O que podem os países africanos aprender com o
desenvolvimento e crescimento inclusivo no Brasil?
Trabalho de pesquisa:
Tributação, redistribuição e o contrato social no Brasil
Resumo
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O Brasil conseguiu um espantoso crescimento em receitas fiscais de 7 pontos percentuais
como uma percentagem do PIB entre 1995 e 2010, um crescimento de 26,9% em 1995
para 34% em 2010.
O desenvolvimento das finanças públicas deu ao Brasil a capacidade fiscal de procurar
abordagens inovadoras para a redistribuição, através de políticas sociais e de
desenvolvimento. O aumento da relação imposto/PIB é provavelmente a base do
‘Modelo de Desenvolvimento’ brasileiro.
O aumento das receitas não é o resultado de qualquer alteração significativa no código
tributário ou na administração tributária, mas o Brasil colheu os benefícios de uma
reforma abrangente e antecipada em meados da década de 1960.
O recente aumento nas receitas fiscais do Brasil foi possível graças a uma combinação de
democratização, sólidas preferências de redistribuição, coligações entre o centro e a
esquerda fiscalmente responsáveis, e capacidade burocrática.
O recente debate público sobre impostos sugere que um crescimento futuro na relação
impostos/PIB pode ameaçar a sustentabilidade do contrato fiscal.
Colher os louros da reforma tributária na década de 60
Até à descoberta dos campos de petróleo no final de 2000, o Brasil não tinha significativa riqueza
minéria e era uma economia relativamente fechada. Historicamente, o Brasil evitou a maldição dos
recursos e a exposição aos altos e baixos de uma economia mundial globalizante, que afectou
muitos países Latino-Americanos.
O Brasil mostrou ter uma capacidade duradoura para recolher receitas fiscais. As administrações
recentes colheram os benefícios de reformas grossistas levadas a cabo em meados dos anos 60.
Como parte dos seus esforços, em 1966, o governo militar pôs em marcha uma grande reforma fiscal
introduzindo medidas inovadoras que tiveram um grande impacto fiscal. O Brazil adoptou um
moderno código tributário, foi o primeiro país a introduzir o IVA, e renovou a sua administração
fiscal. Nos 7 anos seguintes, a carga fiscal duplicou como percentagem do PIB, chegando aos 26% em
1971.
Não houve reformas fiscais significativas nas décadas de 1990 e 2000 que explicassem o rápido
crescimento fiscal neste período. As alterações nas regras fiscais no período democrático têm sido
adicionais; tipicamente reflectem melhorias na eficiência marginal tecnicamente encorajadas e
respostas fragmentadas a defesa por grupos de pressão.
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Brazil: Tax incidence by decile of per capita household income 2008/9
Indirect taxes/tota income
Figura 1:
direct taxes/total income
all taxes/total income
Fonte de Dados:
Silveira, F. G.; J.
Ferreira; J. Mostafa
e J. A. Ribeiro
(2011),
32
28
25
23
22
23
19
22
18
22
17
16
21
21
15
15
21
21
13
11
10
4
4
1
5
4
2
3
5
4
5
7
6
5
6
8
7
8
9
10
Propostas para que se efectuasse uma reforma fiscal mais substancial nunca chegaram a materializar.
Isso deve-se em parte porque reformas abrangentes necessitariam que a constituição fosse alterada,
o que tem desencorajado qualquer mudança significativa. Os sucessivos governos têm optado por
manter um sistema ineficiente com uma elevada capacidade extractiva em vez de um sistema mais
eficiente com receitas incertas no futuro.
Além disso, os legisladores são todos da mesma opinião de que objectivos redistributivos são melhor
garantidos através dos gastos e não através de impostos.
O actual sistema tributário brasileiro está cravado de ineficiências e complexidade. Em termos
distributivos, os sistema fiscal é neutro no sentido em que as taxas de imposto são mais ou menos
semelhantes transversalmente à distribuição de rendimentos, conforme mostra a Figura 1. A
progressividade de impostos directos é neutralizada pela regressividade de impostos indirectos.
A estrutura do sistema fiscal brasileiro
Brazil - Tax/gdp ratio 1994-2010
Tax/GDP ratio exc. Soc. sec. conts
Tax/GDP ratio inc. soc. Sec. conts.
Data Source: Base
CIAT-BID
32.30
31.68
33.54
33.52
27.21
27.11
34.22
34.30
27.66
27.67
33.82 34.07
32.28
31.00
30.29
29.61
28.79
27.72
26.96
26.49
27.03
26.51
25.54
25.89
26.25
26.84 27.04
24.80
24.08
23.58
21.66
21.63
22.24
20.96
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
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A Constituição Federal de 1988 mostra a estrutura institucional para o actual sistema fiscal brasileiro.
A Constituição atribui competências fiscais aos diferentes níveis de governo, permitindo aplicar
Figura 3: Níveis de Desigualdade e Redistribuição em Mudança ao Longo do Tempo
Despesa Social Federal (% PIB)
17
16
2009
15
14
2007
2008
2006
2005
2004
13
2002
2003
12
1999
2001
2000
1995
11
1997
1990
1996
10
1980
9
1985
8
7
0.53
1998
Fonte: Autores dos dados do Gasto
Social Federal para 1995 a 2009 do
IPEA (2011). Dados para 1980, 1985 e
1990 calculados usando estimativas
do total (gastos sociais federais,
estatais e municipais) no IPEA (2009:
42-44). Dados Gini de
www.ipeadata.gov.br/
0.54
0.55
0.56
0.57
0.58
0.59
0.6
0.61
0.62
Coeficiente de Gini
impostos a uma vasta gama de actividades económicas assim como esquemas de partilha de receitas.
Em 2009, as receitas fiscais totalizaram 34,3% do PIB, o grosso do qual foi colectado pelo governo
federal (56,3%), seguido dos governos estatais (25,2%) e os governos municipais (18,5%).
O sistema fiscal inclui impostos, taxas e contribuições. As contribuições são cobradas sobre as folhas
de pagamento, mas também sobre os lucros da entidade empregadora, e sobre lotarias, receitas
governamentais e licenciamento. A complexidade do sistema fiscal no Brasil é uma consequência da
proliferação de impostos que cobrem uma base comum.
Os impostos federais mais importantes são o imposto sobre rendimentos e o imposto sobre
produtos industrializados (IPI), que contabilizam mais de 90 porcento das receitas federais. O
imposto sobre rendimentos pessoais é cobrado sobre os rendimentos e receitas de qualquer
natureza ganha por indivíduos com domicílio no Brazil a uma taxa progressiva de 15% ou 27,5%,
contingente da capacidade do contribuinte pagar.
As empresas pagam um Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) de 15%, com base nos ganhos
reais ou estimados, ou sobre os ganhos apurados pelas autoridades tributárias. O IPI é um imposto
de valor acrescentado de uma única fase sobre a produção obtida com base no preço de venda
quando o produto deixa a fase de fabricação, ou na importação, a uma razão dependente da
classificação do produto.
Além disso, o governo federal colecta um Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que inclui
crédito, divisas, operações de segurança e seguros.
Os estados colectam o seu próprio IVA (o ICMS), imposto sobre a venda de bens e serviços de
circulação de mercadorias/telecomunicações. O ICMS representa mais de 20% das receitas fiscais
totais (uns significativos 7,22% do PIB).
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As políticas do recente aumento de impostos/PIB:
O aumento da razão impostos/PIB no Brasil não resultou da reforma fiscal radical ou dos
desenvolvimentos na administração fiscal, o que sugere que os modelos políticos têm menos
relevância do que os factores políticos para explicar este aumento. O consentimento político ao
aumento das receitas fiscais está ligado à renovação do contrato social no Brasil após a
democratização.
O facto de o modelo ter sido alargado a iliterados em 1985 incluiu uma grande fatia da população
que se encontrava em empregos informais e de baixos rendimentos. Em linha com os modelos
médios de votantes, houve uma aumentada pressão para se proceder à redistribuição, num
contexto de grande polarização e enormes desigualdades na sociedade. A concorrência política e a
influência de grandes coligações governamentais nos partidos de esquerda e centro-esquerda
ajudaram a mudar as exigências da população em políticas redistributivas eficazes.
O aumento da pressão social foi uma condição necessária mas não suficiente para que ocorresse
uma redistribuição sustentada. A sustentabilidade fiscal e capacidades institucionais também foram
uma componente fundamental dos resultados de redução de desigualdades. Reduzir a inflação com
políticas fiscais prudentes num contexto de receitas fiscais em crescimento, permitiu uma
abordagem equilibrada à redistribuição. Os incentivos políticos responderam ao novo contrato fiscal.
Até que ponto é que o contrato fiscal é sustentável?
O crescimento económico e o desenvolvimento da razão impostos/PIB permitiram que sucessivos
governos alargassem as políticas sociais inclusivas para redistribuir recursos de programas existentes
e evitar assim um conflito que poderia ser prejudicial. A existência de um espaço fiscal alargado
possibilitou um activismo político social sem prejudicar direitos já existentes.
No entanto, esta abordagem tem sido posta à prova já que o espaço para as políticas fiscais e de
despesas tem diminuido com o abrandamento da economia. Os contribuintes estão cada vez mais
descontentes com os elevados impostos e cada vez mais brasileiros estão de acordo quanto aos
impostos serem demasiado elevados em comparação com outros países na região.
As classes médias têm sido descritas como tendo uma relação de ‘cliente insatisfeito’ com o Estado;
não estão satisfeitos com a qualidade dos serviços públicos que recebem na prática pelas suas
contribuições.
Os lares com baixos rendimentos estão cada vez mais conscientes dos impostos elevados. 66,7%
porcento dos brasileiros que responderam ao inquérito do Latinobarómetro em 2011 concordaram
que os impostos eram demasiado elevados.
O Brasil encontra-se agora num momento decisivo crítico. O elevado grau de impostos, a politização
do assunto, e as pressões por uma melhor qualidade dos serviços públicos estão a engendrar uma
nova responsabilização.
Assim, as pessoas poderão exigir menos corrupção e melhores serviços em troca por tolerarem
impostos elevados, mas o resultado final está longe de certo.
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BID-CIAT 2013 data, does
not include refunds
Tax revenues by components (% of GDP)
Direct
Indirect
Property
Soc.Sec.
Foreign trade
Other
1.1
0.6
0.7
0.7
0.5
0.7
7.0
5.5
1.2
5.3
1.0
0.9
15.0
14.8
12.6
4.2
4.4
1994
2000
6.1
2010
Implicações políticas:
Qualquer abordagem à elaboração de políticas deve ter em conta o contexto local, pelo que nenhum
país poderá ser bem sucedido se se limitar a ‘transplantar’ directamente os métodos usados no
Brazil. Contudo, o Brasil pode ser uma fonte de inspiração útil e de orientação para os legisladores
de outros países em desenvolvimento.
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Os governos que pretendem aumentar a razão entre o imposto e o PIB não devem ter uma
abordagem puramente tecnocrata, mas devem envidar esforços para estabelecer um forte
contrato social com os cidadãos com base numa visão partilhada da sociedade.
As reformas ao código fiscal requerem a capacidade institucional para as implementar e
podem levar décadas a realizarem o seu potencial total.
É viável priorizar a redistribuição através dos gastos e não dos impostos, mas isso pode ter
como resultado a insatisfação pública ao longo do tempo.
Este resumo tem como base o documento de trabalho 12 do IRIBA ‘Taxation, redistribution and
the social contract in Brazil’, por Marcus Melo, Armando Barrientos e André Canuto Coelho
disponível em http://www.brazil4africa.org
Leitura recomendada:
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
Alston, L. J.; M. A. Melo; B. Mueller and C. Pereira (2012), Changing Social Contracts: Beliefs
and Dissipative Exclusion in Brazil, NBER Working Paper 18588, Cambridge MA: NBER.
Higgins, S. and C. Pereira (2013). The effects of Brazil's high taxation and social spending on
the distribution of household income. Tulane, Tulane University.
Melo, M. A.; C. Pereira and S. Souza (2010), The Political Economy of Fiscal Reform in Brazil,
Working Paper IDB-WP-117, Washington DC: Inter-American Development Bank.
Melo, M. A. (2007) Institutional weakness and the puzzle of Argentina’s low taxation, Latin
American Politics and Society, 49 (4), pp. 115-148.
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Tributação, redistribuição e o contrato social no Brasil Resumo