Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
CONSERVAÇÃO E RESTAURO DE PERGAMINHOS: UM ESTUDO DE CASO
Ana Cristina de Menezes Santoro (*)
(*) Mestre em História Social/UFRJ e Técnica em Conservação e Restauro/FAOP;
Técnica em Restauro de Bens Móveis e Integrados – Marsou Engenharia.
Introdução
O trabalho aqui apresentado é resultado do processo
de restauro e conservação do diploma de doutoramento
de Fidélis de Azevedo Alves, expedido pela Faculdade
de Medicina do Rio de Janeiro, em 04 de setembro de
1882. O documento, impresso, em pergaminho, pela
Typographia Nacional pode ser considerado de grande
importância e representatividade, principalmente se
considerarmos a história e a tradição da Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro e as trajetórias de vida de
seus egressos.
A educação superior no Brasil foi impulsionada
pela presença da Família Real portuguesa na colônia, a
partir de 1808. Ao contrário do que acontecia nas
demais colônias ibéricas nas Américas, que desde o
século XVI contavam com universidades, a
administração portuguesa não incentivava a presença
de instituições educacionais. Esta política relacionavase com a idéia de que a formação do contingente
populacional da colônia, sobretudo em nível superior,
poderia converter-se em ameaça aos interesses da
corte. Assim, somente com a chegada de Dom João VI
foram criadas as primeiras universidade no Brasil.
Entre as universidades criadas, destaca-se a Escola
de Anatomia, Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro,
estabelecida por Carta Régia de 05 de novembro de
1808. Até a formatura dos primeiros doutores formados
no Brasil, a assistência médica era feita pelos poucos
brasileiros formados na Europa e pelos raros europeus
que vinham para a colônia. Vale ressaltar também o
grande número de curandeiros que atuavam, neste
período, como médicos.
Em 1º de abril de 1813 a Escola de Anatomia,
Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro passou, por
decreto, a ser chamada de Academia Médico-Cirúrgica.
Entretanto, somente a partir de 1826, por meio de um
Decreto-Lei de Dom Pedro I, foi autorizada a emissão
de diplomas e certificados aos médicos formados no
Brasil.
Já em 1832, durante a Regência Trina, em 3 de
outubro, foi sancionada uma Lei que transformava as
Academias Médico-Cirúrgicas do Rio de Janeiro e
Salvador em Faculdades de Medicina. Surgia assim a
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, que
permaneceu funcionando como escola isolada até 7 de
setembro de 1920, quando foi criada, por Decreto, a
Universidade do Rio de Janeiro. Em 1937, com a
criação da Universidade do Brasil (atual Universidade
Federal do Rio de Janeiro), a Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro, passou a se chamar Faculdade
Nacional de Medicina.
Ao longo desta trajetória, a Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro tornou-se um centro de referência,
formando, sobretudo, no século XIX, homens que
alcançariam grande influência na sociedade brasileira.
Os diplomas produzidos passaram a ser marcos de
distinção e valorização dos egressos das universidades.
O título de Doutor passava a ser um grande definidor
de posição e status social.
A biografia do Dr. Fidélis de Azevedo Alves,
embora tenhamos poucos dados, pode ser considerada
representativa da história dos egressos da Faculdade de
Medicina do Rio de Janeiro. Membro de uma
tradicional família fluminense, ingressou no curso de
medicina deixando de lado a administração das
fazendas do pai. Ao final do curso, obteve o grau de
Doutor, após defender a tese intitulada “Periocardite”.
Com o final do curso, seguiu para Paris onde realizou
um curso de Pós-Graduação.
Como vimos anteriormente, a formação superior
somava-se a origem e status familiar, conferindo
grande prestígio na sociedade da época aos Doutores.
Muitos deles, como o Dr. Fidélis de Azevedo Alves
aproveitavam-se deste prestígio e ingressavam na
carreira política. Foi eleito Deputado Estadual. A este
mandato seguiram outros, como Deputado Estadual e
Federal. A atuação política do Dr. Fidélis Alves, como
era conhecido, foi fortemente marcada pelos ideais
franceses de libertação e igualdade, fortalecidos
durante sua estadia naquele país. Neste sentido destacase seu desempenho nos movimentos republicanos e
abolicionistas. A atuação no movimento abolicionista
foi considerada um marco, na sua época. Ao regressar
de Paris, o Dr. Fidélis Alves assumiu a administração
da Fazenda Montividi, no município de Itaboraí, no
norte do Estado do Rio de Janeiro. Uma de suas
primeiras ações foi lotear parte do terreno da fazenda
para construção de casas para os escravos, cujo
trabalho passou a ser remunerado.
Após a Proclamação da República, em 1889, Dr.
Fidélis Alves participou das Assembléias constituintes
que culminaram na promulgação da Constituição de
1891, primeira Constituição republicana do Brasil.
A segunda metade do século XIX, e início do XX,
apresentavam um cenário político marcado por
disputas. A tensão se agravava principalmente entre os
políticos proprietários de terras. Em 1909, em um
destes momentos de disputa política, o Dr. Fidélis foi
assassinado por envenenamento em um jantar
oferecido em sua homenagem. Membros da família,
como a bisneta do Dr. Fidélis, contam que ele percebeu
que havia algo errado e informou à esposa que, caso
começasse a sentir determinados sintomas, ele havia
sido envenenado no jantar. Embora sinalizasse a
possibilidade de envenenamento, nenhuma precaução
ou profilaxia foi tomada. Assim, um dia após o jantar,
o Dr. Fidélis Alves faleceu em sua residência, na sede
da Fazenda Montividi. O então Presidente da
República, Afonso Pena, manifestou o desejo de seguir
com as investigações sobre o acontecimento, pedindo à
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
viúva que autorizasse a exumação do corpo. A recusa
dela fez com que o caso fosse arquivado, deixando
como principal suspeito outro médico e político da
região, amigo do Dr. Fidélis Alves.
A história da Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro e as trajetórias de seus alunos são fontes
importantes para o conhecimento não só da história das
ciências, mas também da vida social e cotidiana do
Brasil. Os documentos produzidos pela instituição são
peças fundamentais para traçar esta história. Entre estes
documentos estão os diplomas de conclusão de curso.
Os diplomas também se tornaram objetos de orgulho
para seus portadores e suas famílias, sendo, em sua
maioria, expostos ou guardados como objetos de valor.
É este o caso do diploma do Dr. Fidélis de Azevedo
Alves.
Após a morte do Dr. Fidélis o diploma permaneceu
com sua família, que o mantinha guardado em um
canudo de papelão, que substituía o canudo metálico
original, danificado em um acidente doméstico. Este
acidente atingiu também o diploma, em seu canto
inferior direito (ponto de vista do observador).
Segundo os proprietários o diploma nunca havia
sofrido nenhum procedimento de conservação ou
restauração.
O presente artigo reporta o processo de conservação
e restauro, aos quais se submeteu o diploma, em 2010.
O pergaminho como suporte de documentos
Antes de apresentarmos os procedimentos e
resultados alcançados, trataremos, brevemente, de
algumas questões sobre a história do pergaminho,
visando, sobretudo, o entendimento das técnicas de
confecção empregadas ao longo dos anos. Esta questão
torna-se importante para fundamentar as análises da
técnica construtiva apresentada no diploma em
questão.
O pergaminho tem sido utilizado como suporte para
documentos, principalmente por sua durabilidade e
características estruturais que dificultam a falsificação.
É também considerado um material nobre pela beleza
que confere ao documento.
Os primeiros registros da utilização do pergaminho
remontam à Antiguidade, quando, na cidade de
Pérgamo, localizada na atual Turquia, teria sido
desenvolvida a técnica de preparação da pele animal
para receber escritos. A técnica logo se difundiu em
substituição ao papiro como suporte da escrita. Embora
tenha sido desenvolvida na Antiguidade, foi na Idade
Média que se tornou o principal suporte para livros e
documentos. Desde então, considera-se pergaminho
(do grego pergaméne e do latim pergamina ou
pergamena) a pele animal, geralmente de cabra,
carneiro, cordeiro, ovelha ou vitela, tratada e utilizada
como suporte para escrita. O velino, proveniente de
bezerros nato-mortos, é um pergaminho de grande
qualidade e de alto preço. Em alguns momentos a
palavra pergaminho tem sido erroneamente utilizada
para designar o documento/escrito em si.
A técnica de preparação da pele animal para
utilização como suporte de manuscritos e documentos
impressos foi sendo desenvolvida ao longo dos anos e
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
do surgimento de novas tecnologias, visando sempre
torná-la flexível, maleável, resistente e capaz de
receber as tintas e pigmentos. Tradicionalmente, o
primeiro passo para a preparação da pele era a limpeza
com água. Depois, a pele era escorrida, e então
polvilhada com cal e colocada sobre o lado da carne
para secar. Esta secagem, que durava semanas, era feita
em armações, onde a pele era estirada e tensionada.
Neste momento polvilhava-se pó de cré, que conferia
impermeabilidade ao couro, impedindo que a tinta
fosse absorvida pelo mesmo. Finalmente, a pele era
polida com pedra-pome para a superfície ficar lisa,
uniforme e brilhante. Ao final do processo, a pele era
cortada para definir a área da folha. Com as dobras
dessas folhas obtinham-se os formato in-fólio, inquarto e in-octavo. Assim, as folhas poderiam ser
agrupadas em cadernos de formatos uniformes1 Em seu
estudo, João Pedro Ribeiro descreve uma técnica
semelhante de fabricação e tratamento de pergaminhos,
ressaltando a qualidade do suporte e o tratamento
necessário para a confecção de diplomas.
No trabalho de João Pedro Ribeiro, publicado em
Portugal, em 1810, encontramos a descrição de uma
técnica construtiva semelhante à utilizada no diploma
do Dr. Fidélis de Azevedo Alves, no que se refere à
camada pictórica. Ao discorrer sobre os diferentes
suportes para escrita e impressão, Ribeiro se dedica
especificamente ao pergaminho. Neste item,
encontramos a descrição de três tipos de acabamento
final: “Conhecem-se 3 espécies: branco de ambas as
partes; amarello de hum lado, e branco de outro;
purpurado de ambas as partes”.2 Seguindo a tradição do
período de sua confecção, o pergaminho foi tratado e
recebeu uma camada de tinta branca em ambos os
lados, sobre a qual se executou uma impressão
monocromática em preto. Manuscritos com tinta
ferrogálica também constituem a camada pictórica do
documento.
Diplomas em pergaminho: análise estilística
O diploma do Dr. Fidélis de Azevedo Alves segue
o modelo tradicional empregado no século XIX. Este
modelo se manteve em uso mesmo após a Proclamação
da República. Alguns aspectos formais, como o
emblema da República, em substituição ao do Império,
na posição superior, continuam a ser empregados até os
dias de hoje.
A utilização do pergaminho como suporte,
recebendo uma camada de tinta branca tanto na frente
quanto no verso também são características estilísticas
dos diplomas produzidos neste período.
Vale ressaltar, que o modelo de diploma adotado
pelas universidades brasileiras herdou, em muitos
aspectos, o modelo europeu. Na obra “Dissertações
chronologicas e criticas sobre a historia e
1
Pergaminho. In: Glossário de Tipografia. Disponível
http://tipografos.net/glossario/pergaminho.html
Acessado
em
02/04/2010.
2
RIBEIRO, João Pedro. Dissertações chronologicas e criticas sobre
a historia e jurisprudencia ecclesiastica e civil de Portugal. Lisboa:
Academia Real das Sciencias, 1810, 5 vol. Disponível em
http://purl.pt/12115 Acessado em 30/03/2010.
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
jurisprudencia ecclesiastica e civil de Portugal”3,
Ribeiro, ao compilar as normas para confecção e
formatação de documentos e trabalhos acadêmicos e
jurídicos, apresenta a forma de elaboração de uma série
de documentos jurídicos e civis, entre eles os diplomas.
Pode-se dizer que o diploma do Dr. Fidélis possui os
elementos
formais
presentes
nas
exigências
apresentadas na obra de Ribeiro, publicada em Lisboa,
em 1810.
O médico e escritor Pedro Nava, em seu livro
“Beira Mar”, fornece uma curiosa descrição dos
diplomas produzidos durante o Império e a primeira
fase da República. Neste livro, o personagem Samuel
Libânio, ao discorrer sobre seu trabalho na seção de
Registros de Diplomas e Protocolo, apresenta a
seguinte descrição dos diplomas produzidos no período
em questão:
O registro de diplomas fazia-se transcrevendo
literalmente a carta do doutor que queria se fixar em
Minas. Mencionava-se de saída: Armas do Império ou
Armas da República e em seguida vinha a chapa
imemorialmente adotada pelas faculdades do país: Eu,
o Doutor Fulano de Tal dos Anzóis Carapuça,
Professor dessa ou daquela cadeira, Diretor da
Faculdade de Medicina da Bahia, do Rio de Janeiro,
do Rio Grande do Sul ou de Belo Horizonte, tendo
presente o termo de colação de grau de Doutor em
Medicina conferido no dia tantos de dezembro de mil e
oitocentos ou novecentos e quantos ao Senhor...
mandei passar-lhe, em virtude da autoridade que me
conferem... este Diploma, etc., etc., etc. Seguiam-se as
assinaturas do diretor, do secretário da faculdade em
questão, do doutorando. Indicava-se o fitão auriverde
que prendia a caixa de prata com o lacre onde se
imprimira o timbre da instituição. O distintivo mais
freqüente era o da Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro — onde Esculápio reclina-se, não sob árvore
clássica mas, sob uma da terra, segurando com a
sinistra o Caduceu com a Serpente da Prudência e com
a destra, escudo onde se incisa o latinório — Ad Cives
Servandus — divisa tantas vezes esquecida! À frente da
figura divina, canta o Galo de Apolo. No dorso, a
coleção dos registros de todos os estados já
palmilhados pelo periodeuta. Tudo aquilo tinha de ser
transcrito verbatim.4
Outra questão que determina as características
estilísticas dos diplomas produzidos no século XIX é o
fato de todos terem sido produzidos e impressos pela
Typographia Nacional, determinando assim um padrão
a todos os diplomas expedidos pelas universidades
brasileiras.
Materiais e Métodos
Os procedimentos de conservação e restauro foram
realizados no laboratório de Conservação e Restauro de
Papéis da Fundação de Arte de Ouro Preto, sob
orientação do Professor Demilson Malta Vigiano.
3
RIBEIRO, op. cit., p.40, vol. 4.
4
NAVA, Pedro. Beira Mar. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985,
p.43.
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
Ao dar entrada no laboratório, o documento foi
submetido a uma análise de estado de conservação,
onde foram identificados os seguintes problemas,
decorrentes, principalmente, da falta de conservação e
de armazenagem inadequada:
•
•
•
•
•
•
•
•
•
sujidade aderida;
rasgos e furos;
marcas de dobras e amassados;
áreas de perdas pontuais do suporte;
manchas provenientes de desenvolvimento de
fungos e umidade;
amarelecimento;
ressecamento e enrijecimento do suporte;
áreas de perdas pontuais da camada pictórica.
Marcas de dobras e
amassados.
Foto: Ana Cristina Santoro
Manchas provenientes de
desenvolvimento de fungos
e umidade.
Foto: Ana Cristina Santoro
Rasgo e furos.
Foto: Ana Cristina Santoro
Rasgo.
Foto: Ana Cristina Santoro
Áreas de perda da camada pictórica.
Fotos: Ana Cristina Santoro
Área de perda do suporte.
Fotos: Ana Cristina Santoro
Após análise do estado de conservação, foi
elaborada uma proposta de tratamento e iniciaram-se
os procedimentos de conservação e restauro.
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
O documento encontrava-se armazenado em um
canudo de papelão, o que fez com que permanecesse
enrolado por um período de tempo considerável. Sendo
assim, o primeiro procedimento realizado foi a
planificação. Para tanto, utilizou-se a mesa de sucção e
umidificação. Em um primeiro momento foi aplicado
apenas o vapor frio por ultrasom visando também a
hidratação do suporte. Este procedimento fez com o
pergaminho se desenrolasse lentamente e sem pressão
mecânica. Ao longo do procedimento, que durou cerca
de 2 horas, a quantidade de vapor na câmara foi sendo
aumentada gradativamente, observando-se possíveis
alterações na estrutura e na camada pictórica do
documento. Após esta etapa, a sucção da mesa foi
acionada para finalizar a primeira etapa de planificação
do pergaminho.
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
O segundo procedimento aplicado foi a realização
de testes de fluorescência UV. Este teste possibilitou a
melhor observação e localização da presença de
manchas de umidade e colônias de fungos. Este teste
permitiu também uma melhor leitura dos registros e
assinaturas do verso do documento.
Detalhes do documento sob luz UV. Reparar manchas
evidenciadas, antes imperceptíveis e manuscritos com tinta
ferrogálica reavivados.
Fotos: Demilson Malta Vigiano.
Documento no início do
processo de umidificação por
vapor de ultrassom.
Foto de Ana Cristina Santoro
Documento, 60 minutos após
o início do processo de
umidificação por vapor de
ultrassom.
Foto de Ana Cristina Santoro
Documento, 30 minutos após
o início do processo de
umidificação por vapor de
ultrassom.
Foto de Ana Cristina Santoro
Final do processo de
umidificação por vapor de
ultrassom.
Foto de Ana Cristina
Santoro
Processo de planificação
por sucção.
Foto:
Ana
Cristina
Santoro
Tornou-se necessário retomar a planificação do
objeto, para tanto, o diploma foi recolocado na mesa de
sucção e umidificação, liberando-se, primeiramente, o
vapor frio por ultrassom. Após, aproximadamente 1
hora, o vapor foi desligado e a sucção acionada. Ao
final do processo, o documento foi colocado entre
folhas de papel mata-borrão e sob uma placa de
madeira para manter a planificação durante a secagem.
Mesmo após a realização de duas etapas de
umidificação e planificação, o documento ainda
apresentava um alto grau de enrijecimento e a
planificação ainda não tinha alcançado um resultado
satisfatório. Para solucionar este problema, durante a
liberação de vapor de ultrassom, foram colocados na
câmara, recipientes com uma solução de álcool etílico
absoluto P.A. e glicerina. A glicerina foi utilizada com
o objetivo de potencializar a reidratação do
pergaminho. O álcool foi empregado para facilitar a
penetração da glicerina. Ao final do processo pode-se
perceber que os resultados alcançados foram
insatisfatórios, principalmente porque se observou um
leve enrijecimento do documento e um pequeno
desprendimento da tinta branca.
Descartadas as possibilidades de reidratação
utilizando a mesa de umidificação, foi aplicada uma
camada de polietilenogligol 10% em álcool etílico
P.A., em ambos os lados do diploma. Após a aplicação,
o documento foi colocado entre folhas de papel mataborrão e pranchas de madeira. Após 24h, pode-se
perceber que a utilização de polietilenoglicol levou a
reidratação do documento de forma satisfatória,
melhorando sua aparência e possibilitando sua
planificação apenas com a utilização das placas de
madeira.
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
Aplicação de polietilenoglicol 10%.
Fotos: Ana Cristina Santoro
O suporte do documento apresenta áreas de dobras
e vincos. Para planificar estas áreas, foi aplicada suave
fricção com espátula de Teflon®. Durante este
procedimento observou-se instabilidade e leve
desprendimento da tinta branca. Por este motivo o
procedimento foi interrompido e aplicou-se uma nova
camada da solução de polietilenoglicol 10% em álcool
etílico P.A. O diploma foi recolocado em um
“sanduíche” de papel mata-borrão entre placas de
madeira. Após a secagem, a camada pictórica se
estabilizou e o tratamento das dobras foi reiniciado.
Finalizado o procedimento acima, iniciou-se a
limpeza do documento, utilizando-se álcool etílico P.A.
a 70% em água deionizada. Esta solução foi aplicada
com um swab, partindo do verso do diploma. A
limpeza apresentou resultados satisfatórios. Entretanto,
na frente do documento, foi possível apenas realizar
uma limpeza parcial, visto que, a tinta preta era
facilmente solubilizada. Por este motivo, a limpeza foi
feita apenas nas bordas e nas partes brancas que não
possuíam impressão.
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
Após a limpeza observou-se que o suporte
enrijeceu-se, possivelmente pelo uso do álcool, como
já tinha ocorrido durante o procedimento realizado na
mesa de sucção e umidificação. Sendo assim, o
tratamento de hidratação com polietilenoglicol 10% em
álcool etílico P.A foi repetido. Neste momento, o
documento foi colocado entre pranchas de madeira e
levado à prensa, para concluir a planificação,
principalmente das áreas com grandes vincos e
amassados. Para melhor observar as reações das tintas
com a solução e afastar os riscos de novos
desprendimentos, o documento foi colocado entre
folhas de papel mata-borrão e de telas do tipo pelon
(entretela sem goma). Primeiramente, aplicou-se pouca
pressão com a prensa, retirando o documento para
observação a cada 5 minutos. Ao final da primeira
hora, não se notou nenhum desprendimento. Por esse
motivo, foi possível aumentar a pressão aplicada com a
prensa.
Para o tratamento dos rasgos e consolidação do
suporte, foram utilizados pedaços de pergaminho novo.
Entretanto, foi preciso trabalhar o pergaminho novo,
visando alcançar uma espessura mínima para que,
quando fixado ao documento, não encubra o texto, e
possibilite um acabamento mais delicado e
esteticamente mais satisfatório. Sendo assim, optou-se
por desbastar o pergaminho pelo carnaz, utilizando
lixas e bisturi, até alcançar a menor espessura e
transparência possível. Entretanto, observou-se que o
carnaz possuía uma coloração mais próxima ao
diploma. Por este motivo, o procedimento foi repetido
desbastando o pergaminho pelo lado da flor,
preservando o carnaz ao alcançar a espessura desejada.
Depois de alcançar os resultados desejados, as peças de
pergaminho foram limpas com álcool etílico P.A 70%,
reidratadas com polietilenoglicol 10% em álcool etílico
P.A. e levadas à prensa entre folhas de papel mataborrão até a secagem. Finalmente, pequenos pedaços
do pergaminho tratado foram colados com PVA neutro,
sobre os rasgos que tinham sido previamente alinhados
e planificados com o auxílio de uma espátula de
Teflon®.
Neste momento foi realizada também a
complementação do suporte, utilizando pergaminho
novo colado com PVA neutro. Parte do pergaminho
novo foi desbastada para possibilitar um melhor
encaixe no documento original.
Limpeza do documento.
Foto: Ana Cristina Santoro
Limpeza mecânica.
Fotos: Ana Cristina Santoro
Tratamento de rasgo.
Fotos: Ana Cristina Santoro
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
Tratamento de rasgos nas extremidades de fixação de fita e do selo.
Procedimento importante também para consolidar a estrutura que
naturalmente é frágil, evitando futuros danos.
Foto: Ana Cristina Santoro
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
Para evidenciar o sentido dos três cortes do
diploma, foi colocada uma fita verde e amarela no local
onde, originalmente, existia uma fita com o selo de
autenticidade. A forma de colocação e a escolha da fita
foram determinadas por pesquisas realizadas em outros
diplomas da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro,
entre eles um impresso em 1860 que segue o mesmo
estilo e forma do diploma restaurado, o que,
possivelmente indica que a fita de ambos os diplomas
possua o mesmo estilo. Um diploma posterior,
impresso em 1919, e pertencente ao acervo do Museu
de Pediatria do Rio de Janeiro apresenta estrutura
semelhante, mantendo a fita e o selo com as mesmas
características do diploma impresso em 1860. A
permanência da forma de fixação e estilo da fita por em
período anterior e posterior ao do diploma restaurado
parece tornar evidente que o diploma restaurado seguia
este mesmo padrão, no que se refere à fita e ao selo.
Sendo assim, optou-se por confeccionar uma fita do
mesmo estilo, que foi colocada nos cortes seguindo o
padrão encontrado nos dois diplomas descritos acima.
Entretanto, para evidenciar que se tratava de uma
intervenção, e não de uma fita original, o corte de
arremate da fita foi feito de forma diferente, com
apenas um bico, e não com dois como as fitas dos
diplomas pesquisados. Neste procedimento, foi
utilizada fita de tafetá.
Complementação do suporte..
Fotos: Ana Cristina Santoro
Após a realização de todos os procedimentos
acima, o diploma foi guardado, permanecendo sem
manuseio por aproximadamente 15 dias. Ao final desse
período observou-se um leve ondulamento e suspensão
das bordas. Por este motivo foi reaplicada a solução de
polietilenoglicol, aumentando a concentração para 20%
em álcool etílico P.A. Depois da aplicação, o diploma
foi levado à prensa entre folhas de papel mata-borrão,
pelon e pranchas de madeira. Durante a prensagem
foram tomados os mesmo cuidados da primeira
prensagem, observando-se o documento a cada 5
minutos e aumentando a pressão gradativamente.
Colocação de fita nos cortes pré-existentes (frente e verso).
Fotos: Ana Cristina Santoro
Concluídos
todos
os
procedimentos,
foi
confeccionado um passe-partout utilizando papel
Arquati® com 1 milímetro de espessura. As proporções
do passe-partout também foram pensadas para que a
fita ficasse exposta sobre a parte inferior.
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
CHRISTO, Tatiana Ribeiro. Modelo Espinosa como
alternativa de encadernação de flexível em pergaminho
de obras raras da Biblioteca Nacional do Rio de
Janeiro. Disponível em:
http://www.bn.br/planor/documentos/PUBLICACOES/
ANAISABRACOR/TATIANA.pdf Acesso em
03/05/2010.
Conservação e Restauração de Papel e Pergaminho.
Disponível em
http://arquivologia.multiply.com/journal/item/15
Acesso em 27/05/2010.
CORUJEIRA, Lindaura Alban, Conserve e restaure
seus documentos. Salvador: Itapuâ, 1971
DOCTORS, Marcio (org.) A Cultura do Papel. Rio de
Janeiro: Casa da Palavra, 1998.
Diploma ao final do processo de conservação e restauro.
Fotos: Ana Cristina Santoro
Resultados e Conclusões
Como vimos anteriormente, no início do processo
de restauro, o diploma encontrava-se fragilizado e
comprometido pela falta de conservação preventiva e
pelo armazenamento inadequado. Os procedimentos
realizados foram adotados visando devolver a
integridade física e estética da obra e os resultados
alcançados podem ser considerados satisfatórios. Foi
possível, assim, garantir também, o registro da
representação histórica guardada no documento.
Pretendemos, com este breve artigo, colaborar com
as pesquisas sobre conservação e restauro de
pergaminhos, compartilhando os procedimentos e
resultados alcançados. Vale ressaltar que uma pesquisa
bibliográfica ampla, a elaboração cuidadosa da análise
do estado de conservação e da proposta de trabalho e a
execução criteriosa dos procedimentos de intervenção
garantem o alcance dos objetivos propostos.
Referências
BANDEIRA, Ana Maria Leitão. Pergaminho e papel
em Portugal: tradição e conservação. Lisboa : Celpa ;
BAD, 1995.
CASSARES, Norma C. Como fazer conservação
preventiva em arquivos e bibliotecas. São Paulo:
Arquivo do Estado/Imprensa Oficial, 2000. Disponível
em:
http://www.arquivoestado.sp.gov.br/saesp/texto_pdf_1
4_Como%20fazer%20conservacao%20preventiva%20
em%20arquivos%20e%20bibliotecas.pdf Acesso em:
27/05/2010.
_______________. A Ciência na Conservação. In:
Diálogos: Conservação de Acervos de Bibliotecas.
São Paulo, 2008.
DOMINGOS, Sónia. Procedimentos básicos para
conservação de documentos com suporte em
pergaminho. Disponível em:
http://www.bn.br/planor/documentos/PUBLICACOES/
ANAISABRACOR/TATIANA.pdf Acesso em
27/05/2010.
DUREAU, J. M. e CLEMENTS, D. W. Princípios
para Conservação e Restauração de Espécies
Bibliográficas. Lisboa: Biblioteca Nacional, 1992.
Disponível em:
http://books.google.com.br/books?id=naS4zXYXlyoC
&pg=PA25&lpg=PA25&dq=conserva%C3%A7%C3
%A3o+de+pergaminho&source=bl&ots=hDeJrQb3GE
&sig=Q9KH-WELycPAS414p4abSGQhokU&hl=ptBR&ei=WCH_S5CtDYKmuAeZ07X3DQ&sa=X&oi=
book_result&ct=result&resnum=4&ved=0CBEQ6AE
wAzg8#v=onepage&q=conserva%C3%A7%C3%A3o
%20de%20pergaminho&f=false Acesso em
27/05/2010.
Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de
Janeiro. In: Dicionário Histórico-Biográfico das
Ciências da Saúde no Brasil (1932-1930). Rio de
Janeiro: Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz. Disponível
em
http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br/iah/P/verbet
es/escancimerj.htm Acessado em 01/04/2010.
História da Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Disponível em
http://www.medicina.ufrj.br/colchoes.php?id_colchao=
1 Acessado em 01/04/2010.
KOELLER, Gustavo Kraemer. Tratado de la Prevision
del Papel y de la Conservacion de Bibliotecas y
Archivos. Madri: Serviço de Publicaciones del
Ministerio de Educación y Ciencia, 1973
LIMA, Alberto F.; RODES, Leopold; PHILIPP, Paul.
Alguns dados sobre a história do papel. In:
D’ALMEIDA, Maria Luiza O. (coord.) Celulose e
papel. Vol. 1. Tecnologia de fabricação de pasta
celulósica. IPT. São Paulo, 1998, p. 2-5.
MENDES, Marylka e BATISTA, Antônio Carlos N.
(orgs.). Restauração: Ciência e Arte. Rio de Janeiro:
Editora da UFRJ / IPHAN, 1998.
Revista Brasileira de Arqueometria, Restauração e Conservação - ARC - Vol. 3 - Edição Especial
Curso de Introdução a Conservação e Restauro de Acervos Documentais - CICRAD - Trabalhos de fim de Curso
MINISTÈRE DE LA CULTURES ET DE LA
COMMUNICATION. Des textes effacés
réapparaissent sous fluorescence d’ultraviolet. In:
_____________ La vie mystérieuse dês chefs-d’ouvre:
La science au service de l’art. Paris: Editions de La
Reunion des Musées Nationaux, 1981, p.221-222.
NAVA, Pedro. Beira Mar. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1985.
Pergaminho. In: Glossário de Tipografia. Disponível
em http://tipografos.net/glossario/pergaminho.html
Acessado em 02/04/2010.
PORTAL DA IMPRENSA NACIONAL. A Imprensa
Nacional. Disponível em:
http://portal.in.gov.br/in/imprensa1/a-imprensanacional/ Acesso em: 13/05/2010.
RIBEIRO, João Pedro. Dissertações chronologicas e
criticas sobre a historia e jurisprudencia ecclesiastica
e civil de Portugal. Lisboa: Academia Real das
Sciencias, 1810, 5 v. Disponível em
http://purl.pt/12115 Acessado em 30/03/2010.
VALLE, Clarimar Almeida. Subsídios para uma
Política de Preservação e Conservação de Acervos em
Bibliotecas Universitárias Brasileiras. Brasília: UnB,
1991
E-mail da Autora
[email protected]
Copyright © 2011 AERPA Editora
Convênio AERPA - CFDD do Ministério da Justiça - no 748319/2010
Download

CONSERVACAO E RESTAURO DE PERGAMINHOS UM