ANESTESIA E MEDIDAS PARA
OTIMIZAÇÃO DO CAMPO CIRÚRGICO
GLAUBER GOUVÊA
LEONARDO CONRADO BARBOSA DE SÁ
A presença de sangramento significativo no campo operatório, principalmente
aquele maior ou igual ao GRAU 3 (Tabela 1), em uma escala de cinco graus publicada por
Boezarrt et al., podem interferir de forma significativa no sucesso da cirurgia e no
aumento do risco de complicações. (1)
Graus de
Sangramento
Grau 1
Campo Cirúrgico
Condições de cadáver com mínima aspiração necessária
Grau 2
Sangramento mínimo com necessidade de aspiração infreqüente
Grau 3
Sangramento intenso com necessidade de aspiração freqüente
Grau 4
Sangramento cobre o campo cirúrgico depois da remoção da ponta de
aspiração e antes que um instrumento cirúrgico possa efetuar a manobra
Sangramento incontrolável. Sangramento através da narina quando
removida a aspiração.
Grau 5
Tabela 1- Sistema de Graduação de Sangramento no Campo Cirúrgico. Tabela adaptada do Livro-texto Cirurgia
Endoscópica – Peter-John Wormald. (2)
Objetivando a melhoria do campo cirúrgico na realização da cirurgia endoscópica
Nasossinusal (CENS), a literatura preconiza a realização de anestesia tópica associada a
vasoconstrictor, acompanhada ou não de anestesia geral. (2) (3) A injeção no sítio
cirúrgico de solução de adrenalina associada à lidocaína não produz altas nos níveis
plasmáticos de epinefrina quando comparada à de soro fisiológico e não induz a nenhum
efeito colateral significativo se realizada da forma preconizada. Os autores da pesquisa,
realizada no Hospital Mount Sinai, em Toronto, Canadá, sugerem que a combinação de
lidocaína 1% pode reduzir o estresse fisiológico durante e cirurgia e prevenir elevados
níveis de catecolaminas.
Entretanto o anestesiologista deve estar atento no caso de injeção intravascular
inadvertida, ocasionando imediatamente aumento abrupto da pressão arterial sistêmica e
da frequência cardíaca (mais raramente pode ocorrer bradicardia). Tais alterações
hemodinâmicas raramente necessitam de tratamento especifico uma vez que são
transitórias e auto-limitadas em sua imensa maioria, não perdurando mais do que um
minuto.
Anestesia Local
I.
Vantagens:
 Possibilidade de alta no mesmo dia.
 Menor sangramento quando o anestésico local é associado a vasoconstritores.
 Adequada para pacientes cujas condições clínicas impedem anestesia geral, em
procedimentos de pequeno a médio porte.
 Monitoramento da visão em cirurgias orbitárias ou com risco de lesão do nervo
óptico.
II.
Desvantagens e Limitações
 Procedimentos de grande porte ou mais complexos.
 Ansiedade e movimento súbito do paciente durante a cirurgia. Lembrar que os
procedimentos duram, em média, de 1 a 2 horas.
 Sedação e/ou sangramentos exagerados podem predispor à aspiração de sangue e
secreções.
 A presença do anestesista assistente é sempre indicada, mesmo tratando-se de
procedimento com anestesia local.
 Necessidade de anestesia apropriada em todos os seios e estruturas.
III.
i.
Técnica
Cotonóide embebido com vasoconstritor (adrenalina 1:2000 – 10.000 ou
oximetazolina 1%) é introduzido em fossas nasais. A utilização do endoscópio
facilita o correto posicionamento. Devem ser contemplados os meatos inferiores e
médios, o septo nasal, os recessos esfenoetmoidais e a as inserções verticais das
conchas nasais médias. Os cotonóides devem permanecer por no mínimo 10
minutos.
ii.
Infiltração de solução de lidocaína 1% a 2% associado à adrenalina 1:80.000 com
jelco número 22/24. Sob orientação endoscópica a área acima da concha nasal
média, topografia do Agger Nasi, é infiltrada, seguida da injeção da face anterior
da concha. Angular a agulha pode ser de grande valia, principalmente para
alcançar estruturas mais laterais, como, por exemplo, na realização de infiltração
da porção posterior à crista lacrimal anterior ou na área em que emerge a artéria
esfenopalatina.
iii.
Manter os cotonóides nos demais sítios anatômicos, enquanto outro é abordado,
pode potencializar o efeito anestésico e a hemostasia.
Anestesia Geral
Um anestesista experiente é essencial à CENS, na medida em que baixos níveis
pressóricos e uma freqüência cardíaca menor do que 60 bpm permitem melhor
hemostasia e um campo operatório mais limpo. (2) (4) Pressão arterial média 30% mais
baixa do que a da admissão hospitalar é considerada ideal.
I.
Vantagens
 Maior comodidade para o cirurgião. Facilita o ensino.
 Necessária para procedimentos mais complexos, de grande porte ou que exijam
maior duração.
 Permite acesso a pontos anatômicos mais restritos à anestesia local, como o
recesso frontal e ao seio esfenoidal.
 Facilita o controle dos sangramentos.
 Maior segurança para pacientes com quantidade excessiva de secreções nas
cavidades nasais.
II.
Desvantagens
 O paciente não pode oferecer feedback em relação à acuidade visual ao cirurgião, ,
em procedimentos orbitários ou em possíveis lesões do nervo óptico. Nestes casos,
a observação do globo ocular do paciente, de forma regular, pode ser de grande
valia.
 Complicações potenciais inerentes ao procedimento de anestesia geral.
 Embora ainda objeto de controvérsia, a anestesia geral por via venosa total parece
diminuir o risco de sangramento em relação aos procedimentos em que a via
inalatória também é utilizada (2) (3). Nao há consenso ainda se este efeito benefico
se deve as drogas utilizadas per se ou se devido a redução da frequencia cardiaca
mais evidente quando a anestesia venosa total é utilizada (uma vez que ela
costuma ser mais vagotônica do que a anestesia inalatoria).
III.
i.
Técnica
Preconizamos como anestésicos a associação PROPOFOL-REMIFENTANIL para as
cirurgias sob anestesia geral.
ii.
Indução lenta, anestesia perioperatória e reversão suave levam a menos
sangramento (5).
iii.
Lembrar que a hipotensão isolada nas CENS não é sinônimo de menos
sangramento.
iv.
O uso de máscara-laríngea reduz a estimulação da via área, particularmente na
extubação. entretanto e considerada uma técnica avançada de utilização da
mascara laríngea, e deve ser criteriosamente selecionada, sendo que a cooperação
do cirurgião e fundamental para o sucesso dessa técnica. A incidência de
broncoaspiração não difere quando se utiliza a técnica convencional (cânula
endotraqueal).
v.
Outras drogas podem ser utilizadas: esteróides, antieméticos, analgésicos,
antibióticos, betabloqueadores (cuidado nos asmáticos) e clonidina. (2)
vi.
Após indução do paciente, o anestesista pode colocar um tampão de compressa
cirúrgica na orofaringe. Embora extremamente raro, o tampão pode ocasionar
lesão por excesso de compressão e diminuição da pressão de perfusão da mucosa
subjacente, especialmente quando posicionado de forma inadequada. Outra
complicação e a não retirada do tampão no momento da extubação do paciente,
havendo relato de asfixia devido a migração do mesmo para as estruturas
periglóticas. Outra opção e inserir uma sonda orogástrica ao final do procedimento
para esvaziamento gástrico do sangue eventualmente drenado durante a cirurgia.
vii.
Cotonóides com vasoconstrictor tópico (oximetazolina, nafazolina ou adrenalina
1:2000 – 1:10.000) devem ser aplicados nas cavidades nasais, conforme descrito
anteriormente. É necessário aguardar o tempo necessário (mínimo de 10 minutos).
Orientamos a colocação dos cotonóides logo após a indução anestésica, antes da
arrumação dos demais aparatos cirúrgicos.
viii.
Na vigência de sangramentos, procede-se à aspiração do assoalho da cavidade
nasal e do cavum, com aspiradores calibrosos, o que minimiza a quantidade de
tempo despendido removendo sangue. A aplicação de cotonóides com
vasoconstritor sobre os sítios de sangramento, sempre que necessário,
proporciona um campo operatório mais limpo e mais seguro. Nestes casos, o
cirurgião deve aguardar pelo menos 5 minutos antes de removê-los. Contar a
quantidade de cotonóides é prudente.
ix.
Elevar a cabeceira do paciente, deixando-a entre 30 e 40 graus, diminui o retorno
venoso e o sangramento transoperatório.
x.
Manter contato com o anestesista no transoperatório e observar os níveis
pressóricos do paciente, pois hipotensão arterial e, principalmente, bradicardia
diminuem o sangramento e melhoram, com isso, o campo operatório.
xi.
Reversão suave e lenta da anestesia diminui a agitação e o esforço do paciente ao
término da cirurgia, diminuindo o risco de sangramentos. Varias técnicas ja foram
descritas para minimizar a chance de bucking ao despertar do paciente (lidocaína
venosa, remifentanil em baixas doses, transição para mascara laringe, extubacao
em plano profundo, etc) sendo que não ha vantagens especificas de uma em
relação a outra, devendo o anestesiologista optar por aquela em que tiver maior
experiência.
Antibióticos e Esteróides Pré-Operatórios
Os esteróides orais devem ser administrados, contanto que não haja contraindicações e os seus efeitos colaterais explicados ao paciente. Uma dose diária, após o
desjejum, de 0,75 mg/Kg de prednisolona, por 7 dias é recomendada. (2) (5)
Embora ainda não haja estudos que comprovem o beneficio na redução do
sangramento perioperatório para os que utilizam antibióticos na semana anterior à
cirurgia, preconizamos o uso de Amoxicilina-Clavulanato 875 mg 12/12 h ou Ciprofloxacina
500 mg 12/12 h nos sete dias que antecedem a cirurgia.
Diretrizes Gerais para melhoria do campo cirúrgico no
perioperatório
 Verificar posicionamento do paciente.
 Reavaliar qualidade da anestesia tópica e injetável realizada.
 Colocar cotonóides embebidos com solução de adrenalina 1:2000 – 1:10.000 e
aguardar 10 minutos antes de nova abordagem no mesmo sítio.
 Verificar freqüência cardíaca. Mantê-la menor que 60 bpm. Avaliar uso de
betabloqueadores.
 Verificar pressão arterial. Manter a pressão arterial média entre 65 e 75 mmHg (2).
 Usar eletro cautério em sangramentos pontuais.
 Em sangramentos importantes, checar vasos calibrosos. Avaliar
ligadura/cauterização das artérias esfenopalatinas ou etmoidal anterior
Bibliografia
1. Boezaart, A P, Merwe, J van der e Coetzee, A R. A comparison of sodium nitroprusside and esmolol-induced controlled hypotension for functional endoscopic sinus surgery. Can
J Anesth. 1995, Vol. 42, pp. 373-376.
2. Wormald, Peter-John. Campo Cirurgico em cirurgia endoscopica nasossinusal. [trad.]
Aldo Stamm. Cirurgia Endoscopica Nasossinusal - Anatomia, Reconstrucao Tridimensional
e Tecnica Cirurgica. s.l. : Revinter, 2007.
3. Ahn, H J, et al. Comparison of surgical conditions during propofol or sevoflurane
anaesthesia for endoscopic sinus surgery. British Journal of Anaesthesia. 100, 2008, Vol. 1,
pp. 50-54.
4. Nair, S, et al. The Effect of beta-blocker premedication on the surgical field during
endoscopic sinus surgery. Laryngoscope. 2004, Vol. 114, pp. 1042-1046.
5. Simmen, Daniel e Jones, Nick. Cuidados Perioperatorios. [trad.] Aldo Stamm. Cirurgia
Endoscopica Nasossinusal - Basica e Avancada. s.l. : Revinter, 2006, pp. 148-168.
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