A dinâmica da Metrologia: Atualização, Confusão, Enriquecimento e Reflexão Prezados leitores, este artigo pode ser encarado como uma colcha de retalhos, no qual se discute atualização, confusão, enriquecimento e reflexão sobre alguns conceitos e práticas em Metrologia, com algumas peculiaridades na área de Química Elcio Cruz de Oliveira A tualização Os termos metrológicos estão definidos e unificados na língua portuguesa (Brasil e Portugal), disponíveis no Vocabulário Internacional de Metrologia – Conceitos fundamentais e gerais e termos associados [1]. Calibração nada mais é do que comparação dos valores entre instrumento padrão e objeto a ser calibrado. O termo Aferição não faz parte da Metrologia Científica e sim da Metrologia Legal; já o termo verificação pode ser considerado como uma comparação simplificada, uma boa prática aconselhável entre calibrações. Validação é uma verificação na qual os requisitos especificados são adequados para um uso pretendido. Toda validação é uma verificação; entretanto, nem toda verificação é uma validação. Nas versões anteriores do VIM, se falava no termo VVC, valor verdadeiro convencional, o qual caiu em desuso. Atualmente, tem-se o valor verdadeiro como o valor de uma grandeza sendo considerado único e, na prática, impossível de ser conhecido. Já o valor convencional é estabelecido por um acordo, como por exemplo, a aceleração da gravidade. Precisão pode ser quantificada numericamente e especificada sob de condições de repetibilidade, precisão intermediária e reprodutibilidade. A repetibilidade (a primeira versão do VIM, no Brasil, falava em repetibilidade, sendo que desde 1995 passou a ser repetitividade, voltando em 2012 para repetibilidade) é quando não se tem variação de parâmetros (tempo, operador, máquina e laboratório). A reprodutibilidade é quando se tem variação de todos os parâmetros, somente ocorrendo entre laboratórios diferentes, como por exemplo, em um plano interlaboratorial. Quando se varia um ou mais parâmetros, dentro do mesmo laboratório, tem-se a precisão intermediária. Curva analítica é o nome sugerido pela IUPAC para substituir o termo curva de calibração, dentro de um laboratório que não está acreditado para calibrações. Material de referência certificado (MRC) deve ser utilizado para calibrações, avaliações de incerteza e etapas da validação que requeiram medições exatas; já material de referência (MR) pode ser utilizado para ensaios de precisão. Entretanto, é uma boa prática metrológica, que se avalie o equilíbrio entre custos, riscos e possibilidades técnicas no momento de se escolher entre um MRC ou MR. Partes por milhão (ppm) é uma notação adimensional e, portanto, só pode ser utilizada como unidade de medida de concentração, equivalente a mg/L, em solução aquosa de baixa concentração, com densidade igual a da água (1000 kg/m3), pois neste caso um litro de solução tem massa igual a 1000 gramas, podendo-se considerar 1 mg/L = 1 mg/1000 g = 1 g/1000000 g = 1 ppm. Incerteza de medição é um parâmetro não negativo que caracteriza a dispersão dos valores atribuídos a um mensurando, com base nas informações utilizadas. Com isto, a incerteza de medição, quando não acompanhada pela grandeza é dada em módulo. Exemplo: Resultado da medição = 100 ± 1, cuja incerteza é 1. Confusão Normas são documentos aprovados por uma instituição reconhecida, que preveem, para um uso comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para os produtos ou processos e métodos de produção conexos, e cuja observância não é obrigatória e sim voluntária; ao contrário dos regulamentos que são compulsórios. Dentro da Metrologia, o escopo normativo da certificação/acreditação, às vezes, pode criar confusões. Na Figura 1, apresentam-se quatro normas dentro deste cenário. Figura 1 – Escopo simplificado de algumas normas Todo Ensaio de Proficiência é uma Comparação Interlaboratorial; entretanto, nem toda Comparação Interlaboratorial é um Ensaio de Proficiência. Pode-se dizer que quando uma Comparação Interlaboratorial tem a finalidade de avaliar o desempenho de um laboratório, recebe o nome específico de Ensaio de Proficiência. Exatidão de medição não é uma grandeza, não lhe é atribuído um valor numérico e sim qualitativo. Em Química Analítica, a característica de desempenho Recuperação é muito utilizada para expressar de forma quantitativa a exatidão [2]. Para grandezas físicas, tendência é a estimativa numérica do erro sistemático. Analistas químicos normalmente utilizam o branco analítico em suas análises, mas raramente esta fonte de incerteza é avaliada. Embora o valor numérico deste branco, em algumas situações, seja desprezível, a contribuição de incerteza nem sempre é [3]. Enriquecimento São poucos casos em Química Analítica, que as correlações entre grandezas de entrada são consideradas. Os exemplos clássicos estão na construção de curvas analíticas. Na construção destas curvas com padrão externo, os coeficientes de uma regressão linear a e b são correlacionados. Na padronização interna, além desta correlação citada, ainda se tem outra numericamente negativa, entre a área do analito e a área do padrão interno, o que minimiza a incerteza de medição, aumentando a confiabilidade do resultado [4]. Curvas analíticas são normalmente obtidas, a partir de dados discretos, por regressão, utilizando-se o método dos mínimos quadrados ordinários. Entretanto, quando se tem um erro considerável em ambos os valores de x (concentração) e y (sinal), esta técnica deve ser cuidadosamente avaliada. O uso de regressão ortogonal (ODR) é uma boa alternativa, a qual leva em consideração erros que são significantes no eixo x; ou seja, quando uma curva analítica não é construída por um MRC (erros desprezíveis perante o sinal) [5]. A literatura descreve vários procedimentos baseados em princípios estatísticos para validar se o grau de concordância entre os resultados produzidos por analisadores em linha e de bancada são satisfatórios. Entretanto, todos estes procedimentos consideram que os dados têm distribuição normal, o que nem sempre é verdadeiro. A Tabela 1 descreve a correspondência entre estes testes. Tabela 1 – Comparação entre testes paramétricos e não-paramétricos [6] Reflexão Em uma regressão linear não ponderada, a partir de pontos de dados da curva de calibração e para números de medições para determinar , a incerteza padrão em, onde , é geralmente calculada a partir da equação (1), sendo é o desvio padrão residual do ajuste linear. Esta equação parece mágica; entretanto, a incerteza padrão apresenta exatamente o mesmo valor do que quando calculada pela expansão da série de Taylor, levando em consideração que os coeficientes angular e linear da regressão são correlacionados, equação (2). Assim sendo, discordo da Referência [7], ao dizer que a Equação (1) e suas variações são apenas formas simplificadas de estimar a incerteza, pois não consideram os efeitos de correlação entre os coeficientes da reta a e b. Outra questão para reflexão são os requisitos de um profissional para trabalhar na área de Metrologia, que está longe de alguma padronização: • Team Leasing Brasil - Itupeva – SP: Irá atuar com medidas e demais atividades pertinentes ao cargo. Formação Acadêmica: Necessário curso técnico em Desenho Mecânico. • Curitiba – PR: Anúncio nº: 1002677. Para trabalhar na empresa: PH RECURSOS HUMANOS LTDA Escolaridade mínima: Superior Incompleto. • Eusébio – CE: Efetuar ensaios e leituras nos laboratórios de metrologia com massa, volume, temperatura e ensaios especiais. Experiência: Conhecimentos da norma 17.025 e ISO 9000. Salário: A combinar. • Engenheiro Metrologista. Rio de Janeiro – RJ. Concurso para o Inmetro: • Analista Executivo em Metrologia e Qualidade & Pesquisador – Tecnologista em Metrologia e Qualidade: Requisitos: diploma, devidamente registrado, ou certificado de conclusão de curso de graduação plena de nível superior. • Assistente Executivo em Metrologia e Qualidade & Técnico em Metrologia e Qualidade: Requisitos: diploma, devidamente registrado, ou certificado de conclusão de curso de graduação de nível médio completo / educação profissional técnica de nível médio. Esta última reflexão permeia a formação acadêmica. Acredito que uma das principais razões para reprovação e desinteresse, principalmente na graduação, em Matemática (cálculo e álgebra) e Estatística, ferramentas essenciais na confiabilidade metrológica, é a dicotomia entre a disciplina e aplicação prática, apenas com exemplos teóricos. Através da Tabela 2, é possível vermos tais associações. Tabela 2 – Ferramenta matemática e aplicação prática Como é possível se observar, os conceitos e práticas metrológicas são bastante dinâmicos, gerando dúvidas entre os stakeholders da Metrologia. O caráter trans e multidisciplinar desta área dificulta a consolidação desta expertise. Assim sendo, acredito que urge a necessidade de se regulamentar o profissional de Metrologia no país, (r)estabelecendo requisitos mínimos para a sua capacitação, com ênfase em áreas específicas. Referências [1] Vocabulário Internacional de Metrologia – Conceitos fundamentais e gerais e termos associados (VIM 2012). 1a edição luso-brasileira do VIM 2012 (JCGM 200:2012). [2] Oliveira, EC. Critical Metrological Evaluation of Fuel Analyses by Measurement Uncertainty. Metrol. Meas. Syst., 2011, Vol. XVIII, No. 2, pp. 235–248. [3] Oliveira, EC et al. Impact of the Analytical Blank in the Uncertainty Evaluation of the Copper Content in Waters by Flame Atomic Absorption Spectrometry. Journal of AOAC International, 2012, Vol. 95, No. 2, pp. 560–566. [4] Oliveira, EC et al. Internal Standard versus External Standard Calibration: an Uncertainty case of a Liquid Chromatography Analysis. Quim. Nova, 2010, Vol. 33, No. 4, 984–987. [5] Oliveira, EC; Aguiar, PF. Least Squares Regression with Errors in Both Variables: Case Studies. Quim. Nova, 2013, Vol. 36, No. 6, pp. 885–889. [6] Oliveira, EC et al. Validação de Analisadores de Processo – Implantação de Novos Procedimentos na PETROBRAS, VII Congresso Rio Automação, 2013. [7] RM 68 – Incerteza de Medição: Guia Prático do Avaliador de Laboratórios. Rede Metrológica RS Revisão: 05 abr/2013. Elcio Cruz de Oliveira é consultor técnico da Petrobras Transporte S.A., do Departamento de Pós-Graduação em Metrologia para Qualidade e Inovação, PUC-Rio.