Impresso Especial
9912247598/2009-DR/BA
CRIARMED
ANO IV Nº 20 | MAR/ABR 2013
DISTRIBUIÇÃO DIRIGIDA
a Revista dos Líderes da saúde do brasil
HIPÓCRATES
ESCANDALIZADO:
mercantilização predatória
da medicina acendeu de
vez o debate sobre a ética
no setor
FRAUDE
A FACE MAIS ASSUSTADORA DA NÃO CONFORMIDADE AINDA
É REAL, DESEQUILIBRA O JÁ COMBALIDO MERCADO DE SAÚDE
BRASILEIRO E DESAFIA OS QUE LUTAM POR UM SISTEMA MAIS
Diagnóstico | mar/abr
ÉTICO E RACIONAL
2013
03
04
Diagnóstico | mar/abr 2013
Diagnóstico | mar/abr 2013
05
06
Diagnóstico | mar/abr 2013
SUMÁRIO
08
Saúde Pública
ENSAIO
ENTREVISTA
Mauro Nunes
Presidente no Brasil do MSF fala sobre
hospitais mantidos pela entidade e as
particularidades da carreira
30
62
Henrique Salvador
Ex-presidente da Anahp: hospitais privados
ampliam número de leitos para desafogar
o setor
24
DESIGN
BASEADO EM
EVIDÊNCIA
O ALEMÃO
FRANZ
KNIEPS
ÁFRICA
Como o avanço da renda, investimentos
e outras ações podem ampliar o acesso à
saúde de qualidade na África subsaariana
22
62
08
Franz Knieps
Ex-diretor-geral do Ministério de Saúde da
Alemanha, Knieps conta como funciona o
financiamento do sistema de saúde alemão
14
Shutterstock
Divulgação
ENTREVISTA
MERCADO
Design Hospitalar
O Center For HealthCare Design (CHD)
traz as referências que tornaram o design
parte intrínseca no processo de cura
70
ISRAEL
Mercado Internacional
País vendeu US$ 70 milhões em produtos
médicos ao Brasil, em 2012, e tem planos
ambiciosos para o mercado local
Roberto Abreu
POLÍTICA
44
Legislação
A dinâmica do jogo político, do
partidarismo e do lobby no Congresso
Nacional para projetos em saúde
37
MÁRCIO coriolano,
da Bradesco Saúde:
debate sobre não
conformidade
ARTIGO
Maísa Domenech
Engenheira e consultora discute overuse
de órteses, próteses, materiais especiais,
medicamentos e outros
38
ESPECIAL
Visões da América
Jorge Cortés Rodriguez, diretor médico
do Hospital Clínica Bíblica (Costa Rica),
aborda alternativas para o futuro da saúde
44
CAPA
Não Conformidade
Divulgação
A polêmica das não conformidades no
sistema de saúde brasileiro e a má formação
médica nos holofotes do mercado no país
50
Divulgação
CARO GESTOR
73
Osvino Souza
ENSAIO
Saúde & Gestão
O que os IPOS, bancos e fundos de
investimentos têm a ensinar ao setor de
saúde em cinco lições
58
GESTÃO
Fanem
Maior fabricante de berçários e equipamentos neonatais do Brasil, empresa
aposta em inovação e competitividade
Paulo Lopes
Headhunter aborda mudança nos hábitos de
vida dos profissionais para incrementar a
qualidade de vida
Especialista discute temas como carreira,
especializações, MBAs, trainees e ascensão
nas empresas
56
ARTIGO
79
58
fábrica da fanem, em
guarulhos, grande
são paulo:
ARTIGO
Alexandre Diogo
Presidente do IBGC discute conceito
do foco do cliente e esclarece dúvidas e
equívocos sobre o tema
84
RESENHA
Gestão Tributária
Livro ensina o exercício da administração
tributária para profissionais de saúde que se
iniciam nos negócios
EDITORIAL
Hipócrates e a ética
S
e estivesse vivo, o grego Hipócrates certamente estaria orgulhoso
dos avanços que a medicina alcançou ao longo dos séculos, especialmente na era moderna. E exemplos não faltam, de Alexander
Flemming a Christiaan Barnard, de Louis Pasteaur aos engenheiros Godfrey Hounsfield e Allan Cormack, que descobriram, em
1968, a possibilidade de se obter imagens de raios-x na forma de
“fatias” transversais. Além de ganhar o Prêmio Nobel pelo feito,
mais de uma década depois, eles abririam caminho para as técnicas de diagnóstico
por imagem que revolucionariam de vez a medicina dos nossos tempos.
Hipócrates também foi um visionário. Sabia que, pela sua complexidade, a
incipiente carreira precisaria de um “estatuto”. Lançou as primeiras bases da literatura médica e da ética profissional, que ainda hoje permanecem atual, calcadas
na philotechnié – amor ao ofício – e philantropia – amor aos homens. A medicina
dos nossos dias também trouxe novos desafios para a futura geração de médicos,
como permanecer fiel aos preceitos filosóficos e éticos de um colega que viveu no
século IV antes de Cristo.
A reportagem de capa desta edição tem o objetivo de abrir o debate sobre questões que deixariam “Hipócrates horrorizado”, mas que, ao mesmo tempo, o fariam
refletir sobre os fatos. Afinal, os desvios de conduta profissional existem desde
sempre, em todas as áreas, em todas as profissões. Os casos narrados no texto
também são historicamente clássicos: representam uma minoria, com grandes impactos no sistema – é verdade –, mas que nunca se perpetuarão na história.
Como sempre, aliás, os revezes também servem, muitas vezes de forma épica,
como caminho para grandes aprendizados. Tem sido assim desde o início da humanidade. E que assim continue sendo.
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Realização
A Revista Diagnóstico não se responsabiliza pelo conteúdo
editorial do espaço Prestador Referência, cujo texto é de
responsabilidade de seus autores. Artigos assinados não
refletem necessariamente a opinião do veículo.
CORREIO
[email protected]
Com relevância cada vez mais crescente,
nada mais oportuno que saber o que pensam gestores do
setor médico-hospitalar da região. Parabéns à equipe da
Diagnóstico por surpreender mais uma vez seus leitores.
R.Souto, São Paulo-SP
Capa
VisÕes da
américa latina
Não conhecia a revista e tive
o grato prazer de interagir
com uma publicação comprometida com conteúdo – algo
raro entre as publicações do
gênero. Aproveito para dar
meus parabéns ao Luiz de
Luca em seu artigo na estreia
“Visões da América Latina”.
Uma grande reflexão para o
setor.
Marco Antônio Petrosa,
Curitiba-PR
Cultura organizacional é
algo indispensável para
qualquer organização, como
bem pontuou o especialista
Luiz de Luca. Infelizmente,
poucos serviços de saúde no
país vêm dando atenção a
um tema tão relevante para a
sustentabilidade de qualquer
negócio.
Wilson de Souza,
Belo Horizonte-MG
Entrevista
paula wilson
Que bom ver uma entrevista
tão bem conduzida pela equipe da Diagnóstico com a presidente da JCI, senhora Paula
Wilson. Um debate oportuno,
no momento em que a busca
pela certificação vem se tornando cada vez mais obriga-
tória para o mercado de saúde
brasileiro. Infelizmente, ter
JCI ainda é um sonho distante
para os pequenos serviços de
saúde no país.
Amélia Dantas, Rio de
Janeiro-RJ
Economia da Saúde
china
Há bem pouco tempo atrás, se
deparar com um artigo voltado para o mercado de saúde
brasileiro tendo a China como
tema seria algo impensável.
Mas, em um mundo cada vez
mais globalizado, não dá para
imaginar que o que acontecer
no “dragão chinês” não tem
interferência alguma com o
mercado de saúde brasileiro.
Estamos interligados.
outras prioridades nos impõem mais atenção em nossas
rotinas como gestores, mas é
preciso ir além. O exemplo
inglês – ainda que distante da
nossa realidade – é uma boa
inspiração.
R. Rend, Curitiba-PR
Artigo
EDUARDO NAJJAR
Foi com enorme prazer
que li o texto do senhor
Eduardo Najjar, nessa
conceituada revista. Já tinha
assistido às suas palestras
e fiquei impressionado
com o seu domínio sobre
o tema gestão familiar.
Parabéns à Diagnóstico pela
“contratação”.
Sampaio Guimarães,
São Paulo-SP
Ações Sustentáveis
Negócios
Sustentabilidade precisa ser
encarada definitivamente
como prioridade para o mercado de saúde. Sabemos que
Marketing
HOSPITAIS
É de se admirar que, com
o setor médico hospitalar
de pires na mão, gastem-se
fortunas com publicidade em
horário nobre de uma novela
global. São realidades distintas, claro, mas não deixa de
ser um grande constraste.
As novelas globais, que quase
sempre têm na trama um
hospital – sempre privado
–, deveriam aproveitar a audiência e colocar no horário
nobre a realidade do sistema
público de saúde. Seria muito
bom ver Edson Celulari em
corredor lotado, à espera
de atendimento no Sistema
Único de Saúde.
M. Cerqueira, Recife-PE
Acompanhava o articulista
Eduardo Najjar na Exame.
com e, agora, na Diagnóstico.
Sauzo Azevedo, São Paulo-SP
Caro Gestor
osvino souza
R.S, Brasília-DF
T. A., São Paulo-SP
Amaury Dias, Recife-PE
Muito rico o texto publicado sobre a China na última
edição da Diagnóstico. A
publicação e seus repórteres
estão de parabéns por propiciar a nós leitores artigo de
altíssimo nível.
não éticas, mas um setor
inteiro não pode ser penalizado por conta de uma minoria.
Mais respeito!
Edmundo S, Salvador-BA
Oportuna a provocação de
um leitor dessa conceituada
revista sobre não conformidade ao ilustre professor Osvino
Souza. Nós, prestadores de
serviço, somos vítimas de
uma relação cada vez mais
pautada pela desconfiança por
parte das operadoras. Que se
pese a conduta de empresas
Ensaios
ANAHP
Muito elogiável o esforço
da Anahp em sempre buscar
difundir seus conhecimentos
para o mercado. Espero que
a parceria com a Diagnóstico
seja de longa data.
B. Vieira, Recife-PE
Diagnóstico | mar/abr 2013
09
ENTREVISTA
franz Knieps
Fotos: Divulgação
Reforma alemã
Da Redação
O
fato de ser a mais rica nação da zona do
euro não isenta a poderosa Alemanha de
verificar, centavo por centavo, como estão sendo aplicados os recursos na área
de saúde. O país consome 10,4% do seu
PIB com assistência médica e enfrenta os
mesmos dilemas de outras nações mundo
afora. Como, afinal, tornar mais eficiente um sistema que, fora
de controle, pode ser uma fonte de desperdício de dinheiro público? A resposta a esse dilema é ainda mais necessária e urgente
para os alemães pela tendência de estagnação do crescimento
demográfico e de envelhecimento populacional, o que se reflete
em mais pressão sobre o orçamento. “Nos últimos 20 anos, nossa filosofia predominante tem sido a de que o sistema de saúde
não pode gastar mais do que a sua renda”, diz o consultor Franz
Knieps, que durante seis anos foi diretor-geral do Ministério da
Saúde alemão. “Além disso, controlamos cuidadosamente todos
os tipos de gastos. Também introduzimos incentivos que enco-
Como a assistência médica é financiada na Alemanha?
Franz Knieps – O financiamento de assistência médica é mais complexo na
Alemanha do que em muitos outros países porque não depende de uma única
fonte de receita. Em vez disso, é utilizada uma variedade de fontes. O fundo
estatutário de seguros de saúde (público) cobre cerca de 90% da população.
Contribuições para esse fundo, que são
baseadas na renda, são feitas tanto por
empregadores quanto por empregados.
10
Diagnóstico | mar/abr 2013
rajem todos a evitar gastos desnecessários”. Ele explica que o
sistema de saúde germânico é financiado em uma base pay-as-you-go. E a menos que a despesa seja mantida sob controle, as
contribuições a partir da diminuição do número de trabalhadores ativos em breve poderão ser insuficientes para cobrir o custo
dos cuidados para os aposentados. Diante desse dilema, há uma
receita alemã para resolver a questão e que possa ser seguida
por outras nações? “Quando era jovem – lembra Knieps –,
conheci um economista da saúde influente na London School of
Economics e o questionei sobre qual era a grande ideia na política de saúde. Sua resposta, em essência, foi esta: ‘Meu querido
jovem amigo, a única maneira de organizar e prestar os serviços
de saúde é mudar o sistema a cada dois anos, para que ninguém
se sinta confortável nele’”, contou o consultor, com um humor
pouco comum entre os burocratas alemães. De Berlim, Franz
Knieps concedeu entrevista a Matthias Wernicke, diretor do escritório da McKinsey na capital germânica, que a Diagnóstico
publica com exclusividade na América Latina.
A Alemanha tem cerca de 180 fundos
de seguros de saúde legais, e eles são
responsáveis por aproximadamente
70% das receitas do sistema de saúde.
Ao longo da última década, a Alemanha tem sido bastante bem sucedida
em conter os seus custos com assistência médica, especialmente em
comparação a alguns outros países
europeus. Ao que se deve esse êxito?
Knieps – Não houve uma alavanca
única que usamos para a contenção de
custos. Em vez disso, foi implementado
um grande número de medidas menores
para estabilizar as receitas e despesas
do sistema de saúde. Nos últimos 20
anos, nossa filosofia predominante tem
sido a de que o sistema de saúde não
pode gastar mais do que a sua renda.
Foram implementadas as medidas em
todos os níveis do sistema de saúde. Por
exemplo, a cada ano, estabelecemos
um orçamento global para o sistema
em nível nacional para servir como um
guia para todos os participantes do sis-
tema. Orçamentos virtuais também são
criados em nível regional. Isso assegura que todos os participantes do sistema, incluindo os fundos de seguros de
saúde e os prestadores, saibam desde o
início do ano o quanto de dinheiro pode
ser gasto. Além disso, controlamos cuidadosamente todos os tipos de gastos.
Também introduzimos incentivos que
encorajam todos a evitarem gastos desnecessários.
Como a Alemanha estabelece preços
de referência para medicamentos?
Knieps – Introduzimos um sistema com
base em classes de grupos terapêuticos,
de medicamentos similares, utilizados
para a mesma condição. Sob esse sistema, reembolsamos todas as drogas em
uma classe terapêutica com o mesmo
preço. Nosso objetivo era dar às empresas farmacêuticas um incentivo para se
concentrarem na inovação e não simplesmente para produzir medicamentos
biossimilares. Preços de referência não
impedem que uma empresa farmacêutica exija mais dinheiro para um determinado medicamento, nem impedem
que um médico prescreva essa droga.
No entanto, o médico teria que explicar
aos pacientes porque essa droga é necessária, e os pacientes teriam que estar
dispostos a pagar um valor adicional
superior ao copagamento normal. Os
farmacêuticos que preenchem as prescrições também questionariam os pacientes para se certificar de que eles entenderam que alternativas mais baratas
estão disponíveis. Como a substituição
por genéricos é permitida na Alemanha,
temos ainda uma outra vistoria no local, para garantir que os medicamentos
caros são utilizados apenas quando necessários. Por último, mas não menos
importante, removemos a maioria dos
medicamentos isentos de prescrição do
pacote de benefícios. Os pacientes que
compram medicamentos sem receita
médica têm que pagar por eles.
Como os pacientes reagiram à introdução de copagamentos nas prescrições e o fato de que eles podem ter
de pagar mais dinheiro por alguns remédios?
Knieps – A implantação de uma política
de copagamentos, que varia de acordo
com o custo de cada remédio, ajudou o
governo alemão a desencorajar os pa-
cientes a usarem medicamentos caros
que não oferecem nenhuma vantagem
real sobre alternativas menos dispendiosas. Nossa experiência diz que cerca
de 90% dos pacientes estão dispostos
a usar um remédio mais barato se o
seu médico explicar que ele é tão bom
quanto o medicamento mais caro. Se
o médico disser que a droga mais cara
é um pouco melhor, cerca de 70% dos
pacientes ainda estão dispostos a tomar
o medicamento mais barato. Isto nos
sugere que os incentivos estão tendo
o efeito desejado nos pacientes e estão
cumprindo com os nossos esforços para
controlar os gastos com medicamentos.
De que outro modo vocês estão usando incentivos para controlar os custos?
Knieps – Há alguns anos, introduzimos
programas de gestão da doença, uma
abordagem que adotamos a partir dos
Estados Unidos. Como os americanos
dispõem de uma infinidade de planos
de saúde diferentes em seu mercado,
essa experiência é, muitas vezes, um
laboratório para novas ideias. Algumas
seguradoras de saúde dos EUA estão
usando programas de gerenciamento
de doenças para melhorar a qualidade
da prestação de atendimento, enquanto
gerenciam custos. Ficamos impressionados como os resultados dessas seguradoras foram obtidos. E assim decidimos implementar programas similares
na Alemanha. Temos, agora, os programas de gestão para pacientes com
doenças cardíacas, diabetes e algumas
outras condições crônicas comuns. Os
programas foram projetados usando diretrizes baseadas em evidências, o que
garante que os tratamentos incluídos
nos “protocolos” de programas são os
mais eficazes disponíveis. Para participar dos programas, os pacientes devem
concordar em fazer check-ups regulares
com seus médicos e em aderir às recomendações de tratamento. Os médicos
devem concordar em aderir aos programas “protocolos” e educar os pacientes
para o autocuidado. Os programas dão
a ambos, pacientes e médicos, um incentivo para participar. Por exemplo,
os médicos recebem dinheiro adicional
para cada paciente inscrito, que, por
sua vez, tem copagamentos menores à
medida que adere ao programa de autocuidado. As seguradoras de saúde também se beneficiam, pois os programas
É difícil dar
conselhos, mas
acho que todos
nós devemos
estar dispostos a
aprender com outras
experiências e adotar
práticas que foram
bem sucedidas em
outras nações
são concebidos para prevenir exacerbações da doença, complicações e os
elevados custos que elas acarretam. As
seguradoras também receberam financiamento federal adicional para cobrir
os custos iniciais dos programas. Uma
clara evidência está emergindo de que
essas iniciativas foram muito bem sucedidas. Milhões de pacientes já estão
inscritos e todos eles concordaram em
cumprir os protocolos do programa.
Muitos países estão tentando coordenar mais de perto a prestação de
assistência médica como forma alternativa de melhorar a qualidade do
atendimento, ao mesmo tempo em
que gerenciam os custos. Que medidas a Alemanha adotou para integrar
melhor seus serviços de saúde?
Knieps – Historicamente, o sistema
alemão era estritamente separado em
dois campos principais: assistência ambulatorial, que pode ser prestada tanto
por médicos de família quanto por especialistas, e cuidados hospitalares. No
entanto, essa divisão rigorosa levou ao
desperdício de um monte de dinheiro e,
por isso, estamos tentando preencher a
lacuna entre o atendimento ambulatorial e o hospitalar. Por exemplo, agora
incentivamos os médicos de ambulatórios a cooperar mais estreitamente com
os seus colegas baseados em hospitais,
e até mesmo permitimos que os méDiagnóstico | mar/abr 2013
11
ENTREVISTA
franz Knieps
dicos de cuidados ambulatoriais trabalhem nessas unidades. Médicos do
hospital também podem trabalhar nos
ambulatórios. Além disso, abrimos os
hospitais para que seus funcionários
possam fornecer atendimento ambulatorial especializado para certas doenças
raras e casos muito complicados. Também estamos tentando encontrar formas de integrar mais plenamente todo
o cuidado contínuo, desde a prevenção
à atenção ambulatorial, hospitalar, reabilitação e até mesmo de cuidados de
longo prazo. Para promover o cuidado
integrado, separamos uma verba específica no orçamento para incentivar
os médicos de cuidados ambulatoriais
e hospitais a experimentarem novas
ideias e novos modelos de prestação de
cuidados. Temos agora que avaliar os
resultados destas experiências e trazer
melhores ideias para o sistema como
um todo.
Por que houve poucos avanços na política de prevenção de doenças do governo alemão?
Knieps – Infelizmente, a Alemanha ainda não teve muito sucesso nesse quesito. Nossa Constituição atribui a responsabilidade pela gestão da saúde pública
aos 16 estados federativos e há pouca
coordenação entre eles – ou entre eles e
o governo federal – no que diz respeito
a iniciativas preventivas de saúde. Não
há na Alemanha, por exemplo, leis que
promovam a política de saúde pública
antitabagista – o que é um enorme contrassenso em termos de saúde pública.
Em comparação a outras nações, nas
quais questões como essas já são superadas, parece estar claro que precisamos desenvolver nossas habilidades.
A Alemanha tem uma longa experiência com policlínicas, uma forma de
cuidados primários que outros países
estão experimentando agora. Como
a oferta desse tipo de serviço tem se
mostrado eficiente?
Knieps – Grupos policlínicos de clínicos gerais que trabalham em conjunto
para formar centros de cuidados primários mais especializados foram usados
extensivamente e com bastante sucesso
na ex-Alemanha Oriental. No entanto, muitos políticos da parte ocidental
inicialmente não gostaram da ideia
das policlínicas porque as associavam
12
Diagnóstico | mar/abr 2013
à ideologia comunista. Demorou um
pouco para muitas pessoas entenderem
que policlínicas oferecem vantagens
significativas em relação à comunicação, coordenação e cooperação. No final de 1990, reintroduzimos as policlínicas com um novo nome, centros médicos, e eles agora são vistos como uma
forma muito atraente da prestação de
atendimento. Muitos médicos jovens,
especialmente aqueles que querem ter
um bom equilíbrio entre trabalho e vida
pessoal, acham que clinicar em um
centro médico é preferível a trabalhar
Nos últimos 20
anos, nossa
filosofia predominante
tem sido a de que
o sistema de saúde
não pode gastar mais
do que sua renda.
Também introduzimos
incentivos que
encorajam todos
a evitarem gastos
desnecessários
po no atendimento ao paciente. O que,
afinal, deve ser a essência do trabalho
desses profissionais.
SEDE DO MINISTÉRIO DA SAÚDE
DA ALEMANHA: medidas de
contenção de gastos com saúde
incluem a coparticipação na compra
de medicamentos e bonificação
para médicos que incentivam seus
pacientes a serem fiéis a tratamentos
preventivos
sozinho ou em pequenos grupos clínicos. Na Alemanha, centros médicos se
tornaram populares primeiramente em
grandes cidades, como Berlim e Munique. No entanto, eles também são agora
bastante populares em áreas rurais, que
historicamente sofreram com a escassez de médicos. Os centros de saúde
são formados não só por médicos, mas
também por enfermeiros e outros profissionais de saúde. Uma estrutura que
possibilita aos médicos organizar as
suas atividades de modo a permitir que
sejam capazes de concentrar mais tem-
Muitos países estão começando a
questionar se eles devem pagar por
tratamentos que não são muito producentes. A Alemanha tenta limitar a
utilização de tais tratamentos?
Knieps – Por lei, os planos de saúde podem não reembolsar por serviços que
são considerados desnecessários. Assim, um médico que presta tais serviços
não será pago por eles. Para determinar
o valor dos serviços médicos e de produtos, a Alemanha criou uma agência
nacional, o Instituto para a Qualidade e
Eficiência em Saúde (Institut für Qualität und Wirtschaftlichkeit im Gesundheitswesen (IQWiG)). Esta agência
é semelhante ao Instituto Nacional de
Saúde e Excelência Clínica (NICE), do
Reino Unido. Como o NICE, o IQWiG
investiga dispositivos médicos, medicamentos e outras formas de tratamento para determinar o quão eficazes eles
são. Se a agência decide que um dado
tratamento não traz benefícios à saúde, ele pode ser excluído do conjunto
de benefícios fiscais. Essas decisões
são tomadas por uma instituição muito
especial em nosso sistema, a BundeDiagnóstico | mar/abr 2013
13
ENTREVISTA
franz Knieps
sausschuss Gemeinsamer (G-BA), uma
comissão mista federal que representa
médicos, enfermeiros e demais profissionais de saúde; fundos de seguros
de saúde e os proprietários dos hospitais. Se o IQWiG decide que um novo
dispositivo ou droga não é melhor do
que as terapias existentes, o reembolso
fica próximo à taxa dada pelas terapias
existentes. Mas se a agência decide que
um novo medicamento ou dispositivo
é uma inovação real, há muito menos
restrições relativas ao reembolso do
que em outros países.
No Reino Unido, houve considerável
debate público sobre os tratamentos
que foram excluídos do reembolso.
Como a Alemanha lidou com as expectativas dos pacientes sobre a cobertura?
Knieps – Na Alemanha, cada novo tratamento é incluído no pacote de benefícios assim que é aprovado para uso,
tendo ou não a anuência do IQWiG – a
quem compete apenas determinar o valor que ele agrega. Somente se as conclusões do instituto forem negativas e o
tratamento não tiver valor, o reembolso
é negado. A Alemanha não exige que
o IQWiG ofereça uma recomendação
positiva antes que um novo tratamento
possa ser incluído no pacote de benefícios. Em nossa experiência, a maioria
dos pacientes e médicos costuma aceitar as recomendações do IQWiG. No
entanto, surgiram fortes debates sobre
algumas medicações, como os análogos
de insulina de ação prolongada. O instituto decidiu que esses remédios não
fornecem um valor adicional além do
que tratamentos de diabetes existentes
oferecem e, assim, os fabricantes não
receberam o preço adicional que buscavam. A indústria acabou tendo que
aceitar taxas de reembolso inferiores.
PROTESTO DURANTE GREVE DE
MÉDICOS NA ALEMANHA, ONDE O
SISTEMA DE SAÚDE É CONSIDERADO
MODELO NA EUROPA: no cartaz
abaixo, se lê: Opere você mesmo!
O que a Alemanha faz para obter consenso, entre todos os participantes do
sistema de saúde, sobre a assistência
médica?
Knieps – A G-BA tem um papel importante nesse sentido. A lei alemã afirma
que os pacientes têm o direito de ter
acesso ao atendimento ambulatorial.
Mas o que isso significa? Que serviços
estão incluídos na definição de atendimento ambulatorial? Quais serviços são
Shutterstock
14
Diagnóstico | mar/abr 2013
excluídos? Que padrão de qualidade é
esperado? O G-BA é encarregado de
tomar decisões sobre essas questões e,
em seguida, regulamentar a assistência
médica. Ele é capaz de fazer o que chamamos de “soft law”. Por incluir todos
os atores do processo – médicos, enfermeiros, gestores de fundos e CEOs
dos hospitais –, as decisões do G-BA
são mais propensas a serem aceitas por
todos os intervenientes no sistema. Se
o processo de tomada de decisão ocorresse dentro das paredes do Ministério
da Saúde, haveria muito menos concordância das partes interessadas.
A Alemanha utiliza listas de espera
como uma maneira de alocar serviços?
Knieps – Não temos experiência de
contingenciamento, sob esse aspecto.
Claro, os pacientes que querem consultar especialistas de renome ou receber
tratamento em hospitais muito proeminentes podem enfrentar atrasos. Mas a
maioria dos pacientes pode ter acesso a
qualquer serviço, a qualquer momento
no sistema alemão. Temos uma enorme
capacidade no nosso setor hospitalar.
E a maioria das nossas áreas urbanas
está amplamente servida com os mais
diversos especialistas. Assim, as listas
de espera não existem realmente.
De que forma a opinião dos pacientes
é usada na condução das políticas públicas de saúde na Alemanha?
Knieps – No sistema alemão, os fundos
de seguros de saúde sempre obtiveram
uma grande quantidade de dados dos
médicos, hospitais, farmácias e outras
fontes. Porém, agora eles estão autorizados a reunir tudo isso em um único
banco de dados. Trata-se de um avanço
que tem melhorado a capacidade de avaliar se as reivindicações são precisas.
E, o que é ainda mais importante, fazer
com que os dados agregados nos possibilitem orientar o sistema de maneira
mais eficaz. Isso permite, por exemplo,
que os fundos de seguros identifiquem
e criem incentivos aos médicos e hospitais para que encorajem seus pacientes
a mudar de comportamento. Portanto, a
tecnologia da informação vem desempenhando um papel muito importante
no nosso sistema. Nem tudo sobre a
agregação de dados no setor, contudo,
está funcionando bem na Alemanha.
Por exemplo, tivemos problemas com
a proteção dessas informações. Mas
acreditamos que a ampliação da coleta
desses indicadores e o uso racional dessas informações são muito importantes
para o futuro do nosso sistema.
Que outras novas ideias a Alemanha
está considerando para aumentar o
controle de custos da assistência médica?
Knieps – Acho que não há ideias novas
ou revolucionárias na política de saúde, mas existem algumas ideias antigas
que ainda valem a pena levar em conta.
Quando eu era jovem, conheci Brian
Abel-Smith, um economista da saúde
influente na London School of Economics, e o questionei sobre qual era a
grande ideia na política de saúde. Sua
resposta, em essência, foi esta: “Meu
querido jovem amigo, a única maneira
de organizar e prestar os serviços de
saúde é mudar o sistema a cada dois
anos, para que ninguém se sinta confortável nele”. Ele quis dizer que, de vez
em quando, é necessário reorganizar
a coalizão de atores dentro do sistema
para que ninguém se sinta satisfeito,
ninguém se sinta seguro. Na Alemanha, recentemente implementamos este
tipo de rearranjo através da introdução
de maior concorrência no sistema. Os
pacientes acabaram tendo muito mais
liberdade para escolher entre os vários
fundos de seguros de saúde estatutários.
Eles também têm uma maior liberdade
para escolher em quais serviços querem que haja cobertura, que médicos
consultar e quais hospitais visitar para
tratamento. Como resultado, os fundos
de seguros, médicos e hospitais devem
agora competir por pacientes. A mudança trouxe uma série de novas ideias
para o sistema e aumentou a pressão
sobre os pagadores e provedores para
oferecer serviços de alta qualidade com
eficiência. Acreditamos que o aumento
da concorrência, em combinação com
as nossas salvaguardas regulamentares,
poderia permitir que nosso sistema de
saúde se reinventasse, se não a cada
ano, pelo menos década após década.
Não está claro se faz sentido introduzir
este tipo de competição em outros sistemas de saúde, especialmente aqueles
que são administrados centralmente.
É difícil dar conselhos, mas acho que
todos devemos estar dispostos a aprender com outras experiências e a adotar
De vez em
quando, é
necessário reorganizar
a coalizão de
atores dentro do
sistema de saúde
para que ninguém
se sinta satisfeito.
Recentemente,
usamos esse tipo de
rearranjo para dar
mais concorrência ao
sistema
práticas que foram bem sucedidas em
outras nações. Por exemplo, um sistema
gerido centralmente poderia introduzir
a concorrência de forma gradual, talvez, em primeiro lugar, trazendo hospitais privados. Se isso ocorrer de forma
satisfatória, o próximo passo pode ser
aumentar a concorrência entre as seguradoras públicas e privadas. Podem
ser feitas alterações passo a passo, de
modo que os próprios atores do sistema
de saúde possam avaliar se as medidas
funcionam ou não.
Nesta etapa, você pode quantificar
com precisão o impacto das mudanças
que foram discutidas, tais como preços de medicamentos de referência,
cuidados integrados e agregação de
dados?
Knieps – Ainda é cedo. No momento,
não está claro se nós produzimos redução de custos reais ou se nós simplesmente retardamos o aumento da despesa. Estou convencido de que o custo de
assistência médica não está indo para
baixo, mas há muito que podemos fazer
para reduzir a quantidade de dinheiro
desperdiçado. Recursos que podem ser
investidos em prevenção, reabilitação e
assistência de qualidade superior.
Diagnóstico | mar/abr 2013
15
SAÚDE PÚBLICA
ÁFRICA
ATENDIMENTO EM COMUNIDADE
REMOTA DA ÁFRICA: falta de
médicos e infraestrutura ainda são
um desafio para o continente mais
pobre do planeta
Fotos: Shutterstock
16
Diagnóstico | mar/abr 2013
um diagnóstico
da saúde
africana
Como o avanço da renda e a implantação de boas práticas de gestão pública,
aliados ao investimento privado, podem ampliar o acesso à saúde de qualidade
na África subsaariana
Lowell Bryan, Michael Conway, Tineke Keesmaat, Sorcha McKenna e Ben Richardson
N
as décadas recentes, a atenção global ao
pungente estado da saúde na África subsaariana aumentou dramaticamente. O financiamento ao combate aos principais problemas de saúde no continente alcançou níveis
sem precedentes, e nítidas melhorias têm
sido feitas. Em Zanzibar, na Tanzânia, por
exemplo, as mortes por malária diminuíram substancialmente. E
em Uganda a mortalidade materna caiu mais da metade.
Apesar desses progressos, a saúde da vasta maioria das pessoas na África subsaariana continua em perigo. De 1990 a 2005,
a expectativa de vida deslizou em mais de dois anos, caindo para
47,1 anos. Além disso, milhões de africanos continuam sofrendo
de doenças que podem ser prevenidas ou curadas de uma forma
relativamente fácil.
À medida que os sistemas de saúde da região lutam para atingir os padrões básicos de atenção, muitos especialistas passaram
a acreditar que barreiras existentes no sistema impedem maiores
progressos. Uma abordagem ampla é necessária para superar esses
obstáculos. Mas como podem acontecer vastas mudanças em países que ainda lutam para oferecer cuidados básicos? Para resolver
esse problema, a Touch Foundation, uma ONG atuante na Tanzânia, e a McKinsey recentemente conduziram uma ampla investigação no sistema de saúde na região do Lago Victória, no nordeste
do país. Essa área foi escolhida porque é pequena o suficiente para
ser estudada em detalhes e grande o bastante para servir como uma
representação geográfica adequada para a Tanzânia como um todo
e, potencialmente, para toda a região subsaariana.
Essas iniciativas vão exigir novos investimentos, e nós não subestimamos as dificuldades em encontrar esses recursos necessários. Mas como essas iniciativas estão focadas o seu impacto será
desproporcional ao seu custo. A abordagem diagnóstica que usamos na região do lago forneceu uma maneira de superar o debate
sobre se os países da África subsaariana devem possuir programas
verticalizados destinados a buscar resultados em doenças específicas ou esforços horizontalizados para fortalecer os sistemas de
saúde. Qualquer sistema de saúde, na África subsaariana ou em
qualquer outra parte, pode se adaptar a essa abordagem.
OS DESAFIOS
A saúde precária de tantas pessoas na África subsaariana é amplamente conhecida há anos. Ao longo da última década, contudo, a crise na assistência médica da África recebeu uma renovada
atenção por causa de fatores como a disseminação do HIV/AIDS
e uma maior compreensão da relação entre saúde e desenvolvimento econômico.
Esses esforços produziram resultados importantes. Em um número crescente de nações africanas, a catastrófica taxa de novas infecções de HIV em adultos parece estar em queda: de acordo com
a UNAIDS (o programa da ONU para Joint United HIV/AIDS),
o número de novas infecções na África subsaariana declinou em
25% aproximadamente em 2008. Similarmente, as taxas de tuberculose estão lentamente caindo em toda a região. A incidência de
malária e a mortalidade por causa da doença estão declinando não
apenas em Zanzibar – costa leste da Tanzânia –, mas também em
muitas outras partes da África.
Entretanto, a região continua a enfrentar profundos desafios
na saúde. A Tanzânia, por exemplo, tem feito progressos contra a
mortalidade infantil, ainda que uma em cada nove crianças tanzanianas morra antes de completar cinco anos. E a taxa de mortalidade materna do país persiste alta, a despeito de três quartos dessas
mortes serem evitáveis. O país é a 92ª economia do mundo, a 15ª
da África – em um ranking formado por 60 países – e possui PIB
estimado em US$ 28 bilhões, equivalente ao do estado do Pará.
abordagem diagnóstica
Nossa investigação teve como objetivo identificar as principais
barreiras que frustram a prestação de serviços preventivos de saúDiagnóstico | mar/abr 2013
17
SAÚDE PÚBLICA
ÁFRICA
de, serviços de diagnóstico e tratamentos eficazes na zona do lago.
Para definir o esforço, construímos quatro percursos clínicos diferentes, que descrevem a viagem que os pacientes fazem através do
sistema de saúde. Com cada caminho focado em um problema de
saúde específico – malária, saúde infantil, saúde materna e trauma
–, juntos eles forneceram insights sobre como o sistema funciona
na sua totalidade.
Esta abordagem inovadora oferece vários benefícios. Ela disponibiliza uma janela para entender como os pacientes realmente
experimentam o sistema de saúde, bem como uma visão abrangente de como o atendimento é prestado na ponta. Além disso,
ao permitir comparações entre a prestação de cuidados reais e as
diretrizes internacionais de melhores práticas, ilumina as lacunas
entre elas. Mais importante, expõe as barreiras que permitem que
essas lacunas persistam.
As barreiras iniciais a uma assistência
efetiva
Três problemas que se reforçam mutuamente compõem as
barreiras mais importantes em todos os quatro caminhos: o acesso
a cuidados de saúde primários é, no máximo, apenas um terço do
que a zona lago requer; a força de trabalho é apenas uma fração do
tamanho necessário; e várias deficiências operacionais impedem o
bom funcionamento do sistema.
Acesso insuficiente
Na zona do lago, as maiores lacunas no atendimento ocorrem
em cuidados primários. Cerca de dois terços deles são oferecidos
pelo sistema de saúde pública, e o restante, por organizações sem
fins lucrativos, empresas privadas ou pelo setor informal (curandeiros tradicionais ou trabalhadores de saúde clandestinos, por
exemplo). Cuidados primários oferecidos pelo setor público são
quase sempre gratuitos, mas organizações privadas e sem fins
lucrativos geralmente cobram taxas dos usuários. Além disso, os
pacientes, muitas vezes, optam por pagar do próprio bolso por serviços prestados no setor informal. Apesar dos serviços que todos
esses grupos oferecem, a atenção primária na zona lago continua
lamentavelmente insuficiente.
Dois tipos de instalações prestam serviços de cuidados primários lá: dispensários e centros de saúde. Dispensários são pequenas
clínicas que oferecem consultas básicas, serviços de diagnóstico,
tratamento para condições de rotina e encaminhamentos para tratamentos mais avançados. Os centros de saúde fornecem esses serviços, bem como outros mais avançados. A falta de ambos os tipos
de instalações torna difícil para as pessoas, especialmente as mães
e as crianças, ter acesso a cuidados de saúde primários convenientemente. Além disso, a eficácia das instalações está comprometida
tanto pela escassez significativa de suprimentos médicos e de pessoal, quanto pela frequente falta de energia elétrica e água potável.
Dentro de todos os quatro caminhos clínicos estudados, verificou-se que as maiores lacunas na prestação de cuidados ocorrem nos
dispensários, com os centros de saúde se saindo um pouco melhor.
Uma aguda escassez de profissionais de saúde
Os profissionais de saúde estão em falta em toda a África sub-saariana, especialmente na Tanzânia. A Organização Mundial de
Saúde (OMS) estima que o país deveria ter uma força de trabalho
médica de cerca de 92 mil profissionais (a população atual do país
18
Diagnóstico | mar/abr 2013
é de 46 milhões de habitantes). O governo aspira crescer cerca de
52%, até 2019, chegando a aproximadamente 140.500 profissionais. Mas, no momento, o país tem apenas cerca de 25.400 trabalhadores em assistência médica. Uma das razões para a escassez
é o número insuficiente de programas de treinamento: a Tanzânia
tem menos de 100 instituições, que, juntas, formam menos de 4
mil alunos por ano. Até 30% dos trabalhadores de saúde do país
deixam o sistema dentro de um ano após o treino. Aqueles que se
formam, muitas vezes, acabam desistindo da carreira, como resultado dos baixos salários (com pagamentos atrasados, muitas vezes
por mais de um ano), da localização remota e da má qualidade da
maioria das instalações de cuidados primários, além da falta de
acesso a uma formação adicional, entre outras razões.
As unidades de saúde, assim, muitas vezes não têm trabalhadores com as competências para cumprir os padrões básicos de
atendimento. De acordo com as diretrizes do governo, dispensários deverão ser compostos por oito profissionais de saúde, mas
na prática a maioria tem apenas um ou dois. Os centros de saúde
devem ter cerca de 30 funcionários, mas geralmente têm menos
da metade disso. Muitas vezes, os trabalhadores de saúde nestas
instalações não têm formação ou acesso à educação médica continuada apropriada. Além disso, a produtividade é baixa: em média,
os funcionários gastam apenas cerca de 40% do seu tempo de trabalho na assistência ao paciente.
Deficiências do sistema
Além desses problemas, três debilidades evitam que o sistema
de saúde da região do lago alcance melhores resultados.
Falta de dinheiro – A Comissão de Microeconomia e Saúde
da OMS estima que a maioria das nações em desenvolvimento
precise gastar de US$ 30 a US$ 40 por pessoa por ano para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) das
Nações Unidas. O gasto per capita anual da Tanzânia é apenas
cerca de US$ 20.
Práticas de gestão frágeis – Poucos dispensários, centros
de saúde e hospitais usam ferramentas de gestão de desempenho
eficazes. Muitos incentivos para os trabalhadores de saúde estão
desalinhados – o trabalho é recompensado pelas tarefas executadas e não pelos resultados do paciente, por exemplo. Além disso,
a zona do lago carece de sistemas de informação para apoiar a
prestação de atendimento médico. Uma razão pela qual a escassez de oferta é comum em dispensários e centros de saúde é que
o sistema não tem uma maneira eficiente de controlar os níveis
de estoque. A cadeia de fornecimento do sistema também sofre
de supervisão gerencial fraca e processos pobres de aquisição e
distribuição.
Mentalidades e comportamentos – Entrevistas com
membros da equipe (especialmente aqueles que trabalham em cuidados de saúde primários) sugerem que muitos estão com moral
baixa pelos mesmos fatores que fazem com que os seus colegas
deixem a assistência médica. Pacientes detectam essa apatia. Muitos veem os profissionais de saúde desmotivados, irresponsáveis
e não qualificados.
Estes problemas se reforçam mutuamente: baixo financiamento, por exemplo, se traduz em baixos salários e níveis de abastecimento precários, que acabam impactando na baixa autoestima das
equipes, tendo como consequência direta a baixa produtividade e
o aumento das taxas de retenção. Se os cuidados de saúde devem
ser entregues de forma eficaz na zona do lago, este círculo vicioso
NAIROBI, CAPITAL DO QUÊNIA:
governos locais vêm descobrindo que o
desenvolvimento econômico da África
subsaariana está vinculado ao avanços
na saúde pública da região
Diagnóstico | mar/abr 2013
19
SAÚDE PÚBLICA
ÁFRICA
TERCEIRO SETOR: ajuda de ONGs é
apenas uma parte da solução para um
sistema de saúde ainda precário e com
baixa resolutividade
deve ser transformado em um virtuoso. Fornecimentos e serviços
melhores e mais acessíveis poderiam atrair mais pacientes, o que
poderia levar a um aumento das receitas e salários e, por fim, a
maior motivação, produtividade e menor retenção.
Melhorando o acesso à atenção básica
Estender o alcance da atenção primária e melhorar o seu desempenho requer uma ação em várias frentes simultaneamente,
incluindo novos modelos de atendimento para aumentar o acesso,
um papel maior para as organizações sem fins lucrativos e privadas na prestação de serviços, bem como a introdução de incentivos de desempenho para melhorá-lo.
Outros países em desenvolvimento utilizam três modelos de
atendimento inovadores para fornecer cuidados primários de baixo custo. Agentes comunitários de saúde têm apenas formação limitada, mas realizam atividades de promoção da saúde e servem
como elo para os colegas melhor treinados. Como quase todas as
aldeias podem ter seu próprio agente comunitário de saúde, as noções básicas de prestação de assistência médica estão disponíveis
para todos. Assistência de saúde móvel é uma forma de estender
o alcance de dispensários e centros de saúde. Os profissionais de
saúde se deslocam regularmente para aldeias vizinhas não atendidas (um dia por semana, por exemplo), levando suprimentos médicos básicos e ferramentas de comunicação. Call centers operados por enfermeiros (com a supervisão de médicos) podem apoiar
tanto a comunidade quanto as equipes móveis de profissionais de
20
Diagnóstico | mar/abr 2013
saúde, que usam telefones celulares ou outras tecnologias de comunicação para se consultar com a equipe.
Para melhorar o desempenho nos dispensários do setor público e centros de saúde, o sistema de saúde pode oferecer incentivos
à sua força de trabalho. Atualmente, estas instalações são formadas por empregados assalariados pouco motivados a melhorar a
prestação de atendimento. Muitos países desenvolvidos resolveram problema semelhante baseando o reembolso em uma combinação de captação e algum tipo de taxa por serviço ou modelo
de remuneração por desempenho para equilibrar a necessidade de
aumentar o serviço com as limitações do orçamento. A Tanzânia
começou a se mover nessa direção, por exemplo, e agora oferece
pagamento de bônus por desempenho aos trabalhadores de saúde
que atendam a determinados objetivos da saúde materno-infantil.
A Tanzânia poderia ir mais longe. Muitos países incentivam a
apropriação de algumas formas de prestação de assistência. Mesmo em sistemas de financiamento público, como o Sistema Nacional de Saúde do Reino Unido, por exemplo, a maioria dos médicos
de família é dona de seus consultórios. A Tanzânia poderia usar
abordagens semelhantes.
Uma inovação que tem sido utilizada com sucesso em outros
lugares é incentivar as organizações sem fins lucrativos e privadas
à prestação de cuidados mais primários. Em alguns países em desenvolvimento, dispensários e centros de saúde que são operados
pelo proprietário ou geridos através de um modelo sócio-franchising complementam as ofertas de serviços oferecidas pelo setor
público. No Quênia, por exemplo, mais de 60 dispensários franqueados prestam atendimento de saúde a cerca de 350 mil pacientes por ano. O custo dessas instalações está coberto não só pelos
gastos do governo e as contribuições dos doadores, mas também
pelos pagamentos dos pacientes. Que os tanzanianos paguem por
alguns serviços de saúde não é uma ideia nova, pois as estimativas
oficiais sugerem que, apenas em 2006, eles gastaram entre US$
208 milhões e US$ 265 milhões do próprio bolso em atendimentos de saúde.
Para funcionar corretamente, os incentivos devem ser apoiados por dados operacionais detalhados sobre o número de pacientes atendidos e as condições de tratamento. Uma rotina de recolhimento desses dados é, portanto, essencial. O uso rapidamente
crescente de telefones celulares torna isso possível, mesmo em
ambientes pobres em recursos.
Aumentando a força de trabalho
A Iniciativa Twiga – que em idioma nativo significa girafa
– pretende dobrar a capacidade da Tanzânia em treinar os profissionais de saúde (dos atuais 3.850 para 7.500 por ano), em um
dos mais importantes programas do governo na área. Embora este
plano possa aumentar a força de trabalho do sistema de saúde dos
atuais 25 mil para 48 mil em 2019, o quadro de pessoal ainda vai
ser muito baixo. Devem ser consideradas quatro medidas adicionais: novos tipos de trabalhadores com necessidade de formação
mais curta, bem como uma melhor retenção de pessoal, recursos
de treinamento e produtividade da equipe. A maioria dos traba-
lhadores de saúde na Tanzânia recebe pelo menos dois anos de
treinamento. Em alguns casos, três. No entanto, o tempo médio de
treinamento pode cair consideravelmente se forem introduzidos
dois novos tipos de profissionais de saúde: um daria atenção primária básica em dispensários, o outro, às formas de sensibilização
da comunidade descritas acima. A experiência de outros países
em desenvolvimento sugere que esses trabalhadores poderiam ser
educados em cerca de um ano. Desta forma, a Tanzânia poderia
educar mais de 26.500 trabalhadores no prazo de dez anos.
Mas esses novos trabalhadores da saúde não vão reduzir a necessidade de funcionários dispostos a trabalhar em áreas rurais.
Para ajudar a atrair trabalhadores de saúde (especialmente médicos e enfermeiros) para o campo e incentivá-los a permanecer lá,
a Tanzânia poderia oferecer empréstimos estudantis e pacotes de
incentivos, bem como um maior compromisso dos distritos locais
para manter a qualidade dos serviços de saúde. Além disso, o país
poderia introduzir programas de orientação ativa e e-learning para
melhorar a formação contínua.
Com isso, os hospitais da Tanzânia podem desempenhar um
papel crucial na expansão de programas de treinamento de força
de trabalho, criando e fornecendo recursos de e-learning e desenvolvendo novos programas de orientação. Essas instituições devem reforçar a sua liderança clínica, de gestão de desempenho e
capacidades de gestão de talentos e formar redes para estabelecer
acordos de referência mais eficazes de prestadores de atendimento
primário e entre hospitais distritais, regionais e terciários. Essas
redes também poderiam oferecer educação médica continuada nas
áreas de captação e aumentar a colaboração entre os estabeleci-
mentos. Hospitais poderiam fazer parcerias com instituições de
ensino internacionais para ter acesso também a informações sobre
os recentes avanços na assistência médica.
A Tanzânia não pode, no entanto, resolver a crise da força de
trabalho sem melhorar a produtividade de seus trabalhadores, atualmente em 40% no nível de melhores práticas, para cerca de 55%
(uma meta razoável para os padrões internacionais). Hospitais podem liderar o caminho através da realização de programas de melhoria de desempenho para aumentar a sua própria produtividade
e expor os formandos a métodos mais eficientes, o que teria um
impacto direto até mesmo na atenção básica.
Um programa padronizado de melhoria de desempenho voltado especificamente para dispensários e centros de saúde poderia
também ter um impacto significativo se os membros da equipe
tivessem incentivos adequados e fossem abertos à mudança.
Criando um sistema de saúde sustentável
Três mudanças fundamentais devem ocorrer para o sistema de
saúde melhorar o atendimento de uma forma real e substancial.
Nada vai ser fácil de fazer, mas todas são necessárias.
MORTALIDADE INFANTIL EM QUEDA:
apesar dos progressos, uma em cada nove
crianças morre antes de completar cinco
anos na Tanzânia
Diagnóstico | mar/abr 2013
21
SAÚDE PÚBLICA
ÁFRICA
Aumentando o financiamento – Embora o sistema
de saúde deva receber mais financiamento, as condições econômicas atuais, tanto no mundo quanto na Tanzânia, tornam
aumentos significativos irrealistas. Propomos, portanto, novos
modelos de cuidados de saúde primários e novas formas de ampliar a força de trabalho. Essas mudanças poderiam aumentar
a cobertura do sistema de saúde na zona do lago significativamente, de forma eficiente e econômica. Hoje em dia, o sistema
atinge apenas cerca de um terço da população da região. Sem
mudanças na forma como o sistema funciona, o financiamento
pode ter que triplicar, portanto, para prestar atendimento médico adequado a toda a população. Por outro lado, as nossas
recomendações dobrariam a cobertura na zona do lago com um
aumento de 35% no financiamento. A cobertura total seria possível com um aumento de 70%.
Mesmo estas abordagens serão um desafio para serem implementadas na zona lago no curto prazo. Nos últimos anos, no
entanto, o PIB da Tanzânia aumentou o dobro da taxa de crescimento da população (6% contra 3%). Até mesmo em 2008, o
país teve um aumento do PIB sólido. Graças a esta tendência, o
gasto per capita da Tanzânia em cuidados de saúde deve aumentar em 70% em 18 anos. Além disso, se o crescimento do PIB
continuar forte, o governo pode ser capaz de aumentar a parcela
do seu orçamento dedicada aos cuidados de saúde ao nível em
que se comprometeu na Declaração de Abuja, que a Tanzânia e
outros 43 países africanos assinaram em 2001, fixando os gastos
com saúde pública em 15% de seus orçamentos.
Se a dotação orçamentária subir de seu nível atual (cerca
de 11%) para os 15% prometidos, o financiamento público do
sistema aumentará em quase 36%, reduzindo para 13 anos o
tempo necessário para alcançar um aumento de 70%. Alguns
ganhos com o crescimento do PIB seriam, no entanto, anulados
pela inflação da assistência médica. No entanto, estima-se que,
em 2019, o gasto per capita com saúde da Tanzânia pode aumentar em 85%. Na verdade, mesmo se o crescimento do PIB
for menor do que tem sido anteriormente, a Tanzânia poderia
aumentar o financiamento dos cuidados de saúde consideravelmente em 2019. Estes cálculos revelam que a percentagem de
financiamento da assistência médica, com a contribuição do setor privado, permanece estável. Para que isso aconteça, tanto os
gastos dos bolsos dos tanzanianos quanto a ajuda externa para
o desenvolvimento teriam que ir aumentando em linha com o
crescimento do PIB. Dada a atual recessão, manter esse crescimento no curto prazo será outro desafio.
No entanto, os doadores podem valorizar a chance de atuar
como catalisadores para a mudança necessária, especialmente
se o seu dinheiro servir para estimular o sistema durante uma
década, enquanto o país constrói um modelo de financiamento interno sustentável. Se os tanzanianos podem pagar valores
mais elevados do próprio bolso, é incerto, mas ao oferecer modelos inovadores de assistência médica com uma melhor prestação de serviços, os fornecedores privados ou sem fins lucrativos
podem capturar uma fatia maior dos pagamentos que atualmente vão para o setor informal.
Melhor capacidade de gestão – A implementação
das nossas ideias para melhorar o atendimento primário e a capacidade da força de trabalho vai exigir supervisão significativa
do Ministério da Saúde da Tanzânia e das autoridades locais.
Assim, eles terão de reforçar as suas capacidades de lideran22
Diagnóstico | mar/abr 2013
ça, especialmente a sua condição de monitorar a entrega de
iniciativas ambiciosas e fornecer gestão eficaz para o sistema.
A tecnologia da informação é importante nesse processo. Os
funcionários podem, por exemplo, aproveitar o poder de telefones móveis para coletar dados e gerenciar as operações em
instalações individuais. A TI também poderia melhorar significativamente a cadeia de fornecimento do sistema para garantir
que a quantidade adequada de medicamentos e equipamentos
está disponível quando necessária. Organizações sem fins lucrativos e religiosas da Tanzânia reportam que têm muito menos problemas de falta de estoque e que os seus custos com a
cadeia de suprimentos são mais reduzidos do que os das lojas de
departamento médicas operadas pelo governo. Seus resultados
sugerem que a Tanzânia poderia fortalecer o desempenho do
departamento de saúde, abrir o fornecimento de suprimentos à
competição privada, ou ambos.
A coleta de dados rotineira permitirá que as autoridades monitorem a demanda por serviços e a implantação e produtividade dos funcionários em cada unidade. Uma vez agregados, os
dados podem ser usados para examinar as tendências de saúde,
identificar as questões emergentes e avaliar o desempenho de
todo o sistema de saúde. Prestadores de fora do sistema público
poderiam desempenhar um papel importante na ampliação do
seu alcance, mas o ministério tem que garantir que eles entreguem um atendimento de qualidade a um preço razoável.
Embora seja necessária uma maior fiscalização dos prestadores sem fins lucrativos e privados, a regulamentação deve
ajudá-los a operar de forma sustentável em qualquer lugar, não
apenas em áreas de alta renda.
Melhores mentalidades e comportamentos –
Gratificações por desempenho e outros programas de incentivo
poderiam motivar os profissionais de saúde a oferecer atendimento de alta qualidade com eficiência. A entrega aperfeiçoada
de suprimentos reduziria a frustração. Melhores capacidades de
gestão ajudariam a garantir que os trabalhadores sejam pagos a
tempo. Para melhorar ainda mais as atitudes dos profissionais
de saúde, o sistema deve lhes oferecer formação em gestão e
outras oportunidades de desenvolvimento de competências e
um ambiente de trabalho mais favorável. E deve assegurar que
os seus líderes clínicos sejam modelos eficazes. A mudança de
mentalidade entre os pacientes também é necessária para que
eles procurem tratamentos necessários mais prontamente. A
presença de agentes comunitários de saúde em cada aldeia pode
ajudar a mudar mentalidades, fazendo os pacientes verem que o
sistema de saúde está atendendo às suas necessidades imediatas.
Nossa experiência em outros países subsaarianos sugere que
muitos deles enfrentam problemas semelhantes. Uma abordagem investigativa semelhante à descrita aqui pode permitir que
os países identifiquem as barreiras específicas que os impedem
de prestar cuidados de saúde de forma eficaz e as iniciativas que
têm o maior impacto na superação das barreiras.
Esses países podem fortalecer seus sistemas de saúde, fazer
progressos significativos na melhoria da prestação de cuidados
e, mais importante, salvar muitas vidas.
Este artigo é uma reprodução. Mckinsey Quartely | www.mckinseyquartely.
com. Publicado com exclusividade na América Latina pela revista Diagnóstico. Todos os direitos reservados. Tradução: Gilson Jorge
Diagnóstico | mar/abr 2013
23
Ensaios
HENRIQUE SALVADOR
COMO ATENDER À DEMANDA
DA SAÚDE?
Apesar da falta de incentivo do governo federal, hospitais privados
ampliam número de leitos para desafogar o setor
P
ara enfrentar a demanda crescente dos quase 48
milhões de beneficiários de planos de saúde, os
hospitais privados têm procurado investir em ampliações. Se visitarmos as principais instituições
privadas de assistência à saúde do país, perceberemos que a maior parte delas encontra-se em algum processo de expansão.
Este cenário reflete, de certa forma, as contradições do sistema de
saúde brasileiro. O setor privado, que deveria ser complementar, é
responsável por 64% dos leitos no país. Isso ocorre principalmente em virtude da falta de planejamento e gestão do setor público de
saúde e da falta de investimentos na área.
Os gastos com saúde no Brasil representam hoje 9% do Produto Interno Bruto (PIB) do país. Apenas o setor privado é responsável por 53% desse valor, ou seja, R$ 210,2 bilhões. Do universo de
6.293 hospitais no Brasil (dezembro de 2012), 65% são privados.
Além disso, de acordo com dados da Organização Mundial
de Saúde (OMS), o número de leitos preconizados para cada mil
habitantes é de três a 3,5. No Brasil, estamos longe de cumprir a
meta, com 2,3 leitos para cada mil habitantes. Nos países desenvolvidos, como a Austrália, por exemplo, que possui um sistema
de saúde parecido com o brasileiro, a estimativa é de 3,8 leitos
para cada mil habitantes.
Apesar da representatividade do setor privado na saúde, este
ainda enfrenta resistência por parte do governo federal quando
se trata de incentivos ao crescimento e desenvolvimento. Como
exemplo, podemos citar a impossibilidade de investimentos estrangeiros nos hospitais brasileiros, vedados pela legislação do
país, criando dificuldades à sua modernização, expansão e fortalecimento. Outro exemplo é a questão da desoneração fiscal, que
hoje contempla mais de 40 setores da economia, exceto prestadores de serviço em saúde.
Em meio a esse ambiente desfavorável, outras preocupações
acometem o setor, como o envelhecimento populacional, que tem
impacto direto na assistência e na demanda por serviços de saúde,
a migração e ascensão das classes sociais no Brasil e o crescimento do emprego formal, que eleva o número de contratos empresariais e, consequentemente, o número de beneficiários de planos de
24
Diagnóstico | mar/abr 2013
saúde. Essa desordem do setor provoca, por sua vez, a lotação dos
pronto-atendimentos das instituições de saúde e a insuficiência de
leitos disponíveis. É importante mencionar, ainda, que mais de
57% dos leitos privados são destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS), o que sobrecarrega ainda mais as instituições privadas.
A partir desse panorama, como atender à demanda crescente
de saúde no país? Para suportar o aumento significativo de beneficiários, os hospitais privados recorrem às poucas alternativas
já conhecidas de financiamento de sua expansão e modernização
no mercado, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o sistema bancário privado, fundos
de investimento imobiliários ou recursos próprios. O BNDES é o
meio de financiamento mais utilizado pelas instituições privadas.
Os juros são mais baixos do que os dos bancos comerciais, mas
apenas uma parte do investimento pode ser financiada. Os bancos
privados também são uma alternativa, mas os juros são elevados,
o que, na prática, inviabiliza a sua utilização, uma vez que a margem financeira operacional do sistema hospitalar privado, muitas
vezes, não permite a utilização dessas vias de financiamento.
Os fundos de investimento imobiliários ainda não possuem
escala e experiências que comprovem com segurança sua eficácia.
Por último, a utilização de recursos próprios, que nem sempre são
viáveis ou estão ao alcance das instituições.
A reorganização do sistema de financiamento do setor é necessária. A obtenção de recursos é fundamental para a sustentabilidade das instituições privadas de saúde. Essa discussão não é
recente, e alguns movimentos para ampliar as opções do segmento
são observados no mercado.
A incorporação crescente de tecnologia, o investimento em
iniciativas que priorizam a segurança assistencial, o atendimento
às exigências regulatórias e a capacitação das pessoas que trabalham nas instituições prestadoras de serviços de saúde são apenas
alguns exemplos da demanda crescente para os aportes financeiros. O setor precisa crescer para atender à demanda, e, o mais importante, crescer com qualidade e segurança na assistência. Mas,
para que isso seja possível, é preciso rever as políticas de financiamento para os prestadores de serviço de saúde privados, que hoje,
pelas restrições abordadas, dificultam a evolução adequada do sis-
tema. A gestão competente do sistema público também é fundamental nesse processo, pois, como foi possível evidenciar com os
dados citados acima, a ineficiência da saúde pública sobrecarrega
e prejudica o sistema privado.
Estamos todos trabalhando pelo bem comum da melhoria da
saúde em nosso país. Apesar das dificuldades enfrentadas, não
podemos desconsiderar o fato de que o Brasil possui um sistema
público de saúde que é modelo para os demais países em desenvolvimento e um dos maiores do mundo. Ainda que existam falhas nesse modelo de atenção à saúde, são poucos os países que
proporcionam atendimento com a abrangência do Sistema Único
de Saúde (SUS). Mas, sem dúvida, precisamos nos empenhar para
melhorar o acesso dos brasileiros a melhores e mais resolutivos
serviços de saúde.
O setor privado também deve resgatar a sua função social,
impulsionando as questões relacionadas à gestão e a inovações
tecnológicas, além de voltar a ser uma opção do usuário, em vez
de proporcionar desordenadamente os cuidados de saúde que deveriam ser ofertados pelo sistema público.
“
Shutterstock
O setor precisa
crescer para
atender à
demanda, e, o mais
importante, crescer
com qualidade
e segurança na
assistência. Mas,
para que isso seja
possível, é preciso
rever as políticas
de financiamento
Henrique Moraes Salvador Silva é médico, presidente do Hospital Mater-Dei
(MG) e ex-presidente do Conselho de Administração da Associação Nacional
de Hospitais Privados (Anahp).
Diagnóstico | mar/abr 2013
25
ENTREVISTA
MAURO NUNES
MAURO NUNES,
DO MédicoS sem
fronteiras: quase
uma centena de
brasileiros, a maioria
mulheres, atuam em
missões do MSF em
diferentes partes do
mundo
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Diagnóstico | mar/abr 2013
Leogump Carvalho
“Médicos Sem Fronteiras está à
procura de bons gestores no Brasil”
Presidente no Brasil do MSF, o carioca Mauro Nunes diz que hospitais mantidos
pela entidade precisam também de administradores voluntários, fala sobre as
particularidades da carreira e admite: sempre haverá riscos no exercício da atividade
Reinaldo Braga
Diagnóstico – Qual o perfil do profissional de saúde que costuma se candidatar a voluntário do MSF?
Mauro Nunes – É preciso ter, antes de
mais nada, vontade de trabalhar com
ajuda humanitária. A grande maioria dos
profissionais que postulam atuar com a
organização – mesmo aqueles que não
são recrutados porque não atendem às
exigências da organização – é motivada
por esse desejo de ajudar. Possuímos em
nossos quadros desde pessoas muito jovens até senhores e senhoras com muita
experiência, que fecham suas clínicas
ou pedem licença de seus trabalhos para
se dedicar por um tempo ao MSF. Para
muitos, o trabalho humanitário é uma
opção de carreira. Atualmente, cerca de
100 brasileiros trabalham com Médicos
Sem Fronteiras em diferentes partes do
mundo. A maioria é mulher e da área
médica – médicos e profissionais, como
enfermeiros, psicólogos e farmacêuticos. Mas para fazer os cuidados com a
saúde chegarem até os nossos pacientes
também precisamos de profissionais de
outras áreas, como logísticos, administradores, economistas etc. Entre os
brasileiros, cerca de 20% têm esse tipo
de formação. A idade média dos nossos
profissionais é 38 anos.
Diagnóstico – Por que o MSF está à
procura de gestores?
Nunes – Médicos Sem Fronteiras mantém inúmeros hospitais em diferentes
países e eles precisam de bons gestores,
como qualquer outro tipo de hospital.
Para trabalhar na organização, além da
formação tradicional desse profissional,
que é bem específica, e de falar inglês
ou francês fluentemente, ele deve ter
pelo menos dois anos de experiência
profissional. É preciso ainda ter disponibilidade para morar em países que
enfrentam crises causadas por conflitos
armados, epidemias, fome e desastres
naturais. Um profissional que vai trabalhar com o MSF pela primeira vez recebe entre 700 e 1.040 euros por mês. Ou
seja, é um trabalho com muitos desafios.
Diagnóstico – De onde vêm os recursos
para manter as ações do MSF?
Nunes – Fundamentalmente de pessoas
físicas, porque isso garante a independência e a neutralidade fundamentais
para o nosso trabalho. Essa prerrogativa
possibilita que a organização trabalhe
em situações de conflito, nas quais, muitas vezes, outras instituições não conseguem atuar por conta de seus vínculos
políticos e econômicos. O trabalho do
MSF é pautado exclusivamente pela necessidade dos beneficiários, nunca por
interesses políticos, religiosos ou econômicos.
Diagnóstico – Trabalhar no MSF continua sendo uma atividade de risco?
Nunes – Médicos Sem Fronteiras tem
rigorosos protocolos de segurança para
evitar que incidentes aconteçam, mas
não podemos dizer que não existem riscos. Os países onde o MSF mantém seus
projetos, em geral, vivem um contexto
de crise que, mesmo quando não causa
um conflito armado, pode estar associado a um aumento da violência.
Diagnóstico – O que é mais grave na
ajuda humanitária atualmente: os conflitos étnicos e políticos ou o acesso
escasso a estruturas de saúde nos rincões do planeta?
Nunes – Não gosto de apontar essa ou
outra crise como a mais grave porque
não é possível escalonar o sofrimento
humano. No momento, o nosso grande
desafio é levar ajuda humanitária para
a população síria. O governo não está
permitindo a entrada de ajuda humani-
tária no país e também não permite um
cessar-fogo para a retirada dos pacientes
feridos para um dos campos de refugiados dos países fronteiriços onde o MSF
mantém equipes médicas. Nossas equipes estão trabalhando no país há dois
anos, em três hospitais montados em
casas que foram adaptadas para receber feridos. Atuando dessa maneira, não
conseguimos levar ajuda suficiente para
atender às necessidades da população
afetada pela guerra. Nesse tempo todo,
estamos conversando com o governo
para tentar a autorização para podermos
ampliar o nosso trabalho na Síria, mas
até agora não tivemos uma resposta positiva.
Diagnóstico – Nesses 20 anos de organização, qual a imagem que mais marcou a sua atuação como voluntário?
Nunes – Guardo algumas muito tristes,
como a de dezenas de pessoas catando
míseros grãos de milho que caíam dos
sacos que se rompiam durante seu desembarque do avião para se alimentar,
no período da guerra em Angola. Mas
nem tudo é tristeza. Temos momentos
muito emocionantes que dão sentido
ao que fazemos. Alguns anos depois da
guerra, voltei para Angola. Uma jovem
me parou e me deu um abraço supercaloroso. Eu não a reconheci, mas ela disse
que havia sido minha paciente quando
pequena. Contou que eu tinha cuidado
dela em um de nossos centros nutricionais e começou a cantar uma música que
as recreadoras ensinavam para as crianças na época. Foi uma felicidade reencontrar uma paciente tão bem de saúde,
com a vida reconstruída e um filho no
colo. Ela me apresentou o menino e disse que o nome dele era Mauro, como eu.
Fiquei muito emocionado. São histórias
como essas que me mantêm no MSF há
22 anos.
Diagnóstico | mar/abr 2013
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28
Diagnóstico | mar/abr 2013
Divulgação
ARTIGO
Eduardo Najjar
U
Governança familiar - Comunicação e transparência
Há no mundo um movimento de incentivo à total transparência nas informações que o governo, empresas e demais grupos
organizados devem deixar à disposição de seus membros, das
pessoas em geral.
No tocante à empresa familiar, refiro-me à transparência:
- nas relações entre membros da família empresária, bem como
no relacionamento profissional entre estes e os funcionários-chave
(não familiares) que ocupam cargos na gestão dos negócios da
família;
- na gestão dos negócios da família, em aspectos como: operação, principais investimentos, desempenho global e resultados
do negócio, informações econômico-financeiras, eventuais planos
de contingência, desempenho de membros da família na gestão da
empresa, entre outros assuntos.
Faço apenas uma ressalva: nem todas as informações estratégicas do negócio devem estar à disposição de todos os membros
da família. Não é razoável esperar que todos
tenham pleno acesso a
todas as informações.
Um exemplo: o fasão bem sucedidos, as questões problemas, sucessos,
miliar não envolvido
fracassos, desejos e expectativas devem ser discutidos diretamente na gestão
do negócio, obviamenabertamente e com franqueza
te, possui menos informações do que aquele
que
ocupa
cargo
na
gestão
na
empresa,
que,
por sua vez, terá um
Em conjunto, comunicação eficaz e transparência total apoiam
menor
nível
de
informação
do
que
o
familiar
que ocupa o princia atuação da família, na formulação e implementação de soluções
pal
cargo
na
direção
dos
negócios.
que previnam e solucionem, rapidamente, os conflitos familiares.
Os responsáveis pela governança da empresa devem, por
Desta forma, negócios e o patrimônio da família empresária
sua
vez, definir instrumentos e níveis de acesso para que todos
estarão protegidos.
os
membros
da família empresária tenham acesso às informações
O que é comunicação eficaz?
que
permitam
obter um panorama do desempenho econômico, enComunicação eficaz, formal ou informal, refere-se à postura
quanto
acionistas
do negócio.
individual dos membros da família empresária. Na prática, estaTransparência
total ultrapassa os limites dos negócios da
mos falando da disponibilidade para:
família.
Nas
famílias
empresárias cujos negócios são bem su- discutir aberta, direta e honestamente pontos de vista pessocedidos,
as
questões
e
problemas, sucessos e fracassos, desejos,
ais;
expectativas
e
necessidades
dos familiares devem ser discutidos
- expressar o que pensam e como se sentem;
abertamente
e
com
franqueza.
No Brasil, este é um patamar a ser
- ouvir ativamente o que é dito pelos demais familiares;
conquistado.
A
maior
parte
das
famílias empresárias encontra-se
- ser receptivo aos pensamentos e sentimentos de outros memem
estágio
inicial,
neste
aspecto.
Quando a governança da família
bros da família.
empresária
garantir
as
características
discutidas neste artigo – coNo nível formal, a comunicação pode ocorrer em reuniões de
municação
eficaz
e
transparência
total
–, estará criada a receita de
diretoria, do conselho de administração, do conselho de família.
sucesso
para
os
negócios
e
o
patrimônio
da família, para as atuais
A comunicação informal ocorre no dia-a-dia, entre pais e filhos,
e
para
as
futuras
gerações.
irmãos, primos e demais membros da família empresária.
O líder, ou principais líderes da família empresária, deve dar
o exemplo, criando mecanismos adequados para que a comunicação eficaz seja uma realidade entre os membros das diversas Eduardo Najjar é expert brasileiro em family business, consultor e palestrante
associado da Empreenda, coordenador do GrandTour Family Business
gerações e núcleos familiares.
Internacional, professor na ESPM e, além da Diagnóstico, é colunista do Blog do
Transparência na empresa familiar
Management (Exame.com).
m dos desafios do ciclo de vida da empresa
familiar é a estatística mundialmente confirmada: somente 12% a 15% das empresas
familiares atingem a terceira geração.
O fato principal que dá causa a estatística tão perversa são os conflitos familiares
não resolvidos.
Neste ambiente, os conflitos podem ter como causa: disputa
por dinheiro, status, poder, posicionamento entre sócios, problemas na gestão da empresa ou assuntos relativos a acontecimentos
e atitudes entre membros da família empresária.
Minha experiência de trabalho com empresas familiares, ao
longo dos últimos 20 anos, demonstra que as empresas bem sucedidas apresentam algumas características importantes. Neste
artigo, discutirei duas delas, essenciais ao sucesso: comunicação
eficaz e transparência total.
Nas famílias empresárias cujos negócios
Diagnóstico | mar/abr 2013
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30
Diagnóstico | mar/abr 2013
Diagnóstico | mar/abr 2013
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POLÍTICA
legislação
Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
‘SANTA’ CASA
A dinâmica do jogo político, do partidarismo e do lobby no Congresso Nacional
para apreciar os projetos que interessam à saúde de milhões de brasileiros
A
Lenir Camimura,
de
Brasília
Saúde deveria ser o
assunto prioritário da
Câmara dos Deputados. Este foi o resultado apontado por
uma pesquisa recente
realizada pela Coordenação de Participação Popular da Câmara dos Deputados com 1.578 usuários do
Disque-Câmara, em todas as regiões brasileiras. Segundo o levantamento, mais de
32
Diagnóstico | mar/abr 2013
60% dos entrevistados escolheram a Saúde
como tema prioritário, seguido por Educação (55,1%) e Segurança (48,6%). Em
entrevista à TV Câmara, o líder do PT na
Casa, deputado José Guimarães (CE) reconheceu que as prioridades do parlamento e
da sociedade se distinguem. “Precisamos
acompanhar com mais cuidado, apurar e
sintonizar melhor as decisões da Câmara
com o que pensa a sociedade”.
À Diagnóstico, o senador Humberto
Costa (PT-PE), que foi ministro da Saúde
do governo Lula, disse acreditar que, de
modo geral, a Saúde não tem tido mais
prioridade do que outras áreas. Segundo
ele, que atualmente é relator da Comissão
Temporária do Senado que debate soluções para o financiamento da Saúde Pública, há um grupo forte e organizado de parlamentares atuantes e ativos no Congresso
Nacional, mas que não têm conseguido
impor uma agenda que seja predominan-
ferentes à Saúde nos últimos anos. O presidente executivo da Associação Brasileira
da Indústria de Artigos e Equipamentos
Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo), Paulo Henrique Fraccaro,
acredita que a Saúde é “a bola da vez”.
Segundo ele, há cinco anos, em qualquer
agenda governamental o assunto Saúde
aparecia como tema secundário, mas hoje
tem destaque no governo. “A Saúde, nesse momento, representa 10% do PIB, isso
sem considerar os medicamentos. O setor
tem uma significância enorme, até porque
não representa só despesa, mas é um setor
que gera tributos e empregos, além de cuidar da população”.
Mesmo assim, não só na Saúde, mas
em todos os segmentos da economia brasileira, toda vez que se precisa de uma legislação específica, sabe-se que o processo
será demorado. Em Brasília, como de costume, a atenção a um projeto vai depender do interesse da maioria, tanto política,
quanto das pessoas que trabalham dentro
do governo. Atendendo a esse requisito, a
proposta tem a chance de caminhar de uma
maneira muito mais rápida, embora essa
velocidade ainda esteja longe do ideal. “É
muito natural para países como o nosso,
que têm uma série de barreiras para serem
transpostas, que os parlamentares deem
mais atenção aos projetos sobre os quais
há mais cobrança”, reconhece o presidente
da Abimo.
plenário da Câmara dos
deputados, em brasília:
pluralidade de interesses faz
com que o trâmite de um projeto
adormeça ou desperte, a depender
de qual lado se está
temente da área da Saúde. Mesmo com
o apelo social, acredita o senador, não se
percebe uma sensibilidade dentro do parlamento em relação ao tema Saúde. “Há um
sentimento muito forte, generalizado, de
que a pasta não pode continuar como está,
especialmente do ponto de vista dos recursos”, salienta Costa. “Mesmo assim, acho
que se o governo quisesse impedir o debate ou a aprovação de alguma medida que
implicasse no crescimento substantivo de
recursos para a Saúde, não conseguiria”.
Do ponto de vista externo, no entanto,
especialistas garantem que o Legislativo
tem dado mais importância às questões re-
Rito Regimental – As regras do
jogo são postas pelos regimentos internos
da Câmara e do Senado, que definem, entre
outras questões, quantas comissões devem
analisar os projetos, quantas sessões serão
necessárias para as discussões, bem como
a estrutura da Mesa Diretora, do Colégio
de Líderes e das Comissões Permanentes.
Segundo o analista político Carlos Lopes,
há uma estrutura decisória, que funciona
muito bem quando se há regras. Ele explica que cabe ao Colégio de Líderes uma
das mais valiosas decisões da Casa, antes
de uma votação: a pauta no Plenário da
Câmara. “Recentemente, o presidente da
Casa queria votar a Reforma Política, mas
não houve acordo para que se assinasse o
regime de urgência e, com isso, o projeto
não foi votado”, exemplifica. “Não quero
dizer que uma ou outra decisão é boa, mas
o que está em questão é que existem regras
para serem obedecidas. Existe um jogo definido”.
É debaixo dessas regras que atuam os
poderes de influência, quer venham do
A saúde tem um
forte apelo
social, mas, nos
últimos anos, o
Planalto tem exercido
um controle enorme
sobre o destino do
setor no Parlamento. E
isso é ruim
darcísio Perondi, presidente
da frente parlamentar da
saúde
governo, quer da sociedade. A bancada
de Saúde, por exemplo, representada pela
Frente Parlamentar de Saúde, congrega,
hoje, quase 300 parlamentares, entre deputados e senadores. Outras frentes parlamentares defendem questões dentro do
escopo da Saúde, como de apoio às Santas Casas, a luta contra a Tuberculose e o
cooperativismo em Saúde, por exemplo.
Trata-se, em tese, de um grupo apartidário,
que defende uma causa específica, a despeito da ideologia do partido. As frentes
têm um peso especial também por diversificarem o debate e manterem o assunto
em evidência, além de terem ressonância
nos colegiados e nas instâncias decisórias.
Contudo, o poder de influência de uma
frente parlamentar depende da superação
do interesse partidário ou o compromisso
com o governo. O presidente da Frente
Parlamentar da Saúde, deputado Darcísio
Perondi (PMDB-RS), diz que se houvesse um ranking de forças, a “tropa da saúde” ocuparia o segundo ou terceiro lugar,
disputando com a Educação. Em primeiro
lugar, no entanto, estaria a Frente Parlamentar da Agropecuária, que demonstrou
recentemente toda sua força na votação do
Código Florestal – o texto foi aprovado à
revelia dos interesses do governo. “A força da bancada não é reflexo do número de
parlamentares que a compõe, mas da participação da sociedade”, esclarece Perondi.
E do poderio econômico por trás, claro.
Outro mecanismo de pressão é a atuação
Diagnóstico | mar/abr 2013
33
POLÍTICA
legislação
Lia de Paula/Agência Senado
das assessorias parlamentares tanto do Setor Público, quanto do Privado. O acompanhamento das matérias de interesse, conhecido como “lobby”, é importante para
que os legisladores tenham subsídios sobre
as questões em pauta. Além disso, permite
a organização e captação da informação
para as entidades, pautando-as sobre o que
vem acontecendo no Congresso.
Apesar do ranço e da desconfiança que
a palavra “lobby” causa no Brasil, ele existe e é oficial. E, ao contrário do que muitos
podem pensar, há uma unanimidade entre
os especialistas sobre a necessidade de se
criar uma lei que o regulamente. A verdade
é que as assessorias parlamentares são um
elo de ligação com a sociedade, permitindo que haja uma participação social, quer
seja ativamente por um parlamentar eleito que representa um setor, ou através de
pressão – busca o relacionamento com um
parlamentar, leva ao conhecimento dele
um determinado assunto e, a partir disso, é
que esse assunto será discutido.
A Abimo, por exemplo, defende a
importância da assessoria parlamentar.
“No Brasil, pela grandiosidade de nossas
34
Diagnóstico | mar/abr 2013
A saúde, ao
longo dos dez
anos dos governos
Lula e Dilma, não teve
a mesma prioridade
que a assistência
social e a educação
tiveram
senador humberto costa
(PT-PE), ex-ministro da saúde
na gestão de lula
assembleias, é preciso que haja esse monitoramento”, defende Fraccaro. “Além
do mais, a iniciativa acaba fortalecendo a
desenvoltura do projeto. Afinal, pode haver sempre objeções no caminho que devem ser contornadas”. A posição também
é adotada pelas entidades médicas nacionais. Há alguns anos o Conselho Federal
de Medicina (CFM), Associação Médica
Brasileira (AMB) e a Federação Nacional
dos Médicos (Fenam) criaram a Comissão
de Assuntos Políticos (CAP) para atender
à necessidade de atuação do movimento
médico dentro do Parlamento. A ideia é fazer intervenções junto aos parlamentares,
no sentido de contribuir com os projetos.
Segundo o coordenador da CAP, Alceu Pimentel, o modo de atuação da Comissão
é o lobby. Mas ele enfatiza que a atuação
política dos médicos tem como objetivo
primordial “contribuir com os parlamentares, de forma a tornar factíveis os projetos de interesse não só dos médicos, mas
também da medicina e da sociedade como
um todo”. A CAP mantém e atualiza anualmente sua agenda parlamentar, que tem
quase 200 projetos de lei.“Mesmo com o
clamor que vem sendo feito pela sociedade, e com o eco dentro do Parlamento, o
governo parece insensível aos problemas
da Saúde”, afirma Pimentel, em tom de
desabafo. “Percebemos que há uma insensibilidade em transformar esse anseio em
algo concreto. E, claro, na minha opinião,
há um jogo de poder dentro do governo
para que isso prevaleça, mas a sociedade
tem que continuar pressionando”.
Para o senador Humberto Costa, os
segmentos específicos podem, sim, influenciar o andamento das matérias. De
acordo com ele, esse tipo de mobilização
tem importância a tal ponto que possui
parlamentares que os representam em
questões de interesse direto de grupos ou
instituições. É o caso da Santas Casas de
Misericórdia, bem como as categorias
profissionais da Saúde – médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, etc – e os gestores.
Eles influenciam tanto a direita quanto a
esquerda política. Outro segmento forte
é o da Saúde Suplementar. “Embora não
exista uma ‘bancada dos planos de saúde’,
eles têm um diálogo muito forte com todos
os parlamentares”, reconhece Costa.
Mobilização Social – “O Congresso é movido pela pressão social”. A
máxima proclamada por parlamentares
durante manifestações no Congresso, é
verdadeira. Mas não apenas os atos públicos servem como ferramenta de pressão.
A Constituição Federal prevê, além do
voto, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular como formas de atuação da
sociedade na política. Um projeto de lei de
iniciativa popular, por exemplo, mostra a
vontade da população, pois exige a participação de, no mínimo, 1% do eleitorado
nacional, o que hoje seria pelo menos 1,5
milhão de assinaturas. A questão sobre o
financiamento da Saúde, por exemplo,
que vem sendo mobilizada por entidades
como a Ordem dos Advogados do Brasil
(OAB) e a Associação Médica Brasileira
(AMB), com o apoio de entidades como o
Conselho Nacional de Saúde (CNS), deve
chegar ao Congresso com um grande peso
político.
O senador Humberto Costa acredita,
no entanto, que a mobilização presencial
agrega ainda mais peso à questão. “Acho
que o governo ainda não cedeu por conta das definições de prioridade. Acredito
até que a Saúde, ao longo de dez anos de
governo Lula e Dilma, não teve a mesma
prioridade que a assistência social e a edu-
PAulo fraccaro, da abimo:
presença da indústria no
Congresso a favor dos interesses
da saúde brasileira
Ricardo Benichio
cação tiveram”, reconhece o petista.
Para o senador, o pleito do projeto de
lei de iniciativa popular vai trazer de volta
algumas discussões sobre o financiamento.
“Acho que o resultado, desta vez, pode ser
diferente. Acredito que hoje esta matéria
passaria no Congresso, pelo entendimento
geral de que a Saúde não pode continuar
como está”. Além disso, ele ressalta que o
governo entende que os recursos da Saúde
foram subtraídos com o fim da CPMF e
que, por isso, é preciso que haja uma fonte
para bancar esses aumentos. “Mas estamos
assistindo a um aumento expressivo das
renúncias fiscais, das desonerações – este
ano são R$ 80 bilhões. Temos recursos novos que poderão ser incorporados às receitas da União, como no caso dos royalties
do petróleo, da mineração”, salienta Costa.
“Por isso, acho que o Congresso vai definir
a questão e deixar paro governo decidir de
onde vai pegar o dinheiro”.
O projeto de iniciativa popular, conhecido como Saúde +10, propõe que a
União invista 10% de sua receita corrente
bruta em Saúde. A proposta modifica a Lei
Complementar 141/2012, fruto da regulamentação da EC 29, na qual a presidente
Dilma Rousseff vetou os artigos que tratavam a participação da União na Saúde,
Diagnóstico | mar/abr 2013
35
POLÍTICA
legislação
deputado perondi (PMDB-RS):
“Parlamento brasileiro funciona
como uma fábrica em linha de
produção, que faz do deputado um
mero agenciador do município”
Lucio Bernardo Jr./Agência Câmara
mantendo a vinculação com a variação
nominal do PIB. “A última palavra neste
processo, segundo a própria Constituição,
deve ser a apreciação do veto pelo Legislativo. Evidentemente, um veto frustra, porém mais frustrante, talvez, seja a leniência
com que é tratada a apreciação dos vetos”,
diz Carlos Lopes. A análise do veto é como
se fosse a revanche da queda de braço. E,
mais uma vez, o papel da opinião pública
é fundamental. Se no momento em que
o veto for colocado em pauta não houver
mobilização da sociedade, significa que
os eleitores, em última instância, não têm
mais interesse pela questão.
Todo poder ao Planalto – Das
forças que atuam no Congresso e que podem influenciar o processo de tramitação
dos projetos, o Executivo é, sem dúvida, a
mais forte. “O Poder Executivo costuma
ter mais peso em suas decisões porque tem
toda uma estrutura de articulação política,
de uma base de sustentação, com uma representação dos partidos nos Ministérios,
para que as coisas do governo funcionem
e, por outro lado, para que o Congresso não
viva levando o governo a sobressaltos”,
analisa Lopes.
“Assim, há uma grande estrutura de
operação e de defesa dos interesses”. Para
o deputado Darcísio Perondi, os parlamentares tornaram-se intermediários do governo e não mais formuladores de política.
“Como o governo tem dezenas de programas, ele pôs o parlamento como em uma
36
Diagnóstico | mar/abr 2013
fábrica, em linha de produção. O deputado
virou um agenciador do município”. De
acordo com ele, o Planalto continua exercendo o domínio sobre os votos em troca
de cargos e promessas. Perondi alega que,
com este cenário, o Parlamento vai continuar “de joelhos” perante o Planalto. “A
Saúde tem um forte apelo social, mas, nos
últimos anos, o Palácio do Planalto tem
exercido um controle enorme sobre o destino do Setor no Parlamento brasileiro. E
isso é ruim”, enfatiza. Um caso emblemático foi na votação da regulamentação da
Emenda Constitucional 29, que definia o
que eram as ações de Saúde e, em seu último texto, estabelecia que a União deveria
investir 10% de sua receita corrente bruta
no Setor. “Perdemos na votação do Senado o pleito que definia o percentual de investimento (Lei complementar 141/2012),
por quase 20 votos. No dia da votação, no
mínimo um dezena de votos garantidos
mudaram de lado, por influência direta palaciana sobre os senadores”.
Se há tanto apelo social, há de se perguntar por que, então, o Governo Federal
parece tão pouco interessado em alavancar
algumas questões de saúde consideradas
urgentes? Em muitas situações, existe a
percepção de que o governo, ao contrário
do que é esperado, age como “a pedra no
meio do caminho” da aprovação de matérias importantes para o setor. Dentro do
escopo da Saúde existem diversos assuntos
que estão em destaque, como o financiamento da Saúde; a regulamentação da pro-
fissão do médico; a redução da jornada dos
enfermeiros; isonomia tributária para a indústria nacional de materiais e equipamentos odontológicos e medico-hospitalares;
recursos humanos em medicina; e a rediscussão do marco legal da Lei dos Planos
de Saúde (9656/98), entre outros. O que se
pode notar, contudo, é que os projetos que
mexem com questões econômicas continuam recebendo tratamento diferenciado.
“O mercado não vislumbra no Congresso ações efetivas em relação a assuntos
da saúde pública ou privada”, argumenta o
superintendente da Confederação das Santas Casas, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB), José Luiz Spigolon. Ele cita
como exemplo a regulamentação da Emenda Constitucional 29, que após longo período de tramitação, foi aprovado de forma
incompleta, especialmente no que se refere
ao seu principal ponto, o financiamento,
vetado pela presidente Dilma.
De onde sairão os recursos para a PL
2295, que está em vias de entrar em votação, e que reduz para 30 horas semanais a
jornada de trabalho da categoria da Enfermagem, é outro exemplo de como as questões são tratadas de forma superficial pelo
Parlamento, na opinião de Spigolon. “São
casos como esse, que eu julgo até levianos, que impactam diretamente na sobrevivência da saúde do nosso país”, salienta
Spigolon, que acredita que não há falta
de conhecimento dos parlamentares em
relação ao setor, uma vez que há entre os
parlamentares um significativo número de
médicos e de profissionais da saúde, muitos ex-secretários de saúde de estados ou
municípios.“Conhecimento da situação ele
[Governo] tem até demais. Infelizmente, o
Executivo não vê os gastos da Saúde como
investimento social do povo brasileiro”, salienta o dirigente. A mesma posição tem o
deputado Perondi.
Para ele, o Palácio do Planalto não
toma a iniciativa porque tem pesquisas
quantitativas e qualitativas que demonstram que o cidadão não o identifica como
responsável pela crise da Saúde, mas culpa
o prefeito e o governador. Nesse sentido,
mais uma vez, a solução parece estar nas
mãos do eleitor.
Valterci Santos
Quem lê
decide.
Quem
decide lê.
Renato Merolli,
presidente da Federação
dos Hospitais e
Estabelecimentos de
Serviços de Saúde no
Estado do Paraná
(FEHOSPAR)
Diagnóstico | mar/abr 2013
37
Justamente com o objetivo de estudar e minimizar as não
conformidades,
surgiram os grupos de trabalho da ANS, denARTIGO
tre
eles
sobre
remuneração
dos hospitais, a partir do qual foram
Maisa Domenech
Roberto Abreu
definidos os novos modelos de remuneração (vide assunto comentado na revista Diagnóstico nov/dez 2012). Com previsão
de conclusão dos testes até o final de 2014, a partir da aplicação
do modelo entre hospitais e operadoras voluntários, o citado teste, como já revela o próprio nome, tem como objetivo avaliar
as novas formas de remuneração, considerando as transposições
necessárias de margens dos insumos para as inexpressivas taxas
e diárias. Portanto, somente findada esta etapa de testes, poderea revista Diagnóstico de nov/dez 2012, mos discutir a efetiva implantação do modelo. Porém, tal como
tivemos as revelações da escritora e jor- assistimos com a CMED 3, temos visto uma corrida das operanalista americana Rosemary Gibson, que doras de planos de saúde, objetivando reduzir as margens dos
denuncia o overuse no mercado de saúde insumos em geral, evitando, assim, que haja margens relevantes
americano, assim como a crença de que o ou mesmo qualquer resquício de margem para transpor para as
problema é crescente em mercados emer- diárias e taxas dos hospitais quando da possível implantação dos
gentes como o Brasil. Através de diversos novos modelos de remuneração.
No caso do item OPME especificamente, além da perda fimeios jornalísticos, foi divulgado em 25/3/2013 que o Ministério
nanceira
acima citada, os hospitais começam a escalada rumo à
da Saúde fará auditoria com foco em 20 grandes hospitais braperda
de
autonomia na aquisição destes insumos utilizados nos
sileiros para apurar a suspeita de fraudes e superfaturamento na
serviços
prestados
por eles. Muito embora operadoras de granimplantação de próteses e órteses em pacientes do SUS e, princide
porte
e
nacionais
tenham capacidade de aquisição de OPME
palmente, dos planos privados. Entre os assuntos integrantes da
por
preços
mais
competitivos,
estamos vivenciando importante
agenda da Agência Nacional de Saúde (ANS) para 2013/2014,
distorção
de
mercado.
A
deformidade
se agrava ainda mais na
a sustentabilidade do setor faz parte dos eixos temáticos desta
medida
em
que
sabemos
definir
conceitualmente
na denomiagência e, portanto, o conhecimento das práticas relativas às OPnação OPME o O e o P, mas desconhecemos,
até então, qual a definição conceitual de ME
(materiais especiais). Ora, se tal conceituação
não está definida, os prestadores de serviços
hospitalares correm o risco de tê-las definidas
de acordo com o desejo e capacidade de pagamento das operadoras? Os hospitais então
levando embaixo do braço os insumos
comprarão quais insumos no negócio prestação de serviços em saúde? E como fica a resnecessários ao seu fornecimento?
ponsabilidade da unidade de saúde sobre os insumos ofertados na prestação de serviços, seja
do
ponto
de
vista
civil,
técnico ou logístico? Não caberia à ANS
MEs na saúde suplementar.
o
papel
de
criar
mecanismos
de desestímulo às ações desta naSobre o assunto OPME, eximir-me-ei de qualquer comentátureza
enquanto
testes
e
avaliações
dos novos modelos estão em
rio técnico, pois, além de não possuir formação médica, parto do
curso,
evitando,
assim,
que,
quando
da sua validação, nada mais
pressuposto de que os conceitos de ética, princípios morais e o
exista
para
transpor
em
termos
de
margens
para as taxas e diárias
respeito a aqueles que, vulneráveis pela circunstância de saúde,
dos
hospitais?
Será
que
em
breve
compraremos
outros serviços
buscam atendimento fazem efetivamente parte da prática do diae
produtos,
levando
embaixo
do
braço
os
insumos
necessários
-a-dia daqueles que escolheram como profissão cuidar, preservar
ao
seu
fornecimento?
Será
que
chegaremos
numa
pizzaria
com
e/ou reabilitar pessoas. Restringirei, portanto, os meus comentáo
tomate
(vilão
atual
da
nossa
economia)
em
mão
para
baratear
rios às consequências oriundas do modelo de remuneração ainda
o custo da pizza?
vigente no Sistema de Saúde Suplementar.
As duas questões finais acima servem apenas para conscienNo formato que ainda prevalece de remuneração aos hospitização
sobre o nível de deformidade do Sistema de Saúde Supletais pelos serviços prestados, há uma dissociação entre os preços
mentar
em
vigor e o quanto diverge de outros negócios. Portanto,
praticados em taxas e diárias e os custos de tais estruturas, o que,
há
a
necessidade
de medidas do órgão regulador – ANS –, no
consequentemente, fica muito aquém das necessidades. Isso porsentido
de
evitar
tentativas
de interferência das operadoras sobre
que tais preços foram originalmente definidos sem qualquer base
as
complexas
questões
estruturais
vigentes e, consequentemente,
no custeio dos serviços. Aliadas a isto, as tabelas de serviços não
desequilíbrio
econômico
dos
contratos
de prestação de serviços
refletem a evolução das estruturas hospitalares e a falta de realimédico-hospitalares.
nhamento adequado de preços ao longo dos anos acentuou ainda
mais a discrepância entre os custos dos serviços e os preços praticados. Tal cenário trouxe como consequência a concentração da
principal parcela das margens financeiras dos hospitais para os Maisa Domenech é engenheira civil, pós-graduada em Administração Hospitalar,
insumos (materiais, medicamentos, órteses, próteses e materiais consultora da ADM Consultoria em Saúde e representante técnica da Febase no
Departamento de Saúde Suplementar da Confederação Nacional de Saúde (CNS).
especiais (OPME)), estimulando a sua utilização.
OPME
N
Será que em breve compraremos
outros serviços e produtos
Diagnóstico | mar/abr 2013
39
VISÕES DA AMÉRICA
hospital clínica bíblica – costa rica
gestão eficaz,
conhecimento e
tecnologia: eis os
desafios da
amÉrica latina
No segundo artigo da série Os Ideais da América Latina, o executivo
Jorge Cortés Rodriguez, do Hospital Clínica Bíblica, na Costa Rica,
defende que o continente pode fazer do investimento em novos
talentos uma receita bem sucedida para o futuro da saúde na região
Fotos: Divulgação
JORGE CORTÉS RODRIGUEZ
Diretor médico do Hospital Clínica Bíblica. É formado em medicina,
com especialização em medicina interna pela Universidade da
Costa Rica, e tem mestrado em administração de centros e serviços
da saúde pela Universidade de Ciências Médicas, na Costa Rica
N
os correspondeu, como grupo humano,
uma conjuntura provavelmente nunca
antes vista na história da nossa América
Latina: por um lado, a geração dos Boomers se encontra neste momento em sua
plena etapa produtiva, implementando
seus sonhos, sua maneira de pensar o
mundo e sua necessidade de deixar a sua marca histórica para
as próximas gerações, que se preparam para assumir o desafio
do desenvolvimento, e por outro lado, a oportunidade que se
abre a nossos países diante do fenômeno da globalização da
40
Diagnóstico | mar/abr 2013
economia, apresentando ao mundo cada vez mais firmemente
economias mais abertas, maduras e produtivas, dentro de um
contexto político que parece mais maduro, inclusivo e participativo do que foi no passado, estabilizando-se das “guinadas
políticas” seja à esquerda ou à direita, que caracterizaram boa
parte da nossa história no século passado.
O conhecimento é universal, assim como o acesso à tecnologia. Cada vez mais observamos com orgulho como experts
latino-americanos fazem parte do concerto mundial com grande sucesso, e, ainda que continue sendo um fenômeno lamentável a “fuga de cérebros” para os países do primeiro mundo,
já é um fenômeno que não apenas desperta o interesse por
parte dos governos, mas que os leva a, conscientes da importância do conhecimento, gerar oportunidades e políticas para a
conservação desses intelectuais em nossos países, com maior
ou menor sucesso, a depender dos recursos disponíveis. Mas,
sim, há esforços consistentes neste campo.
A medicina não escapa a essa mudança, e o nosso entorno
começa a considerar e a experimentar mudanças na prestação
dos serviços médicos, seja com uma maior especialização clínica, seja com uma maior capacitação e intervenção profissional na gestão dos recursos de saúde (considerando e incluindo os condicionantes históricos, herdados do século passado,
tais como a inclusão, a solidariedade e a proteção aos setores
vulneráveis), mas com uma visão cada vez mais complexa e
eficiente.
As novas tendências na saúde de nossa região latino-americana incluirão a inovação, a tecnologia e as mudanças no
estilo de vida necessárias para estar na vanguarda do conhecimento médico, mas também se deverão enfrentar com estoicismo os custos incrementais de saúde e fazer malabarismos
para conjugar a eficiência e a modernidade com excelência na
gestão dos serviços de saúde em nossos jovens países e a racionalização da oferta de saúde em uma análise de acordo com
nossas realidades e possibilidades.
Desafios e tendências de evolução no futuro.
Academia
Uma das maiores preocupações será a formação de recursos humanos, não apenas os médicos, mas todos os profissionais de saúde em geral. Curricularmente, sabemos que em nossas escolas de medicina a mão de obra qualificada é farta, mas
seguimos com o currículo acadêmico equivalente às realidades
epidemiológicas e terapêuticas do século passado, sem que se
tenha levado em conta o impacto que as novas tecnologias e as
mudanças no perfil epidemiológico terão nas necessidades de
capacitação do futuro profissional nas ciências médicas.
Seguimos pensando na forma tradicional sem projetar o
profissional de que estaremos precisando não daqui a 50 anos,
mas em cinco ou dez, nos quais as referidas realidades tecnológicas e de perfil epidemiológico baterão às portas de nossas
sociedades.
A biologia molecular, a bioengenharia, a população enve-
Fachada do Hospital
CLÍNICA bÍBLICA, em sAN JOSé
DA COSTA RICA: ranking da
revista América Economía coloca
a instituição no sexto lugar entre
os maiores hospitais da América
Latina
Diagnóstico | mar/abr 2013
41
VISÕES DA AMÉRICA
hospital clínica bíblica – costa rica
lhecida e a tecnologia em evolução são apenas alguns de tais
desafios e realidades que devem ser contemplados à luz do
que o futuro vai requerer. Não podemos nos deparar com o
futuro tendo uma preparação cronologicamente inadequada de
nossos recursos humanos.
Recursos humanos
Cada vez mais, as carreiras inovadoras, como a engenharia, conquistam espaço sobre as relacionadas com as ciências
da saúde quanto à preferência dos estudantes. Muitos desses
interesses poderiam ser canalizados em uma visão de sistema
e serviços diferentes da forma tradicional em que os conceitualizamos, orientando interesses inovadores às ciências da saúde, com os quais beneficiaríamos o modelo e o prepararíamos
para sua subsistência.
Este conceito deve estar intimamente ligado à academia
para conceitualizar necessidades e capacidades necessárias
para o desenvolvimento do futuro do setor de saúde. Estes recursos humanos devem variar em seu perfil e competências
para se acomodarem a uma prestação de serviços e modelo de
atenção diferentes e que incorporem a tecnologia e as necessidades futuras do perfil epidemiológico latino-americano.
O futuro profissional nas ciências médicas reunirá cada
vez mais conhecimentos altamente especializados dando suporte ao clínico nos cada vez mais segmentados conhecimentos da medicina.
Modelo de prestação de serviços
Este ponto é fundamental pois os modelos de prestação de
serviços que são utilizados em nossos países sofrem não apenas de um sentido de urgência, mas também de oportunidade
e necessidades históricas. Os diferentes modelos e conceitos
disponíveis passam de um centralismo absoluto à anarquia e
à atomização do modelo privado e vice -versa, acoplado a um
déficit cada vez maior na capacidade de gestão que não é mais
do que o reflexo de uma ausência de um norte estratégico que
permita dirigir consensualmente a escassez de recursos para
a saúde em nossas sociedades.
Uma clara definição deste modelo é essencial para responder com eficiência e qualidade aos desafios da sustentabilidade do sistema. O ideal de modelo deve manter princípios de
cobertura, acesso, equidade na atenção, acoplados à eficiência
operativa e, sobretudo, sustentabilidade.
Gestão dos serviços de saúde
A intangível saúde tem muitíssimas conotações e necessidades que a tornam particular. Sendo um serviço em si,
reveste em nossa sociedade um simbolismo e importância
que vão ligados não apenas a nossas necessidades físicas, mas
também a nossas expectativas e necessidades históricas.
A gestão deve ser eficaz e eficiente, mas, nem por isso, desencarnada e fria. Dentro da dita eficiência, devemos considerar as crenças e necessidades de nossa gente e a sua particular
maneira de ver o mundo, nossas realidades históricas e nossas
responsabilidades futuras. De igual maneira, deve iniciar-se
uma mudança na percepção da prestação de tal serviço por
parte dos funcionários de saúde para o efeito de desmitificar o papel mágico/religioso da tradição de nossos povos e
focalizá-lo em um conceito de serviço ao cliente.
42
Diagnóstico | mar/abr 2013
o custo assistencial
é, atualmente, um
dos indicadores mais
importantes para medir
a eficiência na saúde,
pois os recursos para
o setor são finitos. E o
uso indiscriminado de
tais recursos vai fazer
com que eles faltem em
algum momento
O acoplamento adequado entre os diferentes níveis da
rede de serviços, clareza nos objetivos e políticas, viabilidade do modelo e sustentabilidade são partes de uma
adequada gestão e articulação do sistema e devem estar claros
em seu controle. A cultura deve incluir o conceito de medição
substantiva à atividade para avaliar o impacto das ações.
Parceria público-privada
Todos os sistemas de saúde da América Latina chegaram a
um híbrido público-privado que tem suas particularidades de
acordo com a concepção política e realidades sociais e históricas de nossos povos.
A sobrevivência da prestação de serviços adequada reside
na harmonização entre o que é a parceria público-privada e a
métrica dos resultados obtidos a efeito de promover uma sinergia de esforços e maximização dos resultados nos usuários
dos serviços.
Deve existir um acordo quanto à adequada supervisão não
apenas dos programas conjuntos que se realizem, mas também da atenção em geral à população, sem deixar brechas em
tal provisão de serviços.
Tecnologia
Deve-se racionalizar e valorizar com extremo cuidado a
aquisição e renovação de tecnologia, para poder estabelecer
um equilíbrio entre eficiência, impacto, custo e pertinência,
pois sempre resulta um desafio coordenar a demanda dos profissionais de saúde e da indústria por tecnologia de ponta, sem
que necessariamente esta responda às possibilidades e necessidades do público-alvo.
A tecnologia está mudando rapidamente, e o tempo de sua
atualização se reduz cada vez mais com o passar dos anos. A
substituição de tecnologia tem um horizonte muito limitado
no tempo e a cada ano saem produtos melhorados e com mais
opções do que os anteriores, motivo pelo qual há que se ter
um adequado controle deles e assegurar sua pertinência e vida
média além da sua capacidade resolutiva.
Qualidade
A qualidade, entendida como a segurança do paciente, se
torna um imperativo ético e moral de nossos tempos. É obrigatório introduzir sistemas de qualidade em nosso meio, não
apenas para diminuir o impacto sobre os resultados do paciente, mas o custo que isso implica sobre os sistemas de saúde.
Os processos de acreditação devidamente cimentados e respaldados por entes externos a nossos sistemas, para uma adequada auditoria, devem ser rotineiros em nossos países.
Informática Médica
A gestão moderna implica obtenção e análise de dados. É
impossível, através de nosso tradicional sistema físico de expediente médico, poder obter informação e dar uma adequada
atenção à gestão clínica e administrativa diária, além do que
precede o acesso à informação do paciente.
A ajuda que nos oferece a informática quanto à educação
em duas vias (paciente/médico) é imprescindível nos tempos
modernos. Sua influência abarca todos os campos das ciências
médicas e é um auxílio inestimável nos resultados em saúde
e gestão administrativa. Devem se fazer esforços extraordinários a efeito de contar com os sistemas necessários em nossos
países para a atenção em saúde.
Vejo um grande potencial de desenvolvimento nesta área
futuramente, como demonstram os esforços que a indústria da
informática está empenhando neste segmento em nível mundial.
Infraestrutura
Longe de pensar nas estruturas tradicionais, dado o envelhecimento de nossa população, visualizo que teremos maiores, melhores e mais articuladas redes de serviços médicos
com uma capacidade de resolução adequada em cada uma delas, e uma maior tendência a ter centros especializados para
as enfermidades crônico-degenerativas e problemas próprios
da idade, com um acesso adequado e eficiente para poder lidar
com a grande população nesta situação.
Turismo médico
Assim como escolhemos uma determinada linha aérea
para viajar, de acordo com nossos gostos e percepções, futuramente escolheremos o lugar ou país que mais se adapte a
nossos gostos, necessidades e orçamentos, com a certeza de
que temos qualidade garantida.
Este novo segmento ou tendência é uma realidade em marcha e deve ser contemplado como um dos novos nichos de
expansão que teremos futuramente.
Integração científica
Cada vez mais os países latino-americanos se preocupam
com a retenção de talentos.
Os recursos humanos em saúde estão cada vez mais especializados e evoluídos.
A necessidade de desenvolver nossas próprias soluções
será favorecida pela contribuição em descobertas e soluções
desenvolvidas por esses cientistas, com as respectivas patentes nacionais e internacionais.
Vislumbro um cluster de investigação em múltiplos campos especializados, em campos de interesse, apoiados tanto
pelo setor governamental quanto pelo privado.
Uma das maiores
preocupações (do
continente) será a
formação de recursos
humanos, não apenas os
médicos, mas todos os
profissionais de saúde
em geral. Em nossas
escolas de medicina, a
mão de obra qualificada
é farta, mas seguimos com
o currículo acadêmico
equivalente às realidades
epidemiológicas e
terapêuticas do século
passado
Cada vez mais os países
latino-americanos
se preocupam com a
retenção de talentos.
os recursos humanos
em saúde estão cada vez
mais especializados e
evoluídos. A necessidade
de desenvolver nossas
próprias soluções
se verá favorecida
pela contribuição em
descobertas e soluções
desenvolvidas por
esses cientistas, com
as respectivas patentes
nacionais
e internacionais
Diagnóstico | mar/abr 2013
43
Diagnóstico | mar/abr 2013
CAPA
NÃO CONFORMIDADE
Quem vai
pagar a
conta?
Estudo inédito feito pelo Hospital Israelita
Albert Einstein, em parceria com a Bradesco
Saúde, abre caminho para o debate sobre a
não conformidade na saúde brasileira
Roberto Abreu
Reinaldo Braga
O
s holofotes sobre o
debate relacionado
a não conformidades
no sistema de saúde
brasileiro e à má formação médica, que
nunca tiveram tantas
evidências no país, podem sair da esfera
civil e acadêmica para virar um caso restrito aos tribunais médicos. O precedente foi
uma denúncia formalizada junto à câmara
técnica de implantes da Associação Médica
Brasileira (AMB), feita por um neurocirurgião de São Paulo que teve seu laudo contestado em uma segunda opinião, realizada
pelo Centro de Referência de Tratamento
de Coluna Vertebral do Hospital Israelita
Albert Einstein (HIAE). A queixa seria encaminhada ao Conselho Federal de Medicina (CFM). O paciente foi orientado pela
equipe do hospital a não fazer a cirurgia de
coluna, por conta dos riscos, e a optar por
um tratamento conservador – não invasivo
–, com fisioterapeutas da instituição. Com
base no diagnóstico, a Seguradora Bradesco, que encomendou o estudo junto ao
46
Diagnóstico | mar/abr 2013
Einstein, negou o procedimento. O paciente recorreu à Justiça e foi operado em outro
hospital.
Pelo menos outros dois casos tiveram
o mesmo desfecho. Para a AMB, houve falha ética por parte da equipe do Einstein,
ao “infringir regras já estabelecidas entre
as sociedades médicas, os planos de saúde
e os órgãos reguladores”. Em entrevista à
Diagnóstico, o diretor de diretrizes da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN),
Ricardo Botelho, disse que, se há indícios
de não conformidade no estudo realizado
pelo Einstein, seria necessário que a avaliação da adequação dos procedimentos fosse
feita de acordo com as “normas de auditoria
médica”. “Qualquer atitude fora disto seria,
isto sim, fraude e estaria em desacordo com
o código de ética”. Ao jornal Folha de São
Paulo, o presidente do Einstein, Claudio
Lottenberg, afirmou que o projeto é justamente uma tentativa de evitar conflitos e
padronizar procedimentos. “Queremos o
melhor para o paciente e para o sistema de
saúde como um todo, não para a fábrica de
implantes”, polemizou o executivo.
O estudo feito pelo HIAE fez parte de
um programa pioneiro no país, que avaliou,
em uma primeira etapa, cerca de 500 pacientes, entre maio de 2011 e abril de 2012.
Desse total, menos da metade (41%) teve a
indicação de cirurgia confirmada. Oitenta e
oito por cento das indicações desnecessárias, segundo avaliação do Einstein, eram
de alto custo. No relatório ao qual a reportagem teve acesso, assinado pelo ortopedista do HIAE Mario Ferretti, os números
são citados sob o título Preocupação Éica
e Acadêmica. “Trata-se de um estudo que
pode servir de reflexão, mas não em relação
à formação em ortopedia, neurocirurgia ou
medicina”, disse a reportagem, logo após
a repercussão negativa do caso, o médico
Oscar Pavão, diretor de Prática Médica do
Einstein. “Talvez [o estudo] possa servir
como uma reflexão sobre a complexidade
dos julgamentos nesta área”.
O trabalho de segunda opinião feito
pelo hospital foi utilizado oficialmente pela
Bradesco Saúde com o objetivo de “proporcionar aos pacientes eventuais alternativas de tratamento de patologias de coluna
Márcio coriolano, da
bradesco saúde: pesquisa de
segunda opinião, que provocou a
ira de setores representativos dos
médicos e reação dos usuários,
revelou que 60% das indicações
de cirurgias de coluna eram
desnecessárias
vertebral que não sejam a intervenção cirúrgica, com ou sem colocação de prótese”
Na prática, a cúpula da seguradora usou
os números para confirmar a tese – antiga –
de que seus usuários vêm sendo vítimas de
procedimentos cirúrgicos desnecessários.
“Nosso foco exclusivo é propiciar melhores condições de tratamento dos nossos
segurados ao menor custo que todo o sistema pode suportar”, disse à Diagnóstico
o presidente da Bradesco Saúde, Márcio
Coriolano, que se recusou a falar em não
conformidade. Fontes da seguradora ouvidas pela reportagem, contudo, confirmam
que o resultado da pesquisa feita pelo Einstein revelou distorções bem acima do razoável. O levantamento tem paralelo com
um outro estudo de segunda opinião, feito
em 2011, pela também renomada Clínica
Mayo, nos EUA. Do total de pacientes
americanos avaliados, na época, 40% das
cirurgias indicadas por médicos de outras
unidades eram desnecessárias. O estudo foi
encomendado por uma grande corporação
americana que mantinha um plano de saúde corporativo. “Se há dois anos era difícil
até mesmo falar de não conformidade nos
EUA, atualmente posso dizer que o debate
se dá em nosso país com total liberdade”,
disse em recente entrevista à Diagnóstico
a americana Rosemary Gibson, autora do
livro A Armadilha no Tratamento – ainda
sem tradução no Brasil –, que denuncia as
fraudes no sistema de saúde americano.
Segundo ela, a prática do overuse – tratamento excessivo, em tradução livre – vem
sendo discutida cada vez mais por governos e sociedade organizada, em diversos
continentes.
MUDANÇA NO TABULEIRO – Há
quase dois anos, a Bradesco Saúde vem
assumindo a compra direta de órtese e
prótese junto aos distribuidores – custos
com OPME já representam mais de 40%
do total de sinistralidade da operadora. A
centralização, que permitiu descontos para
a seguradora de até 50% nos valores dos
materiais, já foi implantada em São Paulo,
Rio de Janeiro, Minas e Bahia. A estratégia
incluiu, do lado dos prestadores, a repactuação das margens de comercialização dos
hospitais – comumente vinculada ao preço
do OPME –, através de compensações em
diárias e taxas. Apesar da complexidade
da operação, a seguradora não enfrentou
resistência. Mesmo assim, a cúpula da seguradora destacou o médico e diretor executivo da Bradesco Saúde, Sérgio Galvão
– braço direito de Márcio Coriolano – para
conduzir a transição. O dirigente chegou
a viajar ao exterior para negociar pessoalmente com grandes indústrias de próteses e
órteses reduções em seus preços praticados
no Brasil. O próximo passo da seguradora
é realizar leilões para compra de OPME
e expandir o projeto para outras áreas, a
exemplo de neurologia e cardiologia – as
compras se restringem atualmente às áreas
de ortopedia, hemodinâmica e cirurgia vascular periférica.
Para especialistas ouvidos pela Diagnóstico, apesar de não ser novidade – a
líder Amil já utiliza compras diretas em
sua operação –, é a primeira vez que uma
gigante do setor, sem rede própria, decide
mexer no tabuleiro de xadrez da relação
operadora/prestadores/distribuidores, com
repercussão direta na não conformidade.
“Profissionais não éticos existem e vão
continuar existindo, seja na ortopedia ou
oftalmologia, como em qualquer outra especialidade ou profissão”, pondera o consultor Horácio Cata Preta, que durante dez
anos foi presidente da Federação Nacional
de Seguradoras (Fenaseg). “Mas medidas
como essa, contudo, têm impacto direto na
busca de um reequilíbrio para o sistema”.
Do ponto de vista da economia da
saúde, não há estatísticas no Brasil que
definam o tamanho das perdas com não
conformidades, seja no setor público ou
privado. No estudo específico do Einstein,
os pacientes que tiveram o diagnóstico revisto e foram tratados de forma não cirúrgica apresentaram custo médio de tratamento
de R$ 3.245. Caso fossem operados, como
indicava o diagnóstico preliminar, esse valor chegaria à média de R$ 36 mil. Ao final
do programa, a Bradesco Saúde desembolsou R$ 2,3 milhões ao HIAE – 158% a menos, em comparação à rotina de cirurgias
que seriam realizadas sem uma segunda
opinião.
EXPERIÊNCIA AMERICANA – Nos
Estados Unidos, onde a discussão sobre
não conformidade no setor começou no
início dos anos 80, o Instituto de Medici-
Qualquer atitude
fora disto
(uma segunda opinião,
dentro da lei vigente)
seria, isto sim, fraude e
estaria em desacordo
com o código de ética
médica
ricardo botelho, diretor
de diretrizes da sociedade
brasileira de neurocirurgia
(SBN)
na da Academia Nacional de Ciências estima que 30% dos US$ 2,6 trilhões gastos
no sistema de saúde são desperdiçados em
tratamentos desnecessários, assim como na
ineficiência do sistema e em fraudes. Nesse
ritmo, em 2082 a nação mais rica do planeta vai gastar todo o PIB com o sistema
de saúde, de acordo com estimativas do
Congressional Budget Office (Escritório de
Orçamento do Congresso americano). “O
único lugar razoável para fazer os cortes é
o excesso de tratamento, onde não estamos
agregando valor à saúde do paciente”, afirma Rosemary.
Nos últimos seis meses, duas operações
policiais no Brasil, em parceria com procuradores federais, desmontaram quadrilhas
que agiam em hospitais universitários. As
negociatas entre dois médicos e os empresários foram registradas em planilhas e
relatórios, com os percentuais das comissões fixados entre 5% e 10% do valor dos
aparelhos, pagos pelo SUS. O pagamento
era efetuado mediante depósitos ou transferências bancárias em contas pessoais dos
beneficiários. “As equipes médicas simplesmente impõem a condição para continuar trabalhando com determinada marca”,
disse à Diagnóstico o dono de uma distribuidora que está sendo investigado pela
Polícia Federal. “Quem não aceitar, fica de
fora da lista”. O comentário é uma alusão à
Resolução CFM 1956/10, que estabeleceu
a obrigatoriedade de o médico oferecer à
operadora de saúde ou instituição pública
Diagnóstico | mar/abr 2013
47
CAPA
NÃO CONFORMIDADE
pelo menos três marcas de produtos de fabricantes para realização de procedimentos
cirúrgicos. Segundo ele, que se diz “vítima
do sistema”, não há no país um único distribuidor ou grande player da indústria que
atue no mercado sem negociar compensações, legais ou “por fora”, com os médicos
que indicam seus produtos, seja o patrocínio de uma viagem científica, eventos
organizados por sociedades médicas ou o
pagamento de comissões pura e simplesmente.
No caso de cirurgias de ortopedia, as
comissões ilegais podem representar valores por procedimento que variam de R$ 10
mil a R$ 40 mil, segundo apuração da Polícia Federal. A Bradesco Saúde paga a cirurgião principal, em média, pouco mais de
R$ 1.500 em uma cirurgia de coluna – um
valor considerado aviltante pela categoria.
Um conjunto de dispositivos, para esta
mesma intervenção, pode chegar a R$ 150
mil. “O que se espera é que esse novo modelo de relacionamento, inaugurado pela
Bradesco com os prestadores, possa trazer
de volta o foco da remuneração para o serviço e não para o MAT/MED como tem
sido nos últimos anos”, salienta o pesquisador e vice-presidente da Confederação
48
Shutterstock
Diagnóstico | mar/abr 2013
não conformidade nos
eua: Instituto de Medicina da
Academia Nacional de Ciências
estima que 30% dos US$ 2,6
trilhões gastos no sistema de
saúde são desperdiçados em
tratamentos desnecessários,
assim como na ineficiência do
sistema e em fraudes
Nacional de Saúde (CNS), Marcelo Britto.
Autor de uma dissertação de mestrado sobre o assunto, defendida em Lisboa, ele diz
que o atual modelo de remuneração no setor está exaurido e condenado a estabelecer
relações cada vez mais conflitantes entre as
partes envolvidas. Um cenário, descreve
em seu estudo, “que provoca uma situação de aplicação de margens exageradas,
gerando uma utilização, por vezes, forçada
do consumo de material e de medicamento”. Para Britto, que é médico ortopedista
de formação, o único temor da iniciativa da
Bradesco é a estratégia ser seguida por outras operadoras de forma impositiva, sem
as devidas compensações. “Espera-se também que as operadoras possam repassar a
redução de suas sinistralidades para o usuário”, defende. “Isso vai repercutir em um
aumento de suas carteiras e, consequentemente, ganho em escala para os prestadores”. Sobre as denúncias de fraudes no
sistema, ele diz “desejar” tratar-se de casos
isolados e pontuais, ainda que os impactos
tenham grandes reflexos no setor. “Trata-se
de algo lamentável, em se comprovando
as denúncias, para hospitais e profissionais
éticos que lutam por mais recursos para a
saúde”, reflete o presidente da Federação
Nacional dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde (Fenaess), Humberto Gomes.
TRANSPARÊNCIA – Para o Conselho
Federal de Medicina (CFM), os casos envolvendo profissionais fraudadores devem
ser investigados pela polícia e punidos pela
Justiça. O discurso é o mesmo da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT). Mas é possível fazer mais.
O Instituto de Medicina dos EUA – correspondente ao CFM, no Brasil – decidiu
tipificar o tratamento desnecessário como
uma situação em que o potencial de dano
em um procedimento de cuidados médicos
supera seus possíveis benefícios. A iniciativa, ainda que considerada tímida pelas
autoridades locais, foi vista como um alerta aos médicos para que a indicação dos
procedimentos cirúrgicos passasse a se dar
com mais rigor. Em busca de transparência, uma lei americana passou a obrigar as
indústrias a informar quais os médicos que
lhes prestam consultoria e quanto eles recebem. O dispositivo legal teve o apoio das
principais entidades médicas do país.
Na Inglaterra, em outubro de 2012, o
próprio Conselho Médico Geral do Reino
Unido (GMC, na sigla em inglês) enviou
à polícia o caso do cirurgião Ian Peterson,
investigado por supostamente ter feito
cerca de 450 lumpectomias em mulheres
saudáveis e 700 mastectomias utilizando
técnicas não aprovadas pelas autoridades
daquele país. Mesmo com toda a polidez
britânica, o GMC tomou medidas preventivas enérgicas contra o médico. Um porta-voz do conselho veio a público para anunciar que o “registro do Dr. Ian Peterson
estava suspenso”. Isto significa, reiterou o
GMC perante a sociedade britânica, “que o
médico não pode trabalhar enquanto durarem as investigações em torno de suas aptidões para praticar a medicina”. A polícia da
Inglaterra também se pronunciou, afirmando estar “trabalhando em estreita colaboração com o GMC para avaliar as alegações
e determinar se uma investigação criminal
é necessária”.
Na Filadélfia – costa leste americana
– a American Medical Foundation for Peer
Review and Education (algo como Associação Médica Americana para a Avaliação
de Colegas e Educação) se tornou um referência na arbitragem envolvendo casos
suspeitos de cirurgias desnecessárias. Independente, a entidade é formada por uma
equipe de médicos notáveis e tem tido um
trabalho considerado modelo em questões
O ortopedista
Marcelo Britto,
vice-presidente
da cns: dissertação
de mestrado
para mostrar que
o atual modelo
de remuneração
estabelece relações
cada vez mais
conflitantes
Tadeu Miranda
polêmicas envolvendo uma segunda opinião, como o caso que abre essa reportagem. Outro elo importante na moralização
do setor, também nos EUA, é a participação da sociedade no uso racional do sistema de saúde. O exemplo mais interessante
é o site ProPublica (www.propublica.org),
que permite a qualquer cidadão consultar
quanto um médico recebeu de um fabricante qualquer. Há ainda iniciativas independentes – com o apoio de sociedades
médicas – que estimulam os profissionais
de saúde a debater com o paciente todos os
detalhes do tratamento. Leia-se: os riscos
que o procedimento impõe e eventuais alternativas à indicação cirúrgica. Na Alemanha, médicos são recompensados toda vez
que fazem o uso racional dos recursos destinados à saúde. “O primeiro passo para resolver o problema é falar sobre ele”, defende a pesquisadora Rosemary Gibson. “Se
permanece invisível, nunca vai ser corrigido”. Segundo ela, nos EUA, cada vez mais
pessoas estão falando sobre os danos das
armadilhas do tratamento. “Não chegamos
a esse ponto da noite para o dia e vai levar,
na mesma medida, um longo tempo para
nos desenterrarmos”, pondera. Procurado,
o Conselho Federal de Medicina (CFM)
não retornou ao pedido de entrevista, até o
fechamento desta edição.
Queremos o
melhor para o
paciente e para o
sistema de saúde
como um todo, não
para a fábrica de
implantes
claudio lotTenberG,
presidente do hospital
israelita albert einstein
Diagnóstico | mar/abr 2013
49
50
Diagnóstico | mar/abr 2013
OSVINO SOUZA
Carogestor
Tenho um amigo que investiu cedo em pós-graduações, mas mudou o foco da carreira e pouca
coisa foi aproveitada em sua atual função. Há
uma faixa etária mais indicada para se ingressar
em um MBA, por exemplo? Henrico Gomes, Minas Gerais (BH)
Já há alguns anos a graduação deixou de ser um diferencial
na formação do profissional de nível superior. Com o aumento da oferta de cursos e da facilidade de acesso a eles,
a disponibilidade de profissionais com formação superior
no mercado aumentou significativamente e, para se diferenciar, estes passaram a procurar cursos de pós-graduação lato
sensu e até mesmo stricto sensu. Os primeiros têm um menor rigor acadêmico e, em geral, ampliam o conhecimento
sem muito aprofundamento. São mais curtos e mais baratos.
Segundo a legislação brasileira, são as especializações, por
exemplo. Os cursos stricto sensu são os mestrados e doutorados e têm um rigor acadêmico muito maior. Os Master of
Business Administration (MBA) são tratados no Brasil como
pós-graduação lato sensu, enquanto nos Estados Unidos, na
Europa e em outras partes do mundo, são tratados como
stricto sensu em nível de mestrado profissional (há também
52
Diagnóstico
Diagnóstico || mar/abr
mar/abr 2013
os Doctor of Business Administration (DBA)), pois são muito mais rigorosos do que a quase totalidade dos cursos oferecidos aqui (veja a coluna Caro Gestor da edição n°12 desta
revista). À primeira vista, seu amigo está certo. No mundo
atual, não dá mais para um profissional sobreviver somente
com o conhecimento obtido em sua formação superior. O
conhecimento evolui com muita rapidez. Além do que, as
possibilidades profissionais vão muito além daquelas de sua
formação, ou seja, o profissional tem que ampliar seu leque
de conhecimentos até para escolher melhor onde atuará. Só
para exemplificar, médicos administram organizações, engenheiros administram pessoas etc. A educação ou o aprendizado continuado ou permanente (lifelong learning) tornou-se
uma necessidade. Não dá para parar de estudar e aprender, e
isto não tem idade para começar e nem para terminar. Observe que as crianças começam a estudar cada vez mais cedo,
e muitos “idosos” estão voltando aos bancos escolares. Mas
saber focar no que realmente é útil para cada um é a grande
questão.
No futebol, há sempre uma cautela ao se lançar um jogador juvenil, mesmo craque, no time
principal. Na carreira é assim? Um jovem talentoso pode se ‘queimar’ se for promovido no momento errado? Thiago Freitas, São Paulo (SP)
Há uma diferença fundamental entre idade e maturidade.
Só para exemplificar, já coordenei programas de especialização e conduzi pessoalmente entrevistas de seleção de jovens candidatos. Encontrei entre eles, com frequência significativa, jovens muito maduros. Alguns deles, por razões
diversas, iniciaram suas carreiras profissionais muito cedo,
em empresas familiares, por exemplo. Outros precisaram se
sustentar financeiramente e ser independentes. Da mesma
forma conheço adultos que, apesar da idade, parecem ainda não ter amadurecido. Qualquer pessoa pode se “queimar”
se for promovida no momento errado ou da maneira errada,
e isto ocorre com muito mais frequência do que se pensa.
Eu diria que por irresponsabilidade da empresa e por imaturidade do profissional, dentre outras possibilidades, como
a ambição, por exemplo. Promover um profissional não é
um ato simples, desde o primeiro nível até o último nível
da organização. Estamos tratando aqui, particularmente, da
promoção para níveis gerenciais. Olhando por um só ângulo,
como especialista, o profissional é líder de si mesmo, presta
conta de seus próprios resultados e tem que saber trabalhar
em equipe, mas no primeiro nível de liderança ele já tem que
liderar pessoas, o que exige competências muito diferentes
das anteriores. Em geral, as organizações não os preparam
para esta transição. A promoção de um profissional deve
ser fundamentada na confiança, ou seja, no mínimo, deve-se acreditar que ele compartilha os princípios e valores da
organização e que tenha as competências adequadas para a
nova posição que ocupará. A promoção “empodera” o profissional, ou seja, aumenta seu poder, sua autoridade, que é
acompanhada de responsabilidades (deveres), e é com isto
que o profissional precisa se preocupar, não aceitando uma
proposta sem se sentir capaz de assumir a nova posição, pois
aí sim corre o risco de se “queimar”.
Trabalho em uma grande indústria de equipamentos médico-hospitalares que se habituou a
fazer renovação de seus quadros com um processo bem sucedido de trainee. De uns tempos
para cá, venho percebendo que quem entra por
essa porta tem tido uma ascensão maior dentro da empresa, em detrimento dos funcionários
mais antigos. Isso é normal? Anônimo
Você mesmo menciona que o programa de trainees de
sua empresa é bem sucedido. De fato, nos últimos anos, num
grande número de empresas esses programas têm tido sucesso. Eles são concebidos, quase sempre, para prover as empresas de profissionais jovens e talentosos e, sendo assim,
não se poderia esperar resultados muito diferentes e que demonstram o sucesso da iniciativa. Não que os profissionais
mais antigos não possam ser talentosos também. O que ocorre, muitas vezes, é que estes ficam viciados ou acomodados,
tornando-se o “sangue velho” da organização. Os trainees
são o sangue novo (veja a coluna Caro Gestor da edição n°18
desta revista). Por outro lado, não podemos esquecer que os
jovens de hoje têm grande facilidade e são ágeis no processo
de aprendizagem. Mas nem tudo são flores. Há muitos erros
por aí também. Muitos dos jovens trainees não sobrevivem
ao sangue velho, por exemplo. Outras vezes, são excluídos da
organização, pouco tempo depois, por sua arrogância ou ambição desmedida. Há erros de ambas as partes, da organização e dos trainees. O normal é a organização buscar o talento
onde este se encontra. Se possível, aproveitar o máximo dos
seus talentos internos antes de ir buscá-los no mercado. Até
porque os talentos internos já passaram por um dos testes
mais difíceis: o da harmonia dos valores individuais com os
organizacionais. Mas e se ela não os encontra ali? Na grande
maioria das vezes, a própria organização é responsável por
isso, não investindo adequadamente nos seus profissionais,
mantendo políticas e práticas de gestão de recursos humanos
ultrapassadas e lideranças despreparadas. Isto não deve servir de desculpa para aqueles profissionais que se acomodam
assim que deixam de ser cobrados ou supervisionados. Não
há espaço para este tipo de profissional nas organizações de
hoje. Como menciono na resposta da primeira pergunta desta
coluna, o profissional de hoje tem que investir permanentemente na atualização de suas competências para se manter e
para crescer em qualquer organização.
Osvino Souza é professor da Fundação Dom Cabral nas áreas de
Comportamento e Desenvolvimento Organizacional
Diagnóstico | mar/abr 2013
53
informe publicitário
CEHON abre centro de mastologia com
serviços de mamografia e ultrassonografia
Com inauguração da Clínica Mastos, CEHOM consolida integração entre os
serviços de oncologia e mastologia para aprimorar atendimento aos pacientes
Divulgação
“Há uma equipe
multidisciplinar na
qual mastologistas e
oncologistas definem
juntos a melhor
estratégia para o
paciente”
Márcia amaral,
oncologista do cehon
Clínica Mastos: novo centro especializado no atendimento de mastologia está localizado
estrategicamente ao lado da sede do CEHON, no bairro do Canela (Salvador-BA)
Depois de apostar na interiorização, com a abertura
de novas unidades em Teixeira de Freitas, Jequié, Juazeiro
e Barreiras, no início do ano, o Centro de Hematologia e
Oncologia da Bahia (CEHON) inaugurou a Clínica Mastos
– Centro Especializado no Atendimento de Mastologia. Visando à integração entre os serviços de mastologia e oncologia, a nova unidade especializada em oncologia mamária – principal causa de mortes em mulheres no mundo
– foi estrategicamente pensada para aprimorar os serviços
prestados aos pacientes e a excelência da gestão organizacional. Com investimentos na ordem de R$ 1 milhão, a
nova unidade oferece avançados serviços de diagnóstico
por imagem, que incluem mamografia digital e ultrassonografia.
Conceição Guedes, mastologista da Clínica Mastos, explica que a integração entre as unidades atende a uma necessidade específica em relação à mastologia por se tratar
de uma área cada vez mais complexa, que exige uma especial atenção e que possui vasta ocorrência de pesquisa
54
Diagnóstico | mar/abr 2013
científica. “Logo após a inauguração da clínica, formou-se
um grupo de mastologistas conceituados, em constante
capacitação, e a proximidade com a oncologia é um importante suporte”, disse a mastologista.
Localização – A nova clínica funciona no bairro do Canela, ao lado da sede do CEHON, facilitando o tratamento e
o fluxo entre pacientes e corpo clínico. Segundo a oncologista Márcia Amaral, além da integração entre mastologia
e oncologia, as vantagens com a proximidade é em relação
à agilidade no diagnóstico e no planejamento terapêutico.
“Há uma equipe multidisciplinar na qual mastologistas e
oncologistas definem juntos a melhor estratégia para o paciente. A proximidade possibilita uma maior segurança na
definição do diagnóstico”, assegura a oncologista. Segundo
ela, o fato de as clínicas Mastos e CEHON estarem lado a
lado ajuda porque os pacientes podem realizar todos os
procedimentos relacionados à oncologia e mastologia praticamente no mesmo lugar.
Diretoaoponto
Mário César Scheffer
Divulgação
“Não faltam médicos no
Brasil. O problema é a
concentração de profissionais
em mercados ricos”
Coordenador da pesquisa Demografia Médica no Brasil, patrocinada pelo
Conselho Federal de Medicina, o professor da USP Mário César Scheffer
não acredita que a contratação de médicos estrangeiros seja a solução para
a assistência básica no interior do país e nas periferias das grandes cidades.
“Dos 7.200 médicos que tiveram diplomas revalidados em um ano, 44%
foram trabalhar na Região Sudeste. E 16% especificamente na Grande São
Paulo”, afirmou Scheffer, em entrevista à Diagnóstico. Crítico da estratégia
apresentada pelo governo, o professor realça que não faltam médicos no
Brasil e defende que a melhor forma de assegurar a presença de profissionais brasileiros em localidades remotas é oferecer infraestrutura para o
exercício da profissão. “É preciso criar incentivos para manter os médicos
distantes dos grandes centros, como a possibilidade de continuar se especializando”, aconselha o acadêmico.
A criação de uma carreira
médica nos moldes do que
acontece com os juízes – com
mobilidade e salários proporcionais – é uma boa alternativa para servir o interior?
Sim. No segundo mandato do presidente
Lula, o então ministro da Saúde, José Gomes Temporão, elaborou um plano de carreira federal, mas a ideia não foi adiante.
É uma medida importante, mas não a única. É preciso criar incentivos para manter
os médicos distantes dos grandes centros,
como a possibilidade de continuar se especializando. Além disso, o médico não vai
ficar se não tiver uma infraestrutura adequada e nem como encaminhar pacientes.
Qual o impacto da má distribuição de médicos no país
nos escores de desempenho
da saúde pública?
A presença de médicos por si só não
determina o desempenho que uma região tem em termos de saúde pública.
Claro que a falta de acesso a médicos
influi, mas o estudo mostra que há uma
coincidência entre falta de médicos e
outros problemas sociais, como falta de
saneamento e de educação adequada.
Que papel pode caber à telemedicina na ampliação da
cobertura médica no Brasil?
Toda tecnologia pode ser útil, principalmente onde há poucos profissionais de
saúde. A telemedicina, nesses casos, é imprescindível, mas é apenas um paliativo.
O senhor conhece de perto o SUS. A política ainda
influencia muito a gestão
da saúde pública brasileira?
A não destinação de mais recursos para
o setor, a recusa em aplicar os 10% da
receita bruta da União na saúde são
exemplos de decisões políticas equivocadas. E a ANS foi capturada pelo
mercado e é permissiva com um setor
que não entrega o que foi prometido.
Na sua opinião, o sistema único de saúde ainda é viável?
Apesar de suas deficiências, o SUS tem
bases sólidas. Mas há uma aposta contra
uma saúde pública, eficiente e gratuita no
Brasil, que tem tudo para ser tão boa em
nosso país quanto na Inglaterra, onde o
modelo é referência internacional. A discussão é até que ponto o privado pode ser
compatível com um sistema universal.
o pesquisador Mário césar
scheffer: Brasil tem cerca de
180 mil médicos que não possuem
especialização e apenas metade dos
estudantes de medicina consegue
fazer residência médica
Quais as maiores dificuldades que o governo terá
para pôr em prática o plano de abertura de novas faculdades de medicina nos rincões do país?
Mais importante do que abrir novas graduações é oferecer especialização. Há
180 mil profissionais que não são especialistas, contando os que acabaram de
sair da faculdade e os que estão perto de
se aposentar. Só há vagas de residências
para 50% dos estudantes. A metade pior
não vai ter residência. Isso não seria um
problema se a graduação fosse ótima.
Há um lobby contrário à
contratação de médicos
estrangeiros
no
Brasil?
Flexibilizar a revalidação não seria
justo com quem atualmente sofre com
a ausência de médico. Em algumas faculdades na Bolívia, os estudantes não
têm aulas práticas nem cumprem os
dois anos de internato. E não resolveria
o problema da distribuição. Dos 7.200
médicos que tiveram diplomas revalidados em um ano, 44% foram trabalhar na
Região Sudeste. E 16% na Grande São
Paulo.
Diagnóstico | mar/abr 2013
55
Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos. Trinta anos de luta e uma
conquista histórica. É o Governo da Bahia fazendo mais pelos servidores.
O Governo da Bahia ouviu os médicos e atendeu à principal reivindicação na história da categoria nos últimos 30 anos: a
implantação do Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos (PCCV).
(
). Com ele, os nossos médicos vão ter ganhos reais de até 32%
nos seus salários. Além disso, o PCCV também está garantindo conquistas importantes como progressão de carreira por tempo
de serviço, qualificação profissional e recuperação dos valores das aposentadorias com reajuste de até 200%.. Com esse plano,
os médicos que dão plantões semanais de 24 horas nas unidades da rede da SESAB terão, a partir de abril de 2014, vencimentos
com ganhos de 350% além da inflação, comparando com o que era pago em 2007. Essa ação vem se juntar a outra importante
iniciativa que foi o concurso feito em 2008, depois de mais de 15 anos sem ser realizado, que permitiu a contratação de 2.260
novos médicos para melhorar a saúde no nosso estado. O PCCV faz parte do compromisso que o Governo da Bahia tem com
o nosso funcionalismo público. Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos. Bom para os nossos médicos. Bom para toda Bahia.
56 Diagnóstico | mar/abr 2013
O Governo da Bahia
está melhorando
a vida de quem
cuida da nossa.
A remuneração dos médicos aumentou 300% em 6 anos. Após implantação do PCCV esse aumento será ainda maior.
7.000 –
de 5.304,00
a 8.991,23
6.000 –
5.000 –
4.441,95
4.000 –
3.091,37
3.000 –
0–
3.376,42
Fev. 2010
Fev. 2011
4.665,67
1.920,28
2.000 –
1.000 –
3.225,98
de 6.240,00
a 10.577,91
10.577,91
1.163,06
Fev. 2007
Fev. 2008
Fev. 2009
Fev. 2012
Fev. 2013
Antes do PCCV
Jul. 2013
Abr. 2014
Depois do PCCV
Vencimentos dos médicos que dão plantão de 24 horas semanais no quadro efetivo da SESAB.
Diagnóstico | mar/abr 2013
57
saúde&GESTÃO
5
O
lições que as
empresas de saúde
podem aprender
com o mercado
financeiro
Regiane de Oliveira
que empresas de saúde como a Amil, Brazil
Pharma, Laboratório Hermes Pardini, Grupo COI, Alliar, Odontoprev, Fleury e Grupo Delfim têm em comum? Todas elas, em
momentos diferentes, tiveram aportes de
empresas do mercado financeiro para alavancar seu crescimento.
Mas, afinal, o que os IPOS, bancos e fundos de investimentos
têm a ensinar ao setor de saúde? A revista Diagnóstico levantou
cinco lições que podem ajudar no futuro das empresas do setor
que buscam profissionalização.
1
Governança Corporativa
Em meio às muitas definições atribuídas a este termo, o
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) o define como: “Um sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e
monitoradas, envolvendo os acionistas e os cotistas, conselho de
administração, diretoria, auditoria independente e conselho fiscal.
As boas práticas de governança corporativa têm a finalidade de
aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e
contribuir para a sua perenidade”.
Parece fácil? Pois o oncologista Nelson Teich, presidente do
carioca Grupo COI sabe o desafio que é e a diferença que faz
ter uma organização profissional na empresa. Em 2010, o fundo
Axxon Private Equity Group adquiriu parte do negócio de olho
na expansão da empresa, que atua em um nicho muito demandado do setor de saúde: o tratamento oncológico. “Passamos a ser
mais rigorosos na expansão, colocando metodologia e números
para serem julgados pelo conselho previamente”, afirma. “Com
a governança corporativa, temos de fazer tudo de forma objetiva e clara”. Trazer profissionais do mercado é uma das primeiras
exigências do conselho para criar uma cultura de planejamento,
informação, tomada de decisão e processos.
Os resultados já estão à mostra: o faturamento cresceu 50%
em 2012, chegando a R$ 120 milhões. E os planos de expansão
começaram a sair do papel, a rede vai abrir dois novos laboratórios no Rio e vê potencial para crescer em mercados nos quais há
déficit de tratamentos, especialmente no Nordeste.
2
Lei dos grandes números
O famoso conceito da probabilidade é uma das leis do setor financeiro. A teoria não explica muito. “Quando um experimento se repete um grande número de vezes, a probabili58
Diagnóstico | mar/abr 2013
dade de um evento tende para a probabilidade teórica”. Isto é,
qualquer estimativa probabilística baseada apenas em poucas observações não será muito confiável; é preciso escala.
“Quanto mais escala, maior a chance de um plano de saúde acertar uma mensalidade, por exemplo”, afirma Luiz
Augusto Carneiro, superintendente do Instituto de Estudos da Saúde Suplementar (IESS). “É mais fácil acertar o custo per capita com 1 milhão do que com 20 mil”.
Claro que isto funciona bem para as grandes empresas de saúde, especialmente as seguradoras ligadas ao bancos, que ganham com a
venda de balcão. Mas não é uma realidade para a maior parte das empresas do setor. “O que as empresas de saúde menor podem fazer é
considerar fusões, nem que sejam operacionais”, explica Carneiro.
3
DNA do Risco
Os dados da Fenasaúde mostram que as 355 empresas de medicina de grupo, com seus 21 mil beneficiários, representam 28,9%
da receita do setor, de R$ 94,3 bilhões (do acumulado do quarto
trimestre de 2011 ao terceiro trimestre de 2012). As 13 seguradoras de saúde que atuam no setor, por outro lado, apesar de terem
6,6 mil beneficiários, representam uma fatia significativa: 20,3%
do setor. Por que a diferença tão grande entre número de clientes
e resultados? A cadeia de distribuição das seguradoras e o foco
em um público de poder aquisitivo mais alto são as explicações
mais prováveis para o fenômeno. Afinal, dadas as regulamentações atuais, não há praticamente diferença entre a operação da
empresa de medicina de grupo e uma seguradora, certo? Errado.
Há algo escrito no DNA das seguradoras, que vem do mercado financeiro, que as diferencia das demais empresas do setor:
a análise de risco. A identificação, mapeamento e listagem dos
principais riscos a que uma atividade econômica está exposta é
regra básica para as tomadas de decisão empresariais. “As maiores empresas do setor, as pioneiras, têm um DNA do risco, que
vem do mercado financeiro. Este know how facilita os negócios”,
afirma Roberto Westenberger, sócio da consultoria PricewaterhouseCoopers. Operando de forma massificada, com foco no
longo prazo e com uma análise de risco adequada, as seguradoras
conseguem ter performance melhores quando comparadas a outras empresas do mesmo setor.
4
Rede de relacionamento
Network. Sim, o mercado financeiro entende muito bem disso. E Roberto Santoro, diretor-presidente do Laboratório Hermes
Pardini, de Belo Horizonte, está aí para provar. Ele explica que
uma empresa de saúde não é diferente de outras de setores diferentes: todas têm as mesmas necessidades de se adequar às boas
práticas do mercado. “Desde 2007, trabalhávamos com um projeto estruturante para estabelecer governança, o que nos ajudou
na hora de conseguir um sócio”, afirma. No final do ano passado,
o laboratório recebeu um aporte do fundo Gávea Investimentos.
Santoro sabia que as coisas iriam mudar, mas não foi na área
da gestão que ele viu a maior diferença. “Tivemos uma melhora
em nossas relações institucionais. Os fundos têm outras empresas, o que permite o compartilhamento de inteligência”, conta.
À parte as cooperativas, trabalhar em uma rede ainda é incomum para as empresas de saúde, especialmente as pequenas.
“O fato de atuarmos em um setor sensível, que envolve ética no
cuidado com pessoas, faz com que as empresas de saúde, geralmente, se fechem com foco em suas próprias práticas. A rede de
transferência de inteligência e contatos e de relacionamento não
existe.”
O executivo também ressalta outra característica que fez valer a pena a parceria. “De repente, parece que ganhamos um selo
de qualidade, que ajuda a abrir portas”, diz. Santoro explica que
a empresa de um private equity representa um selo de qualidade
de boas práticas. “Um fundo não entra em uma empresa sem o
mínimo de controle e balanço consistentes.”
A maior diferença está no olhar externo. “Os bancos já veem
a empresa de forma diferente na hora de buscar financiamentos”.
Ele ressalta, ainda, que é mito que vai haver uma intervenção
do sócio. “Ter um fundo como parceiro representa uma pressão
maior, mas não é intervenção. As empresas devem se abrir, pois
ainda precisamos de muito investimento privado na saúde”.
5
Transparência
Sim, as empresas do mercado financeiro batem nesta tecla da
transparência insistentemente. Porém, o que deveria ser uma regra incorruptível mostrou que o sistema financeiro tem falhas que
devem ser consideradas. Eventos recentes, como a crise financeira internacional promovida pela falta de transparência entre
os agentes do setor financeiro, na maioria dos casos em nome
da defesa dos bônus milionários que estes executivos recebiam
pelos bons resultados em operações, mostraram que não é possível usar o mercado financeiro como benchmarking de transparência.
Os executivos ouvidos pela revista Diagnóstico deixaram
claro: neste quesito, o mercado financeiro também tem que
trabalhar bastante. Mas há boas práticas no setor, que podem
servir de exemplo. Desde a ascensão da internet, nos últimos 12
anos, a área da saúde começou a descobrir que a transparência
tornara-se uma demanda social. Se, por um lado, as más práticas
das empresas são colocadas na rede, seja em sites de relacionamento ou mesmo do órgão regulador, do outro, a conectividade
abre espaços para revolucionar as práticas de gestão da saúde.
Compras online é um exemplo.
Em busca de maior transparência de redução de custos, os
hospitais vêm se aliando a novas plataformas, como a Bionexo,
a fim de conseguir maior eficiência em sua compra. “Tanto no
setor público, quanto no privado, vemos uma diferença muito grande com a utilização das plataformas da Bionexo”, conta
Maurício de Lázarri Barbosa, diretor-presidente da empresa. A
plataforma permite que hospitais e fornecedores tenham um relacionamento transparente, sem favoritismos. O resultado, em
alguns casos: redução de 30% no custo das compras.
A Bionexo atua como uma comunidade, formada por mais
de 30 mil agentes do segmento de saúde e com braços fora do
país, na Colômbia, Espanha, México e Argentina. A inovação
trazida pelo modelo de negócio também chamou a atenção
do setor financeiro. Em julho de 2012, a empresa recebeu um
aporte do fundo de private equity americano Insight Venture
Partners.
Diagnóstico | mar/abr 2013
59
GESTÃO
FANEM
diretor-presidente
da fanem, djalma
rodrigues: presença
em mais de cem
países e investimento
constante em inovação
Ricardo Benichio
o modelo fanem
de gestão
Maior fabricante de berçários e equipamentos neonatais do Brasil, empresa quer
continuar fazendo história com comando familiar e obsessão pela competitividade
Regiane de Oliveira
60
Diagnóstico | mar/abr 2013
O
berçário com seis
incubadoras
que
decora o hall de entrada da Fanem certamente é o sonho de
consumo de muitos
hospitais brasileiros.
Equipamentos de ponta, com design sofisticado e alta tecnologia, as incubadoras
são a marca registrada da maior indústria
de equipamentos médicos no ramo de neonatologia, laboratórios e biossegurança do
país. Há quem diga que a Fanem domina
80% do mercado. Outros que, de cada 10
equipamentos dentro de uma UTI neonatal,
nove levam a sua marca. Nem a empresa
sabe de fato qual a versão correta. Eles são
líderes e pronto.
Quem visita a sede da empresa, em São
Paulo, localizada em um bairro residencial
na Zona Norte da capital paulista, percebe
que eles concorrem sim, mas contra si mesmos. A necessidade constante de avanço
da medicina – mais do que qualquer outra
empresa nacional ou internacional –, esta
sim, é a maior concorrente da indústria
fundada em 1924, pelo alemão Arthur Carl
Schmidt, que veio ao país instalar equipamentos médicos e se apaixonou pelo país.
Está gravado no slogan da empresa:
“Para estar entre os grandes, cuidamos bem
dos pequenos”, mesmo que ninguém imaginasse quão pequenos esses bebês poderiam ser um dia. No começo do século XX,
uma criança que nascesse com 1,5 kg tinha,
no máximo, 10% de chance de sobreviver.
Em 1996, o bebê Carlão bateu o recorde
nacional de baixo peso. Nasceu com apenas 430 gramas e, após quatro meses com
ajuda da tecnologia neonatal, sobreviveu.
Em 2006, o bebê Arthur tirou de Carlão o título de menor brasileiro já nascido.
Ele veio ao mundo com 358 gramas, mas
chegou a pesar 282 gramas. Saiu do hospital com 2,1 kg. Em 2010, foi a vez de Ana
Júlia surpreender. Nascida com 365 g e 27
cm, do tamanho da palma de uma mão, no
Hospital Perinatal, na Barra, Rio. Ela precisou de 132 dias na UTI até conseguir voltar
para casa pesando 2,3 kg.
O que estes três vencedores têm em
comum? Todos foram amparados por tecnologia desenvolvida pela Fanem. O sonho
de Walter Schmidt, filho do fundador, que
alavancou os negócios da empresa a partir
dos anos 30, introduzindo técnicas e novos
padrões para a fabricação de centrífugas e
estufas, foi muito além da incubadora modelo 008, que ele apresentou com orgulho
nas comemorações do IV Centenário de
São Paulo, época em que a indústria paulista começou a ganhar destaque frente ao
setor rural.
Não foi um processo fácil. A indústria
de equipamentos nacional mal dava seus
primeiros passos e já encarava dificuldades
que ameaçavam sua continuidade, especialmente se tratando de uma empresa que
ao longo do tempo manteve a administração familiar, sem se interessar pelo assédio
das gigantes. “No passado, as necessidades
eram outras. Enfrentamos, por exemplo, a
falta de matéria-prima durante a Segunda
Guerra Mundial e tivemos de desenvolver
folhas de flandres recicladas para cumprir
os contratos de fornecimentos de estufas”,
conta Rubens Massaro, gerente de vendas e
genro de Djalma Luiz Rodrigues, atual presidente. Djalma foi casado com Marlene
Schmidt, neta do fundador, que faleceu no
ano passado. A quarta geração de herdeiras
– Karin, Kátia e Kristine Schmidt – não
atua na empresa, apesar de ser do conhecimento de todos que Marlene sempre achou
que um dia as filhas acabariam abraçando
a empresa, como ela fez. Mas a quinta geração, os netos de Djalma e Marlene, estão sendo preparados para o negócio. A
participação da família não afeta a estrutura profissional, encabeçada pelo diretor-presidente, Djalma Luiz Rodrigues, e, até
fevereiro, pelo CEO, Cícero Oliveira, que
deixou a empresa por motivos particulares – a função passou a ser acumulada pelo
próprio Rodrigues. Mas isso não parece ser
motivo para uma crise interna, uma vez
que a Fanem tem uma estrutura gerencial
– vendas, comercial, industrial, internacional, fiscal e marketing – bem definida.
A Fanem não nega que enfrentou muitas dificuldades, mas sempre as resolveu
como uma família, modelo que não pretende mudar no curto prazo, nem com as
várias propostas que a empresa recebe frequentemente. “Ouvimos todas as propostas, mas não temos interesse em vender”,
afirma Rodrigues. “Crescemos em nosso
próprio tempo. Aprendemos que não há
grandes personagens em nossa história;
só nossos clientes, nossos colaboradores
e os milhões de pacientes pequeninos que
ajudamos a salvar e a recuperar”. Ele só
esqueceu de mencionar um personagem
importante, que é a base do sucesso da empresa: a coragem de arriscar.
expansão internacional – A
indústria de equipamentos e materiais
médicos, hospitalares e odontológicos do
país começou seu desenvolvimento mais
expressivo na década de 60, época em que
a Fanem já tinha 20 anos de liderança em
seu segmento de negócios. Neste período,
nasceram outras pioneiras, como a Takaoka (do setor de anestesia) e a Baumer
(órteses e próteses). Assim como a Fanem,
essas empresas também foram criadas por
imigrantes que apostaram no país. A Abimo, associação que representa todos os
segmentos da indústria brasileira de equipamentos e materiais para saúde, também
foi fundada neste período, em 1965.
Nessa época, o governo iniciou uma
política de industrialização por substituição
de importações. As medidas de protecionismo ajudaram muito o setor. A indústria
brasileira se desenvolveu apoiada na Lei
do Similar Nacional, de 1969, que protegia
os produtos brasileiros, bem como na nova
política de promoção às exportações, que
deu o primeiro empurrão para que os produtos do setor começassem a sair do país.
A Fanem aproveitou o momento. Em
1970, fez sua primeira exportação de incubadoras para países da América Latina.
Vender para fora, especialmente em uma
época em que os Estados Unidos avançavam na área de equipamentos eletrônicos,
exigiu investimentos em qualidade, com
produtos mais sofisticados. Essas medidas deram certo. Estatísticas da Abimo
mostram que, em 1974, os equipamentos
produzidos no país atendiam a cerca de
73% da demanda interna do setor de saúde.
Nunca mais esse valor seria tão alto. No
ano passado, o déficit comercial na balança
da saúde chegou a R$ 41 bilhões.
Paulo Fraccaro, atual presidente da
entidade, explica que, em 1988, quando o
governo federal criou o Sistema Único de
Saúde (SUS), foram criadas as primeiras
políticas com foco em melhorar o atendimento da população. O problema é que o
SUS não deu conta de arcar com o avanço
dos custos médicos e, para atender aos baixos preços pagos pelas licitações, muitas
empresas partiram para a exportação.
A Fanem optou por outro caminho. Adquiriu tecnologia internacional, por meio
da aquisição de uma empresa nos Estados
Unidos, que, mais tarde, foi vendida para
a alemã Dräger Medical, hoje sócia minoritária. “O nosso sucesso em exportação
não foi só pelo know how comprado, mas
principalmente pelo fato de termos aperfeiçoado a tecnologia, sempre buscando inovação”, afirma Rodrigues.
Diagnóstico | mar/abr 2013
61
GESTÃO
FANEM
O segredo da Fanem, aliás, parece
simples: “Fazemos algo diferente, mas de
olho no custo/benefício. Não adianta fazer
produto que não cabe no bolso do cliente”,
conta o presidente da companhia. A aposta
da empresa é “vender confiança”. O cliente, o administrador do hospital, tem certeza
do retorno financeiro dos produtos a longo
prazo. E a empresa tem provas de que isto
acontece. Recentemente, a Fanem recebeu
uma doação de duas estufas com 50 anos
de utilização, em perfeitas condições de
uso. “Temos estufas no Instituto Vital Brasil, no Rio de Janeiro, que foram instaladas pelo bisavô de meu filho”, comemora
Massaro.
Pé na estrada – Depois de um tempo participando de várias feiras internacionais, a Fanem começou a descobrir a sua
vocação exportadora. “Dá muito orgulho
ir a uma feira internacional e ver o público
comentando que é um produto brasileiro”,
afirma Rodrigues.
Enquanto a indústria nacional entrava
em falência após a abertura econômica, a
Fanem já havia se decidido que não haveria espaço para seu negócio se não conseguisse atuar em um mercado internacionalizado. No início dos anos 1990, a redução
das tarifas de importação e as mudanças na
legislação que protegia a indústria local,
acabando com as barreiras para os produtos similares, deixaram as empresas nacionais descobertas, especialmente no quesito
preço. A sucessão de pacotes financeiros
para tentar estabilizar a economia ajudou
a colocar uma pá de cal em algumas empresas. “Quando analisamos este período,
percebemos que o ambiente na empresa
tinha de se alterar abruptamente, de um
momento para outro, o que não era fácil
para um organismo fabril que já tinha contratos assumidos”, explica Massaro. “Mas
saímos fortalecidos, o que não foi uma exclusividade nossa. Muitas outras empresas
também souberam encontrar suas soluções”, explica.
Quando diz que a Fanem saiu fortalecida, Massaro quer dizer que conseguiu
levar seu nome para mais de 110 países,
abrir duas plantas de produção em São
Paulo – já saturadas, lembra o executivo
–, à espera de ampliação, além de ter um
escritório em Omã e uma fábrica em Bangalore, na Índia, inaugurada em 2011. A
unidade indiana, que conta com 20 funcionários e representa 7% dos negócios
da empresa, por enquanto, tem como foco
apenas a montagem de produtos exportados do Brasil. A venda nos países árabes
representa 20% dos negócios internacio-
nais da Fanem. “Isso tudo é fruto de muito
pé na estrada participando de feiras internacionais. Cansa, mas o retorno é gratificante”, afirma Rodrigues.
Do total de receita da Fanem, 70% ainda são dependentes do mercado interno.
Massaro espera que isso mude, e em breve. O plano é empatar ou passar em número de exportações, que tem um crescimento muito maior do que as vendas internas.
A empresa não divulga mais o faturamento, uma prática que ainda era comum em
2007, quando anunciou vendas na casa de
R$ 63 milhões e um crescimento médio de
5% nos anos seguintes.
Segundo cálculos feitos pela Diagnóstico, nesta velocidade, a receita da empresa já poderia estar na casa dos R$ 100
milhões. Porém, recentemente, a empresa
enfrentou os efeitos da escassez monetária mundial e teve que utilizar recursos do
próprio caixa para garantir contratos de ex-
fábrica da Fanem em
guarulhos, grande SÃO
PAULO: expansão internacional foi
consolidada com abertura de linha
de montagem na Índia e escritório
em Omã, no Oriente Médio
Divulgação
62
Diagnóstico | mar/abr 2013
Inovação – A Fanem investe de 3%
a 4% de sua receita em inovação. O valor
é pequeno quando comparado a grandes
corporações internacionais, nas quais essa
participação chega a ultrapassar 10%. Mas
está bem acima da média nacional de investimento em inovação, de cerca de 1,3%
do PIB. Hoje, a empresa conta com 50 patentes registradas em vários países, uma
grande conquista para uma companhia
nacional, tendo em vista os altos custos
para manter as patentes em vários países.
Em 2003, a empresa inaugurou um centro
de estudos, responsável por fazer o intercâmbio entre a indústria e a academia, em
busca de inovações nos produtos. Ali também são feitos treinamentos. A empresa dá
cursos para cerca de 4 mil pessoas por ano.
Uma pergunta é comum quando se
trata da Fanem. Como eles conseguiram,
enquanto outras, consideradas tão competentes quanto, ficaram pelo caminho? Rodrigues explica que a busca pelo mercado
externo foi o segredo do sucesso da empresa, mesmo com os percalços comuns.
“Minha dica é que as empresas parem de
olhar para a desvalorização do dólar e outros fatores externos, pois, seja qual for
essa desvalorização, o importante é que ela
não derrube a qualidade dos produtos para
reduzir custo”, diz.
Paulo Fraccaro, presidente da Abimo,
no entanto, afirma que, dadas as condições
do setor de equipamentos em saúde, será
muito difícil nascer outra Fanem. “O mercado está globalizado, as empresas nacionais têm concorrentes fortes aqui dentro,
é mais difícil competir”. Enquanto isso,
Massaro sonha alto para a Fanem. “Quem
sabe a gente não comemora nosso centenário com uma fábrica (de montagem de
equipamentos) na China?, sugere ele. Alguém duvida de que isto será possível?
Linha de inovação da Fanem
portação, o que deve ter prejudicado a evolução dos resultados da companhia.“Mas
enquanto o mercado brasileiro reduz, nosso crescimento em vendas foi de 5% no
ano passado. Temos 15 anos seguidos de
balança superavitária, enquanto a balança da saúde no país continua deficitária”,
afirma Rodrigues. “Só não vendemos para
Japão e China”, diz, ressaltando que o gigante asiático é um parceiro muito complicado para se fazer negócios. “Eles copiam
patentes, não têm parâmetros de concorrência leal”. A Fanem prefere desenvolver
a cadeia local de fornecedores a levar a
produção para mercados mais baratos.
1954 - Produção da primeira incubadora brasileira
1969 - Lançamento da primeira fototerapia brasileira com lâmpadas
fluorescentes
1970 - Primeira exportação de incubadoras na América Latina
1971 - Produção do primeiro berço
de calor radiante do Brasil
1975 - Introdução da incubadora
Isolette C-86 no Brasil
1980 - Produção da primeira incubadora de transporte do Brasil
IT058
1983 - Primeira fototerapia dotada
de movimentos giratórios para uso
em berços de calor radiante
1988 - Introdução e produção do
primeiro sistema de medição radiométrica para fototerapia
1991 - Lançamento da fototerapia
Bilispot, a primeira do país a utilizar
lâmpadas halógenas, erradicando
grandemente os procedimentos de
exsanguíneo transfusão
1992 - Introdução da incubadora
C186, a primeira microprocessada
do Brasil
1997 - Conquista do primeiro certificado de produto eletro-médico da
América Latina
1998 - Lançamento do Biliberço, primeira fototerapia reversa
2000 – Lançamento da incubadora
Vision 2186
2004 - Lançamento do Bilitron, primeira fototerapia microprocessada
do mundo. Produto eleito como
tecnologia inovadora pela World
Health Organization
2006 – Lançamento da incubadora
Vision 2286 Advanced
2009 - Lançamento do Ampla, primeira Unidade de Terapia Intensiva
a reunir grande quantidade de tecnologia embarcada em um só aparelho
2010 - Lançamento do Bilitron Bed,
primeira fototerapia reversa de super-LEDs
2011 - Conquista do primeiro certificado RoHS entregue a uma empresa brasileira de eletro-médico.
Lançamento do THOR, único instrumento do mundo que reúne no
mesmo aparelho a medição dos
parâmetros de rotinas
médicas
(temperatura, umidade, oxigênio e
radiância)
2012 – Lançamento do Agitador de
Plaquetas
Fonte: Fanem
Diagnóstico | mar/abr 2013
63
um olhar sobre o
design baseAdo em
evidências
A Diagnóstico foi buscar no renomado Center For HealthCare Design (CHD),
sediado nos Estados Unidos, as referências que tornaram o design hospitalar
parte intrínseca no processo de cura
Rodrigo Sombra,
da
U
Califórnia
ma garota paralisada
pelo medo. Essa foi
a imagem encontrada
por Doug Dietz, designer chefe da GE,
quando visitou um
hospital para observar como pacientes reagiam ao realizarem exames num scanner de ressonância
magnética (MRI) recém-projetado por ele.
Aterrorizada pela ideia de entrar no scanner, a garota não dava ouvidos aos pais,
esperneava e se recusava a realizar o exame. Esgotado o diálogo, pesados sedativos
foram usados para, enfim, “convencê-la” a
entrar no túnel daquele aparelho cinza e
barulhento. Assistir àquela cena e saber
que sedar crianças era prática comum em
exames de ressonância magnética abalaram as convicções de Dietz. Descobrir
como, além de seu aspecto funcional, o
design de um aparelho médico pode gerar
uma experiência positiva o levaria a, anos
depois, projetar um modelo radicalmente
diferente de scanner: o GE Adventure Series. Customizados como submarinos ou
navios piratas, os scanners da Adventure
Series convidam a uma experiência lúdica em nada parecida àquela de deslizar no
interior de um “tijolo com um buraco no
meio” – como o próprio Dietz definiu seus
antigos aparelhos. Não por acaso, um dos
hospitais a adotar o “navio pirata” diminui
em 70% o número de crianças sedadas em
exames de ressonância magnética.
O sucesso do Adventure Series é caso
exemplar de como soluções criativas
64
Diagnóstico | mar/abr 2013
aplicadas ao ambiente hospitalar podem
influenciar a assistência médica. Nos últimos anos, inúmeras pesquisas têm demonstrado como projetos inovadores em
arquitetura e design são capazes de não
somente amenizar o estresse do paciente, mas também reduzir erros médicos, a
chance de quedas e a transmissão de infecções.
O entendimento de que o entorno
impacta o bem-estar do paciente não é
novidade, mas ganhou maior rigor científico nos primeiros anos 90, quando da
criação do Center For HealthCare Design
(CHD), instituto de pesquisa localizado
na cidade de Concord, Califórnia. Interessada em uma abordagem multidisciplinar que integrava design, arquitetura
e conceitos de psicologia ambiental e da
saúde, a equipe do CHD explorava, então, um novo olhar sobre a importância
do ambiente hospitalar.
juntar as pessoas certas –
O método inaugurado pelo CHD ficou
conhecido como “design baseado em
evidência” (DBE). Em suma, o conceito
define o processo pelo qual mobiliário,
instalações e plantas hospitalares são projetados a partir de resultados colhidos em
pesquisas científicas. Ainda em meados
dos anos 90, ao passo em que as pesquisas
do centro evoluíam, crescia também o seu
apelo entre os líderes do setor de saúde
nos EUA. “A certa altura, alguns executivos cabeça-aberta da indústria hospitalar
se aproximaram de nós e disseram: ‘Olha,
isso (design baseado em evidência) é algo
que nós não compreendemos completamente, mas que queremos incorporar à
arquitetura dos nossas instalações. Queremos juntar as pessoas certas e tirar o
máximo do conhecimento que vocês têm
produzido’”, recordou Debra Levin, atual
diretora executiva do CHD, em entrevista
à Diagnóstico. “E à medida em que aquelas novas instalações eram construídas e
a história se espalhava, vimos que a aceitação do ‘design baseado em evidência’
crescia muito rapidamente”. Passados 20
anos desde a criação do CHD, ideias como
“design baseado em evidência” são moeda corrente no setor de saúde americano
e em várias parte do mundo. “As pessoas hoje estão muito mais conscientes de
quanto o entorno contribui para a cura e o
bem-estar”, opinou Hilary Dalke, professora de design da Kingston University, de
Londres. Dalke há anos pesquisa os efeitos da cor no interior de instalações médicas e acredita que “um hospital bem projetado pode não curar pessoas gravemente
doentes, mas um hospital mal concebido
e instalações deprimentes podem definitivamente afetar o tempo de recuperação
de pacientes e a autoestima dos funcionários”. Para David Allison, diretor da Esco-
lobby do hospital da
FUNDAÇÃO pritzker, em
chicago: projeto clássico do CHD
com abordagem multidisciplinar e
psicologia ambiental
Nick Merrick / Divulgação
MERCADO
DESIGN
Diagnóstico | mar/abr 2013
65
MERCADO
DESIGN
la de Arquitetura da Clemson University e
eleito pela revista HealthCare Design uma
das dez personalidades mais influentes do
design hospitalar em 2012, o campo hoje
está mais que estabelecido. “Organizações
de saúde e designers estão se movendo
para além do foco em medidas tradicionais de eficiência funcional e da ênfase em
tecnologias adequadas, mesmo que essas
preocupações continuem sendo importantes. Hoje, os ambientes de saúde são mais
humanizados e menos institucionais”, disse Allison à Diagnóstico.
FUNÇÃO CRÍTICA – Grande parte
dos estudos que investigam a relação entre design e assistência médica nos EUA
é acompanhada de perto pelo Center For
HealthCare Design, que atua como o
principal agregador de pesquisas do setor.
“Em um campo que tem crescido rapidamente, há a necessidade de uma bússola,
um sistema de navegação que ajude as
pessoas a encontrarem seu caminho. Na
minha opinião, o CHD preenche essa função crítica”, opina Upali Nanda, arquiteta
e presidente do conselho consultivo do
RedCenter da American Art Resources,
instituição que estuda o impacto do uso
de artes visuais em instalações hospitalares. Mais que um instituto de pesquisa, o
CHD funciona como eixo para uma comunidade dedicada a pensar alternativas
para o design hospitalar. Arquitetos, designers, médicos e empresários encontram
no centro um espaço privilegiado para a
circulação de ideias e o desenvolvimento
de projetos colaborativos. “O CHD está
tecendo um núcleo forte, a fim de unir a
crescente rede interdisciplinar que define
o design hospitalar. O papel do CHD é essencial para garantir que o que é feito em
certas empresas ou ambientes acadêmicos
seja comunicado para a indústria em geral”, afirma Nanda. Em 2008, o CHD deu
outro passo importante com a criação do
Evidence-Based Design Accreditation and
Certification (EDAC), programa que confere credenciais a profissionais treinados
para usar o método do design baseado em
evidência. Desde o lançamento do EDAC,
mais de 1.300 profissionais já foram instruídos e credenciados pelo centro.
NOVAS TENDÊNCIAS – A forte presença do design na agenda da indústria
médica americana durante os últimos
66
Diagnóstico | mar/abr 2013
anos estimulou a chegada de uma nova
onda criativa para setor. Inaugurado em
fevereiro, o hospital infantil de Orange
County, por exemplo, fez investimento
maciço em aspectos recreativos capazes
de tornar mais suave a estadia de pacientes pediátricos.
Assinado pela FKP Architects, o interior de cada andar do edifício é inspirado
em cenários que vão do oceano profundo
ao espaço sideral. Além disso, o prédio
abriga ainda um estúdio de rádio e TV no
qual pacientes são convidados a montar e
transmitir seus próprios programas. Encarregado de projetar o “hospital do futuro”,
o time do CO Architects inaugurou no ano
passado o Palomar Medical Center, em Escondido, Califórnia. Orçado em US$ 956
milhões, o Palomar é projeto-piloto do
Green Guide for Healthcare (GGHC), sis-
EM sentido horário: ludismo
da sala de diagnóstico por imagem
do Children’s Hospital of Orange
County (CHOC), na Califórnia;
área externa do Palomar Medical
Center, também na Califórnia; o
Lurie Children’s e sua fachada
recreativa eo Hospital Butaro, na
África: mistura de simplicidade e
eficiência
Craig Dugan/FKP Architets
Tom Bonner/CO Architets
Tom Bonner/CO Architets
Mass Design Group/Divulgação
Diagnóstico | mar/abr 2013
67
fachada do choc, hospital
infantil californiano:
design como elemento de cura e
sensibilização
Craig Dugan/FKPArchitets
tema de classificação criado para orientar
construções sustentáveis na área de saúde.
Ornado com jardins, terraços e exposição
abundante à luz natural, o hospital possui
ainda um telhado verde com extensão de
1,5 acre acima de uma de suas torres. O
projeto levou 10 anos para ser concluído e
foi descrito pelo doutor David Tam, chefe
administrativo do Palomar Health, como
“uma oportunidade para realmente olhar a
pesquisa baseada em evidências e incorporar o máximo de avanços que poderíamos encontrar”.
Embora os EUA comportem grande
know-how em design, profissionais americanos muitas vezes aperfeiçoam sua
técnica pelo contato direto com realidades
radicalmente diferentes. É o caso de Michael Murphy, arquiteto e diretor executivo do Mass Design Group. Após formar-se em Harvard, Murphy tomou a dianteira
em projetos de hospitais e escolas em Ruanda, onde aprendeu lições importantes
de eficiência e simplicidade. Convidado
68
Diagnóstico | mar/abr 2013
para conduzir a reforma em um hospital
de Nova Iorque no ano passado, Murphy
deparou-se com um edifício obsoleto, calorento e cujas janelas estavam parafusadas, bloqueando a circulação de ar e provocando total dependência do sistema de
ar condicionado. Em vez de pôr o prédio
abaixo ou tomar qualquer medida drástica
e custosa, ele resolveu o problema da temperatura no hospital a partir de soluções
extraídas da experiência de escassez em
solo africano. Sem precisar usar luz elétrica, recorreu ao sombreamento de varandas ao ar livre, redefiniu o uso das janelas
e aplicou um sistema de chaminés solares
e verticais típico de Ruanda. Pelo sisitema, é possível “acelerar a extração do ar
fresco para o interior do ambiente, em um
sistema de filtração mais parecido com a
respiração natural”, explicou Murphy em
entrevista à revista Metropolis.
Michael Murphy batizou de “pensamento-de-sul-pra-norte” a tática descrita
acima. Em tempos de crise econômica, em
que líderes da área de saúde podem sempre relutar em investir em projetos mais
dispendiosos, a lição de simplicidade do
Mass é mais que bem-vinda. Os designers
americanos consultados pela Diagnóstico,
no entanto, acreditam que o mercado não
parece disposto a recuar.
“Ao investir em suas instalações, eles
(os líderes do setor de saúde) verão economias que irão cobrir os custos do capital
inicial seguidas vezes: em forma de uma
menor rotatividade de funcionários, contas de energia mais baixas e uma maior
participação no mercado”, acredita a pesquisadora Sara Marberry. A promessa de
que o investimento em design promete
bons frutos a longo prazo também é partilhada por David Allison: “Os líderes das
organizações de saúde precisam considerar muito mais do que o custo investido
na construção”, salienta. “Eles precisam
entender dos seus negócios para obter melhores projetos e ir além do pensamento a
curto prazo”.
Nick Merrick /Divulgação
MERCADO
DESIGN
Hospital Infantil Ann
Robert, em chicago:
ambientes mais humanos e
menos institucionais mantêm
astral alto para os pacientes e
seus familiares
Diagnóstico | mar/abr 2013
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70
Diagnóstico | mar/abr 2013
Diagnóstico | mar/abr 2013
71
INTERNACIONAL
israel
Ricardo Benichio
eles querem
‘invadir’ o Brasil
País com maior nível de inovação tecnológica em saúde em todo o mundo, Israel
vendeu US$ 70 milhões em produtos médicos aos brasileiros em 2012 e tem
planos ambiciosos para um mercado de quase 200 milhões de consumidores
Gilson Jorge
H
72
á 65 anos, em 14
de maio de 1948,
o Estado de Israel
entrou para o mapa
ao ser declarado independente do território palestino, com
Diagnóstico | mar/abr 2013
a participação decisiva do embaixador
brasileiro Oswaldo Aranha. A gratidão
israelense é tanta que o falecido diplomata gaúcho, presidente da assembleia da
ONU em 1947, quando se deliberou pela
criação do país, empresta o seu nome a
uma praça em Jerusalém e a uma rua em
Tel Aviv. Pois no último mês de maio, Israel entrou definitivamente para o mapa
dos negócios da saúde do Brasil. Uma
inédita missão médica, liderada pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, visitou as sedes de algumas das principais
instituições de saúde do Oriente Médio
Jayme Blay – presidente
da Câmara Brasil-Israel
de Comércio E Indústria
– liderou missão médica
brasileira a Tel Aviv
em busca de soluções para o mercado brasileiro. Poucos dias depois, um grupo de
empresários israelenses do setor médico
aterrissou em São Paulo para participar
da Hospitalar, em busca de distribuidores
para seus produtos.
O crescente interesse do país que mais
investe em inovação tecnológica no mundo pelo Brasil ficou evidente em 2011,
quando o Protalix, medicamento feito em
Israel contra a doença de Gaucher, foi liberado pela Anvisa para consumo no país.
Dois anos depois, a empresa que o produz
está em avançadas negociações com o governo brasileiro para a instalação de uma
fábrica de R$ 170 milhões no Ceará. O
custo financeiro será bancado pelo Brasil,
através da Fiocruz, e Israel entra com a
tecnologia.
Em 2012, a indústria de saúde israelense vendeu US$ 70 milhões ao Brasil,
um crescimento de 30% em relação a
2010. As cifras ainda são modestas, mas,
ao mesmo tempo, espelham o enorme
potencial que as empresas daquele país
enxergam no novo parceiro. “Esses números sugerem às empresas israelenses
o grande potencial de negócios no Brasil,
ainda que o processo regulatório continue
sendo um desafio e demande grandes recursos e cooperação com fabricantes locais”, afirmou à Diagnóstico, de Tel Aviv,
Angela Rabinovich, do Israel Export and
International Cooperation Institute (IEICI) – correspondente a Apex, no Brasil.
Além disso, o país mais desenvolvido do
Oriente Médio considera que o Brasil está
enviando ao mundo uma mensagem de
que é um país estável, aberto ao investimento estrangeiro e pronto para a cooperação econômica. Justamente como está
acontecendo entre a Protalix e a Fiocruz.
A Teva, maior produtora mundial de
genéricos, pode seguir o mesmo caminho
da Protalix. Criada em 1933 como um pequeno laboratório por um cientista judeu
que emigrou para a Palestina, a empresa
se tornou um ícone do setor de saúde em
Israel em 1976, quando uma série de fusões e aquisições de concorrentes deu origem à Teva Pharmaceutical Ltda. Um gigante do setor que, em 2012, faturou US$
20,3 bilhões em vendas, com a fabricação
de 73 bilhões de comprimidos.
Para se ter uma ideia da importância
da empresa, a cada seis genéricos prescritos pelos médicos nos Estados Unidos,
um é da Teva. Diariamente, a companhia
israelense vende 1,5 milhão de comprimidos na nação mais rica do planeta e outros 2,7 milhões na União Europeia. Presente no Brasil há sete anos, a empresa
tem como um dos principais produtos no
mercado local o Copaxone, uma solução
injetável para o tratamento de esclerose
múltipla remitente recorrente (EMRR).
Hospitalar – Mas não são apenas
os grandes conglomerados da indústria
farmacêutica que estão querendo fincar
o pé no Brasil. Um grupo de pequenos
(mas promissores) empreendedores do
setor participou pela primeira vez, este
ano, da Hospitalar, em São Paulo, com o
apoio institucional do IEICI. A entidade,
sediada em Tel Aviv, montou um estande na principal feira do setor na América
Latina para ajudar a promover pequenas
empresas inovadoras.
Todo esse interesse pelo Brasil não é
à toa. Com uma população de quase 200
milhões de habitantes, a sétima maior
economia do planeta e uma crescente
utilização dos serviços de saúde, o país
é um mercado desejado avidamente pelas
empresas de uma nação de alto desenvolvimento tecnológico e poucos consumidores: algo em torno de sete milhões de
pessoas, apenas um pouco mais do que a
O Brasil tem um
grande potencial
de negócios com Israel,
ainda que o processo
regulatório continue
sendo um desafio e
demande grandes
recursos de cooperação
angela rabinovich, dO ieici –
equivalente À apex no brasil
cidade do Rio de Janeiro.
“O Brasil é muito importante para
nós, e a Hospitalar é a maior feira da
América Latina, por isso estamos aqui”,
declarou à Diagnóstico Raphaële Moog,
executiva do IEICI, que trouxe ao país
oito empresas de pequeno e médio porte,
mas dotadas de tecnologias avançadas em
diferentes setores, como dispositivos para
o tratamento do mal de Alzheimer e cápsulas com câmeras acopladas para a investigação de tumores no sistema digestivo. “São tecnologias que não existem em
nenhuma outra parte do mundo”, afirma
Moog.
Algumas dessas empresas já vendiam
para a América Latina, mas querem ampliar a participação no mercado regional,
que responde apenas por 1,4% das vendas externas de Israel. A Cool Sense é um
bom exemplo. Especializada em produtos
dermatológicos, a empresa já tem distribuidores na Argentina e na Colômbia,
mas resolveu pegar carona na iniciativa do IEICI e se aventurar em busca de
distribuidores no maior país da região.
“Queremos finalmente encontrar distribuidores apropriados e bem estabelecidos
para lidar com nossos produtos. A América Latina é uma região promissora, especialmente na área de estética”, afirmou
à Diagnóstico o gerente de marketing da
Cool Sense, Rami Bakal. A mesma esperança de conseguir distribuidores trouxe
ao Brasil a Neuronix Ltda, empresa que
produz um dispositivo que combate o Alzheimer através de estímulos eletromagnéticos das regiões do cérebro afetadas
pela doença. “O nosso sistema NeuroAD
já recebeu aprovação das autoridades
competentes da Europa e da Ásia, onde
já está sendo comercializado. Mais testes
estão sendo feitos nos Estados Unidos,
pela FDA, e na Inglaterra”, declarou à
Diagnóstico a vice-presidente de marketing da Neuronix, Orly Bar.
O IEICI não forneceu dados sobre as
expectativas de negócios durante a feira.
Mas a reputação de oferecer produtos eficientes e baratos coloca o pequeno país
do Oriente Médio no radar dos executivos
brasileiros do setor de saúde. No final de
abril, uma comitiva de gestores públicos,
médicos e empresários de healthcare embarcou para Tel Aviv a convite da Câmara Brasil-Israel de Comércio e Indústria
e do Hospital Israelita Albert Einstein.
Missão médica – Na comitiva,
Diagnóstico | mar/abr 2013
73
INTERNACIONAL
israel
Divulgação
nomes de peso como os presidentes da
Bradesco Seguros, Márcio de Araújo
Coriolano, da Amil, Edson Bueno, e da
Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), Francisco Balestrin, além
do próprio presidente do Albert Einstein, Claudio Lottenberg. Liderado pelo
ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e
pelo presidente da Câmara Brasil-Israel
de Comércio e Indústria, Jayme Blay, o
grupo percorreu hospitais e unidades fabris de referência.
No roteiro oficial de visita, hospitais
como o Shebar Medical Center, criado
em 1948, ano da fundação do Estado de
Israel, para tratar das vítimas da guerra
pela independência. Atualmente, a instituição é o maior centro de saúde do
país dedicado a casos agudos, mulheres
e crianças, atendendo pacientes de todo
o Oriente Médio e mantendo ainda um
centro acadêmico. Também foram visitadas instituições de vanguarda em
termos científicos, como o Hadassah
Medical Center, os institutos Technion
e Weizmann, a Universidade Hebraica
de Jerusalém, a 52ª melhor do mundo,
e a seguradora Macabi, a maior empresa israelense do setor, para contemplar
os executivos da Bradesco Seguros e da
Amil, empresas que integram a Câmara
Brasil-Israel de Comércio e Indústria.
Uma parte do roteiro que deve ter
interessado particularmente ao ministro
Alexandre Padilha foi a visita à Teva,
líder mundial na produção de genéri74
Diagnóstico | mar/abr 2013
cos. Como já foi dito, especula-se que
a empresa estaria negociando a abertura de uma unidade fabril em território
brasileiro. Mentor da missão médica, o
presidente da Câmara Brasil-Israel, Jayme Blay, salientou que os governos dos
dois países se integraram à viagem, que,
além de fomentar a troca de expertise na
área da saúde, serviu “para fortalecer as
relações e o intercâmbio entre os dois
países”.
O que vai sair de concreto dessa visita ainda é uma incógnita, como destaca
Blay. “É como um namoro, em que você
apresenta as pessoas. Mas o que eles vão
fazer a portas fechadas, ninguém sabe”,
brinca. O fato é que essa aproximação
é muito desejada pelos dois lados. Em
apenas 65 anos de existência como Estado nacional, Israel é uma das maiores
referências mundiais em pesquisa e desenvolvimento. Isso é fruto do esforço
para enfrentar o permanente estado bélico com a vizinhança e dos milhões de
dólares que jorram em seus cofres anualmente, desde a sua fundação, por meio
da diáspora judia no mundo e dos Estados Unidos, seu grande fiador no planeta.
INOVAÇÃO – Graças à mão de obra
qualificada, o país recebeu nos últimos
dois anos novos centros de pesquisa de
duas gigantes no setor de healthcare. A
GE, que já tinha sete centros de pesquisa
em território israelense, investiu cerca de
US$ 4 milhões em uma oitava unidade,
Ministro da Saúde,
Alexandre Padilha, em visita
AO Hadassah Medical Center,
em Jerusalém: interesse bilateral
pode ampliar cooperação médicocientífica entre brasileiros e
israelenses
especializada em dispositivos médicos,
além de água e energia limpa. Mais do
que satisfeita com os resultados obtidos
em Israel, a Philips anunciou, no final de
2012, a ampliação do seu centro de pesquisas em Haifa, onde 600 trabalhadores,
incluindo cientistas e técnicos, desenvolvem scanners CT em 3D que depois são
vendidos para o mundo inteiro.
Mas nesse momento o foco principal
do IEICI no setor de saúde parece estar
nos pequenos inovadores. De Israel saíram soluções médicas que impressionaram o mundo, como a cápsula com uma
câmera que, ingerida pelo paciente, permite ao médico fazer um preciso diagnóstico do aparelho digestivo. Agora,
antes que sejam engolidas pelas multinacionais do setor, pequenas empresas israelenses de inovação tecnológica querem
se apresentar ao Brasil. E os executivos
brasileiros seguem comprando passagens
para o Oriente Médio.
Em junho, alguns deles estarão presentes à MedinIsrael, principal feira de
inovação médica daquele país. Sinal de
que a cooperação entre os dois países
está só começando.
ARTIGO
Paulo Lopes
Roberto Abreu
Produtividade, qualidade de vida e menos estresse
N
este artigo, pretendemos proporcionar aos
profissionais que exercem funções executivas uma reflexão e tomada de consciência
de problemas de gerenciamento do tempo
para poder aumentar sua produtividade
com qualidade de vida e menos estresse.
Nos seminários de gestão do tempo
que realizamos para empresários, executivos e gerentes, temos
observado que os grandes problemas identificados pelos executivos são:
Setor de trabalho com um foco muito competitivo.
Responsabilidades acima da competência intelectual, psicológica, física ou de tempo.
Ambiente de trabalho tenso e/ou de medo.
Falta de planejamento e organização do trabalho.
Fixação de prioridades.
Incapacidade de dizer “não”.
A procrastinação, ou seja, o hábito de adiar as decisões necessárias.
lham ao seu lado e aumento de qualidade de vida com menos
estresse.
Logo, meus caros executivos do século XXI, está na hora
de mudar seus paradigmas e começar a viver de verdade. Escolham diariamente as tarefas importantes, que não são muitas (acreditamos em 10%), e para elas dediquem 70% do seu
tempo. Esta prática os conduzirá a uma maior produtividade,
melhor qualidade de vida e ao sonho de viver com menos stress.
Para isso, torna-se vital adotar as seguintes práticas:
Procure primeiro programar o tempo e depois o trabalho
com suas prioridades.
Registre diariamente onde e em que trabalhou e suas respectivas horas de dedicação.
Aprenda a dizer “não”.
Use agenda semanal e não diária.
Evite o hábito de procrastinar, ou seja, adiar as tarefas.
Estabeleça as horas em 50 minutos e não em 60 minutos,
para que haja um espaço para descanso mental.
Treine sua secretária e/ou assistente, pois eles podem realizar mais de 30% dos seus
problemas do dia-a-dia.
Delegue somente aquilo
que pode cobrar; lembre-se
crises e “apagando incêndios”, sufocados com os
de não abdicar de suas responsabilidades.
problemas do dia-a-dia. Tudo o que fazem é imediato
Organize suas ligações
telefônicas emitidas e/ou re(para ontem), o que os deixa estressados por falta de cebidas.
Podemos afirmar que,
tempo
para obter equilíbrio e resultados, torna-se necessária
disciplina. Somente com novos hábitos de gerenciamento do
Aliado a esses pontos críticos de gestão do tempo, podemos tempo, ou seja, com o uso do planejamento é que terá uma vida
identificar também que a grande maioria não tem ideia de como mais produtiva, menos estressante, com qualidade.
e em que utiliza as horas disponíveis que Deus lhe deu.
Assuma a autoridade sobre sua vida procurando:
Há uma forte cultura enraizada de que o bom é focar nos asTer atitudes em que você se sinta bem consigo mesmo.
suntos “urgentes” e para eles dedicar grande parte do seu tempo.
“Ser” em vez de “Ter” – não tenha medo de perder, mas
Em pesquisas realizadas em nossos seminários, identificamos busque um equilíbrio financeiro.
que há um percentual de 45,2% do tempo alocado para esses
Conheça seus clientes.
assuntos urgentes.
Desvencilhe-se do estilo competitivo de vida.
O reflexo deste comportamento é que os executivos estão
Tenha outras áreas de interesse em sua vida.
sempre resolvendo crises e “apagando incêndios”, sufocados
Tenha uma vida simples.
com os problemas do dia-a-dia. Tudo o que fazem é imediato
Tenha sempre bom humor em coisas que lhe irritam.
(para ontem), o que os deixa estressados por falta de tempo.
Com esses novos hábitos, com certeza irá superar o estresse
Poucos deles realmente usam o seu tempo em assuntos im- e com certeza terá uma vida “melhor”.
portantes. Acreditamos que um executivo deveria dedicar 70%
do seu tempo para tais assuntos, o que lhe proporcionaria resultados mais efetivos, maior produtividade, ações que, realizadas, Paulo Lopes é CEO do Grupo Organiza, headhunter, coach, palestrante e autor
fariam a diferença no seu trabalho e para as pessoas que traba- do livro Segredos de um Headhunter.
Os executivos estão sempre resolvendo
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informe publicitário
Icon
participa
de projeto
pioneiro no
combate
ao câncer
Símbolo no tratamento oncológico em
Vitória da Conquista, instituto participa
de acordo entre Brasil e Cuba para
desenvolver projetos voltados para o
diagnóstico precoce
eferência no tratamento e combate ao
câncer no município de Vitória da Conquista, no sudoeste baiano, o Instituto
Conquistense de Oncologia (Icon) participa do projeto-piloto Cooperação Brasil-Cuba, com o objetivo de prevenir o
câncer no âmbito da atenção básica. “O
projeto é fundamental porque permite
o diagnóstico precoce do câncer e, consequentemente, a cura”, declarou o oncologista e diretor técnico
do Icon, Leonardo Cunha Costa. A iniciativa faz parte de um acordo de cooperação científica assinado entre Brasil e Cuba, em
2004, com o intuito de aprimorar os serviços de saúde.
A parceria possibilitará o desenvolvimento de medicamentos, vacinas e o amplo acesso de pacientes de ambos os países a esses
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medicamentos a um menor custo, além de incorporar institutos
de Cuba à Rede Nacional de Pesquisa Clínica no Brasil. Para o município, a iniciativa é considerada pioneira. De acordo com Leonardo Cunha, Vitória da Conquista é a primeira cidade do Brasil
a implantar esse tipo de programa, voltado para a atenção básica
na oncologia.
Vitória da Conquista foi selecionada para representar o país e coordenar o projeto devido a uma série de fatores, como o fato de
possuir uma rede de serviços adequada às proporções do projeto
e um histórico de êxitos em relação à implantação de projetos na
atenção básica e da família e de serviços oncológicos. “A cidade
já tem um serviço de atenção primária bem desenvolvido e, por
isso, foi dada a oportunidade ao município de se aprimorar e desenvolver este projeto”, completou o oncologista. Segundo ele, o
Icon está atuando junto à prefeitura municipal, realizando treinamentos das equipes de enfermeiros, agentes de saúde e médicos,
além de oferecer toda a retaguarda no tratamento dos casos já
diagnosticados.
Segundo o oncologista, o projeto encontra-se em fase inicial. “Estamos realizando um estudo dos casos para entender quais os tipos de câncer com maior incidência e mapeando as regiões”, completou. Outro objetivo da iniciativa é trazer novas perspectivas
para o controle do câncer, envolvendo também a colaboração no
campo da produção industrial de produtos biotecnológicos para
o tratamento.
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da empresa, um francês, me passa a direção para o momento mais
esperado do evento, justamente a premiação deste programa. No
ARTIGO
estilo Oscar, chamo o vencedor da melhor ideia de reformulação
Alexandre Diogo
de processos com o foco do cliente, que, acredite, era um jovem
Mauricio Santana
analista do financeiro. Ele sobe ao palco sorridente e anuncio o
prêmio surpresa: uma viagem com direito a acompanhante, de
seis dias, e tudo do bom e do melhor incluído, para Paris!
A cara do sujeito foi de um desânimo inacreditável. Não pude
resistir àquela cara “xoxa” e, quebrando o protocolo, perguntei se
não havia gostado. A resposta foi à queima-roupa: “É frio lá... vou
ter que comprar casaco... mas tudo bem, eu vou”. Mais inacreditável ainda que a cara de desânimo, esta resposta me fez, meio
sem pensar, engatar outra pergunta: “E se pudesse trocar, para
onde preferia ir?” O rosto do rapaz se relumeou automaticamenm minhas palestras, coloco sempre uma frase te, e um sonoro “Porto Seguro” saiu. Ainda meio perplexo com
para pensar que, na verdade, é uma constata- a situação de ver Paris sendo trocada por Porto Seguro (imagine
ção minha, resultado destes mais de 10 anos o presidente francês da empresa ao meu lado!), entendi que tanto
como presidente do IBRC: “O sucesso é a arte falamos de foco do cliente e naquele momento estávamos dando
de praticar o óbvio”. Parece só mais uma frase uma tremenda demonstração de que não fazemos o que falamos.
de efeito, mas é a pura, simples e óbvia verda- Afinal, é preciso ter o foco do cliente interno também. Ou melhor,
é preciso começar por ele!
de. Cada dia mais me convenço disso.
Fato contado, vamos aos conceitos:
Ter o foco do cliente numa organização empresarial é um dos
Esta empresa foi proativa com a premiação, não há dúvida,
clássicos exemplos de que se conhece o óbvio, mas ele não é praticado. Não conheço nenhum executivo, nenhum empreendedor, e saiu da inércia. Hoje, muitas empresas persistem atoladas na
nenhuma empresa que diga em sã consciência que ter o foco do inércia. Não tomam iniciativa para nada e esperam sempre a concliente não é importante. Teste você mesmo, vá até o seu CEO e dição mais favorável aparecer. Favorabilidade precisa ser gerada.
pergunte a ele o valor de ter o foco do cliente. Repita a pergun- Quem a espera, pode sentar que vai custar. Esta empresa teve
ta com diretores, gerentes, analistas, assistentes e com a moça foco no cliente com certeza. Ter foco no cliente é agir em prol
do café. Você ficará maravilhado com as declarações que ouvirá. dele e não pensando apenas em si mesma, seus custos, processos,
Mas possivelmente terá a impressão de que trabalha em outra em- umbilicalmente. Nenhuma empresa oferece uma viagem deste
porte (e custo) pensando na empresa. Isto é, sim, foco no clienpresa. Há sempre muito discurso, mas pouca prática.
te. Já ouvi CEO’s e
heads de empresas de
todos os tipos e portes brigando contra
resultados de pesquie não pensando apenas em si mesma, seus custos,
sas de satisfação de
clientes, pois confliprocessos, umbilicalmente
tavam com o que a
empresa achava que é
Para começar, as pessoas confundem foco do cliente com o melhor. Paciência! Mas o jovem analista financeiro se encantou
foco no cliente. E quero introduzir outras duas “palavrinhas má- com tanto foco no cliente e proatividade? Não me pareceu cara de
gicas” muito usadas em discursos corporativos como uma espé- encantamento a que vi. Encantar significa superar expectativas,
cie de “business bingo” no qual as pessoas, para falarem o “cor- surpreender positivamente, e isso não se deu. Fica claro que, para
porativez”, salpicam termos de impacto para uma frase bonita, encantar, não basta proatividade e foco no cliente. Sem o foco
mas nem sempre com muito sentido. São elas: “encantamento” e do cliente, não há encantamento. E o que é foco do cliente? Você
“proatividade”. Juntemos estas duas às nossas anteriores – “foco deve estar perguntando. Afinal, é o título do artigo. Vamos lá: ter
o foco do cliente e olhar por meio dos seus olhos é ver como ele
no cliente” e “foco do cliente” – para analisar neste texto.
Conto sempre uma história real para melhor exemplificar e ir veria. Precisamos abandonar a máxima que aprendemos desde
pequenos de “faça ao próximo o que deseja que façam a você”.
além de dar apenas estes conceitos
Em uma grande multinacional francesa, instalada no Brasil, Coisa nenhuma. Se você deseja encantar, faça ao seu cliente o
fizemos, há alguns anos, um projeto de transformação cultural que ele quer que façam com ele. Isso é ter foco do cliente. Óbvio,
para orientar a empresa ao foco do cliente. Um projeto bacana, não? Mas e aí? Como fazer isso? Que limites há? E quais são as
com mais de dois anos de duração e ações desde revisão da re- ferramentas organizacionais para isso? Muitas perguntas nascemuneração variável dos executivos, com foco em pesquisa de sa- ram. Ótimo! Mas isto será papo para o próximo artigo.
tisfação, até endomarketing forte, passando por um programa de
levantamento e premiação das melhores ideias para mudar processos das áreas (cada área só podia palpitar em seus processos) Alexandre Diogo é presidente do Instituto Ibero-Brasileiro de Relacionamento
com o Cliente (IBRC). Formado em Medicina e Administração de Empresas pela
com o foco do cliente.
UFRJ, é especialista em Saúde Ocupacional e tem MBA em Gestão de Marketing
Evento final do projeto, auditório nobre lotado, o presidente pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Foco do cliente.
Parece óbvio... e é.
Mas ainda assim as
empresas não têm!
E
Ter foco no cliente é agir em prol dele
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informe publicitário
Hospital Agenor Paiva investe em
atendimento ortopédico
Referência no atendimento médico-hospitalar na Cidade Baixa (Salvador), unidade ampliou
capacidade de atendimento e equipe de ortopedistas do Instituto de Ortopedia do Bonfim (Inorb)
Fotos: Roberto Abreu
Equipe de ortopedia do Inorb é responsável por um volume
médio mensal de 120 cirurgias, entre SUS e planos de saúde
E
stabelecer e tornar referência o Instituto de Ortopedia do Bonfim (Inorb) é o grande desafio do
Hospital Agenor Paiva, que ampliou em 50% a
capacidade de atendimento do seu centro ortopédico. Referência em atendimento hospitalar à população da região da Cidade Baixa e subúrbios de Salvador, o
hospital também investiu em infraestrutura e ampliou a equipe,
que atualmente conta 16 ortopedistas capacitados para atender desde traumas a hérnias de disco. Assim, a estrutura de
pronto atendimento ortopédico da unidade, comandada pelo
Inorb, está associada à imagem de solidez e eficiência e à excelência no atendimento médico-hospitalar que já perdura por
46 anos.
Desde sua fundação, a instituição vem demonstrando caráter
e firmeza, confirmando sua posição frente ao que representa.
Associado a uma imagem sólida e eficaz, cujo âmbito de ação
é desenvolver cada vez mais a sua estrutura, o Inorb busca
garantir a satisfação de seus clientes e alcançar a excelência
no atendimento médico hospitalar.
“Nosso serviço de ortopedia e traumatologia está em constante
processo de qualificação para atender com eficiência toda a
demanda de usuários da região da Cidade Baixa. Atualmente,
esses pacientes precisam se deslocar para outros serviços por
desconhecimento de que no Bonfim existe um serviço de ponta
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Diagnóstico | mar/abr 2013
Serviço de ortopedia do hospital conta com atendimento
qualificado e equipamentos de ponta
e com profissionais qualificados para atendê-los com excelência”, explicou o Dr. Francisco Bragança, coordenador do serviço de ortopedia do hospital e idealizador da expansão do Inorb.
O investimento do Hospital Agenor Paiva na ampliação do serviço de ortopedia também tem a intenção de atrair um perfil de paciente mais exigente. Segundo o coordenador, atualmente a equipe de ortopedia da instituição é responsável
por um volume médio mensal de 120 cirurgias, entre SUS e
planos de saúde. Para tanto, a unidade ampliou suas instalações físicas, modernizou sua hotelaria e investiu na aquisição de equipamentos de ponta e na qualificação do corpo
clínico. Outros serviços foram a reestruturação dos setores
de bioimagem, cardiologia, coloproctologia e oncologia. “Todo
o corpo clínico do Inorb trabalha com equipamentos e uma
capacidade cirúrgica de última geração”, acrescentou o Dr.
Bragança.
O projeto de expansão do serviço de ortopedia, segundo o
coordenador, conta ainda com a reestruturação do serviço de
fisioterapia do hospital, que pretende atender cerca de 150
pacientes por dia, aumentando em mais de 100% a sua capacidade atual. “Dessa forma, o paciente de ortopedia poderá
fazer o seu tratamento completo no Inorb. E isso representa
mais comodidade e eficácia, pois grandes deslocamentos nem
sempre são indicados em casos mais complexos”, explicou.
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RESENHA
TRIBUTAÇÃO
SAÚDE X IMPOSTOS
Recém-lançado no mercado editorial brasileiro, livro ensina o exercício da
administração tributária para profissionais de saúde que se iniciam nos negócios
Eduardo César
“
N
ada é garantido, exceto a morte
e os impostos”. A frase do estadista norte-americano Benjamin
Franklin, mesmo tendo sido proferida em outro contexto, soa oportuna quando o assunto é a falta de
entrosamento entre o setor da saúde e as questões fiscais. E a isto se propõe o livro Tributação
da Atividade de Saúde – o que os gestores e profissionais da
saúde precisam saber sobre o recolhimento de tributos: orientar os profissionais do setor médico-hospitalar que pretendem
adentrar no mundo dos negócios em relação aos impostos que
incidem sobre o setor – tarefa muitas vezes considerada ingrata para qualquer um que atue fora da esfera tributária.
A publicação parte desse pressuposto, de que é comum
gestores da saúde não estarem íntimos dos assuntos fiscais,
embora sofram com os efeitos da pesada carga tributária que
vigora no país. Assim, o jurista Alexandre Marques Andrade
Lemos inicia a jornada esclarecendo sobre a importância do
aspecto econômico do setor da saúde para, em seguida, desmistificar os caminhos que levam ao exercício da administração tributária.
E como um manual, orienta o profissional que pretende
abrir o próprio negócio na área de saúde e explica os passos
a serem seguidos. Para os gestores que já atuam na área, o
jurista também explica como identificar possibilidades legais
de redução de custos tributários e como proceder nesses casos
a partir de análises que permitem avaliar medidas que podem
ser adotadas visando à otimização dos custos.
O livro também avança em relação a como se deve proceder quando um profissional da área de saúde decide constituir
pessoa jurídica ou abrir um empreendimento. E, neste último
caso, como o crescimento desse negócio poderá, segundo o
autor, impor a necessidade de ampliação das receitas de cada
negócio com vistas a torná-los sustentáveis.
Bacharel em Direito, com pós-graduação em Direito Processual Civil, e advogado atuante na esfera tributária e empresarial, além de outras atividades que exerce nas áreas de
consultoria e ensino, Alexandre Marques acha imprescindível
tornar os gestores da área de saúde alertas em relação ao tema.
“A realidade revela que o emaranhado de normas legais, mal
sistematizadas e desprovidas de harmonia conceitual, serve
como maquiagem para a absurda taxação das atividades econômicas no Brasil, especialmente no segmento de serviços,
incluindo as atividades de saúde”, alerta.
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Shutterstock
“O objetivo da obra é apresentar
as principais incidências tributárias
que recaem sobre a atividade de
saúde no Brasil”
Alexandre Marques Andrade Lemos
A ressalva ganha força ainda no prefácio, com introdução
do médico e gestor Roque Andrade, que acumulou experiência como sócio-fundador da Sociedade de Oncologia Clínica
(Onco), além de ter exercido os cargos de presidente da Fundação de Ensino e Pesquisa em Medicina (Fabamed), vice-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB) e presidente da Associação Bahiana de Medicina (ABM). Andrade
reforça que o livro serve àqueles que não têm intimidade com
o assunto, “em face não somente da aridez do tema, mas,
principalmente, pelo vasto oceano que separa a realidade do
dia-a-dia dos médicos do entendimento das leis que regem a
atividade”.
Setor privado – Marques também revela quais são os
regimes tributários considerados mais adequados e as principais incidências que recaem sobre a atividade de saúde no
Brasil para levantar questões determinantes em relação ao
tema. Mas não sem antes deixar claro que o enfoque da obra é
direcionado ao serviço de saúde privado e que “não pretende
incluir a política pública de saúde, tampouco ponderar sobre
aspectos sociológicos ou filosóficos relacionados ao exercício
das atividades”.
E, apesar da importância que tem para a sociedade, segundo o autor, o setor da saúde não goza de nenhum tratamento
diferenciado favorável. “Em muitas situações, a tributação da
atividade de saúde, que deveria ser reduzida por conta da sua
função social, excede a meta do que é cobrado de outros setores da economia”, diz o autor, que ainda reflete sobre o fato de
ser uma carga tributária que supera a de setores como educação, segurança e sistema financeiro.
Outra questão amplamente abordada são os cenários de tributação. Através de exemplos práticos e sob o ponto de vista
do custo tributário, o autor apresenta as principais possibilidades de contratação dos serviços de saúde. Marques aponta
os cinco modos de contratação mais comumente utilizados no
mercado de saúde – empregado, autônomo, cooperativas de
trabalho, sócio e pessoa jurídica – e trata das implicações de
cada modalidade, neste caso, “pensando especialmente nas
empresas de saúde de maior porte, cuja estrutura demanda a
contratação de outros profissionais”.
Tributação da Atividade de Saúde | Alexandre Marques
Andrade Lemos | Open Treinamentos e Editora, 210 páginas,
2012 (R$ 39,00)
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Estante&resenhas
Divulgação
Divulgação
Leia também
O livro é o relato detalhado dos
bastidores da trajetória de três empresários que criaram o maior império da
história do capitalismo brasileiro e ganharam uma projeção sem precedentes
no cenário mundial.
André Luiz Villas Bôas e Silva,
diretor de negócios da Doctors
Way
É uma obra que veio para inovar e
simplificar a elaboração de planos de negócios. Os autores se orgulham de terem
tido a colaboração de 470 praticantes,
em 45 países. O livro atende muito bem
às pessoas que estão, pela primeira vez,
pensando em algum projeto de negócio
através de nove tópicos: atividades-chave, relacionamento com clientes, parcerias principais, segmentos de clientes,
recursos principais, proposta de valor,
canais, estrutura de custos e fontes de
receita.
Uma obra que
veio para inovar
e simplificar a
elaboração de planos
de negócios
“Business Model Generation – Inovação em
modelos de negócios”
Autores: Alexander Osterwalder e Yves Pigneur
Editora: Alta Books
Número de páginas: 300
Preço sugerido: R$ 94,90
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Fábio Henrique Cavalcanti,
diretor administrativo da
Faculdade São Camilo (BA)
É um livro para aqueles que se instigam com o tema inovação e tecnologia
em saúde e aceitam a pesquisa em rede
como essência. É um trabalho que provoca, dos mais acadêmicos leitores aos
mais práticos dos empreendedores, a se
questionarem sobre: sem as pessoas certas para conduzir o processo de inovação, as chances de sucesso se reduzem
significativamente. Assim, indico este
livro, sempre que puder, aos inquietos
pela inovação e aos interessados em desenvolver habilidades pessoais em rede.
Um livro destinado
aos interessados
em desenvolver
habilidades pessoais
em rede
“A Revolução da Inovação Aberta. A chave da
nova competitividade nos negócios”
Autor: Stefan Lindegaard
Editora: Évora
Número de páginas: 256
Preço sugerido: R$ 51,35
“Sonho Grande - Como Jorge Paulo Lermann, Marcelo Telles e Beto Sicupira revolucionaram o capitalismo brasileiro e conquistaram o mundo”
Autora: Cristiane Correa
Editora: Primeira Pessoa
Número de páginas: 264
Preço sugerido: R$ 31,90
A Bíblia é o melhor manual sobre
o sucesso já escrito até hoje. Além de
religião, também trata de valores fundamentais para se construir uma base
sólida para a vida profissional.
“As 25 Leis Bíblicas Do Sucesso: Como Usar A Sabedoria Da Bíblia Para Transformar Sua Carreira E Seus
Negócios”
Autores: William Douglas e Rubens Teixeira
Editora: Sextante
Número de páginas: 192
Preço sugerido: R$ 23,29
O repórter do The New York Times Charles Duhigg elabora um argumento animador: entender como
os hábitos funcionam e transformá-los pode gerar bilhões e significar a
diferença entre fracasso e sucesso.
“O Poder do Hábito - Por Que Fazemos o Que Fazemos
na Vida e Nos Negócios”
Autor: Charles Duhigg
Editora: Objetiva
Número de páginas: 408
Preço sugerido: R$ 25,30
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Edição 20 Fraude no sistema de saúde