Joana ou o solstício de Inverno
by Carlos Alberto Poiares
Tive várias dúvidas quanto a este livro...algo me dizia que não ia gostar mas com a opinião tão positiva de uma
amiga, resolvi ler " Joana ou o solstício de Inverno".
Com pena minha não consegui acabar este livro...bem tentei mas quando dei por mim já estava a ler um pouco na
diagonal...dou duas estrelas, pois apesar de não ter conseguido acabar, acho que o livro tem potencial, apenas
achei a escrita um pouco aborrecida, podia ter menos texto corrido e mais diálogo para ser mais dinâmica. A
personagem principal Joana, também não me convenceu, achei-a perturbada demais, fiquei mesmo nervosa com
as fortes emoções que esta personagem transmite ao leitor. E foi por aqui que dei terminada a leitura e acho que
fiz bem, pois por outra opinião: http://www.goodreads.com/review/show/... percebi que ia haver uma situação de
abuso sexual e não sei se iria aguentar ler até ao fim. É um livro que mexe com as emoções e como sentia-me
cada vez triste, cada vez que pegava no livro, cheguei a um ponto em que estava a ser quase uma tortura ler esta
obra.
Obrigada à Isabel pelo empréstimo|Carlos Alberto Poiares
review completa em http://oslivrosnossos.blogspot.pt/201...
Crítica/Opinião:
Por: Isabel Alexandra Almeida/Os Livros Nossos
A obra literária “Joana ou o Solstício de Inverno”, da autoria de Carlos Alberto Poiares, Licenciado em Direito e
Doutorado em Psicologia, com a Chancela da Fronteira do Caos Editores, consiste num romance que podemos
classificar como contemporâneo.
A personagem central – Joana – cujo percurso de vida acompanhamos desde jovem Licenciada em Direito, até à
A personagem central – Joana – cujo percurso de vida acompanhamos desde jovem Licenciada em Direito, até à
meia-idade, é rica e deveras complexa sob o ponto de vista psicológico e emocional. As restantes personagens
vão surgindo na narrativa, em função das interacções que vão estabelecendo com a personagem central.
Surge ao longo da obra uma vasta panóplia de personagens que podemos integrar em distintos espaços sociais, e
que transportam consigo os seus pequenos ou grandes dramas.
As sequências narrativas encontram-se intercaladas entre presente e passado, surgem analepses que nos
transportam a episódios do passado de Joana que melhor nos permitem avaliar ou entender as suas atitudes e
acões presentes, mas cabe referir que este encadeamento de presente e passado mostra-se realizado de forma
coerente e bem pensada, sem nunca deixar que o leitor perca o fio condutor da narrativa, antes pelo contrário,
ajuda o leitor a desvendar as tramas de se tecem as emoções de Joana. Proveniente de um meio rural, partiu aos
18 anos para Lisboa, para casa de uma tia mais velha – Gervásia – para estudar na capital (à semelhança de tantos
outros jovens), sendo tendencialmente alvo da superprotecção da tia e, quando decide viver sozinha na grande
cidade, a mãe – D. Laurinda, faz questão de com ela passar um tempo prolongado, controlando a sua existência a
pretexto de a cuidar.
Joana atravessa a efervescência estudantil do pré 25 de Abril, convivendo de perto com os sectores estudantis
que, em plena Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, dão a cara pela luta contra o regime Salazarista (e
neste ponto, o autor dá a conhecer um aspecto da história do país, se calhar nem sempre conhecido das gerações
mais recentes).
Acaba por arranjar trabalho como consultora jurídica num banco, muito por influência de uma “cunha” de seu pai,
amigo próximo de um membro do Conselho de Administração de um Banco – O Dr. Gilberto. Aí, vai
desenvolvendo as suas competências profissionais, mas não se revela uma apaixonada pelo Direito, apenas
usufrui da posição confortável de uma estabilidade profissional que assim alcança. No banco trava conhecimento
com Gustavo Lencastre, o seu mentor e mais tarde amigo mais presente.
Vinda de uma família disfuncional, onde o pai nem sempre se mostrou presente, Joana demonstra sérias
dificuldades em assumir compromissos afectivos, e vai somando relações uma atrás das outras, sem conseguir
sequer encontrar-se a si mesma, sendo aliás cliente habitual de consultórios de “psis” expressão usada pela
personagem, desde tenra idade, sendo também depressiva, histriónica e vivenciando de forma negativa épocas
festivas associadas à vivência familiar, com especial evidência para o Natal.
O pai de Joana – Jerónimo - ao ver a filha encaminhada e bem na vida (como é apanágio da mentalidade
Portuguesa mais retrógrada), acaba por assumir um novo rumo de vida, fora do seio familiar, bastante inusitado e
que vai surpreender os leitores e marcar indelevelmente a vida futura de Joana.
Por sua vez, Gustavo Lencastre acaba por assumir no romance a qualidade de personagem quase central, e
embora não lhe seja dado tanto destaque como o merecido por Joana, surge aos olhos do leitor com uma
caracterização directa e indirecta também bastante complexa, juntamente com o pai, assimiu-se, desde sempre
como um firme defensor dos ideais democráticos, tendo tido participação activa na luta contra o regime do
Estado Novo. Acaba por se tornar num dos melhores amigos de Joana, por quem nutre um especial carinho e um
sentimento que acaba por se revelar algo ambíguo e que traz ao leitor a oportunidade para reflectir sobre como o
categorizar, atenta a sequência da narrativa até final. Vem de um casamento desfeito, mas trata-se de um homem
íntegro, afável, bastante sociável e sempre rodeado de amigos, aos quais presta apoio perante as crises. Vive
focado no trabalho, talvez possamos reconhecer-lhe uma certa faceta de workaholic, mas tempera-a com
momentos de puro prazer gastronómico que vivencia aquando das suas deslocações aquele que é o seu pequeno
pedaço de paraíso – a residência de férias na Foz do Arelho.
Joana acaba por manifestar os seus desequilíbrios ao nível dos afectos, ao longo de toda a acção, muito por
retorno da disfuncionalidade e instabilidade familiar que lhe coube experienciar, todavia, ao nível das amizades, é
uma amiga presente, e que dá provas de lograr identificar-se com o sofrimento do próximo, empatizando, por
exemplo, com Paula, uma das melhores amigas, que atravessa um momento deveras complicado ao nível familiar
e busca apoio junto de Joana, encontrando essa ajuda no exacto momento em que dela necessita. A verdade é
uma amiga presente, e que dá provas de lograr identificar-se com o sofrimento do próximo, empatizando, por
exemplo, com Paula, uma das melhores amigas, que atravessa um momento deveras complicado ao nível familiar
e busca apoio junto de Joana, encontrando essa ajuda no exacto momento em que dela necessita. A verdade é
que, embora leve uma existência sofrida, e se bem que nem sempre escolha os caminhos mais correctos na sua
vida, o leitor não conseguirá detestar Joana, acabando por criar empatia com a mesma e quase desejando poder
fazer algo que a ajude, tal é o nível de envolvência que o autor conseguiu criar nas páginas do seu romance, e a
que cremos, não será alheia (ainda que admitamos possa não ter surgido de forma consciente) a sua formação em
Psicologia (aliada à formação em Direito que permite caracterizar com realismo tanto a vivência universitária na
Faculdade de Direito de Lisboa, como na prática profissional da advocacia de há umas décadas a esta parte quando “não ocorrera a proliferação de juristas a que se assistiu nas décadas seguintes” p.p.25).
A par da forte densidade psicológica das personagens, foi curioso ir fazendo um percurso por vários espaços
sociais que acabam por se cruzar, desde a vida desafogada que, há cerca de três décadas, era permitida a quem
cursava Direito, do prestigio social associado, mais noutras épocas do que na actualidade, a quem exercia Direito
ou Medicina. Uma viagem ao mundo dos sem-abrigo que povoam as noites e dias desamparados no coração da
Cidade de Lisboa, sem deixar de se considerar fenómenos sociais relacionados com o contexto histórico – o
trauma de Guerra decorrente da participação no conflito colonial Português.
Uma palavra de apreço também pela reflexão suscitada, já no último terço da narrativa, à questão do abuso sexual
de menores, e às consequências que tal facto virá a ter na vida da própria criança abusada e no quotidiano da
mesma e do progenitor inocente. Uma descrição dura, violenta mas necessária pela capacidade de alertar
consciências, e uma verdadeira missão social a ser cumprida pela literatura – “Deve ser bastante violento para uma
mãe saber um filho abusado…pelo pai! (…) a família pode ser o pior lugar do mundo” p.p. 117.
O final do livro é bastante original e surpreendente, mas o que sobre o mesmo pudéssemos aqui mais
acrescentar, corria o risco de se tornar num spoiler que, de todo, não pretendemos fazer.
Quanto à linguagem, a mesma é bastante cuidada e elaborada, sem que, todavia, não se deixem de ter em conta
os registos correntes de linguagem, consoante a classe social dos personagens, porém, parece-nos que, talvez
possa parecer um pouco formalista algumas partes do discurso dos dois personagens juristas da narrativa – Joana
e Gustavo.
Em suma, um livro que, em apenas 126 páginas, de forma dinâmica (mas sem ser apressada), aborda temas como:
as famílias disfuncionais, os dramas psicológicos que podem afectar os seres humanos muito por influência do
que lhes coube viver na infância e adolescência, inclusive com reflexos na forma como vivenciam os afectos e a
sexualidade (andará por aqui pelas entrelinhas uma certa visão Freudiana da formação da personalidade?)- a
história contemporânea do nosso país, nos seus aspectos menos positivos e mais traumáticos.
É uma obra realista, embora ficcional, a escrita é clara, envolvente e oscila entre os momentos de pura ternura,
passando para a livre experiencia dos instintos mais básicos do ser humano e para uma crueza de, por vezes, a
vida acaba por se ver inadvertidamente pautada. Trata-se de um romance que pode ser lido por ambos os sexos,
mas que não podia estar mais longe da qualificação de light, e torna-se bastante original e fácil de ler, mas deixanos a pensar ainda algum tempo depois de finda a sua leitura.
Uma obra madura, para ser lida também com maturidade e não por leitores que sejam mais susceptíveis.
Recomendamos, apenas com a reserva do público alvo!
Blogue Os Livros Nossos - um convite à leitura!
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Joana ou o solstício de Inverno by Carlos