O Ministro Geral dos Frades Menores
ÀS IRMÃS POBRES DE SANTA CLARA
11 de agosto de 2005
Caríssimas Irmãs Pobres,
o Senhor vos dê a paz!
Mais uma vez, por ocasião da festa de Santa
Clara, gostaria de chegar até vós para dizer-vos,
antes de mais nada, quanto estais perto do meu
coração e para agradecer-vos por tudo o que
fazeis pela Igreja, pelo mundo e pela nossa
Ordem. Por vós e convosco “rendo graças ao
doador da graça, da qual, como acreditamos,
decorre todo o sumo bem e todo dom perfeito”
porque vos adornou “de tão numerosos títulos
de virtudes” e vos coroou “com as insígnias de
uma tão grande perfeição” (2LAg 3).
Movido pelo profundo amor que tenho por
vós, gostaria de manifestar-vos algumas preocupações minhas, quando penso no significado
da vida das Irmãs Pobres. Como Irmão, que
pede permissão para entrar na vossa vida, vos
pergunto: à distância de um ano da conclusão
do 750° aniversário da morte de S. Clara e da
aprovação da Regra o que permaneceu nas
Fraternidades? Quais são ainda as reflexões e
os conteúdos que dão fundamento ao vosso
ser? Que pistas de busca nos deixou para o
caminho deste terceiro milênio?
As interpelações surgidas desde 1993, aniversário do nascimento de Santa Clara, até hoje
foram múltiplas, também graças aos muitos
estudos que permitiram aprofundar e situar
Clara na justa dimensão histórica, social, cultural, eclesial, religiosa. Tudo isso é precioso,
porém, na medida em que a análise histórica
não paralisa no passado a vida das Irmãs
Pobres, que é chamada sempre a ser evangélica
e, portanto, a viver no presente o hoje de Deus.
Certamente este é um tempo favorável para
que vos re-aproprieis da vossa autêntica Forma
de Vida de Irmãs Pobres, que, me parece, por
várias vicissitudes históricas ainda hoje não
encontrou um adequado lugar na Igreja e talvez nem mesmo na vossa vida. Pergunto-me se
o que estais professando hoje, ou o que neste
tempo estais defendendo, tem a ver com a
Regra de S. Clara e o Evangelho ou não é sobretudo a defesa de estruturas; se estais preocupadas em oferecer aos irmãos e às irmãs espalhadas pelo mundo a espiritualidade original que
deveria definir-vos como Irmãs Pobres.
As vossas Fraternidades são chamadas hoje
a tornar visível a vida evangélica, a serem testemunhas de presenças que aprofundam a sua
existência em Deus. Quanta necessidade há,
neste tempo, de pessoas que, como Clara, com
a sua profundidade de vida, envolvida de silêncio, remetem a Ele.
Há urgência em recuperar a profecia que um
dia foi confiada pelo Espírito a Francisco e a
Clara. A busca pelo sentido da vossa identidade, ligada ao viver o Evangelho, em altíssima
pobreza e em unidade de espíritos (cf RsC 5; Rb
6,4), se é autêntica não vos paralisa, mas pelo
contrário, vos coloca nos caminhos do Espírito.
Como responder hoje ao Senhor e aos
irmãos e às irmãs que vos interpelam? Como
“refundar” a vossa vida ?
A vossa Forma de Vida requer partir sempre
de Cristo, ter sempre o olhar fixo nEle (cf 2LAg
11), para poder encarnar o Evangelho de modo
compreensível aos homens e às mulheres de
hoje. Quando o sinal não diz mais nada, quer
dizer que a estrutura escondeu o rosto de Cristo
e tomou o lugar dos valores a serem encarnados.
A vossa vida não é fuga mundi, mas contemplação das profundezas do amor trinitário,
através do qual aprendeis a arte do amor a
Cristo, entre vós e a todos os irmãos e irmãs que
habitam o mundo. Ainda hoje ressoa forte o
convite de Clara dirigido a Inês: “Põe a tua
mente no espelho da eternidade, põe a tua
alma no esplendor da glória, põe o teu coração
na figura da divina substância...” (3LAg 12-13),
para ser sinal do amor gratuito de Deus pela
humanidade.
Intelectualizar a pertença ao mundo dos
excluídos ou fazê-la coincidir somente com
uma dimensão da vida significa ainda hoje não
tornar visível a intuição que o Espírito confiou
a Francisco e Clara. Quanto mais vos torneis
contemplativas, tanto mais a vossa existência
participa intimamente da história do mundo,
para atestar que é habitada pelo Espírito de
Deus. Ocorrem gestos visíveis que visualizam a
altíssima pobreza, a comunhão fraterna, o cuidado de Deus pela humanidade.
O testemunho de fraternidades reconciliadas
que cultivam o dom da comunhão, que guardam a diversidade e que vivem a unidade, não
como homologação das coisas a fazer, é sinal de
esperança para quem vive no isolamento, é partilha da própria busca de Deus com quem, em
qualquer modo, procura um sentido para a sua
vida.
Sermos hoje encarnados é particularmente
urgente para tornar credível o Evangelho.
Clara, segundo o exemplo de Francisco, se é
somente revestida de Cristo, o Filho de Deus, o
Deus de Abraão, de Isaque, de Jacó e, abraçando a altíssima pobreza, o visualizou no amor
fraterno. Ainda hoje as Irmãs Pobres são chamadas a tornar visível Cristo na existência pessoal e fraterna, para que os homens e as mulheres do nosso tempo sejam atingidos pelo testemunho de pessoas que, com o seu ser, comunicam a esperança.
Concluo pedindo-vos, mais uma vez, de
rezar por mim e por toda a Ordem dos Frades
Menores, que daqui a alguns meses inicia a preparação para a celebração do VIII Centenário
da sua fundação. Pedi por nós e por vós o dom
da iluminação por parte do Senhor para conhecer a sua santa vontade e, ao mesmo tempo,
para que nos dê a força de cumpri-la sempre.
“Permanecei bem no Senhor e rogai por
mim” (1LAg 35). O vosso Ministro e servo vos
abençoa de coração
Fr. José Rodríguez Carballo, ofm
Ministro Geral
Prot. N. 095737
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