Startup Garagem : Um programa de desenvolvimento de empreendedores Leandro Pompermaier1; Rafael Prikladnicki2; Flavia Cauduro3 Resumo Este trabalho apresenta o programa Startup Garagem sob o ponto de vista da formação do empreendedor. O programa criado pela incubadora RAIAR, sediada no parque científico e tecnológico da PUCRS, visa munir os novos empreendedores com ferramentas e conhecimento necessário para qualquer pessoa que queira abrir sua startup. O programa está separado em três fases principais: O desenvolvimento de um autoconhecimento e da identificação do problema e clientes, utilizando como base o quadro de validação. Depois dessa fase, os empreendedores iniciam o trabalho de construção dos seus modelos de negócio, usando o Business Model Canvas. Na fase final, assuntos relacionados à estruturação de negócios como, por exemplo, estrutura social, contabilidade, marcas e patentes, entre outros, são abordados. Palavras-chave: startup, modelagem de negócio, empreendedor Abstract This paper aims at presenting the Startup Garage program from the point of view of the entrepreneur formation. The program created by RAIAR incubator located in science and technology park of PUCRS (TECNOPUC) aims to equip the new entrepreneurs with tools and knowledge in order to open a startup. The program is divided in three main phases: first, there is the development of a selfknowledge and identification of the problem and customer, using as a base the validation board. After this phase, the entrepreneurs start the process of building their business models, through the business model canvas. And in the last phase, the participants deal with issues related to business structure as, for example, legal contract, accounting, trademarks and patents, among others are addressed. Keywords: startup, business modeling, entrepreneur 1 Professor da Faculdade de Informática da PUCRS e Assessor Estratégico TECNOPUC/Incubadora RAIAR - [email protected] 2 Professor da Faculdade de Informática da PUCRS e Diretor do Parque Científico e Tecnológico da PUCRS (TECNOPUC) [email protected] 3 Gerente da Incubadora RAIAR da PUCRS - [email protected] 1. Introdução Empreendedores são importantes para o progresso econômico e social de uma sociedade e a universidade é o local propício para a formação dos mesmos. Estes indivíduos são normalmente vistos como inovadores, geradores de novas ideias ou processos de negócio. Várias estruturas aparecem com o objetivo de alavancar empreendimentos, sejam em incubadoras de negócios, aceleradoras ou até mesmo em espaços de coworking. Porém, quando se analisa o principal elemento desses empreendimentos, o empreendedor, vê-se uma lacuna nas ferramentas e ambientes que podem auxiliar na sua formação. Através da análise desta lacuna, criou-se no TECNOPUC, o Parque Científico e Tecnológico da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), dentro da sua incubadora de empresas, a incubadora RAIAR, um programa voltado para o desenvolvimento deste empreendedor muito antes dele ter a sua empresa formalmente constituída: o Startup Garagem. Na incubadora RAIAR, o Startup Garagem é um espaço de acolhimento de ideias e projetos de base tecnológica e inovação. Também é um ambiente que propicia o amadurecimento e o detalhamento do projeto apresentado, incentivando a concretização de um negócio. No programa são acolhidos empreendedores e grupo de empreendedores oriundos das unidades acadêmicas da PUCRS, que ainda não iniciaram suas empresas e buscam apoio para desenvolver um modelo de negócios. Peter Thiel, fundador o PayPal e investidor do Facebook, afirma que o próximo Bill Gates não criará um sistema operacional, que o próximo Larry Page ou Sergey Brin não criará uma sistema de buscas e que o próximo Mark Zuckerberg não criará uma rede social (THIEL, 2014), pois os verdadeiros empreendedores não copiam negócios, inovam. E este programa, o Startup Garagem, auxilia o empreendedor a pensar em inovação, seja no âmbito pessoal, seja no âmbito de modelo de negócio. Um programa gratuito que conta com a participação intensa dos empreendedores e que busca a experiência e sabedoria de mentores que são profissionais e empresário de sucesso fazem do Startup Garagem um espaço de transformação, transformação de ideias e projetos em modelos de negócios, transformação de pessoas com ideias em empreendedores. Este artigo está organizado da seguinte forma: na seção 2 são apresentados os principais conceitos relacionados à constituição deste programa. Na seção 3, o programa Startup Garagem é detalhado na sua metodologia e nos resultados obtidos. Por fim, as considerações finais são apresentadas. 2. Revisão da Literatura O sucesso de um negócio é dado por vários fatores, mas o grande determinante desse sucesso é o empreendedor e seu perfil de transformar problemas em oportunidades. Muitos conceitos e ferramentas são apresentadas no mercado e utilizadas por eles na sua formação e na consequente criação dos seus negócios. Conceitos como Lean Startup, validação de cliente e o Business Model Canvas são alguns que norteam este trabalho e aqui são apresentados de forma sucinta. 2.1 Lean Startup A Lean Startup é a forma prática de implementar a cultura de aprendizado necessária para as empresas nascentes, principalmente para o caso das empresas de software (RIES, 2011). Essa filosofia se transformou em um mantra entres os empreendedores, principalmente aqueles que têm suas soluções baseadas em tecnologia. Esta abordagem baseia-se na combinação dos seguintes itens (RIES, 2011): - Customer Development: Processo detalhado para testar e validar hipóteses sobre clientes, produto e mercado. - Desenvolvimento Ágil: Aplicação de metodologias tais como eXtreme Programming (XP) e Scrum (ajustadas para o ambiente das Startups) que possibilitam grande redução do tempo de cada iteração de desenvolvimento, aumentando a velocidade do aprendizado através de feedback real dos clientes/usuários. - Plataforma Tecnológica como commodity: Uso de serviços, frameworks e tecnologias diversas (ex. WordPress, Amazon EC2, Google Adwords, Ruby on Rails, só para citar alguns), que garantem baixo custo e uma agilidade sem precedentes na construção de produtos de base tecnológica. Resumindo, a Lean Startup parte do princípio que tanto o Problema (necessidade do cliente) quanto a Solução (produto) são desconhecidos, e que a descoberta de ambos é um processo iterativo que aglutina o desenvolvimento do produto com atividades de Customer Development, seja por investigação qualitativa (entrevistas, testes de usabilidade, etc.) ou por experimentação quantitativa com software em produção com clientes reais. 2.2 Customer Development Customer Development é uma técnica usada pelas startups para rapidamente iterar e testar parte do seu modelo de negócio (BLANK, 2012). O método de Customer Development divide todas as atividades relacionadas aos clientes assim: Customer Discovery (Descoberta do Cliente), Customer Validation (Validação do Cliente), Customer Creation (Criação de Cliente), Company Building (Construção da Empresa). Figura 1 - O processo de desenvolvimento do cliente Fonte: BLANK, 2012 Para Blank (2012), um dos ensinamentos mais importantes do Customer Development é sair do escritório e conversar com clientes, deixar a zona de conforto de uma sala de reunião e ir atrás deles para aprender sobre os seus problemas. Essa conversa levanta detalhes que serão necessários para construir um produto de sucesso. É muito importante conhecer o usuário para evitar “achismos” e deduções. De acordo com (TREDER, 2013) há a necessidade de encontrar clientes além da tela do computador. Para isso é necessário “transcender os limites do seus ego”. De acordo com (BLANK, 2012) o desenvolvimento de clientes possui 14 princípios que são denominados Customer Development Manifesto. Esses princípios são utilizados como base para a concepção da metodologia do Startup Garagem (BLANK, 2012): 1 – Não existem fatos dentro do seu prédio, então saia: Uma startup nasce baseada na fé e visão dos seus fundadores, que ao longo do tempo devem traduzir essa visão e hipóteses em fatos. Contudo, os fatos estão onde os clientes vivem e trabalham, fora da zona de conforto da startup. Logo, é lá onde o empreendedor precisa estar. Não existe nada mais fundamental para o desenvolvimento de cliente e também nada mais difícil de realizar. É muito mais fácil codificar, fazer reuniões e escrever relatórios do que encontrar e ouvir os clientes. 2 – Combine desenvolvimento de cliente com desenvolvimento ágil de software Customer Development não surtirá efeito se o time de desenvolvimento de produto não conseguir iterar com velocidade e agilidade. Uma startup que adota metodologias ágeis de desenvolvimento é projetada para continuamente capturar as entradas dos clientes e entregar um produto que interage facilmente em torno do MVP (Minimum Viable Product – Mínimo Produto Viável). 3 – O fracasso é parte integrante da procura pelo seu modelo de negócio Em uma startup o empreendedor está em constante busca, não executando um modelo de negócio. E a única forma de encontrar o caminho correto é executar vários experimentos, o que, de certa forma, levará o empreendedor a seguir diversos caminhos errados. O fracasso é parte do processo. Fracassos não são verdadeiros fracassos por si só, mas uma parte integrante do processo de aprendizagem de uma startup e de seu empreendedor. 4 – Faça iterações contínuas e pivots A estratégia para abordar a falha no Customer Development exige frequência, iterações ágeis e pivots. Um pivot é uma mudança substancial em um ou mais dos blocos do modelo de negócios como, por exemplo, uma mudança no preço de freemium para assinatura ou no segmento de clientes de adolescentes para idosos. Pivots são impulsionados pelo aprendizado e percepção a partir de um fluxo contínuo de testes que são executados em toda descoberta e validação. Os melhores empreendedores não hesitam em fazer mudanças, eles admitem quando suas hipóteses estão erradas e adaptam. 5 – Nenhum plano de negócios sobrevive ao primeiro contato com os clientes Só existe uma razão para planos de negócios serem utilizados: algum investidor que veio de uma escola de negócios e não conhece alternativa melhor. Empreendedores muitas vezes confundem seu plano de negócios com um livro de receitas, não reconhecem que ele é apenas uma coleção de hipóteses não comprovadas. A diferença entre um estático plano de negócios e um dinâmico modelo de negócios pode muito bem ser a diferença entre extinção e sucesso. Startups não deveriam planos de negócios e adotarem modelo de negócios. 6 – Elabore experimentos e testes para validar suas hipóteses Para transformar hipóteses em fatos, empreendedores precisam sair do prédio e testá-las com os clientes. Testes e aprendizagem exigem cuidado na construção e elaboração dos experimentos. Além disso, um pensamento comum de fundadores técnicos é que estes experimentos têm de ser com código real, hardware ou produto construído. Sendo que na maioria das vezes pode-se criar um mockup, um demo ou um protótipo físico para obter um aprendizado valioso. 7 – Concordem no tipo de mercado O mercado influencia em tudo que uma empresa faz, estratégias e ações que funcionam para um tipo de mercado raramente funcionam para outro. O tipo de mercado determina as atividades e gastos que a startup terá para aquisição e feedback dos clientes. As necessidades dos clientes também são diferentes, assim como as taxas de adoção, funcionalidades do produto, posicionamento, estratégias para lançamento, canais, atividades etc. Em resumo, diferentes mercados exigem diferentes estratégias para descoberta, dos produtos mínimos viáveis e vendas. 8 – As métricas de uma startup diferem das métricas de empresas que já existem As métricas utilizadas por uma startup devem focar no progresso da mesma e em converter palpites e hipóteses em fatos incontestáveis ao invés de medir a execução de um plano estático. 9 – Tomada de decisões rápida, tempo de ciclo, velocidade e ritmo A única certeza para uma startup é que o fluxo de caixa diminui a cada dia. Nesse contexto a velocidade importa muito. O princípio quatro discorre sobre iterações e pivots, mas não especifica quanto tempo devem durar. Se os ciclos acontecem muito devagar, a startup fica sem dinheiro e fracassa. 10 – Paixão é tudo Uma startup sem motivação e sem pessoas apaixonadas já nasce morta. “Startupeiros” são diferentes, pensam diferente. Suas mentes estão preparadas para o caos, incertezas e mudanças. São irracionalmente focados nas necessidades dos clientes e em entregar produtos formidáveis. Eles não fazem diferença entre suas vidas e o trabalho. 11 – Os títulos e funções numa startup são muito diferentes dos de uma grande empresa Em uma grande empresa os títulos refletem a forma como as atividades são organizadas para a execução de um modelo de negócios conhecido. Comparada com as grandes empresas, as startups precisam de profissionais completamente diferentes; precisam de profissionais que se sintam confortáveis com incertezas, caos e mudanças. 12 – Preserve todo o dinheiro enquanto estiver procurando O processo de Customer Development preserva o dinheiro para não desperdiçar em contratações de vendedores e pessoal de marketing até estar com as hipóteses transformadas em fatos e ter encontrado um ajuste viável entre seu produto e o mercado. Quando a startup encontrar um modelo repetitivo e escalável será o momento de investir tudo para criar demanda e conduzir os clientes nos canais de vendas. 13 – Comunique e compartilhe o aprendizado Uma parte importante da filosofia de “aprendizado e descoberta” do Customer Development é compartilhar tudo que foi aprendido no contato com os clientes com os funcionários, fundadores e investidores. É fortemente recomendado que os empreendedores mantenham e compartilhem as descobertas num blog ou outra ferramenta de gestão. 14 – O sucesso do Customer Development começa com seus co-fundadores e investidores comprando a ideia A filosofia de “aprendizado e descoberta” do Customer Development pode ser extremamente desorientadora para um empreendedor, engenheiro ou investidor que passou toda sua carreira executando um plano. Para o Customer Development ter sucesso, todos na equipe precisam entender e concordar que o processo de Customer Development é diferente do que conhecem e dominam. Todos precisam aceitar o processo e reconhecer que essa é uma busca não linear, para um modelo de negócios, que as vezes pode durar anos. 2.3 Business Model Canvas O modelo de negócio é um conceito relativamente novo que está associado principalmente com a "era da internet” (CHESBROUGH, 2002) . Em outras palavras, modelo de negócio pode ser descrito como um modelo conceitual abstrato, que representa o negócio e a forma de como este será rentável (OSTERWALDER, 2010). O Business Model Canvas (BMC) é uma estrutura simplificada de um plano de negócios que permite a visualização dos principais pontos estratégicos de um novo negócio. Figura 2 - Business Model Canvas Fonte: OSTERWALDER, 2010 Ele é constituído por nove elementos que fornecem uma visão bastante coerente de um negócio. São eles: Segmentos de Clientes Definem diferentes grupos de pessoas ou organizações que uma empresa pretende alcançar e servir. Proposições de Valor Descreve os pacotes de produtos e serviços que criam valor para um segmento de clientes específico. A proposição de valor é a razão pela qual os clientes escolhem uma empresa em detrimento de outra Canais: Os canais implicam na forma como uma empresa se comunica com seus segmentos de clientes para oferecer uma proposta de valor. Relacionamento com o Cliente: O elemento de relacionamento com o cliente descreve os tipos de relações de uma empresa estabelecer com segmentos específicos de clientes. A empresa deve esclarecer o tipo de relação que pretende estabelecer com cada segmento de clientes. Fontes de receita: A renda que uma empresa gera com cada segmento de clientes é representada no quadro fontes de receita do modelo de negócios. Atividades principais: Cada empresa precisa realizar uma série de atividades para cumprir com êxito as necessidades do cliente. As atividades principais são aquelas atividades que são de extrema importância para o empresa e deixá-lo funcionar com êxito. Recursos chave: Cada modelo de negócio requer ativos ou recursos-chave para permitir que uma empresa possa criar e oferecer uma proposição de valor, alcançar os mercados, manter relações com segmentos de clientes e ganhar receitas. Parcerias-chave As parcerias-chave constituem a rede de fornecedores que fazem o trabalho do modelo de negócio. Geralmente existem três razões para a criação de parcerias: otimização e economia de escala, redução de risco e incerteza e aquisição de recursos e atividades particulares. Estrutura de Custos: O elemento de estrutura de custo descreve todos os custos incorridos para operar um modelo de negócio. 3. Startup Garagem O desenvolvimento de um empreendedor passa por ele conhecer as melhores ferramentas que possam auxilá-lo nas fases de transformação das suas ideias em negócios. Desta forma, o Startup Garagem trabalha com diversas atividades durante o período de três meses com o principal objetivo de formação do empreendor. Abandonando o conceito de sala de aula e aulas expositivas, a principal inovação do programa é o trabalho hands-on dos participantes com a guia dos mentores que os auxiliam com conhecimento e experiência. O programa Startup Garagem foi criado com o intuito de auxiliar alunos, professores e pesquisadores na transformação das ideias em modelos de negócio. Mas muito mais do que isso, transformar a atitude empreendedora e fazer com que as pessoas participantes do programa possam pensar e fazer diferente. Na sua primeira edição houve uma grande procura e o número de inscritos foi de 119, e destes 45 foram selecionadas (o que envolveu 20 projetos). A seleção foi realizada com base nos seguintes critérios: atender aos requisito da chamada, entregando toda a documentação requerida clareza na exposição das ideias tratar-se de um projeto inovador e de base tecnológica Mesmo os dois pontos finais sendo considerados subjetivos, eles foram essenciais para que a incubadora escolhesse os participantes. No quesito de clareza de exposição de ideias, os novos empreendedores deveriam em um texto de 140 caracteres apresentar a ideia principal do negócio. Ou seja: com poucas palavras eles deveriam vender sua ideia (aqui o primeiro desafio para o empreendedor). No último item, relacionado a projeto inovador e de base tecnológica, procurou-se definir um filtro para ideias que pudessem mostrar alguma inovação (de produto ou processo) e que fossem trabalhados com alguma tecnologia. Alinhando-se assim com a incubadora RAIAR. Com essa chamada, nove diferentes unidades acadêmicas tiveram projetos encaminhados para o Startup Garagem (figura 3) e, entre os escolhidos, sete foram contempladas. Figura 3 - Unidades Acadêmicas O Startup Garagem está separado em três fases principais: O desenvolvimento de um autoconhecimento e da identificação do problema e clientes. Depois dessa fase, os empreendedores iniciam o trabalho de construção dos seus modelos de negócio. 3.1 Fase 1 - Autoconhecimento e identificação do problema e clientes Na primeira fase, em que os novos empreendedores são instigados a pensar sobre o problema a ser resolvido e sobre seus possíveis clientes, os mentores utilizam a abordagem do Customer Development e para a criação dos experimentos há o uso do quadro de validação. Com a ajuda dos mentores, eles são motivados a validarem seus experimentos e iniciarem um processo de validação. Basicamente, há uma interação entre empreendedores e possíveis clientes e com base nisso dados são coletados e com esses as decisões são tomadas. Muito além da validação do problema e conhecimento dos clientes está o aprendizado dos empreendedores de como conhecer o mercado. Nessa etapa, muitos empreendedores iniciam a discussão com seus pares sobre o problema e vários percebem que os discursos iniciais e os pensamentos estavam sempre focados na solução. Com o auxílio do mentor, eles percebem a necessidade de validar hipóteses junto ao possível cliente. Assim, o primeiro experimento é criado no primeiro encontro sem o foco na solução e o desafio para esses empreendedores é ir para o encontro com os possíveis clientes e validar a hipótese levantada, os seja, existe realmente o problema para aquele grupo de pessoas? No segundo encontro, muitos relatam os esforços em quebrar barreiras de conversar com pessoas que eles entendiam ser possíveis clientes, e descobrir nas primeiras entrevistas que algo não estava se encaixando. Com este aprendizado eles iniciam a construção de um segundo experimento, mudando o nicho de clientes e/ou problema. Repetem o processo de validação deste novo experimento, buscando refinar a ideia e validar a solução que eles entendem ser importante para o nicho de clientes que eles estão querendo atender. Os 14 itens do manifesto do Customer Development (apresentado na seção 2.2) são utilizados na íntegra nesta fase do Startup Garagem. Cada sessão de mentoria para a descoberta do cliente fortalece esses princípios e mostra que muito mais que uma solução, uma empresa precisa de uma missão. E esta missão é aqui descoberta através do entendimento de qual problema será solucionado. Existem várias tentativas na literatura para caracterizar o empreendedor em relação ao seu comportamento e suas características, incluindo a cultura, tipo de envolvimento da família, história de vida, realizações, habilidades, crenças, estilo, motivações, valores, visão de futuro, propósitos de vida e a maneira como eles conduzem o processo de tomada de decisão a respeito de sua carreira e, particularmente, seu perfil psicológico. Segundo (BRZOZOWSKI, 2011) os principais instrumentos que podem definir o perfil psicológico de acordo com a abordagem proposta por Carl Gustav Jung são: o GrayWheelwright, o MBTI (Myers Briggs Type Indicator), e o QUATI (Tipológica Assessment Questionnaire), que são utilizados como recursos para a avaliação aspectos psicológicos da personalidade em áreas clínicas, educacionais e organizacionais. Com ajuda de testes baseados no MBTI (BRZOZOWSKI, 2011) e conversas com conselheiros de carreiras os participantes iniciam um entendimento do seu próprio perfil, dos sócios e de como eles podem utilizar suas forças e trabalhar suas fraquezas em prol dos seus empreendimentos. Um empreendedor é uma pessoa que integra recursos humanos e econômicos para criar produtos e serviços que geram valor (BAUM, 2007). Este empreendedor alcança o sucesso dos seus empreendimentos por diversos motivos: pessoal, organizacional e elementos externos. De acordo com (DUCKER, 1987), o empreendedor é o principal ator do desenvolvimento econômico. Todo empreendedor, principalmente na sua primeira experiência, tem dúvidas ou desconhecimento do seu potencial e de como ele tratará das variabilidades que ele encontrará durante a criação do seu negócio. Com a experiência dos mentores e algumas dinâmicas eles começam a se conhecer melhor e também a alinhar parcerias e sociedades que possam ser complementares para o negócio. 3.2 Fases 2 - Modelo de Negócios A segunda fase é focada no desenvolvimento do modelo de negócios com base nos aprendizados da primeira fase e utilizando como ferramenta principal o Business Model Canvas. Esta ferramenta fornece uma alternativa para um plano de negócios tradicional, principalmente nas fases iniciais do empreendimento. E pela forma visual de criação, melhora o entendimento do negócio fazendo com que o empreendedor tenha mais foco no negócio e flexibilidade para as mudanças que sempre são necessárias. Com base no aprendizado da primeira fase e o entendimento do problema, da solução e do nicho de clientes a ser atendido, os empreendedores chegam nessa fase mais maduros e esse conhecimento facilita a criação do modelo de negócios. Todo os nove elementos do Business Model Canvas apresentado na seção 2.3 são abordados e trabalhados. O foco das atividades é dado em termos de: • Articular a proposição de valor • Identificar um segmento de mercado • Definir a estrutura da cadeia de valor dentro da empresa necessária para criar e distribuir o produto/serviço oferecido e determinar os ativos complementares necessárias para apoiar a posição da empresa nesta cadeia • Estimar a estrutura de custos e potencial de lucro de acordo com a oferta • Formular a estratégia competitiva através da qual a empresa inovadora ganhará e manterá vantagem sobre as rivais Um dos principais itens abordados nessa parte do programa foi a definição da proposta de valor. A proposição de valor define como itens de valor (do produto e características do serviço, bem como serviços complementares) são embalados e oferecidos para atender as necessidades do cliente (KAMBIL, 1996). Esta proposição ajuda a empresa no seu posicionamento em uma determinada indústria. Com esta proposta de valor definida, os empreendedores buscam selecionar os melhores canais para trabalhar e assim entregar o valor aos seus clientes. Um canal de distribuição descreve como uma empresa se comunica com e atinge os seus segmentos de clientes para oferecer uma proposição de valor (OSTERWALDER, 2010). Ainda nessa fase, um workshop de pitch é feito com o intuito de preparar os participantes a apresentarem suas ideias para diferentes públicos. A estrutura do pitch é apresentada e com eles são trabalhadas apresentações de 1 minuto, 2 minutos, 5 minutos, 15 minutos. E também o uso ou não de recurso visual durante a apresentação. 3.3 Fases 3 - Estrutura do negócio Na última fase, a estrutura do negócio é discutida. Mentores que são contadores de empresas consolidadas, advogados especializados em questões societárias e tributação de empresas nascentes e profissionais que trabalham com proteção intelectual auxiliam os empreendedores em temas úteis para que eles possam dar os primeiros passos como empresários. Além disso, workshop de treinamento de mídia e o posicionamento em redes sociais (pessoal ou corporativo) também são trabalhados. Na parte relacionada à propriedade intelectual, os mentores abordam a estrutura da universidade que apoia empresas incubadas na RAIAR e seus serviços. Além disso, apresentam os principais conceitos da área, entre eles patente, marca registrada, direitos do autor, desenho industrial, entre outros. Discussões dos diversos projetos do programa são abordadas e os mentores são questionados sobre detalhes de proteção. Com os profissionais do direito, assuntos ligados aos contratos sociais, contratos entre empresas e fornecedores e o marco civil da Internet são abordados. Estes assuntos se complementam ao discutido e apresentado pela área de contabilidade. De um lado, advogados mostrando deveres legais sobre tributação da empresa e de outro o contado apresentando as principais ferramentas de gestão financeira e contábil de uma empresa (demonstração do resultado do exercício, fluxo de caixa, etc.). No treinamento de mídia e no posicionamento em redes sociais os participantes recebem conhecimento e praticam como eles devem ser comportar como porta-vozes de suas empresas em diferentes tipos de mídia (TV, rádio, Internet, etc). Para o fechamento do programa, um evento chamado Pitch Day (figura 4) é realizado com a presença da comunidade empresarial, incluindo aceleradores, gestores de fundos de investimento, investidores anjo e ativistas do empreendedorismo local. Figura 4 - Pitch Day Cerca de 100 pessoas, entre investidores, representantes do setor empresarial, empresários do TECNOPUC e da incubadora RAIAR, professores e alunos da PUCRS e profissionais da Rede Inovapucrs acompanharam os pitches, realizados no Museu de Ciências e Tecnologia da PUCRS, no dia 8 de dezembro de 2013. Neste dia, cada grupo executou um pitch de 2 minutos e os três melhores receberam o prêmio de utilizar o espaço de coworking da incubadora RAIAR por um período de três meses gratuitamente. A avaliação dos grupos aconteceu em três momentos diferentes durante o programa. Em todo esse marcos os grupos foram avaliados. Na primeira fase o aprendizado e as validações do problema foram considerados e nas duas últimas etapas, questões relacionadas com o modelo de negócio, tais como mercado-alvo, concorrentes, o custo versus receita, parceiros, etc., e da inovação empresarial existente fecharam a pontuação final do projeto. Mentores, profissionais envolvidos na incubadora RAIAR e pessoas envolvidas no ecossistema do empreendedorismo na cidade, realizam tal análise. Muito mais que um programa de formação de empreendedores, o Startup Garagem se transformou em uma referência de formação de negócios. Um exemplo disso foi o interesse de uma importante rede de televisão que acompanhou os projetos durante os três meses de execução e mostrou em um programa, estilo reality show, todas as sextas-feiras ao meio-dia. E a divulgação dos vencedores foi feita ao vivo para todo o estado do Rio grande do Sul. 4. Considerações Finais Um programa voltado para o desenvolvimento e instrumentação dos novos empreendedores é algo fundamental e peça estratégica de uma incubadora que integra um ecossistema de uma universidade, como é o caso da Incubadora RAIAR. Neste artigo, o Startup Garagem foi apresentado e importantes pontos foram aprendidos durante a primeira edição do mesmo. Em um primeiro lugar, o empreendedor sendo o foco do programa fez com que a pressão existente na sociedade pelo sucesso fosse retirada dos participantes. E mentorias que trabalham o perfil empreendedor, o relacionamento com os sócios, o autoconhecimento mostrou-se como a principal base para a criação de uma atitude empreendedora. A instrumentação desses empreendedores, com mentirosa utilizando o quadro de validação e o Business Model Canvas foi essencial para que cada integrante dos grupos pudesse entender melhor o seu empreendimento, seus riscos e principalmente as hipóteses que deveriam ser trabalhadas para o sucesso do mesmo. E, por fim, o trabalho com apresentações (pitches) culminando na apresentação final para a comunidade no evento Pitch Day apresentou para a sociedade a maturidade alcançada por cada participante o programa. E com isso, mostrou que o objetivo principal do Startup Garagem que é o de auxiliar a formação do empreendedor teve êxito. Muito mais que um programa de formação e instrumentalização dos empreendedores, o Startup Garagem se posiciona dentro do ecossistema da universidade como uma etapa importante da construção da atitude empreendedora. Essa atitude pode ser analisada em cada encontro com os mentores e com os próprios grupos participantes. A colaboração entre eles, a procura incansável por mais informação, o entendimento de que o empreendedor é a peça chave de qualquer empreendimento torna a experiência no programa algo único e a com forte contribuição para o crescimento pessoal de cada um. Referências BAUM, J. R.; FRESE M.; BARON, R. A. The Psychology of Entrepreneurship. Mahwah, New Jersey: Lawrence Erlbaum Publishers. 2007 BLANK, Steve; DORF, Bob. The Startup Owner’s Manual: The step-by-step guide for building a great company. California, 2012 BRZOZOWSKI, Ricardo P. Psychological type of the individual entrepreneur: A study of the predominant psychological type in entrepreneurs, according to the MBTI. 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