A Apropriação1 da Multiplicação e da Divisão de Números Naturais no 6º
Ano do Ensino Fundamental: análise de uma proposta de ensino
embasada na Teoria dos Campos Conceituais
Sara Rodrigues (aluno)2
GD 2 - Educação Matemática nos Anos Finais do Ensino Fundamental
Resumo
A compreensão das operações aritméticas elementares é, historicamente, um dos pilares da vida escolar dos
alunos. Na transição dos anos iniciais para os anos finais do Ensino Fundamental, geralmente, esse é um dos
conhecimentos matemáticos básicos que se espera que eles tenham construído. Contudo, as avaliações
nacionais evidenciam que tal expectativa não tem se concretizado em um número significativo de escolas
brasileiras. Nesse sentido, apresentamos um estudo, apenas iniciado, no qual nos propomos tanto a identificar
os conhecimentos matemáticos acerca das operações com números naturais que alunos que ingressam no 6º
ano do Ensino Fundamental possuem, quanto construir e implementar tarefas que possam contribuir para a
superação das dificuldades identificadas. Pretendemos fundamentar esse trabalho na Teoria dos Campos
Conceituais de Vergnaud. Nesse artigo, apresentamos o estágio atual de desenvolvimento do estudo.
Palavras-chave: Ensino e aprendizagem de Matemática, Ensino Fundamental, Campo Multiplicativo, Teoria
dos Campos Conceituais [três a cinco palavras-chave, separadas por pontos.]
Introdução
A motivação para essa pesquisa surgiu durante a minha graduação. Como bolsista do Projeto
de Estímulo à Docência (PED), mantive contato com salas de aula, professores e alunos e,
mesmo antes de iniciar na docência, percebi inúmeras dificuldades enfrentadas.
Particularmente, me chamou a atenção o fato de que um número significativo de alunos
ingressavam no 6º ano do Ensino Fundamental sem um domínio das operações básicas,
1
2
Usamos o termo apropriação no sentido de tornar seu, tornar próprio o conhecimento.
Universidade Federal de Ouro Preto, [email protected], orientadora: Ana Cristina Ferreira.
principalmente a multiplicação e a divisão e que tal situação não era muito distinta nos anos
seguintes de escolaridade.
Após me formar, comecei a lecionar, e, tanto em minhas classes quanto a de colegas,
verifiquei como era comum essa situação. Contudo, paralelamente, também observei que,
usualmente, o trabalho com as operações elementares ainda privilegia as técnicas operatórias
dos algoritmos, por meio de exercícios repetitivos, em detrimento da compreensão dos
algoritmos. Essa metodologia não ajudava na superação dos problemas, mas antes, ao
contrário, reforçava-os.
Ao ingressar no Mestrado Profissional em Educação Matemática da Universidade Federal
de Ouro Preto, me propus a investigar essa problemática e a buscar alternativas para a
mesma.
A revisão da literatura sobre o ensino e a aprendizagem das quatro operações, evidenciou
vários aspectos em comum. Um deles refere-se à metodologia adotada no trabalho com a
multiplicação e divisão, quase sempre abordadas por meio de uma única perspectiva (ex. o
ensino da multiplicação, geralmente, caracteriza-se como a soma de parcelas sucessivas,
desconsiderando que a mesma pode ser ensinada por meio da comparação multiplicativa,
produto de medidas, proporção simples e múltipla3, etc.).
Outro aspecto, associado ao anterior, relaciona-se à formação do professor que leciona
Matemática para os anos iniciais. Geralmente, poucas são as horas dedicadas ao ensino da
Matemática (conteúdo e metodologia) nos cursos de Pedagogia. Isso se reflete nas
dificuldades enfrentadas pelos professores ao trabalhar com a Matemática nesse nível.
Muitas vezes, o único recurso que possuem é a lembrança das aulas que tiveram como alunos
do Ensino Fundamental. Além disso, os estudos corroboram algo que encontrei em minha
prática: o ensino das quatro operações fundamentais privilegia a memorização de regras e a
mecanização de técnicas, quase sempre desprovidas de sentido para os alunos.
Infelizmente, a maioria das pesquisas estudadas dedica-se aos anos iniciais do Ensino
Fundamental; evidenciam a existência de problemas no ensino das operações e erros comuns
3
De acordo com Magina (2001, p.4) a estrutura multiplicativa envolve diversos conceitos que podem ser
trabalhados através de quatro eixos: a proporção simples e múltipla, a comparação multiplicativa e o produto
de medidas, sendo que os dois primeiros eixos se dividem em classes um para muitos, muitos para muitos e
último se divide em configuração retangular e combinatória.
no desenvolvimento do algoritmo, mas não apresentam propostas para a superação dessas
dificuldades encontradas. Poucas contemplam os anos finais do Ensino Fundamental
(GREGOLIN, 2002; CUNHA, 1997) e raros são os estudos que propõem alternativas
(CUNHA, 1997; STAREPRAVO, 2002).
Paralelamente ao estudo das pesquisas brasileiras sobre o tema, procurei me aproximar da
realidade ouropretana, buscando conhecer melhor a situação dos alunos que ingressavam no
6º ano do Ensino Fundamental.
No início de 2014, convidei alguns colegas que atuavam, como eu, com 6ºs anos em escolas
estaduais de Ouro Preto para, juntos, realizarmos uma sondagem de conhecimentos
matemáticos (especificamente voltados para as operações de adição, subtração,
multiplicação e divisão de números naturais) em nossas classes. O propósito era conhecer os
conhecimentos que os alunos traziam consigo dos anos iniciais para melhor planejarmos
nossas aulas. Além disso, eu também procurava definir o foco do meu estudo.
Os resultados obtidos na sondagem indicaram que os alunos estão chegando ao 6º ano do
Ensino Fundamental nas escolas estaduais de Ouro Preto com sérias dificuldades nas
operações básicas, principalmente na multiplicação por dois algarismos e na divisão. Além
disso, observamos que os alunos apresentaram maior dificuldade nas questões que
envolviam situações problema. Em uma questão na qual uma situação problema4 envolvendo
a divisão era apresentada, apenas 33,4% dos alunos acertaram, 29,6% utilizaram outros
algoritmos que não se relacionavam ao problema, 12,5% dos alunos acertaram a questão
parcialmente e 24,5% deixaram em branco, justificando que não compreenderam ou não
sabiam resolver divisões. Dos alunos que acertaram a questão parcialmente, 72,2%
identificaram a operação envolvida, mas não souberam desenvolvê-la.
A revisão de literatura proporcionou um panorama do que tem sido estudado sobre as
operações fundamentais, principalmente no que se refere à multiplicação e à divisão de
números naturais. Há certo consenso quanto às dificuldades existentes, contudo, não
4
Situação proposta: Todos os alunos dos 6 os anos de uma escola de Ouro Preto foram convidados para um
passeio no Trem da Vale. Cada vagão tem capacidade para 48 passageiros. Quantos vagões são necessários
para levar esses alunos no passeio?
trouxeram muitas contribuições quanto a um possível referencial teórico que pudesse
auxiliar na compreensão dessas dificuldades nem em relação a alternativas para superá-las.
Buscando um referencial que me auxiliasse na compreensão do processo de construção dos
conceitos de multiplicação e divisão, cheguei à Teoria dos Campos Conceituais de
Vergnaud.
A teoria dos campos conceituais
A teoria dos campos conceituais é uma teoria psicológica-cognitivista do conceito criada por
Gerard Vergnaud. Essa teoria apresenta um legado de Piaget, como, por exemplo, o uso das
terminologias esquema e invariantes, que são designadas para explicar as estruturas gerais
do pensamento e Vergnaud amplia e redireciona seu foco para o estudo do funcionamento
cognitivo do sujeito em ação.
Essa teoria parte do principio de que a aprendizagem acontece por meio de situações e
problemas. Dessa forma, é no contato com um conjunto de situações nas quais um
determinado conceito está presente que o aluno vai construindo um sentido acerca de tal
conceito. Para Vergnaud (1990, p.1), o principal objetivo dessa teoria "é fornecer um quadro
para a compreensão das filiações e rupturas entre os conhecimentos".
A teoria não é exclusiva da Matemática, mas as contribuições escritas pelo autor para a
compreensão de operações matemáticas são, em muitos textos, explicitadas por meio dos
campos aditivo e multiplicativo. Na presente pesquisa, interessa particularmente o campo
multiplicativo.
Para Vergnaud (1990, p.8), "um campo multiplicativo é um conjunto de situações que
requerem uma multiplicação, divisão, ou uma combinação das duas". Assim, um campo
multiplicativo ou estrutura multiplicativa se refere a um conjunto informal e heterogêneo de
situações, cuja análise e tratamento requerem vários tipos de conceitos, esquemas,
procedimentos e representações simbólicas, os quais se encontram em estreita relação uns
com os outros.
A noção de situação dentro da teoria dos campos conceituais, não é entendida como situações
didáticas e sim como tarefas. De acordo com Brousseau (2007, p.21) "situação didática é
todo contexto que cerca o aluno, nele incluídos o professor e o sistema educacional" e
Vergnaud se limita ao sentido dado pelo psicólogo ao conceito de situação: os processos
cognitivos e as respostas do sujeito são função das situações com as quais é confrontado. O
autor destaca ainda duas ideias principais em relação ao sentido de situação:
1)
Variedade - existe uma grande variedade de situações em um campo conceitual e as
variedades de situações são um meio de gerar de maneira sistemática o conjunto de classes possíveis.
2)
História - os conhecimentos dos alunos são moldados por situações que encontram e
progressivamente dominam, particularmente pelas primeiras situações suscetíveis de dar sentido aos
conceitos e procedimentos que queremos que aprendam (VERGNAUD, 1990, p. 10, tradução livre).
Assim, ao se depararem com um conjunto de tarefas e/ou buscarem soluções para um
determinado problema, os alunos vão adquirindo novos conceitos e podem apresentar
condutas diferenciadas. Alguns já dispõem de conhecimentos prévios que serão usados no
desenvolvimento das tarefas, e outros não, provocando ações diferenciadas diante um
problema. Para compreender melhor essas organizações do pensamento, é importante
esclarecer aqui alguns conceitos.
Um esquema "é uma organização invariante de uma conduta para uma classe de situações
dadas" (VERGNAUD, 1990, p.2). Os esquemas envolvem duas classes de situações, a
primeira em que o aluno dispõe de competências necessárias para a solução do problema,
tendo, portanto, condutas automatizadas, caracterizadas por um esquema único e a segunda
em que o aluno ainda não dispõe de todas as competências, sendo necessário explorar o
problema, fazendo reflexões e tentativas no processo de descobrimento caracterizando o uso
de vários esquemas. Um esquema é então composto por regras de ações e antecipações.
Dentro de um esquema estão contidos alguns conhecimentos que são os teoremas em ação,
os conhecimentos em ação, e de forma mais geral por invariantes operatórios.
A expressão ‘invariantes operatórios’ designa os teoremas em ação e conhecimentos em ação
que o aluno utiliza para o domínio de certas situações.
Um teorema em ação não é um teorema no sentido convencional da palavra e podem ser
considerados invariantes do tipo proposição, pois podem ser verdadeiros ou falsos. Segundo
Magina, Campos, Nunes e Gitirana (2001), teoremas em ação como relações matemáticas
que são levadas em consideração pelos alunos, quando estes escolhem uma operação, ou
sequência de operações, para resolver um problema.
Um conceito em ação é um componente do esquema, podendo ser considerado como
invariantes do tipo função proposicional. De acordo com Vergnaud (1990), esses conceitos
são raramente explicitados por alunos, sendo, portanto, uma categoria de pensamento tida
como pertinente. Para formar um conceito são necessárias situações variadas em que a
linguagem e o simbolismo são indispensáveis, portanto um conceito, de acordo com
Vergnaud é formado por uma terna de conjuntos (S,I,R), onde:
S é um conjunto de situações que dão sentido a um conceito;
I é um conjunto de invariantes que podem ser usados pelo aluno para analisar e resolver essas
situações
R é um conjunto de formas linguísticas que permitem representar as situações e os procedimentos de
ação.
Vergnaud (1990, p.8) define o campo conceitual das estruturas multiplicativas como sendo
um conjunto de situações cujo tratamento implica uma ou várias multiplicações ou divisões,
e um conjunto de conceitos e teoremas que permitem analisar as situações de proporção
simples e múltiplas, função linear e não linear, razão, quociente, produto dimensões,
combinação, função, multiplicação e divisão. Portanto, nessa perspectiva teórica, a
multiplicação e a divisão são trabalhadas dentro de um mesmo campo conceitual, não
fazendo sentido estudá-las de forma isolada.
A seguir, apresento uma classificação das situações-problema na estrutura multiplicativa
feitas por Magina, Sandra e Merline (2013, p.4).
No esquema acima, os problemas são apresentados em quatro eixos: Proporção Simples,
Proporção Múltipla, Comparação Multiplicativa e Produto de Medida. Aos dois primeiros
pertencem as relações quaternárias 5 se dividindo em duas classes "Um para muitos" e
"Muitos para um". Os eixos Comparação Multiplicativa e Produto de Medida pertencem às
relações ternárias, sendo que a comparação multiplicativa se divide em duas classes a
"Relação Desconhecida" e o "Referido Desconhecido", o eixo Produto de medida se divide
em duas classes sendo elas, a "Configuração Retangular" e "Combinatória".
Diante dos aspectos apresentados, a Teoria dos Campos Conceituais é um referencial teórico
que proporciona ao professor formas diferenciadas de trabalhar situações que possam
favorecer a compreensão de conceitos matemáticos envolvidos numa determinada tarefa.
Finalmente, outro aspecto que destacamos na Teoria dos Campos Conceituais é a
conceituação a partir de situações reais e contextualizadas, favorecendo a construção do
conhecimento. Assim, a compreensão de conceitos matemáticos advém da ação dos alunos
de pensar sobre o assunto, vivenciar diferentes situações reais e, de serem capazes de
estabelecer relações do conteúdo estudado com outras situações presentes no seu cotidiano.
A Pesquisa: opções metodológicas
No presente estudo, de cunho qualitativo, se orienta pelo desejo de criar alternativas de
ensino e aprendizagem, diferente da forma tradicional como tem sido trabalhadas, que
possam contribuir para a apropriação de conceitos envolvidos nas operações de
multiplicação e divisão de números naturais. Nesse sentido, o propósito da pesquisa é
investigar o potencial e limitações de um conjunto de tarefas construídas a partir da teoria
dos campos conceituais de Vergnaud para a apropriação das noções de multiplicação e
divisão de números naturais em uma classe do 6º ano do Ensino Fundamental de uma escola
pública de Ouro Preto.
A partir da problemática exposta anteriormente e dos resultados da sondagem, recortamos a
seguinte questão norteadora:
Como tarefas construídas a partir da Teoria dos Campos Conceituais influenciam a apropriação
de conhecimentos e habilidades relacionados ao campo multiplicativo em uma classe de 6º ano do
Ensino Fundamental?
5
De acordo com as autoras, quando o problema oferece três elementos e pergunta pelo quarto tem-se uma
relação quaternária, e quando apenas dois elementos são enunciados e se pergunta pelo terceiro, tem-se relações
ternárias.
Para isso, traçamos os seguintes objetivos específicos:
•
Identificar os conhecimentos dos alunos acerca da multiplicação e da divisão de números
naturais, ao ingressarem no 6º ano do Ensino Fundamental;
•
Investigar os esquemas de pensamento dos alunos, os teoremas em ação e conhecimentos em
ação, presentes no desenvolvimento das tarefas;
•
Verificar, nos registros produzidos pelos alunos ao longo das tarefas, possíveis mudanças na
compreensão e resolução das tarefas.
Além disso, pretendo construir um produto educacional (um pequeno livro), voltado para
professores e futuros professores de Matemática, bem como interessados na temática,
reunindo as reflexões e resultados obtidos com a realização e a análise das tarefas.
Contexto e Participantes
Aplicaremos a proposta numa escola estadual localizada próxima ao centro da cidade de
Ouro Preto (Minas Gerais). A escolha dessa escola se deve ao fato de ela ser o local no qual
a pesquisadora cursou todo o Ensino Fundamental e onde atua como docente desde 2012.
Essa escola, de 85 anos de existência, atende atualmente ao Ensino Fundamental e possui
um curso pós Ensino Médio de Magistério com ênfase na Educação Infantil.
Realizarei a pesquisa com uma turma de 6º ano do Ensino Fundamental. Escolhi esse ano
por considerar essa etapa um marco na vida do aluno, uma vez que nessa fase é requerido do
aluno mais responsabilidades, sendo necessário adaptar-se à uma rotina diferente da qual
estavam acostumados.
Em 2014, a escola conta com três turmas de 6º ano, sendo uma no turno da manhã e as outras
duas no turno da tarde. Os alunos advindos da própria escola estudam no turno da tarde e os
alunos que a escola recebe de uma escola municipal próxima (que possui apenas Educação
Infantil) estudam no turno da manhã.
A faixa etária desses alunos varia de 11 a 13 anos de idade, sendo a maior parte deles
oriundos de bairros localizados próximos à escola. Minha experiência e convivência com os
alunos sugere que a maioria é proveniente de famílias de baixo poder aquisitivo.
Procedimentos
Optei pela abordagem qualitativa dada a natureza da questão de investigação. Busco
compreender como os alunos lidam com as situações e que tipos de tarefas podem resultar
mais interessantes e enriquecedoras para eles. Sendo assim, tanto o processo cognitivo
vivenciado pelos alunos quanto a relação que estabelecerão com o ambiente de
aprendizagem me interessam.
Nesse estudo, atuarei tanto como professora quanto como pesquisadora. Investigarei o
potencial e as limitações de tarefas construídas a partir da Teoria dos Campos Conceituais,
durante aulas regulares da disciplina Matemática.
A princípio, planejo realizar uma sondagem para identificar como os alunos se relacionam
com situações problemas envolvendo as operações de multiplicação e divisão. A partir da
análise dos resultados, realizarei com os alunos algumas tarefas. Meu propósito é colocar o
aluno diante de situações que envolvam a estrutura multiplicativa.
Apenas para ilustrar, apresento a seguir uma tarefa que poderia ser desenvolvida com os
alunos:
Pessoal, minha amiga Ana reaproveita o óleo de cozinha usado para fazer sabão. Dessa forma,
contribui para a preservação do meio ambiente e economiza dinheiro. Lembram-se do que já
estudamos sobre o impacto do lixo no meio ambiente?
Bem, a receita que Ana utiliza foi ensinada por sua mãe lhe passou:
7 litros de óleo de cozinha
1 kg de soda cáustica
2 litros de água
Rendimento 8,8 kg
Vamos aproveitar o óleo de cozinha que sobra em nossas casas e fazer sabão aqui na escola?
Além de efetivamente medir as quantidades, calcular frações (por ex., se decidirmos fazer a
metade da receita ou seu dobro) e produzir o sabão, levando a receita testada para casa, também
explorarei a situação matematicamente. Algumas questões a serem discutidas com os alunos:
a)
Para fazer essa receita precisamos de 7 litros de óleo. Como somos muitos alunos
podemos aumentar essa receita e fazer uma quantidade maior de sabão. Se quisermos fazer 3
receitas. Quantos litros de óleo vamos precisar? Quantos quilos de sabão serão produzidos?
b)
Se nós fizemos uma campanha incentivando a doação de óleo usados e para isso nos
propomos a distribuir um folhetinho com a receita e como brinde um pedacinho de sabão. Para
envolvermos toda a escola que conta com cerca de 400 alunos seriam necessários 54 kg de sabão.
Dessa forma, qual a quantidade de cada ingrediente que vamos precisar?
c)
Juntando a doação de óleo de todos os alunos da sala, conseguimos juntar 50 litros de
óleo. Qual a quantidade de sabão que poderá ser feita com essa receita?
d)Usando uma outra receita indicada por uma amiga 3 litros de óleo de cozinha rendem
aproximadamente 9 kg de sabão. Dessa forma se eu tiver 4 litros de óleo, quantos kg de sabão
poderão ser feitos.
As tarefas criadas, além de procurarem contemplar distintos contextos relacionados à
multiplicação e a divisão na perspectiva dos campos conceituais, buscam propor situações
próximas do cotidiano e que permitam uma conscientização de questões como o papel do
reaproveitamento na preservação do meio ambiente, cidadania, geração de renda, etc.
Ao longo desse trabalho, coletarei informações por meio de análise documental de registros
escolares produzidos pelos alunos, diário de campo da pesquisadora, e, gravações em áudio
(desde que autorizadas por pais, alunos e escola) de momentos dos encontros.
Eventualmente, talvez se faça necessário realizar entrevistas de aprofundamento com alguns
alunos.
Os registros escolares das tarefas desenvolvidas pelos alunos serão utilizados com propósito
de observar aspectos que demonstrem a apropriação de conceitos matemáticos
desenvolvidos a partir das tarefas propostas, principalmente no que se refere as operações de
multiplicação e divisão.
O diário de campo com observações e registros sobre o desenvolvimento das tarefas, tempo
gasto, sobre a ordem cronológica das tarefas propostas, sobre o ambiente, sobre o
comportamento dos alunos podem ser comparadas posteriormente com as expressões
verbais, para verificarmos se os comportamentos e atitudes são semelhantes ou diferentes.
As gravações em áudio têm o propósito de resgatar as falas dos alunos, que possam
corroborar na observação da apropriação do conhecimento acerca das tarefas propostas.
Algumas entrevistas de aprofundamento serão realizadas com alunos visando compreender
melhor como se relacionam e raciocinam em questões que envolvem multiplicação e divisão
de números naturais. Isso permitirá identificar até que ponto que esses conceitos foram
apropriados por alguns alunos.
A título de síntese
O desenvolvimento dessa pesquisa tem como principal interesse desenvolver uma proposta
de ensino que possa favorecer o desenvolvimento e a compreensão de conceitos envolvidos
nas operações de multiplicação e divisão. Assim, pretendemos identificar pontos fortes e
aspectos a serem melhorados no ensino das operações fundamentais, mais especificamente
a multiplicação e divisão nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Nesse sentido, a pesquisa pode servir como suporte na orientação de professores de
Matemática dos 6º anos quanto aos conhecimentos e habilidades matemáticos que os alunos
já possuem, bem como quanto às lacunas e dificuldades que precisam ser superadas.
A Teoria dos Campos Conceituais pode oferecer um quadro teórico interessante no
planejamento dessas tarefas, uma vez que a mesma propõe trabalhar com diversas situações
a partir de contexto reais, para que o aluno possa refletir, desenvolver seu pensamento em
busca de novos conhecimentos.
Outro aspecto importante a ser destacado é que o aluno não fica restrito a uma abordagem
única, sendo o principal agente na construção dos conceitos, nessa perspectiva o professor
ao propor uma sequência de tarefas esta conduzindo o aluno a novas formas de atividade.
Além disso, essas operações não são trabalhadas de forma isolada e sim dentro de um campo
conceitual através de um conjunto de situações que envolvem a multiplicação, a divisão ou
uma combinação das duas.
Referências
BROUSSEAU, Guy. Introdução à Teoria das Situações Didáticas. São Paulo: Ática, 2009.
CUNHA, Maria Carolina Cassino. As operações de multiplicação e divisão junto à alunos
de 5a e 7a séries.1997. Dissertação de Mestrado em Ensino da Matemática - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP, 1997.
GONÇALVES, Alex Oleandro. Algoritmos: Uma perspectiva de professores de 4 e 5 séries
do Ensino Fundamental. Tese (Mestre em Educação - Universidade Federal do ParanáCuritiba 2010.
GREGOLIN, Vanderlei Rodrigues. O conhecimento matemático escolar: operações com
números naturais. Tese de Doutorado em Educação - Universidade federal de São CarlosSão Carlos-SP, 2002.
MAGINA, S.; CAMPOS, T; NUNES, T.; GITIRANA, V. Repensando Adição e subtração:
Contribuições da Teoria dos Campos Conceituais, São Paulo: Ed. PROEM, 2001.
MAGINA, Sandra; MERLINI, Vera Lúcia e SANTANA, Eurivalda. Situações-problema das
estrutura multiplicativa sob a ótica do professor que ensina Matemática. Anais do VII CIBEM
(Conferência Iberoamericana de Educação Matemática), 16 a 20 de setembro de 2013,
Montevideo, Uruguai.
MEGID, Maria Auxiliadora Bueno Andrade. O Ensino e Aprendizagem da divisão na
formação de professores. Revista Eletrônica da Educação (2012), v.6, n.1
MOREIRA, Marco Antonio. A teoria dos campos conceituais de Vergnaud, o ensino de
ciências e a pesquisa nesta área. Revista Investigação em Ensino de Ciências, v.7, 2002, p.729.
VERGNAUD, Gerard. La teoria de los campos conceptuales. (tradução de texto publicado
na revista Recherches en Didáctique des Mathematiques, vol. 10, no. 2, 3, p. 133-170,
1990. disponível em
web.usbmed.edu.co/docbiblioteca/La%20teoria%20de%20los%20campos%20conceptuales.pdf)
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A Apropriação1 da Multiplicação e da Divisão de Números Naturais