Mauro Salles A Revista da ESPM transcreve parte do depoimento gravado por Mauro Salles para o Instituto Cultural ESPM em fevereiro de 2003. Nele, Mauro relata como se deu o início de sua agência, a Mauro Salles Publicidade – hoje Publicis Salles Norton, parte do Publicis Groupe internacional. Este relato, além da contribuição profissional que representa e descreve um grande evento do que chamaríamos hoje de marketing promocional, em plenos anos 60, é, também, de inegável interesse histórico, pelo registro do estado-da-arte da propaganda e das condições sociais e econômicas da época em que nasceu uma das principais agências de propaganda brasileiras. O texto foi transcrito do depoimento de Mauro e passou por pequenas revisões para permitir maior clareza e concisão, sem perda da espontaneidade de um discurso “ao vivo”. (JRWP) 18 Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 Uma lição ainda hoje atual: o lançamento do Itamaraty, o primeiro carro de luxo brasileiro, em 1965 Uma hojeainda atual lição : o lançamento do Itamaraty, o primeiro carro de luxo brasileiro, em 1965 “F oi na época em que era diretor de redação de O Globo – no início dos anos 60 –, eu viajava bastante, sempre com as passagens pagas pela empresa – era um jornal muito sério nessas coisas. Quando minha missão acabava, eu ficava uns dias mais – onde fosse – e comecei a visitar agências de propaganda. Uma das primeiras foi a McCannErickson – presidida por um brasileiro, que era o Armando de Moraes Sarmento, em Nova Iorque – e comecei a interessarme – nos jornais que visitei, nas FOTO SALLES televisões, nas ligações entre os departamentos comerciais com as redações. Quando voltei de uma dessas viagens, tive o meu primeiro job jornalístico-publicitário. O Emil Farhat e o nosso eterno diretor de mídia da McCann, Altino João de Barros, chamaram-me para uma conversa. Eu tinha uma coluna sobre automóveis e aviões n’O Globo – numa revista semanal – para a qual trouxe uma porção de coisas do exterior, testes de carros (fui eu quem os trouxe para o Brasil; o pessoal acha que eu inventei, mas não inventei nada, copiei, adaptei). Havia um redator na Mechanics Illustrated, e o prestígio dele e desses testes era enorme, e fazia tudo na gozação: Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 19 Mauro Salles abrir a porta de um Buick para você não significa nada, mas para um homem de 120 quilos, como eu, isso é importante, você não consegue entrar num Buick de jeito nenhum... Ele fazia essas gracinhas, e eu comecei a fazer as mesmas coisas. Quando fui fazer o teste de um Dauphine, escrevi que a Willis poderia ter tido pelo menos alguma preocupação em ser diferente do Dauphine francês – e não fazer a mesma coisa com aquela caixa de marcha, que parecia uma agulha de tricô num pudim de caramelo, tão solta que ficava... Os caras ficavam furiosos, mas o público gostava. Havia um trabalho a ser feito para a General Motors, um trabalho jornalístico-publicitário, e o Altino me convidou. Eu estava bem precisando de uma grana – eu nunca fui um bom negociador em meu próprio benefício, agora melhorei um pouco – e perguntei quanto ele ia me pagar. Ele perguntou quanto eu queria, e eu disse que ele teria que dizer o preço, fiz um pouco de charme, tinha feito meu calculo, sei lá, de que ia ser dois e aí o Altino ofereceu dez. Nunca tinha ouvido uma oferta daquele tamanho; ele ficou com medo que eu fosse negar e subiu para quinze – eu aceitei logo, antes que mudassem de idéia! Foi assim que descobri que havia um mercado, na propaganda – e que nesse mercado pagava-se bem. Aí, houve um outro momento, quando a Alcântara Machado perdeu a conta da Volkswagen para a Proeme (do nosso Otto Scherb). O José de Alcântara Machado estava arrasado... Mesmo assim, conseguiu, através das boas rela20 “Eu tinha uma coluna sobre automóveis e aviões n’O Globo.” ções que tinha com o Corduan e o Schulz-Wenke [presidente da VW], manter uma conta que não existia, pois ficou com a “conta institucional”. O resto foi para a Proeme. O Alex e o Corduan me convidam para tomar um drinque no Bar do Jaraguá, que era uma espécie de sede institucional do Otto Scherb e do Corduan – onde tomavam uns uísques. Disseramme o seguinte: “Temos a conta institucional, precisamos dar uma qualidade diferente e vamos fazer um projeto. Queríamos que nos ajudasse a recuperar a outra parte da conta, você topa?” Eu disse: “Topo, mas só tenho livre um dia por semana” Minha folga era na quarta-feira. “Então eu vendo para vocês a quarta-feira, pego o primeiro vôo, das seis e meia da manhã, e volto no último, “Nunca fui um bom negociador em meu próprio benefício, agora melhorei um pouco.” Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 que é o das onze da noite, trabalho o dia todo na Alcântara Machado”. Fui conhecendo as pessoas, vendo como se fazia plano, havia cópia de um plano da Chevrolet... Fui apresentado, no dia seguinte, ao Alfredo Carmo – tinha também um francês, ótimo, era genro do que ia ser Ministro da Fazenda do Paraná. Ah, e tinha aquele, que foi planejador na Alcântara Machado, durante muitos anos, o Helio Silveira da Mota, e eu fiquei impressionado com a qualidade dos três. “Se é para ser o redator e o coordenador disso, eu entro.” Eu estava precisando trocar o apartamento que tinha, de dois quartos, por um de quatro quartos, e não tinha o dinheiro. Então fiz a conta de quanto precisava para o apartamento, eram sete meses, ia comprar meu apartamento... E fiz o tal trabalho para ser apresentado ao Juan Corduan, que dirigia as comunicações da Volkswagen – desse trabalho, eu até hoje guardo cópia. Era um plano formidável, não só para aparte institucional, mas para a parte de produto, e tive opurtunidade de dizer ao Schulz-Wenke, ao insistir que ele tinha que assistir a apresentação, não só a da conta institucional, mas da conta de produto também. Para encurtar a história, não só foi aprovado, como a conta voltou toda para a Alcântara Machado – e eu virei herói. As pessoas têm pouca lembrança do José de Alcântara. Dizem: “Ah, não era publicitário, não, era só um lobista...” O José de Alcântara foi um coordenador formidável, um homem que sabia delegar, tinha a visão de buscar as pessoas certas. A gente não Uma lição ainda hoje atual: o lançamento do Itamaraty, o primeiro carro de luxo brasileiro, em 1965 pode deixar de dar a ele uma importância muito grande na propaganda brasileira, porque tratou essas coisas com absoluto profissionalismo. Mexia comigo, dizia que eu o estava explorando... Inventei coisas diferentes também. Por exemplo, o SchultzWenke não era conhecido no Rio. Produzi uma festa para ele, no Country Club, veio toda a sociedade carioca, ele conheceu todo mundo, autoridades que ainda moravam no Rio... Mas a festa ficou mais famosa porque nela entrou um penetra fantástico, era um “penetra profissional” – muito inteligente – que penetrava as festas do Rio, mas ninguém dava muita bola para ele. Estavam querendo expulsar o penetra e eu disse: “Convida ele para a sua mesa, vai dar notícia...” O Schulz convidou o penetra para a mesa, o penetra aceitou, mas pediu que nunca se repetisse aquilo, na vida dele, porque desmoralizava a profissão de penetra. Ele podia ter a sua carreira prejudicada por causa disso. Aquela consagração estava absolutamente contra as regras éticas da profissão que ele adotara. Era penetra em batizados, casamentos, alguns funerais e de todas as festas, desde que o menu e o local o agradassem. Era sinal de prestígio, a festa em que tentava penetrar... Aí, evidentemente, eu já estava encantado com a propaganda. Começou a fase final de montagem da TV Globo. Mas, pouco tempo depois da inauguração, surgiu uma nova oportunidade. Na minha função de cronista de automóveis, eu tinha uma ligação muito grande com os Capa da revista Manchete de dezembro de 1965 presidentes das empresas: eu fui amigo do Schulz-Wenke do Max Pearce, do Alfred Jurzykowsky, que era o homem da Mercedes, e eu batizava nomes de carros; fui eu quem criou o nome “Descobri que havia um mercado, na propaganda – e que nesse mercado pagava-se bem.” Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 21 Mauro Salles Interlagos; criei o nome Jangada para a Simca... Quando a Volkswagen e a Willis, para atender ao pedido da Caixa Econômica, de fazer um carro barato, sem frisos, sem nada, eu batizei os dois: chamei o Volkswagen de “Pé de Boi” e o Dauphine de “Teimoso” – eu me divertia com essas gracinhas. Ajudei a batizar de “Candango”, o jeep da Vemag, também do Toledo Piza. Foi quando o Max Pearce me chama, como cronista de automóveis – pois continuava escrevendo – para mostrar como iria ser o novo Aero Willis Luxo. Isso foi em agosto de 65 – e o carro ia ser lançado em novembro. Ele me mostrou o carro, o estilo, e depois ia mostrar a campanha da Norton, para o lançamento. Isso foi antes do almoço. Naquele tempo, costumava-se dizer que as fábricas de automóveis eram restaurantes cercados de linhas de montagem por todos os lados. O restaurante da Willis era muito bom, o da Volkswagen ainda melhor (não tinha caviar, mas tinha umas coisas interessantes, tinha gente finíssima, o Euclides Aranha, Paulo Quartim Barbosa). Quando acabou, eu fui para a fábrica e, no almoço, perguntaram: “O que é que você achou?” Respondi: “Acho que vocês estão dando um furo na água, vocês não entendem nada, nem daquilo que vocês representam.” Nos Estados Unidos, quando se fazia um carro com up-grade, a lição que a gente aprendeu lá era mudar o nome, ou seja, você tem o Ford e o Mercury – o Mercury é um Ford melhorado. Você tem o Plymouth e o Packard, o Packard é um Plymouth piorado.... Você tem o 22 “O restaurante da Willis era muito bom, o da Volkswagen ainda melhor.” Chevrolet e o Pontiac. Então, continuei: “não há como vocês chamarem isso de Aero Willis, que, hoje, é o carro do povão, do motorista de táxi. O que vocês estão querendo – já que existem esses obstáculos à importação – é um carro de luxo, que vai custar mais caro, para atrair gente mais luxuosa. Você não vai poder dizer “o meu é um Aero Willis que não é um táxi”. Tem que mudar o nome desse troço. Quando quiseram mostrar a campanha, eu disse: “Nem me mostrem a campanha da Norton, porque a campanha vai estar errada porque o nome está errado.” É evidente que o Sr. Frank Erdmann – que depois veio a ser vice-presidente mundial da Ford, foi Presidente da Ford Austrália, da Ford Japão, um craque – fez aquilo que americano faz: “Ah, é? Então diz como é que tem que ser.” Eu: “Você me dá uma semana e trago um projeto para esse carro. Com uma condição: estou querendo sair da TV Globo – porque o Dr Roberto Marinho é uma pessoa que não entende as coisas. Eu ofereci a ele uma “Era um ‘penetra profissional’ – muito inteligente.” Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 oportunidade formidável de ser meu sócio, de eu entrar de sócio na TV Globo, e ele disse que os únicos sócios que ele tem lá são os três filhos, os dois irmãos e o Dr. Herbert Moses, que foi companheiro do pai dele ao fundar O Globo. Como poderia ter o Mauro Salles de sócio? “Então, Dr. Roberto, estou, a partir desse momento, liberado, porque vou sair da TV Globo.” Ele perguntou: “Você vai fazer um Jornal?” “Não há a menor condição, não tenho dinheiro nem espaço para fazer um jornal; não vou fazer uma revista e muito menos fazer uma TV ou uma rádio, mas vou procurar fazer uma empresa de comunicação – ou um agência de notícias – ou uma agência de propaganda.” “Mas você nunca fez propaganda...” Eu disse: “Vou tentar.” Ele riu. Então eu disse ao pessoal da Willis: “Em uma semana eu trago o projeto. Mas, se vocês o aprovarem, eu quero toda a conta da Willis Overland do Brasil, para abrir uma agência.” Riram bastante, acharam ótimo e fecharam. Naquele tempo, uma coisa muito importante, no Brasil, era a escolha das “Dez mais Elegantes”, uma promoção do [cronista social] Ibrahim Sued. Ele tinha sido de O Globo – mas foi para o Diário de Notícias, era o Ibrahim Sued, do Diário de Notícias e Manchete. No fim do ano ele apresentava As Dez mais Elegantes, num grande jantar. Uma lição ainda hoje atual: o lançamento do Itamaraty, o primeiro carro de luxo brasileiro, em 1965 Havia ícones, por exemplo, como o “Casal Vinte”. Em paralelo, havia “Os Dez mais Elegantes”, e a Dona Tereza de Souza Campos e o seu marido – “Didu” – ambos faziam parte dos dez mais elegantes, eram o Casal Vinte. Se naquele tempo houvesse a revista Caras, eles viveriam em festa permanente... Aí eu fui ao Ibrahim, disse que a festa dele era uma festa furreca e propus fazer a maior “Dez mais Elegantes” do mundo. “Não. Você vai querer interferir.” “Não vou interferir em nada, você escolhe as dez mais elegantes, eu vou lançar um carro nesse dia. A gente faz uma festa, os americanos é que vão pagar, a gente manda eles se esconderem porque eu não quero eles nas fotos...” Aqueles americanos usavam aqueles sapatos que a gente chamava de “esmaga sapo”, são os únicos sapatos que têm corrimão, ou então que têm platibanda; são feios, você vai pôr os caras na primeira fila, só porque estão pagando? Eu quero ver é a Ilde Caravaglia, as moças, as senhoras bonitas. “Não se preocupe. A gente esconde eles, faz uma baita festa, faz um leilão do carro 001 em benefício de alguma coisa, faz as fotografias delas e o nome que eu vou sugerir, Ibrahim, é ITAMARATY, com Y, porque com I é cafona, e aí vamos fazer esse Itamaraty ser apresentado nas fotografias das Dez mais elegantes, no Palácio Itamarati”. O Itamarati não era mais o Ministério das Relações Exteriores que já tinha ido para Brasília, mas ainda era uma Delegacia do Ministério das Relações Exteriores. Imediatamente eu pedi o registro da marca “em nome e por conta” da Willis Overland do Brasil, mesmo sem ter a procuração deles, eu registrei a marca em seu nome. O Ibrahim topou e nós fomos chamar o “Uma coisa muito importante, no Brasil, era a escolha das ‘Dez mais Elegantes’.” fotógrafo, o Francisco Albuquerque, que era um fotógrafo de propaganda – Chico Albuquerque – ele estava no Ceará. Eu disse ao Chico que ele iria fotografar as Dez mais elegantes, no Itamarati. Vai sair na capa da revista Manchete e vamos fazer o seguinte: vamos pegar uma instituição (que no caso foi a AACD do Rio de Janeiro) para a qual irão a renda da festa, a renda do leilão e os cachês das 10 mais elegantes, que vão posar ao lado do carro; vamos fazer um cachê uniforme, todas elas receberão a mesma coisa. Fiz apenas um pedido ao Ibrahim: que colocasse uma Princesa. Ele foi contra, mas Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 23 Sra. Gustavo Capanema Filho Mauro Salles eu argumentei que ele não estava vendo as princesas com o devido olhar, etc., insisti. Para encurtar a história, ele próprio se lembrou da Dona Fátima de Orleans e Bragança, que não era exatamente uma senhora bonita, mas era uma senhora muito elegante, que topou. Todas toparam. Então, volto para a Willis na semana seguinte – já tinha convidado e fizeram parte desse meu pré- 24 projeto o Manoel Leite e o Bias de Faria. Foram os dois que “Mas você nunca fez propaganda...” Eu disse: ‘Vou tentar.’ Ele riu.” Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 participaram comigo do projeto e me assessoravam. Um pouco indiretamente, o Nemércio Nogueira, que já trabalhava em relações públicas e era meu amigo. Fui à Willis apresentar o projeto na semana seguinte, fui sozinho, e tinha 8 pranchas, não tinha nada mais que isso, foi aprovado na hora e com aplausos. Um amigo do Manuel Leite havia feito os leiautes. Então, o que aconteceu? Eu trouxe essa coisa e fiz uma proposta mercadológica: “Vocês estão querendo vender, desse “Aero Willis Luxo”, 300 unidades-mês”. A marca vendia 3.000 unidades-mês, portanto eles queriam um acréscimo de 10%. “A diferença de preço que estava prevista por vocês era – sei lá – uns 15%. Pois eu tenho duas propostas: primeira, elevem esse objetivo para 500, segundo, vão aumentar o preço do carro. Mas tudo que vocês chamaram de “opcional” passa a ser obrigatório; quer dizer, todos terão de ter banco de couro verdadeiro, todos terão de ter rádio, terão ar condicionado e todos terão de ter banda branca. Isso vai aumentar X por cento, mas o preço, aí vocês têm de elevar para mais de 25% a diferença. Foi a única coisa em que eles começaram a brigar; eu assisti à briga, mas o diretor comercial da Willis me disse que fazia sentido. A mecânica do que aconteceu foi a seguinte – em linguagem técnica, há uma expressão que é “Ec-Profit”, Economic Profit, ou seja, o lucro econômico da linha Willis subia assustadoramente com a nova linha. Aí o Sr. Max Pearce resolve fazer o sumário e Uma lição ainda hoje atual: o lançamento do Itamaraty, o primeiro carro de luxo brasileiro, em 1965 “Fiz apenas um pedido ao Ibrahim: que colocasse uma Princesa. Ele foi contra.” diz: “Olha Mauro, tá bem, a conta do Itamaraty é sua, e você vai abrir essa agência, você conversa com o Murray – que era o diretor financeiro – para ver como faz isso, eu lhe dou uma carta....” Então eu disse: “Um momento. Estou dando para vocês de presente essa campanha; vou escrever nesse papel o telefone do Ibrahim Sued, mas eu não estou mais no projeto.” “Por quê?” “Porque eu quero a conta toda, eu só saio da TV Globo para abrir uma agência que tenha toda a conta da Willis...” “Mas Mauro, a Norton nos presta um bom serviço...” “Não quero saber se presta um bom serviço ou um mau serviço, estou querendo saber se vocês querem apostar no futuro ou no passado.” Levaram 4 dias brigando, tentando me convencer a ficar só com uma parte da conta; no quinto dia vieram perguntar quanto eu ia precisar. Eu disse: “Nada, só preciso que vocês concordem em ser sócios com 20%. Quero criar a empresa e, na escritura, quero por – sócios: Mauro Salles, Luiz Sales, Apolônio Salles, com 80% e a Willis-Overland do Brasil S/ A, 20%. Vamos fazer um “capital cacareco”; todos integralizam, ou seja, eu integralizo esse capital cacareco e vocês também – eram 10.000 dólares esses 20% – e vocês designam um diretor, a empresa – a sociedade, limitada – vai ter só três diretores: eu, Luiz e um diretor da Willis. E eles indicaram o diretor jurídico da Willis, que era o Prof. Flavio Monteiro de Barros, jurista, um sujeito formidável, que é meu amigo até hoje. Aí peguei essa coisa, fui ao banco e disse: “Eu tenho isso, tenho esta carta que me dá a conta e agora eu quero dinheiro emprestado”. O lançamento do Itamaraty foi um grande sucesso, com um detalhe interessante: foi quase tudo promoção; fizemos apenas um anúncio convencional. Assim nasceu a Mauro Salles, que, no primeiro ano, não dava tempo de montar do zero; então comprei o controle de uma agência que pertencia ao Carlos Cavalcanti, e incorporei o Carlos Cavalcanti ao time; nós começamos a operar no segundo semestre de 1965, para montar essa festa e lançar o carro, através dessas outras empresas, e a “O lançamento do Itamaraty foi um grande sucesso, com um detalhe: foi quase tudo promoção; fizemos apenas um anúncio convencional.” As dez mais elegantes de 1965 Ibrahim Sued foi buscar as suas “Dez Mais” de 1965 na nobreza, na diplomacia e no “top set” de Paris, Rio e São Paulo. A lista inclui as Senhoras Carmem Solbiati Mayrink Veiga, Marjorie Mesquita, Angelina Muniz de Sousa, Andrea Moroni, Princesa Dona Fátima de Orleãs e Bragança, Embaixatriz Teresa Castelo Branco, Sílvia Amélia Marcondes Ferraz, Ana Luísa Capanema, Teresa Sousa Campos e Josefina Jordan. Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 25 Mauro Salles “Não façam Embaixatriz Antônio Castelo Branco isso, porque essas pessoas não me conhecem, eu vou tentar conquistálos.” Mauro Salles nasceu mesmo em 1966, quer dizer, juridicamente ela nasceu, fez as fusões, etc., e de lá para cá não havia um único ano em que ela não tivesse lucro, administrado, certificado. Depois ela cresceu bastante e fez a primeira fusão importante do mercado brasileiro, quando se fundiu com a Inter-Americana... 26 Gostaria de acrescentar só mais um ponto. Quando a agência nasceu, e foi quando a Willis tirou a conta da Norton, pessoas como Rodolfo Lima Martensen, da Lintas, David Monteiro, da Multi e o próprio Geraldo Alonso – que eram pessoas sérias – ficaram revoltados. A APP, a ABAP e o Sindicato das Agências emitiram uma nota esculhambando a Willis: “Evidentemente, o anunciante tem todo o direito, mas tirar de empresas que são especializadas, para um profissional que, por mais destaque que tenha tido, etc. e tal, é um “advena” na Propaganda” – foi a expressão que usaram. Mais três parágrafos mencionavam a necessidade de o mercado proteger-se contra os “arrivistas” da profissão. Quando saiu o comunicado, o diretor jurídico da Willis, que era o Sergio Junqueira, e o Max Pearce me “Rodolfo Lima Martensen, da Lintas, David Monteiro, da Multi e o próprio Geraldo Alonso – que eram pessoas sérias – ficaram revoltados.” Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 Uma lição ainda hoje atual: o lançamento do Itamaraty, o primeiro carro de luxo brasileiro, em 1965 “O Geraldo, ser seu amigo.” “Então, tá bem”, ele disse. E o Geraldo acabou sendo um grajde amigo meu, a vida toda. acabou sendo um grande amigo meu, a vida toda.” chamaram, que iam dar uma resposta pública. Mas eu pedi: “Pelo amor de Deus, não façam isso, porque essas pessoas não me conhecem; eu vou tentar conquistá-los. Vocês vão ver – eu ainda serei presidente dessas entidades todas, não atrapalhem!” E eu vim a ser presidente de todas essas entidades. O mais sério é que o Geraldo Alonso me chamava de “Pistoleta”: “Esse Pistoleta me tomou a conta.” Me espinafrava toda vez que eu encontrava com ele. Um dia, finalmente, convidei-o para um almoço, que ele não queria aceitar, e disse: “Olha aqui, Geraldo, você é uma pessoa séria, uma pessoa que eu admiro, você está no mercado e eu estou também; todo o seu ressentimento, eu entendo, mas é negócio. Então você pode tentar não ser meu amigo por muito tempo, até você cansar, porque eu faço questão de Carmen Mayrink Veiga “Nem me mostrem a campanha da “ Norton, porque a campanha vai estar errada.” Quem éo autor * Mauro Salles – é um dos mais conhecidos e respeitados profissionais de Comunicação do Brasil. Participou da fundação da TV Globo e fundou a mauro Salles Propaganda em 1965. Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003 27 Mauro Salles 28 Revista da ESPM – Maio/Junho de 2003