A N O V I
J O R N A L
C O N T R A
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M E S M I C E
CARA A CARA
O VE R DADE I RO
O U T U B R O 2 0 0 2
U M
COM AS DROGAS
BIG BROTHER
SAN QUADRA 01, BLOCO “E”
70040-200 BRASÍLIA/DF
http://www.fundathos.org.br
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PRESIDENTE
Ari Cunha
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SECRETÁRIO-EXECUTIVO
Indalécio Martins Dal Secchi
COORDENAÇÃO EDUCACIONAL
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editorial
SEVERINO FRANCISCO • EDITOR DO RADCAL
CONSELHO CURADOR
Brasil Helou, Christina Jucá, Cláudia Pereira, Douglas
Marques de Sá, João Filgueiras Lima, Evandro Vilela,
Teixeira Salles, Grace Maria Machado de Freitas, Jorge
Jardim, Karla Osório, Silvio Zamboni, Sueli Belato,
Vanderlei dos Santos, TT Catalão
CONSELHO FISCAL
Ana Przytyk, Frederico Viegas, José Roberto Furquim,
Maria Luiza Brum, Murilo Alves Nunes
de athos bulcão
RADCAL
Em recente entrevista concedida ao jornal Folha de S. Paulo, uma das musas das telenovelas
declarou que não assiste e nem deixa o filho assistir televisão, pois o nível é muito baixo.
Ela prefere fazer coisas mais interessantes: ouvir música, ler, conversar. A declaração da
atriz suscita uma série de questões para o debate. Um pouco antes, Xuxa havia informado
que disco seu não entra em casa, porque sua voz é horrível. Que país estamos formando
quando bombardeamos as cabeças de milhares de crianças e adolescentes com um lixo que
temos vergonha de apresentar aos nossos filhos?
Indalécio Martins Dal Secchi
EDITOR
Severino Francisco
EDITORES ASSISTENTES
Gabriel Coaracy e Gabriela Goulart
PRODUÇÃO EDITORIAL
Gabriel Coaracy
PROJETO GRÁFICO E EDIÇÃO DE ARTE
Marcelo Terraza <Artwork Design Gráfico>
CONSELHO EDITORIAL
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Santiago (DEMTEC) • Geraldinho Vieira (ANDI/AVINA)
• José Eurico de Andrade (SEDUC) • Manoel Serrão
(FNMA) • Manoel Manrique (UNICEF) • Pamela Nunes
(Fundação Athos Bulcão)
CONSELHO EDITORIAL JOVEM
O Radcal veio para oferecer aos adolescentes uma alternativa de comunicação inteligente
má s c a r a
COORDENADOR
contra a mesmice. Ele sempre traz outras imagens, outras palavras, uma outra maneira
de olhar. O Radcal é um jornal interativo. Você também pode escrever. Mande seu artigo,
poema, rap, bronca. Chega mais! O Radcal é um jornal que a gente mostra, sem nenhuma
vergonha, com muito orgulho, para nossos amigos ou para os nossos filhos.
Adriano Duarte • Alaíse Beserra • Allen Guimarães •
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VOLUNTÁRIOS
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COLABORADORES
Anita Campos, Carolina Mendes, Daniel Simião, Patrícia
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FOTOGRAFIA
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FOTOLITOS E IMPRESSÃO
WEB Editora, DF
AT E N Ç Ã O , AT E N Ç Ã O ! A Q U I VA I A D I C A
PA R A Q U E M S E I N T E R E S S A O U T R A B A L H A C O M E D U C A Ç Ã O E T E C N O L O G I A , S E R Á R E A L I Z A D O E M B R A S Í L I A
( C A RT O N H O T E L ) , N O S D I A S 7, 8 E 9 D E N O V E M B R O , O “ I I F Ó R U M S UA E S C O L A A 2 0 0 0 P O R H O R A - A E S C O L A Q U E
Q U E R E M O S : O PA P E L D A T E C N O L O G I A .” O F Ó R U M T E R Á PA L E ST R A S , M E S A S - R E D O N D A S , O F I C I N A S E C O M U N I C A Ç Õ E S O R A I S S O B A R E S P O N S A B I L I D A D E D A S P E S S O A S E N V O LV I D A S N O P R O G R A M A “ S UA E S C O L A A 2 0 0 0 P O R
H O R A”. PA RT I C I PA R Ã O D O E V E N T O E D U C A D O R E S , A LU N O S E E S P E C I A L I STA S N A Á R E A D E E D U C A Ç Ã O E T E C N O L O G I A. TO D O S E STÃO C O N V I DA D O S E A I N S C R IÇÃO É G R AT U I TA! B ASTA E N V I A R U M E-M A I L C O M A N T E C E DÊN C I A PA R A
[email protected] R
CAPA • Marcelo Yuka, Grupo Rappa
O Jornal Radcal é uma realização da
Fundação Athos Bulcão em parceria
com o GDF, pelo convênio nº 63/95,
com a Fundação Educacional do
Distrito Federal, para distribuição
gratuita em sala de aula aos 100 mil
alunos das escolas de segundo grau.
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A P O I O
COMISSÃO DOS DIREITOS HUMANOS DA CÂMARA DOS DEPUTADOS • SECRETARIA DE EDUCAÇÃO/FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DO DF • SECRETARIA DE CULTURA DO DF
Para a psicóloga Ione Menezes, nada
é mais importante do que escolher
um trabalho que você faça com amor
ESCOLHA SUA PROFISSÃO
PAT R Í C I A
O S A N D Ó N ,
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A N O S
O que você vai ser quando crescer? Como se já não bastasse estar passando por
uma fase difícil, é preciso decidir qual profissão é ideal para seu projeto de vida.
A dúvida muitas vezes persiste, além do drama de conseguir passar num vestibular. Para a psicóloga de orientação para o trabalho, do Laboratório de Psicologia
da Universidade de Brasília (UnB), Ione Menezes, nada é mais importante do que
escolher a profissão que se ama. “Não é necessário abandonar os seus sonhos,
só é preciso criar formas de construí-los. A melhor forma de escolher uma profissão é por amor. Se você gosta do que faz, terá muito mais chances de conseguir satisfação e realização”, afirma. Ela explica que é preciso fazer uma análise
minuciosa no projeto de vida: “É preciso conhecer a profissão escolhida e não
acreditar numa idealização, numa idéia irreal. A questão está em como você é
enquanto profissional. É melhor ganhar mal, mas não ser alguém frustrado durante
a vida. Então, faça de tudo para conseguir realizar-se dentro da profissão escolhida e conseguir sustentar-se com ela”.
Com a mudança do mercado de trabalho nas últimas décadas, os chamados testes vocacionais deixaram de ser a base para a escolha da profissão e se tornaram
um auxílio, contrariando a idéia de que o teste deve ser encarado como decisivo.
A psicóloga oferece a dica: “pense no porquê você gosta de determinado curso
e se imagine como um profissional daqui a alguns anos. É isso mesmo que você
quer? Faça uma lista com tudo o que gosta de fazer, independente do que tenha
ou não habilidade e tente olhar onde elas se agrupam. Analise cada profissão e
descubra em qual delas se encaixa o seu projeto de vida”. Ione diz que por mais
que se erre na escolha, sempre é tempo de recomeçar. “Tudo é possível quando
você quer. Basta apenas ter força e nunca desistir do que você acredita. Por mais
que seja uma tarefa dura, sempre vale a pena recomeçar para que a vida tenha
valido. Nenhum tempo é perdido,
porque aprendemos com cada experiência”.
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O bandolinista Hamilton Holanda, 25 anos, é, atualmente,
um dos maiores nomes do Choro no Brasil. Guardadas as devidas proporções, ele toca bandolim com a
pegada e a paixão com que Jimi Hendrix incendiava
sua guitarra. Recentemente, foi agraciado com um
prêmio, que o possibilitou ir morar no exterior para
que possa investir na sua carreira internacional.
Antes de partir, Hamilton conversou com o Radcal.
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JIMI HEN
Hamilton Holanda
Como é que o Choro entrou na sua
vida?
A exemplo da Escola do Choro, qual a
importância do Choro para os jovens?
Quando o médico me deu uma palma-
Tem-se que incentivar cada vez mais
nota e se arrepiar, isso
dinha na minha bunda e eu comecei a
o ensino da música para as crianças
engrandece a alma de
chorar.... (risos).
e para os jovens, porque quem vai dar
um ser humano. E a criança tem que ter
Parece que é uma brincadeira boba,
continuidade e quem faz viver qualquer
contato com isso. A música é mais uma
mas é verdade. O Choro aparece na
coisa no mundo são os jovens.
das dádivas de Deus, que a gente tem
sua vida naturalmente. Por isso eu fiz
O principal do Choro, como estilo musi-
de saber como aproveitar da melhor
essa comparação. E eu, por coincidên-
cal, é a brasilidade. O estudo e o gosto
forma possível. E, para mim, é a minha
cia, além de ter chorado quando saí da
pelo Choro implicam outras coisas tam-
dádiva.
barriga da minha mãe, chorei quando
bém. Implica você se dedicar à cultura
encontrei meu pai. Foi ele que me
brasileira. Qualquer pessoa pode gostar
colocou na música, ele que me colo-
de Choro. É um ritmo quente, as pessoas
cou nesse universo especial. Meu pai
que fazem com prazer também te propor-
me deu um instrumento, meu avô me
cionam o prazer de assisti-las tocando...
É normal vermos vários adolescentes
enveredando para o rock, formando suas
bandinhas e tocando por aí. Você também
teve a sua fase rock?
deu um bandolim. Tudo desde peque-
é como apreciar uma pintura, assistir a
Claro! Eu acho que a “fase rock” pode
nininho.
uma peça de teatro... Além disso, den-
virar a “vida rock”. Tem gente que esco-
tro da educação de qualquer criança,
lhe o estilo como jeito de ser. Eu passei
é importante o ensino da música. Não
e adorei. Aprendi muita coisa. Na época,
Não. Só meu pai, eu e meu irmão. Meu
só do Choro, mas da música em geral.
eu tocava baixo na banda. Tocava Titãs,
avô era maestro de banda de coreto. E
Assim como o esporte, eu acho que a
Legião Urbana, Paralamas.
o meu outro avô não tocava, só fez a
música tem que fazer parte do currí-
maravilha de me dar um bandolim.
culo. Você não precisa nem entender
Toda a sua família é do Choro?
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a música. Só de sentir a música, ouvir uma
Jobim, Chico Buarque. Eu não sou um
profundo conhecedor do folclore, mas
recomendo tudo, porque é uma coisa
visceral.
Então, como você consegue sobreviver de
um estilo musical que não toca tanto na
rádio e não tem presença na mídia?
Olha, eu sobrevivo bem. Porque o que
Como está o Choro em Brasília, no Brasil?
Está se formando uma nova geração?
Como os jovens podem se interessar pelo
Choro?
eu faço, quem gosta gosta. Não tem
essa de gostar hoje e amanhã não gostar. E 90% do que aparece na mídia hoje
não é assim. O que gostam hoje não
gostam mais amanhã, porque já encheu
Eu acho que esse é o grande trunfo
o saco. Eu acho que dá para alcan-
do Choro. Os adolescentes também
çar uma boa vendagem sem precisar
gostam de Choro. Só não gostam os
ser perecível. Dá pra viver muito bem
que não ouviram, não tiveram a opor-
fazendo música de qualidade. E o mais
tunidade de conhecer. Eu acho que o
importante: viver feliz da vida! Sem se
grande lance está em quebrar essa
vender, sem baixar a cabeça para rea-
fronteira do desconhecimento, a falta
lizar desejos de outras pessoas.
de informação, e não, o desgosto. Eu
D R I X DO CHORINHO
Musicalmente, o que você tem como
referência? O que marcou a sua memória musical? O que você recomenda para
os novos apreciadores do Choro?
São tantas coisas... Em janeiro, gravei
o meu primeiro disco solo, dedicado
sempre ouvi desde
pequeno. Será que
sou anormal? Será
que os alunos da
Escola do Choro são anormais?
aos meus quatro mestres de bandolim,
E o que atrai os jovens no Rock?
que eu recomendo que ouçam: o Jacob
Existe uma coisa no Rock de postura,
do Bandolim, o Luperce Miranda, Joel
que, ao Choro, é associada à postura
Nascimento e Armandinho Macedo.
do velhinho sentadinho. A diferença é
Como bandolim, recomendo que ouçam
essa. O Rock tem mais sucesso, por-
Ronaldo do Bandolim, Pedro Amorim,
que, desde que nasceu, teve uma pos-
Isaías...o Brasil tem ótimos bandoli-
tura rebelde...
nistas.
um só tipo de música, um só tipo de ins-
Além da postura do Rock, você acha que
o Choro não aparece porque falta espaço
na mídia?
trumento. Para se entrar no espírito da
Quando eu falei em quebrar barreiras,
música, você tem de ouvir outras coi-
foi justamente quebrar as barreiras
sas. Eu adoro música erudita. Adoro
da não-informação. E o que é a não
Debussy, Beethoven, Bach, Villa-Lôbos.
informação? É, justamente, não apa-
Adoro Jazz também. Isso sem contar
recer na mídia.
Não só o bandolim é o que ouço. Eu
recomendo que as pessoas não ouçam
com música do Brasil. Caetano, Tom
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C A M P O S , 19 ANOS
< M A N I P U L A Ç Ã O D I G I TA L E M F O T O D E I R V I N G P E N N
A N I TA
Quando o Papo é Drogas
Quando o papo é drogas, todos se agitam. Uns acham que
as drogas são o mal da humanidade, outros, a salvação.
Isso acontece porque existem muitos mitos que confundem nossa cabeça. Certamente, você já ouviu falar que se
usar, irá se viciar e entrar para o mundo do crime, ou que
as drogas abrem a mente. Mas não é bem assim.
Você que se acha santo, vou logo dizendo: provavelmente
você é um viciado. Drogas ilícitas, álcool e tabaco, remédios, TV, comida, amor e sexo, religião, compras, trabalho,
tudo, dependendo de como se usa, pode ser considerado
uma droga. Vício é uma relação de dependência que se
cria. É como se você não se imaginasse vivo e feliz sem determinada coisa ou ocasião. Não há como ter preconceito.
Falando das drogas ilícitas, existem vários motivos que
levam alguém a experimentá-las. Curiosidade, rebeldia,
insatisfação, moda, acabar com insegurança, e por aí
vai. O que importa é que nesse momento, você jogou na
sorte. Sorte?
Desfazendo algumas mentiras, eu digo: as drogas dão
muito prazer. Senão, não tinha tanta gente usando. E tem
uma pra cada gosto: as que relaxam, as que te deixam
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sensível, as que produzem imagens, as que desinibem etc.
Além disso, há o ritual, a adrenalina, a enorme sensação
de liberdade.
Há dois tipos de dependência química: a que vem de uma
predisposição orgânica e a adquirida. Existem pessoas que
já nascem com uma disfunção na produção dos neurotransmissores, responsáveis pela sensação de prazer. Essas
pessoas podem obter o vício facilmente. É como se as
drogas complementassem o prazer que seu corpo produz.
Comer, tomar banho, sexo, ouvir música se tornam bem
mais interessantes. É como se vivêssemos um momento
único e interagíssemos com tudo.
Como não querer sentir isso? Quanto mais se usa, mais se
vai descobrindo coisas. E dá vontade de ter esse prazer o
tempo todo, em tudo. Esse é o grande problema! As drogas
danificam muitas partes do corpo, e isso todos já sabem
de cor. Mas o que leva ao vício são os danos causados
nos neurotransmissores. Aos poucos, o organismo não
consegue estimular naturalmente a produção deles, e a
droga vai se tornando cada vez mais necessária, pois o
ser humano não vive sem prazer. Isso é inevitável a todo
usuário, até o de “fim-de-semana” e o de “momentos
especiais”. A rapidez e a intensidade do vício varia de
organismo para organismo, assim como o tipo de droga,
a quantidade e o tempo de uso.
Infelizmente, não há como saber o futuro. Você pode ter
uma predisposição, um organismo frágil ou não; você pode
vir a adorar as drogas ou não. Não dá para nos comparar
ao cara que morreu de overdose ou à velhinha que bebeu
a vida inteira e morreu aos 120 anos. Não há como saber
se nos viciaremos ou não. A dependência química é muito
sutil e estagnar a doença não é fácil, poucos conseguem
sair ilesos.
Hoje, penso que não é preciso usar drogas. Podemos conseguir ser felizes com o que temos. Quando aprendemos a
lidar com a vida evoluindo por nós mesmos, aprendemos a
dar valor ao que somos, a buscar uma qualidade de vida,
a ter prazer com as pequenas coisas. Estamos tendo um
aprendizado duradouro e real, um prazer que só tende a
crescer, que não tem hora para acabar, e o melhor: não
dá ressaca!
Sorte? Pra quê? Eu quero é ser doidão de cara!
FILOSOFIA ZEN NO TRIATLO
G A B R I E L A
G O U L A R T
F O T O G R A F I A S
Do Planalto Central às Olimpíadas
de Sydney, o triatleta profissional
brasiliense Leandro Macedo, 32,
encara a competitividade como
um desafio para atingir o equilíbrio. Adepto da medicina oriental,
Macedo desdobra o seu tempo
entre a vida familiar com a esposa
e o filho de três anos com um treinamento diário de quatro a seis
horas, massagem, acupuntura e
meditação. Antes de embarcar para
a Austrália, ele conversou com o
Radcal.
cidadãos. Por isso é importante ser
orientado por profissionais capacitados não só nas habilidades físicas, mas também que tenham essa
compreensão do esporte. Aprender
artes marciais é aprender a dominar seu físico, sua mente e suas
emoções. Quanto mais se domina
essa arte mais distante se está da
violência, se seguirmos a filosofia
correta.
A que você atribui a quantidade
de triatletas que Brasília tem
revelado, como a Mariana Ohata,
você e o Alexandre Manzan?
Sempre pratiquei esportes. Minha
família dá valor ao esporte como
uma atividade que faz par te do
dia-a-dia, assim como os estudos.
Entrei no esporte competitivo aos
18 anos. Quando fazia Engenharia Florestal, fui me envolvendo
com o triatlo e meu treinador insistia para eu fazer Educação Física.
Ficou complicado conciliar quando
fiz o circuito mundial, em 91, e os
professores não abonaram as faltas. Então entrei para o curso
de Educação Física, estudando à noite. Sempre
gostei de cachoeira,
de estar no meio do
mato. Hoje em dia eu
corro em trilha, em
Pirenópolis, na Chapada, onde não tem
trânsito.
As condições físicas da cidade favorecem bastante, principalmente
para o ciclismo. Saio de casa com
a bicicleta e já começo a contar
a metragem. Além disso, aqui não
tem esquinas, quase não tem cruzamento, o que também poderia
atrapalhar.
Depois de ter sido atropelado,
o triatleta Alexandre Manzan
lançou uma campanha pela paz
no trânsito no Lago Norte. Você
também sente na pele a violência
no trânsito?
O mais perigoso era a alta velocidade, que melhorou muito depois
dos pardais. Colocar placas de
“Respeite o Ciclista” já chama a
atenção e dá uma ajuda.
Pensando principalmente no uso
de lutas marciais para a violência, você acha que os valores do
espor te se desvir tuaram? Que
valores deveriam ser cultivados
no esporte?
Esporte é um meio de educação,
transformação social, formação de
Pensando na sua juventude, como
o esporte contribuiu para a formação de seus valores e de seu
estilo de vida?
Qual a relação dos
esportes
com as
drogas?
São
incompatíveis. Para conseguir sentir essa sensação de bem-estar,
saudável, não tem como se envolver com as drogas. Carro a gente
pode trocar, mas só tem um corpo
para levar a vida toda. Então tem
que dar a ele o melhor possível,
não só no físico, mas também em
termos de cultura, de pensamento,
tem que cuidar também da mente
para ter esse equilíbrio. O esporte
de competição às vezes é muito criticado, pela agressão, ou porque
alguns atletas esbanjam dinheiro.
Para mim a competição é um desafio de equilíbrio. Para estar na sua
melhor perfomance tem que estar
super-equilibrado – o emocional, o
mental e o físico. Se se deixar levar
pelo ego, rapidinho você toma um
tombo.
Nessa neurose de culto ao corpo,
em que as pessoas utilizam
formas artificiais para transformar o corpo, exageram no exercício, tomam anabolizantes, como
você associa a beleza à educação
corporal ligada aos esportes?
As pessoas observam muito
só a parte externa. É muito
comum estar com a pele
desidratada, passar
creme e esquecer de
beber água. Tem que
ser de dentro para fora.
Os músculos podem
estar torneados, mas
vai saber como é
que está o
organismo.
Se continuar buscando a
beleza
de fora
para
G L E I C E
M E R E
dentro, as pessoas nunca estarão
satisfeitas.
Como anda o apoio ao esporte
profissional?
Em ano olímpico é tudo mais fácil
para quem já conseguiu vários títulos, mas no momento de formação
do atleta (por volta dos 14 anos) é
mais crítico. Para um atleta chegar
às olimpíadas ele precisa se preparar por oito anos. Tenho corrido
com um pessoal da Associação de
Corredores da Ceilândia. Lá tem um
corredor de 13 anos que, com certeza, vai para as olimpíadas daqui
a oito anos se continuar treinando,
mas precisa de apoio.
Como funciona essa associação
na Ceilândia?
É formada por um grupo de atletas
e coordenado pelo Albenis, que foi
corredor e está estudando Educação Física. Ele já botou muitos atletas para participar de provas importantes. O Marilson, que foi segundo
na Maratona do Rio, começou lá.
Eles fizeram uma pista de terra de
400 metros, outra de 1000 metros,
dentro do Centro de Ensino 02 da
Ceilândia. O ambiente é muito legal,
mas não tem estrutura. Às vezes a
gente leva uma cesta básica para
ajudar. Muitos bons corredores saíram de lá.
Um recado para os leitores do
Radcal?
Dentro do esporte, se você tiver
objetivos reais, você vai conseguir
grandes realizações pessoais, que
podem contribuir para trazer muito
mais felicidade para você hoje e
daqui a alguns anos. Para isso, é
muito impor tante cuidar do seu
corpo. A gente tem que avaliar as
coisas sempre a longo prazo.
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QUANDO VOCÊS SE DERAM CONTA DE QUE, COM A MÚSICA, PODERIAM ESTAR
AJUDANDO PESSOAS, DIVULGANDO PROJETOS?
No começo, a gente fazia por fazer. Tinha a ver com o texto,
com a nossa atitude. Mas depois que o trabalho deu certo,
teve um certo reconhecimento, começamos a usar nosso
espaço de outra forma. A gente descobriu que, melhor do
que divulgar nossa própria imagem, era divulgar as coisas
em que a gente acreditava.
ENTÃO FOI UMA ESTRATÉGIA MESMO...
É, a gente foi sumindo cada vez mais do plano de marketing,
e colocando ali as nossas coisas. Nos videoclipes, por exemFOTO DE MOIRA SEADON
plo, a banda quase não aparece.
TALVEZ POR ISSO VOCÊS TENHAM UM PÚBLICO TÃO FIEL, NÃO? O RAPPA
PARECE TER MAIS FÃS PELO QUE DIZ (E PRATICA), DO QUE PELA MÚSICA
OU PORQUE O (VOCALISTA) FALCÃO É BONITO...
Acho que ainda é maior o público que visa mais o entretenimento. Mas o mais importante é saber usar a mídia e não
ser usado. Senão fica propaganda de você mesmo, e aí vira
qualquer coisa. A gente acredita em outras coisas, tem mais
yuka pegada
o que dizer do que falar de nós mesmos.
VOCÊS DIZEM O QUE ACREDITAM DE MANEIRA BASTANTE CONTUNDENTE.
FOI A MELHOR FORMA QUE ENCONTRARAM PARA CHAMAR A ATENÇÃO DA
CAUSA SOCIAL?
Não é marketing pessoal, nunca falamos ‘nós estamos
T E R E S A
A L B U Q U E R Q U E
Marcelo Yuka
nunca ficou só no discurso.
O homem do pop/rock nacional que mais rima
música com atitude já se envolvia com projetos
comunitários antes de assumir o posto de letrista
e baterista do Rappa, em 1993. Começou escrevendo para o jornal do AfroReggae, nos tempos
do curso de jornalismo. Também fez parte de uma
banda de reggae da Baixada Fluminense, o KMD5, que deu origem ao Negril. Quando O Rappa foi
criado há nove anos, trazendo um pouco do reggae da Baixada e do discurso do rap, ele logo se
deu conta de que podia fazer muito mais do que
letra e música.
Baleado em novembro de 2000, nunca parou com
os projetos comunitários. Não pode mais subir os
morros do Rio, mas apóia um número cada vez
maior de trabalhos. Está cheio de idéias. Em entrevista ao Radcal, ele fala um pouco de sua formação, da banda e das coisas que acredita.
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fazendo isso’. Estamos apoiando alguém que faz, tornando
isso visível. Não é um projeto nosso. Estamos botando
azeitona na empada dos outros – o que é bem mais sadio
do que colocar azeitona na própria empada. É uma questão de ética.
NA INGLATERRA, HÁ O ASIAN DUB FOUNDATION; NOS ESTADOS UNIDOS,
O RAGE AGAINST THE MACHINE... AQUI O RAPPA É O MELHOR EXEMPLO
(TALVEZ O ÚNICO COM AÇÃO EFETIVA) DE BANDA COM DISCURSO ENGAJADO
QUE VENDE MUITO. POR QUE TÃO POUCA GENTE FAZ ISSO NO “MUNDO
POP”?
Acho que há um pouco de medo do mercado, de ‘esse menino
tá abusando demais do discurso’, ‘não tem espaço na rádio
para discurso desse tipo”... O Rappa é meio zebra mesmo.
VOCÊS TIVERAM DIFICULDADES COM A GRAVADORA?
Um pouco, no início, para que entendessem a nossa postura. Eles nunca censuraram, nunca cercearam o trabalho.
Mas uma vez que ficava pronto, não sabiam como trabalhar
aquele disco.
ISSO FOI MUDANDO COM O TEMPO?
Foi. Hoje eles sabem que a gente consegue ter espaço no
mercado sendo o que a gente é.
YUKA
PARECE QUE ARTISTAS E BANDAS DE OUTROS ESTADOS, ESPECIALMENTE
BAHIA E PERNAMBUCO, SE ENVOLVEM MUITO MAIS COM A ÁREA SOCIAL.
É IMPRESSÃO OU ISSO REALMENTE ACONTECE, COMPARADO AO RIO, ONDE
NÃO HÁ TANTOS GRUPOS CONHECIDOS POR ESTE TRABALHO?
Quando se tem uma cultura popular forte, de cara você tem
uma tendência a associar isso com mudança social. A Bahia
sentiu isso cedo. No Rio há projetos, como o da Xerox da
Mangueira, etc. Mas aqui os morros são mais divididos politicamente, fica mais difícil. E também tem a questão do narcotráfico, que divide muito as comunidades. É mais lento.
FOI BALEADO NA NOITE DE
9 DE NOVEMBRO DE 2000, NUMA
RUA DA TIJUCA, A POUCOS METROS
DE CASA. TINHA SAÍDO SOZINHO
PARA ASSISTIR A UM SHOW E MAL
DOBRARA
A
ESQUINA
QUANDO
ENTROU NUM FOGO CRUZADO. AO
AVISTAR UMA BLAZER PRETA NO
FINAL DA RUA, COM ARMAS PARA
CHAMA A ATENÇÃO A RAIVA COM QUE ESCREVE. VOCÊ SENTE OU JÁ SENTIU
MUITA RAIVA?
Na adolescência, sim.
atitude
FOI A RAIVA QUE O LEVOU A FAZER TODAS ESSAS COISAS?
Foi por raiva que eu comecei a ler. Sempre estudei em escola
pública, mas no cursinho meu pai fez um esforço para eu estudar em colégio de bacana. Pensava que ia conhecer gente
maravilhosa, mas tinha só turma. Era turma da praia, turma
do colégio, turma da rua, todo mundo tinha a sua turma. Eu
era o único suburbano ali. Fiquei no fundo, deslocado mesmo.
E comecei a ler. Por intermédio da literatura, vi que aquilo
tinha fundamento, que não era uma coisa que estava sentindo por nada. Era social mesmo.
FORA, ELE PISOU NO FREIO, TENTOU
DAR RÉ. LEVOU OITO TIROS, MAS NÃO
PERDEU A LUCIDEZ.
ENQUANTO ERA ENCAMINHADO AO
O QUE ACONTECEU
HÁ ALGO QUE CONSIDERE FUNDAMENTAL PARA A SUA FORMAÇÃO? COISAS
QUE LIA, ESCUTAVA? O QUE GOSTAVA DE OUVIR NA ADOLESCÊNCIA, POR
EXEMPLO?
Sou de subúrbio, sempre gostei de música de preto. Mas
não era por não tentar outras coisas. Tentei, sim. Nos anos
80, queria ter alguma afinidade com aquela coisa de “se as
meninas do Leblon não olham mais pra mim”... Acha que não
quis? Queria ter óculos coloridos, embora não tivesse nenhum
problema na vista (risos). Mas o texto não dava, ficava forçado. Gostei dos Paralamas quando eles fizeram Alagados.
Também gostei do discurso da Legião Urbana no começo, e
era amarradão no Cabeça Dinossauro, dos Titãs...
HOSPITAL DO ANDARAÍ, NA ZONA
NORTE, SÓ TINHA DUAS CERTEZAS:
A DE QUE NÃO MORRERIA E A DE
QUE TINHA FICADO PARAPLÉGICO.
NO HOSPITAL PÚBLICO, DEMOROU A
SER ATENDIDO. PELA QUANTIDADE
DE BALAS QUE TINHA NO CORPO,
ACHA QUE O CONFUNDIRAM COM
BANDIDO.
NO DIA SEGUINTE, COM OS JOR NALISTAS NA PORTA, TUDO HAVIA
MUDADO. JÁ ERA O MARCELO YUKA,
DO RAPPA. O HOMEM QUE SEMPRE
TRABALHOU PARA TORNAR REALIDADE A MENSAGEM DE SUAS LETRAS.
ALVO DA VIOLÊNCIA QUE TANTO
DENUNCIOU, ELE TEM ESPERANÇA
NAS NOVAS TECNOLOGIAS PARA UM
DIA VOLTAR A ANDAR.
HOJE SÃO POUCOS OS MOVIMENTOS
QUE CONSEGUE FAZER. YUKA CONTA
APENAS COM O BRAÇO DIREITO PARA
AS ATIVIDADES MAIS SIMPLES DO
DIA-A-DIA, COMO FALAR AO TELEFONE, COMER. O BRAÇO ESQUERDO,
ATINGIDO POR UMA BALA, ELE TENTA
RECUPERAR PARA PODER VOLTAR AO
TRABALHO.
NO LANÇAMENTO DO CD INSTINTO
O QUE LIA NESSA ÉPOCA?
Foucault, Nietzsche... Tinha 17 anos, me f...! (risos) Isso não é
coisa para ler, não... Acho que nem menino, nem grande. (risos)
COLETIVO, NO ANO PASSADO, ELE
SABEMOS QUE VIOLÊNCIA SE COMBATE COM EDUCAÇÃO. NA ESCOLA, O QUE
ACHA QUE PODE SER FEITO PARA PROMOVER UMA CULTURA DE PAZ?
A escola tem que ser, no mínimo, um espaço convidativo.
Um lugar para “estar”, onde você possa se expressar, tocar
violão, fazer grafite... A escola deve ampliar a voz, não reprimir. Deve ser um espaço culturalmente viável para o aluno,
um trampolim para a comunidade. O aluno precisa voltar para
casa armado daquele ambiente escolar. Para isso ele tem
que se sentir mais livre.
NOS SHOWS DO RIO E DE SÃO PAULO.
PARTICIPOU DE ENTREVISTAS DA
BANDA E CHEGOU A SUBIR AO PALCO
GOSTOU MUITO DA RECEPTIVIDADE
DA PLATÉIA, MAS ANDA COM VONTADE DE FICAR MAIS QUIETO. ESTÁ
CANSADO DAS IMAGENS DE HERÓI
E COITADO QUE VIRA-E-MEXE APARECEM POR AÍ. “NÃO QUERO NADA
DISSO”, DIZ.
R
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9
ZÉ ROBERTO
E SUA IRMÃ
VANESSA
JUNTO AOS
PROFESSORES
LÍLSON E
JUÇARA
RAYSSA COE
(ESQ.)
G
A
B
R
I
E
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C
O
A
R
A
C
Y
RAYSSA COE
P RO F I S S I O N A L
José Roberto Fonseca Vieira, um bebê
especial, criança contente. Aos nove
meses, veio do Piauí para Brasília cuidar da sua saúde. Cresceu no Paranoá, cidade pela qual se apaixonou.
Entrando na escola, se encantou
pelo novo mundo que encontrara.
Conforme foi crescendo, aprendeu a mexer nessa máquina
esquisita que é o computador e virou um grande
surfista. Surfou pelos
sites de educação na
internet, se divertiu a pren dendo
a pro gra mar e
a fazer páginas para outros sur farem.
Até que percebeu que sua escola
daria ótimas ondas. Resolveu,
então, se juntar com seus
colegas e fazer o
site do Centro
de Ensino
Médio
01
do
Paranoá.
Ele reunia com o pessoal aqui, quebrava
a cabeça ali, estudava, ia ao cinema, ia
à igreja, surfava, programava. Depois de
algum tempo, era hora de mostrar o site
para a coordenação do colégio. Alegria
total! Todos aprovaram com fervor. E foi
nil no Distrito Federal, apresentou o Largada
2000 para Zé Roberto e seu grupo. Foi assim
que eles se inscreveram no Programa e, sob
a orientação da professora Juçara Avila, se
destacaram. A badalação foi grande. Participação em feiras, flashes de fotografia, o
Radcal sempre assediando... é, o Zé Roberto
está virando um surfista reconhecido...
Sempre acompanhado da sua irmã,
Vanessa, que, além de grande companheira, é uma das responsáveis
pela pesquisa e elaboração do site,
Zé Rober to concilia os estudos
com seu projeto. Ele está no terceiro ano do Ensino Médio e pretende fazer vestibular para Ciência
da Computação. Tudo a ver.
Para Zé Rober to, o Lar gada
2000 é um programa que tem
unido ainda mais os alunos com
a escola, numa relação harmônica. Vem quebrando a idéia do professor estar acima do
aluno. “Depois do Largada 2000, eu passei a
ver a escola não como um aluno que só passa
por ela, mas sim, de um integrante da escola.
Agora, sou um cidadão da escola. Uma pessoa participativa, que pode ser ouvida, que
pode ajudar alunos em dificuldades. Aprendi a
respeitar e a amar a escola. Nós não estamos
lá porque somos obrigados. Temos uma relação de afeto.”
Pois é, bom saber que a escola pode ser uma
CARSON MENDES, E
na Feira de Ciências do ano passado que
o professor Lílson Pelegrine, um dos maiores incentivadores do protagonismo juve-
praia cheia de ondas boas e muito badalada.
Zé Roberto é um surfista que sabe aliar o útil
ao agradável. Irado, bro!
NÃO, PELO PROFESSOR
MILA PETRILLO
ERRATA
O GRUPO DO CEM 01 DO
GAMA QUE PARTICIPOU DA
“TEMPESTADE TEATRAL
INTERATIVA”, O “CABARÉ DO
VOLTAIRE”, FOI COORDENADO
PELO PROFESSOR WILLIAM
EZEQUIAS, COMO HAVIA SIDO
PUBLICADO.
“Em termos de autoconhecimento, me senti mais unido ao meu grupo, mais
aberto a opiniões, mais receptivo às pessoas. O trabalho que fazemos é com
amor, não tem nenhum interesse maior que o nosso gosto pelo projeto.”
PARA QUEM AINDA NÃO CONHECE, O LAR-
NO DISTRITO FEDERAL, O PROGRAMA LAR-
GADA 2000 É UM PROGRAMA QUE INCENTIVA
GADA 2000 É RESULTADO DE UMA ALIANÇA
A EDUCAÇÃO POR PROJETOS NAS ESCOLAS.
SOCIAL ESTRATÉGICA DO INSTITUTO AYRTON
SE VOCÊ TEM UMA IDÉIA NA CABEÇA E QUER
SENNA COM A TCO – CENTRO-OESTE CELU-
COLOCÁ-LA EM PRÁTICA, VEJA SE O LARGADA
LAR. A FUNDAÇÃO ATHOS BULCÃO É PAR-
2000 ESTÁ NA SUA ESCOLA. COM CERTEZA,
CEIRA EMPREENDEDORA E O SESI, O ALIADO
VOCÊ VAI TER O APOIO QUE FALTAVA!
INSTITUCIONAL.
10
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C
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SITE DO CEM 1 DO PARANOÁ: WWW.CEM01PARANOA.HPG.COM.BR
SITE DO PROGRAMA LARGADA 2000: WWW.LARGADA2000.COM.BR
SITE DO PROGRAMA LARGADA 2000 NO DISTRITO FEDERAL: WWW.FUNDATHOS.ORG.BR
O VERDADEIRO
BIG BROT H E R
sos não eram eliminados do jogo, mas vaporizdos, transformando-se em som-
C A R O L I N A
M E N D E S ,
2 1
A N O S
bras do que haviam sido. Poderiam ser acusados por qualquer um, assim, as
crianças recebiam sua educação desde cedo sendo ensinados a identificar
< M A N I P U L A Ç Ã O D I G I TA L E M F O T O D E I R V I N G P E N N
aos gritos os traidores do Par tido, recebendo medalhas por cada identificaGeorge Orwell criou seu Big Brother
no livro 1984. Nele, o “grande irmão”
era uma face de 45 anos, carregada e
com um negro e pesado bigode, estampada em car tazes afixados por todos
os cantos, possuindo olhos que pareciam seguir aqueles que a observavam
– acompanhavam-na os dizeres “Big
Brother is watching you” (O Grande
Irmão está te vigiando), não deixando
dúvidas do propósito daquele rosto que
não se sabia se jamais havia per tencido a alguma pessoa. Desde sua criação, “Big Brother” tornou-se uma constante na língua inglesa, uma metáfora
para uma prisão na qual se é incessantemente vigiado.
O livro 1984 nasceu como uma crítica à sociedade e aquilo em que ela
se transformava, segundo a visão de
Orwell. O ano escolhido foi 1984, 35
anos adiante da publicação do livro, em
1949. Durante muitos anos a “profecia
de Orwell” foi esperada e temida com
a crescente aproximação do fatídico
ano escolhido. 1984 passou sem que
se concretizassem os temores de tantos leitores.
1984 não viu os minúsculos microfones
que captavam mesmo qualquer suspiro
mais profundo, tanto nos centros urbanos quanto no campo; não viu os televisores que haviam perdido sua função primordial de entretenimento e que, colocados estrategicamente nos interiores
das construções, não deixavam nenhum
recanto inobservado.
2002, ao contrário, parece estar realizando tudo aquilo que por tanto tempo
tememos. Agora, enclausuramos um
grupo de pessoas em uma casa para que
possam ser observadas por todos aqueles que o desejem. Eles não possuem
televisores que transmitem sua imagem
para um lado desconhecido, mas espelhos que refletem-na enquanto mostramna para aqueles que se dêem ao trabalho
de ligar algum televisor. Os minúsculos
microfones estão espalhados e presos
ção; pais viviam atemorizados por seus filhos, homens por suas mulheres,
vizinhos, colegas de trabalho, por transeuntes quaisquer. Era-se acusado,
em grande par te, de pensamentocrime, de pensar contra o Par tido que tudo
controlava com seus lemas de Guerra é Paz, Liberdade é Escravidão e Ignorância é Força.sos não eram eliminados do jogo, mas vaporizdos, transformando-se em sombras do que haviam sido. Poderiam ser acusados por qualquer um, assim, as crianças recebiam sua educação desde cedo sendo ensinados a identificar aos gritos os traidores do Par tido, recebendo medalhas
por cada identificação; pais viviam atemorizados por seus filhos, homens por
suas mulheres, vizinhos, colegas de trabalho, por transeuntes quaisquer.
Era-se acusado, em grande par te, de pensamentocrime, de pensar contra o
Par tido que tudo controlava com seus lemas de Guerra é Paz, Liberdade é
Escravidão e Ignorância é Força.sos não eram eliminados do jogo, mas vaporizdos, transformando-se em sombras do que haviam sido. Poderiam ser acusados por qualquer um, assim, as crianças recebiam sua educação desde
cedo sendo ensinados a identificar aos gritos os traidores do Par tido, rece-
às roupas dessas presas que se prestaram a tanto, por dinheiro e meros “15
minutos de fama”, pessoas que abriram
mão de suas individualidades para servir
de entretenimento e pontos no Ibope.
No mundo de George Orwell, nada era
ilegal, pois não havia leis; assim, tudo
que fugisse do padrão imposto poderia e seria considerado ilegal, sem que
ninguém pudesse defender-se. Hoje, os
encarcerados das redes de televisão
abandonaram as leis sociais, em um
jogo no qual tudo é válido para conseguir o prêmio, já que a legalidade para
esses patéticos participantes é aquilo
que rezam o público e as emissoras –
detentoras do direito de eliminar aqueles que se tornam inconvenientes ou
simplesmente entediantes.
Em 1984, aqueles considerados criminosos não eram eliminados do jogo,
mas vaporizados, transformando-se em
sombras do que haviam sido. Poderiam
ser acusados por qualquer um, assim,
as crianças recebiam sua educação
desde cedo sendo ensinados a identificar aos gritos os traidores do Partido,
recebendo medalhas por cada identificação; pais viviam atemorizados por
seus filhos, homens por suas mulheres,
vizinhos, colegas de trabalho, por transeuntes quaisquer. Era-se acusado, em
grande parte, de pensamento-crime, de
pensar contra o Partido que tudo controlava com seus lemas de Guerra é Paz,
Liberdade é Escravidão e Ignorância é
Força.
Pode ser dito que George Orwell criou
em detalhes um pavoroso mundo onde
imperava o medo, onde não havia opções
que não as já determinadas pelo sistema. A verdade é que Orwell não criou
um mundo, apenas descreveu o ponto de
chegada de uma estrada que ele via o
mundo percorrer, criticando o que acontecia e suas possíveis consequências.
Nós utilizamos seu “personagem” e criamos um programa de entretenimento,
banalizamos a crítica; nos tornamos
tudo aquilo que ele temia.
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AGNAM
G A B R I E L A
G O U L A R T
Adolescentes da
Ceilândia criam o
grupo AGNAM para
ensinar a técnica dos
quadrinhos japoneses.
MILA PETRILLO
MADE IN BRASÍLIA
é Mangá ao contrário, um
tipo de desenho que se faz do outro
lado do mundo, mas que um grupo
de jovens de 10 a 25 anos estão
ensinando nas escolas da Ceilândia.
A idéia surgiu há quatro anos, como
uma brincadeira no CEM 02, onde a
professora de Português aproveitava
o talento dos alunos para transformar
clássicos da literatura brasileira em histórias em quadrinhos. O trabalho mais
marcante foi Memórias Póstumas de
Brás Cubas. Na escola, eles encontraram outras pessoas que gostavam de
desenhos japoneses e resolveram fazer
exposições dos desenhos e convocar
quem quisesse aprender.
Os desenhos japoneses que passavam
no Brasil, como Akira e os Cavaleiros do
Zodíaco chamaram a atenção do grupo por
terem uma história mais elaborada do que as histórias americanas mais conhecidas. Os
roteiros incluem elementos históricos e mitológicos e têm uma harmonia impressionante
entre a arte e o roteiro. O Akira, por exemplo, foi baseado no período pós-guerra. Em
histórias como Evangellion, não dá para descobrir quem é o bem e quem é o mal. Ele
fala sobre a luta de Deus contra o homem, do homem contra Deus e do homem contra o
próprio homem. Embora cheguem ao Brasil apenas os mangás mais comerciais (os mais
violentos), o grupo encontrou histórias sobre o amor, a guerra, as drogas, a religião e
também sobre acontecimentos históricos, como a Revolução Francesa. E é esse universo
dos desenhos que eles apresentam para os alunos.
Mesmo trabalhando com os traços do mangá, muitas histórias desenhadas pelo Agnam
se passam em Ceilândia, ou no Plano Piloto. Tem um mangá que conta a história de uma
guerra, cuja única cidade sobrevivente é Brasília. Tudo se passa em Brasília, na UnB, no
Congresso...é uma história do Marcelo, que faz parte do grupo.
Em um futuro bem distante, um meteoro cristalino vai atingir a terra, e as nações se
unem para criar uma arma laser para destruir esse meteoro. Quando ele é destruído, é
quebrado em milhares de pequenos cristais. Eles caem em todo o planeta, mas muitos
caem em Brasília. E o personagem busca energia dos cristais para fazer a máquina do
tempo, que só pode ir ao passado.
O grupo está procurando apoio para continuar realizando as oficinas de desenho nas escolas.
Quem se interessar pela oficina, ou quiser doar material como nankin, folhas, canetas deve
entrar em contato com o Marcelo Alves, pelos telefones: 61 9904-4095 ou 371-4714.
CONHEÇA O AGNAM:
MARCELO ALVES, 26
JEFFERSON DOS SANTOS, 11, ESCOLA CLASSE 27 DA CEILÂNDIA
ALEXANDRE RODRIGUES, 18, RECANTO DAS EMAS
FABIANO AUGUSTO LIMA, 18
DANIEL ALVES DE MELO, 18, CED 111, RECANTO DAS EMAS
MARCOS ALVES DE OLIVEIRA, 18, CEM 07, CEILÂNDIA
ANDRÉ PEREIRA RAMOS, 25, ESCOLA TÉCNICA DE BRASÍLIA
LEONARDO DIAS MENESES, 20
FERNANDO DE OLIVEIRA SOARES, 22, CURSA QUÍMICA NA UNB
ISRAEL
www.sagnam.hpg.com.br
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DICA RADCAL
Q U E TA L D I S C U T I R O E ST R A N G E I R I S M O A O S O M D A
COMPOSIÇÃO SAMBA DO APPROACH, DE ZECA BALEIRO?
VENHA PROVAR MEU BRUNCH
SAIBA QUE EU TENHO APPROACH
NA HORA DO RUSH,
EU ANDO DE FERRYBOAT (VENHA PROVAR)
JÁ FUI FÃ DO JETHRO,
HOJE ME AMARRO NO SLASH
MINHA VIDA AGORA É COOL,
MEU PASSADO JÁ FOI TRASH
EU TENHO SAVOIR-FAIRE
MEU TEMPERAMENTO É LIGHT
MINHA CASA É HI-TECH
TODA HORA ROLA UM INSIGHT
EU ANDO DE FERRYBOAT (BEAUTIFUL!)
FICA LIGADO NO LINK
QUE EU VOU CONFESSAR, MY LOVE
DEPOIS DO DÉCIMO DRINK.
SÓ UM BOM E VELHO ENGOV
EU TIREI MEU GREEN CARD
E FUI PARA MIAMI BEACH
POSSO NÃO SER POP STAR,
MAS JÁ SOU UM NOVEAU RICHE
EU TENHO SEX APPEAL
SACA SÓ MEU BACKGROUND
VELOZ COMO DAMON HILL,
TENAZ COMO FITTIPALDI
NÃO DISPENSO UM HAPPY END,
QUERO JOGAR NO DREAM TEAM
DE DIA UM MACHO MAN
E DE NOITE UMA DRAG QUEEN
A G O R A T E N T E R E S O LV E R A S Q U E S T Õ E S :
® Traduza a letra do Zeca Baleiro para o
português
® Que palavras estrangeiras você cos-
tuma usar no seu cotidiano?
ZECA BALEIRO
® Há quem adote os estrangeirismos
cegamente. Há deputados que elaboram projetos para proibir o uso de
palavras estrangeiras por lei. Há quem
encare essa invasão cultural como um
enriquecimento da língua portuguesa.
E há quem faça samba! E você, como se
posiciona diante dessa situação?
® Como o Modernismo de 22, a Tropicália
dos anos 60 e o Mangue Beat dos anos
90 responderam a essa situação?
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SAÍDA PELA ARTE
O SABER DANDO
SABOR PARA
P A T R Í C I A
O S A N D Ó N
FOTOGRAFIAS GABRIELA GOULART
Imagine bichos peçonhentos e perigosos, índios selvagens e
presença do projeto Saúde
macacos peludos. Imaginou? Se essa é a imagem que você
e Alegria representa uma
tem da Amazônia, esqueça tudo isso, abandone seus estigmas
visão positiva da Amazônia
e conheça um pessoal no Estado do Pará que enfrenta horas
nas comunidades. É possí-
de barco para realizar seu trabalho e faz disso motivo de rea-
vel se desenvolver sustenta-
lização pessoal e social. O Projeto Saúde e Ale-
velmente com a conservação
gria (PSA) atua desde 1987 em 16 comu-
do meio ambiente”. Na área
nidades ribeirinhas extrativistas dos rios
de educação e cultura, o PSA
Amazonas, Tapajós e Arapiuns, atingindo
trabalha com a capacitação
aproximadamente 20 mil habitantes. O
de professores e monitores
PSA é um projeto que trabalha com o
mirins (6 a 12 anos), educa-
desenvolvimento comunitário integrado
ção ambiental, adaptação
e sustentado com programas de Organi-
curricular e o circo Moco-
zação e Gestão Comunitária, Produção
rongo que, por meio da arte,
Agroflorestal e Meio Ambiente, educa-
do lúdico e de enquetes edu-
ção e cultura, Gênero, Crianças e Ado-
cativas e culturais, resgata e
lescentes, Comunicação Popular e Pes-
difunde o conteúdo e os valo-
quisa Participativa. Os programas par-
res locais. Fábio conta que
tem da realidade existente para capa-
o projeto também procura
citar os moradores a atuarem no desen-
realizar a adaptação do que
volvimento comunitário e na defesa dos
é aprendido na escola com
recursos oferecidos pela Amazônia.
a realidade das crianças e
Em entrevista, Fábio Pena, que trabalha dire-
jovens. Como o próprio pes-
tamente com a área de Educação e Cultura, explica que
soal do PSA diz: utilizar-se
a principal idéia dos programas do projeto Saúde e Alegria é
do saber comunitário dando
consolidar um modelo de desenvolvimento comunitário: “A
sabor para a escola.
PRODUZIDO PELA
E AÍ, GOSTOU DO PROJETO?
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pensando naquilo
mento o PSA tem bastante.
triz trabalhada no início do
R E N AT O A R A Ú J O , 1 8 A N O S
A Saúde era a principal dire-
COLUNA DO ESTUDANTE
A ESCOLA
MILA PETRILLO
já ganhou três, sendo um em
de trabalhar com os outros
1º lugar no Prêmio Banco
setores tornou-se cada vez
Mundial de Cidadania, rea-
mais presente para o idealiza-
lizado em parceria com a
dor do PSA, Eugênio Scanna-
Or ganização das Nações
vino. “Ele viu que não adian-
Unidas e a Comunidade Soli-
tava falar de saúde sem falar
dária. “Me sinto privilegiado
de educação, nutrição, par-
em participar de um projeto
ticipação da mulher ou de
como o Saúde e Alegria,
como organizar as comunida-
onde se trabalha o desenvol-
des. O mais interessante era
vimento pessoal e comunitá-
que os jovens eram sempre
rio,
os mais curiosos em todos os
Amazônia, um local de muita
processos”, conta Fábio. No
carência social e de muitos
PSA, os jovens são incen-
r ecursos naturais. A p a r -
Já não é novidade quando ouvimos que o Brasil está sofrendo uma descaracterização de sua
cultura. Porém, quando se fala em “sofrendo”, nos
vem a rápida idéia de “passividade”. Tenho uma
experiência que pode mostrar que esse processo
é bem menos passivo do que imaginamos.
Por volta de 1996/1997, conheci o trabalho de
Chico Science e Nação Zumbi que, junto com o
Mangue Beat, me levaram a outros artistas ligados
à cultura nordestina, como Antônio Nóbrega, Cascabulho, Mestre Ambrósio, Faces do Subúrbio...
Certo dia, um grupo do colégio se reuniu para
um trabalho em minha casa, então, fui mostrar a
eles algumas músicas do Antônio Nóbrega. Não
chegaram nem a ouvir a segunda. Foi cômico e
trágico. Disseram que era música de velho. Fui
motivo de piada e, no colégio, passei a ser conhecido como Renato Maracatu.
Percebe-se que a importação da cultura não
limita-se à substituição da existente. Cria-se, também, resistência nas pessoas. Torna-as predispostas a recusar o que não dá ibope. E essa é a parte
ativa do processo. É quando rejeitamos o que
não é global.
Ficamos fascinados com o glamour do estrangeiro. Preferimos os filmes, as empresas e os produtos de fora, e mal sabemos que muitas vezes,
importamos para nossas casas suco de laranja
feito de nossas laranjas. Mas não ligamos se a
laranja é brazuca, o que importa realmente é
o passaporte do suco. Acharíamos ótimo se o
navio que o traz dos Estados Unidos pudesse
dar uma passadinha na Europa. E, quem sabe,
na Austrália.
O frevo, a festa de Parintins, o samba de roda,
são expressões belíssimas.Todas nacionais, e querendo, dá pra se divertir muito com elas. Cultura
não é um módulo que se possa medir e saber o
valor. A cultura só “é”. Equivocado quem diga que
Jô Soares é mais culto do que Dona Zica. E nem
vice-versa. São conhecimentos diferentes. Assim
como Bill Clinton não tem nada que sobressaia
ao Mestre Salustiano. Se igualam. O que falta em
um sobra no outro. Salustiano tem o povo e a vida
nordestina no sangue. Talvez não fosse capaz de
dominar o mundo ou bombardear civis, mas o Bill
não sabe tocar pandeiro e dançar frevo. E agora?
Quem é mais importante?
tivados a tornarem-se
além de poder viver na
ticipação comuni-
líderes e utilizarem os
tária torna-se funda-
recursos que a pró-
mental para o bom
pria Amazônia lhes
andamento do pro-
ofer ece,
evitando
assim a sua saída
para os centros
urbanos. Prêmios
de r econheci-
Se quiser saber mais acesse
jeto. É a comunidade
buscan do
forças em si mesma”, argumenta
Fábio.
www.saudeealegria.org.br
C A D A C U L T U R A C O M S E U VA L O R
Somente em 2002, o projeto
projeto, mas a necessidade
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15
O que um semáforo e uma
porta de banheiro tem a ver
com a nossa opção sexual?
RESPEITO À
Antropólogo e professor da Universidade
Católica de Brasília
Tem coisas que a gente não
consegue entender. Simplesmente são assim e pronto.
Por exemplo, eu sempre me
pergunto porque diabos escolheram o vermelho para indicar “pare” no sinal de trânsito. Por que vermelho e não,
sei lá, azul perolizado? O sinal, com certeza ficaria mais
fashion, e a gente ainda livraria os daltônicos de uma puta dor de cabeça. Mas não
adianta querer entender. Um
dia definiu-se que era assim,
e pronto. É uma invenção social. As pessoas se acostumaram de tal forma que só uns
poucos malucos como eu é que
ficam implicando e pensando
se não poderia ser diferente.
E assim vai. O vermelho do semáforo, a cartola que indica
“banheiro masculino” – gente,
quem é que ainda usa cartola?!! – e o @ no e-mail são apenas algumas das coisas que
encabeçam a minha lista de
“coisas que a gente não consegue entender”.
A homossexualidade ofende
muita gente. Taí mais uma
coisa que vai para a minha lista de coisas que não dá para
entender. No início do terceiro milênio, em plena era espacial, em tempos de internet,
ainda tem (muita) gente que
até acha normal a violência
urbana, a corrupção, a miséria, mas dois homens se beijando, inadmissível!
Na verdade há algo nessa
história que dá para enten-
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der. Entender
e m o d i f i c a r.
E a pergunta
a ser respondida é: por
que
ainda
há tanto preconceito contra quem vive sua sexualidade de forma diferente
daquela
que manda
o nosso semáforo?
Eu tenho
c á pra mim
uma explicação para
isso. Nossa
sociedade
sempre se
preocupou
muito com
tudo que envolvesse a sexualidade. Basta ver o barulho que andam fazendo hoje
em torno da clonagem. É bem
possível que quando inventaram a bomba atômica (eticamente muito mais questionável que a clonagem) não tenha havido tanto rebuliço.
Mas, mexeu com sexo, o
mundo se agita.
E como esse agito pode se
traduzir no preconceito nosso
de cada dia? Sobre isso também tenho cá minhas idéias.
Você já reparou como é difícil nadar contra a corrente?
Se você estivesse no meio da
torcida do Flamengo, no Maracanã lotado, você teria coragem de gritar “Flumineeenseee!!!”? Acho que não.
Pois o mesmo acontece com pequenas coisas no nosso dia-adia. Se os
seus amigos adoram
heavy metal,
você cer tamente não
se sentirá
à
vontade
para ouvir
(e gostar
de) r eggae – muito menos
de ópera. Se os
seus colegas todos
resolveram
entrar para a
tribo dos Straight Edge, você não conseguirá mais usar
aquela sandalia de couro sem
ser chamado de Calango. Ah,
sim, porque logo surgem os
rótulos. Aliás, os rótulos são
o primeiro passo do preconceito. As pessoas os usam
para enquadrar os outros
em modelos estereotipados.
“Coisa de viado” é mais um
desses rótulos que passam
por cima da individualidade
de alguém para enquadrá-lo
em um modelo negativo para o grupo.
Agora você pode estar pensando: “Pô, mas o pessoal é
foda. Não deixa a gente em
paz nem um segundo”. E aí
é que está a graça. Você faz
parte desse “pessoal”. Quantas vezes você já não chamou
um colega de boiola, fresco
ou florzinha porque ele não
topou fazer alguma aventura
radical com o grupo de amigos? Pois é, o preconceito é
assim, ele vai se reproduzindo nas pequenas atitudes do
dia-a-dia, reforçado por nós
mesmos, até que a gente se
vê vítima das mesmas atitudes que tivemos com outros.
Aí a graça acaba.
Houve uma época em que
até mesmo a ciência achava
que a homossexualidade era
uma doença. Esse tempo já
passou. Alguns tiveram coragem de levar isso adiante. Tiveram coragem de gritar “Fluminense!!!” no meio da torcida do Flamengo. A doença,
agora, é outra e se chama
preconceito.
A vida seria tão mais fácil
se a gente não teimasse em
complicá-la, não é? Quem sabe se você não dá uma grande ajuda pensando duas vezes antes de berrar “coisa de
viado” da próxima vez que alguém gritar “Nense” no meio
da torcida do Flamengo.
ESCULTURA DE BRENNAND, DIANA CAÇADORA, 1980
D A N I E L S C H R O E T E R SIMIÃO
DIFERENÇA!
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Edição 23 - Jornal Radcal