo
d.a. Bob Esponja dentre
outros
3 anos
(Total 19)
4 anos
(Total 38)
5 anos
(Total 19)
100%
42,10%
100%
39,47%
100%
47,36%
Fonte: Dados da pesquisadora
O reconhecimento unânime, pelas crianças, do desenho animado Bob
Esponja e dos outros a elas apresentados comprovam que a televisão, penetra
todas as esferas da vida social moderna.
Quanto ao personagem Bob Esponja, as crianças, não o percebem somente
através do desenho animado. Como apresentamos no capítulo 5, na Globalização,
Industrial Cultural e Consumo, como estratégia de maior consumo, Bob Esponja
tornou-se marca de DVDs, roupas, shampoos, creme para bebês e também
alimentos como leite fermentado, sucrilhos, etc.
Outro registro que fizemos diz respeito à observação de uma garota da
turma de 4 anos. Na primeira fase da pesquisa, a fase de aproximação e busca, ao
falarmos na lanchonete em que Bob Esponja trabalha, a criança prontamente
relacionou: Profª., esse final de semana eu vou lanchar na McLanche Feliz! Esse
é o contexto social e cultural ao qual ela está inserida e nada mais coerente reagir
dessa forma. O fenômeno da globalização favorece a indústria cultural que, através
do
consumo,
ambos
regulam
nossas
práticas
sociais.
“As
corporações
multinacionais da indústria do entretenimento se propõem a proporcionar os
momentos de prazer e de fuga que as pessoas desejam. Segundo o exposto, a
107
cultura empresarial está reescrevendo a natureza da cultura infantil” (OLMOS,
2006).
Alguns fatores podem justificar o percentual de preferência do D.A. Bob
Esponja como o horário em que o desenho animado é transmitido pela TV aberta,
ser o mesmo que a turminha da manhã frequenta a escola; a preferência das
crianças pelos outros desenhos animados apresentados: Meninas Superpoderosas,
Dragon Ball, Dexter, Jimmy Nêutron, Pica-pau e Tom e Jerry caracterizados como
desenhos animados nos quais os personagens se dividem em dois grupos, ou seja,
o do bem e o do mal, que competem entre si e que conquistam o interesse das
crianças dessa faixa etária. Todo o desenrolar das histórias descreve um grupo
tentando vencer o outro. Geralmente, o grupo do bem, após passar por penosas
provas, vence o mal.
No artigo: Ensinando a dividir o mundo; as perversas lições de um programa
de televisão, Costa (2002) apresenta a televisão “como um dispositivo que integra o
aparato pedagógico das sociedades governamentais modernas, ensinando muitas
coisas, entre elas um conjunto de verdades que compõe o currículo cultural no qual
se aprende a dividir o mundo”. A autora analisou o programa Bambuluá, exibido pela
Rede Globo de Televisão (Brasil), direcionado à crianças e adolescentes. A análise
mostra como todos os elementos da vida são arbitrariamente dispostos de um ou de
outro lado na trama do programa, numa estratégia política cultural de dividir o
mundo. O artigo discute ainda que a educação deve contribuir para o entendimento
das diferenças e não para ensinar as divisões. O que constatamos ainda é que os
referidos desenhos animados, além de apresentar um mundo dividido, apresentam
estratégias utilizadas pelos heróis do bem para conseguirem vencer tão perversas e
desrespeitosas quanto às dos vilões do mal. É preocupante perceber a preferência
das crianças de 3 a 5 anos por esses desenhos animados. O D.A. Bob Esponja
encontra-se também nesta categoria.
As crianças de 3 anos, em sua maioria por não ter desenvolvido ainda a
articulação correta de alguns fonemas, pronunciavam “Bogui Ponga” (Bob Esponja);
“Tasa” (Casa) etc., o que não as impediam de conversar sobre Bob Esponja e os
outros personagens do desenho animado
Nas turmas de 4 anos, ao falarem sobre o desenho animado Bob Esponja,
três alunos da turma B da manhã e três alunos da turma B à tarde, descreveram
108
com detalhes características e episódios do referido desenho. Transcrevemos
algumas frases e os analisamos em seu conjunto mais adiante neste trabalho.
− “Bob Esponja tem um bichinho que fala”
− “O bichinho de Bob Esponja é como um cachorro”
– “Bob Esponja mora no fundo do mar. Trabalha na lanchonete Siri
Cascudo”.
− “O melhor amigo de Bob é Patrick”
− “Patrick é muito lindo!”
− Eu amo Bob, mas eu amo mais ainda Power Rangers.
− Esse final de semana, vou lanchar no McLanche Feliz.
As crianças de cinco anos, se posicionaram criticamente diante do Bob
Esponja, colocando livremente sua opinião, como por exemplo:
– “Bob esponja trabalha na lanchonete que é do Sr. Siriguejo, um homem
chato que gosta muito de dinheiro. Ele só fala em dinheiro”.
– “Eu gosto mais de Power Rangers porque é (filme) de menino”.
– “Eu gosto de Meninas Superpoderosas porque é pra menina”.
– “Tia, você sabe que tem um jogo de computador do Bob Esponja? Eu jogo”
– “Qual é o site” (Após a fala anterior)
4.4 Descrição e Análise da Segunda Fase da Pesquisa – Interação e Registro
4.4.1 Escolha do Episódio
Tendo em mãos o consentimento dos pais das crianças, partimos para a
escolha do episódio do desenho animado Bob Esponja, que seria assistido pelas
crianças. Para tanto, levamos vários exemplares para as salas de aula e deixamos
que elas, livremente, escolhessem qual seria o episódio que assistiram
conjuntamente. Apresentamos DVDs do Bob Esponja de 2004 e 2007.
− Bob Esponja (O Filme) (2004)
109
− A terceira temporada completa (Discos 1 e 2) (2007)
− Bob Esponja e seus amigos em confusões aquáticas (2004)
Dentre os títulos apresentados, Bob Esponja e seus amigos em
Confusões Aquáticas (2002), foi escolhido por aclamação. Esse vídeo é composto
por vários episódios e os participantes da pesquisa escolheram: Calça Rasgada
como aquele que iria ser assistido.
No período que antecedeu a sessão do vídeo, algumas crianças vinham nos
perguntar sobre Bob Esponja: se ele estava bem, mandavam beijinhos para ele e
com insistência perguntavam qual seria o dia deles assistirem ao vídeo do episódio.
Nesse episódio, Bob Esponja tenta impressionar Sandy (Esquila) na praia,
esforçando-se para imitar outros personagens como o Lula Molusco. Porém, a
Lagosta, que é atleta, começa a dar um show levantando objetos pesados e todos
ficam admirados. Bob Esponja também levanta alguns objetos leves e não convence
a platéia de que é forte. Acidentalmente, ao se esforçar, rasga suas calças. Ele fica
com vergonha enquanto todos riem dele, julgando que foi de propósito. Bob vê que o
rasgo foi um sucesso. Passa a repetir, então, a façanha em muitos momentos, agora
de propósito. Chega a fingir que está se afogando e quando o salva-vidas o retira do
mar ele diz: “Quero um alfaiate, porque minhas calças estão rasgadas”! Nessa
ocasião todos se afastam dele e a Sandy diz: “Bob Esponja, você passou dos
limites”. Os amigos não mais acharam graça naquela brincadeira e o evitam com
raiva. Nesse momento, o episódio focaliza outros fracassados como a peixinha que
não passou protetor solar e ficou muito vermelha, a baleia que se enterrou na areia e
esqueceu de sair de lá, e o tubarão que encheu seus sanduíches de areia. Eles se
unem, choram, se lamentam e pensam num modo diferente de agradar os amigos.
Resolvem, então, formar uma banda onde cantam e tocam instrumentos. A letra que
compõem, fala de amizade e pedidos de desculpas. Os amigos ao assistirem a
apresentação do grupo, aplaudem e vibram com o novo quarteto. Alguns pedem
autógrafos a Bob Esponja, que sorri feliz com o que causou, recebem aplausos em
sinal de aprovação.
Constatamos que o episódio trata de atitudes positivas e negativas dos
personagens, na tentativa de conviver com os amigos e de agradá-los. Observamos
110
atitudes praticadas com o intuito de chamar a atenção e de ser o melhor. Vejamos
as atitudes predominantes no conteúdo desse episódio:
1) Exibição:
− Bob Esponja faz Sandy sorrir imitando outros personagens.
− Bob Esponja tenta levantar pesos, para ser admirado pelos amigos
quanto a Lagosta atleta.
− A Lagosta se orgulha de ser capaz de levantar pesos maiores do que
aqueles que Bob Esponja levanta.
2) Fingimento buscando atenção:
− Bob Esponja finge rasgar as calças para provocar risos e ser o centro
das atenções.
3) Intolerância:
− Os amigos de Bob Esponja demonstram intolerância com a atitude dele
de fingimento, impondo-lhe um limite.
4) Aceitação da regra do grupo:
− Bob Esponja volta a ser verdadeiro e pede desculpas a todos.
5) Retorno ao grupo (Reinclusão)
− O grupo reinclui Bob Esponja com aceitação de suas desculpas e
aprovação de sua nova atitude, ou seja, ser verdadeiro.
4.4.2 Assistindo ao episódio
O episódio Calça Rasgada foi assistido pelas turmas, em dia e horário
agendados, conjuntamente com as professoras das turmas e a pesquisadora. Os
alunos que assistiram ao vídeo foram aqueles que estavam presentes na escola na
ocasião (outubro/2009), ou seja, 62 distribuídos da seguinte forma.
Quadro 4 – Número de alunos por turma e turno que participaram da segunda fase
da pesquisa:
TURMA
Manhã
Tarde
Total
TURNO
3 anos
7
9
16
4 anos Turma A
9
4
13
4 anos Turma B
6
10
16
5 anos
8
9
17
Total
30
32
62
Fonte: Dados da pesquisadora
111
As professoras acompanhavam participando, sem interferir com comentários
interpretativos. Sua presença foi importante na medida em que as crianças se
sentiam “acompanhadas”.
Os encontros foram registrados através de filmagens e fotografias. Nenhuma
criança recusou ao convite e todas permaneceram assistindo até ao final do vídeo.
Fizemos comentários pontuais que iriam gerar subsídios para refletirmos na
roda de conversa, em relação à sequência de fatos do episódio. Essas observações
verbais constituem um elo para a codificação dos dados brutos do texto que as
crianças elaboraram na roda de conversa.
1. “Bob Esponja rasgou a calça!”
2. “Ela está rasgando a calça novamente.”
3. “Olha como os amigos de Bob reagiram!”
4. O que “será que Bob Esponja vai fazer agora”?
4.4.3 Roda de conversa e confecção dos desenhos
Em cada turma fizemos a roda de conversa sobre o episódio que assistimos
enquanto as crianças desenhavam, atendendo ao nosso convite: Vamos desenhar o
que assistimos? Também perguntamos: Vocês me dão de presente esse desenho?
Quase todos responderam que sim e alguns questionaram: “Por que tia?
Respondemos: “Vou precisar colocar na minha pesquisa.” A criança ficava satisfeita
com essa explicação e concordava.
Como afirma Vygotsky (2007) a linguagem das crianças de 3 a 5 anos de
idade acompanha o movimento. Dessa forma, todas as crianças, enquanto
desenhavam, falavam sobre o episódio, perguntavam e opinavam livremente.
Algumas anotações in loco foram realizadas sobre os comentários das crianças,
porém, ficava difícil registrar tantos detalhes, além de correr o risco de selecionar
umas e não outras anotações. Mais adiante, os desenhos são apresentados e
comentados. Sendo assim, recorremos à filmadora e à máquina fotográfica digital,
“instrumentos tecnológicos que visam minimizar a intervenção do pesquisador no
processo de captação e registro das falas e ações das crianças (LEITE, 2008).
Recorremos, ainda, ao apoio de uma estagiária em Pedagogia, que atua na escola,
112
apresentando a vantagem de estar inserida no contexto da pesquisa. A mesma
realizou filmagens e fotografias das crianças ao assistirem ao vídeo. As crianças
aceitaram a presença da estagiária sem estranheza e não se incomodaram com a
máquina fotográfica e filmadora.
Chamamos “roda de conversa”, pois é através da relação dialógica entre
pesquisadora e a criança, que a mesma torna-se também pesquisadora, onde pode
perguntar e se colocar e, conjuntamente constroem o corpus da pesquisa (Apêndice
2).
Cada turma se posicionou diferentemente nesse momento e nós nos
envolvemos
com
as
crianças
numa
atitude
de
observação
participativa,
proporcionando-nos uma experiência de construção conjunta de significados e não
meramente uma representação da realidade.
Iniciados os desenhos, sentamos ao lado de cada criança para
“conversamos”. As turmas de 3 anos exigiam a presença, enquanto faziam o
desenho, precisando de supervisão. As turmas de 4 anos e as de 5 anos elaboraram
o desenho e esperavam que sentássemos ao lado para comentar sobre o mesmo. A
pergunta inicial para todos foi:
− Você gostaria de ser Bob Esponja? Por quê?
Em seguida, íamos conversando sem um roteiro rígido de perguntas e as
crianças conduziam a conversa. A nossa expectativa é que elas se expressassem
sobre o episódio quanto:
− Que foi que aconteceu com Bob Esponja no episódio?
− Como os amigos deles reagiram? Por quê?
− Que fez Bob Esponja para que os amigos deles ficassem novamente
alegres?
Pedimos que escrevessem seus nomes para identificar os desenhos. Para
aqueles que ainda não escrevem fizemos a tarefa por eles.
113
4.4.4 Você quer ser Bob Esponja? “Falas” das crianças
A transcrição das filmagens de cada turma nos possibilitou organizar e
analisar
os
dados
dando-lhes
significados.
Na
primeira
etapa,
estamos
sistematizando e analisando as primeiras “falas” das crianças relativas à roda de
conversa.
A atividade iniciou-se com a distribuição de papel e lápis para o desenho, o
qual acompanhamos promovendo um diálogo com perguntas provocadoras de
sentido. A primeira delas, ou seja, “Você gostaria de ser Bob Esponja? Por que?” foi
respondida pela maioria dos sujeitos com respostas que nos permitiram categorizálas em 4 modalidades Sim / Não / Talvez / Não expressaram opinião. O número de
crianças correspondem àquelas que participaram dessa atividade nos dois turnos.
Do total de 16 crianças de 3 anos de idade, 43% responderam que
gostariam de ser Bob Esponja, 38% disseram que não gostaria, 13% expressaram
um talvez e 6% não expressaram sua opinião.
O maior percentual afirmativo são dados que vem corroborar as pesquisas
de Piaget (1976) e Scheibe (2009), que afirmam que crianças menores de 5 anos
tendem a avaliar as mensagens televisivas como parte de sua estrutura,
incorporando inclusive personagens e embora saibam brincar de “faz de conta”,
elas se confundem quanto a uma coisa ser real ou apenas ficção na televisão.
As crianças de 3 anos realçaram aspectos como “gosto dele”, “adoro ele”,
“Ele é engraçado” ou apenas afirmam “Porque sim” para justificar porque querem ser
Bob Esponja. Para dizer que não querem ser Bob Esponja escolhem razões como:
“Ele rasgou as calças” e “Porque quero ser os amigos dele”.
As crianças da turma de 4 anos, no total de 29, apresentaram 27%
afirmando querer ser Bob Esponja, 17% expressando não querer, 3% disseram
talvez e mais da metade, ou seja 53% não colocaram sua opinião. Para as crianças
de 4 anos, a afirmação: “Ele é engraçado”, justifica querer ser Bob Esponja e
“Porque ele morreu” e “Porque quero ser Sandy” explicam não querer ser Bob
Esponja.
Com a turma de 5 anos (17 crianças) os percentuais entre o “sim” – 6%
(querer ser Bob Esponja) o “não” – 36% (não querer ser Bob Esponja) foram
114
expressivos. Com esta turma também mais da metade não expressaram sua opinião
ou seja, 59% e nenhuma criança se posicionou com dúvidas (talvez).
As crianças de 5 anos buscaram aspectos relativos a aparência como “Ele é
uma esponja” e “Ele é amarelo” ao afirmar que não querem ser Bob Esponja e, “Ele
tem amigos”, “Ele é legal” para justificar que sim.
4.4.5 Fazendo arte – fantasia e realidade
Continuando a pesquisa, sistematizamos e analisamos o conteúdo das falas
em cada turma, colhidas da transcrição das filmagens no momento da confecção
dos desenhos referentes a cada criança.
Como falamos anteriormente, os desenhos das crianças foram solicitados
como meio de expressão, pois consideramos o desenho como linguagem e um
recurso auxiliar no entendimento infantil e também para facilitar a interação entre a
pesquisadora e as crianças e entre elas mesmas.
Reservamos esse espaço para a apresentação da produção da criança com
o objetivo de valorização dessa produção como algo de relevância cultural, marco de
um contexto e expressão real da subjetividade infantil. Apresentamos os desenhos e
alguns comentários por turma de idade dos dois turnos (manhã e tarde) e para
preservar identidade das crianças usamos letras em lugar dos nomes e o número
refere-se à idade. Anotamos ainda o sexo da criança ao lado do número, sendo “M”
para o masculino e “F” para o feminino.
Muitas crianças desenharam na frente e no verso da folha. A medida que
iam desenhando falavam sobre o vídeo que assistiram, sobre si mesmo, sobre sua
vida na escola ou fora dela. As observações por escrito foram realizadas quando
conversamos, individualmente, com cada uma das crianças.
As frases que apresentamos são colocações da criança no momento de
conversa com a pesquisadora e com as outras crianças.
115
“Os menorzinhos” – 3 anos5
Participaram desse momento da pesquisa 16 crianças, sendo 7 do turno da
manhã e 9 do turno da tarde
3M(A) – À medida que desenhava, falava sobre os personagens do desenho Bob
Esponja. Ele simulava estar escrevendo as palavras além de desenhar os
personagens expressando-se claramente, reforçando a concepção de que o
desenho é linguagem. “Tem Fenda do Biquíni, tem Patrick, tem Bob
Esponja”.
3M(A)
3F(B) – Expressou seu conhecimento sobre o desenho animado Bob Esponja
falando sobre o Patrick e que Bob trabalha na lanchonete. Sua fala
demonstra conhecer bem sobre o desenho.
“Bob Esponja e Patrick trabalhando na lanchonete, foi o que me lembrei”.
3F(B)
5
A ortografia correta seria menorezinhos, porém, usamos o termo menorzinhos registrando a forma
popular comumente veiculada.
116
3F(C) – A criança desenhou ocupando todo o espaço da página, falando sem parar
sobre os personagens do desenho “escrevendo” sobre eles.
“Bob Esponja é engraçado. Patrick é seu amigo”
3F(C)
3M(D) – Esse garoto representou Bob Esponja de tamanho grande e tomou quase
toda a folha de papel. “Eu quero ser Bob Esponja, mas só às vezes”.
Por que? A criança não responde.
3M(D)
P.
117
3F(E) – Com detalhes a criança desenhou o Bob Esponja, disse sua cor, seu amigo
e como gostava dele. “Todo mundo quer ser Bob Esponja. Eu também. Eu
adoro ele”.
3F(E)
3M(F) – Bob Esponja foi representado como figura central do desenho e colocado no
mar onde ele mora. “Desenhei Bob Esponja. Gosto dele.
3M(F)
118
3M(G) – Esse garoto desenhou com detalhes tudo que se relacionou ao Bob
Esponja: “que ele faz sanduíche de presunto, seu amigo Patrick e onde eles
moram”. Ele falava e desenhava entusiasmado.
“Assisto Bob Esponja todos os dias. É legal. Assisto ele fazendo
sanduíches de presunto com Patrick. Eu quero ser ele porque ele é engraçado”.
(Esse garoto foi o que mais queria assistir ao episódio).
3M(G)
3F(H) – Desenhou Bob Esponja e disse que quer ser os amigos de Bob Esponja. O
desenho retrata um ser humano. Ao entregar fez formato de envelope,
dobrando a folha de papel. “Não quero ser Bob Esponja. Quero ser os
amigos dele”.
3F(H)
119
3M(I) – Primeiro desenhou apenas com lápis preto formas variadas. Virou a folha, e
desenhou Bob Esponja e apontou seu “vestido”.
“Olha o meu. Eu fiz o vestido de Bob Esponja.”
3M(I) 1º
3M(I) 2º
120
3M(J) – Perguntou se podia fazer uma casa. Desenhou o sol, Bob Esponja,
passarinho e o mar. Integrou outros elementos ao desenho, referente ao seu
conhecimento em geral.
“Pode fazer uma tasa (casa)?
P. Sim, pode. Então, o que Bob Esponja fez?
“Cantou para os amigos voltarem. Tia, fiz um passarinho e o sol”.
3M(J)
3F(K) – Essa garota desenhou na frente e no verso da folha contando o episódio
que assistiu.
“Os amiguinhos bateram as mãos (palmas) para Bob Esponja. Ele rasgou a
cueca e a calça também”.
3F(K) 1º
121
3F(K) 2º
3M(L) – O desenho retrata Bob Esponja com as calças rasgadas como a historinha
do episódio. O garoto descreveu seu desenho, mas a figura não é facilmente
identificada.
“Ele rasgou a cueca e os amigos não gostaram. Depois ele cantou a
música”.
3M(L)
122
3F(M) – Dizendo que quer ser Bob Esponja, a garota desenhou Bob Esponja e
contou os fatos principais do episódio. Escreveu letras no verso da folha,
dizendo ser seu nome.
“Eu quero ser Bob Esponja. Adoro ele”.
3F(M) 1º
3F(M) 2º
123
3F(N) – Essa criança também desenhou na frente e no verso da folha,
Primeiramente colocou elementos como: montanha, banana, passarinho,
nuvem, lago e o “coisa”. Depois desenhou Bob Esponja de tamanho grande
que tomou toda a folha, dizendo adorar Bob Esponja. Seu desenho não se
identifica com a realidade do episódio.
“Eu também quero”.
3F(N) 1°
3F(N) 2°
124
3M(O) – Esse garoto pediu ajuda a professora de sala. Ele diz que quer ser Bob
Esponja. Pinta o que a professora desenhou e desenha outros elementos,
frente e verso. Obs.: Não se pronunciou na roda de conversa.
3M(O) 1º
3M(O) 2º
125
3M(P) – A criança desenha vários círculos concêntricos e se levanta. Volta e
desenha algo parecido com pernas e pés, saindo dos círculos.
“Eu não quero ser Bob Esponja. Porque ele rasgou as calças”.
3M(P) 1º
3M(P) 2º
126
Os desenhos das crianças de 3 anos da EEBUFPB são expressões com
intenção, apesar de elas não terem a idéia acabada do aspecto que terá o desenho
ao ser finalizado. É um rabisco ordenado que se converte em um meio de
comunicação consciente da criança com seu ambiente. As cores não são
importantes nessa fase (GRIFFA & MORENO, 2001). Os desenhos, embora
apresentem-se em sua maioria formas pouco reconhecíveis, conforme os traços das
crianças dessa idade, são configurações representativas daquilo que a criança
deseja desenhar.
Durante nossas entrevistas – conversas, as crianças de 3 anos
demonstraram representar, simbolicamente, os conteúdos transmitidos pelo episódio
Calça Rasgada como elementos sobre a morada do personagem (3M(A), 3M(J) seus
amigos 3M(A), 3F(B), 3F(C), 3F(H)) onde ele trabalha (3F(B), 3M(G)). O conteúdo
pormenorizado do episódio não é demonstrado em suas falas, porém, observações
curtas, mas que com sentido garantem a sua compreensão, (3M(J), 3F(K), 3M(L),
3M(P)). As colocações relevam ainda a preocupação em agradar ao grupo como foi
a atitude de Bob Esponja no episódio. A interação entre as crianças da Escola de
Educação Básica da UFPB demonstra bem esse fenômeno social. Um dos grupos –
Turma de 3 anos, do turno vespertino, iniciou a “roda de conversa” falando sobre
saber dizer “obrigado”, “com licença”, “por favor”. São atitudes que regulam a
convivência e que elas, as crianças, se esforçam nessa intenção, através da
imitação como afirma Piaget (1978) recorrendo aos processos de assimilação e
acomodação. Nesta fase da pesquisa nós intencionamos captar os conteúdos do
episódio que haviam sido assimilados.
Toda essa busca ou interesse está relacionada à equilibração das estruturas
cognitivas, onde o sujeito avança procurando uma solução para o problema,
ultrapassando seu estágio atual. A escola participa desse processo na medida que
estimula os indivíduos a novas experiências e a refletir sobre elas.
127
Os do meio – 4 anos
O maior número de crianças que participaram da pesquisa faz parte do
grupo de 4 anos, pois, como já vimos, a escola possui duas turmas por turno com
essa idade. O número total é de 29 crianças, sendo 15 crianças do turno da manhã
e 14 do turno da tarde.
4M(A) – Essa criança desenhou na frente e no verso da folha de papel. Por ser
portadora da Síndrome de Down precisou de supervisão durante a
elaboração do desenho. Mostrou interesse em realizá-lo correspondendo
prontamente com o que era proposto.
Obs.: Ficava interagindo com seu olhar, observando, escutando e
desenhando.
4M(A) 1º
4M(A) 2º
128
4M(B) – Desenhou Bob Esponja e sua amiga Sandy. Ele disse que preferia o
desenho animado Pica-pau. Esteve todo tempo falando sobre si mesmo, seu
colega do lado e sobre o vídeo assistido.
“Eu fui na casa dele e vi que ele tem bolsa de Bob Esponja. Eu não gostaria
de ser Bob Esponja. O meu mais preferido do Brasil é o Pica-Pau”.
4M(B)
4M(C) – A criança representou o que assistiu no vídeo, delimitou os espaços
contornando-os de cores diferentes. Fala ainda sobre o personagem
principal.
“Eu assisto Bob Esponja. Eu até tenho bolsa e lancheira de Bob Esponja”.
4M(C)
129
4F(D) – Essa criança é muito observadora, faz comentários sobre o desenho
animado que assistiu, desenha os personagens e os coloca no contexto
espacial delimitado. Ainda comenta com colegas e a professora sobre tudo
que faz .
“Eu assisto na televisão e no DVD. Eu quero ser Bob Esponja...”
4F(D)
4M(E) – Bem posicionado, o autor do desenho, configurou apenas o personagem
principal e o “mar”, ou seja, onde se passava o episódio.
“Eu quero ser Bob Esponja. Eu acho muito engraçado...”
4M(E)
130
4F(F) – A criança desenhou usando várias cores, tomando todo o espaço da folha
de papel e colocando personagens e elementos – chave do episódio.
“Eu quero ser Bob Esponja...”
4F(F)
4F(G) – Essa garota demorou a iniciar o desenho, pois teve uma discussão com
outra criança que a deixou chorando. Quando desenhou, fez Bob Esponja e
Sandy dizendo ser sobre o desenho animado que assistiu.
“Eu quero ser Bob Esponja porque ele é engraçado. Eu também fiz Sandy
também”.
4F(G)
131
4M(H) – A criança desenhou usando uma só cor. Representou Bob Esponja, Sandy,
o mar e as algas marinhas. Identificamos com clareza o que quis desenhar.
Pedia sempre para vermos o que ele desenhou.
“Venha ver o que desenhei: Bob Esponja, seu amigo... Eu quero ser ele
porque ele é engraçado.
4M(H)
4M(I) – O garoto representou Bob Esponja com tamanho bem maior (personagem
principal) que o outro personagem. Colocou o mar como local do ocorrido na
historinha.
Obs.: Não se pronunciou na roda de conversa.
4M(I)
132
4F(J) – A criança é portadora de Síndrome de Down e também precisou de
supervisão ao fazer o desenho.
4F(J)
4F(K) – Detalhista e observadora desenhou os personagens principais. Diz que
Sandy tem lacinho na cabeça.
“Eu queria ser Sandy, aquela que tem lacinho na cabeça”.
4F(K)
133
4F(L) – Seu desenho ainda representa formas indistintas mas fala todo o tempo e
chama a atenção para si mesma.
“Assisto todo dia na televisão”.
4F(L) 1º
4F(L) 2º
134
4F(M) – Dividiu a folha de papel em duas através de um traço. De um lado colocou
uma casa, uma porta e do outro lado colocou Bob Esponja.
“Eu fiz a casa de Bob”
4F(M)
4F(N) – Desenhou Bob Esponja e a casa dele. Seu desenho tem formas pequenas,
porém facilmente identificáveis.
“A essa é a casa dele”
4F(N)
135
4F(O) – Essa garota fez seu desenho muito parecido com o de sua colega 4F(M).
Elas estavam sentadas lado a lado.
“Fiz a casa dele...”
4F(O) 1º
4F(O) 2º
136
4F(P) – Quando essa garota decidiu desenhar, primeiramente pintou a folha de
papel de várias cores. Depois inseriu alguns desenhos representando
personagens e elementos do desenho animado Bob Esponja. Pediu para
rasgarmos o desenho depois.
“Bob Esponja é um homem. Eu quero ser a amiguinha dele”.
4F(P)
4M(Q) – Desenhou o personagem Bob Esponja, sua casa e a arena na praia, onde
ocorreu o campeonato de levantamento de peso. Constatamos que lembra
do que se passou no episódio.
“Bob Esponja levantando peso”
4M(Q)
137
4F(R) – Essa garota desenhou os elementos do desenho animado que assistiu e
acrescentou outros de sua imaginação.
“Eu gosto de Bob Esponja, quer dizer não gosto. Não, não. Eu gosto.”
4F(R)
4F(S) – A criança pintou com várias cores a folha, dizendo ser o mar colorido onde
Bob Esponja morreu. Desenhou ainda sorvetes de morango e chocolate.
“Estou desenhando sorvete de morango e chocolate e o mar onde Bob
Esponja morreu. Quero ser Bob Esponja porque gosto dele”
4F(S)
138
4F(T) – Essa garota passou muito tempo sem desenhar. Quando o fez desenhou
Bob Esponja e borboletinhas que disse gostar muito.
“Gosto de borboletinhas”
4F(T)
4F(U) – Essa criança fez um primeiro desenho e jogou fora. No segundo
representou Bob Esponja e outros personagens de forma identificável, com
expressões faciais diferentes e dentro de um espaço delimitado.
4F(U) 1º
139
4F(U) 2º
4M(V) – A criança representou o que assistiu, com cores e formas variadas.
Identificamos os personagens quando ele apontou os desenhos.
“...ele cantou a música e os amigos gostaram’
4M(V)
140
4F(W) – Seu desenho representa Bob Esponja, porém, não com formas precisas.
Contou a história do episódio rapidamente contendo começo, meio e fim,
demonstrando total compreensão dos conteúdos do mesmo.
“Ele rasgou as calças, ficou triste, cantou uma música e depois foi tomar
sorvete”.
4F(W)
4F(X) – Desenhou Bob Esponja sem olhos e boca, mas retratando seu aspecto de
esponja (cheio de furinhos).
“Eu quero ser Bob Esponja”
4F(X) 1º
141
4F(X) 2º
4F(Y) – Desenhou Bob Esponja, um sol e nuvens. Não conversa pouco sobre o
desenho, mas percebemos que o compreendeu, pois seu desenho
demonstra isso.
“Rasgou as calças. Depois fez um som e todos ficaram alegres”
4F(Y)
142
4F(Z) – A criança desenha Bob Esponja segurando os pesos como ocorreu no
episódio, desenha a areia, o mar e afirma que Bob morreu.
“Bob Esponja morreu...”
4F(Z)
4M(A1) – Esse garoto desenha Bob Esponja falando tudo sobre o episódio.
Demonstra saber bem mais que as outras crianças sobre Bob Esponja,
confirmando sua preferência.
“Ele rasgou as calças, dançou e/os amigos ficaram alegres...”
4M(A1)
143
4M(B1) – Fez o desenho representando Bob Esponja levantando peso. As formas do
desenho não são bem definidas, mas demonstram que a criança
compreendeu o conteúdo do episódio. Desenhou na frente e no verso.
“Quero ser Bob Esponja porque ele é engraçado”
4M(B1) 1º
4M(B1) 2º
144
4M(C1) – Representou vários personagens, dando destaque em cor diferente para
Bob Esponja localizados na areia e no mar. Também desenhou uma flor e
um sol.
Obs.: Quando pergunto onde está Bob Esponja ela aponta o desenho maior
e de cor diferente.
4M(C1)
Os desenhos das crianças de 4 anos que acabamos de descrever
apresentam, em sua maioria, configurações mais definidas. Também não solicitaram
ajuda dos adultos e não foram influenciados um pelo outro. Todos os desenhos têm
uma marca individual, isto é, diferem entre si. Outra característica dessa idade é a
contextualização e localização dos personagens. As crianças desenhavam os
personagens localizados no mar, ou na areia ou na casa. Essa atitude demonstra
preocupação em relacionar ele mesmo com os elementos do desenho.
Outras figuras foram desenhadas, que não fazem parte da historinha que
assistiram. Esse fato vem colaborar com o nosso posicionamento de que a criança
reproduz o que vê, mas também produz adicionando seu conhecimento anterior ao
145
novo conhecimento e, com isso, imprime seu toque individual, sua identidade
(PIAGET, 1978; VYGOTSKY, 2007).
A televisão, através do desenho animado, tem seu papel socializador, na
medida em que interage socialmente com seus telespectadores. Em algumas “falas”,
percebemos a influência comercial da indústria cultural, quando uma criança (4M(C)
afirma possuir objetos que representam Bob Esponja (bolsa e lancheira) e outra
criança confirma 4M(B)).
O processo de representação simbólica (PIAGET, 1978) confirma-se em
todas as “falas” das crianças de 4 anos. Elas se identificam com o personagem
principal, escolhendo a característica do mesmo que mais lhe agrada (4M(C), 4M(E),
4M(A), 4M(B1) ou com outros personagens como Sandy, a esquila (4F(K), 4F(P)).
Na internalização proposta por Vygotsky (2007), percebemos quando as
crianças de 4 anos retiram da suas interações sociais, subsídios para suas funções
mentais. Observamos como a justificativa “engraçado”, por querer ser Bob Esponja,
é frequente nas respostas (4M(E), 4M(H)). Também os relatos do episódio focalizam
como Bob Esponja agiu para que seus amigos ficassem alegres com ele novamente,
ou seja, o que era exterior, conteúdo do desenho animado, torna-se interior,
conhecimento intrapsíquico, (4M(V), 4F(W), 4F(Y), 4M(A1)).
Os elementos do contexto social das crianças aparecem nas “falas”
enquanto desenham ou interagem com o grupo (4F(S), 4F(T)) colocando “sorvetes”,
“borboletinhas”, comentários sobre o sexo do personagem (4F(P)), e sua preferência
por outros desenhos animados (4M(B)), demonstrando a produção de sentido
construída de acordo com a subjetividade peculiar a cada criança.
146
Os “maiorzinhos”6 – 5 anos
Os participantes de 5 anos na confecção do desenho foram 17 no total,
sendo 8 crianças do turno da manhã e 9 do turno da tarde.
5F(A) – A criança desenhou os personagens principais: Bob Esponja, Sandy e os
amigos de Bob Esponja. Também desenhou sol, lua, nuvens e estrelas
configurando-os todos no “céu”. O desenho é rico em detalhes e cores.
“Quero ser Bob Esponja...”
5F(A)
5F(B) – O desenho apresenta figuras bem definidas e facilmente identificáveis. As
cores de fundo são dispostas representando espaços diferentes sobre o
desenho animado Bob Esponja. Um desses espaços representa o que
ocorreu no episódio, os outros representam elementos a mais sobre Bob
Esponja: seus amigos e seu bichinho de estimação. Ainda desenhou flores,
sol, lua, nuvens com carinhas sorridentes. É evidente que a criança
comunica-se através do desenho, tanto no que refere-se ao episódio como
ao que se refere ao seu contexto social.
“Vou fazer os amigos de Bob Esponja, ele... Eles ficaram alegres quando
Bob cantou”
5F(B)
6
Aqui também optamos pela forma de expressão popular “maiorzinhos”.
147
5M(C) – Esse garoto desenhou Bob Esponja de acordo com o que ocorreu no
episódio; rasgou a cueca, rasgou o short e, por fim, cantou. Ainda desenhou
o “cachorrinho” de Bob Esponja, como ele se expressou (animal de
estimação).
“Desenhei o cachorrinho de Bob Esponja”
5M(C)
5M(D) – A criança desenhou Bob Esponja tocando guitarra, fato ocorrido no episódio
que ele assistiu com a turma.
“Ele está na terra. Ele tocou flauta. Não, tocou guitarra”
5M(D)
148
5F(E) – O desenho apresenta Bob Esponja, sol, lua e estrelas. Observamos nesse
desenho, que o mesmo se identifica mais com um humano do que com Bob
Esponja e, ainda porque a cabeça não está ligada ao corpo.
Obs.: Não se pronunciou quanto ao episódio.
5F(E)
5F(F) – O desenho apresenta muitos elementos com riqueza de detalhes.
Demonstra se lembrar de todo o episódio. Resumiu numa frase o conteúdo
do episódio.
“Os amigos ... riu, riu, riu e depois não riu”
5F(F)
149
5M(G) – O garoto desenhou figuras do vídeo assistido e outras como televisão, o
controle da televisão e a pizza de Bob Esponja.
Obs.: Aos conteúdos do episódio, o garoto os inseriu ao seu contexto físico e
social.
5M(G)
5M(H) – O desenho representa rabiscos desordenados. O autor do desenho possui
diagnóstico de autismo. A professora de sala de aula esteve motivando-o a
desenhar.
Obs.: Sempre com o olhar fixo num determinado ponto o garoto movia o
lápis no papel em várias direções.
5M(H)
150
5F(I) – A garota preocupou-se em desenhar os personagens principais e, depois,
coloriu com muito zelo.
“Se ele não enganasse as pessoas eu queria ser ele”
5F(I)
5M(J) – Esse desenho foi estimulado pela professora, colocando Bob Esponja e
pedindo para a criança pintar. Essa criança tem diagnóstico de autismo.
Obs.: O Desenho foi colorido pelo garoto.
5M(J)
151
5M(L) – A criança desenhou uma cena do episódio assistido com riqueza de
detalhes e cores; Bob Esponja e outros surfando, descendo no “tubo
d’água”. O mar é também representado.
“Vou pintar Bob Esponja descendo a onda”
5M(L)
5M (M) – Desenhou Bob Esponja no centro da folha de papel e coloriu. Expressouse verbalmente de forma eloquente sobre o episódio.
“Ele é legal... eu gosto dele, quero ser ele”
5M(M)
152
5M(N) – Desenhou Bob Esponja de tamanho grande tomando quase toda a folha. A
figura é facilmente identificável.
“Eu não quero ser Bob Esponja. Porque ele é esponja, quadrado e tem
bolinhas”
5M(N)
5M(O) – A criança desenhou Bob Esponja e o coloriu com cores próprias do
desenho, p. ex. olhos azuis, calça marrom, etc.
“Não quero porque ele é amarelo, tem um monte de esponja”
5M(O)
153
5F(P) – A garota desenhou os personagens principais e os coloriu com cores
vibrantes, mas que não correspondem àquelas do desenho. Bob Esponja
configura-se como o maior desenho, representando o personagem central.
“Ele resolveu cantar e os amigos ficaram contentes...’
5F(P)
5M(Q) – Esse garoto, antes de desenhar Bob Esponja, traçou margens, isto é,
delimitou o espaço.
“Eu não quero ser Bob Esponja ... Ele cantou para os amigos, mas eu não
quero’
5M(Q)
154
5M(R) – O desenho apresenta vários elementos referentes ao desenho animado
Bob Esponja: casa, amigos e o próprio Bob Esponja. O mar é representado
como contexto, este é, onde ocorre todo o episódio.
“Não quero ser Bob Esponja. Gosto mais de Dragon Ball. Ele e os amigos
foram cantar, mas eu não quero”
5M(R)
As crianças da turma de 5 anos diferenciaram-se das outras turmas,
principalmente, pela definição precisa das figuras, pelo traço firme nos desenhos,
pela objetividade na apresentação do desenho como um todo. Podemos considerálos capazes de se expressar sinteticamente e com realismo (PIAGET, 1978), como
também a riqueza de detalhes é evidente (5F(A), 5F(B), 5F(F), 5M(L), 5F(P)).
Os desenhos das crianças de 5 anos focalizam o conteúdo do episódio
assistido colocando cenas representativas do mesmo (5F(B), 5F(F), 5M(L), 5M(R)) e
tecendo comentários sobre como Bob esponja reagiu para que os amigos voltassem
a ficar alegres com ele (5M(D), 5F(F), 5F(I), 5F(P), 5M(Q)); aspectos sobre a
aparência física de Bob Esponja (5M(N), 5M(O) e sobre a tentativa do personagem
de enganar seus amigos 5F(I).
São comentários relevantes que transparecem o desejo de identificação,
porém, imprimindo sua marca individual como afirma Vygotsky (2007).
155
4.4.6 Na Pista dos Saberes
Nesse item, considerando os desenhos e comentários das crianças sobre o
desenho animado assistido, nós os analisamos não mais por turma de idade, mas,
de forma geral, de acordo com os eixos temáticos descritos em nosso suporte
teórico, Piaget, Vygotsky e Giroux.
Notadamente, algo presente nos diálogos sobre o desenho, foi como Bob
Esponja fez para que seus amigos voltassem a ficar alegres com ele. Observamos
que essa foi uma preocupação de cada grupo demonstrando a compreensão do
conteúdo do desenho animado e se identificando com o personagem na sua
necessidade de manter o bom relacionamento com os amigos. É importante lembrar
que essa preocupação social é registrada em maior número nas falas das crianças
de 5 anos. Tal fato não é subsidiado pela teoria piagetiana, quando teoriza que as
crianças no período pré-operacional, (de 2 a 7 anos) não adquiriram, ainda, a
capacidade da reversibilidade. Essa capacidade daria gradualmente à criança, a
responsabilidade referente às suas ações em relação ao outro. Pelo que
observamos as crianças de 5 anos e algumas de 4 anos compreenderam a relação
que causou intolerância nos amiguinhos de Bob Esponja e o que ele fez para
reverter a situação. Também foi registrado que os sujeitos pesquisados focalizaram
uma característica central da historinha em detrimento de outras como toda criança
nesse estágio cognitivo, ou seja, pré-operacional. Elas ainda apresentam
pensamentos lógico e ilógico, por exemplo: Quero ser Bob Esponja porque ele é
engraçado, tem amigos, é legal, mas outros dizem: Não quero ser Bob Esponja
porque ele é amarelo, porque morreu, etc. É bom lembrar que os parâmetros lógicos
levados em conta são da ótica do adulto; o que com certeza é lógico para uma
criança, poderá não ser lógico para um adulto.
Considerando a perspectiva histórico cultural de Vygotsky (2007), todo esse
interesse das crianças em querer ou não ser Bob Esponja e procurar saber como ele
resolveu a divergência com os amigos, deixa transparecer as capacidades de
observação, imitação e imaginação. Como Vygotsky (1993) explica, é na brincadeira
que a criança observa as informações e situações, utiliza a imaginação, separando o
pensamento dos objetos e fazendo surgir a ação das idéias. Essa ação poderá ser
imitação e, ou “faz de conta”, as quais permitem à criança alcançar a internalização
156
que é o processo onde ocorre a reconstrução interna daquilo que é observado
externamente. Assistir ao vídeo do desenho animado, constituiu uma brincadeira,
sem contar que já faz parte do cotidiano infantil. Ao assistirem aos desenhos
animados, as crianças misturam sonho (desejo), ficção e aventura com realidade. Os
sujeitos pesquisados referiam-se ao personagem do desenho animado como uma
pessoa, mas faziam suas considerações levando em conta a realidade. Sendo
assim, algumas crianças disseram: “Não quero ser Bob Esponja porque ele é uma
esponja”, isto é, considerando que, na realidade, ela mesma não poderia contrariar
sua natureza de ser humano. No entanto, na sua maioria, as crianças atribuíram
qualidades e sentimentos humanos aos personagens do vídeo: engraçado, legal,
mentiroso, triste, alegre, etc.
Essa atitude vem subsidiar, assim, o processo da internalização que, como
postula Vygotsky, as funções mentais superiores aparecem primeiramente no plano
social e depois surgem no plano psicológico. Nesse processo de transposição de
planos, ou seja, do exterior (social) para o interior do indivíduo (intrapsíquico), dois
elementos são primordiais: a cultura e a natureza biológica do próprio indivíduo. Por
isso, apesar de os homens serem semelhantes, também são tão diferentes.
Detalhando melhor, podemos dizer, à luz da teoria de Vygotsky que, embora os
seres humanos tenham em comum as significações culturais, as quais os definem
como humanos, eles são todos diferentes, pois cada um deles tem sua versão
peculiar da natureza cultural dos homens.
Para Vygotsky (2007) a subjetividade estaria resguardada. As crianças que
assistiram ao desenho podem, então, identificar-se com os personagens, porém, ao
convergir a significação cultural em significação pessoal, imprimem a essa última,
sua marca pessoal. Isso ocorre porque o campo da significação não é algo
homogêneo. Os significados culturais são socialmente instituídos, no entanto, os
sentidos são significados culturais construídos pelos indivíduos.
Consideremos, nesse momento, a polêmica e sempre presente discussão
sobre a indústria cultural. Os desenhos animados, que fazem parte da mídia
televisiva, também são produtos culturais. O desenho animado Bob Esponja cumpre
seu papel de entretenimento e ao mesmo tempo, utiliza-se de estratégias
comerciais. Entre os sujeitos pesquisados, encontramos um deles que possui
objetos com a marca Bob Esponja. Todos, porém, reconheceram que existem
157
inúmeros objetos dessa marca. Algumas crianças também se interessaram pelo site
do jogo Bob Esponja e por conhecer bonecos que representam os personagens.
Tais fatos corroboram com a visão frakfurtiana de que a cultura assume um papelchave na construção histórica e na vida cotidiana dos indivíduos. Entretanto,
podemos considerar que as pessoas não estão totalmente dominadas por essa
influência. Na presente pesquisa, observamos que as mensagens transmitidas pelo
vídeo interagem com as idéias das crianças, porém não as substituem. A forma de
pensar das crianças deixa transparecer a influência dos referidos conteúdos, porém,
também transparece seu jeito de tomar consciência da intencionalidade dos fatos;
isto constitui sua subjetividade. Com certeza, o fator social é marcante na vida das
crianças, principalmente, porque ainda são consideradas seres que não estão
prontos e que o adulto sabe mais que elas. Como resistir então? Como impedir a
reprodução cultural e social? Para Giroux (1986), primeiramente, é necessário
compreender as complexas relações de escolarização e sociedade dominantes e
analisar pormenorizadamente os conceitos de conflito e resistência. Para o referido
autor, resistência é um conjunto de oposições parcialmente conscientes, que
impedem a reprodução. Consideramos que a forma peculiar de pensar de cada
pessoa já constitui uma forma de resistência, que é reforçada por pais e professores
quando adotam condutas básicas de oposição, que são o diálogo e a análise crítica.
Como já foi comentado, os conteúdos do desenho animado Bob Esponja
constituem um verdadeiro “merchandising” do capitalismo, apresentando histórias
sobre competições onde o melhor ganha troféus, onde aqueles que não conseguem
atingir os melhores lugares são chamados de fracassados. Além do mais, o trabalho
é o eixo central da vida do personagem principal e seu patrão é explorador, adora
dinheiro e não valoriza o bom empregado pelo que ele é e sim pelo que ele produz
(LIRA, 2005).
Ao comentar com as crianças sobre os episódios do referido desenho
animado, nenhuma delas fez críticas como nos referimos anteriormente, porém,
apresentam comentários do tipo: “Bob Esponja trabalha na lanchonete que é do Sr.
Siriguejo, um homem chato que gosta muito de dinheiro. Ele só fala em dinheiro”
(criança de 5 anos), confirmando seu posicionamento crítico. Com certeza, não são
todas as crianças que apresentaram esses comentários, mas eles surgiram no
158
grupo, criaram conflitos cognitivos, que podem gerar mudanças qualitativas na forma
de pensar.
Finalizando a descrição e análise dos desenhos e falas das crianças,
consideramos que esse instrumento constituiu peça fundamental na consecução do
objetivo da pesquisa, isto é, de considerar a criança sujeito ativo na construção das
relações sociais, oferecendo-lhe o espaço para expressar-se pelo desenho e ser
ouvida em suas opiniões.
Passemos as considerações finais onde expomos opiniões e sugestões
sobre a investigação realizada.
159
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tendo em vista a relação dos conteúdos do desenho animado Bob Esponja
Calça Quadrada e o desenvolvimento da subjetividade de crianças de 3 a 5 anos,
podemos afirmar que se constitui uma interrelação. Constatamos que o desenho
animado, como toda mídia, é dotado de intencionalidade, contudo, o espectador em
geral, inclusive a criança, confere aos conteúdos um sentido próprio além daquele
correspondente ao do autor.
O nosso trabalho apresenta teóricos que dialogam sobre o processo
cognitivo e social de assimilação, ou seja, Piaget (1973, 1976, 1978), Vygotsky
(1993, 2007) e Giroux (1986, 2003). Outros teóricos apresentam a mídia como
processo institucionalizado onde diferentes atores se reúnem e se confrontam,
buscando alcançar uma síntese de significados. Para alguns as subjetividades dos
indivíduos são influenciadas sobremaneira pelos meios de comunicação de massa,
ou seja, a indústria cultural produz e os indivíduos consomem (ADORNO e
HORKHEIMER, 1985 e outros).
Para outros teóricos,
o receptor não é tido como alguém que apenas absorve passivamente o
conteúdo do que é veiculado nas mídias, mas, ao contrário, como alguém
que participa ativamente da produção de sentido, dentro de uma lógica
cultural e que lida com as possibilidades que ela essa cultura lhe abre (ou
limita) para construir significados (DUARTE, 2008 e outros).
Esse último posicionamento é comprovado através da pesquisa, todavia, um
dos nossos objetivos é, com esse trabalho, incentivar educadores a desenvolverem
o hábito de relacionar-se criticamente diante da mídia televisiva, especificamente,
diante dos desenhos animados.
Com esta proposição concordamos e reafirmamos que a educação para a
mídia, expressão utilizada por Belloni (2005) para designar um conjunto de
informações bastante útil para a problematização das características técnicas e
sociais da televisão, é o caminho a ser trilhado pelos educadores. Giroux (1986)
corrobora esta proposta, quando postula a necessidade da pedagogia crítica nas
160
escolas, visando a possibilidade de resistência das crianças diante de conteúdos
homogeinizantes e não emancipatórios.
Consideramos ainda que o nosso objetivo em atribuir à criança a condição
de receber e participar como autora das produções culturais foi plenamente
alcançado na medida que as tornamos participantes e coautoras da investigação
através das falas e diálogos interessantes e argumentativos e também de seus
desenhos. Devemos promover na escola a educação para a mídia televisiva com
dupla intenção: de torná-la instrumento pedagógico e de ser objeto de estudo de
professores e alunos, favorecendo a ambos adquirir uma postura crítica diante dela
(CAMURRA e TERUYA, 2009). Queremos lembrar que a postura crítica que
almejamos, são constituídas com a ponderação, reflexão, seleção de estratégias ao
invés da inflexibilidade, rigidez e julgamento rápido. Existem diferentes modos de se
engajar na crítica social, uma delas é prestando atenção tanto ao processo como ao
produto do trabalho intelectual e valorizando igualmente o esforço individual e o
coletivo.
O desenho animado Bob Esponja Calça Quadrada é preferência entre os
outros apresentados e frequentemente assistido pelas crianças participantes da
pesquisa. Suas imagens expressivas, sua linguagem atrativa concorrem para
satisfazerem
à
criança
e
prenderem
sua
atenção.
Alguns
aspectos
do
comportamento de Bob Esponja são questionáveis como não ir à escola, sua
obsessão pelo trabalho, sua ingenuidade excessiva acreditando em tudo e em
todos. Todavia, há alguns elementos positivos que podem servir de modelo como
seu otimismo, seu companheirismo com o amigo Patrick, a responsabilidade no
trabalho, a postura tolerante diante das provocações do Lula Molusco, o prazer de
brincar e o zelo com o seu animal de estimação Gary. Esses são elementos, dentre
outros, que poderão ser pesquisados em trabalhos futuros, sendo, portanto, umas
das nossas intenções após a conclusão do trabalho de tese.
161
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168
APÊNDICES
Apêndice 1
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Prezado (a) Senhor (a)
Esta pesquisa é sobre “Desenho animado e educação: calça quadrada, cabeça redonda?"
e será desenvolvida por Margarida Sonia Marinho do Monte Silva, aluna do Curso de Doutorado do
Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Educação da Universidade Federal da
Paraíba, sob a orientação da Profª. Dra. Adelaide Alves Dias.
Os objetivos do estudo são: analisar os conteúdos do desenho animado Bob Esponja
através da fala das crianças da Escola de Ensino Básico da UFPB, que interferem na construção
da subjetividade; verificar a frequência com que a criança da creche escola assiste ao desenho
animado Bob Esponja.
A finalidade deste trabalho é contribuir para o debate sobre desenhos animados numa
perspectiva emancipatória dos sujeitos, a partir de uma reflexão por parte de pais e educadores
que trabalham com esta faixa etária, proporcionando uma visão critica sobre os conteúdos
transmitidos por esses desenhos. Esta investigação presume o estudo da formação simbólica
infantil, a internalização e a construção do conhecimento crítico.
Solicitamos a sua colaboração em conceder a participação das crianças desta escola nas
entrevistas e no momento das observações, como também sua autorização para apresentar os
resultados deste estudo em eventos da área de educação e publicar em revista científica. Por
ocasião da publicação dos resultados, seu nome será mantido em sigilo. Informamos que esta
pesquisa não oferece riscos previsíveis para o desempenho e o desenvolvimento das atividades
das crianças.
Esclarecemos que a participação das crianças no estudo é voluntária e, portanto, o(a)
senhor(a) não é obrigado(a) a fornecer as informações e/ou colaborar com as atividades solicitadas
pela Pesquisadora. Caso decida pela não participação da criança no estudo, ou resolva desistir da
mesma, a criança não sofrerá nenhum dano, nem haverá modificação na assistência que vem
recebendo nesta Instituição.
A pesquisadora estará a sua disposição para possíveis esclarecimentos que considere
necessários em qualquer etapa da pesquisa.
Diante do exposto, declaro que fui devidamente esclarecido(a) e dou o meu consentimento
para a criança participar da pesquisa e para publicação dos resultados.
_________________________________________
Assinatura do Participante da Pesquisa
ou Responsável Legal
Contato com a Pesquisadora Responsável: Margarida Sonia Marinho do Monte Silva
Caso necessite de maiores informações sobre o presente estudo, favor ligar para a pesquisadora
Endereço (Setor de Trabalho): Centro de Educação – Departamento de Fundamentação da
Educação da UFPB – Campus I
Telefone: (83) 3216-7447
Atenciosamente,
___________________________________________
Assinatura da Pesquisadora Responsável
Apêndice 2
RODA DE CONVERSA
TURMA: 3 anos
TURNO: MANHÃ
Nº DE CRIANÇAS: 7
DATA: 04/11/09
Quando as crianças voltaram para a sala de aula a professora ajudou a
distribuir as folhas de papel. As crianças escolheram os lápis para desenhar.
P. Vocês vão desenhar o que assistiram no episódio Bob Esponja, calça rasgada.
Eu vou ficar observando e conversando com cada um.
3M(A): (Fez um desenho cheio de símbolos e a medida que desenhava contava o
episódio – Tem fenda do Biquíni, tem Patrick, tem Bob Esponja. (Ele simulava
escrever as palavras)
3F(B): Bob Esponja e Patrick, foi o que me lembrei.
3F(C): Desenha sem parar de falar – Bob Esponja é engraçado. Patrick é seu
amigo.
3M(D): Eu quero ser Bob Esponja, mas só às vezes.
P. Por que?
3M(D): (não responde)
3F(E): Todo mundo quer ser Bob Esponja. Eu também. Eu adoro ele.
3M(F): Desenhei Bob Esponja. Gosto dele.
3M(G): Assisto Bob Esponja todos os dias. É legal. Assisto ele fazendo sanduíches
de presunto com Patrick. Eu quero ser ele porque ele é engraçado. (Esse garoto foi
o que mais queria assistir ao vídeo).
171
RODA DE CONVERSA
TURMA: 4 anos A
TURNO: MANHÃ
Nº DE CRIANÇAS: 9
DATA: 10/11/09
P. Distribuindo folhas. Duas crianças estão chorando.
4F(G): Você me deu um murro
4F(F): Eu já pedi desculpas
Profª: Já sabem o que é para fazer, Mateus? Natan já sabe o que é pra fazer?
P. Sim, agora vocês vão desenhar o episódio calça rasgada que assistiram sobre
Bob Esponja.
Todos estão empenhados em desenhar
Sento junto de Mariana. Ela diz está desenhando a cabeça de Bob Esponja.
4M(I): Eu também, vou pegar o amarelo (pega o lápis) (Profª sempre interfere). Cada
um faz o seu!!
P. Você assiste Bob Esponja?
4F(F): Assisto não. Só às vezes.
4M(I): Eu assisto Bob Esponja, Eu tenho até alguma coisa dele. Bolsa, lancheira.
4M(B). Eu já fui na casa dele e vi que ele tem bolsa de Bob Esponja.
P. Você gostaria de ser Bob Esponja.
4M(B): Eu não. Tia, o mais preferido meu do Brasil é o Pica-pau.
4M(H). Eu também tia o meu preferido é o Pica-pau.
P. Eu vou para juntinho de você conversar. Você assiste o desenho Bob Esponja na
televisão?
4F(C): Sim, mas assisto também no DVD. (Fez desenho com Bob Esponja na praia /
P. Vocês dão esse desenho de presente para mim? Cada um diz: Eu dou. Eu dou,
tia. Eu dou.... (todos respondem sim)
P. Você quer ser Bob Esponja?
4F(C): Quero porque ele é engraçado.
P. (Mariana entrega) Oba, Mariana já entregou!
P. Natan, você quer ser Bob Esponja?
4M(I): Sim porque ele é engraçado. Fiz também Sandy.
4F(G): Quero ser Bob Esponja as vezes (a menina que brigou com Mariana vai
entregar o desenho.
Eu aproveito e pergunto o que aconteceu, referindo-me a discussão. Elas explicamse falando ao mesmo tempo. Mariana me entrega o desenho.
4M(H): Oh tia o que eu faço! Estou fazendo a Sandy. Tiaaa! Olha o meu desenho.
(converso com ele um pouco). Nessa ocasião uma das crianças que brigou, arruma
o cabelo da outra.
4M(E): Conversa baixinho (Natan interrompe. Volto para Felipe. Ele é tímido e
responde muito baixinho.
4M(D): Eu assisto na televisão e no DVD. Eu quero ser Bob Esponja.
A criança 4M(A) não se pronunciou na roda de conversa apresentando no
entanto, seu desenho.
172
RODA DE CONVERSA
TURMA: 4 anos B
TURNO: MANHÃ
Nº DE CRIANÇAS: 9
DATA: 06/11/09
P. Desenhar o episódio Bob Esponja, calça rasgada do jeito que vocês quiserem.
Bem bonito.
4F(M): Tia vou fazer um coração.
4F(N). Eu não sei fazer.
P. Não sabe? Vamos tentar! O que você se lembra do episódio?
4F(N). De Bob Esponja, de Patrick.
P. Patrick não apareceu hoje no episódio. Apareceu aquela outra amiguinha dele, a
Sandy.
4F(M). Por que ele não apareceu?
P. Foi só nesse episódio. Vamos ver seu desenho. Isso aí é o que? A casa?
4F(M). É, a casa.
P. Todo mundo desenhando. Que bom!
4F(O). Que coisa linda! A casa de Bob Esponja.
P. Quando terminarem coloquem o nome.
Quem é que assiste Bob Esponja?
4F(L). Assisto todo dia na televisão.
P. Você gosta? Queria ser Bob Esponja?
4F(L). Queria ser Patrick.
4F(K). Eu queira ser Sandy. Aquela que tem um lacinho no cabeço.
4F(L). Bob Esponja é homem. Eu quero ser a amiguinha dele.
4F(O): Eu também.
P. Como foi que ele fez para as pessoas gostarem dele?
4F(O) – Foi buscar um violão. Oh. Tia eu sei escrever meu nome, olhe!
P. Vocês me dão esse desenho de presente?
4F(O): Sim, claro. (outros dizem sim, sim!)
P. Vou ficar de lembrança dessa turma!
Obs.: A criança 4M(J) não se pronunciou na roda de conversa
apresentando, no entanto, seu desenho.
173
RODA DE CONVERSA
TURMA: 5 anos
TURNO: MANHÃ
Nº DE CRIANÇAS: 8
DATA: 13/11/09
P. Vocês sabem o que vão fazer?
Profª.: Prestem atenção. Vocês vão desenhar o que assistirem. Façam direitinho (ela
fica tomando conta da criança autista)
P. Vocês me dão de presente esse desenho? (alguns respondem sim)
5M(D): Tia cadê a folha de Heitor?
P. Vou pegar. Vou sentar ao lado de cada um para conversar.
(autista: risca muito)
5M(C). Bob Esponja tem cabelo?
5M(D). Bob Esponja não tem cabelo.
5M(C). Escrevo só o 1º nome? Quero ser Bob Esponja!
P. Quem assiste sempre Bob Esponja?
5F(E): Bob Esponja na terra...
P. Gosta de Bob Esponja? (Maria Eduarda baixa a cabeça)
(converso com Pedro. Ele explica o desenho)
P. Que aconteceu com Bob Esponja?
5M(G): Rasgou as calças (vou para outra criança)
5M(D). Terminei!
P. Coloque seu nome.
5F(B). Não sei o que desenhar:
P. Que aconteceu no episódio?
5F(B). Vou fazer a Sandy e depois o Patrick.
P. Certo, legal. Dirigindo-se a Heitor: Você desenhou o que?
5M(C): O cachorrinho de Bob Esponja.
P. Legal: Ele desenhou o cachorrinho, o animal de estimação de Bob.
(Uma das gêmeas desenha e a irmã copia o que ela desenhou).
5F(A). Eu quero fazer o nome de Sandy. (Ela olha para quem está filmando)
Lucas Gabriel continua sem desenhar. A professora o incentiva, mas ele só olha fixo
para frente.
5F(E). Vou buscar meu estojo
P. Que foi que Bob Esponja fez pra seus amigos dele ficarem alegres de novo.
5F(B): Tocou flauta. Não, tocou guitarra.
174
5F(B). Eu posso beber água? Eu quero ver o DVD Bob Esponja. (Olha para capa e
tenta desenhar. Aqui, todos se interessam para ver).
As crianças trocam os desenhos conversando sobre eles
(5F(B) demora muito desenhando detalhes)
(5M(C): mostra o desenho para a filmadora e faz um V com os dedos)
(5M(D): explica o desenho. Três garotas pintam com esmero)
Desenham o bichinho de Bob Esponja
Gêmea explica o desenho: lua, estrelas (escreve tudo que me dizem)
Duas crianças ficaram pintando enquanto as outras saem. São cuidadosas e trocam
os lápis entre si.
5F(F) – Os amigos ... riu, riu e depois não riu.
Obs.: A criança 5M(H) não se pronunciou na roda de conversa
apresentando no entanto, seu desenho.
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RODA DE CONVERSA
TURMA: 3 anos
TURNO: TARDE
Nº DE CRIANÇAS: 9
DATA: 27/11/09
Vamos desenhar o episódio que vocês assistiram sobre Bob Esponja
3F(H). Eu sei dizer obrigado, por favor, com licença
P. Vou conversar com cada um de vocês enquanto vocês desenham. Podem
começar a desenhar nessa folhinha! (Continuam conversando sobre quem pede
desculpas, diz obrigado etc.)
3F(H): Tia Margarida, olha o meu!
P. (Pedro levanta. Não quer desenhar). Carol, você quer ser Bob Esponja?
3F(H): Não. Quero ser os amigos.
P. O que Bob Esponja fez para os amiguinhos ficaram alegres novamente (Ninguém
responde, falam outras coisas.
3M(J): Pode fazer uma casa (tasa)
P. Sim, pode. Então, o que Bob Esponja fez?
3M(J): Cantou para os amigos voltarem. Tia, fiz um passarinho e o sol.
P. Jéssica, o que foi que aconteceu no episódio?
3F(M): Ele rasgou a cueca. Os amigos não gostaram. Depois ele cantou a música.
P. Você quer ser Bob Esponja?
3F(M): Quero. Eu gosto dele.
3M(I): Olha o meu. Eu fiz o vestido de Bob Esponja.
P. Ta certo! Você quer ser Bob Esponja.
3M(I): (não responde)
3F(K): Os amiguinhos bateram as mãos (palmas) para Bob Esponja. Ele rasgou a
cueca e a calça também.
3M(L): Eu não quero ser Bob Esponja. Porque ele rasgou as calças.
3F(N): Eu quero ser Bob Esponja. Adoro ele
3M(O): Eu também quero.
P. Por que?
3M(O): Porque sim.
P. 3M(P) (irmão de Isabel) desenha círculos e levanta várias vezes. Não participa da
conversa. A professora pede para ele sentar. Ele senta e torna a levantar.
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RODA DE CONVERSA
TURMA: 4 anos A
TURNO: TARDE
Nº DE CRIANÇAS: 4
DATA: 20/11/09
P. Vamos desenhar o que Bob Esponja fez no episódio, como ele rasgou as calças...
4M(Q): Vem Tia sentar aqui. Eu não sei fazer.
P. Comece que eu vou já, já (sento junto de 2 crianças). A professora diz: Faz 4F(P)!
4F(5). Bob Esponja levantando peso.
P. Como foi a história de Bob Esponja,
4F(P): Eu vou pintar. (E pinta toda a folha de diversas cores)
(A profª. Ficou sugerindo: o mar, os amigos...)
(Levanto e vou para junto de outros 2 alunos)
(Fico observando 4F(P) e 4F(S) desenharem)
4M(Q) levanta e vai buscar o nome na ficha para copiar = 4M(Q)
P. Vocês me dão esse desenho de presente para mim?
4M(Q) – Eu dou.
Outros: Eu dou, eu dou!
4F(P) – Dou não. Eu não sei fazer.
P. Você diz que não sabe, mas você sabe!
4F(X): Eu tenho DVD de Bob Esponja
4M(Q) – eu não tenho
4F(S): Olha! (Aluna mostra que terminou o desenho. (Veio pra junto)
(A profª continua sugerindo o que desenhar, mas as crianças não seguem o que ela
diz).
Fico conversando sobre os desenhos das 2 meninas 4F(S) e 4F(R)
P. Você fez ótimo. Está ótimo seu Bob Esponja. Você assiste?
4F(S): Desenhei o mar colorido onde Bob Esponja morreu e sorvetes de morango e
chocolate. Eu quero ser Bob Esponja porque gosto dele.
4F(R): Assisto todo dia , todo dia. Gosto dele.
P. Beijão 4F(R) 4F(P) não queria dá o desenho, mas no final levanta-se e coloca o
seu desenho entre os outros desenhos. Não quis conversar e no seu desenho
aparece Bob Esponja por entre as cores que pintou. Eu aponto e ela diz os nomes:
Bob Esponja, Patrick...
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RODA DE CONVERSA
TURMA: 4 anos B
TURNO: TARDE
Nº DE CRIANÇAS: 10
DATA: 17/11/09
Sentam-se e escolhem os lápis. Inquietos perguntam o que vão fazer
P.: Eu explico. Vão desenhar o que vocês viram no vídeo. Vou sentar junto de vocês
depois para conversar.
P. O que foi que aconteceu no episódio?
4F(U). Bob Esponja rasgou a calça!
4F(T): Tia me dá a borracha. (Dirigindo-se a profª.) 4x
4M(V): Estou fazendo Bob Esponja. Ele cantou uma música e os amigos gostaram.
P. Muito bem. Eu não disse que você sabia!
(Turma inquieta. A professora não está. Está a substituta. Ela oferece outros lápis. A
menina da borracha ainda continua pedindo).
4F(W): Quero marrom, marrom.
4F(T): Cadê a borracha? Vou fazer a borboletinha! (vou junto)
P. O que Bob Esponja fez para os amiguinhos ficarem alegres?
4M(B1): Bob Esponja, levantando peso. Eu quero ser Bob Esponja – Ele é
engraçado.
Elisa: Bob Esponja morreu. Não quero ver ser ele.
4F(W): Me dá o laranja. Tia (profª) ela não quer me dá o laranja (e dirigindo-se a
mim). Bob Esponja rasgou as calças. Ele ficou triste, mas cantou uma música, ficou
alegre e foi tomar sorvete.
(Eles conversam sobre cores)
Garota cochicha com outra. A menina da borracha desenha pouco. Vou junto dela)
P.: Você me dá esse desenho de presente? Vocês me dão de presente? Vou junto
das que cochichavam.
4M(B1) continua pintando. Converso com ele. Todos agora querem falar se assistem
ou não Bob Esponja. Dois alunos dizem que querem ser Bob Esponja.
4F(T): Ele cantou uma música bonita.
4F(U): Bob Esponja é engraçado
(4M(A1) e 4M(C1) desenham vários Bob Esponja)
4M(A1): Os amigos de Bob Esponja não ficaram contentes
4F(Y) – Rasgou as calças. Depois fez um som e todos ficaram alegres.
4F(Z) – Ele rasgou as calças, dançou e os amigos ficaram alegres.
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RODA DE CONVERSA
TURMA: 5 anos
TURNO: TARDE
Nº DE CRIANÇAS: 9
DATA: 24/11/09
Todos se preparando para desenhar
P. Desenhem o que vocês assistiram no vídeo
Começam a falar a idade
Eu tenho 20 anos, tenho 10 anos, tenho 1000 anos
P. Quem já disse a idade, escreva o nome na folhinha. Vocês me dão de presente
esse desenho?
Todos: Sim, sim, sim!
5M(L): Vou pintar Bob Esponja descendo a onda
Profª.: João, senta!
5M(M). Olha o que fiz! Levanta e mostra
5M(N): Eu não queria ser Bob Esponja. Ele é uma esponja. Ele é quadrado.
P. O que foi que Bob Esponja fez para os amiguinhos
5M(N): Ele fez um show
Gêmeo vem entregar e pede para conversar ou explicar o desenho
7Todos se mostram interessados em desenhar
5M(O): Eu não quero ser Bob Esponja. Ele é amarelo e tem um monte de esponja
5M(M): Eu quero ser Bob Esponja porque ele é legal e bom demais, Ele foi cantar
com o violão
5F(I): Não quero ser Bob Esponja. Só se ele não excluir as pessoas é que eu queria
ser ele.
(Ela faz em forma de carta para me entregar)
P. Excluir?
5F(I): Sim, quando ele ficava rasgando a calça de propósito
P. Você quer dizer enganando as pessoas?
5F(I): Sim. Depois ele cantou para os amigos e eles ficaram contentes
5F(P): Não quero ser Bob Esponja porque ele é uma esponja
FM(R): Não quero ser Bob Esponja, gosto mais de Dragon Ball
5M(Q): Não, não quero ser Bob Esponja. Ele cantou para os amigos, mas eu não
quero.
Recolho o material e agradeço.
Obs.: A criança 5M(J) não se pronunciou na roda de conversa
apresentando, no entanto, seu desenho.
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Desenho animado e educação: calça quadrada, cabeça