Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 1 ARMINDO GUARANÁ E SUA PRODUÇÃO NA CASA DE SERGIPE Anthony Fábio Torres Santana (UNIT) Aldenise Cordeiro Santos (UNIT) INTRODUÇÃO Da São Cristovão ainda capital de Sergipe, emerge a figura de Manoel Armindo Cordeiro Guaraná incentivador da produção intelectual no estado. Autor do Dicionário Biobibliográfico Sergipano1 que reúne 647 verbetes de cunho biográfico reconstitui histórias da sociedade local entre o final do século XIX e início do XX, obra que o qualifica como biógrafo dentro do contexto historiográfico regional. Guaraná teve sua vida permeada pelo trabalho na magistratura, função que desenvolveu em vários estados do Brasil, a exemplo do Ceará e Piauí. Bem como, a sua paixão pelas produções históricas, estas fundamentadas na composição de um vasto acervo de verbetes, e artigos biográficos sempre referentes aos sergipanos contemporâneos a ele. Parte das suas publicações foi destinada a periódicos e informativos em geral. Outrossim, segundo o historiador Itamar Freitas, Armindo atuou no começo da revista do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe – IHGS, sendo redator da referida publicação nos números 2, 3, 4 e 5. Como autor publicou cinco trabalhos, entre eles três biografias, que foi um dos temas mais recorrentes de seus escritos. Dentre as histórias de vida narradas destaca-se a do Monsenhor Antônio Fernandes da Silveira. Este que foi o fundador do primeiro jornal de Sergipe, o Recopilador Sergipano, em setembro de 1832, na cidade de Estância. Acerca da produção enquanto biógrafo, Maurício dos Reis Santos aponta que “a forma de escrita de Armindo Guaraná nos jornais pode explicar sobre a sua formação no 1 GUARANÁ, Armindo. Dicionário Bio-bibliographico Sergipano. Rio de Janeiro, 1925, Ed. Pongetti & C. 1925. Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 2 tempo em que passou em Pernambuco. A linguagem política, literária, agressiva, direta ou insinuosa, deve ser herança da sua experiência acadêmica naquela província” (SANTOS, 2005, p.20). Os artigos publicados por Armindo Guaraná, entre 1913 a 1920, na revista do IHGS, estão intitulados: O 1º Jornal de Sergipe, setembro de 1832: Antônio Fernandes Silveira (1913), que trata da contribuição deste ao contexto sócio-político sergipano; Brigadeiro Manuel Fernandes da Silveira (1913), o texto apresenta um relato biográfico do primeiro governador de Sergipe; Glossário etimológico dos nomes da língua Tupi na geografia do Estado de Sergipe (1916), saindo do universo biográfico, Armindo faz um levantamento dos termos tupi presentes no vocabulário sergipano; Antônio Muniz de Souza (1916), regressando ao fazer biográfico, Guaraná constrói passagens da vida, desse que foi um pesquisador sergipano da época; e Brigadeiro José Pereira Filgueiras (1920), neste o biógrafo contextualiza o leitor em fatos relevantes do período citado, onde mostra como o seu personagem militou na Confederação do Equador. A escolha desse tema foi pautada na viabilidade de disseminar as produções de Guaraná. Faz-se necessário ressaltar que Armindo se dedicou a apresentar registros biográficos de sergipanos, e incentivou a contínua produção na “Casa de Sergipe”. Vale ressaltar, que dos autores que tratam sobre Armindo, destacam-se, o historiador Itamar Freitas que em seu livro A Escrita da História na “Casa de Sergipe” – 1913/1999 aborda as produções de Guaraná na revista do IHGS, apresentando elementos que compunham o teor biográfico dos seus escritos. Sob orientação de Freitas, o historiador Maurício dos Reis Santos em seu trabalho de conclusão de curso, intitulado Restos imortais: uma leitura do arquivo de Manoel Armindo Cordeiro Guaraná (1848/1924) percorre, e organiza o FAG, Fundo Armindo Guaraná, localizado no IHGS. O autor tece ponderações com relação ao teor da escrita, e mesmo sobre a vida do biógrafo. Apesar desses registros acerca de Armindo Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 3 Guaraná, sentimos que sua participação nas ações primeiras do IGHS, ainda não foram aprofundadas e desveladas. Segundo Itamar Freitas (2002), o Dicionário Biobibliográfico Sergipano de Guaraná criou um banco de informações relevantes a respeito da história de Sergipe. Sendo este é constituído por informações referentes aos sergipanos que faziam parte da elite da época. O período natalício de cada biografado perdura entre 1840 e 1900, sendo que dos que constam no livro, em sua notável maioria eram atuantes na política e na literatura, até o final de 1920. O conceito de biografia neste trabalho perpassa o fato de fazer o relato de momentos da vida de um determinado indivíduo. Ao biógrafo cabe entre outros papéis, o de dar espaço para que o seu biografado possa se revelar por si mesmo. No momento que se faz o estudo particular da vida de um indivíduo, e tenta através desse remontar a estrutura social vivida na sua época, o pesquisador tem que se manter neutro, pois ele vai “interrogar uma época através das reações desse indivíduo”, ou seja, ele vai questionar o passado de uma sociedade, através das ações do seu objeto de pesquisa. Na sucessão dos fatos e episódios que constituem uma biografia, só há um personagem em primeiro plano: o biografado. O autor não deve intervir na sua ação, nem no seu destino; mas deixar que ele viva naturalmente a sua vida. Nem há numa biografia oportunidade para considerações críticas, ou julgamentos de valor. Por mais contraditória ou por mais negativa que possa parecer à vida de um homem, há sempre uma lógica no seu desenvolvimento – motivos profundos que a justifiquem e a tornam respeitável. (RABELLO, s/d, p.1) A “biografia histórica, não tem por vocação esgotar o absoluto do ‘eu’ de um personagem, como já se quis e ainda se quer. Ela é o melhor meio de mostrar os laços entre o passado e o presente” (BORGES, 2005, p. 215). Sendo assim, propõem-se aqui uma análise do conteúdo histórico-social, contido nestes artigos, que desvelam discursos dentro das perspectivas de formação e entendimento de quem os escreveu. Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 4 Para atender as expectativas iniciais, no primeiro momento construímos uma representação biográfica de Armindo Guaraná, focando suas contribuições para o IHGS. Posteriormente, procedemos com uma análise voltada às produções desse autor para a revista da referida instituição. 1 - UM HOMEM NAS PRATELEIRAS EMPOEIRADAS DA HISTÓRIA Em meados do século XIX, em 4 de agosto de 1848, nasce na cidade de São Cristóvão, ainda capital da Província de Sergipe Del Rei, um dos personagens da história sergipana, Manuel Armindo Cordeiro Guaraná filho de Teodoro Cordeiro Guaraná e Andrelina Muniz de Menezes. Cursou as primeiras letras em sua cidade natal, migrando mais tarde para outros redutos do conhecimento cientifico como o Atheneu Baiano e o Curso de Humanidades do Colégio das Artes (1865) em Pernambuco. Posteriormente, ingressou na Faculdade de Direito do Recife, importante instituição do período, consagrada por formar uma elite de intelectuais liderados por Tobias Barreto. Graduou-se em direito no ano de 1871. Dedicou-se ao jornalismo e a elaboração de diversos trabalhos que compunham jornais, revistas e outras publicações periódicas entre os anos de 1832 a 1908. Registrando assim, o primeiro dos jornais, o Recopilador Sergipano, editado em Estância, na Tipografia Silveira & Cia, de propriedade do monsenhor Antonio Fernandes da Silveira, enumerando publicações jornalísticas e literárias, até 1908, ano do centenário do aparecimento do primeiro dos jornais brasileiros, o Correio Brasiliense, editado em Londres, em 1808, por Hipólito da Costa. Em 25 de outubro de 18722, iniciou seus trabalhos como Promotor Geral da Comarca de São Cristóvão, em Sergipe, por intermédio do Juiz de Direito da referida 2 Cf. GUARANÁ, 1872. ARQ. IHGS. FAG, S1, Cx208. Doc 15. Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 5 comarca, Alexandre Pinto Lobão. Um ano depois3, foi nomeado Promotor Público da capital. Em 16 de março de 18784, Armindo Guaraná foi nomeado secretário da Província do Piauí, por Carta Imperial. No mesmo ano foi habilitado ao cargo de Juiz de Direito, por ter exercido por mais de 4 anos o lugar do Promotor Público. Em 1879, foi nomeado Procurador Fiscal da Tesouraria Provincial de Sergipe, pelo presidente da Província local, Fernandes Santos, tornando-se em 1881 Promotor Público da Comarca de Estância, por intermédio do Presidente da Província, Herculano Marcos Inglez de Souza5. No dia 13 de maio de 1882, Armindo Guaraná foi nomeado para secretário da Província do Ceará, por Carta Imperial, e em setembro deste mesmo ano, foi nomeado Juiz de Direito da Comarca de Oeiras, Província do Piauí, por decreto. Em 1º de dezembro de 1884, foi transferido para Itabaiana, para exercer a magistratura. Dentre os cargos exercidos por Armindo Guaraná, vale destacar o de Chefe de Polícia Interino6 da Província de Sergipe, designado por Jerônimo Sandro Pereira, em 1889. No ano de 1890, Armindo Guaraná é nomeado Juiz de Casamentos, em Aracaju, pelo presidente do Brasil, o Marechal Deodoro da Fonseca. Após doze dias, o Barão de Sobral lhe comunica essa nomeação, dando-lhe um prazo de três meses para exercer suas funções. A trajetória jurídica de Armindo Guaraná termina no dia 09 de março de 1906, quando Leopoldo de Bulhões lhe concede a aposentadoria, como Juiz Federal pela Secção do Ceará, função que exercia por mais de 20 anos. Após aposentar-se, Armindo Guaraná vai para o Rio de Janeiro. Na capital federal começa a juntar os 3 Cf. GUARANÁ, 1873. ARQ. IHGS. FAG, S1, Cx208. Doc 31. Cf. GUARANÁ. 1878. ARQ. IHGS. FAG. S1. Cx.208. Doc. 28. 5 Cf. GUARANÁ. 1879 e 1881. FAG. S1. Cx.208. Doc. 19 e 32. 6 Cf. GUARANÁ. 1889. ARQ. IHGS. FAG. S1. Cx.208. Doc. 40 e 46. 4 Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 6 subsídios necessários para confecção de sua maior obra, o Dicionário Biobibliográfico Sergipano. Em 1911,7 retorna a Sergipe fixando-se na cidade de Aracaju. Mais tarde tornou-se sócio-fundador do IHGS, e idealizador do Dicionário Biobibliográfico Sergipano, sua principal obra, que contitui-se por ser um documento que possibilita aos leitores e pesquisadores, subsídios para o desenvolvimento de seus trabalhos acerca da história de vida de sergipanos que viveram entre a segunda metade do século XIX, e a primeira metade do século XX. Em 1912, associou-se ao IHGS - instituição que auxilia a várias décadas, o desenvolvimento de produções literárias e históricas, através do seu acervo bibliográfico, documental e iconográfico – tendo participado de sua fundação. Neste instituto, Armindo elaborava diversos artigos, sobre os mais variados aspectos. Atuou como redator, entre os anos de 1912 a 1916, produzindo textos para complementar a sua revista trimensal, participou da diretoria do mesmo órgão como membro da Comissão de História e Arqueologia, sendo o vice-presidente da instituição, no período de 1912 a 1913. Consta no cadastro social do Instituto, como Sócio Fundador, tornando-se sócio honorário, em 14 de julho de 19158. Tendo em vista sua atuação e produção no IHGS, foi possível analisar os artigos, com os quais tratamos neste trabalho. 2 – A PRODUÇÃO DE ARMINDO GUARANÁ NA “CASA DE SERGIPE” Os levantamentos das produções de Guaraná junto à revista do IHGS apontam um total de cinco publicações, sendo destas três de cunho inteiramente biográfico, característica marcante das suas produções. Além dos artigos citados anteriormente, podemos encontrar um referente à fundação do primeiro jornal de Sergipe – o Recopilador Sergipano da cidade de Estância – onde trabalhou nesse 7 Cf. GUARANÁ, 1911. ARQ. IHGS. FAG. S1. Cx 208. Env. 12. Doc. 12 - Correspondência de Armindo Guaraná para Epiphanio Doria. Rio de Janeiro, 23 de abril de 1911. 8 INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SERGIPE. "Sócios do Instituto Histórico e Geographico de Sergipe". IN: Revista do IHGS. AnoI, Aracaju, 1912-1913. p. 51 Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 7 contexto com a imagem do seu fundador, e por último o Glossário etimológico dos nomes da língua Tupi na geografia do Estado de Sergipe. O artigo escrito por Armindo em referência a fundação do primeiro jornal sergipano, foi publicado no primeiro número da revista do IHGS, o texto intitulado o 1º Jornal de Sergipe, setembro de 1832: Antônio Fernandes Silveira9 aborda elementos da fundação do jornal e do seu fundador. O texto “trata da contribuição de Antônio Fernandes Silveira à formação política e social de Sergipe, através da fundação da imprensa no Estado (Estância) em 1832 – O Recopilador Sergipano” (FREITAS, 2002, p.66). Neste artigo desenvolve suas argumentações partindo de um contexto amplo até chegar ao ponto principal referente às ações do Monsenhor Antônio Fernandes da Silveira iniciador da imprensa escrita sergipana. Situando o leitor sobre o impacto da realização dessa empreitada para o contexto sergipano da época. As produções biográficas propriamente ditas aparecem ainda no primeiro volume da revista, só que no seu segundo número, com a presença do verbete Brigadeiro Manuel Fernandes da Silveira10. O primeiro texto de perfil estritamente biográfico trata da trajetória do primeiro governador de Sergipe. O autor propõe uma análise do indivíduo, partindo para contextos maiores, com o intuito de situá-lo em meio às transformações políticas do período. O artigo aponta ainda “traços biográficos do estanciano Manuel Fernandes da Silveira e comentários sobre a sua atuação como presidente de Sergipe (1824/1825)” (FREITAS, 2002, p.67). No decorrer da nossa análise nos deparamos com a pesquisa desenvolvida por Armindo Guaraná em parceria com o baiano Teodoro Sampaio 11, que mostrou 9 GUARANÁ, A. O 1º Jornal de Sergipe, setembro de 1832: Antônio Fernandes Silveira. Revista do IHGS, Aracaju, v.1, n.1, 1913. p. 43-45 10 GUARANÁ, A. Brigadeiro Manuel Fernandes da Silveira. Revista do IHGS, Aracaju, v.1, n.2, 1913. p. 37 – 41 11 Engenheiro, geógrafo, escritor e historiador baiano. Foi um dos fundadores do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, membro do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (1898) e sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1902). Publicou obras como: O rio São Francisco e a chapada Diamantina (1906), O tupi na geografia nacional (1901), Atlas dos Estados Unidos do Brasil (1908), Dicionário histórico, geográfico e etnográfico do Brasil (1922) e História da Fundação da Cidade do Salvador (póstumo). Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 8 outra face dos seus estudos e produções, o Glossário etimológico dos nomes da língua Tupi na geografia do Estado de Sergipe12. Nesse glossário encontramos a definição de várias palavras presentes na oralidade dos sergipanos, estes remetidos ao nosso contexto linguístico, muitas vezes passam despercebidos, como os nomes de nossos rios, cidades, ou o próprio significado da palavra “Sergipe”, que segundo os autores seria “Rio dos Siris, que dá nome ao território entre os rios Real, ao sul, e São Francisco, ao norte” (GUARANÁ, SAMPAIO, 1916, p. 321). O quarto texto13 escrito para a revista concerne a uma conferência proferida pelo mesmo, na instituição em 21 de março de 1915. O escrito trata de Antonio Muniz de Souza (1782/1857), que o autor Itamar Freitas cita como sendo um “pesquisador sergipano, autodidata, que se destacou na exploração de minerais e plantas nacionais, como abolicionista e catequista de índios” (FREITAS, 2002, p.77). Armindo desvela algumas linhas do perfil biográfico de Muniz de Souza, salientando como certas personalidades padecem nas prateleiras empoeiradas da história. Assim como outros tantos nomes, assuntos e temas sergipanos que nunca foram contemplados. Em seu discurso emprega um tom de criticidade quando percorre os caminhos da formação intelectual de Muniz de Souza, desde o aprendizado da língua vernácula a sua experiência profissional. Para introduzir o conteúdo propriamente biográfico, remete à figura de Tobias Barreto como um dos filhos ilustres da povoação de Campos do Rio Real, onde nasceu Antônio Muniz na segunda metade do século XVIII. Guaraná versa sobre experiências além terras sergipanas, destacando os contextos das cidades em que o seu personagem passou, como Lisboa e a invasão de Napoleão Bonaparte em 1807. Portanto, o autor não se detém apenas a 12 ______. Glossário etimológico dos nomes da língua Tupi na geografia do Estado de Sergipe. Revista do IHGS, Aracaju, v.2, n.5, 1916. p. 297-326 13 ______. Brigadeiro José Pereira Filgueiras. Revista do IHGS, Aracaju, v. 5, n. 9, 1920. p. 59-64 Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 9 particularidade do seu protagonista observa o seu objeto não do alto de uma torre, mas perpassa-o e analisa o seu entorno. Dialoga até com jornais do Rio de Janeiro como o Aurora Fluminense, que cita as contribuições das viagens de Muniz de Souza para a sociedade de medicina. Detém-se analisar discursos do seu biografado buscando nas entrelinhas características formadoras de sua intelectualidade. É relevante ressaltar que seu texto não segue a métrica vigente nas biografias. Usualmente, os textos biografados salientam um caráter modal com início, meio e fim, perpassando cronologicamente pelos acontecimentos da vida do biografado. Neste ponto Itamar Freitas indica que: O ‘fazer’ biográfico raramente foi contrariado em seu modelo. Guaraná, porém, destacou-se nesse particular quando se distanciou de um dos (modernamente considerados) maiores vícios da biografia: substituir a história política do Estado pelo estudo exclusivo do individual. Em um dos seus trabalhos, o biografado quase serve de pretexto para denunciar o vigor de tendências aristocráticas e militaristas em meados da década de 1820. (FREITAS, 2002, p.43-44) Guaraná argumenta sobre a falta de trabalhos que versam sobre Muniz de Sousa e transita pelas obras publicadas pelo personagem, referenciando até a localização dos seus escritos no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. No quinto texto, uma terceira biografia, o autor recompõe a história do Brigadeiro José Filgueiras, “sergipano de Santo Amaro das Brotas, ex-presidente da junta governativa do Ceará e militante do movimento Confederação do Equador 1824” (FREITAS, 2002, p. 90). A biografia discorre acerca dos elementos constitutivos da trajetória do personagem, não pontuando datas, mas reconstituindo contextos. No trecho em que trata do local de nascimento de Filgueiras, o autor pondera sobre as características da antiga vila de Santo Amaro das Brotas. Com pensamento notadamente crítico, Guaraná expôs configurações políticas que levaram Filgueiras a se tornar militante da Confederação do Equador. Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 10 Por fim, com uma perspectiva influenciada pelo cientificismo pulsante da época, Armindo finaliza seu texto com o seguinte pensamento: Entre as excelsas qualidades que muito recomendam o historiador no conceito público, nenhuma o elevam mais do que o respeito a verdade na apreciação dos fatos a transmitir a posteridade. Este é o lema de que jamais se deve afastar uma linha, para não deturpar a grandeza de sua nobre missão e, quando termina ela, ufanar-se de dizer que encontrou em Juvenal a norma invariável dos seus atos no pensamento: “vitam impendere vero” 14 (GUARANÁ, 1920, P 64). CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisarmos os números descritos da revista do IHGS, podemos visualizar através das produções de Armindo Guaraná, que o mesmo tinha uma afinidade com a produção biográfica. Outro fator relevante nessa análise é que, Armindo se detinha a biografar as pessoas atuantes no contexto sócio-político e cultural da sua época, pessoas estas, ligadas a elite sergipana contemporânea ao seu tempo. É perceptível também a presença de um significativo número de militares dentre os biografados, esse aspecto se revela em duas publicações biográficas da revista dedicada à figura de dois oficiais. As suas produções relevam por si só, a preocupação que o mesmo tinha de retratar os acontecimentos importantes da sua terra, como na produção referente ao jornal o Recopilador Sergipano, e mostra a história de vida das pessoas que praticavam estas ações no Sergipe de parte dos séculos XIX e XX. As escritas nessas obras se apresentam bem elaboradas, mostrando que o autor tinha domínio da escrita, no seu segmento culto, formal, sempre bem articulado, criando assim conexões interessantes para o desenvolvimento dos seus enredos, que englobavam a vida dos seus biografados, com o contexto social que o circundava. 14 Guaraná cita o poeta Romano Juvenal (I d.C.), o texto significa “Consagrar a vida à verdade”. Anais Eletrônicos do IV Seminário Nacional Literatura e Cultura São Cristóvão/SE: GELIC/UFS, 03 e 04 de maio de 2012. ISSN: 2175-4128 11 FONTE FAG – FUNDO ARMÍNDO GUARANÁ (IHGS). GUARANÁ, Armindo. “Antônio Muniz de Souza”. IN: Revista do IHGS, Aracaju, v. 3, n. 6, p. 167 – 181 1916. ______. “Brigadeiro José Pereira Filgueiras”. IN: Revista do IHGS, Aracaju, v. 5, n. 9, p. 59-64, 1920. ______. “Brigadeiro Manuel Fernandes da Silveira”. IN: Revista do IHGS, Aracaju, v.1, n.2, p. 37 – 41 1913. ______. Dicionário Bio-bibliographico Sergipano. Rio de Janeiro, Ed. Pongetti & C. 1925. ______. “O 1º Jornal de Sergipe, setembro de 1832: Antônio Fernandes Silveira”. IN: Revista do IHGS, Aracaju, v.1, n.1, p. 43-45, 1913. GUARANÁ, Armindo; SAMPAIO, Teodoro. “Glossário etimológico dos nomes da língua Tupi na geografia do Estado de Sergipe”. Revista do IHGS, Aracaju, v.2, n.5, p. 297-326, 1916. REFERÊNCIAS AHMAD, Aijaz. “Cultura, nacionalismo e o papel dos intelectuais: uma entrevista”. IN: Maria Elisa Cevasco (org.). Linhagens do Presente. Sandra Guardini T. Vasconcelos (trad.). 1ª Ed. São Paulo: Boitempo Editorial. p. 219-247. BARRETO, Luiz Antonio. Dicionário Bio-Bibliográfico Sergipano de Armindo Guaraná. Disponível em: <http://iaracaju.infonet.com.br/serigysite/includes/serigysite/242/Dicionario_Ar mindo_Guarana_set2007.pdf>. Acesso em: 20.08.2009. BORGES, Vavy Pacheco. “Grandezas e misérias da biografia”. IN: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes Históricas.– São Paula: Contexto, 2005. p. 203-233. BOURDIEU, P. A ilusão biográfica. Paris: 1986. 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