PESQUISA
NO
ENSINO
DE
QUÍMICA
Ricardo Gauche e Elizabeth Tunes
▲
professor, atuação, ética
▲
Neste trabalho, é esboçada e discutida a relação entre ética e autonomia, conforme a reflexão feita por um
professor de Química do Ensino Médio, ao narrar sua trajetória profissional.
Recebido em 12/9/01, aceito em 20/2/02
H
alunos que tinham diante de si, no cetos modos de agir que rejeitamos e tenário em que deviam atuar” (p. 307),
mos a convicção de que jamais agiríaera no espaço da relação com seus
mos daquela maneira. Quando nos dealunos que as diferenparamos com formas
ças e contrastes entre
de agir muito diverÀs vezes, apreciamos uma
elas emergiam; estes
gentes das nossas,
determinada forma de
eram tantos e de tal
costumamos nos infazer de um colega e a
magnitude, que não se
quietar com a difeincorporamos, à nossa
poderia supor tantas
rença.
moda, ao nosso fazer;
semelhanças em suas
Tacca (2001) exaoutras vezes, apesar de
histórias e nas condiminou a atuação de
apreciarmos um certo
ções em que atuavam.
duas professoras de
modo de agir, não o
É tentador supor
segunda série do Enincorporamos, pois, dadas
que os contrastes ensino Fundamental
as nossas próprias
tre as duas professoque diferiam bastante
características, sabemos
ras decorrem do fato
entre si. Fez observaque não conseguiríamos os
de apenas uma delas
ções em suas salas
mesmos resultados que o
ser vocacionada para
de aula, entrevistoucolega
o magistério. Se entenas e observou-as
dermos vocação como algo inerente
também conduzindo atividades junto
ao sujeito, uma qualidade que ele já
a um grupo restrito de alunos. Os resultados mostraram que, apesar de haver
tem ao nascer, o conceito pode ser
uma possibilidade de explicar as dife“entre as duas professoras similarirenças constatadas. Mas, nesse sentidades importantes no que dizia respeido, ele seria quase um sinônimo de
to ao espaço institucional que ocupafadário, de destino, faltando-lhe bases
vam, às orientações sobre o que lhes
teóricas para que fosse admitido como
cabia realizar em aula, às condições
hipótese explicativa. Se, todavia, o conde trabalho, às experiências anteriores
ceito de vocação for compreendido coque tinham como professoras e aos
mo um processo que se constitui no
curso da vida da pessoa, teríamos, enA seção “Pesquisa no Ensino de Química” inclui investigações sobre problemas no ensino de química, com explicitação
tão, uma espécie de compromisso.
dos fundamentos teóricos e procedimentos metodológicos adotados na análise de resultados.
á muitas maneiras de ser professor. Quem é professor sabe
disso e reconhece a importância que o contato com a diversidade
de atuação tem para o aperfeiçoamento profissional. A troca de idéias e
experiências com colegas permite-nos
aprender novas formas de planejar e
conduzir o ensino de nossa disciplina.
Podemos também conhecer atividades
mais interessantes e motivadoras para
a aprendizagem dos alunos.
Mas a nossa relação com a diversidade não é a de mera cópia. Temos
critérios de seleção e de ajustamento
às nossas próprias características. Às
vezes, apreciamos uma determinada
forma de fazer de um colega e a incorporamos, à nossa moda, ao nosso
fazer; outras vezes, apesar de apreciarmos um certo modo de agir, não o
incorporamos, pois, dadas as nossas
próprias características, sabemos que
não conseguiríamos os mesmos resultados que o colega. Podemos, também, não apreciar um determinado jeito de atuar, mesmo reconhecendo que
produz bons resultados e, por isso, não
o tornamos nosso. Finalmente, há cer-
QUÍMICA NOVA NA ESCOLA
Ética e autonomia
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que a conquista da autonomia, com
ção”, o que “no dia-a-dia normal da EsMas, nesse caso, “vocação” perde a
inovação, é “um caminho bastante docola, é muito difícil”. Novamente, o propossibilidade de ser um conceito exloroso” e frisa que a inovação resulta
fessor João Batista situa na construção
plicativo e passa a ser algo que requer
explicação. Logo, a pergunta seria:
de um abandono da “ação antiga” em
de um projeto coletivo, que necessacomo uma vocação (ou um comprofunção de uma “ação nova”. Ele defenriamente deve contar com a participação
misso) constitui-se no decorrer da vida
de que a ação antecede e gera a inodo aluno, a base do desenvolvimento e
de uma pessoa?
vação; que a ação efetivamente autôda consolidação do espaço de exercício
de autonomia. “Os professores, na
Buscando responder a essa quesnoma deve estar calcada na argumenmaioria das vezes, estão fechados” à
tão, Gauche (2001)
tação. “Argumentação,
Conforme o professor João
inserção naquela construção, cercerealizou uma pesquimas na ação”, diz ele,
Batista, para ter sucesso no
ando as possibilidades de “produção do
sa (um estudo de capara também afirmar
processo de ensinoprojeto” por parte dos alunos e mesmo
so) para investigar o
que “se eu não estou
aprendizagem, é preciso
dos colegas que lutam pelo exercício da
processo de constirefletindo, pensando,
que o professor promova
autonomia essencial ao processo edutuição da autonomia
eu vou reproduzir, é
um ambiente favorável, em
cativo genuíno.
de um professor, a
mais prático”. A alienaque as pessoas se sintam
O processo educativo dá-se, na conpartir da análise da
ção, entende, associa“respeitadas nas suas
cepção de João Batista, “na vivência
narrativa autobiográse diretamente à reproindividualidades, opinando,
social”, sendo a sala de aula um mofica de sua trajetória
dução e é diametralcolocando suas opiniões
mento menor, se comparado com a amprofissional. Empremente oposta ao exernas construções dos
plitude que envolve a educação. O encício da autonomia.
gando uma metodoprojetos. É muito
sino e a aprendizagem processam-se
Para ele, existe a
logia para análise do
importante que se crie esse
na confrontação entre o conhecimento
relato verbal (Tunes e
“pseudoautonomia”,
ambiente de respeito
prévio do aluno e aquele mais elaboSimão, 1999), aliada
resultante da incapacimútuo”, evitando o
rado, trazido pelo professor. No projeto
ao uso da narrativa
dade de “gerar conscerceamento do aluno
do professor, às vezes, não ocorre “a
de vida (Bruner, 1997
ciência da profundimodificação da ação”, mas só se pode
e 2001), seu estudo
dade e da importância
falar do processo na forma composta:
de caso permitiu esboçar a relação
do momento ali em que se está inseensino-aprendizagem. Isso não se resentre ética e autonomia, conforme a
rido”.
tringiria, para ele, ao ambiente escolar.
reflexão feita pelo professor que
O professor e o aluno
Conforme o seu ponto de vista, para
participou de seu trabalho, a quem
ter sucesso nesse processo, é preciso
chamaremos de João Batista.
João Batista atribui ao aluno o papel
que o professor promova um ambiente
de “ver a realidade, entender a realidaConcepção de autonomia
favorável, em que as pessoas se sintam
de em que ele está; fazer a interação,
“respeitadas nas suas individualidades,
No dizer do professor João Batista,
processar essa realidade, para que,
opinando, colocando suas opiniões nas
autonomia “é aquela capacidade e vonentão, possa agir, modificar, melhorar,
construções dos projetos. É muito
tade de você ter um projeto, uma idéia,
preservar, dependendo dessa interação
importante que se crie esse ambiente de
e desenvolver essa idéia. Você tem a
que ele tiver com o conhecimento e
respeito mútuo”, evitando o cercealiberdade de desenvolver aquele pencom o mundo”. Todavia, entende que
mento do aluno. Para isso, o professor
samento, aquela idéia, que se propôs”.
“na maioria das vezes, não é permitido
precisa dar-lhe voz. Assim, ele pode “ver
Hoje, ele considera-se autônomo no
a ele fazer isso”, porque “quando ele
que o que ele fala tamambiente sala de aula, mas, no “âmbito
vai desenvolvendo a
bém é importante para
escolar como um todo, nem tanto, porsua própria autonoNo dizer de João Batista,
o professor e para a
que está caminhando... a passos lenmia, a escola, entre
autonomia “é aquela
classe”. A situação prótos”. Esse caminhar envolve luta e conaspas, o sistema acacapacidade e vontade de
xima do ideal é, sequista de liberdade.
ba impedindo que ele
você ter um projeto, uma
gundo ele, aquela em
Para ele, a autonomia tem um caráexerça essa autonoidéia, e desenvolver essa
que o professor poster volitivo (individual, subjetivo) e um
mia”, ficando “mais na
idéia. Você tem a liberdade
sibilita ao aluno ter
caráter coletivo: é uma construção que
fase da repetição”,
de desenvolver aquele
“uma força que o motiva
não se faz sem a deliberação pessoal
antes de atingir a “fapensamento, aquela idéia,
o suficiente para exterdo professor e sem interação com cose da ação”. Atribui isque se propôs”
nar suas idéias”, início
legas e alunos. Implica a reflexão em
so ao sistema de endo exercício da autonomia. Externando
sino, que “favorece mais uma repetitorno da prática docente; a consciensuas idéias, ele começa a lutar por elas
ção de conhecimentos, uma reprotização, que envolve amadurecimento,
e, se “são coerentes com o conteúdo,
dução de idéias do que uma construdesenvolvimento individual e coletivo;
com aquele saber elaborado, ele já coresistência e persistência. João Batista
ção, do que uma discussão, uma avameça a pensar em projetos, em ações”.
vê os alunos como os constituintes
liação e uma ação reflexiva”. E, “para
Isto acontecendo, o professor “fica emprincipais do foco de ação do profesromper isso, o aluno teria que contar
polgado; é muito bonito”.
sor autônomo. O professor ressalta
com o apoio de professores, da DireQUÍMICA NOVA NA ESCOLA
Ética e autonomia
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Ação e reflexão, essenciais na
construção da autonomia do professor,
também o são na do aluno. Por isso,
João Batista não se satisfaz com a acomodação do aluno à primeira informação, condena e reprova o atraso, a
irresponsabilidade, a preguiça, o não
desejar “ir para frente no serviço”. O caráter volitivo, individual, subjetivo é, assim, sempre ressaltado como fundamental.
O professor e seus colegas
tário, é a de sermos convidados a cumprir um script marcado pela neutralidade, pelo descompromisso de envolvimento com aqueles que partilham o
palco, afinal desconhecedores do texto
básico e detentores da responsabilidade quase unilateral de assimilar as
informações selecionadas sob a ótica
dos que têm o poder de selecioná-las.
Nesse cenário, a insegurança pode
emergir e, sendo assim, a rigidez e a
punição tornam-se instrumentos de defesa, como modo principal de ação docente, segundo a visão de João Batista. A segurança emerge do amadurecimento resultante de instrumentação
técnica, de reflexão e de conscientização, presentes na elaboração de um
projeto pedagógico, interdisciplinar e
contextualizado, quando efetivamente
coletivo e com o fim precípuo de
propiciar o domínio de conhecimento,
o crescimento pessoal e coletivo. Para
que tal fim seja atingido, o modo da
ação caracteriza-se pela atividade,
pelo incentivo ao aluno, com compromisso e envolvimento do professor.
João Batista não concebe autonomia sem interação, sem construção de
projetos coletivos. Estes resultam do
encontro de professores, de uma autonomia coletiva que vai se desenvolvendo na consolidação genuína de uma
equipe. O individualismo e a alienação
levam a “transtornos”, quando o projeto
vem da instância superior, sem a participação do corpo docente e discente
da escola, com resultados “terríveis”
para os alunos, foco primordial do
educador, do professor autônomo.
A construção do projeto, no seu entender primordialmente coletivo, envolO professor e as instâncias superiores
ve “reflexão”, o que implica não aceitar
o conhecimento como inquestionável
O contexto propiciado pela instâne definitivo e resulta em consciência de
cia superior imediata é visto por João
limites e de perspectivas. Os relatos de
Batista como essencial para o desenJoão Batista são fruto de suas tentaticadeamento do exercício autônomo de
vas de tornar consciente a interpreconstrução de projetos, visto ser a
tação dos mecanismos existentes na
autonomia condicionada, no âmbito
dinâmica própria da cultura escolar, na
escolar, à influência daquela instância,
consolidação do esembora, em sala de
A segurança emerge do
paço autônomo para a
aula, até defenda ser
amadurecimento resultante
prática educativa. Ele
possível ter autonode instrumentação técnica,
demonstra estar semmia, a despeito dessa
de reflexão e de
pre em busca de forinfluência. A instância
conscientização, presentes
mas de desvelar as resuperior, então, pode
na elaboração de um
lações de subordinacolaborar, não atrapaprojeto pedagógico,
ção e controle às
lhar ou até inviabilizar
interdisciplinar e
quais somos submeo desenvolvimento da
contextualizado, quando
tidos no contexto esautonomia do profesefetivamente coletivo e
sor: “A instância supecolar, relações marcacom o fim precípuo de
rior às vezes pensa da
das por uma ética que
propiciar o domínio de
maneira correta, mas
precisa ser debatida,
conhecimento, o
na hora de viabilizar,
que precisa localizar o
crescimento pessoal e
na hora que coloca no
professor, situando-o
coletivo
papel o projeto, não
em parâmetros outros
respeita aquele deque não os retratados
senvolvimento que já existe na escola”.
nos atos da peça chamada educação
Mas, se tal instância pode inviabiliescolar.
zar a consecução dos objetivos elaboA tendência, ao adentramos o palco
rados na construção coletiva do projeto
da cultura organizacional da escola, no
pedagógico, também “não pode deterpapel de protagonista quase que soliQUÍMICA NOVA NA ESCOLA
Ética e autonomia
minar que o professor seja autônomo”,
por que a autonomia é “uma construção do professor”, conforme pensa,
ressaltando enfaticamente: a construção é coletiva; só assim é autonomia.
A constituição do sujeito autônomo
na prática docente não se dá de modo
harmônico e tem um preço. João Batista percebe que tal aprendizado, se
pretendido o exercício da autonomia,
é um “caminho bastante doloroso”,
pois a instância superior imediata, filtrando, ratificando, contestando ou
desvirtuando determinações superiores não-imediatas aos professores, de
modo geral, impõe restrições à liberdade.
Os embates, entretanto, não ocorrem apenas entre professores e instância superior imediata, mas entre os próprios professores, especialmente
quando se trata de defender a “ação”
inovadora em contraposição ao “continuismo” dos pressupostos básicos
que norteiam a administração do espaço escolar. E a “dor” não resulta somente desses embates, mas dos que
também surgem com alunos e com
pais, quando não dispostos a admitir
modelos distintos de dinâmica no
processo ensino-aprendizagem, especialmente quando instâncias superiores não imediatas (por exemplo, a universidade, as secretarias de educação)
impõem pressões que transfiguram o
papel educativo.
A ética da autonomia
O que João Batista defende e faz
relaciona-se ao seu esforço para ser
genuinamente um educador, o que distingue do mero professor. Este assume
uma “postura de conhecimento”, cumprindo o script com a neutralidade de
quem não se envolve com o aluno,
com o processo educativo. Já o professor-educador é “pessoa que tem a possibilidade de auxiliar, ajudar o aluno a
conhecer e a construir o seu conhecimento, dentro de um intercâmbio, de
uma interação com o aluno; é alguém
que tem um determinado conjunto de
conhecimentos, como o aluno, que
também tem alguns conhecimentos.
Então, há essa troca, essa interação, e
o professor (educador) auxilia, ajuda,
contribui para que o aluno também
sistematize esses seus conhecimenN° 15, MAIO 2002
37
38
tos”. Sendo educador, “o professor tem
cupação na elaboração do projeto
que ser ele mesmo. Tem que ser autênpedagógico.
tico, na sala, fora de sala...”. “O profesA autonomia é desenvolvida com seu
sor não precisa representar um papel”,
próprio exercício, todo voltado ao
frisa João Batista, para quem a autenconhecimento do outro, ao conheciticidade é vital. Enquanto o professor
mento e ao convencimento do aluno,
não-educador acaba por representar um
cúmplice e co-autor de um projeto. Por
papel, o professor-educador constitui e
isso, demanda tempo para ser constiexerce o seu papel.
tuída, porque conhecer o outro, ter “intiQuando fala de autonomia, João Bamidade” fraterna, conquistar confiança,
tista associa o conceirequerem tempo do
to ao professor-educaprofessor que deseja
A formação científica e a
dor, já que o mero proser autônomo. O procorreção ética associam-se
fessor, pelo não envolcesso de constituição
no respeito aos outros, na
vimento com um proda autonomia é, porcoerência, na capacidade
jeto coletivo, acaba
tanto, intrinsecamente
de viver e de aprender
por reproduzir e perpedemorado, e cada procom o diferente. Não basta
tuar a perspectiva do
fessor situa-se nele em
fazer ou saber fazer; é
sistema. Enquanto o
momento distinto, funpreciso fazer bem
educador enfoca o
ção de múltiplas ciraluno, é compromissado e se envolve
cunstâncias históricas. Daí a diversidade
no processo, tendo como fim de sua
observada na cultura escolar, diversidaação o domínio de conhecimento e o
de que precisa ser tomada como essencrescimento pessoal e coletivo, o procial. Respeitar a autonomia dos compofessor não-educador enfoca o conteúnentes do sistema educacional significa
do, tendo na rigidez, na punição e no
abandonar as velhas fórmulas de impocumprimento neutro do script o seu mosição de modelos pedagógicos monodo de ação, que visa principalmente à
líticos. É preciso admitir a diversidade
assimilação de informações e de defide projetos e de propostas, mas mannições por parte dos alunos.
tendo o foco primordial comum, que,
Com base nas relações de signifipara o professor autônomo concebido
cado inferidas dos relatos do professor
por João Batista, é o aluno, que deve
João Batista, a pesquisa realizada perser conhecido e respeitado em seu prómitiu concluir que, para ele, a autonoprio momento de constituição de automia é constituída no outro, principalmennomia.
te o aluno, com quem é preciso ter intiA reflexão desenvolvida por João Bamidade, em termos de proximidade afetista mostra-se muito profunda e torna
tiva fraterna e, talvez,
presente, a cada inssobretudo, cumplicitante, a questão ética.
A autonomia é
dade no processo
Aproxima-se, notadadesenvolvida com seu
ensino-aprendizagem,
mente, da visão de
próprio exercício, todo
cujo fim precípuo é o
Paulo Freire (1996). Travoltado ao conhecimento
desenvolvimento da
ta-se da reflexão sobre
do outro, ao conhecimento
autonomia coletiva.
a autonomia e a ética
e ao convencimento do
Então, falar em autode um professor situaaluno, cúmplice e co-autor
nomia do indivíduo só
do historicamente em
de um projeto
tem sentido se esta for
um contexto caracteriorganicamente situada
zado por pressupostos
na autonomia do coletivo. Não há como
constituintes de uma cultura escolar
conceber autonomia de um indivíduo
dinâmica, que afirma que transformar a
isolado. O individualismo relaciona-se ao
experiência educativa em puro treinaegoísmo da não-autonomia. O altruísmo
mento técnico amesquinharia o “que há
da autonomia relaciona-se ao conhecide fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador”
mento do outro, foco de ação e de preo-
(Freire, 1996). Desse ângulo, “se se
respeita a natureza do ser humano, o
ensino dos conteúdos não pode dar-se
alheio à formação moral do educando”
(p.37). Do mesmo modo, a preparação
científica do professor “deve coincidir
com sua retidão ética”, sendo “uma lástima qualquer descompasso entre aquela e esta”. A formação científica e a correção ética associam-se no respeito aos
outros, na coerência, na capacidade de
viver e de aprender com o diferente. Não
basta fazer ou saber fazer; é preciso
fazer bem.
O respeito à individualidade é crucial no processo de autonomia, por ser
essa uma exigência ética convergente
com a liberdade (Freire, 1996). Há que
se perguntar: até que ponto o professor
age com a consciência exigida pela liberdade, respeitando os alunos e
colegas e sendo respeitado pelas
instâncias superiores, pelos colegas,
pelos alunos... na consolidação da ética desejada?
Ricardo Gauche, bacharel e licenciado em Química pela
Universidade de Brasília (UnB), mestre em Educação
pela Unicamp e doutor em Psicologia pela UnB, é professor do Instituto de Química da UnB. Elizabeth Tunes,
psicóloga pela UnB, mestre e doutora em Psicologia
pela USP, é professora da Universidade Católica de
Brasília e pesquisadora associada da UnB.
Referências bibliográficas
BRUNER, J.S. A cultura da educação.
Trad. M.A.G. Domingues. Porto Alegre:
Artes Médicas, 2001.
BRUNER, J.S. Atos de significação.
Trad. S. Costa. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia:
saberes necessários à prática educativa.
São Paulo: Paz e Terra, 1996.
GAUCHE, R. Contribuição para uma
análise psicológica do processo de
constituição da autonomia do professor.
Tese de doutorado. Brasília: Instituto de
Psicologia da UnB, 2001.
TACCA, M.C.V.R. Ensinar e aprender:
análise de processos de significação na
relação professor x aluno em contextos
estruturados. Tese de doutorado. Brasília: Instituto de Psicologia da UnB, 2000.
TUNES, E. e SIMÃO, L.M. Sobre análise do relato verbal. Psicologia, v. 9, n.
1, p. 303-324, 1999.
Abstract: Ethics and Autonomy: a Vision of a High-School Teacher – In this paper, the relationship between ethics and autonomy is deliniated and discussed, based on a reflection carried out by a
chemistry high-school teacher, narrating his professional path.
Keywords: teacher, performance, ethics
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Ética e autonomia
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