REABILITAÇÃO AMBIENTAL DE ANTIGOS DEPÓSITOS DE REJEITO E
MORRO DO GALO: ESTUDO DE CASO DA ANGLOGOLD ASHANTI BRASIL
MINERAÇÃO LTDA.
Ana Flávia Alves, enga civil - Gerência de Meio Ambiente, [email protected]
RESUMO
Desde 1930, os rejeitos da mina de Morro Velho começaram a ser dispostos em vales ao
longo do Ribeirão Cardoso, acumulando 1.000.000 m3, em uma área de 250.000 m2. Estudos
hidrogeológicos e análises de riscos foram realizados e indicaram a necessidade de reabilitar
estes locais devido ao potencial poluidor encontrado nestes antigos depósitos. O processo foi
então iniciado em 2003 no Morro do Galo, antiga fábrica de trióxido de arsênio, seguido dos
depósitos Galo, Resende, Matadouro e Madeiras. Aproximadamente, R$ 8.500.000,00 foram
gastos nestes trabalhos, acompanhados constantemente pelos órgãos ambientais.
Como resultado, notou-se uma significativa melhora na qualidade das águas subterrâneas e do
Rio das Velhas demonstrando que este tipo de intervenção é possível em áreas urbanas sem a
necessidade de realocação dos residentes.
Palavras-chave: mineração de ouro; depósito de rejeito; reabilitação.
ABSTRACT
Since the 1930s, tailings at the Morro Velho Mining operations began to be deposited along
the banks of the Cardoso River, amounting to 1 million m3 of tailings being spread over
250,000 m2. To address the potential hazard associated with the older tailings deposits, a risk
assessment was conducted. The findings indicated that encapsulation of tailings would be
required. As a result, with the endorsement of the Brazilian environmental authorities, the
rehabilitation work commenced in 2003 in Morro do Galo, an old arsenic trioxide recovery
plant, followed by Galo’s, Resende’s, Matadouro’s and Madeiras’ tailings deposit.
The encapsulation has resulted in a significant improvement in underground water quality and
in the Rio das Velhas River. This intervention demonstrates that it is possible to undertake the
rehabilitation of old tailings deposits in a populated area without the relocation of residents.
Keywords: gold mining; old tailings deposit; rehabilitation.
INTRODUÇÃO
As explorações auríferas em Nova Lima, Minas Gerais, datam de 1834, quando os rejeitos
provenientes da mina de Morro Velho eram lançados diretamente no Ribeirão Cardoso,
afluente do Rio das Velhas. Desde 1930, os rejeitos passaram a ser dispostos em vales
utilizando a melhor tecnologia disponível na época, com adoção de técnicas avançadas de
engenharia objetivando a reutilização futura do material com tecnologia mais eficiente para
recuperação do ouro residual.
Hoje em dia, a disposição destes rejeitos é realizada em barragens, construídas e licenciadas
ambientalmente para este fim.
Figura 1: Localização da área estudada
Figura 2: Mapa dos depósitos de rejeito e Morro do Galo
REABILITAÇÃO AMBIENTAL
Visando a proposição de soluções conceituais definitivas para a mitigação de eventuais
impactos decorrentes dos depósitos de rejeito, foram realizados estudos de diagnóstico
hidrogeológico ambiental e análise de riscos.
A reabilitação ambiental destes locais foi, portanto, recomendada. O principal critério
utilizado para determinação da melhor tecnologia a ser implantada nestas obras foi aquele que
permitisse a maior proteção ao meio ambiente e à saúde da comunidade local.
Morro do Galo
A partir de 1940, foi instalada no Morro do Galo uma usina de processamento de trióxido de
arsênio. Estas atividades industriais foram suspensas em 1975, quando as instalações foram
desmontadas e demolidas e a maioria dos materiais metálicos sido vendidos como sucatas
metálicas. Vinte anos depois, a vegetação local era bastante esparsa, consistindo basicamente
de gramíneas.
A reabilitação ambiental desta área consistiu na retirada do material calcinado depositado na
base do Morro do Galo, totalizando aproximadamente 14.000 m3. Além disto, foram
estabelecidas, por empresa especializada, técnicas específicas visando à recuperação local
através de revegetação e plantio de 35.000 mudas nativas. A área foi cercada e um sistema de
drenagem superficial construído com o intuito de coletar e tratar quimicamente a água de
chuva, removendo o arsênio presente através de precipitação, antes da mesma ser descartada
no Rio das Velhas.
Antes do início dos trabalhos, um grupo multidisciplinar se reuniu para levantar os riscos
associados a cada atividade a ser desenvolvida, bem como o que deveria ser feito para
minimizar ou eliminar o potencial de perda durante as obras.
O trabalho de reabilitação ambiental do Morro do Galo ganhou o 7º prêmio de Excelência da
Indústria Mínero-Metalúrgica concedido pela revista Minério e Minerales.
Figura 3: Morro do Galo em 1991 antes (esquerda) e depois da reabilitação em 2004 (direita)
Depósitos de Rejeitos
Existem seis depósitos de rejeitos provenientes da mina de Morro Velho que, até o seu
fechamento, em 2003, era uma das minas de ouro mais antigas em operação no mundo.
Destes, quatro já foram reabilitados e os restantes têm previsão de término em 2011.
O depósito do Galo, situado na margem esquerda do Ribeirão Cardoso e próximo à
confluência com o Rio das Velhas, é parcialmente urbanizado. Anteriormente ao início dos
trabalhos de reabilitação, sua superfície plana era revegetada e o talude existente era coberto
com uma geomembrana de PVC conforme pode ser observado na figura 4.
A área como um todo recebeu diferentes tratamentos em função das particularidades de cada
uma. No topo do depósito, que corresponde à parte plana do mesmo, primeiramente foi
disposta uma camada de areia de 0,20m de espessura para proteger a manta contra eventuais
perfurações ocasionadas por pedras ou outros materiais porventura contidos pelos rejeitos e
para permitir a drenagem de gases, líquidos ou vapores eventualmente gerados no interior dos
rejeitos. Por cima desta, colocou-se uma manta PEAD para impermeabilizar o topo da pilha,
evitando a percolação das águas superficiais nos rejeitos. Esta impermeabilização funciona
também no outro sentido, pois impede que partículas dos rejeitos possam eventualmente
ascender à superfície. Uma camada de aterro compactado de 1,0m de espessura foi disposta
sobre a manta com o intuito de prover uma proteção mecânica para a mesma e permitir que a
área ocupada pelo topo do depósito possa ser urbanizada e utilizada.
Em relação ao talude do depósito, o mesmo teve a sua geometria alterada para uma forma
mais estável e permanente. Um filtro inclinado foi feito com a finalidade de receber eventuais
excessos de águas superficiais na camada de aterro compactado. Depois, uma camada de
material foi compactada com o intuito de dotar a pilha de uma proteção superficial contra
infiltração e erosão, além de criar um confinamento lateral para os rejeitos. A face do talude
recebeu um sistema de drenagem para direcionar as águas até o córrego.
Quanto á área residencial, o tratamento consistiu em executar um piso de concreto e construir
jardineiras suspensas para o plantio de hortas e algumas plantas ornamentais.
A principal via de acesso ao bairro foi impermeabilizada através da utilização de asfalto. Um
sistema de drenagem periférica revestido foi construído para desviar as águas de encostas e
curso d’água de montante para um ponto de descarte no Ribeirão Cardoso, minimizando o
fluxo de águas no local.
Figura 4: Depósito do Galo em 2004 antes (esquerda) e em 2005 depois da reabilitação (direita)
A reabilitação ambiental do Depósito Resende ocorreu em 2006. O tratamento dos taludes
deste depósito foi o mesmo dado no talude do Depósito Galo, descrito anteriormente. No
entanto, a parte plana foi asfaltada após preparo do terreno. Um sistema de drenagem também
foi implementado para direcionamento das águas de chuva.
Em 2007, foi a vez do Depósito Matadouro. O tratamento dos extremos inferior e superior do
depósito, bem como da praça e área residencial, com exceção de algumas casas que já
possuíam proteção adequada, consistiu em executar um piso de concreto para prover vedação
superficial. O mesmo foi construído obedecendo a uma inclinação específica para permitir a
drenagem das águas de chuvas. Jardineiras suspensas foram confeccionadas de forma a
proporcionar o plantio de hortas e plantas.
Os pavimentos das calçadas e das ruas que apresentavam trincas e outros defeitos que
poderiam permitir a passagem de água de chuva foram recuperados com massa de cimento e
areia. O pavimento das ruas da praça recebeu tratamento asfáltico em toda a sua superfície.
Vale salientar que, em todas as residências onde foi necessária a intervenção, houve formal e
prévia liberação dos proprietários para que as obras fossem realizadas.
A reabilitação ambiental do Depósito Madeiras foi iniciada no segundo semestre de 2009.
Grande parte da área foi impermeabilizada através da utilização de asfalto após o preparo do
terreno. Um sistema de drenagem constituído de canaletas foi implantado com o intuito de
coletar e direcionar as águas de chuva.
Figura 5: Depósito Resende em 2005 antes (esquerda) e depois da reabilitação em 2006 (direita)
A qualidade das águas, à montante e à jusante das áreas, foi monitorada diariamente durante
os trabalhos de reabilitação. Os resultados destas análises mostraram que não ocorreu
alteração na qualidade do rio que pudesse ser associado à execução das obras.
Um intensivo programa de comunicação foi realizado com os residentes destas áreas com
distribuição de cartilhas explicativas sobre o trabalho e seus impactos, bem como as melhorias
dele decorrentes. Nestas visitas pessoais de representantes da empresa, foi dada a
oportunidade dos moradores expressarem as suas preocupações e necessidades. A maioria das
solicitações, tais como a construção de campo de futebol, a instalação de uma nova ponte de
pedestres mais resistente, pavimentação da passarela de acesso da comunidade ao ponto de
ônibus, reabertura de acesso entre bairros e construção de garagens para os moradores que
tiveram as suas retiradas em função da realização das obras foram atendidas.
MONITORAMENTO AMBIENTAL DOS DEPÓSITOS DE REJEITO
De forma a avaliar a qualidade ambiental da região, bem como quantificar as possíveis
interferências de suas atividades na área central do município de Nova Lima, a AngloGold
Ashanti Brasil Mineração Ltda. vem de longa data realizando o monitoramento qualitativo
das águas do Ribeirão Cardoso, do Rio das Velhas e das águas subterrâneas sob influência dos
antigos depósitos de rejeitos.
Para a avaliação sobre a evolução das características físico-químicas destas águas, foi
utilizado o histórico de dados de monitoramento diário e mensal do principal parâmetro
envolvido e considerado como indicador da qualidade: o arsênio.
Assim como destacado no estudo hidrogeológico realizado, “os solos e rochas de Nova Lima
- MG apresentam uma concentração de arsênio naturalmente elevada (i.e., concentração de
background). As concentrações naturais encontradas em solos desta região (entre 50 e
200mg/kg) estão, pelo menos, uma ordem de grandeza acima das concentrações médias
naturais descritas para outras regiões do mundo” (Golder Associates, 2002). Assim sendo,
conclui-se que, naturalmente, as águas superficiais e subterrâneas da região sofrem influência
direta dos solos e rochas da região.
Desta forma, o objetivo principal deste tópico é demonstrar o progresso na concentração de
arsênio em pontos sob influência dos depósitos de rejeitos, a partir do início das suas obras de
reabilitação ambiental.
Todo o processo de amostragem (coleta, transporte, armazenamento e realização das análises
físico-químicas) foi executado pelo laboratório interno da empresa. Este laboratório possui as
certificações ISO 9.001, ISO 14.001, OHSAS 18.001 além da acreditação do INMETRO
através da NBR 17.025.
Para a realização das amostras foram consideradas as seguintes normas:
•
NBR 9897/87 – Planejamento de Amostragem de Efluentes Líquidos e Corpos
Receptores;
•
NBR 9898/87 – Preservação e Técnicas de Amostragem de Efluentes Líquidos e
Corpos Receptores;
•
Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater, 21a edição.
Pontos de Monitoramento
Os pontos de monitoramento das águas superficiais avaliados se encontram a jusante dos
depósitos de rejeito, onde se pode notar qualquer interferência decorrente dos depósitos.
Avaliou-se a qualidade do Ribeirão Cardoso e do Rio das Velhas. Já os piezômetros estão
locados em áreas internas aos depósitos.
RESULTADOS
Destaca-se que até julho de 2008, as análises das águas superficiais eram realizadas
diariamente, o que torna estes históricos totalmente confiáveis. A partir de agosto do mesmo
ano, as amostragens passaram a ser feitas mensalmente. Este extenso histórico de dados foi
compilado na forma de gráficos cujos resultados são discutidos a partir da classificação das
águas segundo a Deliberação Normativa Conjunta COPAM/CERH-MG no 01, de 5 de maio
de 2008.
As obras de reabilitação realizadas até então, bem como as futuras, têm como principal
objetivo proporcionar uma minimização da exposição da população aos antigos rejeitos
dispostos nestas áreas. Este propósito vem sendo cumprido, contudo é necessário ressaltar que
as obras vêm trazendo outras conseqüências benéficas além daquelas esperadas.
Águas Superficiais
Ribeirão Cardoso
Ribeirão Cardoso
- Montante
Ribeirão
Cardoso Rio das Velhas
0,2
0,16
0,14
0,12
0,1
0,08
0,06
0,04
0,02
Antes Reabilitações
Depois Reabilitações
Média Rib. Cardoso Antes
Média Rib. Cardoso Depois
Figura 6: Monitoramento da qualidade das águas do Ribeirão Cardoso
out-09
dez-08
fev-08
abr-07
jul-06
set-05
nov-04
jan-04
mar-03
mai-02
jul-01
0
out-00
Arsênio
(mg/L)
Arsênio total
(mg/l)
0,18
Figura 7: Monitoramento da qualidade das águas do Rio das Velhas
Verifica-se nitidamente que, após o início das reabilitações ambientais dos depósitos, as
concentrações de arsênio sofreram queda significativa, principalmente no que se refere ao Rio
das Velhas.
Observa-se que não existia esta expectativa devido às possíveis condições de mobilidade do
arsênio localizado nos rejeitos de mineração, conforme previsto no estudo hidrogeológico
realizado. Destaca-se, entretanto, que a impermeabilização dos rejeitos existentes em cada
depósito acarretou em uma redução visível no aporte de carga do arsênio pelos depósitos no
Ribeirão Cardoso e, conseqüentemente, no Rio das Velhas, concluindo-se em uma evolução
extremamente positiva.
Águas Subterrâneas
Figura 8: Monitoramento da qualidade das águas subterrâneas
Conforme exposto no estudo hidrogeológico, há influência dos depósitos de rejeito nas águas
existentes nos interstícios do material depositado. As obras de reabilitação não removem todo
o material da área e realizam, principalmente, uma impermeabilização da superfície, evitando
qualquer contato da população com o material. Por esta razão, não se esperava uma melhora
significativa na qualidade das águas subterrâneas. Porém, foi observada uma diminuição na
concentração de arsênio do piezômetro monitorado na Figura 8, fato que permite considerar
que as obras já realizadas alcançaram resultados além do esperado e extremamente positivos
em relação ao arsênio.
CONCLUSÃO
A construtiva interação entre empresa, moradores locais e órgãos ambientais foi fundamental
para o sucesso dos trabalhos desenvolvidos. Este tipo de intervenção demonstra a
possibilidade de realizar reabilitações em antigos depósitos de rejeitos, mesmo em áreas
povoadas, sem a necessidade de realocação dos residentes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Golder Associates (2002) Estudos Hidrogeológicos dos Depósitos de Rejeito do Vale do
Ribeirão Cardoso - Nova Lima-MG. Vol 1, 224 p.
Huang, P. M., Fujii, R. (1996) Selenium and Arsenic. In: Methods of Soil Analysis. Part 3
Chemical Methods. Soil Science Society Book Series, Madison, Wisconsin USA.
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reabilitação ambiental de antigos depósitos de rejeito e morro do galo