ANA CAROLINE NERES CASTRO ATENAS BRASILEIRA X BABILÔNIA DE EXÍLIO: uma análise sobre a decadência intelectual do Maranhão (1894 – 1932) São Luis 2007 ANA CAROLINE NERES CASTRO ATENAS BRASILEIRA X BABILÔNIA DE EXÍLIO: uma análise sobre a decadência intelectual do Maranhão (1894 – 1932) Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, para obtenção do grau de Licenciado em História. Orientadora: Profª. Ms. Maria de Lourdes Lauande Lacroix São Luis 2007 CASTRO, Ana Caroline Neres Atenas Brasileira X Babilônia de exílio: uma análise sobre a decadência intelectual do Maranhão (1894-1932) / Ana Caroline Neres Castro. – São Luis, 2007. - f. Monografia (graduação em História) – Universidade Estadual do Maranhão, 2007. 1.Decadentismo 2.Academia 3.Mito 4.Status I. Título CDU: 94 (81) “1894/1932" ANA CAROLINE NERES CASTRO ATENAS BRASILEIRA X BABILÔNIA DE EXÍLIO: uma análise sobre a decadência intelectual do Maranhão (1894 – 1932) Monografia apresentada ao Curso de História da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, para obtenção do grau de Licenciado em História. Orientadora: Profª. Ms. Maria de Lourdes Lauande Lacroix Aprovado em ___/___/___. BANCA EXAMINADORA ______________________________________________________________________ Profª. Ms. Maria de Lourdes Lauande Lacroix Orientadora ______________________________________________________________________ Profº. Ms. José Henrique de Paula Borralho ______________________________________________________________________ Profª. Ms. Elizabeth Sousa Abrantes Aos meus pais, Raimundo e Expedita Castro. AGRADECIMENTOS A Deus, pelo cuidado e amizade sincera ao longo desses vinte e três anos. Aos meus pais, pela presença constante, amor, dedicação e apoio irrestrito durante todo o período de elaboração deste trabalho. Amo Vocês! À minha irmã Ana Carolina, por ter me aliviado das tarefas domésticas. Valeu! À minha Sobrinha Ana Beatriz, pelos momentos de distração proporcionados pela inocência dos seus quatro anos de idade. A João Bispo (namorado), pelo envolvimento direto na elaboração deste trabalho, pela boa companhia, cumplicidade, amor, incentivo e paciência nos momentos mais difíceis. Amo-te ! A Profª. Lurdinha, minha orientadora, minha mestra. Obrigada pelas conversas e conselhos, pelo apoio, pela disponibilidade, pelo carinho e pela amizade. Obrigada por acreditar em mim, mas do que eu mesma. Amo Você!! Ao Profº. Marcelo Cheche, pelo exemplo de profissionalismo que me ensinou preciosas lições. Tenho imensa admiração por você! Ao Profº. Henrique Borralho, pelas contribuições para a realização deste trabalho, pelas aulas dinâmicas recheadas de conhecimento. Você é o cara! À Profª. Elizabeth Abrantes, pela disposição e pelas aulas maravilhosas. Você é uma fonte de inspiração! Aos professores Alan e Helidacy, pelo carinho e pelo convívio durante estes cinco anos. Tenho imenso apreço por vocês! Aos professores Ximenes e Júlia Constança pelo convívio e pelas contribuições para a minha formação acadêmica. Ao Profº. Fábio Monteiro, a quem pouco tempo de convívio foi necessário para demonstrar sua competência. Obrigado pelo carinho e compreensão demonstrados a mim em momentos importantes, talvez até sem perceber. À professora Adriana Zierer, pelas contribuições importantes para a minha formação acadêmica. Ao Profº. Paulo Rios, que apesar do pouco tempo de convívio, foi o suficiente para deixar marcas indeléveis de conhecimento. Aos profissionais da secretaria do Curso de História, pela prestimosidade no atendimento. Aos colegas de todos os períodos que tive oportunidade de conhecer. À Edyene e Eloy, pelas contribuições imprescindíveis que me auxiliaram na confecção deste trabalho. Aos colegas que tive o prazer de conhecer e que fizeram destes cinco anos de estudos uma grande aventura repleta de experiências inesquecíveis. Entre eles: Esmênia e Sandro, Edyene, Eloy, Lívio Bruno, Rafael e Glêdson Cardoso. (...) Ah! Se os novos escritores não pensassem na Academia, se eles por sua vez a matassem em suas almas, que descortino imenso para o magnífico surto do gênio, enfim liberto de mais esse terror. Esse ‘academicismo’ não é só dominante na literatura. Por ele tudo o que a nossa vida oferece de enorme, de esplêndido, de imortal, se torna medíocre e triste. (Graça Aranha) RESUMO O Decadentismo intelectual (1894-1932) cantado e decantado pelo grupo de intelectuais denominados Novos Atenienses, não deve ser entendido simplesmente como uma tendência natural, um determinismo causado pelo abandono dos intelectuais que partiram para outras regiões do país em busca de novas perspectivas. A afirmação constante daquela condição decadente pode ser entendida como uma construção ideológica fomentada por um grupo de intelectuais que buscavam afirmação no concorrido cenário das letras. A utilização do Decadentismo justificava a fundação de várias agremiações entre elas a Academia Maranhense de letras que tinha por missão, resgatar o Maranhão daquela triste condição. Busca-se, neste trabalho, revelar as estratégias empregadas pelos neoatenienses na incansável corrida pelo status de homens de letras, tomando como objeto de estudo a Academia Maranhense de Letras, associada à contextualização econômica política e social. Palavras-chaves: Decadentismo. Academia. Mito. Status. RÉSUMÉ Le Décadentisme intellectual (1894-1932) chanté et célébré par le groupe d’intellectuels nommés Nouveaup Atheniéns, ne doit pas être vu seulement comme une tendance naturelle, um déterminisme causé par l’abandon des intellectuels qui partirent vers d’autres régions du pays à la recherche de nouvelles perspectives. L’ affirmation réitérées de cette condition décadente peut être comprise comme une construction idéologique suscitée par un groupe d’intellectuels qui cherchaient une affirmation sur la scène recherchée des lettres. L’utilisation de Décadentisme justifiait la fondation de divers associations, entre autres de l’Académie Maranhense des Lettres qui avait pour mission de récupérer lê Maranhão de cette triste condition. Dans ce travail on cherche à révéler les stratégies employées par les nouveaux athéniens dans cette course sans fatigue au status des hommes de lettres, prenant comme objet d’étude l’Académie Maranhense de Lettres, associée au contest économique, politique et social. Paroles-clés: Décadentisme. Academie. Mythe. Status. LISTA DE TABELAS Tabela 1 Quadro de membros efetivos da Academia Maranhense de Letras em 1920.............................................................................................................. LISTA DE ILUSTRAÇÕES 1 Salão de alvejamento..................................................................................................Anexo 2 Salão de tecelagem.....................................................................................................Anexo 3 Rua do Sol..................................................................................................................Anexo 4 Teatro São Luis...........................................................................................................Anexo 5 Arredores da cidade....................................................................................................Anexo 6 Praça João Lisboa.......................................................................................................Anexo 7 José Ribeiro do Amaral..............................................................................................Anexo 8 Clodoaldo Freitas........................................................................................................Anexo 9 I. Xavier de Carvalho..................................................................................................Anexo 10 Barbosa de Godóis....................................................................................................Anexo 11 Godofredo Viana......................................................................................................Anexo 12 Antonio Lobo............................................................................................................Anexo 13 Fran Paxeco..............................................................................................................Anexo 14 Alfredo de Assis.......................................................................................................Anexo 15 Vieira da Silva..........................................................................................................Anexo 16 Astolfo Marques.......................................................................................................Anexo 17 Domingos Barbosa....................................................................................................Anexo 18 Corrêa de Araújo.......................................................................................................Anexo SUMÁRIO INTRODUÇÃO..................................................................................................................13 1 UM BREVE RETROSPECTO: O MARANHÃO NA PASSAGEM DO SÉCULO XIX PARA O SÉCULO..................................................................................................16 1.1 Economia...........................................................................................................16 1.2 Política...............................................................................................................24 1.3 Cotidiano e Sociedade......................................................................................31 2 QUESTIONANDO E DECADENTISMO....................................................................43 2.1 A evolução educacional do Maranhão: da colônia à República...................43 2.2 “Atenas Brasileira” X “Babilônia de Exílio”.................................................54 3 ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS: DISCURSO SALVACIONISTA E FOMENTAÇÃO DO DECADENTISMO.....................................................................72 3.1 A regeneração intelectual.................................................................................75 3.2 Academia Maranhense de Letras...................................................................78 3.2.1 A réplica nas letras do art nouveau ............................................................78 3.2.2 Do quadro e das obras...................................................................................82 3.3 O poder/saber: uma faceta do poder/cultura.................................................91 3.1 Canais/Discursos...............................................................................................92 3.4 Decadentismo: um mal necessário................................................................101 3.5 AML e o combate ao Decadentismo..............................................................105 CONCLUSÃO................................................................................................................. 116 REFERÊNCIAS...............................................................................................................119 ANEXO..............................................................................................................................124 INTRODUÇÃO Nos últimos anos, muitos pesquisadores da área de História dedicaram-se ao aprofundamento de questões relacionadas à historiografia local no que tange aos grupos de intelectuais, suas produções, bem como o ambiente por eles vivido ou forjado. Observa-se, porém, que ainda existem muitas zonas intocadas, grandes espaços que necessitam ser explorados. Outros temas ainda, mesmo que sempre repetidos, ainda reservam pontos que merecem estudos, releituras e ainda despertam novas questões. No Maranhão, por exemplo, sobretudo no período que este trabalho pretende abranger, – 1889-1930 – o Decadentismo intelectual preconizado pelos literatos intitulados neoatenienses tornou-se uma “verdade” que, de tão repetida, cantada e decantada pelos clássicos, passou a ser um ponto da historiografia oficial praticamente irretorquível. O discurso decadentista não era novidade no início do século XX, apenas a continuação de uma postura assumida por intelectuais desde o século XIX, principalmente no que se refere à economia. A diferença entre um período e outro é que, naquele início de século a atenção dos literatos estava voltada para as questões intelectivas. Expressões como: “o Maranhão já não era o mesmo”, “fuga dos grandes espíritos”, eram comumente utilizadas para referir-se àquele período que, segundo eles, era de “negror para as letras maranhenses”, ocasionada, principalmente pelo abandono dos intelectuais que foram tentar a vida fora do torrão natalício. Este período despertou nosso interesse pelo fato de terem surgido vários grupos “organizados” de intelectuais que diziam ter um objetivo comum: regenerar o Maranhão da letargia mental na qual estava submerso. Nossa atenção foi direcionada a um grupo específico de intelectuais: os membros fundadores da Academia Maranhense de Letras. Neste sentido, tentou-se elucidar pontos essenciais da sua formação, o ambiente por eles vivido, o que pensavam a respeito do suposto Decadentismo e que medidas foram tomadas por esta instituição para solucioná-lo. Definida a questão, o trabalho resultou organizado em três capítulos. O primeiro deles, dividido em três seções primárias tenciona reconstituir o ambiente econômico, político e social. Entendemos que o recorte temporal privilegiado neste trabalho (1890-1930) contempla um período de importantes transformações. O objetivo perseguido foi estudar, através de um breve retrospecto, os vários aspectos da realidade maranhense daquele período de transição, não apenas de século, mas de regime político, economia e cultura, contextualizando nosso objeto de estudo para uma compreensão mais abrangente, uma vez que, todos esses aspectos estão intimamente relacionados com o tipo de cultura produzida pela sociedade ludovicense naquele período em que a idéia de decadência já cristalizada no âmbito econômico passou a caracterizar também a produção intelectual. O segundo capítulo Questionando o Decadentismo visa analisar a profundidade desse termo – Decadentismo – criado pelos intelectuais neoatenienses, buscando identificar o que foi fato e o que foi mito (exagero) na construção dessa ideologia. Para tanto, dividimos este capítulo em duas sessões. A primeira visa analisar a evolução educacional do Maranhão. Procuramos perceber se de fato houve em São Luís, uma realidade educacional que propiciasse o surgimento dos títulos de Atenas Brasileira e República das Letras. Neste ponto dedicamos uma seção secundária à comparação entre a Atenas Brasileira e a Atenas Grega. Na segunda sessão, objetivamos mostrar se houve condições intelectuais reais anteriores aos neoatenienses onde a saída daqueles literatos para outras regiões do país resultasse no posterior Decadentismo. O terceiro e último capítulo, dedicado à Academia Maranhense de Letras, que despontou dentro do contexto delimitado neste trabalho, busca revelar as estratégias contidas no discurso decadentista/salvacionista, preconizado por aqueles intelectuais membros da Academia, que almejavam afirmação no concorrido mercado das letras e status perante a elite local. O objetivo desta pesquisa não está em buscar a origem do Decadentismo, mas, verificarmos se ele realmente existiu como foi apontado por alguns intelectuais – o grupo fundador da Academia Maranhense de Letras – e revelar os interesses ocultos desses literatos ao preconizar em alta voz o Decadentismo. Para a elaboração desta pesquisa, utilizamos como fontes primárias, artigos de jornais produzidos durante o período em questão, e o primeiro volume da Revista da Academia Maranhense de Letras, publicada dez anos depois de sua fundação, porém registrando as primeiras atividades dessa instituição. Para uma melhor compreensão do período estudado fizemos um levantamento de referências bibliográficas produzidas por historiadores locais acerca do conteúdo, bem como referências que constituíssem balizas teóricas, formuladas por Burke, Chartier, Foucault, Hunt, entre outros. Trazendo a lume este trabalho de pesquisa, anelamos não apenas atender as exigências do Programa de Graduação em História da Universidade Estadual do Maranhão, como também contribuir, de forma modesta, para a compreensão de aspectos da historiografia local. 1 UM BREVE RETROSPECTO: O MARANHÃO NA PASSAGEM DO SÉCULO XIX PARA O XX 1.1 Economia O recorte temporal deste trabalho está delimitado entre a última década do século XIX e as duas primeiras do século XX (1890-1920), no entanto, nos permitimos fazer breves considerações relacionadas à economia maranhense de períodos que antecederam os trinta anos privilegiados neste estudo. Sem a intenção de parecer repetitivos, traremos à lume um breve retrospecto. Expressões como crise, decadência, declínio e oscilação são recorrentes quando o assunto é economia maranhense. Nos últimos 60 anos, muitos historiadores que se dedicaram a este tema, apresentaram a experiência maranhense na lavoura como uma contínua oscilação entre bonança e crise, o que Alfredo Wagner (1983) convencionou chamar de Ideologia da Decadência. De fato, a economia maranhense no século XIX, pautada nos moldes coloniais 1 – grande propriedade monocultora escravista – viveu uma sucessão de tentativas de inserção no mercado mundial, porém, sempre condicionadas às oscilações do mercado externo devido às arcaicas formas de produção. Beatriz de Andrade (1984, p. 5) aventa que [...] O Maranhão saiu do período colonial em condições precárias, uma vez que a exploração da terra se fazia por processos primitivos, a indústria não passava de um paupérrimo artesanato, os transportes e comunicações eram os mais rudimentares possíveis e a única forma de energia empregada era a força humana e animal. 1 Conseqüência da atuação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão. Tem seu início ainda no século XVIII com a atuação da política pombalina. No entanto, dois períodos de repentina prosperidade para o Maranhão – 1780 a 1820 e 1850 a 1870 – favorecidos por anormalidades no mercado internacional, e a utilização do trabalho escravo, possibilitaram o envio dos filhos das famílias ricas da província para a Europa, e levou ao surgimento de dois grupos de literatos, a saber, o Grupo Maranhense e os Atenienses – respectivamente – composto de romancistas, poetas e jornalistas. Porém aquela fase de crescimento foi efêmera, entre as causas apontadas para o declínio da produção agrícola do Maranhão está a abolição da escravidão. Ao longo de todo o século XIX a mão-de-obra escrava passou por uma paulatina diminuição, sendo considerada como uma das principais causas da crise da lavoura. Por volta da segunda década do século XIX, o número de negros no Maranhão representava cerca de 55,3% da população, um número superior à média nacional que era de aproximadamente 51%. Em 1861 esse número já havia caído para 27,1% da população da província (FARIA 1998, passim). Durante muito tempo, a abolição do trabalho escravo foi considerado o grande responsável pela crise da economia maranhense verificada no final do século XIX. Viveiros (1954, p. 1) escreveu: [...] a liberdade dos escravos e o advento da República, uma desorganizando o trabalho agrícola e outro criando novas obrigações para o Estado, determinaram no Maranhão uma tremenda crise econômica que se prolongou por um lapso de tempo de cerca de um quarto de século. Para Andrade (1984, p. 7), a abolição deflagrou o processo que “viria causar desastrosas conseqüências para a Província do Maranhão”. Meireles (1964, p. 344) usa a expressão “ferida de morte”, referindo-se à condição da economia maranhense após a abolição da escravidão. Porém, nem todos concordavam que a crise da grande lavoura tenha sido a crise da economia maranhense, mas, apenas a crise de um setor – grande fazenda monocultora escravista – conforme já foi apresentado. O número de pequenos produtores livres atuando em outros ramos tornou-se crescente a partir da segunda metade do século XIX e principalmente no início do século XX, conforme observou Raimundo Lopes (1916, apud MARTINS, 2004, p. 74): “o evoluir das terras, pela substituição efetiva, mas ainda incompletamente estabilizada das fazendas senhoriais pelas famílias de lavradores [...] [era uma] verdadeira renovação social, altamente benéfica em seu conjunto”. Para ele, a abolição da escravidão determinou a derrocada de uma determinada classe social, e não de todo o corpo social, ao contrário do que afirmava a maioria dos intelectuais de seu tempo. O fim do cativeiro representou a derrocada do latifúndio produtor no Maranhão, porque os fazendeiros insistiam em permanecer com uma agricultura rudimentar, carente de um progresso tecnológico mínimo que permitisse a sobrevivência dessa forma de produção. Ao contrário do que aconteceu no sul do país, aonde investimentos na produção e a versatilidade dos fazendeiros quanto à mão-de-obra, fizeram com que a abolição do trabalho escravo não tenha significado o colapso da economia. Miguel Vieira Ferreira (1886, p. 44 apud Martins, 2002, p. 23), intelectual maranhense que viveu na segunda metade do Século XIX, afirmou que “os lavradores são a própria causa da sua ruína”. Ao analisar a obra de Ferreira, Martins (2002, p. 23) afirma que ele via a lavoura como a grande responsável pelo atraso econômico do Maranhão, por que [...] se o fazendeiro maranhense fosse um empreendedor, antes de tudo, utilizaria racionalmente os elementos a seu dispor: a escravaria e o capital monetário. Entretanto, faltava-lhe o capital moral, isto é, conhecimentos especializados suficientes para a organização de seus empreendimentos m bases capitalistas”. Desta forma, ficou atestada a incompetência e falta de iniciativa dos fazendeiros maranhenses diante daquela nova realidade. José do Nascimento Morais, autor de Vencidos e Degenerados, publicado em 1915, focaliza o interior de uma sociedade decadente situada entre o final do século XIX e o início do XX – A sociedade Maranhense. O discurso da decadência moral e material ganha destaque no trabalho. Através da obra, Morais (2000, pp. 81-83 apud MARTINS 2004) expressa suas idéias sobre a decadência material do Maranhão, e não credita essa situação apenas à falta de braços após o 13 de maio de 1888, mas também “porque em grande parte não entendiam de lavoura e criação os que acudiam aos honrosos qualitativos de lavradores, agricultores e fazendeiros”. Atribuiu aquela situação à ausência de emigração estrangeira, ao monopólio comercial dos portugueses, sírios e turcos, e ao controle da administração pública nas mãos dos descendentes das antigas famílias da província. Quanto à mão-de-obra estrangeira, vista como uma alternativa de substituição da mão de obra-escrava, a análise do estudo de Regina Faria (1998) nos fez concluir que duas razões específicas impediram a introdução do trabalho de imigrantes no Maranhão: a falta de interesse dos fazendeiros em adaptar-se a esta nova realidade – já conhecida em outras regiões do país – e a morosidade do governo em aplicar ações efetivas na concretização desse projeto. Podemos afirmar que no Maranhão esta tentativa não obteve sucesso, sendo praticamente nula no Estado, devido à ausência de uma política de atração deliberada, à semelhança de outros Estados da federação. A diminuição gradativa das verbas destinadas para imigração, revela o desinteresse dos produtores em pressionar o Governo a fim de efetivar a imigração de estrangeiros para o trabalho na lavoura. Desta forma, os imigrantes pouco contribuíram para modificar as relações sociais e de produção no meio maranhense. O impacto causado pelo fim da escravidão e todas as suas conseqüências no âmbito político não foi maior que as seqüelas deixadas pelo cativeiro naquela sociedade marcada pelo preconceito racial e pela aguda bipolaridade social – dominadores e dominados. Apesar das altas e baixas que acompanharam a economia maranhense durante todo o Império, o século XIX foi o período que a historiografia tradicional convencionou chamar Idade de Ouro do Maranhão, pois, apesar de tudo, foi nesse período que se deu o soerguimento do baixo nível material legado pela colônia. Por volta da década 1890, uma nova alternativa de investimento despontou para a economia maranhense. Apesar da crise na lavoura, ainda houve fôlego para o investimento em um novo setor – um parque fabril têxtil2 – visto com uma espécie de tábua de salvação para os latifundiários que após a abolição da escravatura, desiludidos pela não indenização dos escravos libertos (1888) e o conseqüente declínio da produção, viram suas propriedades perderam o valor em até 90%. Maria da Glória Correia (2006, p.176) afirma que “corações e mentes, devaneios e esforços voltavam-se agora para a montagem de fábricas, envolvendo-se neles até os menos aquinhoados”. É, pois, nesse contexto em que, pelo menos formalmente, as condições estavam dadas que o espírito instaurador de fábrica, provocando aquilo que Fran Paxeco diagnosticou como uma ‘disenteria fabriqueira’ [...] E assim ‘como quem muda de cenário em palco de teatro pretendeu-se transformar o Maranhão escravocrata e agrícola em parque industrial de trabalho livre’. (CORREIA, 2006, pp. 174, 175). Iniciava-se aí uma corrida, dos donos de fazendas, a fim de redirecionar o capital da lavoura para a indústria. Beatriz de Andrade (1984, p. 12) nos informa que num lapso temporal de dez anos (1885-1895) foi construído uma parque industrial que “ocupava o segundo lugar do país, no setor, com 27 fábricas (sendo 17 pertencentes a sociedades anônimas e 10 particulares), suplantado apenas por Minas Gerais, que tinha trinta e sete”. São Luís pretendia ser a “Manchester Brasileira” (CORREIA, 2006, p. 180). Francivaldo Melo (2005) em Uma Breve História do Maranhão destaca 10 (dez) unidades fabris que se dedicavam à fiação e tecelagem de algodão, sendo cinco em São Luís, quatro em Caxias e uma em Codó. Uma parte do algodão que ainda era produzido na província passou a ser utilizado na indústria que na década de 1890 chegou a contar com 11 fábricas de tecido e fios de algodão. Algumas razões são apresentadas para o redirecionamento repentino da produção agrícola para a indústria no Maranhão. Entre elas estão: • 2 A gradativa substituição do trabalho escravo pelo assalariado; Ver fotografia em anexo. Imagem 1 • O liberalismo nacional; • Falência das fazendas cotonicultoras e dos engenhos de açúcar. Estas condições propiciaram a mudança repentina da economia maranhense para a indústria, as fábricas proliferaram em São Luís para onde mudaram os grandes senhores agrários. A origem do capital empregado na construção do Parque Fabril é atribuída ao amealhado na produção algodoeira, e também ao Capital Comercial e Bancário, que ao que tudo indica, era a mesma coisa, apenas separados judicialmente. Afinal, era apropriação do excedente gerado nas unidades produtivas que proporcionava essa concentração crescente de capitais nos setores comercial e financeiro, ligados à exportação. Em relação à mão-de-obra utilizada nas fábricas, “a força de trabalho utilizada, no processo de trabalho, foi basicamente recrutada entre a população pobre urbana, sendo mais da metade dos postos de trabalho, ocupado por mulheres e menores” (MEIRELES, 1970 apud MELO, 2005, p. 78) retirantes fugidos da seca no Ceará também compunham esse quadro. Houve também experiência com mão-de-obra estrangeira, relatada por Correia (2006, p. 190): “Engajados na cidade do Porto, zarparam os imigrantes portugueses, embarcados no vapor Brunswick, que partiu do porto de Liverpool, na Inglaterra, em 23/07/1894, rumo ao Maranhão”. Sobre a jornada de trabalho, Maria da Glória Correia afirma que era controlada por rígidos mecanismos de exploração, ressaltando-se, o chamado Barracão, como era chamado o local de trabalho dos operários, que geralmente permanecia fechado durante todo o horário de trabalho, contribuindo para a disseminação de muitas doenças. Além do roubo nos pesos dos fios e na metragem dos panos, prolongamento exaustivo da jornada de trabalho, multas, ameaças, violências físicas (2006, passim). Correia (2006, p. 199) nos informa ainda: Tendo em vista as longas jornadas de trabalho e o regime a que eram submetidas nas fábricas, tornar-se operária era quase como viver em cativeiro sendo pessoa livre, ainda que não passivamente, pois significava aprisionar gestos e sentimentos, num estranho concerto de tempo e movimento, cuja regência não dependia de quem os executava, mas do próprio instrumento. Isto porque, para se tornar uma operária, assim como era exigido adestramento do corpo – já que era necessário submetê-lo a uma rígida disciplina que o fizesse repetir indefinidamente os mesmos movimentos, como se executasse rígida sinfonia, sem possibilidades de variações sobre o tema -, também era imprescindível que fosse domado o espírito, a fim de que pudesse privar esse mesmo corpo do prazer do sol e do vento. A implantação da República não alteraria substancialmente as relações de dependência econômica que o Brasil mantinha com o Capitalismo Internacional. Com a eclosão da I Guerra Mundial e a conseqüente valorização dos produtos agrícolas nacionais, a utilização do babaçu e do algodão, entre outros produtos, fez com que o Maranhão conseguisse, mesmo que temporariamente, reequilibrar as suas finanças e expandir as exportações nos primeiros 20 anos no século XX. Lacroix (2004, p. 18) afirma que no início do século XX as dificuldades econômicas foram substituídas por uma “rápida reativação” da economia, devido ao aproveitamento do babaçu e a elevação dos preços do algodão e dos tecidos da indústria local, “o déficit, advindo do final do século XIX, foi ligeiramente superado pela balança comercial positiva”. No entanto, o aproveitamento do babaçu no mercado não foi suficiente para manter a estabilidade econômica diante da reorganização do mercado mundial após o término da guerra, como aventou Meireles (1960, p. 343): “o babaçu não foi, porém, como poderão crer os menos avisados um ‘milagre’ que tenha imediatamente dado remédio à combalida economia maranhense; e teve mesmo seus efeitos prejudiciais”, entre eles, o endividamento dos exportadores que investiram muito dinheiro no negócio, sem garantias suficientes. Terminada a guerra, seguiu-se uma queda nos preços dos produtos de exportação e a economia voltou a sofrer as conseqüências de não ser competitiva. No comércio interestadual, os maiores compradores de algodão e babaçu foram os Estados do Rio de Janeiro e São Paulo, o primeiro, utilizado na indústria têxtil; o segundo, na fabricação de óleo comestível. A indústria têxtil logo revelou sua fragilidade – na ausência de uma produção algodoeira em larga escala, inexistência de indústria de base para desenvolver tecnologicamente a produção, a flagrante dependência econômica do Estado às oscilações do mercado internacional e pela incapacidade de concorrer com produtos de qualidade equivalente aos produzidos em outros países – levando à falência progressiva desse modelo que se arrastou até por volta da metade do século XX. Entre as causas mais apontadas para a crise do parque fabril têxtil, temos: • Incapacidade gerencial, ou falta de experiência na indústria têxtil; • Falta de incentivo do governo central, voltado para a consolidação do café no sul do país; • Baixo nível tecnológico; • Mão-de-obra de custo elevado (no caso dos operários especializados); • Baixo poder aquisitivo da população. Carlos de Lima (1981, apud ANDRADE, 1984, p. 13) acrescenta que: [...] por outro lado, o número excessivo de estabelecimentos fabris de tecidos, gerou uma feroz concorrência entre eles, disputando os operários especializados a peso de altos salários e, com a baixa dos preços dos produtos para a conquista de mercados, a moda destruía-se a si mesma. As fábricas foram fechando as portas e inaugurando uma nova moda: a venda dos maquinismos para o sul do país. Isto não deve ser entendido como o fim da indústria têxtil no Maranhão, porém, com a crise, os proprietários em sua maioria desviaram seus investimentos para outras atividades, como por exemplo, o mercado imobiliário, em meados dos anos 50. Na zona rural, uma nova configuração passa a ser desenhada baseada na pequena produção: [...] Tudo leva a crer que a pequena produção já figurava com importância no panorama rural maranhense desde meados do XIX [...] No despontar do século XX, a preponderância da roça cultivada por moradores foreiros dos grandes proprietários, por posseiros em terras devolutas e por imigrantes nordestinos assentados em terras municipais em diversificadas plantações modificou o meio rural maranhense. (LACROIX, 2004, p. 18). A primeira metade do século XX também foi de alternância da economia maranhense, ao sabor das duas grandes guerras mundiais. 1.2 Política A proclamação da República trouxe à lume a discussão sobre identidade, pertencimento e nação. Intelectuais influenciados pelos ideais iluministas travaram verdadeiras batalhas de idéias junto àqueles que ainda defendiam o regime monárquico. Para os intelectuais cientificistas, a República era a expressão da integração do país à história do Ocidente, sendo resgatado dos séculos de atraso em que esteve envolvido com o modelo monárquico-escravista. Acreditavam que através da cultura e da educação seria possível “superar o atraso cultural e acelerar sua marcha evolutiva a fim de que o Brasil pudesse alcançar a parcela mais avançada da humanidade” (OLIVEIRA, 1990, p.81). Para isso foi necessária a veiculação de correntes que possibilitaram a integração ao moderno e científico, o Estado Positivo. O Positivismo encontrou no Brasil boa acolhida, principalmente nas Forças Armadas, que se tornaram responsáveis diretas dos acontecimentos do 15 de novembro de 1889. No século XIX, a influência do Romantismo destacava o caráter individual marcado pela busca da singularidade nacional, a individualidade insubstituível de cada homem. O Positivismo republicano destacava o aspecto universalista, as características gerais da pátria, buscando a noção de unidade indispensável à formação da identidade nacional. O triste fim de Policárpio Quaresma de Lima Barreto, que é uma crítica à sociedade daquele período, evidencia essa busca pela identidade nacional. O ufanismo patriótico do personagem se fez presente em todos os aspectos da sua vida. Em um fragmento do texto, o autor se expressa através do personagem que após muitas reflexões chega à conclusão de que o Brasil “tinha todos os climas, todas as frutas, todos os minerais e animais úteis, as melhores terras de cultura, a gente mais valente, mas hospitaleira, mais inteligente e mais doce do mundo” (BARRETO, 2004, p. 29). O desejo de abandonar os traços da velha ordem levou à lusofobia, ou seja, desprezo a tudo que ligasse ao passado colonial dominado por Portugal, desde a substituição violenta da arquitetura lusitana, destruindo sua presença (na capital federal, Rio de Janeiro), até os usos e costumes. “O país europeizava-se, segundo os modelos ingleses, subvertendo os hábitos lusitanos até então dominantes”. (ANDRADE, 1984, p. 10). No Maranhão, o conjunto arquitetônico da praia grande só não foi demolido porque as famílias, as firmas comerciais, e o próprio governo, experimentavam uma pobreza que resultou na riqueza arquitetônica atual, ou seja, na preservação dos imponentes sobradões. Algum dinheiro disponível representou a destruição, como por exemplo, a substituição dos azulejos de alguns casarões pela tinta que além de não preservar a construção, tem vida útil muito curta o que força à manutenção permanente. No caso da não manutenção, que se observou na maioria dos casos, o resultado foi o abandono e a destruição de grande quantidade de casarões, destruídos pela ausência de conservação. Apesar das divergências entre os intelectuais republicanos a respeito do que deveria ser a República e o modelo a ser adotado (francês X americano), as idéias de Silva Jardim em A República no Brasil (1888) expressam o que esse novo regime simbolizava naquele momento “sua pretensão era mostrar o atraso e a inutilidade do regime monárquico em confronto com as vantagens do regime republicano. A República seria o governo da opinião púbica, da ausência de privilégios, da liberdade nas relações morais e civis, da igualdade perante a lei” (OLIVEIRA, 1990, p. 87). Todas as esperanças estavam depositadas na República, no entanto, a imagem que a República Velha deixou como herança na História oficial foi a de um regime controlado pelas oligarquias, tanto no governo central (Minas Gerais e São Paulo) quanto nos Estados, com os coronéis, e caracterizado como um regime moroso e ineficaz. Faoro (1979, p. 472) explica que [...] a elite política sofre convulsão impotente, ao importar as idéias européias para um país inapto a consumi-las. Ela se parte, na ideologia, entre o país real, necessitado de modernização e o país oficial, mera cópia de modelos alheios. Essa dicotomia, mal definida, difusa, será responsável pela sua esclerose interna numa perplexidade que a falta de missão própria converterá em decadência. O período que vai de 1889 a 1898, considerado como o de consolidação da República, foi marcado por conflitos econômicos e políticos em todo o país, devido ao ajustamento aos novos mecanismos econômicos e à nova ordem do poder, “daí os descompassos econômicos, sociais e políticos que, mantidos em estado de latência no sistema monárquico, vão irromper irrefreavelmente durante a República, tornando difícil a sua estabilização” (ANDRADE, 1984, pp. 13 e 14). Os historiadores costumam dizer que a passagem do Regime Monárquico para o Republicano foi um passeio, dada à indiferença da população em relação ao que se passava. Na capital do Império, autores relatam que diante do ato da proclamação da república, muitos transeuntes acreditavam estar vendo uma Parada Militar. “Com efeito, na República, como na Independência, o povo permaneceu à margem dos acontecimentos, conduzido pela classe dominante, fracionada em partidos opostos e, agora, como foi dito, em disputa permanente pela posse do poder de Estado” (ANDRADE, 1894, p. 16). Em São Luís a única anormalidade registrada, aconteceu na noite de 17 de novembro de 1889, e ficou conhecida com O Fuzilamento do dia 17. A manifestação foi atribuída a ex-escravos que, segundo Meireles, temiam que o regime republicano voltasse atrás quanto à questão da escravidão. A movimentação do dia 17, na visão desse historiador, não passou de um “incidente sem maior gravidade”. Relata ainda que, “indo os manifestantes contra a redação de O Globo, a polícia interferiu imediatamente, dispersando-os; isto na véspera da adesão” (1960, p. 297). O fato é que talvez a manifestação não tenha sido assim tão irrelevante, talvez o termo fuzilamento, não tenha sido um exagero, como afirmou Meireles. A Pacotilha do dia 18 de novembro de 1889 informou que um grupo de pessoas fazia uma manifestação em frente da redação do jornal O Globo dando vivas à monarquia, ao imperador e à família imperial quando foram interrompidos pela polícia. Saldo: quatro mortos e diversas pessoas feridas. Ao atribuir a manifestação a ex-escravos, informação que a notícia do jornal não confirma, Meireles minimizou a amplitude do conflito, que como o próprio autor disse “concorreu um ambiente de frieza, indiferença e desconfiança, se não de hostilidade, contra a República” (MEIRELES, 1960, p. 297), de forma que somente no dia 22 de novembro (1889) aconteceram as primeiras cerimônias cívicas saudando a República, uma delas por parte dos alunos do Liceu Maranhense, e um desfile alegórico promovido no dia 30 pelo professor e poeta Sousândrade. A tentativa de abafar a violência e a repercussão do dia 17 foi preocupação também das autoridades da época, manifestada claramente nesta nota divulgada pela Pacotilha no dia 18 e assinada pelo Chefe de Polícia interino. A ordem que reinou durante a noite passada nesta cidade e que muito abona o zelo de V. S a bem da tranqüilidade e socego publico, da-me motivos para louval-o e testemulhar-lhe o conceito que merece de governo. Sem que seja meu fim despertar a solicitude que há revelado nesta quadra pouco normal, confio ainda que empregará os meios suasorios e aconselhados pela prudência para evitar qualquer reunião de que tenha notícia, estando certo que tudo conseguira, attenta a índole ordeira e pacifica do povo maranhense. Tito Augusto Pereira de Mattos. Sr. Dr. Chefe de Polícia interino (SÃO LUÍS. Pacotilha, 18/11/1889, nº. 274). Porém um fragmento retirado de uma notícia que dava conta do ocorrido no dia 17 confirma que o conflito ultrapassou os limites de um incidente. [...] Amigos da segurança publica, aconselhamos aos nossos concidadãos que mantenham a paz e a ordem que se observam na cidade, evitando por essa forma scenas deploráveis, como as que se deram na noite de ontem (SÃO LUÍS. Pacotilha, 18/11/1889, nº. 274). Aos poucos, todos os seguimentos da população se davam conta da instalação do novo regime, dadas as confirmações oficiais que se avolumavam nos jornais, nos dias que se seguiram àquele 15 de novembro de 1889. A revolução está consumada: a República esta vencedora e é hoje o poder constituido em toda a extensão do país [...] A retirada de D. Pedro e sua família, para o continente europeu torna escusada qualquer reacção que não pode deixar de ser prejudicial a paz e ordem publica (SÃO LUÍS. Pacotilha, 18/11/1889, nº. 274). Desmoronou-se o império com aplauso da nação brazileira, e a velha instituição tão desmantellada se achou no momento critico do ajuste de contas, que nem sequer fez uma tentativa de resistencia. O que o patriotismo exige actualmente é abnegação, trabalho, organização, e todo cidadão, por mais humilde que seja tem o dever de levar sua pedra para a reconstrução da pátria (SÃO LUÍS. Aurora Maranhnse, 28/01/1890, nº. 1). O entusiasmo que acompanhou a chegada da República foi gradualmente sendo substituído pelo descontentamento diante das inovações impostas pela mudança política. A República, influenciada por idéias positivistas, intrometeu-se em aspectos tradicionais da vida social considerados íntimos e arraigados ao longo dos séculos. Entre esses aspectos, destacamos a separação entre Estado e Igreja, ideal defendido pelo positivismo, e a introdução do casamento civil. A separação entre Igreja e Estado, prevista pelo regime republicano não foi vista com bons olhos em uma sociedade que carregava em seu bojo séculos de catolicismo. Apregoam certos jornalistas da actualidade que o dogma (?) republicano exige a separação da Igreja e do Estado[...] Estas declamações, embora desprovidas de provas, mil vezes repetidas, servem para desvairar a opinião pública, e crear desharmonia funestas no seio da sociedade brazileira [...] Todas as constituições republicanas da América, com excepção dos Estados Unidos norte-americanos, reconhecem a Religião Catholica Apostólica Romana como Religião do Estado, donde se vê que o regimen republicano não é compatível com a Igreja Catholica. (SÃO LUÍS. Aurora Maranhense, 31/03/1890, nº. 2). O decreto de 7 de janeiro que separou a Igreja do Estado [...] Não podendo ser o governo, pondera a Pacotilha, uma cousa differente da nação, do povo, concluese necessariamente que não é justo o Decreto, que separou a Igreja do Estado, tornando este inteiramente indifferente á assumptos religiosos (SÃO LUÍS. Aurora Maranhense, 09/04/1890, nº. 12). A reação da população logo se esboçou, comparecendo em massa às cerimônias realizadas pela Igreja, expressando sua rejeição ao novo decreto, caracterizado como perseguição à fé Católica. Foi enorme a concorrência do povo às cerimônias da semana santa. A procissão do enterro do Senhor foi verdadeiramente imponente. Se o governo separou-se da Igreja, com certeza della não separou-se o povo deste Estado (SÃO LUÍS. Aurora Maranhense, 09/04/1890, nº. 13). As nossas procissões quaresmais fizeram-se com ordem e com um cortejo enorme. A todos estes actos do culto divino tem assistido o zeloso prelado maranhense. Nota-se no povo geral contentamento. O Maranhão provara que é fiel ás suas tradições religiosas (SÃO LUÍS. Aurora Maranhense, 22/04/1890). A questão do casamento civil foi vista como uma intromissão do Estado na sagrada intimidade do seio familiar e também foi alvo da reprovação popular. No campo político, a mudança administrativa de Província para Estado e a criação de uma Intendência administrativa, foi aparentemente bem recebida tendo em vista a má atuação da Câmara Municipal nesta província. O acto dictatorial, que aboliu as Câmaras Municipais, tranformando-as em intendências de nomeação do poder executivo, offende sem duvida o apregoado principio moderno da soberania popular, mas explica-se senão justifica-se pelo descrédito, em que cahiu essa instituição, convertida em instrumento de pequens corrilhos políticos [...] Saudamos a nossa intendência, e dando mil louvores á República por sua prodijiosa produção, desejamos ardentemente que o Município tome outro aspecto [...] (SÃO LUÍS. Aurora Maranhense, 31/01/1890 nº. 2) A atuação da Câmara municipal não despertava muita confiança na população, notas como esta transcrita abaixo, não eram incomuns. Camara Municipal Por falar de numero não funcionou hoje esta corporação (SÃO LUÍS. Pacotilha, 30/10/1889 nº. 259). A primeira Constituição política do Maranhão foi promulgada em 04 de julho de 1891, constituída de oito títulos com cento e cinqüenta e nove artigos. A Constituição previa a separação dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário. Definia que o Poder Legislativo seria exercido por uma Câmara de Deputados (composta de 20 membros leitos por 3 anos) e outra de Senadores, esta composta de 15 membros eleitos por nove anos. O Poder Executivo seria exercido pelo Governador do Estado, eleito por quatro anos, podendo ser substituído pelo Vice-Governador do Estado eleito juntamente com ele. “O Poder Judiciário exercido pela magistratura do Estado era composta de um Superior Tribunal de Justiça e por Juízes de direito e juízes distritais e seus suplentes, tribunais do Júri e tribunais correcionais”, nas palavras de Meireles. Também se instituiu uma Polícia do Estado, responsável pela “manutenção da ordem e segurança públicas”. (MEIRELES, 1960, p. 303) Quanto à administração municipal, ficou responsável: uma Câmara, um intendente e um subintendente, eleitos por 4 anos. Estavam aptos para votar: os maiores de vinte e um anos, alfabetizados do sexo masculino, exceto “mendigos, praças de pré e religiosos com votos de renúncia da liberdade individual”. (MEIRELES, 1960, p. 304). Quanto à educação, a Constituição previa que anualmente, o Estado aplicaria cerca de vinte por cento das rendas resultantes dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino, criação de mais escolas secundárias e profissionalizantes, bem como a obrigatoriedade do ensino primário. Desta forma ficou organizado o Maranhão, “Estado federado da República dos Estados Unidos do Brasil”. (MEIRELES, 1960, p. 305). No início da República, o número de municípios no Estado do Maranhão era de aproximadamente cinqüenta, excluída a capital (São Luís). Os principais eram: Caxias, Codó, Pedreiras e Bacabal. No censo de 1960 o número de municípios havia aumentado em mais de uma dezena. No Maranhão a instabilidade política herdada da monarquia permaneceu inalterada nos primeiros anos da República. Em menos de dois anos teve oito governadores provisórios, tendendo a estabilizar-se somente a partir do terceiro mandato (1898-1902) até a Revolução de 30. Resumindo o que significou a Primeira República no Brasil utilizaremos as palavras de Carlos de Lima (1981, apud ANDRADE, 1984, p. 17) que afirma: Como era de esperar, a República chegou com os mesmos vícios, os mesmos homens, as perseguições aos adversários e a farta distribuição de pingues, empregos a parentes, amigos e correligionários [...] Um ano depois, os senadores e deputados eram escolhidos em listas feitas e aprovadas no Rio de Janeiro, num sistema eleitoral compulsivo, elegendo, por vezes, as províncias, cidadãos completamente, cidadãos completamente desconhecidos nelas. Mais uma farsa, só que, agora, republicana. O Maranhão não fugiu à regra; foi próspero em chefes políticos dessa natureza, onde o prestígio e a força dos deputados e senadores eram avaliados por suas relações com esses coronéis, que além de aliciar votos para o Governo, ainda utilizava instrumentos punitivos, vingativos e de repressão no âmbito municipal – Coronelismo. Nas palavras de Correia (2006, p. 172): “Mudara-se tudo para não mudar”. Os primeiros anos da República coincidem com o surgimento do grupo de intelectuais maranhenses autodenominados Novos Atenienses (1894-1932) que inspirados nos dois grupos anteriores – Grupo Maranhense e Atenienses – cantaram e decantaram as glórias do passado no campo das produções literárias atribuído a este Estado. Caracterizam-se pela forte atuação no jornalismo, não só na produção de artigos como também na fundação de vários periódicos. Distinguiram-se também, “por constituírem um patrimônio institucional jamais visto no maranhão, voltado para dar sustentação à obra de resgata do passado mitológico”. Entre essas instituições estava a Academia Maranhense de Letras, fundada com o objetivo de promover uma renovação cultural e preservar a excelência das tradições pretéritas do Maranhão intelectual (MARINS, 2006, p. 174). 1.3 Cotidiano e sociedade Em 1900 a população ludovicense estava estimada em 499. 308 habitantes espalhados entre a zona urbana e a zona rural (Cutim, Anil, Bacanga, Vinhais). Os surtos de crescimento econômico no século XIX, permitiu à capital maranhense ingressar nos moldes civilizatórios ditados pela Europa (mais precisamente a França), considerada um paradigma a ser seguido pelas outras nações. Isto se deu em todos os aspectos da vida da população que tentava imitar tais padrões. Numa cidade típica do século XIX, São Luís aos poucos conquistava um belo conjunto de sobrados3, em sua 3 Ver fotografia em anexo. Imagem 3. maioria pertencentes aos fazendeiros que de tempos em tempos vinham à capital tratar dos seus negócios. O Teatro São Luis4 era a evidência de que a sociedade ludovicense não se preocupava apenas com o enriquecimento material, mas também com as criações do espírito5. Os Saraus, reuniões alegres onde apreciavam música e Literatura, era o lugar ideal para os jovens das classes mais abastadas demonstrarem estar atualizados com a cultura européia. A utilização do idioma francês era comum nestas reuniões. Entre os círculos sociais mais favorecidos economicamente, a produção literária européia (portuguesa e francesa) proliferava, divulgando as novidades do pensamento europeu. É neste contexto, que surge o destacado Grupo Maranhense, composto de jovens intelectuais versados nas mais variadas áreas – poetas, jornalistas, romancistas, entre outros. Desse grupo fizeram parte escritores como: Odorico Mendes, Sotero Reis. João Francisco Lisboa, Trajano Galvão de Carvalho, Gonçalves Dias, Antônio Henriques Leal, Joaquim Gomes de Sousa e Joaquim de Sousa Andrade (Sousândrade). Segundo a historiografia oficial, foi este grupo de notáveis escritores que rederam a São Luís o título de Atenas Brasileira. Ainda no século XIX, um segundo grupo denominado Atenienses, também alcançou destaque nas letras nacionais. Entre eles estão: Teófilo Dias, Graça Aranha, Aluísio e Arthur Azevedo, Raimundo Correia, entre outros. O desejo da classe rica de estar em sintonia com o modelo francês fazia com que essas pessoas adotassem de vez o estilo gaulês, de forma que poderiam até confundir um observador desatento. Signaes para reconhecer o parisiense [...] Não devemos nunca tomar por parisienses os que encontramos nos banhos de mar e nos disem constantemente: Paris oli! Paris! – não há nada como Paris! Meu Paris, etc. 4 5 Posteriormente, Teatro Arthur Azevedo. Ver fotografia em anexo. Imagem 4. Tão grande enthusiasmo temos pelas coisas que desejamos ou lamentamos, mas nunca pelas que possuímos [...] Em caso nenhum lamentarão acharem-se fora de Paris, pois tem certesa de que em breve estarão de volta (SÃO LUÍS Pacotilha, 28/11/1880, nº. 5). Nos jornais havia um grande espaço reservado somente para as notícias de Paris e destaque para tudo que aqui poderia ser encontrado de origem francesa como os anúncios de vinhos e deliciosos chocolates franceses de primeira qualidade”. Sortimento Triumphal A ultima palavra em Paris A Notre Dame recebeu dos melhores armazens de Paris, o que havia de mais chic e mais moderno, para assim satisfazer o gosto do mais exigente de seus freguezes. Crepe de seda em todas as cores chics Setim charmerise em todas as cores da moda Tafetá raduim para vestidos de senhoras Seda Bojador para vestidos ou bluzas Cambraias brancas Bolsas para senhoras, leques em gazes de seda, cambraia e papel, plumas [...] Espartilhos modelos elegantisimos, cofeccinados em tecido mercerise [...] (SÃO LUÍS. A Tarde, 03/07/1915). Mas nem tudo eram flores. Não havia muita preocupação por parte do poder público no que se refere à questão do saneamento básico da cidade. Somente a partir de meados do século XIX que a prestação de serviços básicos começou a ser oferecida, mesmo que precariamente. Na década de 1850, a Companhia do Anil recebeu o direito de explorar, durante 60 anos, o encanamento e a distribuição de água em São Luís, mas não durou muito tempo devido a forte oposição de um grupo que já explorava esse serviço. A água vendida por Dona Ana Jansen em sociedade com o comerciante José da Cunha Santos, era proveniente de suas fontes situadas no Vinhais e no Apicum, sendo transportadas para a cidade em canoas, onde eram vendidas em carros de boi conduzidos por escravos. Esta célebre matriarca e seu sócio fizeram grande resistência à Companhia do Anil, espalhando boatos sobre a qualidade do produto fornecido pelo concorrente, e sabotando os canos que levavam a água dos mananciais aos chafarizes instalados pela companhia. (FARIA, 1998, p. 85). Em 1874 a concessão do serviço de distribuição de água foi dada à Companhia de Águas de São Luís, no entanto, essa medida não solucionou o problema da distribuição de água. A insatisfação com a prestação de serviço dessa empresa é a causa de repetitivos artigos nos jornais da época. As reclamações não estavam circunscritas apenas à questão da falta d’água como também o preço que era cobrado, que chegava a ser oito vezes mais caro do que o da água distribuída no Rio de janeiro. No tocante à inoperância do poder público, vale, todavia, ressaltar que a não implementação de medidas concernentes ao abastecimento de água não se devia ao desconhecimento do ponto em que chegava a sua insuficiência e dos constrangimentos que essa falta impunha à população, ou mais precisamente aos habitantes mais desfavorecidos da fortuna, os quais não tinham como suprir suas necessidades comprando o líquido distribuído pelos aguadeiros. (CORREIA, 2006, p. 133). A constante falta d’água comprometia gravemente o funcionamento de setores importantes para a economia, como as fábricas que vez ou outra eram forçadas a interromper a produção devido a ausência do precioso líquido, isto sem falar na limpeza pública para o qual somente as chuvas amenizavam a situação caótica. Ha dois dias que por falta d’água não trabalha a fábrica de fiação e tecidos (SÃO LUÍS. Pacotilha, 16/11/1889). Incontestavelmente as chuvas prestam melhor serviço à limpeza publica do que os fiscaes da edilidade (SÃO LUÍS. Pacotilha, 30/10/1889, nº. 10). Dia a dia vai se tornando mais evidente a calamidade [...] ruas inteiras privadas do precioso liquido e não consta que a Companhia das águas de São Luís tenha tomado qualquer providencia no sentido d remediar o mal [...] A situação é grave e como tal deve ser tratada (SÃO LUÍS. Pacotilha, 30/10/1889, nº. 10). Em caso de incêndio, muito freqüentes devido ao grande número de palhoças na cidade (o que facilitava o alastramento do fogo), e às constantes sabotagens em armazéns, as pessoas só poderiam contar com a ajuda dos vizinhos, que eram orientados a sempre ter baldes d’agua em casa à disposição para serem utilizados para conter o fogo, inutilmente. Nesta semana não houve roubo nem incêndios. Vamos melhorando (SÃO LUÍS Pacotilha, São Luís, 19/12/1880, nº. 9) . Na transição do século XIX para o XX, São Luís, já batizada Atenas Brasileira, vivia o dilema de uma cidade que pretendia ser moderna, civilizada, porém, convivendo com hábitos retrógrados. No final dos anos 20, mais precisamente no ano de 1918, a Diretoria do Serviço Sanitário informou que em São Luís constavam 560 casas de telha e 460 palhoças, somando um total de 6.060 habitações, contrastando com um dado apresentado em 1921 que informava que de um total de 8. 417 casas, 5.410 eram cobertas de telha, logo, 3.007 palhoças, um aumento considerável6. Ainda em 1921, o cenário da cidade era composto de: 2 parques, 4 avenidas, 14 praças, 72 ruas, 26 travessas, 2 rampas, 2 becos e 4 praias. (PAXECO, 1923, pp. 602-636). Em 1862, a Companhia de Iluminação à Gás do Maranhão assinou um contrato que a responsabilizava ela iluminação pública. Em 1870, 9 prédios públicos e 442 residências particulares dispunham de iluminação a gás e também algumas vias públicas como a rampa do Palácio, o largo do Carmo, a Praça da Alegria, entre outros. A deficiência dos serviços de iluminação prestada por esta companhia tornou-se alvo de constantes reclamações, devido o descaso com que era tratada esta questão. Se o gerente da Companhia que nos ilumina tivesse necessidade de transitar pela rua de S. João até o ponto em que cruza com a de Sant’Anna, sem dúvida que providenciariam de modo que fosse substituído, ou consertado o candieiro alli collocado cuja luz, alem de não ter intensidade de meia vela siquer, tremula com tal insistência que encommoda a vista (SÃO LUÍS, Pacotilha, 02/01/1881, nº. 10). Hontem a noite chovia a cântaros e a cidade estava em trevas... por ser dia de Lua (SÃO LUÍS Pacotilha,16/01/1881, nº. 12). 6 Seria interessante um estudo específico que verificasse a veracidade desses dados, porque o aumento populacional verificado em três anos, a partir dessas informações, é impressionante. A Profª. Maria da Glória Guimarães Correia (2006), fez uma excelente descrição da realidade ludovicense no início do século XX, em seu trabalho, recentemente publicado na coleção de teses lançada pela Universidade Federal do Maranhão. Ela discorre em uma análise interessantíssima sobre o que chama de cidade ideal e a cidade real. São Luís era a cidade do fausto e do fastio, ou seja, a opulência vivia lado a lado com a miséria, contradição ilustrada pelos casarões, de um lado, e os cortiços e palhoças do outro. O fastio também se refere à ausência de salubridade, observado na imundície com que se deparavam os transeuntes das vias públicas de São Luís, o desrespeito às leis de saúde eram sintomáticas da (pseudo)civilização – resultado da falta de educação e conseqüente ausência de noções básicas de higiene – que os orgulhosos atenienses diziam viver. Ruas e praças que se transformam em monturos, praias tomadas por focos de infecção e viveiros de germes; enfim, torrentes de miasmas que infectam a sua atmosfera. Diante desse quadro, nada mais coerente do que considerar porque a mortalidade crescia e os organismos depauperavam, em detrimento das campanhas higienistas por mudanças que, aliás, só poderiam ser viabilizadas se as bases da sociedade fossem tocadas. (CORREIA, 2006, p. 59). Os detritos fecais escoriam livremente pelas ruas da cidade devido a ausência de uma rede de esgotos. Animais mortos eram jogados no meio das ruas, entravam em estado de putrefação e lá ficavam vários dias, até quem sabe a próxima chuva. O recolhimento do lixo feito por carroças que percorriam a cidade, era caótico. As pequenas carroças não comportavam todo o lixo, que por sua vez ia caindo ao longo do caminho traçando um rastro de podridão. Na época, dizia-se que São Luis era uma excelente moradia de ratos. A rampa Campos Mello está sendo obstruída por grande porção de lixo [...] que alli são depositados todos os dias (SÃO LUÍS. Pacotilha, 21/11/1881, nº. 4). Os surtos virulentos não eram incomuns, dizimando a vida de centenas de pessoas, numa cidade em que a palavra prevenção era desconhecida. Para as famílias mais pobres que não dispunham de um serviço médico domiciliar, uma vez doentes, só poderiam esperar pela morte, tendo em vista que o isolamento era a ante-sala da morte. [...] é evidente que uma alimentação má, como a que entre nós se observa, enfraquece a população predispondo-a para as moléstias endemicas e epidemias que infelizmente quase sempre nos perseguem. Para nós é fora de dúvida que o mao estado sanitário da capital procede directamente do pouco eu nenhum cuidado que o governo dispensa a sua causa primordial (São Luís, Pacotilha, 19/04/1881). O matadouro público foi personagem central de reclamações relacionadas não só ao aspecto imundo em que se apresentava, mas também pela qualidade da carne que oferecia. [...] não há um só dia que a nossa população coma carne fresca. A carne que todos os dias consumimos[...] é sem exageração – carne podre! O melhoramento de nosso estado sanitário depende exclusivamente do da alimentação pública – effectuando este será verificado aquelle (SÃO LUÍS. Pacotilha, 21/11/2006, nº. 4). Em 1871 chegou a São Luís uma inovação em questão de transporte público. Aos cuidados da Companhia Ferro-Carris São Luís do Maranhão, o transporte passou a ser feito por meio de bondes puxados à tração animal, cobrindo uma área de duas léguas (aproximadamente 5. 310 metros de trilhos). De acordo com o Código de Posturas Municipais (1866 apud Correia, 2006, p. 145), os condutores dos bondes animálicos deveriam andar vestidos decentemente, referirse discretamente aos fregueses, dirigir com cuidado, sempre com respeito e educação no trato com os passageiros e não maltratar os animais. Contrastando com o que diz o Código, a postura dos condutores estava longe de ser o que estava previsto. Todas as carroças de condução [...] sobem pela rua do sol, fasendo um barulho infernal de taboas soltas, tinir de correntes, tacadas, gritos, o diabo! (SÃO LUÍS Pacotilha, 28/11/1880, nº. 5). No jornal A Tarde de 21 de julho de 1915, um passageiro sentindo-se lesado com o tipo de tratamento dispensado pelos condutores, escreveu um longo artigo de repúdio a tal comportamento. Transcrevemos abaixo um pequeno trecho: Os Bondes [...] um tal procedimento, sr. Diretor é tanto mais injustificável e abuzivo, quanto é certo que cocheiros e condutores, sob pretexto algum, não deverão negar-se a executar os serviços que lhe cabem. (SÃO LUÍS. A Tarde, 21/07/1915). Em relação ao trato com os animais “tais fatos aconteciam com a vivacidade das cores com que era pintado, beiravam a selvageria, que certamente chocava a gente dessa civilizada cidade.” (CORREIA, 2006, p. 146) A prestação de serviços públicos, em geral provocavam muito descontentamento. Entre eles estava a segurança pública, ou poderíamos dizer insegurança pública. Os órgãos policiais já andavam desacreditados pela população. Os que duvidam que a nossa cidade seja policiada á noite, queiram tomar o trabalho de dar um pulo até a fonte do Ribeirão, das sete ás oito horas, que terão o prazer de encontrar uma patrulha sentada sobre o parapeito da citada fonte, a conversar largamente em assumptos de interesse geral (SÃO LUÍS. Pacotilha, 02/01/1881, nº. 10). É o cazo das nossas autoridades policiais pedirem demissão dos seus cargos, visto não inspirarem a menor confiança ao público. E como poderá eficazmente operar uma policia de quem o publico desconfia, a ponto de sujeitar-se a todos os prejuízos, de preferencia a servir-se dos seus préstimos, mesmo oferecidos? Em que tristes tempos vivemos nós, santo Deus! (SÃO LUIS. A Tarde, 02/07/1915). Tais e tantos tem sido os assaltos á propriedade alheia, nestes últimos dias que a população está verdadeiramente alarmada. Não há absolutamente garantias; é completa a falta de insegurança [...]. Atravessamos uma quadra anormal de insegurança e ninguém pode estar tranqüilo, porque a todos ameaçam os inimigos do alheio. E o pavor domina a cidade, enquanto a policia dorme, só ela, tranquilamente e feliz (SÃO LUIS. A Tarde, 18/07/1915). O descaso com que a segurança pública era tratada abria margem para críticas ferozes. Em tom de indignação a polícia era rebaixada o máximo possível. Muitas vezes os policiais eram denunciados de andar sonolentos pelo fato de estarem se divertindo em festas durante toda a noite até o amanhecer, mesmo estando em serviço. Também eram acusados de estarem envolvidos em jogos proibidos dos quais participavam livremente em plena luz do dia, ou seja, participavam de jogos e festas que deveriam reprimir, perdendo, desta forma, o respeito da população. A opção dos soldados pelo fazer o que deviam renunciar em cumprimento de seu dever, permanecerá como uma marca de sua atuação, ou da falta dela, mesmo quando já andava avançado o novo século, pois, a crer no que veiculam jornais sobre os muitos conflitos que aconteciam durante os festejos juninos, parece até que o policiamento deixava de existir no dito período. (CORREIA, 2006, p. 112) Em meio a toda essa situação, e às vezes sem entender o porquê de nada dar certo na capital do Maranhense – resultando numa situação caótica – muitos recorriam até mesmo a crendices populares para justificar tal estado de coisas. Entre essas crendices estava a caveira de burro, símbolo de mau agouro. A tal caveira de burro supostamente enterrada em algum local da cidade era a única explicação que muitos encontravam para que a capital do Maranhão andasse tão lentamente em direção ao progresso. Caveira de burro [...] Diante de tudo isso, sou forçado a acreditar na tão falada caveira de burro, espécie de determinismo na vida econômico-social maranhense que nos embaraça a marcha evolutiva (São Luís. A Tarde, 30/06/1915). Talvez a explicação para esse estado de coisas fosse uma compreensão deformada da noção de civilização, ou talvez, de liberdade, como expressa esta crônica de jornal que resume aspectos do cotidiano da sociedade ludovicense, e traz até nós um perfil das práticas da orgulhosa Atenas Brasileira no início do século XX. Estamos no melhor dos mundos, vivemos na melhor das cidades. O ar que respiramos é livre, livre é a nossa locomoção, livre é a nossa língua; livres são os nossos hábitos, os nossos costumes, os nossos gestos. Quando ouço reclamações, digo logo que o reclamante não tem segura a função do cérebro. Que mais dezejamos nós? Que maior liberdade do que essa que todos gozamos? Não me consta que haja cidade em que seja mais compreendido o regimen da liberdade do que a nossa. As leis que servem de muralhas a umas tantas couzas sociais, e que os legisladores fizeram na supozição de que trabalhavam em beneficio da coletividade, nós as saltamos com a mesma facilidade com que nos circos os acrobatas saltam barras que lhes opõem à marcha. Vivemos em plena liberdade. Sabemos que há leis que regulam construções urbanas, pondo-as de acordo com a higiene e com a estética, porém, não nos incomodamos com elas, e fazemos as nossas casas e muros dos nossos jardins á nossa vontade. Os alinhamentos são como nós entendemos e não como diz a lei que deve ser. Daí a continuação desse pezado e ridículo aspecto colonial que tem a cidade em que vivemos [...] O código de posturas proíbe em um dos seus artigos a criação de animais nas ruas; nós entendemos que isso é uma peia a nossa sonhada liberdade, e não nos conformamos com essa exquizita restrição. E então, transformamos as nossas ruas e praças em campos de criação de animais: cavalos, bois, carneiros, porcos, patos perus, galinhas, cachorros, enfim, um verdadeiro jardim zoológico. Para que serve a nossa liberdade sinão para della gozarmos como entendermos? [...] Para as sargetas das ruas enviamos detritos culinários; as imundicieis liquidas das nossas habitações; os reziduos dos nossos aparelhos gazogenicos; as viceras dos galináceos que sacrificamos para o nosso consumo. Haverá maior liberdade? No mundo inteiro não há. O capim créce audaciozamente nos telhados e perto da bordadura dos passeios, onde pequenos pântanos aninham bacteries diversas e hematozoarios de Larveran, e ainda reclamamos de liberdade! [...] No mercado, os talhadores modificam ao seu belo prazer o sistema métrico decimal aplicado aos pezos, os marchantes fazem o preço, que querem, à carne. Estão todos no seu direito; praticam e gozam a liberdade que Deus fez para o nosso uso e prazer [...] As sociedades mutuas creceram, minguaram, feneceram e morreram; os seus diretores e encorporadores também cresceram os olhos nas reservas monetárias dos associados, e delas não deram conta a ninguém. Si isso não é a compreensão mais lata da liberdade, é que perdi por completto a noção das couzas simples. Não! não tem razão os que bradam que não temos liberdade [...] Concordemos: vivemos no melhor dos mundos, e não sejamos tão exijentes! (SÃO LUÍS. A Tarde, 03/08/1915). Mas a capital do Maranhão também era uma cidade de festas. Essas festas tinham sua origem nos mais variados seguimentos sociais, de forma que havia diversão para todos os gostos, desde aquelas promovidas pelas elites imitando costumes europeus, passando pelos festejos religiosos, chegando até as manifestações das classes mais pobres. Dentre as festas mais comuns estavam: Natal, Janeiras (Ano Bom), Reis e o Bumba-boi. Entre as brincadeiras mais populares da época figurava o Boi. Amado por uns, odiado por outros, no início do século, era a marca cultural das classes menos abastadas “não só porque lhes oportunizava a alegria e o prazer no desafogo de suas cotidianas tensões, mas igualmente porque o verso e a rima, o canto e dança podiam ser veículos por meio dos quais davam vasão a seus protestos”. Por isso mesmo que era uma brincadeira rejeitada pelas classes mais altas, vista como um escândalo e expressão de uma cultura degenerada, de incivilizados. (CORREIA, 2006, p. 118). Parece incrivel que numa capital como a nossa, a policia consinta que o celebre bumba-meu-boi campeie livremente pelas ruas principais desde as nove horas da noite, até as dez da manhã do dia seguinte, com está sendo. Que essa brincadeira (se tal nome se pode dá a isso) fosse permitida, somente nos lugares ermos, vá, mas não é justo, não é licito, nem é decente que se verifique o fato triste e deprimente, que estamos vendo e, que, certamente, não tem qualitativo algum. Que belos tempos ! (SÃO LUÍS. A Tarde, 02/07/1915). Nem mesmo as ameaças de repressão dos aparelhos policiais intimidaram esses brincantes que encontraram nessa manifestação popular uma saída para esquecer por alguns momentos as suas mazelas. Isto pode parecer estranho nos dias de hoje, uma vez que o Bumba-Meu-Boi tornou-se uma das maiores expressões da cultura popular do Estado do Maranhão, servindo de propaganda turística para atrair visitantes durante todo o ano principalmente durante as festas juninas. Mas o fato é que [...] pelo menos entre 1876 e 1913, os donos dos bois depositavam requerimentos pedindo autorização para ensaiar a brincadeira e sair nos dias dos festejos juninos. A Secretaria de polícia, no entanto, somente concedia tais licenças para os lugares situados fora do centro da cidade. A memória oral também atesta que os bois continuaram confinados para além da estação de bondes do bairro do João Paulo, na primeira metade do século XX. Como no caso dos batuques, existi então uma lógica espacial que refletia as relações de poder entre autoridades e classes subalternas, opondo um centro civilizado, onde não se tolerava tais barbaridades, à periferia, onde era difícil impedi-los. (ASSUNÇÃO, 2003, p. 47). A noção de poder elaborada por Michel Foucaut talvez nos ajude a elucidar este mistério em relação ao Bumba-boi no Maranhão, onde passou de expressão incivilizada das camadas pobres, para símbolo cultural do Estado preconizado pelo Governo. Foucault (FOUCAUT [19--?] apud O’BRIAN, 2001, p. 46) afirma que o poder não só reprime como também cria, introduzindo novas tecnologias de poder. O que Foucault chama tecnologias de poder, são métodos (meios) que levam à legitimação de uma verdade. A partir da década de 1960, assume o Governo do Estado, uma elite que viria ser mais tarde o maior domínio oligárquico vivido no Maranhão. É neste cenário que ressurge o Bumba-Boi, recriado por este grupo político, desejoso de criar uma identidade cooptadora das massas, agora como expressão genuína da cultura maranhense, amado pelo povo e legitimado pelo governo. 2 QUESTIONANDO O “DECADENTISMO”. 2.1 A evolução educacional do Maranhão: da colônia à República O objetivo de estudar a evolução do sistema educacional maranhense, remontando ao período colonial, é tentar descobrir se houve um progresso significativo do sistema educacional a ponto de fundamentar o mito da Atenas Brasileira, atribuído a São Luís. Entendemos que o grau intelectual de uma população nunca está desvinculado da atenção que esta sociedade dá à educação. O estudo das condições educacionais oferecidas no Maranhão nos dará subsídios para afirmar se aqui existiu, de fato, um ambiente propício para a criação de uma República das Letras, cantada e decantada pela intelectualidade maranhense no século XIX e ecoada pelos intitulados decadentistas no início do século XX. Durante todo o período colonial, em que o Brasil esteve subordinado a Portugal através do sistema de dominação conhecido como Pacto Colonial, toda a estrutura economia brasileira esteve articulada a uma complexa rede de práticas comerciais convencionalmente denominadas de Sistema Mercantilista. Assim como a infra-estrutura econômica do país, a tessitura social era caracterizada por uma simplicidade reduzida à bipolaridade social, reunindo de um lado os dominantes – proprietários rurais – e do outro, os dominados – um enorme contingente de trabalhadores despossuídos, livres ou escravos. No Maranhão, assim como em todo o país, se produzia parar exportar e não se exportava porque produzia. Nesse período, a característica essencial da província era a vida circunscrita ao meio rural e predominantemente escravista. O progresso material do período colonial foi assinalado pelas ações do Marquês de Pombal, principalmente no âmbito econômico. No campo da educação, sua principal intervenção foi a instituição das aulas régias. Até então, Meireles (1960, p. 220) nos informa que a esse respeito, no Maranhão, o que se tem notícia, era a existência de seminários de padres capuchos (franceses) para meninos colonos e nativos.7 Durante todo o século XVII, a educação do Maranhão tinha como fundamentos as aulas de filosofia, teologia, retórica, gramática e primeiras letras. Há também o registro de duas instituições situadas em Alcântara: o Colégio de Nossa Senhora do Pilar, que oferecia leitura, latim e catecismo, e a escola gratuita de ler, escrever e solfa, dos mercedários do Convento de Nossa Senhora dos Remédios. (MEIRELES, 1960, p.220). Sobre as aulas régias instituídas por Pombal, se tem notícia delas no Maranhão, somente a partir da segunda metade do século XVIII. Em 1753, Gabriel Malagrida, da Companhia de Jesus, fundou o Recolhimento de Nossa Senhora da Anunciação e Remédios para moças órfãs e senhoras desvalidas, sendo a primeira escola feminina (MEIRELES, 1960, p.220). O desafogo econômico do Maranhão no século XVIII, propiciado pela atuação da Companhia Geral do Comércio, possibilitou o envio dos primeiros estudantes para Europa com o objetivo de estudar e atuar nas seguintes profissões: hidráulico, tipógrafo, médico, cirurgião e contador. O governador da província naquele período, D. Fernando de Noronha, demonstrou seu desagrado quanto a esta medida, que segundo Meireles (1960, p. 221), fora obrigado a tomar, dizendo que “não era conveniente que aqui no Maranhão houvesse mais cadeiras além de gramática latina, ler e escrever”. Durante todo o período colonial, a ação jesuítica foi marcante, imprimindo os valores da fé católica à educação, de tal forma que, o curso de Teologia no Maranhão, era tido como referência no país e até no exterior. A Igreja Católica foi por muito tempo responsável pela transmissão da cultura nesta província. Alguns autores aventam que o caráter intelectual e o cultivo da educação literária do tipo clássica, que posteriormente deram a São Luís o título de Atenas, se devem à ação jesuítica e o modelo educacional adotado. Porém, Viveiros (19-- apud MEIRELES, 7 A primeira escola aberta em São Luís (1626), foi de iniciativa do jesuíta Luís Figueira, com o objetivo de “ensinar as letras aos filhos dos portugueses” (MEIRELES, 1960, p. 220). 1960) discorda, e atribui essa característica literária do Maranhão ao costume cada vez mais freqüente, a partir do fim do século XIX, de enviar jovens maranhenses, de famílias ricas, para serem educados na Europa. Para Meireles (1960, p. 222) que também compactua com esta idéia, a “Atenas do Brasil seria um fruto, além-mar, do humanismo coimbrão”. Como veremos adiante, o envio de moços e moças para estudar nos centros humanísticos do Império e da Europa tornou-se uma prática freqüente da elite Brasileira Até aproximadamente mais da metade do século XVIII, o ensino no Maranhão esteve monopolizado pelos jesuítas, observa-se este fato, pela quantidade de estabelecimentos dirigidos por cléricos ligados à Companhia de Jesus. Quando, em 1759, el rei Dom José I de Portugal decreta a expulsão dos Jesuítas, que se efetiva no Maranhão em setembro de 1760, deixam São Luís cerca de 86 inacianos entre sacerdotes, aspirantes e irmãos coadjudores. Pode-se imaginar os efeitos dessa medida no que tange à educação, uma vez que provoca a parada completa da atividade docente no Maranhão. (BEATRIZ. 1984, p. 25). As aulas régias, instituídas para ocupar o vago deixado pelos jesuítas, buscavam valorizar a carreira do magistério pelo cultivo de homenagens e privilégios aos professores régios. Consta que no último decênio do século XVIII já existiam, em São Luís, cerca de três escolas régias (VIVEIROS, 1953, p. 5). As reformas pedagógicas instituídas na colônia pelo Marquês de Pombal na segunda metade do XVIII, não lograram êxito devido à falta de escolas públicas onde o ensino fosse ministrado regularmente. Em 1799 D. Joaquim Ferreira de Carvalho, 12º bispo do Maranhão, recémchegado a São Luís, expressa sua impressão sobre a Diocese que encontrara, dizendo da sua decepção de “não achar nesse bispado, nem letras, nem religião, nem costumes, e não havendo as primeiras, a falta da segunda e da terceira é conseqüência, sendo entre todos os mais escandalosos os eclesiásticos [...]” (PACHECO, 1969, p. 92 apud ANDRADE, 1984, p. 26). O Seminário do Maranhão, fundado em 1805, trouxe novo impulso à educação humanística da província, apesar de ter sido registrado como carente de métodos eficazes e deixando a desejar quanto ao quadro de disciplinas. Concomitante a isso, foram criadas as disciplinas isoladas de Primeiras Letras, Gramática Latina, Retórica, Filosofia e Geometria. No que refere à educação, apesar da reforma pombalina não ter tido muito êxito no Maranhão, progrediu ao transferir para o Estado a responsabilidade pela educação como parte integrante da ação governamental. Na fase imperial, a educação no país avançou um pouco mais. A lei de 15 de outubro de 1827, determinava a criação de escolas de primeiras letras em todo o país. Sobre esse período, Andrade (1984, p. 27) nos informa que, a despeito das deficiências, o Maranhão passou de 14 para 24 escolas. Apesar de ser um número pequeno, representou um avanço na educação do Estado. Por essa época, foi criado o Liceu Maranhense (1838), estabelecimento de ensino secundário que lecionava somente dez disciplinas: Matemática elementar, Geografia, Gramática Filosófica (portuguesa), Latim, Retórica, Francês, Inglês, História Universal, Comércio, Filosofia Racional e Moral. Nos último quartel do século XVIII a condição financeira dessas famílias permitiu enviar seus filhos, “os futuros condes, viscondes, barões, moços fidalgos e comendadores, a estudar na Europa, principalmente em Coimbra, mas não raro na França, Alemanha, de onde voltavam bacharéis e doutores em leis, Filosofia, Medicina, Matemática”. No entanto, a formação superior desses jovens não significava que as condições educacionais da província seriam alteradas, porque “feitos doutôres, voltavam sempre, não só à província mais à cidade natal e preferiram, geralmente, fazer-se herdeiros das fazendas de algodão e dos engenhos de açúcar, a se deixarem pelos grandes centros onde as haviam educado, entregues à vida ociosa e inútil” (MEIRELES, 1960, p. 289). Até a proclamação da República, o ensino secundário no Maranhão resumia-se ao Liceu, considerado deficiente em comparação com os de outras províncias; e a educação primária a 90 vagas para o sexo masculino, e 59 para o sexo feminino. Analisando o nível educacional na província do Maranhão e a situação financeira das elites, o descaso que havia nesse período em relação à educação fica evidente. As famílias abastadas não se incomodaram com esse quadro porque tinham a possibilidade de enviar seus filhos para os grandes centros culturais do país ou do exterior. Entre os jovens que alcançaram a formação superior (no período imperial) poucos se decidiram pela carreira literária, porém, foi propício à formação de um grupo de intelectuais, posteriormente denominado Grupo Maranhense (1832-168). Desse grupo enumeramos alguns dos mais destacados pela historiografia oficial: • Odorico Mendes: publicista, poeta, humanista, parlamentar, tradutor clássico de Homero e Virgílio; • Sotero dos Reis: professor, publicista, poeta, filósofo (autodidata), parlamentar, filólogo e parlamentar; • Gonçalves Dias: bacharel em Direito, poeta, etnógrafo, dramaturgo e historiador; • João Lisboa: historiador e publicista (autodidata); • Joaquim Gomes de Sousa: matemático, poliglota e astrônomo. Posteriormente uma segunda geração de intelectuais se destacou na literatura nacional, os denominados Atenienses (1868 – 1894). Entre eles figuraram: • Teófilo Dias: orador, jornalista e professor; • Raimundo Corrêa: promotor, juiz, professor e poeta; • Teixeira de Sousa: Médico, jornalista e poeta; • Aluízio Azevedo: jornalista, panfletário, romancista, contista, caricaturista, poeta e diplomata; • Artur Azevedo: dramaturgo, prosador , teatrólogo e escritor; • Coelho Neto: jornalista, professor, romancista, orador, poeta, teatrólogo e lexicógrafo; • Celso Magalhães: poeta, novelista, crítico e magistrado. Sobre a formação desse grupo de intelectuais, Martins (2002, p. 68) aventa que: Essa elite maranhense foi cultivada na estufada da escravidão. Tal como o mito ateniense, instituído pelos seus intelectuais, ainda hoje atesta sua pujança o patrimônio edificado portentoso observável nas cidades mais antigas [...]. Patrimônio em preto e branco fundado imageticamente sob o império dos três as dominantes da economia local, respectivamente: o algodão, o arroz e o açúcar. Três produtos brancos, como as camadas sociais dominantes, obtidas a partir da exploração compulsória da mão-de-obra negra. É evidente que não podemos tomar como paradigma para análise da condição educacional do Estado, expressões intelectuais como o primeiro ou o segundo grupo de intelectuais do século XIX, uma vez que esses literatos representavam uma ínfima parcela da sociedade, portanto não constituíam uma realidade abrangente. Com o advento da República e as conturbações políticas que agitaram aquele período a questão educacional ficou esquecida, de forma que “o Maranhão apresenta, relativamente à instrução pública, o mesmo aspecto desolador que as demais províncias do Brasil” (ANDRADE, 1894, p. 29). O estado da educação pública era tão precário que as escolas privadas ganhavam cada vez mais espaço, quase monopolizando o ensino. O descaso do poder público era sintomático em vários aspectos mais especialmente na má remuneração dos professores. Como declarou o inspetor geral da Educação, da época, Corrêa Leal (1896 apud ANDRADE, 1894, p. 31): Não conheceis a gravidade da crise que nos flagela a ponto que cada vez mais se torna precária a luta pela existência. Tudo quanto é necessário ao homem tem triplicado ou quadruplicado de preço; e, portanto, não pode o cidadão investido do magistério público, manter-se com os vencimentos que recebe, sendo esse um constante motivo de escuza ao cumprimento de seus deveres. A Constituição do Maranhão republicano, inspirada nos ideais positivistas, que vinham se acentuando cada vez mais, previu, entre outras coisas, os seguintes aspectos referentes à educação: DA EDUCAÇÃO Art. 108. O Estado criará o Conselho de Educação que a lei regulará, obedecendo às diretrizes do plano nacional de educação. Parágrafo único. Para garantir a obrigatoriedade do ensino primário o Estado manterá fiscalização sistemática sobre os menores em idade escolar, diligenciando para que os pais, tutores ou responsáveis, se desobriguem do dever que lhes impõe a lei. Art. 109. O Estado e os Municípios reservarão uma parte do seu patrimônio territorial para a formação de fundos de educação. Parágrafo único. Parte desses fundos será aplicado em auxílios a alunos necessitados, mediante fornecimento gratuito de material escolar, bolsas de estudo, assistência alimentar, dentária e médica, devendo também custear as vilegiaturas que forem promovidas no interesse no ensino. [...] Art. 111. Cada município terá, pelo menos uma escola noturna para adultos [....]. Art. 112. Anualmente, o estado aplicará nunca menos de vinte por cento das rendas resultantes dos impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino. Art. 113. O Estado fiscalizará a instrução primária particular. Art. 114. De acordo com os Municípios o Estado providenciará para que haja, em todas as cidades, bibliotecas de fácil acesso ao povo. [...] Art. 118. Para mais prontamente atender ao problema educacional, Estado poderá criar, nas cidades mais importantes, escolas secundárias e profissionais. Parágrafo único. As escolas profissionais de que trata o presente artigo, são de curso restrito às matérias básicas secundárias, especialmente destinadas a preparar professores rurais. Art. 119. Os professores das escolas muito afastadas dos centros de progresso e conforto social deverão receber, além dos vencimentos normais, uma gratificação adicional, que será determinada em lei. [...] Art. 122. O Estado criará e difundirá escolas de artes, ofícios e trabalhos domésticos, para ministrar o ensino gratuito aos trabalhadores (MEIRELES, 1960, pp. 382, 383). Analisemos a prática escolar baseados em dados da época, para verificarmos se de fato a constituição foi respeitada ou se realidade estava distante do idealizado pelo governo. O Artigo 108 prevê tanto a obrigatoriedade do ensino primário, quanto a sua fiscalização. Em estudo sobra a educação desse período, Andrade (1984, p. 30) afirma que [...] apesar de constar em decreto, a obrigatoriedade do ensino primário jamais se concretizou integralmente na prática, seja pela ausência de sanção na lei para os infratores, seja pela carência de estabelecimentos de ensino para todos, seja pela quase total falta de recursos da grande população. O grande número de crianças que trabalhavam em fábricas na capital, comprovavam essa triste realidade. Casos como os de Acácia e Pingo-de-ouro, relatados por Correia (2006) em sua pesquisa sobre o trabalho feminino nas fábricas, em São Luís, nos revela que era grande o número de crianças que viviam aquela exaustiva jornada de trabalho. A autora nos informa que a primeira tinha onze e a segunda dez anos de idade. Outros casos de crianças com até oito anos até idade também são relatados. Apesar de sua pouca idade e de serem bem pequeninas devido à baixa estatura, Acácia e Pingo-de-Ouro, começaram a trabalhar para arcar com o seu sustento, pois, como sendo ela operária, sua tia era mulher muito pobre. (CORREIA, 2006, p. 197). Uma personagem da obra de Correia relata em cores bem vivas a realidade de quem precisou abandonar a escola para trabalhar nas fábricas desde cedo, e oferece informações sobre a instrução pública oferecida para a população pobre. Mas como a gente ia aprender alguma coisa, se a gente ia novinha para lá?’ Em outros termos, devido ao fato de se engajarem cedo nas fábricas, sendo aquela sociedade marcada pela exclusão, não tinham a instrução mínima exigida para o desempenho daquele tipo de trabalho [...] Com relação à instrução formal que lhes poderia oportunizar trabalho menos difícil e mais reconhecido que o fabril, suas possibilidades de recebê-la eram de fato bem poucas [...] porque mesmo quando chegavam a freqüentar a escola, a formação que aí recebiam não contribuía para mudar a sua situação de classe. (CORREIA, 2006, p. 205). Se na capital, grande quantidade de crianças pobres estavam fora da escola para garantir o sustento da família, o que se pode dizer da zona rural, onde a mão-de-obra infantil foi historicamente utilizada na lavoura? Pelas condições em que o ensino público era oferecido, observa-se a inépcia da aludida fiscalização prevista pela Constituição, sobretudo nas escolas do interior. Nas palavras do governador Luís Domingues: [...] Infelizmente, porém, o meio porque, entre nós, se effectua essa fiscalização, é deficientíssimo. Confiada aos promotores públicos e seus adjuntos, não deixarão de certo estes os seus afazeres, para fiscalisarem aquilo que, em geral, não podem fiscalizar, por lhes faltar especialidade, ou, muitas vezes, competência nesse ramo de serviço. As mais das vezes, o fiscal limita-se a um mero fornecedor de attestados e visador, permitido o neologismo, de mappas de freqüência. (1908, apud ANDRADE, 1984, p. 34). Conforme Andrade (1984), o fundo escolar do Maranhão, recolhido através das caixas escolares, tinha como objetivo preparar os alunos para aceitarem outras regras da sociedade passivamente, sem risco de desestruturação do status quo. Nas caixas escolares, recolhia-se pequenos valores depositados pelos estudantes, sob incentivo de prêmios para os alunos que se destacassem no comportamento, ou seja, na manutenção da ordem. Entre as propostas para o destino do dinheiro, estava a distribuição de vestuário, calçados e merendas às crianças indigentes. Andrade (1894, p. 35) afirma que essa proposta contribuiu “para difundir e incentivar valores tipicamente capitalistas como a poupança e a competição”. O Artigo 119 que garantia uma remuneração maior para os professores que trabalhavam na zona rural, nada mais era do que um incentivo para resolver um antigo problema: o da falta de professores nas regiões mais afastadas da capital. Os normalistas geralmente se recusavam a trabalhar no interior devido as precárias condições de vida, e os que chegavam a ir, ficavam por pouco tempo. “Apesar das propostas apresentadas para resolver esses problemas, presentes desde os primórdios da República e agravados na segunda década do século, eles permanecem até hoje sem solução”. (ANDRADE, 1894, p. 36) A criação de escolas profissionais previstas nos Artigo 118 e 122 revela sem nenhum disfarce a intenção do poder público, formado pela elite esclarecida, de reproduzir a divisão social do trabalho, destinando os cursos de aprendizagem de ofícios à população pobre, restringindo os cursos de Humanidades para as classes mais altas, negando aos segmentos mais carentes da população uma possibilidade de ascensão social por meio de uma instrução menos alienante. A elite supunha que estudos filosóficos estavam acima do nível intelectual dos desafortunados. “Com o Aprendizado Agrícola, o Governo estabelecia uma segunda rede de escolarização, proletarizante, que realizava a divisão de classes às claras, sem mesmo os subterfúgios da escola primária única”. (ANDRADE, 1894, p. 35). O atraso educacional do Maranhão, que no início do século XX possuía o triste título de campeão do analfabetismo, pode ser observado também pela demora na instalação de uma instituição de nível superior, que só ocorreu em 1918, com a criação da Faculdade de Direito, seguida pela Faculdade de Farmácia (1920) e pela de Odontologia (1925). Esse retardamento do Maranhão em relação à maioria dos Estados brasileiros, que já possuíam faculdades há certo tempo, pode ser explicado pelo desinteresse da elite, que tinha o hábito de enviar seus filhos para os centros culturais do país ou do exterior, e pela falta de pressão das classes médias. O interesse por esse empreendimento ficou, por muito tempo, restrito a um pequeno grupo de intelectuais. Na primeira República, as ações do Governador Godofredo Viana, marcaram um momento que ficou conhecido como entusiasmo pela educação, que tomou conta do país na segunda década do século XX, investindo na expansão do ensino para as massas. Nessa administração, foi colocada em prática a reforma da instrução pública, que estabelecia três cursos para o ensino primário: o elementar (dos 5 aos 7 anos); o médio (dos 7 aos 12 anos), e o complementar (dos 12 aos 13 anos), e criou escolas na zona rural para decrescer o número de matriculas na cidade. Segundo Andrade (1984, p. 37), o sucessor ao Governo do Estado, o governador Magalhães de Almeida, partilhava do mesmo entusiasmo. Em Mensagem ao Congresso Legislativo, disse orgulhosamente que o Estado do Maranhão liberava, no seu governo, 15% das rendas para a instrução pública, em 1925. A Constituição do Estado previa no Artigo 112, que o Estado investiria “nunca menos de vinte por cento das suas rendas” para a instrução pública. Se os governos que se destacaram pelo investimento na educação nunca alcançaram nem o previsto pela Constituição, o que se pode dizer dos governos anteriores? Andrade (1984, p. 38) chama a atenção para o fato de que, naquele momento, todos os movimentos de cunho nacionalista levantavam a educação como bandeira de luta. Em análise sobre esse fenômeno, a autora concluiu que [...] na realidade, a ênfase colocada na educação como responsável por todos os problemas nacionais, embora tivesse o mérito de ressaltar a necessidade do estado de expandir a sua instrução primária, cumpria também o objetivo, embora nem sempre consciente, de mascarar a realidade, desviando do aspecto sócio-econômico a origem dos problemas mais relevantes [...] a contradição entre interesses agrários e interesses industriais, mais evidentes na Primeira República, reflete-se na educação, na medida em que elementos favoráveis ao desenvolvimento industrial começam a perceber a educação do povo como um instrumento para ampliação das suas bases eleitorais, até então predominantemente agrárias. Às vésperas da Revolução de Trinta, o Maranhão vivia em pleno estado de subdesenvolvimento cultural, com uma escola primária, que mesmo precária, atendia mais as crianças das classes média e alta, afastando as crianças das famílias de baixa renda. Nas palavras de Andrade: [...] até a Revolução de 1930, a instrução pública no Maranhão não formava um todo homogêneo, não passando, principalmente no interior do Estado, de uma reunião de escolas isoladas em todos os sentidos, em que os professores, em sua grande maioria, buscavam mais um emprego para sobreviver do que a difusão do ensino ou o interesse coletivo, e em que fica claro, também o desinteresse do Governo pela real cultura e conscientização das massas. (ANDRADE, 1984, p. 40). Através dessa breve análise sobre a educação do Maranhão na Primeira República, podemos perceber que, além de a realidade estar bem distante do que estabelecia a lei, o percurso da educação no Maranhão, desde o período colonial, não oferecia condições reais ao estabelecimento de uma República das Letras, como por tão longos anos São Luís foi denominada, devido a um suposto ambiente intelectual, onde supunham que os maranhenses respiravam intelectualidade. Concluímos que não foi por meio do viés educacional que se constituiu o ideário de uma sociedade letrada na capital do Maranhão. Na realidade, o que vimos, é que o mito da Atenas Brasileira não se refere a uma sociedade como um todo, e sim a um reduzido número de intelectuais, que pelos mais variados motivos, conseguiram subsistir a despeito da ignorância educacional em que estava imerso o Estado no Maranhão. O próprio termo instrução pública reflete a visão diminuta que as autoridades tinham em relação à educação, sugerindo com esta expressão que os educandos eram, na verdade, tábulas rasas, necessitando apenas do indispensável, negando, dessa forma, uma educação mais ampla que oferecesse uma possibilidade de mudança àquela realidade sofrida pelas famílias que não podiam enviar seus filhos para outras localidades. 2.2 “Atenas Brasileira” X “Babilônia de Exílio”. O Maranhão saúda o século XX enfrentando graves problemas de ordem econômica relacionados à agricultura e à indústria. Com uma política local que não procurava dinamizar a economia através da modernização desses setores, caminhava-se para a estagnação, revelada pela fragilidade de um mercado que não resistia à concorrência externa, portanto, dependente das oscilações do mercado externo, como foi visto no primeiro capítulo. Ainda no século XIX, dois períodos de crescimento econômico – 1780 a 1820 e 1850 a 1870 favoreceram uma mudança de comportamento revelado pelo consumo, gosto pelo luxo e interesse pela educação erudita. Filhos de grandes comerciantes e fazendeiros da região saíam do Estado para estudar em outras capitais e até fora do país. Muitos desses ao completarem seus estudos, tornaram-se literatos de reconhecimento nacional. Notabilizando-se pelo surgimento de dois grupos intelectuais como os de Gonçalves Dias e Luís Antônio Vieira da Silva; Arthur e Aluízio Azevedo, respectivamente, correspondendo à terceira e quarta fase da literatura maranhense. Após a intensa atividade intelectual – que repercutiu muito mais no âmbito nacional do que de fato na capital maranhense – mobilizada pela primeira e segunda geração de intelectuais, seguiu-se um período de letargia e marasmo intelectual. Especificada por Mário Meireles (1955) como a quinta fase da literatura Maranhense, tornou-se mais conhecida como Decadentismo, descrito por Antônio Lobo (1909 apud MEIRELES, 1955, p. 172) como uma “tristíssima e caliginosa noite em que por tão longo tempo viveram imersas suas letras”. A fase decadentista (1894-1932) é explicada pelos literatos, do início do século XX, como o abandono dos intelectuais que deixaram a capital maranhense arrastados por várias razões, inclusive de ordem econômica, e tornam-se essencialmente literatos nacionais, como: Teófilo Dias, Raimundo Corrêa, Aluízio e Arthur Azevedo, Coelho Neto e Graça Aranha, entre outros. Ao longo do século XX, todos os estudiosos que se dedicaram a escrever sobre a literatura maranhense, concordam em um ponto: o período que vai de 1894 a 1932, foi um momento de negror para as letras maranhenses. Segundo os 8clássicos que tratam do assunto, esse é o período literário conhecido como Decadentismo – após o abandono dos literatos que foram tentar a vida em outros lugares do país ou até mesmo no exterior –. O Maranhão, mais especificamente São Luís se vê ensombrecida pela ausência daqueles que lhe deram o título de Atenas Brasileira. Sobre o período em questão, chamado decadentista, Meireles (1955, p. 163) afirma que O Maranhão não era mais aquele centro humanístico onde haviam pontificado um Timon e um Sotero, e tão pouco os seus grandes poetas do momento revelavam, como Odorico Mendes e Gonçalves Dias... Todos se haviam ido de uma vez para sempre... eram essencialmente literatos nacionais. O Decadentismo 9 é geralmente apresentado em contraposição a dois períodos literários que o antecedem, que são respectivamente o Grupo Maranhense (1832-1868) – Gonçalves Dias, Odorico Mendes, Sotero dos Reis, João Lisboa, entre outros – e os Atenienses (1868-1894) – Aluísio e Arthur Azevedo, Coelho Neto, Graça Aranha, Raimundo Corrêa, entre outros. Nos clássicos, os representantes desses períodos são apresentados como símbolos de um período de glórias da literatura local. No entanto, uma voz dissonante vem de Reis Carvalho (19-- apud MEIRELES, 1955, p. 120)10 em Literatura Maranhense, onde afirma: “[...] inferior à fase precedente por lhe faltarem individualidades que lhe sejam o que para aquela foram Gonçalves Dias e João Lisboa, o segundo momento literário conta com maior número de escritores de valor e mais variadas manifestações”. 8 Os clássicos são livros que exercem uma influência particular quando se impõem como inesquecíveis e também se ocultam nas dobras da memória, mimetizando-as com inconsciente coletivo ou individual. (CALVINO. 1993. p. 11apud BORRALHO, José Henrique de Paula. Tradições Historiográficas do Maranhão. Outros Tempos. São Luís, 2002) 9 Decadentismo expressão comumente utilizada para se referir ao período que vai de 1899 a 1932 (referente aos Neoatenienses), considerado inferior em termos de produção literária devido ao abandono dos intelectuais da capital maranhense, aos dois ciclos anteriores, respectivamente:Grupo Maranhense (18321865), Atenienses”(1868-1894). 10 Antônio Reis Carvalho, nascido em São Luís a 10/04/1874 e falecido no Rio de janeiro no ano de 1946...Funcionário público, jornalista, ensaista, poeta e teatrólogo. Sócio correspondente da Academia Maranhense de Letras.(MEIRELES, 1955, p. 178). Autor de Literatura Maranhense, entre outras obras. Nesta passagem, apesar de não desmerecer completamente; o que Reis Carvalho classifica como inferior, é o período pertencente aos Atenienses, composto de figuras de reconhecimento literário nacional, e que para Mário Meireles seriam a reafirmação do título de Atenas conquistado pelo Grupo Maranhense. Porque Reis Carvalho considerou os Atenienses inferiores ao Grupo Maranhense? Porque Mário Meireles considerou os Novos Atenienses (1899-1932) decadentes em relação aos Atenienses? A história parece repetir, o que nos levou a formular a seguinte hipótese: O Decadentismo (1894 – 1932) não existiu, pelo menos não da forma exagerada, romântica e saudosista como é apresentado. Esse período, na realidade, foi assim rotulado pelos clássicos da Literatura para dar luz, foco, ao período que o antecedeu (Atenienses), que por sinal sofreu muitas críticas, da mesma forma que Reis Carvalho inferiorizou os Atenienses em detrimento do Grupo Maranhense. Para lançar luz sobre este ponto, recorremos ao artigo Tradições Historiográficas no Maranhão de autoria do Profº. Henrique Borralho lançado na revista Outros Tempos V. 1. No artigo, Henrique Borralho, citando os historiadores Eric Hobsbawn e Terence Ranger em As invenções das tradições, fala sobre a capacidade da História de inculcar valores que “de tão repetidos passam a ser encarados como irretorquíveis, irreparáveis, fundando de fato tradições, olhares que qualquer possibilidade de contraposição, pareça inverossímel” (HOBSBAWN, Eric & RANGER, Terence,1997, p. 9. apud BORRALHO. Outros Tempos, 2002, p. 1). Neste contexto, entra um termo muito familiar aos historiadores e também responsável pela formação de tradições: a Historiografia. Mas a historiografia não deve ser entendida apenas como arrolação e análise de fatos. A Historiografia precisa ser compreendida como metalinguagem quer dizer, não só trilhar o percurso do historiador, como trilhou, como também as artimanhas que utilizou, estratégias discursivas e argumentativas, enredos, arquétipos, tropos de linguagem, concepções teóricas e filosofias, entre outros. (BORRALHO, Outros Tempos, 2002, p. 2) Ou seja, precisamos compreender que análises históricas não estão insentas de heranças culturais de quem as escreve, dos interesses subjetivos que por mais que se tente esconder, acabam revelados na escrita, até mesmo daqueles que buscam total imparcialidade. No artigo do prof. Henrique, Mário Meireles e seu Panorama da Literatura Maranhense, são apresentados como exemplo de clássicos da historiografia maranhense formadores de tradições inventadas, entre elas a idéia de Atenas brasileira atribuída a São Luís, que aos poucos vem sendo desmistificada por trabalhos como o da Profª. Maria de Lourdes Lauande Lacroix (2002) em A Fundação Francesa de São Luís e seus Mitos, assunto para o qual também queremos deixar nossa contribuição. Mas voltando ao centro da discussão, rebatendo ao argumento de Reis Carvalho que classifica os ateniense de inferiores, Mário Meireles (1955, p. 121) diz que “a fase não foi inferior; não, e, muito pelo contrário, essa nova plêiade veio apenas confirmar, para a terra natal, o título honroso de Atenas herdado daqueles outros”. Meireles (1955), além de rebater a afirmação de Reis Carvalho, em outras citações11 transfere a inferioridade para o grupo subseqüente, os novos atenienses, fomentando a idéia de decadentismo. Mas, existiu o Decadentismo? Para responder esta pergunta, precisamos primeiramente perceber se de fato houve esse período de glórias, precedente na literatura maranhense. Precisamos penetrar nas tradições literárias da capital maranhense, precisamos questionar e saber se esta tradição é consistente. Entendemos por consistência aquilo que não rui, que é compacto, resistente. Daí concluiremos que se realmente houve um tempo em que São Luís foi a Atenas brasileira, mais do que apenas em palavras, qualquer período posterior que não tenha se comparado culturalmente a este momento, deve ser considerado decadente. 11 Este primeiro ciclo do século XX, o quarto da literatura própria do Maranhão, e que será o penúltimo do nosso estudo, caracteriza-se essencialmente, pela reação local que se esboça, e mesmo se efetiva, embora efêmera, para restabelecer em São Luís um clima intelectual, à sombra das glórias de um século antes, que permitia aos novos, conservar para a terra,e na terra, a fama de Atenas Brasileira que aqueles maiores para ela haviam conquistado e que, com a emigração em massa dos literatos do terceiro ciclo, havia ensombrecido. Este, sim, o característico essencial, porque no mais é simples prolongamento do ciclo anterior, apenas inclinação simbolista predominando sobre as vocações poéticas. (MEIRELES, 1955, p. 163) Ao fazer esta análise devemos ter o cuidado de não incorrer em dois erros graves: o dogmatismo, que admite conceitos indiscutíveis; do outro lado, o relativismo, que subjetivisa tudo. Entendemos que a História é um processo, portanto, sempre volúvel, mutável, nunca acabada, um constante recomeço. O primeiro período da literatura maranhense simbolizado pelo Grupo Maranhense (1832-1868), é considerado como o nosso aparecimento no palco das letras nacionais quando Odorico Mendes publicou Hino à tarde – símbolo do Romantismo. Gonçalves Dias é reconhecido internacionalmente, e João Lisboa é destaque na prosa e no jornalismo. Um fato que nos chamou a atenção é que esses intelectuais, em sua maioria, alcançaram sua fama fora de sua terra natal (Maranhão), ou seja, foi apenas quando publicaram suas obras em outras regiões do país, até mesmo no exterior, é que conquistaram para São Luís o título de Atenas Brasileira. A exemplo disso temos a obra marco inicial do Romantismo aqui no Maranhão Hino à tarde de Odorico Mendes, publicada no Rio de Janeiro. O que dizer de Gonçalves Dias? Quando proferia os versos sobre terra das palmeiras, que lhe trariam o título de produto genuíno das três raças, a personificação da nacionalidade, estava bem distante de onde canta o sabiá, em terras d’além mar. Podemos considerá-los essencialmente literatos nacionais. Em pesquisa sobre esse fenômeno, Dorian Azevedo (2005, p. 26) nos fornece alguns dados, sintomáticos desse abandono da capital maranhense por parte dos intelectuais da primeira geração. Ela afirma que [...] dos 78 intelectuais maranhenses de maior evidência no âmbito de consagração literária, 61 formaram-se fora da Província, grande parte na Europa, e, posteriormente, com o surgimento das primeiras faculdades do Brasil, estudaram em Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador. Os dados revelaram também que do total pesquisado, 37 estudaram e radicaram-se fora do Maranhão, 22 estudaram fora e retornaram para morar na Província. E por último, a informação de que 16 intelectuais estudaram no Maranhão e adquiriram conhecimento através das leituras de publicações importadas e do incentivo dos primeiros mestres. Entre eles estão: • Ernesto Adolfo de Freitas: nasceu em São Luís e faleceu em Lisboa. Formado em Direito, morou e trabalhou em Lisboa; • José Joaquim Lopes: foi Barão de Matoso em Portugal, nasceu no Maranhão e faleceu no Rio de Janeiro; • Frederico Magno de Abranches: nascido em São Luís e falecido em Basse Freire (Guadalupe), formou-se em Direito em Coimbra, trabalhou como diplomata, na Guiana, no Peru, foi orador e jornalista; • Joaquim Gomes de Sousa: nascido no Sítio da Conceição, às margens do tio Itapicurú, em 1829 e falecido em Londres em 1863. Estudou em Pernambuco e no Rio de Janeiro, onde bacharelou-se em Matemática e em Paris estudou Medicina. Morou e trabalhou na cidade do Rio de Janeiro, onde foi professor. • Augusto de Frederico Collin: nascido em São Luís em 1823, foi poeta, jornalista e Secretário de Governo no Paraná. Fundou com Henriques leal, o jornal de instrução e recreio; • João Duarte Lisboa Serra: nascido no Itapecurú Mirim e falecido no Rio de Janeiro e, 1855. Formou-se em direito na Universidade de Coimbra. Foi parlamentar do Império, primeiro presidente do Banco do Brasil e presidente da Província da Bahia; • Cândido Mendes de Almeida: nascido em Brejo dos Anapurús, e falecido no Rio de Janeiro, foi professor, jurista e parlamentar. Bacharelou-se em direito na Universidade de Coimbra e foi chefe de secretaria do Império no Rio de Janeiro; • José Joaquim Ferreira Vale (Visconde do Desterro): nasceu em São Luís onde faleceu. Foi diplomata, jornalista, poeta, cônsul brasileiro na Suíça e na Alemanha. • Trajano Galvão de Carvalho: nascido em Vitória do Mearim em 1830, faleceu na capital ludovicense em 1864. Foi bacharel em Direito, expoente consagrado como precursor das letras pátrias de poesia social sobre a escravidão; • Gentil Homem de Almeida Braga: nasceu em São Luís no ano de 1835 e faleceu em 1876, formou-se em direito na Cidade de Olinda. Foi advogado, jornalista, professor e secretário de governo no rio Grande do Norte; • Augusto Olímpio Gomes de Castro: nasceu em Alcântara e faleceu no Rio de Janeiro. Foi publicista, bacharel em Direito formado pela faculdade de Recife, presidente das Províncias do Piauí e Maranhão. • Joaquim Maria Serra Sobrinho: nasceu em São Luís em 1838 e faleceu na cidade do Rio de Janeiro. Foi lente do Liceu maranhense, secretário de governo da Paraíba, diretor do diário oficial do Rio de janeiro, teatrólogo e poeta. • Joaquim José de Campos Medeiros e Albuquerque: nascido em Caxias em 1825, faleceu no rio de Janeiro em 1892. Formado em direito pela Faculdade do Recife, foi deputado geral e secretário da Província de Pernambuco, Diretor Geral do Recenseamento no Estado do Rio de Janeiro, Diretor da Secretaria do Império e Secretário do Ministério da Saúde Pública, orador e publicista. Como pôde ser percebido pelos exemplos citados, os intelectuais alcançavam sua formação acadêmica fora da Província, para onde alguns desses nomes jamais retornaram. No caso do poeta indianista Gonçalves Dias, o poema Terra das Palmeiras, contrastava com o sentimento do intelectual sobre sua terra natal expressado algumas vezes aos amigos mais íntimos como Teófilo Leal. Antes de partir da capital maranhense, revelou “sua insatisfação com a terra natal, cuja adaptação tornava-se difícil. O literato também criticou o poder das facções políticas nas decisões educacionais da cidade”. A postura do poeta era considerada escandalosa “o poeta queixava-se de ter cerceada sua liberdade de agir e opinar com franqueza”. Foi quando resolveu partir para a capital do Império a fim de conquistar sua consagração (AZEVEDO, 2005, pp. 27,28). Manoel Odorico Mendes também é outro exemplo de um intelectual que sentiu necessidade de abandonar a República das Letras. “O poeta foi um itinerante literato pela Europa, percorreu berços de tradicionais culturas, visitou a Grécia, Roma, Pisa, França e finalmente Londres, cidade aonde veio a falecer” (AZEVEDO, 2005, pp. 29, 30). Antonio H. leal nos informa que Odorico, “desgostoso das discórdias que lavravam entre seus amigos, e, por outro lado, ressentido da ingratidão dos conterrâneos, retirou-se em 1834 com a mãe e irmãos para o Rio de janeiro, não tornando jamais a ver a terra de seus amores, e por que sempre suspirou”. No tempo que permaneceu em São Luís, denunciou através da imprensa local e de obras publicadas, as práticas políticas que limitavam a liberdade de expressão: o mandonismo e o autoritarismo, característicos da São Luís oitocentistas. (LEAL, 1987, p. 24). Dos poucos que permaneceram no Maranhão, destacamos Francisco Sotero Reis e João Francisco Lisboa. Estes intelectuais tiveram que vencer as limitações da educação provincial, já citadas, para exercerem suas atividades intelectuais. Destes dois nomes citados, Lisboa era o que tinha um olhar mais crítico sobre aquela sociedade “descrevendo um cotidiano rude e desprovido da educação refinada que era considerada inerente ao ateniense de São Luís”. Em sua obra A Festa de Nossa Senhora dos Remédios, o autor “buscou evidenciar a falta de realismo, a desconexão entre as palavras e a realidade”. (AZEVEDO, 2005, p. 33). Essa crítica pode ser entendida quando nos deparamos com dados que nos informam que a sociedade maranhense àquele período contava com cerca de 80% de analfabetos, e sustentando um título de Atenas Brasileira. (MERIAN, 1988, p. 16, apud AZEVEDO, 2006, p. 34.). Diante do quadro apresentado, a idéia de uma República das Letras começa a perder o brilho. O contraste do mito com a realidade torna a Atenas Brasileira cada vez mais irreal e ilusória. Mencionando este período, Lacroix (2002, p. 77) em A Fundação Francesa de São Luís e seus Mitos afirma que [...] aquela efervescência intelectual do Maranhão no século XIX, tão cantada pelas gerações subseqüentes restringiu-se a uma pequena fatia da população branca. A retumbante descrição desse passado talvez semelhando ao de outras províncias, resultou no começo de uma fantasia de singularidade, sempre presente com o passar do tempo. (LACROIX, 2002, p. 77). O segundo ciclo da literatura maranhense, de acordo com a cronologia de Mário Meireles, são aqueles que, segundo ele, confirmaram o título de Atenas à capital maranhense, conhecidos como Atenienses. Se pudéssemos representar a atuação ou influência no palco das letras nacionais dos nossos vultos maranhenses dêsses dois ciclos, de maneira concreta para somarmos os respectivos algarismos, não sabemos se o total do primeiro seria superior à soma do segundo. (MEIRELES, 1955, p.p. 120, 121). Para Mário Meireles (1955), os dois ciclos anteriores ao Decadentismo são, em qualidade, idênticos. O contraste de idéias fica claro: para Reis Carvalho os Atenienses são inferiores ao Grupo Maranhense. Para Meireles são dois períodos de glórias; decadentes foram os Neoatenienses (1894-1932). Referindo-se aos Atenienses, intelectuais do segundo ciclo, Mário Meireles (1955 p. 121) diz que [...] o que aconteceu, e não se pode esconder, é que aquela emigração em massa de valores, dos mais cultos que temos tido, marcou o início, não queremos chegar ao exagero de dizer – de nossa decadência intelectual, mas de nossa estagnação, da diminuição de nossa atividade intelectual, mas de nossa atividade intelectiva, como se a capacidade geradora ou produtora da gleba tivesse atingido seu ponto de saturação. Talvez Reis Carvalho tenha considerado os atenienses como inferiores devido a fragmentação não só literária deste grupo, descrita por ele como mais variadas manifestações, mas também pelo abandono dos intelectuais que deixaram a capital maranhense em busca de reconhecimento e prestígio. Azevedo (2005, p. 47) nos fornece alguns dados relativos a esse período que confirmam a necessidade do intelectuais de abandonarem a capital maranhense para prosseguirem os seus estudos. De cinqüenta e oito nomes pesquisados, trinta e oito estudaram fora da Província; destes, apenas 15 retornaram para fixar residência no Maranhão. Dois nasceram fora e vieram morar na província. Três que estudaram na capital Maranhense emigraram para outros Estados. Eis o roteiro de alguns nomes que exemplificam esse quadro de formação e consagração fora do Estado: • Euclides Faria: nasceu em São Luís e faleceu em Belém do Pará em 1911. Foi poeta, e humorista; • Antonio Enes de Sousa: nasceu em São Luís em 1848 4 faleceu no Rio de Janeiro em 1920. Foi engenheiro de Minas pela Real Academia de Freiberg, Suíça; • José Antonio de Freitas: nascido no Maranhão em 1849, foi professor e literato, membro da Real Academia de ciências em Lisboa; • Celso da Cunha Magalhães: nasceu em 1849 em Viana e faleceu em São Luís em1879. Foi bacharel em Direito pela Faculdade de Recife, também atuou como poeta, novelista, crítico e magistrado. Precursor dos estudos folclóricos no Brasil, e membro da Academia Maranhense de Letras; • Juvêncio Pereira: nasceu no Maranhão e 1852 e faleceu no Ceará em 1882. Funcionário aduaneiro e poeta; • José Eduardo Teixeira de Sousa: nasceu em São Luís em 1852 e faleceu em São Luís em 1922. Formou-se e Medicina pela Faculdade do Rio de Janeiro, foi poeta, republicano e abolicionista; • Manoel de Bethencourt: nascido em Portugal em 1854, faleceu em 1916. Radicado no Maranhão, naturalizou-se brasileiro; foi chefe animador e orientador do movimento Renascença literária em São Luís no início do século XX; • João Henrique Vieira da Silva: nasceu em São Luís em 1854 e faleceu em 1890. Bacharel em Direito pela Faculdade de Recife, atuou como professor e promotor em São Luís; • Teófilo Dias Mesquita: nasceu em Caxias em 1854. Formou-se em Direito em São Paulo onde viveu e faleceu em 1889; • Raimundo Teixeira Mendes: nasceu em Caxias em1855 e faleceu no Rio de Janeiro em 1927. Foi apóstolo do positivismo republicano e filósofo; • Adelino Fontoura Chaves: nasceu em Axixá em 1855 e faleceu em Lisboa em 1884. Foi poeta, jornalista e militante na imprensa no Rio de Janeiro; • Artur Nabantino Belo Gonçalves de Azevedo: nascido em são Luís em 1855, faleceu no Rio de Janeiro, onde viveu. Foi dramaturgo, poeta, cronista, crítico teatral; fundou a Revista dos Teatros; • Raimundo Sá Vale: nasceu em São Luís em 1856 e faleceu em Gênova na Itália em 1914. Foi bacharel em Direito por Genebra onde foi professor, e atuou como cônsul do Brasil em Barcelona, Espanha; • Fernando Mendes de Almeida: nasceu no Maranhão em 1857 e faleceu em 1921; foi bacharel em direito por São Paulo; • José de Augusto Vinhais: nasceu em São Luís em 1857; foi professor de História e trabalhou como jornalista no Rio de Janeiro; • Aluízio Tancredo Belo Gonçalves de Azevedo: nasceu em São Luís em 1857 faleceu em Buenos Aires em 1913. Foi jornalista panfletário, romancista, caricaturista, poeta e diplomata. Morou em São Luís, no Rio de Janeiro e fora do país. • Raimundo Mota de Azevedo Correia: maranhense, nasceu em 1860 e faleceu em 1911. Bacharel em Direito por São Paulo, foi promotor no Rio de Janeiro, Maranhão e Minas Gerais. • João de Melo Viana: maranhense, concluiu os primeiros estudos, o curso secundário e o superior em Portugal em 1886. Formado em Medicina fundou a Revista de Medicina de Lisboa e ainda em Portugal, colaborou em vários jornais médicos e literários. Foi sócio correspondente da Academia Maranhense de Letras. Uma vez mais os literatos maranhenses necessitaram abandonar a Atenas Brasileira para obter reconhecimento profissional. A prova da falta desse reconhecimento local foi a reação de um jornal maranhense à publicação de O Mulato em 1881. O texto está reproduzido em Panorama da Literatura Maranhense de Mário Meireles. No artigo do jornal (que não tem o nome citado) Aluízio Azevedo é aconselhado a “trocar a pena por um sacho e fosse capinar nas roças do interior”... “À lavoura meu bruto, que de braços para a lavoura é que andamos carecendo” (MEIRELES, 1955, p. 173). Enquanto o jovem escritor recebia palmas e flores da imprensa nacional, aqui sofria agressões. Que Atenas é essa que execra um intelectual? O exagero com que o Decadentismo é freqüentemente apresentado fica evidente quando percebemos que as dificuldades enfrentadas pelos intelectuais maranhenses, eram as mesmas com que literatos de outras regiões do país lutavam diariamente. Adolfo Caminha, autor de obras como A normalista (1893) e Bom-crioulo (1895) relatou a realidade bem conhecida dos escritores brasileiros ao tentar publicar uma obra, traçou de forma geral, os limites do trabalho literário no país. [...] orgulhoso da obra que fez, quer publicá-la e bate à porta do editor. Este, quando não é um sujeito grosseiro, sem tino comercial, ricaço, a quem tanto faz obter mais uma edição como não obtê-la, recebe-o amavelmente, com um arzinho de bondosa superioridade, manda-o sentar e passa logo ao assunto. O discurso é o mesmo sempre: não há leitores, além disso, o romance não é do gênero que o nosso povo gosta, e tal, e coisa... [...] Acontece, finalmente, que o escritor vê-se na dura obrigação de tomar partido, e, neste caso, ou deixa ficar o livro porque a miséria o ameaça, ou, intransigente e altivo, prefere guardá-lo consigo e recolher-se à obscuridade. Em qualquer hipótese, é claro que ele só tem a perder, ele que trabalhou um ano inteiro, e às vezes muito mais, ele o artista honesto e incansável. (CAMINHA, 19-- apud El, FAR, 2000, p. 13). Celso Magalhães, tido como expoente da literatura maranhense, é um dos muitos exemplos de escritores que conheceram essa realidade de perto. Artur Azevedo conta que em 1873, Celso Magalhães entregou-lhe o manuscrito de um romance intitulado Um estudo de temperamento para ser entregue a um editor. ‘cumpri a incumbência. Mas o velho editor não quis publicar o livro, que só em 1881, depois da morte do autor, apareceu nas páginas da Revista Brazileira’. Encontram-se muitos trabalhos de Celso Magalhães nas revistas acadêmicas, publicadas no Recife.12 El Far (2000) aventa que a partir da década de 1880, a expansão da imprensa jornalística – graças ao aperfeiçoamento tecnológico - possibilitou aos escritores a chance de viver das letras, sem a obrigação de uma formação superior a que recorriam por falta de opção muitas vezes, e que garantia certa estabilidade financeira. Agora muitos intelectuais dedicavam-se exclusivamente à literatura, possibilitando a eles um papel mais atuante. Embora alguns literatos ainda continuassem presos a outras atividades, outros optaram por viver exclusivamente da própria pena, contando com uma pequena renda mensal. Assim grande parte dos literatos tornaram-se jornalistas, fazendo de tudo nos jornais. Desta forma passaram a preencher as colunas jornalísticas com poemas, críticas literárias e folhetins, entre outras atividades, até conquistar alguma fama. Afirma ainda, que [...] para compensar os baixos rendimentos, os escritores arriscavam algumas outras atividades literárias paralelas. Com o crescimento da grande imprensa, 12 Estudo lido na Academia Maranhense de Letras em 11 de novembro de 1917 (Revista da Academia Maranhense de Letras, 1917, p. 75). desenvolveu-se o anúncio publicitário [...] Para vender bem esses produtos, era necessário criar slogans que atraíssem os consumidores. Era então que se recorria ao talento dos homens de letras. (EL FAR, 2000, p. 36) A imprensa ampliou a possibilidade desses intelectuais publicarem suas obras. Muitos autores que nunca publicaram nenhum trabalho, na verdade os possuíam às dezenas, porém espalhados em revistas e jornais que possibilitavam o contato com o público, espaço para divulgar suas idéias, além de ter o nome divulgado entre a intelectualidade. Em São Luís, o Semanário Maranhense, revista literária que durou apenas um ano (1867 – 1868) editou cerca de 55 números e foi um veículo de publicação para inúmeros autores que não dispunham de outros meios para editar seus trabalhos, como atesta este fragmento de um estudo lido na Academia Maranhense de Letras, publicado no primeiro volume da revista da Academia: [...] Qual era o ambiente intelètual, enquanto circulou esse folheto, editado por Belarmino de Matttos? [...] Odorico Mendes enviou um magistral sonêto A Rossini. Souzândrade estampou nelas fragmentos dos cantos inaugurais do soberbo Guêsa errante. Gentil Braga (Flávio Reimar), que seria um dos diretores do Semanário, encheu muitíssimas colunas, com prozas e poezias. Heráclito Graça fez ali as suas primicias de bardo e conteur, sob o pseudônimo de Gamaliel. Colaboraram nele também, cultivando as belas-letras, a história, a lingüística, a critica, a economia, a política, Sotero dos Reis, Cezar Marques, A. Henriques Lial, Francisco Dias Carneiro, A. Marques Rodrigues, Nuno Álvares Pereira e Souza, o engenheiro Ricardo E. Ferreira de Carvalho, o desembargador José Ascenso da Costa Ferreira, Domingos de Almeida Martins Costa [...] Antonio Cezar de Berredo, Sabas da Costa, João Rodrigues de Oliveira Santos, Augusto Frederico Colin, Antonio Pereira Labre [...] M. Benício Fontenele, Raimundo de Carvalho Filgueiras, Rocha Borba, Túlio Beleza, Daniel Rodrigues de Souza, Sérgio Vieira, Antônio da Cunha Rebelo, Maria Firmina dos Reis, Celso Magalhães, Teófilo Dias [...]. (MAGALHÃES, 1917, p. 81). Retornando ao nome de Celso Magalhães, este escritor só conseguiu publicar uma obra, na tipografia B. de Matos, intitulada Versos que reunia seis traduções e vinte e uma poesias de sua autoria somando duzentas e quinze páginas. Intelectuais da Academia Maranhense de Letras justificavam, no início do século XX, que a ausência dos intelectuais se dava pelas péssimas condições econômicas do Estado que impediam esses literatos de permanecer no Maranhão, necessitando dessa forma, rumar para outras regiões a fim de exercer sua atividade literária. Daí a decadência da sua literatura local, quiçá passageira, porque vemos entre os moços gratas esperanças. E se esses novos, após as escursões escolásticas, se domiciliarem no torrão natalício, - é bem provável que S. Luiz recupere a sua hegemonia [...] (MAGALHÃES, 1917 p. 71). Entendemos que a ausência dos literatos não se deveu simplesmente à razões econômicas, tanto que nos anos de prosperidade da capital, dos intelectuais que saíram, poucos retornaram, como mostramos anteriormente. Na verdade não havia um ambiente literário propício para que esses escritores desejassem permanecer no Maranhão exercendo suas atividades literárias, porque como já foi visto, não havia uma educação voltada para a formação de um mercado consumidor capaz de absorver satisfatoriamente as obras desses literatos, nem havia uma sociedade educada a ponto de valorizar seus intelectuais, que em sua maioria alcançaram o reconhecimento depois de sua morte, ou em outras regiões depois de abandonarem a capital maranhense. As contradições e fragilidades das glórias intelectivas atribuídas a São Luís nesse período são reveladas nesta citação de Mário Meireles: O característico essencial deste ciclo literário do Maranhão é o fato de nossos literatos, então, terem sido antes brasileiros que maranhenses. Com efeito, todos eles, os maiores daqui se foram mal se ensaiaram na república das letras e foi lá fora, no sul do país que se revelaram ou impuseram, escrevendo como poetas e prosadores nacionais, completamente desligados do meio regional. (MEIRELES, 1955, p. 124). Queremos destacar alguns fragmentos desta citação: terem sido antes brasileiros que maranhenses[...], daqui se foram mal se ensaiaram na República das Letras[...] no sul do país se revelaram[...] completamente desligados do meio regional. Não há dúvidas de que São Luís não oferecia condições necessárias para o devido reconhecimento desses intelectuais, portanto fica claro porque eles precisaram abandoná- la para alcançarem o reconhecimento. Ora, porque atribuir a São Luís os louros da vitória desses sobreviventes intelectuais, como se aqui tivessem conquistado o prestígio nacional? Azevedo (2005, p. 50) aventa em sua pesquisa, que cerca de 80% dos literatos maranhenses alcançaram a formação superior fora do Estado, e desse número, 58% radicaram-se em outras localidades. Através de uma rápida e simples explanação, percebemos que os intelectuais nascidos na República das Letras precisaram abandoná-la para obter o tão desejado reconhecimento. Lacroix (2002, p. 132) afirma que “o ilusório da origem e a presunção da superioridade intelectual preponderam nos discursos das autoridades, embora a incerteza paire alicerçada na inconsistência”. Ao longo de todo o século XX foi forjada uma ideologia de superioridade da capital maranhense, imagem idealizada pela elite esclarecida, por pessoas que foram beneficiadas pelo sistema, até mesmo porque conseguiram alcançar a formação superior. A ideologia inversamente ao senso comum, pode ser muito sofisticada, porque é produzida por pessoas versadas intelectualmente. Por isso a ideologia é tão sagaz, porque se esconde atrás de uma linguagem erudita, o que em nossa sociedade toma forma de uma verdade indiscutível, servindo aos interesses dominantes, muito mais preocupados em fazer a máquina funcionar do que em questioná-la. Diante do que foi apresentado, nos parece que a República das letras, o mito da Atenas não se mostrou consistente, não resistiu ao questionamento simples. “Era, pois, uma característica visível da Atenas Brasileira, a incapacidade de proporcionar meios de manter em solo maranhense esses privilegiado filhos”. (AZEVEDO, 2005, p. 45). Tomando por base os aspectos educacionais e o ambiente citadino, entendemos que São Luís não oferecia condições favoráveis para o cultivo do título que recebera. A Atenas Brasileira era, na verdade, o que se queria ver, não o que realmente era. Chegamos à conclusão de que esse período de glórias perpetuado na tradição ludovicense, nunca existiu de fato, pelo menos não da forma como é apresentado pelos clássicos. Existiu apenas para um pequeno grupo de intelectuais (1894 – 1932) que arraigados a tradições inconsistentes, forjadas, passaram a reproduzir a idéia criada num período de decadência econômica do Estado, onde as elites buscavam firmar sua superioridade numa suposta singularidade intelectual em comparação com o resto do país. Se não houve República das letras, se não houve Atenas Brasileira, então não pode ser legitima a idéia de decadência intelectiva no período subseqüente – Neoatenienses (1894-1932) – o que houve, na verdade, foi a utilização de uma estratégia anteriormente utilizada por Reis Carvalho de inferiorizar um período para dar luz a outro, partindo de interpretações próprias baseadas em ideologias cristalizadas ao longo do tempo. Utilizamos Mário Meireles como exemplo, porém ele não é o único a usar o termo e a defender a idéia do Decadentismo. Vamos finalizar este capítulo conhecendo opinião de Antônio Lobo sobre o assunto: [...] Basta-nos, pois, deixar assinalado que vida literária local absolutamente a não tínhamos e que, se continuávamos condignamente representados, na cultura geral brazileira, não era absolutamente pelo que aqui fazíamos, e sim pelo que na capital do paiz operavam escritores maranhenses, muito cedo emigrados da terra natal, em busca de campos mais propício às múltiplas expansões da sua atividade espritual [...] Não fossem os seus trabalhos, na imprensa e no livro, não fossem as continuadas e brilhantes exteriorizações do seu vigor cerebral, e Atenas para nós se teria transformado de vez numa triste Babilônia de exílio [...]. (LOBO, 1909 apud MEIRELES, 1955, p. 172). Na historiografia maranhense ainda permanecem muitos termos explicativos, muitas tradições que precisam ser questionados. Não pretendemos aqui lançar por terra todas as tradições formadas ao longo do tempo, instalando um sentimento de incertezas e desilusões em relação à herança cultural maranhense, no entanto, não podemos deixar de avançar nas pesquisas, e avançar significa superar algumas tradições infundadas e inconsistentes. A perpetuação do Decadentismo na historiografia maranhense pode ser compreendida à luz de argumentos como os de Alfredo Wagner em A Ideologia da Decadência aonde o autor faz uma explanação clara de como esses conceitos são criados e cristalizados ao longo do tempo. Um conceito ou um termo, depois de criado por um autor que alcança prestígio e reconhecimento intelectual, se torna uma referência que dispensa qualquer comprovação porque uma primeira utilização erudita as confirmou, passando a ser repetida através do tempo. Assim, os autores que posteriormente tratam do assunto mostram estar em dia com a tradição letrada, como aconteceu no caso do mito da Atenas Brasileira. Nas palavras de Borralho (2000, p. 80). A presença mítica da Atenas cristalizou no pensamento um ideário de significações das mais variadas possíveis que serviu para os mais diferentes propósitos. Serviu até mesmo para justificar perante o resto do Império Brasileiro no século XIX e para o país no século XX que a província do Maranhão, e depois Estado, ainda tinha sua importância, apesar das ausências de perspectivas econômicas. Portanto, independentemente da qualidade da produção cultural do período, o mito da Atenas foi (e ainda é) usado para configurar espaço de legitimidade e legibilidade urbana, tanto por parte da elite política quanto intelectual. O mito também serviu para centrar a literatura maranhense dentro do quadro das letras nacionais [...]. Esse processo de criação mental pode ser observado quando tratamos do Decadentismo. Não temos informação segura de quando este termo foi utilizado pela primeira vez para referir-se aos Neoatenienses (1894-1832), porém, os autores que se dedicaram ao assunto, apesar das divergências que possam haver em um ou outro aspecto, não discordam nem questionam a existência desse período que mostramos não ter existido efetivamente, pelo menos, não da forma exagerada como é apresentado, em contraposição a um suporto período de glórias. A seguir veremos como a construção e cristalização desse termo – Decadentismo – foi fundamental para a afirmação de um grupo de intelectuais que buscavam prestígio no universo intelectual do Estado do Maranhão no início do século XX. Os autointitulados Neoatenienses buscavam através da constante afirmação do Decadentismo, situado por eles mesmos nos últimos anos do século XIX e início do XX, promover na opinião pública um interesse pela atuação de intelectuais que brilharam no Grupo Maranhense e dos Atenienses, e assim, considerando-se herdeiros dessa herança literária e responsáveis por ressuscitar a fama da literatura maranhense, construíram uma nova realidade baseada no fundo falso da Atenas Brasileira, através da criação de uma Academia de Letras e de rituais que legitimassem a sua existência e conferissem à atividade literária um novo status que os beneficiasse, sob o pretexto de recuperar o foros da literatura local. 3 ACADEMIA MARANHENSE DE LETRAS: DISCURSO SALVACIONISTA E FOMENTAÇÃO DO DECADENTISMO. A nossa história literária, pessimamente sabida, e feita, em geral, num espírito de cuja excelência me atrevo a duvidar, está cheia de lendas, que a nossa preguiça de investigar vai aceitando, sem reflexão, sem crítica. José Veríssimo No capítulo anterior mostramos como era difícil para um literato viver, no final do século XIX, apenas da sua produção intelectual, dadas as condições educacionais e sociais do Estado, e não apenas do Maranhão, como da maioria dos Estados brasileiros, inclusive da capital do país, Rio de Janeiro. Manoel de Jesus Martins (2002, p. 122), referindo-se aos intelectuais maranhenses do início do século XX, afirma que a tentativa de renascimento cultural (1899) – que veremos adiante – encetada àquele período, visava “remontar um ambiente capaz de dar publicidade a suas produções intelectuais [...] Afinal, atuando na imprensa, o intelectual tinha amplas possibilidades de alcançar sucesso e reconhecimento e de ampliar suas idéias para um público mais diversificado [...]”. Nascidos muito mais do voluntarismo da intelectualidade do que de uma demanda expressiva de um mercado consumidor exigente, no início do século XX podemos observar o surgimento de inúmeros periódicos e revistas, em sua maioria, de curta duração, reflexo do desejo dos literatos de vulgarizarem suas obras, num ambiente que não favorecia o viver da pena. São registradas cerca de 210 publicações periódicas, algumas de curtíssima duração, entre os vinte últimos anos do século XIX e os vinte primeiros anos do século XX. Entre os jornais que alcançaram maior destaque na capital, temos: • Diário do Maranhão • A Pacotilha • Federalista • O Imparcial • O combate • A Hora • A Tarde As revistas também foram importantes veículos de contato entre os escritores e seus leitores. Entre as que mais se destacaram temos: • Revista Elegante (moda) • Revista Maranhense (artes, ciências e letras) • Revista do Norte (conhecimentos gerais) Estas iniciativas foram importantes no sentido de [...] dar vazão à produção intelectual da elite letrada maranhense, que publicando os trabalhos para a vulgarização jornalística quer editando obras de maior densidade. De qualquer modo, serviram para projetar no cenário local uma boa parcela dos novos atenienses, a seguir integrados aos corpos redacionais e diretivos dos órgãos de maior longevidade (MARTINS, 2002, pp. 122, 123). O surgimento da Imprensa Oficial, em 1905, não contribuiu para amenizar a situação dos literatos de forma geral, uma vez que favoreceu a publicação das obras “daqueles intelectuais ligados de alguma forma aos jogos de poder vigentes”. Quanto aos que não dispunham de recursos para financiar seus projetos, ficavam “à espera de uma indicação de seus trabalhos para publicação por alguns integrante das camadas diretivas da situação política vigorante” (MARTINS, 2002, p. 125). Apesar de existir em São Luís um parque tipográfico moderno, os entraves enfrentados pelos escritores (desvinculados do poder público) para publicação de uma obra fazia com que os jornais ainda fossem os intermediadores entre esses autores e o público leitor. Apesar de escreverem em jornais e revistas de grande circulação e desfrutarem de um reconhecimento desconhecido em outras profissões, nossos literatos do início do século XX ainda viviam sob o espectro da instabilidade financeira e falta de prestígio, fato visível na hora de negociar seus escritos em jornais e editoras. Apesar de mediar o contato entre os escritores e seus leitores, os textos impressos nos jornais tinham suas desvantagens, pois eram diariamente substituídos por outros e logo descartados. Somente na publicação de livros os intelectuais viam a possibilidade de não caírem no esquecimento. Publicar um livro em fins do século XIX não era tarefa tão simples. As editoras preferiam a publicação de romances franceses, muito populares entre as classes abastadas, pelo fato de ainda não existir o pagamento de direitos autorais, no caso dos livros europeus traduzidos, garantindo assim a venda desse tipo de literatura, em detrimento dos autores brasileiros. O analfabetismo era outro fator que limitava o trabalho de quem queria viver das letras. Em muitos casos, o próprio escritor financiava as primeiras edições. Vejamos o caso de Aluísio Azevedo, sob o pseudônimo de Vítor Leal em O Combate de 1892, onde conta sua experiência ao tentar publicar uma obra na capital do país. Aluísio Azevedo tem quase ano e meio um volume de contos a publicar-se na casa Mont’ Alverne, hoje Companhia Editora; e, apesar de haver pago adiantado a primeira folha da composição, ainda não teve o prazer de ver uma página impressa do seu livro; outro e outros homens de letras queixam-se de iguais contrariedades, e não é natural que alguém se disponha a escrever com boa vontade, tendo uma obra encalhada no prelo. [...] hoje, no Rio de Janeiro, dar um livro à publicidade é quase tão difícil como viver, ou talvez mais ainda, se atendermos ao que por aí vai pelas tipografias e casas editoriais (O Combate, 1892 apud EL FAR, 2000, pp. 39, 40). Enfrentando baixas remunerações e diminutas oportunidades no mercado editorial, que ainda privilegiava os autores consagrados e romances vindos da Europa, os homens de letras, dividiam-se entre a carreira literária e outras atividades que complementassem a renda mensal. Entre as principais atividades, encontramos: professores, funcionários públicos e jornalistas. Em outros casos, encontramos nomes que ocuparam cargos relevantes na política, mas que se dedicavam ao cultivo das letras nas horas vagas, escrevendo poemas, contos, romances, entre outros gêneros. Essas considerações nos levam a compreender o porquê da adesão de literatos à idéia de fundar uma academia de letras num Estado de tão poucos leitores. A inauguração de uma academia – numa época em que, sob influência do Positivismo, as instituições científicas eram vistas como uma porta de acesso ao mundo dos homens ilustres e respeitados pela sua produção intelectual – poderia proporcionar, através da afirmação da importância das letras nos debates nacionais, além do status, a possibilidade de ascensão social. Aqui, trataremos de mostrar como um grupo heterogêneo de literatos que forjou e usufruiu de mitos, ritos e ideologias, para justificar e legitimar, através do viés institucional, a sua existência que, na realidade, tinha como prioridade conferir aos seu integrantes o reconhecimento social. Isto nos faz compreender porque foi primordial para os fundadores da Academia Maranhense de Letras cristalizar a idéia de um período de decadência intelectual do Estado do Maranhão, pois, foi através dessa ideologia e transferindo para si a responsabilidade de “reinstaurar a altas e indiscutíveis” qualidades literárias desta terra, que os fundadores da AML13 legitimaram a necessidade dessa agremiação literária. 3.1 “A regeneração intelectual” 13 A fim de que não se torne cansativa a constante repetição, a partir daqui utilizaremos esta sigla para nos referirmos à Academia Maranhense de Letras. O ano de 1899 é considerado o marco inicial da reação neoateniense contra o decadentismo, o início de uma reunião de esforços no sentido de reinstaurar as “altas e indiscutíveis tradições de inteligência e cultura intelectual” destas plagas. (MEIRELES, 1955, p. 164). Foi neste ano que a passagem de Coelho Neto pelo Maranhão – num período em que a repercussão do abalizado escritor correspondia ao apogeu do seu prestígio social – marcou o movimento que ficou conhecido como Regeneração intelectual. A reação iniciada em 1899 provocou a formação de um grupo de intelectuais que se intitulou Novos Atenienses, identificados no tempo como aqueles nascidos entre as décadas de 1870 e 1890, contando com alguns nomes expressivos pertencentes à geração anterior, como Sousândrade e César Marques. Nas palavras de Martins (2002, p. 85) os Novos Atenienses eram [...] promessas intelectuais em busca de afirmação situadas no centro da tensão e do desconforto de descortinar e construir o futuro, sem, contudo, esquecer-se do passado mitológico, onipresente, herdado dos ‘gigantes’ da velha Atenas, a partir daquela realidade movediça, em que o ideário decorrente de ‘civilização’ e ‘progresso’ fazia prosélitos e instigava esses jovens intelectuais à reação ante semelhante estado de coisas denotador das glórias amealhadas nos tempos áureos do dinamismo provincial. Para eles a situação reinante era a convocação incisiva para que interviessem concretamente naquela realidade decadente, visando apontar soluções para o presente, capazes de projetar um futuro glorioso, tendo como artefato fundamental o passado mitológico da Atenas Brasileira [...]. Manoel de Béthencourt14 é o nome apontado como figura exponencial desse reavivamento, e considerado grande agitador da “reação”. Além de liderar as cavatinas, como eram chamadas as reuniões para palestras noturnas que colocavam os jovens em contato com obras de renome do Brasil e do Exterior, Béthencourt também orientou o 14 Manoel de Béthencourt, português de origem, brasileiro naturalizado, foi professor de Filosofia do Liceu Maranhense, atividade que o aproximou da juventude secundarista de sua época [...] suas idéias ficaram expressas nas colunas dos vários jornais em que atuou, inclusive sua obra mais importante: o romance crônica A Crise (1902), em que problematiza a sociedade do Maranhão, especialmente a de São Luís [...]” (MARTINS, 2002, p. 109). surgimento de dois periódicos importantes, porém de efêmera duração na época: O Estudante e Philomatia. O Centro Caixeiral15, em São Luís, foi um importante endereço para reuniões e acaloradas discussões entre jovens intelectuais que, motivados pelo ideal de restabelecer na terra os foros de cultura ateniense, começam a fundar uma série de sociedades culturais efêmeras, com vôos curtos e repetidos sem direção certa. Entre elas: • Oficina dos Novos • Renascença Literária • Grêmio Literário Maranhense • Cooperação Sotero Reis • Clube Nina Rodrigues • Grêmio Odorico Mendes • Sociedade Literária Barão do Rio Branco • Távola do Bom Humor De todas estas iniciativas, a Oficina dos Novos é considerada a que mais expressou o ânimo da elite maranhense reacendido pela passagem de Coelho Neto em junho de 1899. Fundada em 28 de julho de 1900, a Oficina dos Novos “visava cultuar os vultos do passado maranhense, dar publicidade à produção intelectual dos autores da Terra timbira, promover eventos cívicos, literários e similares [...]” (MARTINS, 2002, p. 128). Em 5 de agosto já fazia circular a primeira edição do seu periódico intitulado Os Novos , declarado evolucionista. No entanto, com apenas um ano de existência a Oficina já sofria os abalos que levariam à total ruína. Divergências ideológicas levaram à dissidência do movimento, afastando do seu quadro nomes que acabaram por fundar outras instituições literárias, como as Oficinas da Renascença e posteriormente a Academia Maranhense de Letras. Sobre o fim da Oficina dos Novos Jomar Morais (1981, p. 60) afirma que 15 Fundado em 1890 sob os auspícios do segmento de caixeiros empregados no comércio de São Luís, desejosos de constituir uma sociedade promotora de instrução para seus membros (MARTINS, 2002, p. 127). A Oficina dos Novos terminou morrendo de inanição, assim como, anterior e posteriormente a ela, dezenas de entidades do gênero sucumbiram extenuadas pelo muito que fizeram, ou frustradas pelo que pretenderam e não conseguiram, ou ainda pelo claro convencimento de sua absoluta inutilidade. Apesar da movimentação realizada naquele período, no sentido de desfazer o suposto clima decadentista, todas as iniciativas malogravam invariavelmente. Não é esta a primeira vez que me encontro entre camaradas na maioria filhos da terra de tão alto renome, concorrendo com meu pequeno esfôrço, para a organização de um núcleo predisposto á cultura desse vasto campo de frutos proveitozos, que é o domínio das letras. E, porque assim falei, não é esta a primeira vez que se congregam, nesta cidade rapazes cheios de entusiasmo, num vivo desejo de lhe acrescer o movimento mental. Tantas e tão malogradas têm sido as instituições literárias que aqui surgiram, dês que entrei para as vigorozas filuras do batalhão estudantal, que enumerá-las seria uma dolorosa tarefa, numa ocasião como esta, em que aqui estamos reunidos, para assistir ao alvorecer de mais uma agremiação desse gênero [...]. Ainda não houve, nesta terra, uma associação literária que pudesse gosar, por muito tempo, os proventos cobiçados e contidos nas linhas dos seus programas. O desânimo, filho da desorganização, é uma praga que se alastra assustadoramente, cerceando os alicerces de tais instituições [...] (São Luís, O Ateniense, Março/Abril de1920. Nº. 18). 3.2 Academia Maranhense de Letras 3.2.1 A réplica nas letras do art nouveau Academo, herói ateniense da guerra de Tróia (século XII a. C.), ajudou a Castor e Pollux encontrarem sua irmã Helena, raptada por Theseu. Por isso, quando os lacedemônios devastaram a Àtica, em respeito à sua memória, pouparam a terra a noroeste de Atenas, que lhe havia pertencido. Foi, então, transformada em "Jardim de Academo", do qual se originou o vocábulo Academia, dado à escola dedicada às musas, criada no apogeu da civilização grega, 387 a.C., por Platão, célebre filósofo grego (429-347 a.C.), discípulo e amigo de Sócrates (468-400 a.C.). Consistia em uma residência, uma biblioteca e um jardim. Nesse local, à sombra das árvores, durante quarenta anos, Platão reunia seus discípulos, com vistas a contribuições da filosofia, da matemática, da astronomia, da legislação e da música. Abrigou intensa atividade filosófica, professando um ensino informal por meio de lições e de diálogos entre mestres (ACADEMIA DE LETRAS DE VIÇOSA.Portal ALV-História da ALV.htm). As academias da antiguidade grega serviram de modelo para quase todas as instituições de nível superior do Ocidente, inclusive a academia francesa, que tinha como principal objetivo de fundação estabelecer normas para a língua francesa. Importando o modelo francês, a Academia Maranhense de Letras torna-se um exemplo vivo da “imitação servil”, descrita por Antônio Cândido (1989) em Literatura e subdesenvolvimento. Nas palavras de El Far (2000, p. 18): [...] os padrões europeus adotados por esses escritores, formando ao seu redor um agrupamento aristocrático em relação ao homem inculto, não passavam de um exercício de mera alienação cultural. Dissociando-se de sua terra e tendo como foco de atenção os aspectos estrangeiros, esses literatos demonstravam sua dependência literária, típica de um subdesenvolvimento cultural. Provavelmente, entre as razões para a criação da academia francesa, não estava a preocupação de valorizar o mercado das letras, nem o de inserir os intelectuais na elite francesa, uma vez que dela já faziam parte. Portanto, para a AML, os traços franceses foram copiados ou modificados para conferir sentido dentro da cultura do Estado tomando significado diferente tanto do modelo francês, quanto da Academia Brasileira. A idéia de uma academia de letras não era novidade no início do século XX, diversos grupos de literatos pelo país afora desejavam estabelecer um novo padrão de sociabilidade literária, queriam destaque dos outros setores da sociedade intelectual16. A exemplo disso temos a fundação da Academia Brasileira de Letras, fundada em 20 de julho de 1899 com o objetivo de preservar a pureza e o prestígio da língua portuguesa, e também, defender os artistas da palavra escrita, objetivos semelhantes (em partes) ao da fundação da Academia Francesa fundada em 1635, que tinha por intenção ser um órgão regulador da língua e propunha a organização de um dicionário que tornasse a língua francesa mais pura e eloqüente (EL FAR, 2000, p. 31). 16 Em 1724, nasceu em Salvador, então sede do governo geral, a Academia Brasílica dos Esquecidos, primeira sociedade brasileira destinada ao cultivo das letras e das ciências naturais. Após produzir três volumes de trabalhos literários e históricos, essa associação desapareceu antes de completar um ano. A Academia do Felizes, fundada em 1736 no Rio de Janeiro, funcionou durante quatro anos com 30 sócios. Mas suas reuniões que tratavam de assuntos vários, assim heróicos, com líricos, costumavam ficar suspensas por longos períodos. A Academia dos Renascidos, criada em 1759 na Bahia, tinha por objetivo fazer renascer a Academia dos Esquecidos (EL FAR, 2000, pp. 55, 56). No Maranhão, a criação de uma academia de letras destinava-se ao cultivo das letras pela ação coletiva ou individual dos seus membros, onde buscavam resgatar as glórias intelectuais perdidas durante o suposto Decadentismo. Para os literatos maranhenses do início do século XX, urgia salvaguardar esse passado de glórias que, segundo eles, suplantava o de todas as outras províncias. Domingos Barbosa afirmava: Somos uma terra de gramáticos...pelo menos, é assim que todos, a uma voz, nos apelidam [...] Não sei, assim de terra que tenha origem mais fidalga, nem seja mais nobre pela velha e pura linhagem da inteligência e do saber. E, desde os seus princípios até hoje – haveis de perdoar ao maranhense a imodéstia da afirmação – não sei qual possa arrolar maior número de nomes famozos do que os daquêles que entre nós têm cintilado, assim nas ciências como nas letras (BARBOSA, 1917, p. 53). Godofredo Viana confirmava a necessidade de fazer deste grêmio uma sementeira de glórias legítimas. Para ele, a iniciativa de criar uma academia de letras os tornaria os edificadores, os obreiros, os guardas do augusto edifício. Ribeiro do Amaral endossava o discurso, reforçando a idéia de que era um dever dos intelectuais daquela geração fazer reviver as glórias do passado, interrompidas pelo Decadentismo das gerações anemiadas do final do século XIX que se arrastava até aquele início de século. Como acabais de ver, srs., somos nós, os do Maranhão, depozitários duma grande e precioza herança; temos um brilhante passado a defender. Pois então, quando por toda a parte se manifesta um incontido dezejo de acompanhar de perto o desenvolvimento intelectual dos povos cultos; quando todos os estados, como que à porfia, manteem já as suas agremiações literárias, algumas delas muito bem organizadas, que se entregam ao estudo e aprofundado exame das doutrinas e questões literárias e científicas; quando, finalmente, assistimos, no nosso paiz, à reunião de congressos de toda sorte, não seria na verdade de lamentar-se que nos deixassemos ficar quêdos, ou que por vãs razões, contribuíssemos para que se quebrantasse o zelo dos que ainda desejam e querem trabalhar? Por certo que não. Foi esta a cauza que prezidiu à criação desta coletividade” (AMARAL, 1916, p. 6). Seguindo a orientação intelectual do momento, numa época de fundação de instituições que “objetivavam afirmar e perpetuar suas visões de mundo” foi fundada em São Luís a Academia Maranhense de Letras em 10 de Agosto de 1908, com o propósito de desenvolver a cultura intelectual e defender as tradições literárias do Maranhão e ainda, manter um intercâmbio de idéias com os centros de atividades culturais do Brasil e do exterior (MARTINS, 2002, p. 125). O jornal A Pacotilha de 11 de Agosto de 1908 noticiava o acontecimento: A Academia Maranhense de Letras Na reunião convocada para a Biblioteca Pública, ficou fundada a Academia Maranhense, de quem fazem parte, como fundadores os drs. José Ribeiro do Amaral, Clodoaldo de Freitas, I. Xavier Carvalho, Barbosa de Godóis e Godofredo Viana, e Antonio Lobo, Fran Paxeco, Alfredo de Assis, Vieira da Silva, Astolfo Marques, Domingos Barbosa e Corrêa Araújo. Para alguns autores, como Mário Meireles (1955), a Academia Maranhense de Letras foi uma transformação da Oficina dos Novos, pelo fato de alguns operários17 terem participado como membros fundadores da Academia, entre eles: Godofredo Viana, Vieira da Silva e Astolfo Marques, no entanto, Jomar Morais, ex-presidente da AML, discorda e observa que a relação destes intelectuais com a Oficina dos Novos já não ia além do apoio e da simpatia. Jomar Morais faz esta afirmação baseado no registro de atividades concomitantes das entidades nos jornais da época. Um jantar de confraternização foi registrado entre as duas confrarias no Hotel Central em 15 de novembro de 1908, ou seja, as duas instituições existiram ao mesmo tempo, mesmo que por um curto período em razão do término da Oficina. O imóvel localizado na Rua da Paz, nº. 84 Centro, construído para sediar a Escola de Primeiras Letras da Freguesia de N. Senhora da Vitória, sediava a Biblioteca Pública do Estado quando no salão de leitura deste prédio às 19 horas do dia 10 de agosto 17 Assim eram denominados os membros da Oficina dos Novos. de 1908, fundou-se a Academia Maranhense de Letras tendo como nome tutelar a figura de Gonçalves Dias, e solenemente instalada no dia sete de setembro do mesmo ano. O Profº. José Ribeiro do Amaral, por força de disposição estatutária18, foi o primeiro presidente da Academia, Astolfo Marques foi escolhido secretário geral e Alfredo Assis como bibliotecário-tesoureiro. Durante muitos anos, a AML não dispôs de sede própria, por isso as reuniões eram realizadas nas casas dos próprios acadêmicos, ou em outros salões cedidos pela Assembléia Legislativa do Estado, pelo Grêmio Lítero Recreativo Português e pela Associação Comercial, entre outros. Através do decreto nº. 92 de 19 de novembro de 1918, o Governador Urbano Santos considerou a AML de utilidade pública, determinando que fosse instalada no edifício a ser construído para a Biblioteca Pública e que a imprensa oficial editasse sua revista. Porém, somente no governo de Sebastião Archer (1947-1951), depois de construída a nova sede para a Biblioteca Pública, a AML recebeu como doação do Estado – Lei nº. 320 de 03.02.1949 – o prédio que abrigou por duas vezes a Biblioteca Pública do Estado e que quarenta e dois anos antes sediou a primeira reunião dos membros fundadores da Academia Maranhense de Letras. 3.2.2 Do Quadro e das obras No seu tempo e no seu meio a maior glória que possa conquistar um homem é ser literato. Mas como ser um literato? Há duas maneiras: ou nascer literato ou entrar para a Academia. O desembargador resolveu o seu problema pela segunda fórmula, isto é, entrando para a Academia. A Academia é uma sina de glórias literárias com capital ilimitado. O desembargador fez-se seu acionista e ficou sendo literato, apesar do seu discurso de entrada [...]! Antônio Torres 18 Por ser o mais velho entre os confrades, de acordo com o artigo 15º, parágrafo 2º, do Estatuto: ‘Não se obtendo maioria absoluta, far-se-á segundo escrutínio entre os dois mais votados, considerando-se eleito o que alcançar maioria relativa, ou o mais antigo no quadro dos Acadêmicos, se ocorrer empate’. (ESTATUTO E REGIMENTO INTERNO. Academia Maranhense de Letras. Tipografia: São José, São Luís, 1962). A seguir, apresentamos o quadro dos membros oficialmente considerados fundadores da AML. José Ribeiro do Amaral (03.05.1853 – 30. 04. 1927) Nascido em São Luís, estudou no colégio de N. S. da Glória do qual ele depois foi educador. Fundou o Colégio de S. Paulo, e como funcionário público dirigiu o Liceu Maranhense e a Biblioteca Pública. Catedrático de Geografia e História do Liceu Maranhense, e membro fundador do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão . Na Academia Maranhense de letras ocupou a cadeira nº. 11, patrocinada por João Francisco Lisboa. Antônio Lobo (04. 07. 1870 – 24. 06. 1916) Autodidata versado em Sociologia e Biologia. Colaborador em diversos periódicos, falou sobre política, ficção, crítica literária e ciência. Na AML, como membro fundador, ocupou a cadeira nº. 14 patrocinada por Nina Rodrigues. Foi professor da Escola Normal e do Seminário das Mercês. Dirigiu o Liceu Maranhense, a Instrução Pública e a Biblioteca Pública. Inácio Xavier de Carvalho (26. 08. 1871 – 17. 05. 1944) Bacharel em direito pela Faculdade de Recife, foi Juiz Substituto Federal no Maranhão; magistrado, jornalista e poeta. Na AML, ocupou a cadeira nº. 09, patrocinada por Gonçalves Dias. Com a ampliação do quadro de membros, tornou-se patrono da cadeira nº. 37. Domingos Barbosa (28. 11. 1880 – 26 12. 1946) Nascido em São Luís foi jornalista, contista, dirigiu a Imprensa Oficial, foi Secretário de Estado no Maranhão e deputado estadual. Foi membro fundador da AML e secretário; inaugurou a poltrona nº. 2 sob patrocínio de Aluísio Azevedo. Fran Paxeco (09. 03. 1874 – 17. 09. 1952) Português de origem chegou ao Maranhão em 1900. Jornalista, professor, historiógrafo, geógrafo, orador e diplomata. Foi lente do Liceu Maranhense, professor “Honoris Causa” da antiga Faculdade de direito do Maranhão. A serviço do seu país foi cônsul no Maranhão e Pará, no Brasil, e Cardiff e Liverpool, na Inglaterra, e Secretário da Presidência da República e da Comissão de Fomento da Exploração Portuguesa. No Brasil, além de sócio correspondente e membro de várias instituições culturais. Fez parte do grupo fundador da AML ocupando a cadeira nº. 05, sob patrocínio de Celso Magalhães. Barbosa Godóis (10. 11. 1860 - 04. 09. 1923) Graduado em direito pela Faculdade de Recife, foi Procurador da Justiça Federal no Maranhão e também se dedicou ao magistério. Foi professor na Escola Modelo e na Escola Normal do estado. Na AML escolheu a cadeira nº. 01, patrocinada por Almeida Oliveira. Raul Astolfo Marques (11. 04. 1876 – 20. 05. 1918). Nascido em São Luís, foi jornalista e tradutor, contista e ensaísta. De origem humilde, iniciou sua carreira trabalhando na Biblioteca Pública como servente. Diz-se dele, que “lutou bravamente nos começos para galgar uma posição de destaque na vida social e literária de sua terra”. Juntamente com Antônio Lobo fundou a “Oficina dos Novos” e posteriormente a AML, onde ocupou a cadeira nº. 10, sob o patrocínio de Henriques Leal. Alfredo de Assis (14.01. 1881 – 29. 12. 1977). Bacharel em Direito, foi desembargador do Tribunal de Justiça do Maranhão, filólogo, crítico, poeta, jornalista e professor. No magistério foi Catedrático de Português e Literatura na Escola Nacional do Maranhão e diretor do Liceu Maranhense. Na administração pública, foi diretor da Biblioteca Pública do Estado e secretário geral do Estado. Membro fundador da AML inaugurou a Cadeira nº. 07, patrocinada por Gentil Braga. Correia de Araújo (29. 05. 1885 – 24. 08. 1951) Nascido na cidade de Pedreiras, formou-se em Direito pela Faculdade do Maranhão e foi lente de Sociologia e História Universal no Liceu Maranhense. Dirigiu a Biblioteca Pública do Estado; foi jornalista e poeta. Na AML preferiu a cadeira nº. 16, patrocinada por Raimundo Correia. Clodoaldo Freitas (07. 08. 1855 – 29. 06. 1924) Natural do Piauí foi poeta, historiógrafo e ensaísta. Era sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e da Sociedade de Geografia do Rio de Janeiro. Membro efetivo das Academias de Letras do Piauí e do Maranhão, aqui, ocupou a cadeira nº. 18, sob o patrocínio de Sousândrade. Em 1916 Clodoaldo Freitas passou de membro efetivo para sócio correspondente da AML. Godofredo Viana (14. 07. 1878 – 12. 08. 1944) Nascido em São Luís, formou-se em Direito pela Faculdade da Bahia e exerceu o Ministério Público no Maranhão. Professor de Direito do Maranhão, foi Deputado Estadual e Federal. Eleito governador (1922 – 1926) dedicou-se, nos últimos anos da sua vida à ficção. Na AML fundou a cadeira nº. 05 patrocinada por Odorico Mendes. Vieira da Silva (30. 08. 1887 – 09. 10. 1940) Bacharel em Direito, foi Procurador Regional da República no Maranhão; foi oficial do gabinete de Governo do Maranhão e diretor da Imprensa Oficial. Escritor e poeta. Sócio efetivo da AML, nela inaugurou a cadeira nº. 08, patrocinada por Gomes de Sousa. Antônio Costa Gomes (09. 05. 1880 – 16. 12. 1915). Maranhense, militou na imprensa e escreveu poesias. Segundo Antônio Lobo, era “um emotivo e um simples, tipo genuíno do nortista, de alma singela e bondosa”. Na AML ocupou a cadeira nº. 03, sob patrocínio de Arthur Azevedo. Justo Jansen (16. 03. 1864 – 18. 08. 1930) Natural de São Luís foi doutor em medicina e professor catedrático de Geografia Geral e Corografia do Brasil do Liceu Maranhense. Na Escola Normal lecionou Física, Química e Mineralogia. Sócio correspondente de várias associações estrangeiras como a Societé de Astronomie, de Paris e a Sociedade de Geografia, de Lisboa. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e da Academia de Geografia de Lisboa. Membro do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e da Academia Maranhense de Letras escolheu a cadeira nº. 04, patrocinada por Cândido Mendes. José Luso Torres (10. 11. 1879 - ?) Nascido no município de São Bento, interior do Estado, cursou a Escola Militar, sendo posteriormente, reformado ao posto de General. Na carreira política foi prefeito de São Luís e Interventor Federal no Estado. Fundou a Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e foi membro da Sociedade de Cultura Artística do Maranhão. Foi conselheiro técnico do Diretório Regional de Geografia e colaborou como cronista na “Pacotilha”. Na AML ocupou a cadeira nº. 06, escolhendo como patrono Frederico José Corrêa. Clodomir Serra Serrão Cardoso (27. 12. 1879 – 30. 07. 1953) Nasceu em São Luís e faleceu no Rio de Janeiro como Senador da República. Alternou o exercício da advocacia com a política, tendo sido Deputado Estadual e Federal e Senador duas vezes pelo Maranhão. Foi prefeito de São Luís e Interventor Federal. Durante o regime do Estado Novo fez parte do Conselho dos Estados. Na AML inaugurou a cadeira nº. 12 sob patrocínio de Joaquim Serra. José de Almeida Nunes (20. 02. 1882 – 27. 08. 1940) Nasceu em São Luís e formou-se em medicina pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Foi secretário particular durante o governo de Luís Domingues(?), quando este governou o Estado. Na AML inaugurou a cadeira nº. 13 patrocinada por José Cândido de Morais e Silva. José Augusto Correia (03. 08. 1854 – 16. 02. 1919) Filho da capital maranhense lecionou no Seminário das Mercês, entre outras instituições em São Luís. Como funcionário público, desempenhou os cargos de Delegado Fiscal e Inspetor da Alfândega. Também colaborou na imprensa local. Como membro fundador da AML preferiu a cadeira nº. 13 patrocinada por José Cândido Morais e Silva. José Américo dos Albuquerques Maranhão Sobrinho (25. 12. 1879 – 25. 12. 1916) Natural de Barra do Corda. Levou vida boêmia. Dele, Mário Meireles disse: “De uma fecundidade quase assombrosa, Maranhão Sobrinho, que morreu aos Trinta e seis anos, deixou poesias que se contam às centenas, algumas desperdiçadas na pedra das mesas de botequins. Só os seus maravilhosos sonetos são mais de trezentos”. Na AML, escolheu a cadeira nº. 19, patrocinada por Teófilo Dias. Benedito de Barros Vasconcelos (31. 07. 1879 – 10. 05. 1955) Nascido em São Luís, formou-se em Direito pela Faculdade do Rio de Janeiro; foi jornalista, magistrado e escritor. No Maranhão foi Secretário da Fazenda, Consultor Jurídico do Estado e Presidente do Conselho do Estado. Membro fundador do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão e da AML, ocupando a cadeira nº. 20, sob o patrocínio de Trajano Galvão. Destes nomes, alguns foram acrescentados somente a partir de 1916 com honras de membros fundadores, elevando o quadro membros, ocupando também vagas deixadas por membros falecidos. Até 1918, já haviam falecido: Antonio Costa Gomes, Maranhão Sobrinho, Antonio Lobo e Raul Astolfo Marques. Foram recebidos como membros: Justo Jansen, Augusto Corrêa, Raimundo Lopes, Almeida Nunes, J. da Costa Gomes, Clodoaldo Cardoso e Benedito de Vasconcelos. O Artigo 4º do Estatuto da Academia previa que só poderiam ser aceitos como membros efetivos escritores que fossem nascidos no Maranhão e aqui residissem, exceção apenas para Fran Paxeco e Clodoaldo Freitas, o primeiro português e o segundo piauiense, porém, atuaram decisivamente na fundação da agremiação. Portanto, com exceção destes dois nomes, todos os outros membros eram maranhenses, sendo que pelo menos onze eram ludovicenses e os outros nascidos no interior do Estado como Luso Torres, natural de São Bento, Antônio Lopes, natural de Viana e Maranhão Sobrinho, natural de Barra do Corda, entre outros. Em relação ao grau de instrução pelo menos dez membros haviam feito curso superior que variava entre Medicina e Direito, um havia cursado a Escola Militar e o restante havia concluído o ensino secundário. Os que alcançaram instrução superior geralmente estavam ligados a alguma esfera de poder, ocupando cargos federais, ou outros cargos públicos nas instituições do governo, como escolas e a Biblioteca Pública do Estado, entre outras instituições, outros ainda, atuavam nos veículos de comunicação escrevendo em jornais e revistas. A média de idade entre os acadêmicos variava. Encontramos entre os membros fundadores em 1908, desde moços como Correia de Araújo e Vieira da Silva que tinham 21 e 23 anos respectivamente, até Ribeiro do Amaral, um dos mais experientes com 55 anos de idade. Dos que ingressaram a partir de 1916 para compor o quadro de membros, se dá o mesmo, como por exemplo, temos Raimundo Lopes que ingressou na Academia aos 23 anos e Augusto Correia que já contava com 62 anos. Analisando essa questão da idade, percebemos que é considerável o número de acadêmicos com idade entre 20 e 30 anos (cerca de sete acadêmicos) em relação aos mais experientes, acima de 50 anos, que eram apenas cinco – entre 30 e 40 anos eram aproximadamente seis – o que reforça a idéia de que acima de qualquer discurso proferido pelos acadêmicos, o que eles realmente buscavam era a estabilidade econômica e o prestígio social. Tampouco era homogênea a situação econômica desses literatos, bem como o posicionamento social dos membros da AML, que em sua maioria, pertenciam às famílias da elite e obtiveram a possibilidade de estudar fora do Estado, como o costume da época entre as famílias mais ricas. Este era o caso de nomes como: Inácio Xavier de Carvalho, Barros Vasconcelos, Almeida Nunes, Clodomir Cardoso, Godofredo Viana, Antônio Lopes da Cunha, Barbosa Godóis, Alfredo de Assis, Justo Jansen e Correia de Araújo. Maranhão Sobrinho geralmente é citado como filho de uma das melhores famílias do Estado. Sobre Justo Jansen, José Ribeiro do Amaral em seu discurso de recepção ao novo confrade, disse: [...] Oriundo de uma das mais notáveis e tradicionais famílias desta terra, cujos membros, em todos os tempos, se teem ilustrado nas lutas do forum, da imprensa e da política, é o sr. Dr. Justo Jansen um nome feito, no estado e fora dele, quer como clínico, quer como professor, dos mais competentes[...]” (AMARAL, 1916, p. 6) Em contrapartida, Raul Astolfo Marques é registrado como tendo origem humilde, tendo trabalhado na biblioteca Pública como servente. Outros membros eram, em sua maioria, funcionário públicos, como por exemplo, José Ribeiro do Amaral, reconhecido professor do Liceu, funcionário público e proprietário do colégio São Paulo. Antônio Lobo, também funcionário público, jornalista e professor, entre outras atividades, amplamente conhecido entre a juventude estudiosa. Fran Paxeco atuava como cônsul português no Maranhão, entre outras atividades de cunho intelectual. Essas diferenciação financeira determinou relações as mais diversas com o mundo literário, aqueles que se dedicavam exclusivamente à produções intelectuais, geralmente reclamavam de dificuldades financeiras. Outros que se dedicaram preferencialmente a outras atividades deixando a função de escritor para as horas vagas, conseguiram manter seu alto padrão de vida. Outros ainda, como Astolfo Marques venceram a pobreza graças ao trabalho literário. Embora fossem nomes conhecidos àquele período, ainda não desfrutavam do status almejado pelos homens de letras que buscavam através da institucionalização o reconhecimento, não só entre a elite, mas uma forma de divulgar as suas obras com maior amplitude. El Far (2000. p. 65) aventa que “os literatos ambicionavam uma autoridade em relação ao discurso literário, e a criação de uma academia de letras poderia propiciar-lhes uma projeção intelectual jamais alcançada[...]”. Ainda no art. 4º do Estatuto de 24 de julho de 1916, está previsto que para o ingresso no quando de membros da AML era necessário ter publicado pelo menos um livro de valor, ou seja, que obtivesse reconhecimento na impressa e entre o público leitor. Justificava-se esta exigência “tão só da necessidade de termos ante os olhos um trabalho em bloco, que, numa rápida vista de conjunto, para logo dê notícia bastante dos requizitos de quem nos bata as portas [...]”(BARBOSA, 1916, p. 39). No entanto, esse critério dentro da Academia nem sempre foi respeitado, denotando que para o ingresso na AML outras questões falavam mais alto. Em 29 de agosto de 1918 foi proposto na AML o ingresso, como membro efetivo da Academia, o nome de Clodomir Cardozo, porém, o pequeno detalhe dele não ter nenhuma obra de valor publicada, logo foi remediado com a seguinte explicação: Propomos, para membro efetivo desta associação de letras, o dr, Clodomir Cardozo. Disposmos os nossos estatutos que somente podem pertencer a esta Academia escritores que tenham publicado pelo menos um livro de valor, nós ao interpretarmos, há tempos, aquele dispozitivo, assentamos em que a espressão livro, ali empregada, não quer dizer livro volumozo, mas sim e tão só bom livro. E esta companhia literária bem o entendeu, resolvendo assim, porque o contrário seria preferir estensão á qualidade. Um estudo, por mais rápido que fosse, dos trabalhos entre nós vindos a lume, nos tempos mais chegados, para logo colocaria em lugar de alto e merecido destaque os discursos pronunciados pelo dr. Codomir Cardozo, ao inaugurar-se a estátua de João Lisboa e ao celebrar-se o jubileu de Rui Barboza, aquêle por nós editado e este já no prelo, em adiantado serviço de impressão[...] (BARBOSA, 1916, p. 173). Não custa lembrar a ampla participação de Clodomir Cardozo na esfera política, como aventamos anteriormente na sua biografia. No caso de Raimundo Lopes o critério previsto no art. 4º do estatuto também não parece ter sido o principal apoio ao seu ingresso na Academia. A publicação do Torrão Maranhense apenas confirmou o que parece ter sido uma indicação anterior à publicação da obra, como expressa Domingos Barboza em seu discurso de recepção a Raimundo Lopes: [...] Ha, alem dessa exigência, a circustáncia de que pouco faz que retiraste o vosso livro dos prelos. Ainda se lhe não evolou de todo o acre cheiro embriagador das tintas que o imprimiram. Nem ainda se escoou por inteiro a oportunidade de sobre ele dizerem críticos que dêle ainda não disseram [...] (BARBOSA, 1916,p. 39). Em 1917 foi lançada por Godofredo Viana, a proposta de inserção de Almeida Nunes no quadro de membros efetivos, porém, Almeida Nunes havia se dedicado à carreira médica, e não possuía nenhuma obra de cunho literário nos moldes que eram exigidos por este tipo de agremiação. Nunes adentrou ao rol de sócios da Academia por meio de uma trabalhado intitulado Cezariana Conservadora, que só pelo título já causa estranheza, ainda mais quando utilizado como cartão de entrada em uma agremiação literária que visava restaurar as características literárias do Maranhão. Mas a despeito de qualquer crítica que essa indicação pudesse despertar, Godofredo Viana correu a defendêlo: Não se trata, como o seu título o está desde logo indicando, de uma obra puramente literária. No modo, porém, porque foi desenvolvida a matéria sobre que versa (nada mais seco e árido do que discorrer acerca da Cezariana Conservadora), estão a meu ver as provas do seu grande merecimento. Porque, devendo ser, como de praxe, apenas uma enfiada de termos técnicos, ouriçados e campanudos, que uma linguajem quaze sempre descuidada liga, entre si, áspera e desarmoniozamente, escapa por milagre a essa regra, tem ritmo, tem fórma, sem nenhum prejuízo do rigor científico, deixando transparecer o artista da palavra escrita, em toda a nobreza do seu elegante mister [...] Não quero, por desnecessário, ir ao encontro de duas objeções que podem acazo ocorrer [...] A primeira, já ele de antemão a rebatia com afirmar que lhe não parece que ‘um trabalho valha menos por ter sido concebido em pequeno modelo, calcado em restritas fórmas; mas valha pela sua grandeza, pelo seu tamanho, que pela idéa conteúda’ [...]. Quanto á outra, diga-se apenas que é evidente não dar toda e qualquer téze de doutoramento á entrada nesta caza. Mas fora absurdo sustentar que com uma téze de doutoramento, escrita em puro vernáculo, com estilo e com arte, não se lhe possa transpor dignamente a umbreira (VIANA, 1917. pp. 57, 58) A rigidez do art. 4º que exigia um livro de valor parece ter sido abandonada gradualmente. Alguns intelectuais passaram a defender uma noção mais abrangente de literatura. Para esses literatos o valor exigido pelo estatuto acadêmico poderia ser encontrado em outros trabalhos que não fossem necessariamente romances e poesias. Apesar dos argumentos apresentados, o que importava aos acadêmicos era a introdução de nomes importantes que pudessem fazer da Academia um lugar respeitável e de grande influência, já que apenas o discurso não bastava. Para chamar a atenção da elite, era preciso alargar as fronteiras da literatura e buscar uma comunicação maior com as outras áreas do saber. Desta forma, entre o grupo de sócios eleitos a partir de 1916, também considerados membros fundadores, temos geógrafos, historiadores, juristas, médicos e políticos. O caráter literário das obras variava tanto quanto o caráter intelectual dos membros. Temos discursos variados, trabalhos sobre geografia, medicina, contos infantis, poesias, romances, trabalhos jurídicos, entre outros. 3.3 O poder/saber: uma faceta do poder/cultura Foucault criou o termo Tecnologias de Poder. Para ele o poder nem sempre age apenas por meio da violência, o poder também cria verdades que funcionam como legitimação do poder. Foucault acreditava que por meio do estudo do discurso o historiador poderia descobrir o momento em que novas tecnologias de poder são introduzidas. Patrícia O’Brian (2001) afirma que para cada discurso, texto ou evento, ele colocava a mesma pergunta: Onde está o poder nesse conhecimento? Partindo desse pressuposto apontado por Foucault, analisaremos de forma geral o discurso decadentista dos neoatenienses investigando não apenas as tecnologias de poder introduzidas na linguagem desses intelectuais, como também o efeito produzido. Através do estudo do discurso desses intelectuais tentaremos identificar as estratégias através das quais os homens de letras da AML impuseram uma ortodoxia, uma espécie de leitura autorizada daquela época impedindo novas abordagens ou interpretações diferentes daquele período. Em História e Teoria Social Peter Burke (2002), destaca a necessidade de, no estudo do discurso, levar em conta não apenas as mensagens e os emissores, mas também os canais, códigos e cenários. Chartier (2001, p. 154) aventa que “o significado da mensagem depende não (ou não somente) das intenções do indivíduo que a transmite, mas das regras que constituem o código, ou em outras palavras, sua estrutura”. Os neoatenienses sócios da AML encontravam nas reuniões da academia a situação mais favorável para a exposição dos canais – linguagem (discursos); códigos – forma de linguagem: falsa modéstia e linguagem erudita, estrangeirismos, invenção da tradição literária; e do cenário – solenidades e Decadentismo. 3.3.1 Canais / Discursos Discursos falados nas solenidades públicas ou escritos no órgão impresso da Academia foram os principais meios de comunicação entre os intelectuais da AML e a sociedade. Chartier (2001, p. 214) afirma que o discurso é uma das principais estratégias utilizadas quando se quer legitimar uma verdade, de forma explícita ou implícita, “Transformado o texto num mecanismo que deve, necessariamente, impor uma compreensão considerada legítima”. Este autor aventa que a maioria dos textos tentam, abertamente, omitir sua própria condição de discurso buscando, desta forma, produzir no nível prático, comportamentos ou práticas que sejam considerados legítimos ou úteis. Porém, ele afirma que [...] as apropriações culturais também nos permite ver que os textos ou as palavras destinadas a configurar pensamentos e ações nunca são inteiramente eficazes e radicalmente aculturados. As práticas de apropriação sempre criam usos ou representações redutíveis aos desejos ou às intenções daqueles que produzem os discursos e as normas. (CHARTIER, 2001, pp. 133, 134). A seguir, faremos uma breve análise de algumas estratégias utilizadas pelos intelectuais da AML em seus discursos proferidos em solenidades públicas na presença da alta sociedade e de autoridades, onde buscavam alcançar o prestígio e a legitimação da Academia. a) Falsa modéstia / Vernáculo O estudo dos discursos desses intelectuais registrados na revista da Academia nos permitiu perceber que a estrutura dos discursos segue, quase invariavelmente, o mesmo modelo: introdução exprimindo uma modéstia exagerada, cooptando assim a simpatia do público, linguagem extremamente rebuscada denotando a erudição dos sócios e diferenciando-os do restante da população, utilização de uma segunda língua que geralmente era o latim ou o francês, tudo isso somado à louvação do passado em detrimento do presente decadente que os conclamava (os acadêmicos) ao soerguimento cultural, justificando a existência daquela instituição. Vejamos alguns exemplos da “modéstia” com que sempre iniciavam suas falas públicas: Minhas senhoras Meus senhores A’ nímia bondade dos srs. Membros da Academia Maranhense, elegendo-me para tão elevado posto, devo a subida honra de vos dirigir a palavra neste momento. E, já que assim o quiseram, começarei confessando toda a nossa maior gratidão – deles e minha, - a vós que, atendendo ao convite, vos dignastes de concorrer a tão modesta festa literária, emprestando-lhe, com a vossa prezença, um desuzado brilho. Penhora-nos tamanha gentileza. (AMARAL, 1916, p. 5) Referindo-se a Cândido Mendes, a quem escolhera como patrono, Justo Jansen disse: [...] Para descrever todas as feições com que ele se manifestou, a mim me falta competência. Para não deixar no olvído tantas jóias com que dotou as nossas letras, escasseia-me o fulgor do talento, o primor do estilo e a grandeza da erudição. Animando-me a tratar de algumas modalidades de tão alto engenho, ampara-me a convicção de que a superioridade dos seus lavrores suprirá, eficientemente, a carência do meu saber e a deficiência da minha linguagem [...] (FERREIRA,1916, p. 7). Em outros fragmentos encontramos: Meus senhores Mulheres da minha terra Minhas crianças O império dos estatutos da Academia é que responde pela minha prezença aqui. De outra forma, não de esplicaria tanta falta de luz, nesta sessão, luz que só a palavra de Domingos Barboza, nas suas rutiláncias mágicas, ou a erudição de qualquer outro dos meus pares, poderia trazer”. (CARVALHO, 1917p. 60). [...] meus senhores, não quero ocupar a vossa atenção por mais tempo. Seria fatigar-vos. Sinto que as minhas poucas luzes e os meus sofrimentos façam de pouco valor o auxílio que posso prestar a esta corporação, que contém em si tão grande espoente intelètual. Só me resta agradecer-vos a minha ecolha. E crede que, no que depender de mim, farei para me não distanciar muito de vós. (CORREA. 1916, p. 26) É interessante notar como a modéstia dos discursos contrastava com os rasgos de elogios proferidos de uns para os outros, numa lógica que funcionava assim: o sócio que assumia o posto se desmerecia e exaltava os companheiros, em contrapartida recebia louvores dos confrades que o recebia, o que resultava numa intensa troca de simpatias que elevava o status intelectual de cada um. Celebra a Academia Maranhense, neste instante, a sua primeira sessão solene [...] para receber no seu seio o sr. Dr. Justo Janen Ferreira. [...] Oriundo de uma das mais notáveis e tradicionais famílias desta terra(...) Ninguem, portanto, mais digno da honroza investidura que vai receber agora, e, em compensação, também nada de mais auspiciozo para esta Academia do que a aquizição que acaba de fazer de um homem do valor intelectual e moral do novo acadêmico”. (AMARAL, 1916, p. 6) Não sei que mais vos agradeça; se a honra que me conferis, elegendo-me para esta escelsa missão, se o ensejo que dadivozamente me proporcionais de prestar desta tribuna [...] a homenagem ao mestre ilustre, que transpõe hoje os mubrais desta Academia, inundando-a com o brilho do seu talento e enobrecendo-a com o prestígio do seu nome e da sua fama. Prestígio escoimado dos rumores da inveja; fama já serena pela superioridade do seu quilate [...]. (VIANA, 1916 p. 12). Meus senhores Subida é a honra de me sentar entre vós. Aqui encontro José Ribeiro do Amaral, esse educador emérito, paciente bibliógrafo e profundo historiador das coizas da pátria; o dr. Godofredo Viana, juiz que honraria a própria Inglaterra, quer pelo seu saber jurírdico e literário, quer pela inteireza do seu caráter de magistrado; o dr. Justo jansen Ferreira, grande clínico e geógrafo de provada erudição; o dr. Alfredo de Assis, jornalista, poeta, orador e burilador da formoza língua de João Lisboa, que ele cultiva com competência tal que ninguém o poderá esceder; Fran Paxeco, essa inteligência de ecol, esse erudito, esse grande vulto literário; Luzo Torres, essa fôrça altiva, esse estilista, esse homem superior, que nunca se curvou senão á virtude e à justiça; Domingos Barboza, que, como jornalista, é o nosso segundo Timon, como orador, um émulo de Antonio Lobo; Inácio Carvalho, Corrêa de Araújo e Vieira da Silva, esses poetas que sabem honrar a terra de Gonçalves Dias; Astolfo Marques, que tem ilustrado as letras pátrias e moureja, com pena diamantina, no nosso jornalismo; o dr. Barboza de Godóis, cujos serviços á instrução pública são de alto valor [...]. (CORRÊA, 1916, p. 22) b) Estrangeirismos Agora veremos exemplos de utilização da linguagem estrangeira em discursos públicos como mecanismo de diferenciação e como uma faceta do poder. [...] Não nos desonra a sombra que se espéssa em torno de nós. Notabilita-nos o esforço que fazemos para vencê-la. Car sais-tu qui vaut de vivre uniquement? L’effort! Qui rend sacré l’être lê plus infime”. (VIANA, 1916, p. 15) [...] Ela era, enfim, o contemplativo da Vizão de Brama, um romântico, susbstituindo a todas as paixões a paixão absoluta do Ideal, que lhe inspirava estas palavras como vidas: Dors! Ó Blanche victime, em notre ame profonde Dans ton linceul de vierge et ceint de lotos... Dors! L’impure laideur est la reine du monde Et nous avons pordu le chemin de Paros... (LOPES, 1917,p. 29) Burke afirma (2002, p. 135) que “a linguagem é, como o consumo, um meio utilizado por alguns grupos socais para se distinguirem dos outros”. A estratégia de utilizar uma segunda língua nos discursos, era muito comum entre os intelectuais, e tornava-se importante no sentido de diferenciá-los das outras camadas sociais, causando grande impressão no público. Com o passar do tempo, essas cerimônias tornaram-se cada vez mais solenes, salientando sua importância social. Isto pode ser observado nesta notícia do jornal O Postal de 23 de janeiro de 1919 Academia Maranhense Em sessão solene, effetuada em II do corrente, no salão de honra do congresso Estadoal, foi recebido pelo brilhante litterato Domingos Barboza, o acadêmico snr. Dr. Almeida Nunes. A essa bella reunião compareceu todo o mundo official exmas. senhoras, graciosas senhorinhas e cavalheiros da nossa fina flor social [...]. c) Construção da memória: Invenção da tradição literária Talvez a maior particularidade dessa instituição que buscava afirmação social, foi a oficialização de uma história da literatura maranhense, e com ela a construção de um passado para as nossas letras, elaborando uma história oficial das obras e dos autores mais importantes do Estado. [...] No próprio culto que rendemos aos nomes dos que nos engrandeceram e nobilitaram os dias idos, não vizâmos somente a homenagem que o dever nos reclama de cada um de nos, e a todos nos ordena. Evocâmo-los tanto para maior glória sua como para exemplo aos de hoje, de modo que possamos bem preparar os dias de amanhã. (BARBOSA, 1917, p. 37). Para tanto, além de reunir dados biográficos e literários, passaram a adotar patronos para cada uma das cadeiras da Academia. Esses patronos deviam ser intelectuais maranhenses, já falecidos e que marcaram a história literária do Estado, ou seja, na ausência de um passado literário estruturado, organizar-se-ia uma genealogia elevando alguns nomes para que formassem, de repente, o capital simbólico da instituição. [...] Sem história, não pode haver tradição, nem nacionalidade, assim como sem memória não pode haver individualidade. [...] esse movimento, porém, limitarse-á a um surto de imperialismo ou de militaria, se não for inspirado, idealizado pelo culto das glórias [...]. ( Revista da Academia Maranhense de Letras, 19161919, p. 101). Ao organizar o passado, até então espalhado, os literatos forjariam uma história oficial, uma memória literária que vinha corroborar aquela instituição que nascia cheia de tradição. Esta prática estava prevista nos art. 10 e 11 do estatuto que diziam: Art. 10. – Cada uma das vinte cadeiras de membros efectivos terá um patrono, escolhido, pelo membro efectivo que primeiro a ocupar, entre os literatos maranhenses já estintos, sujeita essa escolha á aprovação da Academia. Art. 11. – Todo o membro efectivo é obrigado a fazer o estudo crítico da obra do patrono da sua cadeira, devendo os empossados fazê-lo em sessão magna, previamente marcada pela Academia, e, na ocazião da solenidade da sua posse, os que daqui por diante forem eleitos. Os escolhidos para as vagas que se forem abrindo, depois de completo o quadro dos efectivos, estudarão, por sua vez, a obra literária do seu antecessor”. (Revista da Academia Maranhense de Letras, 1916-1918, p. 4). Ao conferir a determinados literatos o status de patrono da Academia, os fundadores estavam, instituindo um passado de glórias da literatura local, que era reafirmado de tempos em tempos através de rituais. O acadêmico que tomava posse, obrigatoriamente teria que fazer um discurso de homenagem ao patrono e aos antecessores da cadeira para qual fora eleito, por fim um membro designado anteriormente ficava responsável de dar as boas-vindas ao novo sócio. Assim ficou composto o quadro de membros e respectivos patronos: Cadeira Patrono Membro Nº. 1 Almeida Oliveira Barbosa Godóis Nº. 2 Aluízio Azevedo Domingos Barbosa Nº. 3 Arthur Azevedo Antônio Costa Gomes Nº. 4 Cândido Mendes Justo Jansen Nº. 5 Celso Magalhães Fran Paxeco Nº. 6 Frederico Correia Luso Tôrres Nº. 7 Gentil Homem de A. Alfredo de Assis Braga Nº. 8 Joaquim Gomes de Vieira da Silva Sousa Nº. 9 Gonçalves Dias Inácio Xavier de Carvalho Nº. 10 Antônio Henriques Raul Astolfo Marques Leal Nº. 11 João Francisco Lisboa José Ribeiro do Amaral Nº. 12 Joaquim Serra Clodomir Cardoso Nº. 13 José Cândido de Almeida Nunes Morais Nº. 14 Nina Rodrigues Antonio Lobo Nº. 15 Odorico Mendes Godofredo Viana Nº. 16 Raimundo Correia Correia de Araújo Nº. 17 Sotero dos Reis José Augusto Correia Nº. 18 Joaquim Sousândrade Clodoaldo Freitas Nº. 19 Teófilo Dias Maranhão Sobrinho Nº.20 Trajano Galvão Barros e Vasconcelos Tabela 1: Quadro de membros efetivos da Academia Maranhense de Letras em 1920. Somente os ocupantes das cadeiras 1, 2, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15, 16, 18, participaram da fundação da AML em 1908, os outros nomes foram incorporados a partir de 1916. É interessante notar que com esta prática de eleger patronos, os intelectuais determinavam quais literatos era dignos de eternização, podendo desta forma, eleger os próprios pares já falecidos, tornando-os imortais e elevando ao posto dos grandes nomes da terra. Assim, os acadêmicos da AML, entravam para o rol dos grandes intelectuais. O caso mais sintomático é o de Maranhão Sobrinho. Apesar de ser filho de uma rica família do interior do Estado, Maranhão Sobrinho levou uma vida boêmia e morreu ainda muito jovem aos trinta e seis anos e sem nenhum reconhecimento, a não ser pelo fato de ter sido membro fundador da AML. Mário Meireles (1955) ao escrever o Panorama da Literatura Maranhense, afirma não haver a inclusão do nome de Maranhão Sobrinho em nenhum dos compêndios de Literatura nacional. Por meio da AML, Maranhão Sobrinho teve seu nome imortalizado, quando após a sua morte foi escolhido patrono da cadeira nº. 21 fundada por Raimundo Lopes e veementemente defendido por Domingos Barbosa. [..] Como que a compensar, porém, incide, ao mesmo tempo m raio consolador de bondade, a espalhar benéfica luz reparadora, melhor aclarando a memória de tão alto poeta e artista tão fidalgo, e que o grosso das turbas queria quaze que apenas ver o boémio descuidozo que por ele passava, indiferente e incompreendido, a tanger a sua lira de oiro, sem atentar nos ranídeos que coaxavam na vaza, nem nos ninhos que meigamente se calavam para o ouvir... A’queles talvez pareça algo estranho que, num lugar de estudo e de recolhimento, como deve ser este nosso, se inscreva o nome de um vate notámbulo, de um revoltado contra um sem-número de para ele prementes convenções sociais, no alto de um muro que ele aliás ajudou eficazmente a erguer. Estes, porém, os que integralmente o compreenderam e deleitozamente o escutaram, olharão sempre para ali com a vaga unção, quaze religioza [...] (Revista da Academia Maranhense de Letras, 1917, ?) Em 1921, cinco anos após a sua morte, o nome de Maranhão Sobrinho já fazia parte de uma lista de homens ilustres do Maranhão, organizada pela entidade Legião Ateniense. A lista foi divulgada no jornal pertencente a este clube literário. E não só Maranhão Sobrinho ocupava um lugar na lista como também José Augusto Correia, Antônio Lobo, Astolfo Marques e Antonio Costa Gomes. Posteriormente, com o aumento do número de cadeiras, nomes como Antonio Lobo, Raimundo Lopes e I. Xavier de Carvalho também tornaram-se patronos. Os outros que não se tornaram patronos passaram a ter suas obras relembradas por seus sucessores. No intuito de construir esse passado literário, outro método utilizado pelos acadêmicos através de textos escritos, cultivo da memória visual por meio de fotografias, pertences, monumentos e, especialmente, sessões comemorativas abertas ao público. A AML procurou formar ao longo dos anos uma galeria de retratos de todos os membros e patronos. Entre 1916 e 1918 houve intensa movimentação no sentido de traçar uma memória literária para o Estado. As principais medidas tomas foram: • Inauguração da estátua de João Lisboa e confecção de uma obra literária sobre a vida do jornalista; • Reimpressão de inéditos de Sotero dos Reis e de trabalhos de Nina • Comemoração do primeiro centenário do nascimento de Cândido Mendes; Rodrigues; • Estudos realizados em sessões públicas sobre Celso Magalhães e Gonçalves • Discursos homenageando Sotero dos Reis, Maranhão Sobrinho, Almeida • Autorização do Congresso Estadual para publicação da Seleta Maranhense Dias; Oliveira; de Astolfo Marques; Na visão de Martins (2002, p. 98), [...] o problema fundamental para esses novos atenienses era dar conta da montagem dessa trajetória intelectual. Com efeito, remontar uma continuidade das teias evolutivas da produção intelectual maranhense não indicava constituir-se uma tarefa cuja consecução fosse produzida pelo voluntarismo evidente na postura de muitos desses intelectuais. Ao contrário, definir as linhas mestras da formação cultural do Maranhão significava identificar com clareza meridiana a ausência de vida cultural orgânica (ARANTES, 1997, p. 17), a falta de seriação de idéias, a ausência de uma genética (ANDRADE Apud SODRE, 1984, p. 65). 3.4 Decadentismo: um mal necessário A partir deste ponto, veremos como a Academia Maranhense de Letras conseguiu sobreviver apoiando-se no discurso decadentista; ou seja, ao mesmo tempo em que responsabilizava-se por mudar tal estado de coisas, reafirmava através do seu discurso o mito (Decadentismo) que legitimava a sua existência, baseando-se na eterna evocação do passado glorioso. Malinowisk (1926 apud BURKE, 2002, p. 1420) afirmou que os mitos são histórias com funções sociais, ou seja, “é uma história sobre o passado que em suas palavras, faz por vezes de um alvará para o presente”. Entendemos que a fomentação do Decadentismo pela AML, tornou-se uma prática necessária para a legitimação dessa instituição que aparentemente não teria utilidade social real. Desta forma, se fez mister construção de uma linha evolutiva que resultasse na fundação da AML, passando pela edificação da idéia de um presente decadente em relação ao passado glorioso, de duas gerações que respiravam intelectualidade, como se fossem dois grupos coesos – que além de não terem sido grupos no real sentido da palavra, mostramos que na realidade não alcançaram sua consagração no torrão natalício – no caso o Grupo Maranhense e os Atenienses. Ao preconizar esse passado de grandes feitos evidenciando o presente decadente, responsabilizavam-se como herdeiros e guardiões desse patrimônio, e a AML seria o instrumento utilizado por eles no cumprimento da nobre missão. Na realidade, o que a árdua tarefa camuflava era o desejo de auto-promoção e destaque no mundo dos homens de letras protegidos pelo viés institucional. Vejamos um fragmento do discurso proferido por José Ribeiro do Amaral, na ocasião presidente da instituição, em sessão realizada pela AML em 30 de dezembro de 1916. [...] Não me posso esquivar também nessa ocazião, ao dever de dar ao público e solene testemunho de boa vontade, constáncia e decidido empenho de que, na hora prezente, na hora de incertezas e desfalecimentos, se acham possuídos os poucos, mas fevorozos cultores das letras que aqui vedes, e que, com o mais nobre esforço, procuram zelar, para transmitir intactas aos vindoiros, as tradições gloriozas desta terra querida, tradições que se afirmam de modo inequívoco, imperecedoiro, nesta trindade augusta que foi – em João Lisboa, o insigne politico doutrinário do Jornal de Timon, o lúcido crítico da vida do padre António Vieira, o grande historiador das duas invazões; em Gonçalves Dias – o poeta soberano ao mesmo tempo majestozo e doce cantor dos Timbiras; em Odorico Mendes, enfim – o helenista e latinista exímio, o familiar de Homero e Virgilio [...] (AMARAL, 1916, p. 5) Ribeiro do Amaral destaca a boa vontade dos fervorozos cultores das letras, referindo-se aos acadêmicos da AML; rotula o presente como hora de incertezas e desfalecimentos reforçando a idéia do Decadentismo e finaliza evocando o passado glorioso nas figuras de João Lisboa, Odorico Mendes e Gonçalves Dias, todos pertencentes ao Grupo Maranhense: o modelo de intelectualidade. Adiante, Amaral justifica a importância da agremiação uma vez que “somos nós, os do Maranhão, depozitários duma grande e precioza herança: temos um brilhante passado a defender” (AMARAL, 1916, p. 6). Nesta sentença fica evidente que os decadentistas viviam muito mais com os olhos no passado do que no presente. Isto se tornará evidente na ausência de medidas efetivas de reavivamento intelectual por parte da AML, como veremos adiante. Nesta mesma sessão do Dia 30 de dezembro de 1916, Godofredo Mendes Viana ao tomar a palavra proferiu um discurso de recepção a Justo Jansen como sócio da academia, e desdobrando-se em elogios ao confrade, como era de costume nos discursos entre os acadêmicos diz: [...] Vida invejável, vida fecunda, que bem poderia servir de incentivo a estas gerações anemiadas, que não conhecem a tenacidade que faz milagres, a santa obstinação que mais avança quanto mais lhe estorvam os passos, a confiança que não esmorece, o dever que nunca entibia. Gerações, que o apêlo supremo de Bilac tenta galvanizar na sua indolência profunda, no seu enervamento indescritível, e sobre as quais caiu a palavra esbrazeada de Miguel Pereira, Palre di dolore, accenti d’ira Senão grito de alarma na noite de nosso descazo, da nossa imprevidência, do nosso marasmo, da nossa ignorância, no nosso criminozo desamor á terra que tão querida nos devera ser (VIANA, 1916, p. 16) Mas uma vez, a tônica do discurso perpassa pelo Decadentismo, o elemento imprescindível. Nas palavras de Viana, o presente é uma geração anemiada, doentia, indolente, imprevidente, ignorante e desprovida de amor à terra. A seqüência de adjetivos pejorativos que reforçam o mito é seguida pela exaltação da instituição a que pertenciam, o discurso salvacionista é imediatamente contrastado à decadência, pintando em cores bem vivas a missão da AML. [...] Vós pertenceis, sr. Dr., a essa plêiade brilhante que é a esceção a confirmar a regra, para nós dolorozissima. Sois um digno continuador da obra e do esforço daquele cujos trabalhos admiráveis vindes desdobrar aos nossos olhos. Sois da raça dos fortes, dos que não conhecem os desânimos, nem se embriagam com os primeiros triunfos [...] (VIANA 1916, pp. 16, 17) Viana confirma a idéia de que a decadência intelectual era a regra do presente vivido naquela sociedade, a intervenção daquela realidade era a missão da AML, a exceção. A dualidade de conceitos fica evidente na utilização de termos que passam a cristalizar-se com o tempo: Decadência X Reação; Regra X Exceção; Doentes x Forte, Passado glorioso X Presente incerto. José Augusto Corrêa em sessão solene realizada em 30 de dezembro de 1916, dá sua contribuição reforçando a idéia preconizada por seus colegas: [...] Esta é a verdade. A reacção impõe-se. Possa esta Academia com a sua influência moral, catequizando como Spencer, trazer uma pedra para a regeneração de um tal estado de coizas, que é deplorável (CORRÊA, 1916, p. 26). A 12 de maio de 1917, Domingos Barboza em discurso de recepção a Raimundo Lopes, criou o cenário de uma verdadeira batalha, os acadêmicos são comparados à figura romântica de um cavaleiro medieval destemido. [...] E’ pois, com justificado júbilo que vos vemos receber, nesta hora, a pranchada que vos arma cavaleiro na hoste em que pelejamos, e envergar brial e elmo de cruzado, para a reconquista de uma Jeruzalem talvez ainda distante, mas por todos nós muito amada, qual a do reerguimento mental desta terra, que é nossa e que foi a mais literária do Brazil, no seu passado [...]. (BARBOZA, 1917, p. 37). Adiante, Domingos Barboza exclama cheio de ufanismo: [...] Vede, assim quanto é grato ao Maranhão, que se ufana de ser a mais literária das terras brasileiras [...] eu vos saúdo, em nome dos homens de letras do Maranhão [...]. (BARBOZA, 1917, p. 54). Fica evidente que o discurso heróico que os transforma quase em mártires pela cultura, também proporciona a posição de destaque e o prestígio social tão almejado pelos literatos: serem intitulados Homens de Letras. Ser um homem de letras em um país de analfabetos conferia ao portador do título certo status social. Nas palavras de Barboza, ser um membro da AML “não deixa de ser um prêmio[...] porque, com ele, vos dizemos o nosso aplauzo ao que já tendes feito [...]”(BARBOZA, 1917,p 37). Ou seja, o tão esperado reconhecimento. Antonio Lobo (apud MEIRELES, 1955, p. 172), considerado um dos grandes nomes da reação neoateniense, afirma que, passadas as glórias deixadas pelo Grupo Maranhense e com a morte do Semanário (1968) “começou então para o Maranhão essa tristíssima e calijinosa noite, em que por tão longos tempo viveram imersas suas letras, noite cortada, por vezes, pelo clarão fujidio de algum astro errante, que para logo ia eclipsar na morte, ou perder-se na distância a que era impelido pelas inelutáveis fatalidades da sua trajetória”. Martins ao analisar a noção de decadência, esse conceito tão recorrente na história do Maranhão, afirma que [...] Para os novos atenienses, o problema da decadência da lavoura havia assumido a dimensão de algo auto-evidente na estrutura discursiva dos intelectuais regionais envolvidos com esse tema, passando também a informar os discursos a respeito de outros níveis da realidade maranhense [...] Isto é, o período de vigência dos neo-atenienses foi por eles afirmado e reafirmado ulteriormente como um período de decadência cultural à toda prova”. (MARTINS, 2002, p. 101) O Decadentismo nas letras maranhenses era para os neoatenienses uma verdade incontestável, e sempre reafirmada em seus discursos. De fato, o Maranhão vivia em pleno estado de decadência social e educacional, como mostramos nos capítulos anteriores, porém para os intelectuais da AML, o motivo da decadência literária estava na “fuga dos espíritos”, no abandono das “grandes mentes”, que se foram do Estado. Pregavam que pelo cultivo das letras o Maranhão poderia voltar a desfrutar as glórias já experimentadas no passado e para isso, apresentavam a instituição como o instrumento necessário para esta realização. 3.5 AML e o combate ao Decadentismo Fundam-se Academias; todo maranhense, hoje, é acadêmico. Iniciam-se grêmios; todo maranhense, hoje, pertence a uma agremiação – seja de lettras, seja de football intelectual. Realizam-se commemorações cívicas e civilistas [...] mas o pensamento, entretanto, é vasio, todo o craneo é oco [...]. O Postal, 23 de julho de 1918 Durante todo o período analisado, aproximadamente os dez primeiros anos após a fundação da AML, a realidade vivida pela Academia ficou muito distante do discurso dos seus integrantes. A intenção inicial de fazer da Academia um grande instrumento reavivador das glórias passadas não foi suficiente para fazer alavancar um projeto que promovesse alguma mudança efetiva. Talvez porque o interesse em obter afirmação social tenha sido mais intenso do que, de fato, trabalhar em prol do soerguimento mental do Estado. Isto pode ser verificado na movimentação registrada na primeira revista publicada pela Academia, que compreende os anos de 1916 a 1918, e assinala as ações efetuadas por este grupo de intelectuais. A vida da Academia nesses primeiros doze anos de existência foi marcada pela apatia e inexistência de intervenção naquilo que justificava a existência dessa instituição – o Decadentismo. Basta observarmos que após a sua fundação em agosto de 1908, acontece um esmorecimento tal, que só haverá registro de alguma atividade a partir de julho de 1916. A existência da Academia até esse período será, nas palavras de Domingos Barbosa, “meramente virtual” e só a partir dali (1916) passou “realmente a viver”. (Revista da Academia Maranhense de Letras, 1918, p. 168). Porém, as atividades da AML a partir de 1916 são caracterizadas não pela ação dos intelectuais em prol do reerguimento mental desta terra, mas pelo empenho daqueles literatos em estabelecer o vínculo da Academia com os círculos da elite política e social maranhense. Mesmo não conseguindo, de início o incentivo político almejado, a AML foi fundada na esperança de angariar algumas regalias, através de futuras leis aprovadas pelo Governo, já que alguns acadêmicos desfrutavam de boas relações com muitos políticos da época. Sem a proteção do Estado para legitimá-la perante a sociedade, as chances da Academia sobreviver seriam mínimas. Não muito diferente do período imperial, o êxito de uma instituição como a Academia ainda estava associado ao mecenato do Estado. Assim nossos literatos continuaram buscando proteção oficial dos que estavam no poder, com o argumento sedutor de que ao ajudar uma instituição do porte da AML estavam perpetuando seus nomes na história política do Estado. Foi o que aconteceu na ocasião da inauguração da Estátua de João Lisboa, que em resposta ao consentimento do governador de que a Academia se responsabilizasse pela cerimônia, a diretoria respondeu ao governador: Respondendo, cabe-lhes dizer a v. exc. que a Academia Maranhense aceita desvanecida a incubéncia, que lhe comete o govêrno do estado, de levar a efeito a inauguração da estátua de João Lisboa, e agradece penhorada a alta honra dessa escolha , endereçando a vexa. , ao mesmo tempo, os seus mais calorozos aplauzos por tão nobre gesto, que assinalará, com um traço indelével, a passagem de v. exc. pela pública administração[...] (Revista da Academia Maranhense de Letras, 1916-1917, p. 56). O art. 13. do estatuto da AML dizia: “A Academia publicará, assim que o possa, uma revista, que será o seu órgão na imprensa”(Revista da Academia Maranhense de Letras, 1916, p. 4). O que só viria a acontecer no governo de Urbano Santos, em reposta aos apelos constantes dos acadêmicos: Devido á espotânea e valioza intervenção pessoal de v. ex.ª, junto ao congresso do estado, autorizou o orçamento em vigor que a revista desta associação de letras fosse gratuitamente composta nas oficinas da Imprensa Oficial [...] A Academia Maranhense que de sóbra e de perto conhece o interesse que v. ex.ª vota a tudo quanto diz respeito ao progresso desta terra, em particular no que se relaciona ao seu desenvolvimento mental, vem confiante pedir a v ex.ª as ordens necessárias á realização daquele serviço, por cuja autorização, aliás, já se acha, para com v. ex.ª, obrigada a Academia (Revista da Academia Maranhense de Letras, 1916-1918, p. 195). Em resposta ao constante assédio dos intelectuais, o governador Urbano Santos, por intermédio do decreto nº. 92, de 19 de novembro de 1918, considerou de utilidade pública a Academia Maranhense de Letras, ordenou que lhe fosse dada instalação em um edifício do Estado e que a sua revista fosse publicada. Parece que finalmente a AML havia reunido as condições necessárias para um bom funcionamento. Apesar de conceder apoio oficial, o governo demonstrava não encarar aquela instituição com muita seriedade, pois somente em 1949 a AML obteve do governo um prédio público para a sua sede. Essa questão foi, por longos anos, uma dura realidade para os acadêmicos, onde a influência política de alguns sócios não foi suficiente para garantirlhes a sede em edifício próprio. Outra hipótese seria a ausência de comprometimento dos sócios com a questão, haja vista, a quase total ausência de vida dessa instituição durante esses vinte anos. Um artigo de jornal datado em 20 de junho de 1915 abordava o tema em tom bastante crítico e acusava o desaparecimento da AML no cenário literário local. Num texto de sentido ambíguo, o autor do artigo ao tentar descobrir o local de funcionamento do sodalício, questiona a existência real da Academia. Não sei como satisfazer o que me pediram e que gostozamente aceitei. há ocaziões em que a gente se mete em cada entatelada dos diabos! Eis o cazo: Alguém cujo nome não devo declinar, remeteu-me um lindo ramalhete de flores artificiais para que eu enviasse á Academia dos imortaes desta boa terra. Até ahi tudo bem, mas, onde funciona esse ninho de águias? Como desempenhar a incubéncia? Hoc opus labor est! Li que a Academia nasceu em uma bela manhã de estio sob o influxo da doce palavra de um dos mais ilustres hitoriografos da nova geração maranhense. Em torno do velho mestre e grande educador colocaram-se os condôres que no terreno da poezia, da jurisprudência, das belas letras enfim. Cada qual tomara pouzo, gravebundo como um côro de baixos profundos em templos católicos. As cadeiras tiveram o seu batismo literário, e os imortaes as ocuparam solenemente. Pela cidade afora sentia-se uma vaga satisfação pelo nascimento de tão importante centro literário, e todos que fazião um versinho ou redijião uma noticia querião pertencer a tão conspícua associação. A noticia correu mundo, e pelo interior do Estado todos acreditão ainda na ezistencia da Academia. Agora recebo um grande ramalhete, para corporação dos letrados; mas, onde funciona ele? ‘Em que mundo ou estrela ela se esconde que não a vê ninguém?’ [...] Se não encontrar a Academia, mandarei o ramalhete para o arquivo público (São Luís, A Tarde, 20/06/1915) A decepção em relação ao compromisso do poder público com a AML fica patente nesta declaração de Jomar Morais (1999), ex-presidente da instituição. [...] Houve período adverso da Academia, deserções, esmorecimentos e descasos, principalmente dos poderes públicos, apesar de se contarem, entre os acadêmicos de todos os tempos, deputados estaduais, deputados federais, senadores, governadores, prefeitos e outros titulares de cargos e funções relevantes” (MORAIS, 1999) Quanto à publicação da revista, até 1948, só haviam sido editados três números, provavelmente pela ausência de atividades promovidas pela Academia. Apesar de ser verificado um reavivamento – ou nascimento, uma vez que não houve registro de atividades até esta data – no ano de 1916, esse movimento foi efêmero. Meireles (1955, p. 164) afirma que com a morte de Antonio Lobo, neste mesmo ano, e a ida de Fran Paxeco em 1923 para a Europa, “a reação foi se enfraquecendo gradativamente, insensivelmente, até desaparecer”. Mas, e a reação ao Decadentismo? Não existiu. Os primeiros doze anos da AML foram marcados pela mesma letargia e marasmo dos quais a Academia prometia salvar o Maranhão. Quando não, havia esporadicamente sessões solenes que se tornaram bons encontros entre os membros da alta sociedade. As palestras tratavam de temas leves, sem qualquer relevância política ou mesmo social. Os oradores privilegiavam a cadência das palavras e o rebuscamento de frases, “tudo tinha a sua aplicação, visando não provar alguma coisa ou chegar a qualquer espécie de conclusão, mas servir apenas de pretexto ao floreio literário” (EL FAR, 2000, p. 74). Nos discursos acadêmicos não havia lugar para mulheres, pobres e negros. A questão indígena também não foi uma preocupação desses literatos, a menos que o tema fosse Gonçalves Dias e o Indianismo romântico. “Muitos desses literatos preocupavam-se unicamente em fazer da literatura um frívolo passatempo, deixando de lado sua verdadeira função de ‘atuar como fermento de inquietação” (EL FAR, 2000, p. 74). As ações da AML ficaram restritas a atos de civismo e sessões que aconteciam com um largo espaço de tempo. Em relação ao civismo, a Academia fez questão de manter a data de fundação no dia 8 de agosto de 1908, que coincidia com o aniversário de Gonçalves Dias, apesar de não ter sido verificada nenhuma atividade promovida pela AML a partir desta data, além da instalação solene que ocorreu no dia 7 de setembro, data da independência do Brasil. Apesar dessa estratégia, isso não foi suficiente, diante da falta de direção desta instituição. O Decadentismo existiu de fato, no definhamento moral das instituições, no atraso do ensino público, no empobrecimento da maior parte da população, porém, esta era uma realidade que estes intelectuais não estavam dispostos a ver. Achavam que no culto aos vultos do passado o Maranhão voltaria ser aquilo que na realidade nunca foi, a Atenas Brasileira, a República das Letras. Como atestou um jornal da época: [...] O Maranhão foi e continua a ser o fóco inteletual do Norte, senão do Brazil inteiro. Entretanto, a não ser o número, aliás, restrito, dos que se dedicam ás letras ou a outras profissões liberais, o restante formam um continjente numerozo de ignorantes ou analfabetos [...] Inteligências muitas vezes fecundas ficam condenadas a um estagnamento deconsolador, e virtude da falta total de estabelecimentos de ensino, onde possam dirigir-se e educar-se [....] A instrução pública é ou deveria ser o principal cuidado de todo o governo sem ella não pode existir, porque ella é o gérmen fecundante de todas as manifestações intelletuais, morais e práticas [...] (São Luís, A Palavra, 18/07/1909). A relação das instituições com o passado, o culto aos grandes nomes, era a saída mais favorável para instituições como a AML que não elaboraram em seus programas medidas efetivas de combate às questões relevantes que impediam o progresso mental do Estado. Um artigo escrito no jornal A Palavra de 25 de setembro de 1909 denuncia essa realidade [...] A nossa pobreza intellectual é presentemente tão extrema, que todas essas manifestações penosas da nossa decadência, tão leves e nullas, têm merecido alto conceito e elogios, como jamais obtiveram produções de Gonçalves Dias, de João Lisboa, de Gentil Braga e de Celso Magalhães dos seus conterrâneos, que acostumados no meio luxuriante de uma riqueza litteraria, que ainda hoje é a nossa gloria e o nosso orgulho, não viam motivo para apotheosarem aquillo que era commum ou quase vulgar [...] Entretanto, como estamos na época das sepulturas caiadas de que fala o Evangelho, não falta quem apregoe urbe et que a nossa litteratura actual é pujante e viridente, rica e variada e hoje mais do que nunca o Maranhão merece o nome de Athenas. Triste Sarcasmo! [...]. A AML não foi uma exceção à regra. Apesar do nosso estudo estar concentrado nesta instituição, não podemos deixar de observar que o período republicano em sua primeira fase, conhecida como República Velha, foi fecundo no surgimento de instituições que abrigavam intelectuais e homens atrelados a alguma forma de poder. Sobre os novos atenienses, Martins, (2002, p. 126) afirma que [...] Em comparação aos intelectuais maranhenses da metade do século XIX, os novos atenienses distinguiram-se deles justamente por constituírem um patrimônio institucional jamais visto no Maranhão, voltado para dar sustentação à obra de resgatar o passado mitológico. Um monumento devotado a esse passado identificado como glorioso e imperecível, era essa a função que devia cumprir o acervo institucional criado entre 1890 e 1930, além de atender a interesses hodiernos orientados para o atendimento de demandas supervenientes. O modernismo dos anos 20 talvez tenha sido o golpe fatal na difícil sobrevivência das academias. As novidades do movimento traziam consigo a contestação de tudo aquilo que se impunha como tradição. A Academia de Letras tornou-se um alvo fácil para onde Graça Aranha, abandonando a defesa da instituição que ajudara a erguer, desferiu os primeiros golpes, em tom de desabafo. A fundação da Academia foi um equívoco e foi um erro. No sentido em que comumente se entende ser uma academia, é esta um corpo de homens ilustres nas ciências, nas letras, nas artes, consagrados pelo talento e trabalhos, sumidades espirituais de uma cultura coletiva. As academias são destinadas a zelar tradições e supõem um povo culto, de que são os expoentes. Diante deste conceito, a Academia Brasileira foi um equívoco. Somos um povo inculto, sem tradições literárias ou artísticas, ou pelo menos de tradições medíocres, que seria melhor se apagassem. O fato de haver raros escritores ou artistas de primeira ordem não forma uma tradição. E é ridículo supor que as tradições são criadas pelas academias. A tradição não é um artifício. Vem do inconsciente coletivo e se tem força para impor-se no curso do tempo, viverá a despeito das academias. O equívoco permaneceu, porque geralmente se imagina que um país de academias literárias alimenta-se de um vasto manancial de produção, que é preciso reger e disciplinar. No Brasil não existe tal produção. A Academia está no vácuo. Não tem função a exercer, segundo a tradição acadêmica. E se tem a função de regulamentar a inteligência e criar o academicismo, ela é funesta. Foi o seu erro inicial”. (ARANHA, 1909, pp. 751-55 apud El FAR, 2000, p. 127). Graça Aranha aponta para o fato de que as Academias de Letras no Brasil não têm função. Peter Burke (2002, p. 146) aventa que o termo função “pode muito bem passar por um conceito inofensivo, implicando apenas que as instituições têm os seus usos e aplicações”. Os funcionalistas defendem a existência das instituições baseados no argumento de que elas contribuem para o equilíbrio social, porém Burke afirma que, ao acreditarmos que todas as instituições de uma determinada sociedade possuem uma função positiva, incorremos em custos, que ele chama de disfunções. Afirma ainda que “não há necessidade de se agarrar ao pressuposto de que determinada instituição é imprescindível ao desempenho desta ou daquela função” (BURKE, 2002, pp. 146-153). A AML surgiu com um discurso salvacionista, trazendo para si a função de resgatar o Maranhão do Decadentismo. O fato é que a visão que os literatos dessa instituição tinham sobre essa questão era distorcida da realidade e, na realidade, mesmo que não fosse, essa nunca foi a prioridade dessa agremiação literária, como se pode observar até os dias de hoje. Preocupados em assegurar seu espaço no disputado mercado intelectual, e garantir seu status perante a elite local, esses intelectuais estiveram muito mais ocupados em garantir regalias e aproximar-se do poder local, do que em trabalhar em prol do que haviam se proposto e que justificava a existência daquela instituição. Jomar Morais (1981, pp. 60, 61), ex-presidente da Academia, confirma que essa realidade perdura até hoje, ao afirmar que “alguns de seus integrantes que aqui poucas vezes compareceram depois da sessão da posse, em que se armaram de colar e diploma”. Ele completa dizendo que esse entre outros fatores, como a morte de alguns membros, seriam motivos suficientes para interromper o curso da história dessa instituição, “fossem elas o resultado ou a expressão da vontade de um grupo, e não o símbolo da inteligência e da cultura de um povo”. Diante de tudo o que foi exposto somos obrigados a discordar, e afirmar exatamente o contrário. Se a Academia representasse a cultura e a inteligência do Maranhão, há muito ela teria deixado de existir, uma vez que este Estado comanda as tristes estatísticas de pobreza e analfabetismo de todo o país. A Academia sobrevive, justamente por estar alheia a tudo isso e por ser a expressão de um pequeno grupo que ainda utiliza a imagem da instituição para garantir seu status perante a sociedade. CONCLUSÃO A partir da leitura do capítulo inicial, pôde ser percebido que o Maranhão sofreu, na passagem do século XIX para o século XX, sucessivas transformações nos aspectos político social e econômico, entre as quais a mudança do regime imperial para o republicano, a transferência do trabalho escravo para o assalariado, a substituição da grande lavoura pela indústria e o comércio incipientes. Na esfera social, todas essas transformações, aliadas ao aumento demográfico, resultante do intenso êxodo rural, favoreceram o surgimento de novas classes sociais, com níveis distintos de atuação nessa sociedade complexa que se configurava no início do século XX. A São Luís novecentista orgulhava-se do seu passado glorioso e pretendia-se sofisticada, no entanto, configurava-se a partir de um emaranhado social que fazia conviver o luxo e a miséria, trazendo em seu bojo, as seqüelas de séculos de escravidão. Nesse contexto surgem os neoatenienses, intelectuais que pretendiam resgatar o Maranhão do Decadentismo (1889-1930), caracterizado por eles, como sendo um período de degenerescência para as letras maranhenses, causado principalmente pela saída em massa dos intelectuais em busca de oportunidades em outras regiões do país. No entanto, para nossa surpresa, verificamos que o suposto Decadentismo não possuía argumentos lógicos para fundamentar a sua existência naquele período, uma vez que, através da análise da situação econômica e educacional do Estado, percebemos que nunca houve condições reais para a gestação de um período de glórias em contraposição àquele presente decadente. Logo, se não houve um passado glorioso representado por uma Atenas Brasileira, não poderia haver uma decadência tão profunda como a que foi pregada pelos literatos do início do século XX. Esta questão despertou nosso interesse em buscar os motivos que levaram aqueles intelectuais a cantar e decantar algo que aparentemente desejavam extinguir. A Academia Maranhense de Letras, assim como muitas outras agremiações que surgiram naquele contexto, nasceu com um objetivo muito definido: resgatar o Maranhão daquele estado de marasmo intelectual, através da louvação do passado e por meio de ações que modificassem aquela realidade. Ao analisarmos as características daqueles que almejavam destaque no cenário literário, encontramos dois grupos distintos. Para os intelectuais das classes menos abastadas, percebemos que a criação de uma instituição como a Academia de Letras, favorecia o aparecimento desses escritores entre as classes mais altas da sociedade e consequentemente lhes conferia maior estabilidade financeira. Para os escritores nas horas vagas que se dedicavam a outros carreiras profissionais e que já eram membros da elite local, ser sócio da Academia conferia-lhes o status de Homens de Letras. Com base nessas considerações, percebemos como a fomentação do Decadentismo pelos sócios da Academia foi importante para justificar não só a sua existência, como também a permanência daquela instituição que não possuía nenhuma utilidade efetiva para a sociedade, além de promover socialmente os seus membros. Isto foi verificado pela ausência de medidas efetivas que marcassem a atuação dessa instituição, tanto na esfera educacional, quanto cultural. A Academia deixou sua marca na história cultural do Maranhão pelo completo distanciamento das questões mais relevantes, ficando presa a um passado de glória. Marcou também pela quase completa ausência de vida, dando sinais de sua existência apenas através das reuniões dos sócios – dos poucos que freqüentavam – e de sessões solenes esporádicas que serviam muito mais para demonstrações explosivas de ufanismo do que, de fato, para contribuir com a cultura local. Em suma, não podemos negar que o Maranhão viveu sim àquele período um declínio geral, resultante de uma sociedade onde poucos tinham muito e muitos tinham quase nada. No entanto, a intenção dos nossos intelectuais da AML não era desmascarar essa realidade, mas tão somente escondê-la, através de um discurso que apresentava um Decadentismo distorcido, irreal, onde não havia espaço para projetos que interferissem de forma ativa naquela realidade, mas que visavam unicamente a autopromoção e o reconhecimento social. REFERÊNCIAS FONTES PERIÓDICOS Pacotilha (1880-1908) Revista da Academia Maranhense de Letras (1916 – 1918) O Novo País (1988) Aurora Maranhense (1890) A Palavra (1909) O Postal (1912) A Tarde (1915) O Ateniense (1920) BIBLIOGRAFIA ANDRADE, Beatriz Martins de. O discurso educacional do Maranhão na primeira república. São Luís. UFMA/ Secretaria de Educação, 1894. ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. A ideologia da decadência: leitura antopológica a uma história da agricultura no Maranhão. São Luís: FIPES, 1983. ANTOLOGIA da Academia Maranhense de Letras (1908 – 1958). Publicação Comemorativa do Cinqüentenário de Fundação da Academia. 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IMAGEM 4 Teatro São Luis – Sala de Espetáculo Fonte: Revista do Norte, 1° De outubro de 1903. IMAGEM 5 Arredores da cidade Fonte: Revista do Norte, janeiro de 1905. IMAGEM 6 Praça João Lisboa Fonte: Revista do Norte, 16 de julho de 1903. IMAGEM 7 José Ribeiro do Amaral (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 8 Clodoaldo Freitas (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 9 Inácio Xavier de Carvalho (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 10 Barbosa de Godóis (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 11 Godofredo Viana (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 12 Antonio Lobo (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 13 Fran Paxeco (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 14 Alfredo de Assis (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 15 Vieira da Silva (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 16 Astolfo Marques (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 17 Domingos Barbosa (Imagem exposta no auditório da AML) IMAGEM 18 Corrêa de Araújo (Imagem exposta no auditório da AML)