Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Instituto de Ciências Biomédicas Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfológicas Aline Cristina Portella Pereira ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS NA ONTOGÊNESE CEREBELAR DE ANIMAIS MUTANTES PARA A ISOFORMA β DO RECEPTOR DO HORMÔNIO DA TIREÓIDE Dissertação de Mestrado submetida à Universidade Federal do Rio de Janeiro visando à obtenção do grau de Mestre em Ciências Morfológicas Rio de Janeiro Abril / 2008 ii Universidade Federal do Rio de Janeiro Aline Cristina Portella Pereira ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS NA ONTOGÊNESE CEREBELAR DE ANIMAIS MUTANTES PARA A ISOFORMA β DO RECEPTOR DO HORMÔNIO DA TIREÓIDE Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfológicas do Instituto de Ciências Biomédicas da UFRJ, como pré-requisito para obtenção do título de Mestre em Ciências Morfológicas. Orientadora: Flávia Carvalho Alcantara Gomes Rio de Janeiro Abril / 2008 iii FICHA CATALOGRÁFICA Pereira, Aline Cristina Portella Alterações morfológicas na ontogênese cerebelar de animais mutantes para a isoforma β do receptor do hormônio da tireóide / Aline Cristina Portella Pereira. -- Rio de Janeiro: UFRJ / ICB, 2008. xv, 101 f.: il. Orientadora: Flávia Carvalho Alcantara Gomes Dissertação (mestrado) – UFRJ, Instituto de Ciências Biomédicas, Programa de Ciências Morfológicas, 2008. Referências: f: 88-101 1. Cerebelo. 2. Hormônio tireoidiano. 3. TRβ 4. Interação neurônio-glia. 5. Glia de Bergmann – Tese. I. Gomes, Flávia Carvalho Alcântara. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Ciências Biomédicas. III. Título iv Aline Cristina Portella Pereira ALTERAÇÕES MORFOLÓGICAS NA ONTOGÊNESE CEREBELAR DE ANIMAIS MUTANTES PARA A ISOFORMA β DO RECEPTOR DO HORMÔNIO DA TIREÓIDE Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Morfológicas do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências Morfológicas. Aprovada por: Prof. ________________________________________________ Flávia Carvalho Alcantara Gomes – ICB – UFRJ Orientadora Prof. ________________________________________________ José Garcia Abreu – ICB – UFRJ Presidente da banca Prof. ________________________________________________ Patrícia Franca Gardino – IBCCF – UFRJ Prof. ________________________________________________ Vânia Maria Corrêa da Costa – IBCCF – UFRJ Prof. ________________________________________________ Silvana Allodi – ICB – UFRJ Revisora e suplente interna Rio de Janeiro Abril / 2008 v O presente trabalho foi realizado no Laboratório de Neurobiologia Celular, do Instituto de Ciências Biomédicas - ICB, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sob a orientação da professora Flávia Carvalho Alcantara Gomes e em colaboração com a professora Tânia Maria Ortiga-Carvalho, do Laboratório de Endocrinologia Molecular, do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho – IBCCF. O trabalho foi desenvolvido na vigência de auxílios concedidos pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM). vi Dedico esta dissertação a todos que sempre contribuíram de forma especial em minha vida, desde o momento em que nela surgiram, impulsionando-me na direção do melhor caminho e dando-me apoio diante dos obstáculos encontrados. vii AGRADECIMENTOS Antes de tudo, agradeço a ajuda dos “Planos Superiores”, de onde é emanada toda Luz Divina que me ilumina a cada dia, e que me faz seguir em frente, sempre no caminho do bem; Agradeço à minha brilhante orientadora Flávia Gomes, por ter me dado a oportunidade de fazer parte deste Universo Acadêmico por mais tempo, me ensinado o que é a intrigante e, às vezes, desesperadora área da Pesquisa Básica, e por toda paciência que teve ao longo desses dois anos e, em particular, nos últimos três meses. Espero que tenhamos muitas conquistas como esta pela frente! • Aos divertidos e amigos, integrantes do LNBC: Vivian (querida amiga desde o meu tempo de IC), Fernando (o IC plus que muito me ajudou nesses 2 anos), Joice, Rômulo, Cris, Luciana, Juliana, Tânia, Ismael (pelos belos cortes no criostato), Rodrigo, aos novos IC’s, Priscila, Bianca e Daniel e ao Sr. Severino. Cada um de vocês contribuiu para que eu conseguisse chegar ao fim desta etapa sem enlouquecer por completo; • Ao LMC que muito me ajudou, ainda no tempo de minha iniciação científica, principalmente ao ilustre Profº Vivaldo Moura Neto. Também à Profª Jane Amaral, Luciana, Sheila, Rose e todos os integrantes deste importantíssimo laboratório; • Ao LNP, local onde eu passei, ao menos, 1/3 de meu mestrado, entre perfusões, colorações, análises e quantificações, sempre podendo contar com a boa vontade de todos, Profº Roberto Lent, Profª Daniela Uziel, Ludmila, Adiel, Michele, Carol, Carlomagno, Jean Pierre, Noboro, Patrícia...; • Ao Profo José Garcia por sempre ter acreditado em meu trabalho e minha dedicação, incentivando-me na carreira científica ainda no tempo em que pertencíamos ao extinto Laboratório Integrado de Biologia Celular e Molecular do Desenvolvimento, e a todos os antigos e atuais alunos do LEV; • • A todos os amigos do antigo Departamento de Anatomia; À Profª Silvana Allodi pela revisão desta dissertação e pela tranqüilidade que me passou no final deste processo; • À Profª Tania Ortiga e suas alunas Larissa e Débora pela colaboração, pelos animais, pelas genotipagens e por toda atenção prestada; • Ao Profº José Garcia, e às Profªs Patrícia Gardino e Vânia da Costa por terem participado da banca avaliadora desta dissertação de mestrado; • viii Aos meus amados pais pelo exemplo de vida que me fornecem a cada dia, pelo incentivo e por tudo o que têm feito por mim ao longo desses anos; • Às minhas lindas irmãs, que sempre se orgulharam de mim e entenderam meus momentos distantes, ao Cadu, meu cunhado preferido e a Julinha, minha paixão e adorável sobrinha; • À minha maravilhosa tia Janete: amiga, irmã, segunda mãe. O convívio com você me faz perceber que muito ainda tenho que aprender; • Ao Jorge, meu amor, pelos bons momentos e por todo apoio nas horas difíceis e de elevados níveis de estresse. Agora vem o doutorado, vamos encarar juntos? E também à minha futura sogrinha, por todo carinho e cuidado que tem comigo; • Ao meu querido primo, Fabiano, que sempre me salva quando o PC tenta me levar à loucura; • • A toda família que amo e sinto saudades; Às amigas de hoje e sempre: Gabriela, Amanda, Alessandra e Michele. E aos amigos que estão longe provisoriamente; • E um agradecimento especialíssimo a uma pessoa fantástica que tive o prazer de estar próxima, por três anos, que muito me ensinou, me ajudou e me mostrou que apesar das dificuldades, sempre podemos evoluir e nos superar. Meu lindinho, querido tio e grande amigo Milano Ferrari (em memória). • A todos vocês um imenso obrigada por tudo!!! ix RESUMO PEREIRA, Aline Cristina Portella. Alterações morfológicas na ontogênese cerebelar de animais mutantes para a isoforma β do receptor do hormônio da tireóide. Dissertação (Mestrado em Ciências Morfológicas)-Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. O desenvolvimento do cerebelo no período pós-natal caracteriza-se por uma intensa proliferação celular na camada granular externa (EGL) e pela migração das células granulares, através das fibras da glia de Bergmann na camada molecular, formando a camada granular no adulto. Nestes eventos, o hormônio tireoidiano (HT) tem um papel fundamental. A maior parte dos efeitos biológicos do HT é mediada pela ligação do T3 aos seus receptores nucleares do tipo alfa (TRα) e beta (TRβ). Neste trabalho, utilizamos camundongos mutantes para o TRβ e investigamos as alterações no cerebelo destes animais em diferentes idades. Utilizando ensaios in vivo e in vitro, mostramos que a não-ligação do HT ao TRβ altera a morfologia cerebelar, com reduções em todas as camadas cerebelares em nove (P9) e vinte e um dias pós-natal (P21), levando a um cerebelo menor e com prejuízos na foliação. A incorporação de BrdU pelas células da EGL e a redução do número de fibras de glia de Bergmann sugerem que tanto a proliferação quanto a migração destas células está prejudicada. Além disso, mostramos também, uma redução no número de glia de Bergmann com morfologia alongada em cultura. Ao contrário do que observamos em idades mais jovens, o cerebelo dos mutantes adultos não evidenciou grandes mudanças em sua morfologia, exceto pelas células de Purkinje que parecem estar mais desorganizadas em sua camada. Nossos dados sugerem que a ação do HT via TRβ pode regular eventos importantes da ontogênese cerebelar, como a proliferação de precursores na EGL, a migração das células granulares, a maturação da glia de Bergmann e a foliação do cerebelo, contribuindo para o entendimento sobre algumas desordens neuroendócrinas. x ABSTRACT PEREIRA, Aline Cristina Portella. Alterações morfológicas na ontogênese cerebelar de animais mutantes para a isoforma β do receptor do hormônio da tireóide. Dissertação (Mestrado em Ciências Morfológicas)-Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. Cerebellar development on the post-natal period is characterized by an intense cellular proliferation in the external granular layer (EGL) and by the granular cells migration through the Bergmann glia fibers, in order to form the granular layer in the adult. On those events, the thyroid hormone (TH) has a critical role. Most of the biological effects of TH are mediated by the binding of T3 to the nuclear receptors type alpha (TRα) and beta (TRβ). In this work, we used TRβ mutant mice to investigate cerebellar development. In vivo and in vitro studies demonstrated an alteration in the cerebellar morphology with reductions in all layers at nine (P9) and twenty-one postnatal days (P21) leading to a smaller cerebellum with foliation defects, as a consequence of a non-binding TRβ. BrdU incorporation by the EGL cells and the reduction of the Bergmann glia fibers suggest that both cellular proliferation and migration are affected. Furthermore, we demonstrated a reduction in the number of elongated Bergmann glia in culture. Inspite of we observed in earlier ages, the morphology of adult mutant cerebellum show no clear changes, except by the Purkinje cells that seem like more desorganized in their layer. Our results suggest that the action of TH via TRβ can regulate important events on the cerebellar ontogenesis, as: precursors proliferation in the EGL, granular cells migration, Bergmann glia maturation and cerebellar foliation, contributing to a better understanding about some neuroendocrine disorders. xi LISTA DE FIGURAS Figura 1: Estrutura anatômica do cerebelo..................................................................... 2 Figura 2: Camadas e tipos celulares do cerebelo .......................................................... 4 Figura 3: Diferentes etapas do desenvolvimento cerebelar ........................................... 8 Figura 4: Padrão de foliação cerebelar ........................................................................ 13 Figura 5: Biossíntese e secreção dos hormônios tireoidianos...................................... 15 Figura 6: Mecanismo de ação dos hormônios tireoidianos (regulação positiva) .......... 20 Figura 7: Alterações morfológicas no cerebelo dos animais TRβ mutantes ................. 40 Figura 8: Área sagital do cerebelo de animais TRβ mutantes P9................................. 43 Figura 9: Área do lóbulo IX do cerebelo de animais TRβ mutantes P9 ........................ 44 Figura 10: Área da camada granular externa (EGL) em P9 ......................................... 45 Figura 11: Área da camada molecular (ML) em P9...................................................... 46 Figura 12: Área da camada granular interna (IGL) em P9 ........................................... 47 Figura 13: Espessura da camada granular externa (EGL) em P9................................ 49 Figura 14: Espessura da EGL em cada região do lóbulo IX nos diferentes genótipos. 50 Figura 15: Espessura da EGL nas diferentes regiões do lóbulo IX .............................. 51 Figura 16: Área sagital do cerebelo de animais TRβ mutantes P21............................. 53 Figura 17: Área do lóbulo IX do cerebelo de animais TRβ mutantes P21 .................... 54 Figura 18: Área da camada molecular (ML) do cerebelo de animais TRβ mutantes P21 ........................................................................................................................... 55 Figura 19: Área da camada granular interna (IGL) do cerebelo de animais TRβ mutantes P21 ................................................................................................................ 55 Figura 20: Cerebelos de animais TRβ mutantes em P21 não apresentam EGL .......... 56 Figura 21: Área sagital do cerebelo de camundongos TRβ mutantes adultos ............. 58 Figura 22: Alterações na camada de Purkinje do animal homozigoto adulto ............... 59 Figura 23: Efeitos da mutação no TRβ sobre a proliferação in vitro............................. 61 Figura 24: Efeitos da mutação no TRβ sobre a proliferação dos GCPs na EGL .......... 62 Figura 25: Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vitro ........................... 64 Figura 26: Alterações na morfologia da glia de Bergmann in vitro ............................... 65 Figura 27: Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vivo em P9................. 67 Figura 28: Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vivo em P21............... 68 Figura 29: Efeitos da mutação do TRβ no desenvolvimento cerebelar ........................ 86 xii ABREVIATURAS AF-1 AF-2 BDNF BLBP BMP BrdU BSA c-erbAα c-erbAβ CoA CoR D1 D2 D3 DAPI DBD DIT EGF EGL E(n) FGF GABA GCP GFAP GL GLAST H HE HO HT IGL LBD Função de ativação 1 Função de ativação 2 Fator neurotrófico derivado do cérebro (do inglês: brain derived neurotrophic factor) Proteína ligadora de lipídio do cérebro (do inglês: brain lipid binding protein) Proteína morfogenética de osso (do inglês: bone morphogenetic protein) 5 – bromo-2’-deoxiuridina Soro albumina bovina (do inglês: bovine serum albumin) Gene que codifica o receptor tipo alfa do hormônio tireoidiano Gene que codifica o receptor tipo beta do hormônio tireoidiano Proteínas coativadoras Proteínas correpressoras Iodotironina desiodase tipo I Iodotironina desiodase tipo II Iodotironina desiodase tipo III 4’, 6- diamidino-2-fenilindol Domínio de ligação ao DNA (do inglês: DNA-binding-domain) Diiodotirosina Fator de crescimento epidermal (do inglês: epidermal growth factor) Camada granular externa (do inglês: external granular layer) Número de dias embrionários (ex.: E10 – dez dias embrionários) Fator de crescimento de fibroblasto (do inglês: fibroblast growth factor) Ácido gama-aminobutírico (do inglês: gamma-aminobutyric acid) Precursor da célula granular (do inglês: granular cell precursor) Proteína acídica fibrilar glial (do inglês: glial fibrillary acidic protein) Camada granular (do inglês: granular layer) Transportador de glutamato (do inglês: glutamate aspartate transporter) Região de dobradiça (do inglês: hinge region) Animal mutante heterozigoto Animal mutante homozigoto Hormônio tireoidiano Camada granular interna (do inglês: internal granular layer) Domínio de ligação ao ligante (do inglês: ligand-binding-domain) xiii LR MCT ML MIT NcoR NGF NGS OATP OCT PBS PCR PL P (n) Ptch rT3 RTH RXR S SB Shh Smo SMRT SNC T2 T3 T4 TRs TRE TRH TRα TRβ TSH ZI ZV Lábio rômbico Do inglês: monocarboxylate anion transporter Camada molecular (do inglês: molecular layer) Monoiodotirosina Do inglês: nuclear receptor co-repressor) Fator de crescimento do nervo (do inglês: nerve growth factor) Soro normal de cabra (do inglês: normal goat serum) Do inglês: organic anion-transporting polypeptides Do inglês: optimal cutting temperature Salina tamponada por fosfato (do inglês: phosphate buffer saline) Reação em cadeia da polimerase (do inglês: polymerase chain reaction) Camada das células de Purkinje (do inglês: purkinje cell layer) Número de dias pós-natal (ex.: P7 – sete dias pós-natal) Do inglês: patched 3,3’, 5’- triiodotironina ou T3 reverso Síndrome de resistência ao hormônio tireoidiano Receptor do ácido retinóico Animal selvagem substância branca Do inglês: Sonic hedgehog Do inglês: smoothened Do inglês: silencing mediator of retinoic acid and thyroid hormone receptor Sistema nervoso central Diiodotironina 3,5,3’- L-triiodotironina 3,5,3’, 5’- L- tetraiodotironina ou tiroxina Receptores nucleares de HT (do inglês: thyroid hormone nuclear receptors) Elemento responsivo ao HT (do inglês: thyroid hormone response elements) Hormônio liberador de tireotrofina (do inglês: thyrotrophin releasing hormone) Receptor tipo alfa do hormônio tireoidiano Receptor tipo beta do hormônio tireoidiano Hormônio estimulante da tireóide (do inglês: thyroid stimulating hormone) Zona intermediária Zona ventricular xiv SUMÁRIO RESUMO....................................................................................................................ix ABSTRACT.................................................................................................................x LISTA DE FIGURAS..................................................................................................xi ABREVIATURAS......................................................................................................xii 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................1 1.1 O cerebelo ........................................................................................................1 1.1.1 Estrutura anatômica e histológica do cerebelo .................................................1 1.1.2 Funções e circuitos cerebelares .......................................................................5 1.1.3 Morfogênese cerebelar.....................................................................................7 1.2 Hormônios tireoidianos...................................................................................14 1.2.1 Mecanismos de ação dos hormônios tireoidianos..........................................18 1.2.2 Receptores dos hormônios tireoidianos .........................................................21 1.3 Hormônios tireoidianos no desenvolvimento do cerebelo ..............................24 2 OBJETIVOS.................................................................................................... 28 2.1 Geral ...............................................................................................................28 2.2 Específicos......................................................................................................28 3 MATERIAIS E MÉTODOS .............................................................................. 29 3.1 Animais ...........................................................................................................29 3.2 Perfusão e criocortes ......................................................................................30 3.3 Procedimentos histológicos.............................................................................31 3.4 Imuno-histoquímica para o marcador glial GFAP............................................32 3.5 Incorporação e detecção de BrdU in vivo .......................................................33 3.6 Cultura mista de neurônio granular e glia de Bergmann .................................34 3.7 Imunocitoquímica para o marcador glial GFAP...............................................35 3.8 Incorporação e detecção de BrdU in vitro .......................................................35 3.9 Análises morfológicas in vivo ..........................................................................36 xv 3.10 Análises morfológicas in vitro..........................................................................38 3.11 Análises estatísticas........................................................................................38 4 RESULTADOS ............................................................................................... 39 4.1 Mutação no TRβ induz alterações na morfogênese cerebelar ........................ 39 4.2 Análise morfométrica do cerebelo e de suas camadas em P9........................41 4.3 Mutação no TRβ induz alterações na EGL......................................................48 4.4 Análise morfométrica do cerebelo e de suas camadas em P21......................52 4.5 Análise morfométrica do cerebelo dos animais mutantes adultos...................57 4.6 Efeitos da mutação no TRβ sobre a proliferação na EGL ...............................60 4.7 Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vitro ...............................63 4.8 Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vivo................................66 5 DISCUSSÃO .................................................................................................. 69 6 CONCLUSÕES .............................................................................................. 87 7 REFERÊNCIAS .............................................................................................. 88 1 INTRODUÇÃO 1 1 1.1 INTRODUÇÃO O cerebelo 1.1.1 Estrutura anatômica e histológica do cerebelo O cerebelo, órgão do sistema nervoso central (SNC), localiza-se no interior da caixa craniana repousando sobre a fossa cerebelar e está separado do lobo occipital, por uma prega da dura-máter, denominada tenda do cerebelo. Está situado dorsalmente ao bulbo e à ponte, contribuindo para a formação do teto do IV ventrículo (Machado, 2002). Sua organização anatomo-funcional é muito parecida entre as diferentes espécies de mamíferos (Voogd & Glickstein, 1998). Ele consiste de dois hemisférios cerebelares reunidos por uma faixa mediana e estreita, o vérmis. Devido à alta densidade celular em seu córtex, o cerebelo, que constitui apenas 10% do volume total do encéfalo, contém mais da metade de todos os seus neurônios (Kandel et al., 2000). Uma característica da superfície cerebelar é a presença de muitos pregueamentos paralelos chamados de folhas. Duas principais fissuras transversas profundas dividem o cerebelo em três lobos. A primeira fissura na superfície dorsal (fissura primária ou prima) separa os lobos anterior e posterior, que juntos formam o corpo do cerebelo (Figura 1A). A fissura póstero-lateral, na superfície ventral, separa o corpo do cerebelo de sua menor parte: o lobo floculonodular (Figura 1B). Secções sagitais próximas à linha média apresentam fissuras mais superficiais, que subdividem cada lobo em vários lóbulos que, por sua vez, englobam um número variável de folhas. Sua estrutura interna é diferente em relação à estrutura da medula espinal e do tronco 2 encefálico, pois as substâncias cinzenta e branca estão dispostas de uma maneira inversa. A substância cinzenta (córtex cerebelar) cobre toda a superfície mergulhando nas várias fissuras que a cruzam e revestem a substância branca (corpo medular do cerebelo), na qual são encontrados os núcleos profundos do cerebelo. Três estruturas denominadas pedúnculos cerebelares (inferior, médio e superior) conectam o cerebelo à porção dorsal do tronco encefálico. Estas estruturas agrupam as fibras de projeção cerebelares (Kandel et al., 2000). Figura 1: Estrutura anatômica do cerebelo. Características gerais: (A) Vista dorsal do cerebelo. A porção mais mediana é chamada de vérmis e este separa os hemisférios esquerdo e direito. Parte do hemisfério direito foi retirada para mostrar os pedúnculos cerebelares. Os núcleos profundos do cerebelo encontram-se no interior da substância branca. A fissura primária separa o lobo anterior e posterior. (B) Vista ventral. A fissura póstero-lateral separa o lobo floculonodular do corpo do cerebelo. Adaptado de Kandel et al., 2000. 3 O córtex cerebelar de mamíferos adultos é composto por oito diferentes populações neuronais: células de Purkinje, células de Golgi, células granulares, células em cesto, células estreladas, células de Lugaro, células unipolares em escova e células candelabro. Estas células estão contidas em três principais camadas (Figura 2). A mais superficial delas é a camada molecular (ML) uma região de baixa densidade celular, mas de alta incidência sináptica. Nela, além das inúmeras conexões estabelecidas entre os axônios das células granulares e os dendritos das células de Purkinje, encontram-se dois tipos de interneurônios cerebelares: as células em cesto e as células estreladas. A camada mais profunda exibe, ao contrário da ML, a mais alta densidade celular do SNC. Nela encontram-se as células de Golgi, as células unipolares em escova, as células de Lugaro e as células granulares, que são as mais numerosas, e por isso é chamada de camada granular (GL). Entre essas duas camadas (ML e GL) encontra-se uma fina zona na qual os corpos das células de Purkinje estão alinhados formando a camada das células de Purkinje (PL), estas células são os elementos principais em torno dos quais todo o circuito cerebelar é organizado, recebendo informações sinápticas extracorticais, processando e conduzindo-as em direção às vias corticais eferentes, aos núcleos profundos do cerebelo, e aos núcleos do tronco encefálico, principalmente ao núcleo vestibular. Temos ainda, localizados na camada de Purkinje, os corpos das células candelabro (para revisão ver: Sillitoe & Joyner, 2007; Sotelo, 2004). 4 Figura 2: Camadas e tipos celulares do cerebelo. O córtex cerebelar no adulto é formado por três camadas: camada molecular, camada de células de Purkinje e camada granular. Nessas camadas encontram-se distribuídos os vários tipos celulares responsáveis por enviar e modular os sinais que chegam às células de Purkinje. Nesta imagem, não estão representadas as células de Lugaro, as células unipolares em escova e as células candelabro. No detalhe, imagem mostrando o glomérulo, local de conexão entre as fibras musgosas e as células granular e de Golgi. Adaptado de Kandel et al., 2000. 5 1.1.2 Funções e circuitos cerebelares Classicamente, o cerebelo está relacionado ao controle do sistema motor. Ele atua na manutenção do equilíbrio e da postura, na coordenação motora, no adequado movimento ocular e no aprendizado motor (Böhmer & Straumann, 1998; Ito, 2006; Mauk et al., 2000; Middleton & Strick, 1998). Porém recentemente, vários trabalhos vêm mostrando a sua importância também em processos cognitivos, discriminação sensorial (Callu et al., 2007; Schmahmann & Sherman, 1998; Tavano et al., 2007) e em distúrbios neurológicos como o autismo (Allen & Courchesne, 2003; Courchesne, 1997). Para que essas funções sejam possíveis, o cerebelo depende da interação entre seus diferentes tipos neuronais e, principalmente, de duas classes de projeções aferentes que chegam a todos os lóbulos deste órgão formando circuitos que envolvem as células granulares e os diferentes interneurônios, terminando nas células de Purkinje, o único tipo neuronal eferente do córtex cerebelar (Altman & Bayer, 1997). Uma das classes de projeções aferentes é formada pelas fibras musgosas. Elas entram no cerebelo através dos pedúnculos cerebelares, sendo originadas a partir de vários núcleos da medula espinal e do tronco encefálico, bem como dos núcleos profundos do cerebelo, e se dirigem para a camada granular, dentro da qual estabelecem conexões com os dendritos das células granulares e terminais axônicos das células de Golgi, formando uma estrutura denominada glomérulo (Figura 2). As fibras musgosas são excitatórias, glutamatérgicas em sua maioria, porém algumas podem ser colinérgicas. Já as células de Golgi são inibitórias liberando o ácido gamaaminobutírico (GABA) como neurotransmissor. Essas fibras podem também formar sinapses com as células unipolares em escova. Estas células são interneurônios e estão localizados na camada granular recebendo sinais excitatórios das fibras 6 musgosas e transmitindo, posteriormente, às células granulares (Ito, 2006; Sillitoe & Joyner, 2007; Sotelo, 2004; Voogd & Glickstein, 1998). Parece que estas células são capazes de amplificar os sinais das fibras musgosas, enviando-os para as células granulares, porém isto ocorre em regiões específicas do cerebelo. Uma única fibra musgosa, através de inúmeras ramificações, pode realizar sinapses com até 600 células granulares, sendo que cada uma destas últimas recebe apenas de quatro a cinco terminais das fibras musgosas. Após o processamento dos sinais recebidos, a célula granular envia seu axônio para a camada molecular, onde ele então se bifurca em “T” formando as fibras paralelas. Essas fibras estabelecem contatos sinápticos excitatórios glutamatérgicos com os dendritos de inúmeras células de Purkinje. Sendo assim, uma fibra musgosa pode influenciar indiretamente, através das fibras paralelas das células granulares, centenas de células de Purkinje. Modulando estas interações, estão os interneurônios inibitórios da camada molecular (células estreladas e em cesto), da camada de Purkinje (células candelabro) e da camada granular (células de Golgi e de Lugaro). A segunda classe de projeções aferentes é composta pelas fibras trepadeiras, que são originadas a partir do núcleo olivar inferior e chegam ao cerebelo através do pedúnculo cerebelar inferior. Possuem este nome porque se enrolam ao redor dos corpos celulares e dendritos das células de Purkinje. Cada célula de Purkinje recebe aferência de uma única fibra trepadeira, enquanto esta é capaz de fazer sinapses com uma a dez células de Purkinje. As células de Purkinje, por sua vez, emitem seus axônios eferentes em direção aos núcleos profundos do cerebelo exercendo sobre eles uma ação inibitória - GABAérgica (Ito, 2006; Sillitoe & Joyner, 2007; Sotelo, 2004; Voogd & Glickstein, 1998). 7 Os núcleos profundos são os principais centros de saída das informações trazidas pelos axônios das células de Purkinje. Neles são encontrados dois tipos de neurônios: neurônios de projeção glutamatérgicos e interneurônios GABAérgicos (Altman & Bayer, 1985; Maricich & Herrup, 1999). 1.1.3 Morfogênese cerebelar O desenvolvimento morfogenético do cerebelo está baseado em uma seqüência precisa de proliferação e diferenciação de seus tipos celulares. Grande parte desses eventos ocorre no período pós-natal, diferente do que acontece com outras estruturas do SNC. Durante a formação do cerebelo, duas ondas neurogênicas distintas são responsáveis pela origem de suas células (Figura 3). A primeira delas ocorre a partir da zona ventricular (ZV) do neuroepitélio cerebelar, onde são gerados os interneurônios inibitórios do cerebelo (incluindo os dos núcleos profundos) e as células de Purkinje, por volta do décimo dia embrionário (E10) em camundongos. Estas células então migram radialmente em direção ao cerebelo primitivo. A migração das células de Purkinje da ZV para o cerebelo ocorre entre E12 - E15 e, no decorrer dos diversos estágios, estas células expressam diferentes moléculas. Calbindina e spot-35 começam a ser expressas pelas células de Purkinje pós-mitóticas e são mantidas até a fase adulta; Thy 1, apenas enquanto estão migrando; L7, zebrin, Kv3.3b surgem no período pós-natal e permanecem até o final do desenvolvimento; Notch-1 é expressa durante a proliferação dos precursores e depois reaparece nos estágios finais (Hatten et al., 1997). 8 Figura 3: Diferentes etapas do desenvolvimento cerebelar. A morfogênese cerebelar é caracterizada por duas ondas neurogênicas. A primeira ocorre no período embrionário em duas regiões distintas: a ZV, que origina as células de Purkinje e os interneurônios inibitórios (não representados) e, o LR de onde partem os GCPs que migram tangencialmente à superfície do cerebelo primitivo formando a EGL. A segunda onda neurogênica ocorre no período pós-natal e é marcada por uma intensa proliferação dos GCPs na EGL. Após sair do ciclo celular estas células começam a se diferenciar na parte mais interna da EGL e migram através das fibras da glia de Bergmann até chegar ao local onde será formada então a IGL,logo abaixo da PL. No adulto a EGL não está mais presente, e as células granulares estabelecem conexões, através de suas fibras paralelas, com os dendritos das células de Purkinje na ML. LR lábio rômbico; ZV - zona ventricular; ZI – zona intermediária; SB – substância branca; EGL - camada granular externa; PL - camada das células de Purkinje; IGL - camada granular interna; GL – camada granular. Adaptado de Hatten, 1999. 9 A segunda onda neurogênica acontece principalmente após o nascimento, na camada mais externa do primórdio cerebelar, conhecida por camada granular externa (EGL). Nesta camada, encontram-se os precursores das células granulares (GCPs). Os primeiros GCPs a cobrir a superfície cerebelar surgem aproximadamente em E11 (Hatten et al., 1997) e são provenientes do lábio rômbico, uma região de encontro entre duas das cinco vesículas embrionárias: o mesencéfalo e o metencéfalo (Altman & Bayer, 1997; Wingate & Hatten, 1999). O lábio rômbico também origina os neurônios de projeção dos núcleos profundos e as células unipolares em escova (Fink et al., 2006). Os GCPs deixam o lábio rômbico e migram tangencialmente pela parte mais externa do cerebelo, estabelecendo-se nesta região e formando assim a EGL a partir de E15. Nessa camada, os GCPs entram em uma intensa atividade mitótica gerando inúmeras células granulares. Com o aumento do número de GCPs, a EGL se expande atingindo o seu pico, aproximadamente, no 8º dia pós-natal. À medida que os GCPs saem do ciclo celular eles atingem a região mais interna da EGL e iniciam o mecanismo de diferenciação passando de células granulares pós-mitóticas a células granulares prémigratórias. Elas começam então a emitir prolongamentos e a se movimentar tangenciando a borda entre a EGL e a ML até que, finalmente, entram nessa última camada ligadas às fibras da glia de Bergmann, por onde realizam sua migração radial até alcançarem a PL, de onde seguem para estabelecerem-se em seus destinos finais formando assim a camada granular interna (IGL). Uma série de fatores e moléculas estão envolvidos na especificação e diferenciação das células granulares. Ainda no lábio rômbico, os GCPs expressam os fatores de transcrição MATH-1 e RU49 (permanecendo durante todos os estágios), En2, Zic1, Zic2 e proteínas implicadas com o ciclo celular (p.ex., ciclina D2). No período 10 pós-natal, os GCPs expressam genes como patched (Ptch), smoothened (Smo), gli1 e gli2, componentes da via de sinalização de sonic hedgehog; Notch-2, que diminui à medida que estas células se dirigem para a zona pré-migratória da EGL, MN20/D2, transitoriamente expresso, e En-2 que retorna no final da primeira semana pós-natal. Em estágios mais tardios do desenvolvimento, quando as células granulares começam a estender prolongamentos, estão presentes as proteínas TAG-1 e L1, e durante a migração radial pela glia de Bergmann, há a participação da glicoproteína de superfície celular neuronal, astrotactina e também N-CAM, N-caderina e β1-integrina. A diferenciação terminal das células granulares resulta na expressão de genes envolvidos na transmissão sináptica como a subunidade α6 do receptor de GABA (Hatten et al.,1997; Kuhar et al.,1993; Sotelo, 2004). A participação das células gliais no desenvolvimento do cerebelo também é muito importante. A glia de Bergmann, um tipo especializado de astrócito, é fundamental para a migração das células granulares até a PL (Rakic, 1971). Seu corpo celular está localizado entre os corpos celulares das células de Purkinje emitindo seus prolongamentos transversalmente, cruzando a ML e fixando seus pés terminais na superfície pial. No cerebelo em desenvolvimento, ela possui atributos de uma glia radial, não só pela presença de prolongamentos radiais, mas por expressar marcadores típicos como nestina, proteína ligadora de lipídio do cérebro (BLBP), vimentina, transportador de glutamato (GLAST) e proteína acídica fibrilar glial (GFAP) (para revisão ver: Yamada & Watanabe, 2002), além de dar suporte à migração das células granulares. Cada glia de Bergmann possui várias fibras e além de estar relacionada com a migração durante idades jovens, ela também participa da manutenção estrutural das células de Purkinje e 11 possui importantes funções nas sinapses que ocorrem entre estas células e as fibras musgosas e trepadeiras. A glia de Bergmann permanece no córtex cerebelar mesmo na idade adulta, nesta fase, porém, elas deixam de expressar os marcadores típicos de glia radial apesar de manterem sua morfologia alongada mesmo sem a existência de células migratórias (Yamada & Watanabe, 2002). Outro tipo glial atuante na formação do cerebelo é o oligodendrócito, a célula formadora de mielina do SNC. A mielinização no cerebelo de camundongos tem início a partir do terceiro dia pós-natal (P3) e se intensifica na segunda semana de vida. Esta célula participa também do processo de arborização dendrítica da célula de Purkinje e da fasciculação de seus axônios (Bouslama-Oueghlani et al., 2003; Mathis et al., 2003). O cerebelo adulto apresenta apenas três camadas celulares: ML, PL e GL, pois conforme as células migram, a EGL vai diminuindo até desaparecer por completo por volta do 15º dia pós-natal em camundongos. Diversos fatores e moléculas vêm sendo apontados como moduladores das diferentes etapas do desenvolvimento cerebelar, incluindo proteínas de matriz extracelular como laminina, fibronectina, integrinas (Belvindrah et al, 2006; Blaess et al., 2004; Martinez & Gomes, 2002; Mills et al, 2006; Trentin et al., 2003); fatores de crescimento como fator de crescimento epidermal (EGF; Martinez & Gomes, 2005), fator de crescimento de fibroblasto (FGF), fator de crescimento do nervo (NGF), BMPs (proteína morfogenética de osso; Alder et al., 1999; Qin et al., 2006; Rios et al., 2004); o morfógeno sonic hedgehog (Corrales et al., 2004; 2006; Dahmane & Ruiz i Altaba, 1999; Wechsler-Reya & Scott, 1999); hormônios tireoidianos (Martinez & Gomes, 2002; 2005; Trentin et al., 2003), entre outros. 12 Particularmente, a etapa de proliferação dos GCPs na EGL é de grande relevância para se compreender a estruturação final do cerebelo. Nesse contexto, as células de Purkinje são indispensáveis, pois elas exercem uma importante regulação sobre o mecanismo proliferativo. Estudos mostraram que a ausência desse tipo celular no início do desenvolvimento cerebelar leva a prejuízos na formação da EGL (Sotelo, 2004). Aparentemente, grande parte da influência das células de Purkinje na morfogênese cerebelar é mediada pela síntese e secreção do morfógeno sonic hedgehog (Shh). Esta molécula está envolvida na modulação da proliferação dos GCPs e determinação do padrão de foliação cerebelar (Corrales et al., 2006; Dahmane & Ruiz i Altaba, 1999; Lewis et al., 2004). A foliação no cerebelo de roedores é elaborada durante as duas primeiras semanas pós-natal. Inicialmente, a superfície lisa cerebelar é dividida em cinco lobos cardinais separados por quatro fissuras principais. Após crescerem extensivamente, os lobos cardinais se subdividem em lóbulos individuais em uma seqüência estereotipada e comum a todos os mamíferos, culminando na formação de dez lóbulos distintos presentes no adulto (Altman & Bayer, 1997; Voogd & Glickstein, 1998). Posteriormente, os lóbulos, designados por algarismos romanos de I - X, são então novamente divididos em sublóbulos com um número variável de acordo com a espécie. Por exemplo, o vérmis cerebelar de muitos camundongos, poucos dias após o nascimento, consiste de oito lóbulos principais que posteriormente se dividem nos poucos sublóbulos presentes no adulto (Figura 4), enquanto o vérmis do rato consiste de dez lóbulos e contém mais sublóbulos (Corrales et al., 2006). Os dez lóbulos básicos presentes no rato são conservados em humanos, entretanto, cada lóbulo cerebelar humano é extensivamente 13 dividido em muitos sublóbulos, formando as inúmeras folhas cerebelares (Voogd & Glickstein, 1998; Donkelaar et al., 2003). Embora os fatores que modulam a foliação não sejam bem compreendidos, é sabido que o padrão e extensão da foliação é resultado do balanço entre a proliferação e diferenciação das células granulares. Desta forma, moléculas envolvidas nesses eventos são potenciais candidatas à modulação do padrão de foliação cerebelar. Figura 4: Padrão de foliação cerebelar. Vista sagital do vérmis do cerebelo de camundongo adulto corado com cresil-violeta mostrando seu padrão de foliação com oito lóbulos principais, sendo alguns deles divididos em sublóbulos, totalizando dez regiões individualizadas separadas por fissuras. Cada lóbulo e sublóbulo está representado por algarismos romanos de I – X. Adaptado de George Paxinos e Keith B. J. Franklin, 2001. 14 1.2 Hormônios tireoidianos Os efeitos biológicos do hormônio tireoidiano (HT) são essenciais para a promoção do crescimento e diferenciação celulares e para o metabolismo energético nos vertebrados mais complexos na escala evolutiva. Os hormônios 3,5,3’,5’-Ltetraiodotironina (tiroxina ou T4) e 3,5,3’-L-triiodotironina (T3) são os principais produtos secretados pela glândula tireóide e são sintetizados na célula folicular tireoidiana a partir de três componentes principais: iodeto, tireoperoxidase e tireoglobulina (Figura 5). O iodeto é transportado para a célula folicular através do co-transportador de Na+/I(NIS). Na face apical da célula ocorre a oxidação e organificação do iodeto com o radical tirosil da tireoglobulina pela ação da tireoperoxidase, originando a monoiodotirosina (MIT) e a diiodotirosina (DIT). O acoplamento de dois DITs dá origem ao T4 e de um MIT com um DIT resulta na formação do T3. A tireoglobulina é a matriz utilizada para a síntese de HTs e também a forma como estes são estocados no interior do folículo como colóides. Dentro da célula este material é processado por enzimas lisossomais que degradam a tireoglobulina e liberam T3 e T4 para a circulação (Goodman, 2003). Em condições fisiológicas, o total plasmático de T4 é cerca de 45 vezes maior que o de T3, embora ele possua menor atividade biológica. Uma vez secretados, os hormônios tireoidianos circulam ligados a proteínas plasmáticas e somente uma pequena parte está livre (para revisão ver: Yen, 2001). 15 Figura 5: Biossíntese e secreção dos hormônios tireoidianos. O iodeto (I-) é transportado para a célula folicular através do transportador Na+/I- presente na membrana basal. Na face apical da célula ocorre a oxidação e organificação do iodeto pela ação da tireoperoxidase (TPO). Próximo às microvilosidades ocorre o acoplamento de DIT e MIT à molécula de tireoglobulina (TG). O material coloidal é reintegrado à célula e, após o processamento por lisossomas, formam-se os hormônios tireoidianos (HT -T3 ou T4) que são, então, secretados pela membrana basal para a circulação capilar. Adaptado de Goodman, 2003. 16 Através de um sistema de retro-alimentação negativa que envolve o eixo hipotálamo-hipófise-tireóide, a síntese e secreção dos HTs podem ser controladas. O hipotálamo é responsável pela secreção do hormônio liberador de tireotrofina (TRH) que é transportado até a hipófise anterior, onde ocorre a ligação com seus receptores induzindo a secreção do hormônio estimulador da tireóide ou tireotrofina (TSH). Tanto o TRH quanto o TSH são negativamente regulados pelos HTs, porém a secreção destes hormônios é regulada principalmente pelo TSH. A entrada e saída dos HTs nos tecidos ocorrem em uma menor parcela, por difusão passiva, e outra principal através de transportadores específicos que regulam a sua captação e efluxo (Hennemann et al., 2001). Para exercer seus efeitos, os HTs então primeiro cruzam a membrana plasmática das células-alvo sendo este movimento mediado em grande parte por mecanismos de transporte dos quais recentemente uma variedade tem sido identificada, incluindo o sistema L (atividade de transporte produzida por membros da família do gene slc 7) e ânions orgânicos como OATP (do inglês: organic anion-transporting polypeptides) e MCT (do inglês: monocarboxylate anion transporter). O sistema L possui uma importante função no transporte do HT extracelular para o núcleo, bem como na regulação das funções biológicas dos HTs (Ritchie et al., 2003). Mutações no transportador MCT 8 estão associadas com retardo mental, sérios distúrbios neurológicos e um padrão anormal de concentração de HT no sangue (Dumitrescu et al., 2004; Friesema et al., 2004). O gene MCT 8 está localizado no cromossomo X e codifica uma proteína transmembrana expressa no cérebro, fígado, rim, tireóide, coração, hipófise e outros tecidos. No SNC, o MCT 8 é expresso nos neurônios do neocórtex, hipocampo, núcleos da base, amígdala, hipotálamo e células de Purkinje do cerebelo (Bernal, 2005; 2006). 17 Nos tecidos, grande parte do T4 secretado pela tireóide é convertido em T3 e no composto inativo T3 reverso (3,3’, 5’-triiodotironina ou rT3), pelas enzimas iodotironina desiodases através de 5’ e 5 monodesiodação, respectivamente (Bianco & Kim, 2006). Há três iodotironinas desiodases identificadas, a desiodase tipo I (D1), tipo II (D2) e a tipo III (D3). A D1 é encontrada em tecidos como fígado e rim e é responsável pela conversão da maior parte do T4 em T3 na circulação. A D2 é encontrada no cérebro, na hipófise e no tecido adiposo marrom, e converte principalmente T4 em T3 para uso intracelular. A maior parte do T3 presente no sistema nervoso é gerada pela desiodação do T4 pela enzima D2, já a enzima D3 possui uma função inativante pela desiodação 5’ que converte o T4 em rT3, ou o T3 em T2 (diiodotironina) ambos com mínimas atividades biológicas (Forrest et al., 2002; Verhoelst et al., 2005; Yen, 2001). No SNC de ratos, D2 está presente nos astrócitos, enquanto a expressão de D3 é restrita aos neurônios (Guadaño-Ferraz et al., 1997; Tu et al., 1999), sugerindo que células astrogliais possam estar envolvidas na captação do T4 dos capilares e na sua conversão em T3 para os neurônios. 18 1.2.1 Mecanismos de ação dos hormônios tireoidianos A maior parte dos efeitos do HT é exercida através da ligação do hormônio a receptores específicos localizados no núcleo das células, os receptores nucleares do hormônio tireoidiano (TR). O ligante fisiológico é o T3, considerado a forma ativa do hormônio, já o T4 por ter baixa afinidade aos TRs, é considerado um pró-hormônio. Os TRs pertencem à superfamília de receptores nucleares, da qual também fazem parte os receptores para esteróides, vitamina D, retinóides e prostaglandinas, e são fatores de transcrição dependentes do ligante (Glass & Holloway, 1988; Willians, 2000; Yen, 2001). Eles medeiam a ação do hormônio ligando-se a seqüências específicas do DNA conhecidas como elementos responsivos aos hormônios tireoidianos (TREs), que geralmente localizam-se na região promotora dos genes-alvo, modulando a transcrição em todos os tecidos de mamíferos. A formação do complexo HT-TR que está ligado ao TRE é o primeiro passo na regulação dos genes-alvo, e na subseqüente síntese de proteínas (Figura 6). Deste complexo participam, também, proteínas correguladoras. Apesar dos TRs ocuparem os TREs como monômeros ou homodímeros, eles formam preferencialmente heterodímeros com receptores do ácido retinóico (RXR) ou outros fatores de transcrição. Esses heterodímeros podem aumentar a diversidade do complexo formado pelo receptor bem como o potencial de interação do receptor com os genes-alvo. O HT pode regular a transcrição gênica de forma positiva ou negativa, dependendo do tipo de TRE. Nos genes com um TRE positivo e na ausência do hormônio, os TRs associam-se a proteínas correpressoras (CoRs; as principais são NcoR e SMRT) formando um complexo que inibe a transcrição gênica. Na presença do ligante, este complexo CoR se dissocia e é substituído por proteínas co-ativadoras 19 (CoAs; das famílias: SRC e DRIP/TRAP) que então ativam a transcrição pelo promotor. Em contraste com o mecanismo de regulação positiva, a atividade transcricional regulada negativamente ocorre na ausência e diminui na presença do hormônio (Lazar, 2003). Neste caso, os CoRs podem aumentar a transcrição basal. Porém, algumas vezes, as proteínas CoAs também podem estar envolvidas na repressão dependente de ligante, e para que haja a inibição da transcrição é necessário o recrutamento das CoAs após a dissociação dos CoRs em decorrência da formação do complexo HT-TR (OrtigaCarvalho et al., 2005). Esta regulação negativa pode ser observada no controle do eixo hipotálamo-hipófise-tireóide, no qual o aumento das concentrações dos HTs leva a uma redução da síntese e secreção do TRH e TSH. A interação T3-TR-TRE causa uma alteração conformacional da cromatina através da acetilação ou desacetilação de histonas, regulando então a acessibilidade do gene a sua maquinaria de transcrição (Muñoz & Bernal, 1997). 20 Figura 6: Mecanismo de ação dos hormônios tireoidianos (regulação positiva). Após a ação da enzima desiodase tipo 2 (D2), o T4 é convertido em T3 que então, no núcleo da célula-alvo liga-se ao seu receptor específico (TR) que pode estar formando homodímeros ou heterodímeros com outros tipos de receptor. O mais comum é o receptor do ácido retinóico (RXR). Nos genes positivamente regulados, na ausência do T3 o TR forma um complexo com proteínas correpressoras impedindo a transcrição gênica. A ligação do T3 ao TR libera essas proteínas e eles formam um novo complexo com proteínas coativadoras dando início à transcrição. Adaptado de Forrest et al, 2002. 21 1.2.2 Receptores do hormônio tireoidiano Para que as ações do hormônio tireoidiano ocorram, é fundamental a presença de seus receptores nucleares acoplados ao DNA formando o complexo HT-TR-TRE do qual participam também as proteínas CoRs e CoAs. Em vertebrados, existem dois genes distintos (c-erbAα e c-erbAβ) que codificam as duas isoformas principais dos TRs classificadas como TRα e TRβ (Lazar & Chin, 1990). Em humanos estes genes estão localizados nos cromossomos 17 e 3, respectivamente. Cada um desses genes codifica várias proteínas que são o resultado do processamento alternativo do RNA mensageiro (splicing alternativo). As isoformas geradas são: α1,α2, Δα1, Δα2, β1, β2, β3 e Δβ3, sendo que, apenas α1, β1, β2 e β3 são capazes de se ligar ao T3 e mediar a expressão gênica regulada pelo hormônio (Flamant & Samarut, 2003). A isoforma α2 é capaz de se ligar ao TRE, porém ela não gera a transativação dos genes, já que a ligação com T3 não ocorre. Desta forma, o TRα2 pode agir como um inibidor da ação do HT possivelmente competindo com outras isoformas pelo sítio de ligação no TRE (Koenig et al., 1989; Lazar et al., 1989). Os TRs apresentam domínios funcionais distintos em suas estruturas, porém sua organização é semelhante nas diferentes isoformas. Os três principais domínios são: o amino-terminal, o de ligação ao DNA (DBD) e o de ligação ao hormônio (LBD). Existe também uma pequena região que conecta o DBD ao LBD, que é conhecida como dobradiça (H). O domínio amino-terminal é extremamente variável entre os membros da superfamília dos receptores nucleares e exibe uma função de ativação transcricional independente do ligante, denominada função de ativação 1 (AF-1). Alguns estudos 22 mostraram que a deleção deste domínio tem pouco efeito sobre a resposta transcricional positiva ao T3. O DBD é o domínio mais bem conservado entre todos os receptores nucleares e tem como função principal a ligação ao DNA. O LBD é menos conservado que o DBD, refletindo a variedade de ligantes que atuam nestes receptores. Este domínio localiza-se na região carboxi-terminal e possui varias funções, como a homo- e heterodimerização do receptor, localização nuclear e interação com proteínas correpressoras e coativadoras. Alem dessas funções, o LBD contém uma superfície que é fundamental para a ativação transcricional, que se forma com a ligação do hormônio ao receptor. Após a ligação ao hormônio, essa região denominada função de ativação 2 (AF-2), passa a interagir com as proteínas CoAs, que permitirão a formação do complexo protéico envolvido na ativação da transcrição (para revisão ver: Barra et al., 2004). A expressão desses receptores varia de tecido para tecido e nos diferentes estágios do desenvolvimento. As isoformas α1, α2 e β1 são expressas em quase todos os tecidos, ainda que em níveis diferentes. De uma maneira geral, há uma expressão abundante de α1 no sistema músculo-esquelético, no tecido adiposo marrom e no coração; a isoforma α2 é particularmente abundante no cérebro; a isoforma β1 é expressa em grande quantidade no fígado, rim e cérebro; e a isoforma β2 é encontrada na hipófise anterior, áreas específicas do hipotálamo, cérebro em desenvolvimento, orelha interna e retina (Oppenheimer et al., 1974; Yen, 2001). Para o desenvolvimento do SNC, o HT possui um papel fundamental. Sendo assim, muitos trabalhos foram realizados com o intuito de investigar a presença dos 23 TRs em células neuronais e gliais de diversas regiões encefálicas de roedores (Bradley et al., 1992; Constantinou et al., 2005; Leonard et al., 1994; Puymirat et al., 1991). Através de imunocitoquímica observou-se, em ratos, a presença dos TRs no bulbo olfatório, no neocórtex, no hipocampo, amígdala e cerebelo com níveis de expressão variados (Puymirat et al., 1991), porém esses ensaios utilizaram um anticorpo monoclonal para os TRs sem ser específico para nenhuma das diferentes isoformas. Bradley e colaboradores (1992) mostraram a distribuição espacial e temporal dos TRs no SNC em desenvolvimento, no qual observou-se que os genes α e β tem padrões diferentes de expressão no período embrionário e pós-natal, sendo a isoforma α predominante no primeiro período. Além disso, a isoforma β2 é expressa na hipófise, no hipocampo e no striatum. A distribuição de mRNA ou proteínas sugere um predomínio neuronal da expressão desses receptores, por exemplo como observado em culturas de neurônios colinérgicos (Garza et al., 1990). Entretanto, outros estudos mostraram também a expressão dos TRs em astrócitos, oligodendrócitos e células microgliais (Carlson et al., 1994; Lebel et al., 1993; Lima et al., 2001; Luo et al., 1989). Parece haver uma distribuição célula-específica dos TRs no SNC, com um predomínio das isoformas α1 e β nos neurônios e um nível muito elevado de α2 nos astrócitos, mas não se pode excluir a possibilidade de diferentes receptores estarem presentes em uma mesma célula (Leonard et al., 1994). Vários trabalhos mostraram a expressão da isoforma β nas células de Purkinje do cerebelo, mostrando que estas células são um alvo direto da ação do T3, em diferentes etapas do desenvolvimento e também na idade adulta, enquanto na camada granular interna e na camada molecular 24 esta isoforma não foi detectada, havendo a expressão de TRα1 e TRα2 (Puymirat et al., 1991; 1992; Strait et al., 1991). 1.3 Hormônio tireoidiano no desenvolvimento do cerebelo Os hormônios tireoidianos possuem uma indispensável participação na ontogênese do SNC (Bernal & Nunez, 1995; Chan & Kilby, 2000; Koibuchi & Chin, 2000; König & Moura Neto, 2002; Oppenheimer & Schwartz, 1997). A falta do hormônio durante o início da vida pós-natal resulta em prejuízos neurológicos permanentes, incluindo alterações intelectuais e de comportamento, como no cretinismo, síndrome neuroendócrina que conduz o indivíduo a quadro severo de rebaixamento mental, surdez neurossensorial e espasticidade (Bernal, 2002; Knobel & Medeiros-Neto, 2004). Entretanto, esses déficits podem ser revertidos se a administração de tiroxina for realizada poucos dias após o nascimento (Wiersinga, 2001), o que sugere a existência de um “período crítico” para a ação do hormônio. Muitos estudos caracterizaram esse período entre as primeiras 2-3 semanas de vida em roedores, tempo durante o qual este hormônio é necessário para a determinação de um SNC estrutural e funcionalmente adequado (Clos et al., 1974; Hébert et al.,1985; Rabie & Legrand, 1973). Em humanos, este período corresponde geralmente ao último trimestre de gestação até 1-2 anos de vida (Porterfield & Hendrich, 1993). O tempo de ação do HT está associado a diversas etapas do desenvolvimento neural como crescimento axonal e dendrítico, formação de sinapses, gliogênese, mielinização e proliferação de células granulares no cerebelo (Bernal & Nunez, 1995). O cerebelo é um dos principais alvos do hormônio tireoidiano. In vivo, o T3 controla o número de astrócitos e a maturação da glia de Bergmann (Clos et al., 1980; 25 Clos & Legrand, 1973; Legrand, 1986; Rabié et al., 1977; 1979; 1980; Pesetsky, 1973). In vitro, o tratamento com T3 aumenta a proporção de células gliais semelhantes à glia de Bergmann, por possuírem longos prolongamentos e corpos celulares arredondados (Messer et al., 1985). O tratamento com T3 induz também a proliferação de astrócitos cerebelares em cultura primária (Trentin & Moura Neto, 1995). Além disso, Gomes e colaboradores (1999) demonstraram que o T3 induz astrócitos cerebelares a secretarem uma combinação de fatores que agem por vias autócrinas e parácrinas, modulando a proliferação de astrócitos e precursores neuronais, respectivamente. Algumas das ações dos hormônios tireoidianos no desenvolvimento do sistema nervoso podem ser mediadas por fatores de crescimento como NGF e EGF (Gomes et al., 2001). O hormônio tireoidiano é capaz de induzir direta ou indiretamente o aumento dos níveis desses fatores. Através de um modelo de cocultura neuro-astrocitária, Martinez & Gomes (2002) mostraram que o T3 age nos astrócitos cerebelares aumentando a secreção de EGF e de proteínas da matriz extracelular favorecendo, assim, a proliferação de precursores granulares e sua diferenciação. No cerebelo, várias alterações anatômicas induzidas pelo hipotireoidismo perinatal têm sido documentadas, estas incluem: redução do crescimento e ramificação dos dendritos das células de Purkinje, redução da sinaptogênese entre as células de Purkinje e axônios das células granulares, atraso na proliferação e migração das células granulares, atraso na mielinização, e alterações na conexão sináptica entre os neurônios cerebelares e as fibras neuronais aferentes. Estas anormalidades não podem ser evitadas a menos que o hormônio tireoidiano seja administrado numa crítica janela temporal após o nascimento (Vincent et al., 1982; Koibuchi & Chin, 2000). 26 Recentemente, a geração de animais mutantes para as distintas isoformas de TRs vem contribuindo fortemente para o entendimento do papel de T3 no desenvolvimento cerebelar. Morte e colaboradores (2002) mostraram que a deleção do TRα1 não produz alterações no cerebelo, porém quando o hipotireoidismo é induzido nesses animais, contrariando as expectativas, eles permanecem com o fenótipo normal, enquanto os animais selvagens apresentam prejuízos no desenvolvimento das células de Purkinje e na migração das células granulares, características do hipotireoidismo congênito. Outro estudo realizado para analisar os efeitos do T3 nas células de Purkinje mostrou que o desenvolvimento dendrítico dessas células é temporal e dosedependente de T3; in vitro elas expressam tanto TRα quanto TRβ, porém a ação do T3 ocorre mais fortemente via TRα (Heuer & Mason, 2003). Hashimoto e colaboradores (2001) mostraram que apesar dos altos níveis de hormônios tireoidianos, camundongos com uma mutação no TRβ, que impede a sua ligação ao T3, apresentam problemas vestibulomotores e de coordenação que caracterizam anormalidades das funções cerebelares. O animal mutante possui o cerebelo menor, enquanto a massa cerebral não apresenta diferença, sugerindo que o cerebelo menor não é devido a uma redução de todo o encéfalo. Há também uma redução da camada molecular e da camada de Purkinje no animal mutante. O número de células de Purkinje e suas ramificações também estão reduzidos. Esse fenótipo apresentado é observado em animais hipotireóideos, mas não em animais knock-out para esse receptor. 27 O objetivo do presente trabalho é estudar o desenvolvimento do cerebelo de camundongos mutantes para o receptor tipo beta (TRβ) do hormônio tireoidiano. Estes animais são um modelo da Síndrome de Resistência ao Hormônio, descrita por Refetoff e colaboradores em 1967. Esta síndrome se caracteriza por apresentar níveis séricos de TSH e de HTs elevados, diferente do que ocorre no hipotireoidismo, e apesar disso, alguns tecidos-alvo possuem baixa resposta às altas concentrações de T3 e T4 livres. Pacientes com esta síndrome apresentam dificuldades significantes de movimentação, coordenação e de aprendizado indicando déficits na organização dos circuitos cerebelares (Gauthier et al, 1999; Hashimoto et al, 2001). Embora algumas alterações no cerebelo já tenham sido descritas em função da mutação do receptor tipo beta, mais estudos precisam ser realizados para que se compreenda melhor a ação dos TRs no desenvolvimento cerebelar. 2 OBJETIVOS 28 2 OBJETIVOS 2.1 Geral: Analisar os efeitos da mutação Δ337T do receptor tipo β do hormônio tireoidiano na ontogênese do cerebelo de camundongos. 2.2 Específicos: 2.2.1 Analisar a morfologia do cerebelo dos animais TRβ mutantes ao longo do desenvolvimento; 2.2.2 Analisar a organização e morfometria das diferentes camadas do cerebelo de animais TRβ mutantes: EGL, ML e IGL; 2.2.3 Analisar o processo de proliferação e migração dos precursores das células granulares da EGL in vivo e in vitro; 2.2.4 Analisar a organização e morfologia da glia de Bergmann in vivo e in vitro. 3 MATERIAIS E MÉTODO 29 3 3.1 MATERIAIS E MÉTODOS Animais Nesse estudo foram utilizados animais machos e fêmeas com uma mutação na isoforma beta do receptor do hormônio tireoidiano (TRβ). Hashimoto e colaboradores (2001) produziram esses animais através de uma deleção do aminoácido treonina do gene do TRβ (Δ337T) gerando um modelo knock-in para estudo da Síndrome Humana de Resistência aos Hormônios Tireoidianos. Esta mutação foi inserida em camundongos de linhagem mista 129/SV x C57/BL6. Os receptores que apresentam esta mutação inibem de forma dominante a transcrição dos genes por eles regulados, mesmo na presença do ligante. Os experimentos foram realizados com animais de três genótipos distintos: selvagem (S), heterozigoto (HE) e homozigoto (HO), nas idades pós-natal de nove (P9), vinte e um dias (P21) e adultos, resultantes do acasalamento de animais em heterozigose. As dosagens hormonais e genotipagens dos animais foram realizadas pelas técnicas de radioimunoensaio e reação em cadeia da polimerase (PCR), respectivamente, pelo Laboratório de Endocrinologia Molecular do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ, sob a supervisão da professora Tânia Maria OrtigaCarvalho. Os animais foram condicionados em ambiente com temperatura controlada (2326°C) e submetidos a ciclo claro-escuro de 12/12 horas. Tinham acesso à água e ração comercial ad libitum. A linhagem foi mantida em heterozigose. 30 A manipulação e sacrifício dos animais seguiram as normas estabelecidas pelo Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), segundo protocolo aprovado pelo número DHEICB 006. 3.2 Perfusão e criocortes Antes do início dos procedimentos, os animais foram mantidos no éter até a interrupção de seus movimentos voluntários, e de suas respostas a estímulos dolorosos. Os animais foram submetidos à perfusão via intracardíaca com o objetivo de promover a fixação das células in situ. Inicialmente, utilizou-se solução salina 0,9% para remover todo o sangue circulante, posteriormente utilizou-se solução fixadora contendo paraformaldeído a 4% até o enrijecimento do animal. Após as perfusões, os cerebelos foram dissecados e submetidos a um gradiente crescente de sacarose (10%, 20% e 30%) para crioproteção. Os cerebelos foram divididos em duas partes através de uma secção mediana no plano sagital. Os hemicerebelos foram incluídos em O.C.T (TissueTek) e congelados em nitrogênio líquido. No criostato, à temperatura de aproximadamente -20°C, foram feitos cortes parassagitais, na região do vérmis cerebelar, com 12μm de espessura cada, colhidos em lâminas previamente tratadas com poli-L-lisina (200μg/ml - Sigma Chemical Co). Os cortes da região mais lateral dos hemicerebelos foram descartados e as análises realizadas preferencialmente na região do vérmis, na qual é possível a visualização do todos os lóbulos cerebelares (I ao X). Após esses procedimentos os cortes foram então submetidos a técnicas histológicas ou imuno-histológicas para os marcadores de interesse. 31 3.3 Procedimentos histológicos Para analisarmos a morfologia cerebelar, utilizamos a técnica de Nissl (coloração por cresil-violeta). As secções do tecido cerebelar foram montadas em lâminas previamente tratadas com poli-L-lisina (200μg/ml - Sigma Chemical Co) e após o tempo mínimo de 24 horas foram submetidas à coloração seguindo o seguinte protocolo: as secções foram lavadas com água destilada para retirar o O.C.T. (5 minutos); desidratadas em álcool 75%, álcool 95% e álcool 100% (3 minutos cada), desengorduradas em álcool 100% + clorofórmio (1:1) (10 minutos); reidratadas em álcool 100%, álcool 95% e álcool 75% (3 minutos cada), lavadas em água destilada (3 minutos) e coradas na solução de cresil-violeta à 37°C (por 1 minuto ou mais tempo, se necessário). Após nova lavagem com água destilada, seguiu-se fazendo outra desidratação e diferenciação com álcool 75% + 10 gotas de ácido acético (observandose a coloração), álcool 95% + 10 gotas de ácido acético (observando-se a coloração), álcool 95% e álcool 100% (3 minutos cada), álcool 100% + butanol (1:1) (3 minutos observando-se a coloração) e, por fim, as lâminas foram mergulhadas em xilol até a montagem. As lâminas foram, então, seladas com Entellan (Merck®) e cobertas com lamínula. 32 3.4 Imuno-histoquímica para o marcador glial GFAP Os cortes de cada animal foram selecionados de forma que fossem analisadas regiões análogas dos diferentes genótipos. Os tecidos foram lavados com água destilada por 5 minutos seguido de 3 lavagens com PBS, 5 minutos cada e permeabilizados com tampão salina fosfato (PBS) Triton X-100 0,2% por 5 minutos. O bloqueio dos sítios inespecíficos foi feito com PBS-Triton 0,05% NGS (soro normal de cabra) 5% por 1 hora à temperatura ambiente. Em seguida, foram incubados com anticorpo primário policlonal contra a proteína acídica fibrilar glial (GFAP; marcador astrocitário; feito em coelho; Dako Cytomation – diluição 1:200) em câmara úmida à temperatura de 4º C por 16 horas. Posteriormente, foram lavados com PBS e incubados com anticorpo secundário contra IgG de coelho conjugado à Alexa Fluor 546 (Molecular Probes, diluição 1:500) em câmara úmida por 2h à temperatura ambiente. Após este período os cortes foram lavados com PBS e incubados com o marcador nuclear DAPI (4’, 6’-diamidino-2-phenylindole dihydrochloride; Sigma Chemical Co) por 10 minutos. Após nova lavagem com PBS, as lâminas foram montadas com N-propil-galacto (Sigma Chemical Co) cobrindo-as com lamínula de vidro. 33 3.5 Incorporação e detecção de BrdU in vivo Para as análises de proliferação dos GCPs utilizamos a técnica de incorporação do análogo de timina, 5-bromo-2’-deoxiuridina (BrdU). Foram realizadas injeções intraperitoneais de BrdU (100 mg/kg - Sigma Chemical Co) nos animais selvagem (S), heterozigoto (HE) e homozigoto (HO). Trinta minutos após a injeção, os animais em P9 foram perfundidos e os tecidos cerebelares processados como descrito anteriormente (ver item 3.2). As análises foram feitas após imuno-histoquímica para BrdU seguindo o seguinte protocolo: as lâminas contendo os cortes foram lavadas 1 vez com água destilada por 1 minuto, 3 vezes com PBS, 5 minutos cada, e incubadas com HCl 2N à 50ºC por 2 vezes, 10 minutos cada. Posteriormente, foram incubadas 1 vez com tampão borato 0,1M à 50ºC, 10 minutos e 1 vez à temperatura ambiente. Após a lavagem com PBS, os cortes foram bloqueados com PBS-Triton 0,1% NGS 10% por 40 minutos, e em seguida incubados com anticorpo primário policlonal contra BrdU (marcador de proliferação; feito em rato; Accurate Chemical & Scientific Corporation; diluição 1:500) em câmara úmida à temperatura de 4º C por 16 horas. Após este período, os cortes foram lavados com PBS e incubados com anticorpo secundário contra IgG de rato conjugado à Alexa Fluor 546 (Molecular Probes, diluição 1:500) à temperatura ambiente por 2 horas em câmara úmida. Em seguida, foram lavados com PBS e incubados com DAPI (Sigma Chemical Co) por 10 minutos. Após lavagem, as lâminas foram montadas com N-propil-galacto (Sigma Chemical Co) e montadas com lamínula de vidro. 34 3.6 Cultura mista de neurônio granular e glia de Bergmann As culturas foram preparadas a partir do cerebelo derivado dos animais selvagem (S; n=2), heterozigoto (HE; n=2) e homozigoto (HO; n=2) em P7. Cada animal foi decapitado e o cerebelo removido com suas meninges cuidadosamente retiradas. Os tecidos foram lavados com PBS-Glicose 2%, picotados e mantidos em BSA (soro fetal bovino) 0,003g/ml, glicose 0,014M, MgSO4 0,075M e tripsina 0,25 mg/ml (tampão A) por 15 minutos à 37°C. Foi acrescentado BSA para inibir a atividade da tripsina e as amostras foram centrifugadas por 30 segundos à 1500 rpm. Os tecidos foram então ressuspensos em outro tampão composto por BSA 0,003g/ml, glicose 0,014M e MgSO4 0,081M (tampão C) e dissociados mecanicamente com pipeta Pasteur. Em seguida foi acrescentado o tampão D constituído de BSA 0,043g/ml, glicose 0,014M e MgSO4 0,075M, lentamente ao fundo dos recipientes, determinando a formação de duas fases que foram centrifugadas por 5 minutos à 850-1000 rpm. Os precipitados foram então ressuspensos em meio de cultura neurobasal (Invitrogene) acrescido de 2% de B-27 e, após a contagem, as células foram plaqueadas na densidade de 3x105 células por poço, sobre lamínula de vidro, em placas de cultura de 24 poços com 16mm de diâmetro previamente tratadas com poli-ornitina (1,5μg/ml - Sigma Chemical Co). As culturas foram incubadas à 37°C em uma atmosfera umedecida e com 5% de CO2 e mantidas por aproximadamente 24 ou 72 horas dependendo do objetivo. As culturas foram fixadas em paraformaldeído - sacarose 4%. 35 3.7 Imunocitoquímica para o marcador glial GFAP Após a fixação das culturas que foram mantidas por 72 horas, as células foram lavadas e permeabilizadas com PBS-Triton X-100 0,2% por 5 minutos. O bloqueio dos sítios inespecíficos foi feito com PBS-BSA 5% por 1 hora. As células foram incubadas à 4°C por 16 horas com anticorpo primário policlonal contra GFAP (marcador astrocitário; feito em coelho; Dako Cytomation – diluição 1:200). Posteriormente, as células foram lavadas com PBS e incubadas por 2 horas à temperatura ambiente com o anticorpo secundário contra IgG de coelho conjugado à Alexa Fluor 546 (Molecular Probes, diluição 1:500). Após incubação com o anticorpo secundário, as células foram lavadas com PBS e incubadas com DAPI (Sigma Chemical Co) por 10 minutos e montadas com N-propil-galacto (Sigma Chemical Co). 3.8 Incorporação e detecção de BrdU in vitro Para análise da proliferação in vitro, utilizamos o marcador de proliferação celular, BrdU. As culturas descritas no item 3.6 foram incubadas por 24 horas em presença de 1μg/ml de BrdU (Sigma Chemical Co). A adição de BrdU foi realizada 2 horas após o plaqueamento das células com o objetivo de não interferir na adesão ao substrato. Posteriormente à incubação com BrdU, as células foram fixadas com paraformaldeído - sacarose 4% por 20 minutos, lavadas 2 vezes com água destilada e incubadas em solução de HCl 2N à 50°C por 5 minutos. Em seguida, as células foram lavadas 2 vezes com tampão borato 0,1 M, 10 minutos cada, à temperatura ambiente. Após este procedimento, as células foram lavadas com PBS e submetidas à imunocitoquímica para BrdU conforme o protocolo descrito no item 3.7. Os anticorpos 36 primário e secundário utilizados foram, respectivamente: policlonal contra BrdU (marcador de proliferação; feito em rato; Accurate Chemical & Scientific Corporation; diluição 1:500) e contra IgG de rato conjugado à Alexa Fluor 546 (Molecular Probes, diluição 1:500). 3.9 Análises morfológicas in vivo Para análise das lâminas coradas com cresil-violeta e realização da morfometria cerebelar, foram feitas fotomicrografias utilizando-se o microscópio óptico ZEISS AxioPlan acoplado à câmera digital ZEISS AxioCam e ao programa Axiovision AC. Através deste programa, foram medidas a área sagital do cerebelo, do lóbulo IX , de suas diferentes camadas celulares (EGL, ML e IGL) e a espessura da EGL. A quantificação da área das camadas e da espessura da EGL foi realizada sempre no lóbulo IX, com a finalidade de padronizarmos as análises, já que os resultados poderiam variar muito se realizados em regiões distintas do cerebelo. O programa utilizado permite que seja feito o contorno do cerebelo e das camadas específicas calculando automaticamente os valores das áreas (em μm²) e/ou das espessuras (em μm). Foram analisados camundongos selvagens (S), mutantes TRβ Δ337T em heterozigose (HE) e em homozigose (HO) nas idades pós-natal de 9 (P9), vinte e um dias (P21) e adulto, conforme o número especificado na tabela 1. 37 Tabela 1: Número de animais utilizados de cada genótipo nas diferentes idades para as análises morfométricas. S HE HO P9 7 6 5 P21 3 4 4 ADULTO 6 4 3 Para análise das fibras da glia de Bergmann foram realizadas fotomicrografias utilizando-se o microscópio ZEISS Axioplan acoplado à câmera digital ZEISS Axiocam. Após a aquisição das imagens, as fibras foram quantificadas da seguinte forma: traçamos uma linha paralela à superfície pial, de mesmo comprimento e a uma mesma distância dessa superfície em cada campo observado. Em seguida contamos o número de fibras da glia de Bergmann (imunomarcadas para GFAP) que cortavam esta linha. Para esta análise foram utilizados 3 animais de cada genótipo em P9. OBS.: A análise das fibras da glia de Bergmann dos animais P21 foi realizada em apenas um animal de cada genótipo através de microscopia confocal (Zeiss LSM 510 Meta) com a reconstrução do tecido em 3D. A quantificação das células que incorporaram BrdU na EGL foi feita em relação à área desta camada (μm²). Para esta análise foram utilizados 2 animais de cada genótipo em P9. 38 3.10 Análises morfológicas in vitro As quantificações e análises das células em cultura foram realizadas utilizando- se o microscópio Nikon TE 300. A glia de Bergmann foi analisada inicialmente quanto à forma: protoplasmática ou alongada. Aquelas classificadas como alongadas foram então analisadas quanto ao número de projeções que apresentavam: 1, 2 e 3 ou mais projeções. Apenas as projeções primárias, originadas a partir do corpo celular, foram consideradas. 3.11 Análises estatísticas As análises estatísticas dos diferentes grupos foram realizadas no programa Prisma 4.0. Os valores foram comparados através da aplicação do teste de análise de variância (ANOVA) ou teste T e, quando necessário, o pós-teste não paramétrico de Tukey com níveis de confiança estabelecidos em 95% e considerados significativos quando p<0,05. 4 RESULTADOS 39 4 RESULTADOS 4.1 Mutação no TRβ induz alterações na morfogênese cerebelar Baseando-nos nas alterações encontradas por Hashimoto e colaboradores (2001), procuramos investigar idades mais jovens a fim de verificarmos possíveis danos durante o desenvolvimento cerebelar. Para isto, analisamos cortes sagitais do vérmis do cerebelo de camundongos com a mesma mutação, porém em P9, corados com cresil-violeta. Aproximadamente nesta idade, em condições normais, ocorre o pico proliferativo dos GCPs na EGL. O cerebelo, nesta etapa do desenvolvimento, já apresenta uma morfologia bastante definida, com suas fissuras e lobos bem divididos. Ao analisarmos os cerebelos em P9, encontramos importantes diferenças entre a estrutura cerebelar do S (Figura 7-A, -B, -C) e a dos mutantes HE (Figura 7-D, -E, F) e HO (Figura 7-G, -H, -I). No HO, além de um cerebelo menor (Figura 7-G), podemos notar prejuízos na formação de algumas fissuras e lóbulos, principalmente na fissura que separa os lóbulos VI e VII, fazendo com que este último não possa ser distinguido (Figura 7-H). O lóbulo IX também apresenta alteração em sua forma (Figura 7-I). O HE mostra alterações menos evidentes em relação ao HO e possui uma variação fenotípica de um animal para outro, o que faz com que se assemelhe ora ao S ora ao HO. Estes achados sugerem que a mutação do TRβ possa estar interferindo em etapas precoces do desenvolvimento cerebelar. 40 Figura 7: Alterações morfológicas no cerebelo dos animais TRβ mutantes. Fotomicrografia de cortes sagitais da região do vérmis do cerebelo de camundongos com nove dias pós-natal (P9) corados com cresil-violeta. (A) Selvagem com todos os lóbulos numerados de I a X, mostrando um cerebelo com desenvolvimento normal; (B) A seta preta aponta a fissura que separa os lóbulos VI e VII no selvagem; (C) Selvagem apresentando lóbulo IX com desenvolvimento normal; (D), (E) e (F) Imagens do heterozigoto; note em (E) que ele apresenta a fissura (seta), porém em (F) o lóbulo IX apresenta alterações de forma e tamanho;(G) Homozigoto evidenciando um cerebelo menor e com importantes modificações morfológicas; observe em (H) a ausência da fissura, sem separação dos lóbulos VI e VII (seta vermelha); em (I), o lóbulo IX também mostra alterações de forma e tamanho. Barras de escala: 1000 μm. 41 4.2 Análise morfométrica do cerebelo e de suas camadas em P9 Hashimoto e colaboradores (2001) demonstraram que os camundongos mutantes para o TRβ, em P24, apresentam um cerebelo menor que o do animal S, com uma redução de 55% e 46% na área da ML dos animais HO e HE, respectivamente. Como foram verificadas alterações macroscópicas no cerebelo dos animais mutantes P9, aprofundamos nossas observações, através da análise morfométrica do cerebelo e especificamente do lóbulo IX, por apresentar uma alteração bem evidente em sua morfologia. O número de animais utilizados nestas análises está apresentado na tabela 1. Quantificamos a área sagital do cerebelo, do lóbulo IX e de suas diferentes camadas: EGL, ML e IGL. O animal S apresentou, em média, uma área sagital de 3,8 x 106 μm², para o cerebelo e de 764 x 103 μm², para o lóbulo IX. Encontramos uma redução de 22% na área cerebelar (Figura 8) e de 32% na área do lóbulo IX (Figura 9) do animal HO. Não observamos diferenças estatísticas nessas áreas do animal HE. Estes animais apresentam uma grande heterogeneidade morfológica. Hashimoto e colaboradores (2001) sugeriram que a redução do cerebelo dos animais mutantes estaria diretamente relacionada à redução da camada molecular, entretanto, esses autores não mensuraram as outras camadas, além de não ter ficado claro em que região do cerebelo estas alterações foram encontradas. Desta forma, analisamos morfometricamente todas as camadas do cerebelo de animais selvagens e mutantes em P9, sempre no lóbulo IX e verificamos que no animal HO todas estão reduzidas. 42 O animal S apresentou, em média, uma área de 112 x 103 μm² para a EGL; 221 x 103 μm² para ML; e 430 x 103 μm² para a IGL. No animal HO, houve uma redução de 41% na EGL (Figura 10); na ML, a redução foi de 22%, porém, pela análise estatística, esta diferença não foi significativa (p=0,05) revelando apenas uma tendência a ser menor (Figura 11); e na IGL, a redução foi de 30% (Figura 12). O animal HE não evidenciou diferenças estatísticas. 43 Figura 8: Área sagital do cerebelo de animais TRβ mutantes P9. Fotomicrografia de cortes sagitais da região do vérmis do cerebelo de camundongos P9 corados com cresil-violeta. As quantificações foram feitas utilizando-se o programa Axiovision AC através do qual é possível contornar todo o cerebelo e, a partir disso, obter automaticamente o valor das áreas em μm². A representação gráfica está em percentual do selvagem. (A) Cerebelo do animal S com desenvolvimento normal; no canto inferior direito a orientação do cerebelo: D – dorsal; V – ventral; P – posterior; A – anterior; (B) Cerebelo do mutante HE; (C) Cerebelo do mutante HO mostrando uma notória redução em seu tamanho; (D) O gráfico revela uma redução de 22% na área do HO em relação ao S e de 27% em relação ao HE. Não houve diferença estatística entre o S e o HE. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO - homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; média ± SEM; *p<0,01). Barra de escala: 1000 μm. 44 Figura 9: Área do lóbulo IX do cerebelo de animais TRβ mutantes P9. A quantificação da área do lóbulo IX do cerebelo dos animais P9 foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta. As medidas foram feitas utilizando-se o programa Axiovision AC. A representação gráfica está em percentual do selvagem. (A) Lóbulo IX do cerebelo do animal S com desenvolvimento normal; (B) Lóbulo IX do HE com morfologia alterada; (C) Lóbulo IX do HO mostrando uma notória redução em seu tamanho e forma; (D) O gráfico revela uma redução de 32% na área do HO em relação ao S e de 20% em relação ao HE. Não houve diferença estatística entre o S e o HE. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO - homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; média ± SEM; *p<0,05 e **p<0,001). Barra de escala: 1000 μm. 45 Figura 10: Área da camada granular externa (EGL) em P9. A quantificação da área da EGL foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta, utilizando-se o programa Axiovision AC. (A) Linha tracejada vermelha demonstrando como a EGL foi medida no lóbulo IX, representado na figura pelo animal S; (B) O gráfico mostra a redução de 41% na EGL do HO. Não houve diferença estatística entre o S e o HE. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; média ± SEM; *p<0,001). Barra de escala: 1000 μm. 46 Figura 11: Área da camada molecular (ML) em P9. A quantificação da área da ML foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta, utilizando-se o programa Axiovision AC. (A) Linha tracejada vermelha demonstrando como a ML foi medida no lóbulo IX, representado na figura pelo animal S; (B) O gráfico mostra a tendência de redução de 22% na ML do HO em relação ao S e de 30% em relação ao HE. Não houve diferença estatística entre o S e o HE. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO - homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; média ± SEM; p=0,05). Barra de escala: 1000 μm. 47 Figura 12: Área da camada granular interna (IGL) em P9. A quantificação da área da IGL foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta, utilizando-se o programa Axiovision AC. (A) Linha tracejada vermelha demonstrando como a IGL foi medida no lóbulo IX, representado na figura pelo animal S; (B) O gráfico mostra a redução de 30% na IGL do HO em relação ao S e de 33% em relação ao HE. Não houve diferença estatística entre o S e o HE. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO - homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; média ± SEM; *p<0,001). Barra de escala: 1000 μm. 48 4.3 Mutação no TRβ induz alterações na EGL A EGL é uma zona germinativa secundária de intensa proliferação das células que darão origem aos neurônios granulares da IGL (Sotelo, 2004). Como em nosso trabalho a EGL foi a camada que apresentou a maior redução (41% no HO) em conseqüência da mutação no TRβ, focamos nossas análises nessa região. Considerando que a taxa de proliferação da EGL possa variar de acordo com a região do lóbulo estudada, analisamos a EGL presente na margem do lóbulo IX e encontro dos lóbulos VIII-IX e IX-X. A partir dos tecidos corados com cresil-violeta, medimos a espessura da EGL nessas três regiões distintas (Figura 13). Chamamos então de “Região A”, o local de encontro entre os lóbulos VIII e IX; “Região B”, a margem do lóbulo IX e de “Região C”, o local de encontro entre os lóbulos IX e X. O animal S apresentou o seguinte padrão na espessura da EGL das diferentes regiões: A = 42 μm; B = 34 μm; C = 39 μm. No HE, observamos a redução de 18%, 9% e 12% na espessura da EGL das regiões A, B e C, respectivamente, enquanto no HO a redução foi de 38%, 33% e 37% (Figura 14). A espessura também variou de acordo com as regiões específicas do lóbulo, apresentando-se maior no local das fissuras (regiões A e C), e menor nas margens (região B); esta característica foi comum nos três genótipos como observado na Figura 15. Tanto no HO quanto no HE, a espessura da EGL foi menor nas três regiões em relação ao S sugerindo que o mecanismo de proliferação na EGL seja alterado pela mutação do TRβ. O número de animais quantificados para cada genótipo está apresentado na tabela 1. 49 A EGL ML B PL IGL IGL PL ML EGL C D E F Figura 13: Espessura da camada granular externa (EGL) em P9. Fotomicrografias de regiões distintas do lóbulo IX do cerebelo de camundongos com nove dias pós-natal (P9) corados com cresil-violeta. Em A, C e E, imagens da margem do lóbulo IX dos animais S, HE e HO, respectivamente. Notar que nesta região, a EGL é menor em relação à região das fissuras (as setas vermelhas chamam atenção para espessura desta camada) vistas nas imagens B, D e F (região de encontro dos lóbulos). A EGL do HO é menos espessa em relação ao S em todas as regiões observadas. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto; EGL – camada granular externa; ML – camada molecular; PL – camada de células de Purkinje; IGL – camada granular interna. Barra de escala: 100 μm. 50 Figura 14: Espessura da EGL em cada região do lóbulo IX nos diferentes genótipos. (A) Regiões do lóbulo IX que tiveram a EGL quantificada. A região A (verde) é a EGL que está próxima ao lóbulo VIII, a região B (azul) é a EGL que está na margem do lóbulo IX e a região C (rosa) é a EGL que está próxima ao lóbulo X. Os gráficos comparam a espessura da EGL em μm de cada uma das regiões entre os diferentes genótipos; (B) O HO apresenta uma redução de 38% e o HE de 18% na espessura da EGL da região A; (C) Redução de 33% no HO e de 9% no HE na região B; (D) Redução de 37% e de 12% na região C. Todas as regiões da EGL dos animais HO e HE apresentaram redução na espessura. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; *p<0,01 e **p<0,001). 51 Figura 15: Espessura da EGL nas diferentes regiões do lóbulo IX. (A) Regiões do lóbulo IX que tiveram a EGL quantificada. A região A (verde) é a EGL que está próxima ao lóbulo VIII, a região B (azul) é a EGL que está na margem do lóbulo IX e a região C (rosa) é a EGL que está próxima ao lóbulo X. Os gráficos comparam a espessura da EGL em μm nessas diferentes regiões em cada genótipo. Os valores médios ± SEM foram: (B) selvagem: região A – 42,19 ± 0,73; região B – 34,30 ± 0,55, região C – 39,68 ± 0,77; (C) heterozigoto: região A – 34,57 ± 0,94; região B – 31,34 ± 0,69; região C – 35,06 ± 0,84, e (D) homozigoto: região A – 26,34 ± 0,73; região B – 23,09 ± 0,63, região C – 25,18 ± 0,74. Na margem do lóbulo a espessura é sempre menor do que no local das fissuras, independente do genótipo. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=7; HE=6; HO=5; *p<0,01). 52 4.4 Análise morfométrica do cerebelo e de suas camadas em P21 Além das análises realizadas no animal P9, quantificamos também as áreas do cerebelo, do lóbulo IX e de suas camadas nos animais P21. Nesta idade, o cerebelo com desenvolvimento normal já não apresenta EGL, pois todas as células desta camada já saíram do ciclo celular, passaram por mudanças em seu citoesqueleto e aquelas que ainda não atingiram a IGL estão migrando para se estabelecer nesta região. Nossos resultados mostram que os camundongos mutantes continuam a apresentar reduções no tamanho do cerebelo em P21, confirmando os dados de Hashimoto e colaboradores (2001). Verificamos uma diminuição de 18% na área sagital do cerebelo do HE e de 30% na do HO (Figura 16). A área do lóbulo IX apresentou-se 15% menor no HE e 26% no HO (Figura 17). Não encontramos diferença estatística na ML dos animais mutantes (Figura 18). A IGL foi 13% menor no HE e 25% no HO (Figura 19). Além dessa diminuição nas áreas, algumas alterações morfológicas ainda podem ser notadas, principalmente no lóbulo VI do HO. Geralmente, em camundongos, existe neste lóbulo uma pequena fissura que o divide em dois como pode ser observado no S e no HE, mas não no HO (Figura 16). O número de animais quantificados para cada genótipo está apresentado na tabela 1. Um dado muito importante é que nenhum dos animais mutantes analisados nesta idade apresenta EGL (Figura 20), diferente do que ocorre em roedores com hipotireoidismo, nos quais a EGL permanece por mais tempo, desaparecendo apenas em torno dos vinte e quatro dias pós-natal (Lauder et al., 1974). 53 Figura 16: Área sagital do cerebelo de animais TRβ mutantes P21. Fotomicrografia de cortes sagitais da região do vérmis do cerebelo de camundongos com vinte e um dias pós-natal (P21) corados com cresil-violeta. (A) Selvagem com morfologia cerebelar normal e os lóbulos identificados de I a X; orientação do cerebelo (D – dorsal; V – ventral; A – anterior; P – posterior). A seta indica o local da fissura que divide o lóbulo VI; (B) Heterozigoto. A seta indica o local da fissura que divide o lóbulo VI; (C) Homozigoto mostrando uma notória redução em seu tamanho e forma também nesta idade. O asterísco indica o local onde deveria haver uma pequena fissura dividindo o lóbulo VI; (D) O gráfico revela uma redução de 30% e de 18% na área do HO e HE, respectivamente em relação ao S. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=3; HE=4; HO=4; média ± SEM; *p<0,001). Barra de escala: 500 μm. 54 Figura 17: Área do lóbulo IX do cerebelo de animais TRβ mutantes P21. A quantificação da área do lóbulo IX do cerebelo dos animais com vinte e um dias pós-natal (P21) foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta. A representação gráfica está em percentual do selvagem. O gráfico revela a redução de 26% na área do HO. Não houve diferença estatística entre S e HE. Os valores médios em μm² ± SEM foram: S – 13122e+006 ± 100284; HE – 11142e+006 ± 69157; HO – 969881e+006 ± 29457. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=3; HE=4; HO=4; *p<0,01). 55 Figura 18: Área da camada molecular (ML) do cerebelo de animais TRβ mutantes P21. A quantificação da área da ML do cerebelo dos animais com vinte e um dias pós-natal (P21) foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta. A representação gráfica está em percentual do selvagem. O gráfico não revelou diferença estatística entre os grupos. Os valores médios em μm² ± SEM foram: S – 534294 ± 85830; HE – 521220 ± 40502; HO – 447405 ± 20138. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=3; HE=4; HO=4). Figura 19: Área da camada granular interna (IGL) do cerebelo de animais TRβ mutantes P21. A quantificação da área da IGL do cerebelo dos animais com vinte e um dias pós-natal (P21) foi realizada a partir das lâminas coradas com cresil-violeta. A representação gráfica está em percentual do selvagem. O gráfico revela a redução de 25,5% na área do HO. Não houve diferença estatística entre S e HE. Os valores médios em μm² ± SEM foram: S – 582041 ± 43252; HE – 503627 ± 30493; HO – 433340 ± 12483. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=3; HE=4; HO=4; *p<0,01). 56 Figura 20: Cerebelos de animais TRβ mutantes em P21 não apresentam EGL. As fotomicrografias foram obtidas a partir de cortes sagitais do cerebelo de camundongos dos três diferentes genótipos com vinte e um dias pós-natal (P21) corados com cresil-violeta. (A) e (B) Selvagem; (C) e (D) Heterozigoto; (E) e (F) Homozigoto. As fotos B, D e F correspondem às regiões delimitadas pelos retângulos em A, C e E, respectivamente. As linhas tracejadas vermelhas estão no local de encontro dos lóbulos. As setas pretas apontam o limite da ML (na superfície pial); notar neste local a ausência da EGL nos três genótipos. IGL – camada granular interna; PL – camada de células de Purkinje; ML – camada molecular. Barras de escala: 100 μm. 57 4.5 Análise morfométrica do cerebelo dos animais mutantes adultos Com o objetivo de investigar se as alterações morfológicas observadas ao longo do desenvolvimento cerebelar eram mantidas no adulto, cortes sagitais do vérmis do cerebelo de camundongos entre 2-3 meses, dos três diferentes genótipos (S, HE e HO), foram corados com cresil-violeta e a área do cerebelo, posteriormente, analisada por microscopia óptica, utilizando-se o programa Axiovision AC, como observado na Figura 21. Inesperadamente, não verificamos diferenças no tamanho da área cerebelar entre os grupos. Foram analisados S (n=6), HE (n=4) e HO (n=3), sendo quantificados quatro cortes sagitais de cada animal. Apesar de não haver diferença na área, detectamos alterações no lóbulo VI e na camada de Purkinje do HO. Neste animal, as células de Purkinje estão dispostas de forma mais desorganizada em algumas regiões do cerebelo, diferente do que ocorre no S, onde estas células encontram-se mais alinhadas em sua camada (Figura 22). Estes dados sugerem que alguns dos prejuízos causados pela mutação do TRβ ao desenvolvimento cerebelar em idades mais jovens, podem estar sendo revertidos com o passar do tempo. Porém, nas células de Purkinje, os efeitos deste receptor mutado e incapacitado de ligar-se ao T3, parecem ser permanentes. 58 Figura 21: Área sagital do cerebelo de camundongos TRβ mutantes adultos. Fotomicrografia de cortes sagitais da região do vérmis do cerebelo de camundongos adultos corados com cresil-violeta. (A) Selvagem, com os lóbulos identificados de I a X e com a orientação do cerebelo (D – dorsal; V – ventral; P – posterior; A – anterior); (B) Heterozigoto; (C) Homozigoto; (D) As quantificações foram realizadas utilizando-se o programa Axiovision AC, e os valores estão representados em percentual do selvagem. Não observamos diferença estatística na área cerebelar entre os grupos. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto (n: S=6; HE=4; HO=3; média ± SEM). Barra de escala: 500 μm. 59 SELVAGEM A HOMOZIGOTO C B D IX VIII IGL PL ML B D Figura 22: Alterações na camada de Purkinje do animal homozigoto adulto. Fotomicrografia da região de encontro dos lóbulos VIII e IX mostrando a camada granular interna (IGL), a camada das células de Purkinje (PL) e a camada molecular (ML). (A) e (B) Selvagem; (C) e (D) Homozigoto, mostrando alterações na PL; (B) e (D) correspondem à magnificação dos locais destacados pelo retângulo vermelho em (A) e (C), respectivamente. Notar como a PL está desorganizada (pontilhado vermelho em D) no HO em contraste com o S, onde estas células encontram-se alinhadas em sua camada. S – selvagem; HO – homozigoto. Barras de escala: 100 μm. 60 4.6 Efeitos da mutação no TRβ sobre a proliferação na EGL Alguns estudos já demonstraram que o HT participa do mecanismo de proliferação celular no cerebelo, aumentando o número tanto de neurônios quanto de astrócitos (Gomes et al., 1999; Trentin & Moura Neto, 1995). Como encontramos uma importante redução da área e, principalmente, da espessura da EGL, passamos a investigar a capacidade proliferativa desta camada nos camundongos mutantes. Para esta análise realizamos, então, ensaios in vitro através de culturas cerebelares de animais S e mutantes em P7. As células foram cultivadas por 24 horas em presença de BrdU e, após este período, foram fixadas e submetidas à imunomarcação com anticorpo contra BrdU. A cultura do animal HO apresentou uma redução de aproximadamente 34% na taxa de incorporação de BrdU (Figura 23). O número de animais quantificados para cada genótipo foi: S=2, HE=2 e HO=2. A análise de proliferação foi realizada, também, através de injeções intraperitoneais de BrdU em animais P9. Após trinta minutos, eles foram submetidos à perfusão intracardíaca. A análise da incorporação deste marcador foi feita na EGL e revelou uma redução de 23% no número absoluto de células BrdU positivas marcadas na EGL do animal HO (Figura 24). Não houve diferença estatística na incorporação de BrdU pelo heterozigoto, por este motivo eles não foram representados nas figuras 23 e 24. Estes dados apontam para um possível déficit no mecanismo de proliferação celular nos animais mutantes e sugerem um papel relevante para o TRβ na modulação da proliferação de precursores das células granulares (GCPs). 61 Figura 23: Efeitos da mutação no TRβ sobre a proliferação in vitro. Culturas de cerebelo de animais com sete dias pós-natal (P7), mantidas na presença de BrdU por 24 horas e observadas em contraste de fase e ao microscópio de fluorescência. (A), (C) e (E) Selvagem; (B), (D) e (F) Homozigoto; (G) A quantificação das células BrdU positivas em cultura revelou uma redução de ~34% na sua incorporação pelas células derivadas do animal HO; no gráfico, os valores foram representados pelo número absoluto de células BrdU+/ campo. Os valores médios ± SEM foram: S – 48,26 ± 2,0; HO – 31,98 ± 1,7. S – selvagem; HO – homozigoto (n: S=2; HO=2; *p<0,05). 62 Figura 24: Efeitos da mutação no TRβ sobre a proliferação dos GCPs na EGL. Os animais com nove dias pós-natal (P9) receberam injeções intraperitoneais de BrdU e após trinta minutos foram submetidos à perfusão intracardíaca. Após o processamento adequado do tecido, realizamos a detecção do BrdU nos animais (A) selvagem e (B) homozigoto por microscopia de fluorescência; (C) A quantificação das células BrdU positivas na EGL do homozigoto revelou uma redução de 23% em relação ao selvagem. Não houve diferença estatística na incorporação de BrdU pelo heterozigoto (não representado nesta figura). S – selvagem; HO – homozigoto ( n: S=2; HO=2; p<0,05). Barra de escala: 50 μm. 63 4.7 Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vitro Logo que as células da EGL saem de seu ciclo proliferativo, elas deixam a região mais interna desta camada, e iniciam uma nova etapa do desenvolvimento – a migração. Este mecanismo ocorre através das fibras da glia de Bergmann, células do tipo radial que mantém sua morfologia alongada mesmo na idade adulta (Yamada & Watanabe, 2002). Para avaliarmos se a mutação do TRβ pode estar comprometendo a migração, procuramos observar se há algum prejuízo no desenvolvimento da glia de Bergmann. Inicialmente, achamos importante analisar a morfologia desta célula através de ensaios in vitro. Para isso, preparamos culturas enriquecidas neste tipo glial, derivadas de animais dos três diferentes genótipos (S=2; HE=2; HO=2) e, após fixação, reações imunocitoquímicas para o marcador glial GFAP foram realizadas. A cultura derivada do animal HO revelou um número muito reduzido de células gliais com morfologia radial (Figura 25). Apenas 25% destas células apresentaram-se alongadas (Figura 26-A), em contraste com as culturas derivadas dos animais S e HE que possuíam células com características típicas daquelas envolvidas com a migração gliofílica (Figura 26-D). As poucas células do animal HO que continham prolongamentos, emitiram 1 ou 2 projeções a partir do corpo celular, enquanto algumas dos animais S e HE emitiram até mais de 3 projeções (Figura 26-B). Além disso, a cultura derivada do animal HO apresentou uma importante redução do número de células GFAP positivas, 64% a menos em relação ao S (Figura 26-C). Esses achados sugerem que o efeito da não-ligação do T3 ao TRβ pode prejudicar não só o mecanismo de proliferação celular no cerebelo, como também o processo de maturação das células gliais. 64 Figura 25: Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vitro. Culturas enriquecidas de glia de Bergmann foram preparadas a partir do cerebelo dos três diferentes genótipos com sete dias pós-natal (P7). Após 72 horas, as células foram imunomarcadas para GFAP e observadas ao microscópio de fluorescência. (A) e (B) Selvagem; (C) e (D) Heterozigoto; (E) e (F) Homozigoto. Poucas foram as células gliais derivadas do homozigoto que emitiam longos prolongamentos. Notar como as células gliais do selvagem e do heterozigoto possuem uma morfologia mais radial. Barra de escala: 100 μm. 65 Figura 26: Alterações na morfologia da glia de Bergmann in vitro. Culturas enriquecidas de glia de Bergmann, provenientes dos três diferentes genótipos (S, HE e HO), com sete dias pósnatal (P7) foram preparadas, e as células imunomarcadas para GFAP, quantificadas. (A) Apenas 25% das células GFAP+ do HO apresentam morfologia alongada em contraste com S e HE; (B) Estas células apresentam-se menos ramificadas em relação ao S, possuindo 1 ou 2 projeções; (C) Além destas alterações na morfologia celular, o gráfico mostra uma redução de 64% no número de células GFAP+ no HO; (D) Fotomicrografia obtida no microscópio de fluorescência, de uma célula GFAP+ derivada do animal selvagem, exibindo um fenótipo típico de glia de Bergmann com morfologia alongada e ramificações. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto. Barra de escala: 100μm. 66 4.8 Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vivo Para que a migração das células pós-mitóticas ocorra adequadamente através das fibras da glia de Bergamnn, faz-se necessário que esta célula emita seus longos prolongamentos até a superfície pial. Verificamos que, em cultura, estas células são bastante afetadas pela mutação do TRβ. Para avaliarmos se esta mutação pode estar comprometendo o mecanismo de migração procuramos observar se existe algum prejuízo na organização dessas fibras, já que elas são fundamentais para que as células pós-mitóticas alcancem o seu destino final. Com este objetivo, realizamos reações imuno-histoquímicas para GFAP e quantificamos o número de fibras de Bergmann presente na ML. As análises foram feitas no lóbulo IX de camundongos P9, como pode ser observado na Figura 27, e revelaram uma redução de 15% e 26% no número de fibras passando pela ML do HE e do HO, respectivamente. Estas diferenças não foram observadas no cerebelo de animais mais velhos, P21 (Figura 28), no entanto, nesta idade, apenas um animal de cada genótipo foi analisado e, por isso, futuramente realizaremos novas análises. Esses achados, somados aos dados in vitro, sugerem que a migração dos GCPs através das fibras da glia de Bergmann pode ser fortemente comprometida em conseqüência da mutação do TRβ. 67 Figura 27: Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vivo em P9. Os tecidos cerebelares derivados de animais P9 foram imunomarcados para GFAP e o número de fibras gliais quantificado no lóbulo IX de cada genótipo. (A) Selvagem; (B) Heterozigoto; (C) Homozigoto. As setas apontam locais onde o espaço entre as fibras é maior. Em (D) o gráfico mostra uma redução de 26% no número de fibras da glia de Bergmann no animal HO e de 15% no HE ambos em relação S. Os valores médios ± SEM foram: S – 60,25 ± 2,08; HE – 51,13 ± 1,82; HO – 44,38 ± 1,30. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto. (n: S=3; HE=3; HO=3; *p<0,01; **p<0,001). Barra de escala: 100 μm. 68 Figura 28: Efeitos da mutação no TRβ na glia de Bergmann in vivo em P21. Os tecidos cerebelares derivados de animais com vinte e um dias pós-natal (P21) foram imunomarcados para GFAP e o número de fibras gliais analisado através de microscopia confocal. (A) Selvagem; (B) Heterozigoto; (C) Homozigoto. (D) O gráfico não revela diferença entre os grupos, porém este resultado corresponde a um experimento. S – selvagem; HE – heterozigoto; HO – homozigoto. Barra de escala: 100 μm. 5 DISCUSSÃO 69 5 DISCUSSÃO O cerebelo é um dos principais alvos do hormônio tireoidiano no SNC (Clos et al., 1974; 1980; Clos & Legrand, 1973; Legrand, 1982; Rabié et al., 1977; 1979; 1980; Pesetsky, 1973). Muitos aspectos de seu desenvolvimento são afetados pelas alterações hormonais, incluindo proliferação e migração das células granulares e a arborização dendrítica das células de Purkinje (Legrand et al., 1976; Nicholson & Altman, 1972a,b,c). Grande parte dos efeitos de T3 sobre o cerebelo ocorre através da regulação da transcrição gênica em decorrência de sua ligação aos receptores nucleares. Entretanto, na ontogênese cerebelar apesar de já ter sido descrita a expressão das diferentes isoformas dos TRs nos diversos tipos celulares como astrócitos, oligodendrócitos, células de Purkinje e células granulares (Bradley et al., 1992; Strait et al., 1991), pouco se sabe sobre o quanto cada isoforma contribui para a estruturação deste órgão nas diferentes etapas de seu desenvolvimento. Além disso, poucos são os genes conhecidamente regulados pela ação direta de T3 (AlvarezDolado et al., 1999; Farsetti et al., 1992; Koibuchi et al., 1999). Recentemente, com o uso de novas técnicas, alguns grupos vêm buscando aumentar o conhecimento a este respeito (Quignodon et al., 2007; Takahashi et al., 2007). Neste trabalho, analisamos o efeito da mutação Δ337T da isoforma β do receptor do hormônio tireoidiano (TRβ) na ontogênese do cerebelo de camundongos do período pós-natal à idade adulta. Utilizando ensaios in vivo e in vitro demonstramos que o TRβ está envolvido em diversas etapas do desenvolvimento cerebelar, incluindo proliferação dos GCPs na EGL, migração das células pós-mitóticas da EGL para a IGL e desenvolvimento da glia de Bergmann. Além disso, nosso trabalho é pioneiro em 70 implicar uma isoforma específica do receptor do HT no mecanismo de foliação cerebelar. A importância deste estudo consiste em trazer novas informações a respeito do mecanismo de ação do HT através de sua interação com seus receptores nucleares no desenvolvimento do SNC e contribuir para um maior entendimento a respeito dos déficits neurológicos causados pelas disfunções neuroendócrinas. ¾ Efeito da mutação do TRβ na foliação cerebelar O processo de foliação cerebelar que ocorre principalmente no período pósnatal é caracterizado pelo número de folhas separadas por fissuras. Apesar da organização celular relativamente simples, o padrão de foliação do cerebelo parece ser algo bem mais complexo. Em mamíferos, o cerebelo é dividido em três regiões com distintos padrões de foliação no eixo ântero-posterior (AP): um vérmis central e dois hemisférios bilateralmente simétricos (Altman & Bayer, 1997). Em roedores esse processo ocorre durante as duas primeiras semanas pós-natal, coincidindo com o período de intensa proliferação dos GCPs, o que sugere que o aumento do número de células granulares está intimamente associado à foliação. O processo de foliação começa com a formação de quatro fissuras, que dividem o cerebelo em cinco lobos principais (Altman & Bayer, 1997). Como a proliferação dos GCPs continua neste período, estes lobos se expandem e então se subdividem dando origem ao padrão de foliação específico de cada espécie observado no cerebelo maduro. As fissuras que dividem o lobo central nos lóbulos VI a VIII estão entre as últimas a serem formadas. Devido a essa diferença do padrão de foliação entre o 71 vérmis e os hemisférios cerebelares, tivemos a preocupação neste trabalho, de analisar sempre a região mais central (ou seja, o vérmis), a fim de evitar erros na comparação entre os diferentes genótipos. Em nosso trabalho, mostramos que os animais HO não apresentam a fissura que separa os lóbulos VI-VII e possuem o lóbulo IX pouco desenvolvido, sugerindo que a não-ligação do T3 ao TRβ possa alterar de forma prejudicial a elaboração de alguns lóbulos cerebelares. A formação das folhas cerebelares está intimamente relacionada ao padrão de expansão da EGL. Em 1974, Lauder e colaboradores fizeram um estudo com ratos hipo- e hipertireóideos para analisar o padrão de foliação cerebelar. O hipotireoidismo induz a um aumento no número de fissuras embora com uma menor profundidade, enquanto o hipertireoidismo leva a uma foliação menor, com menos fissuras sendo estas de profundidade normal. O grupo associou a formação das fissuras ao tempo de expansão da EGL que, no hipotireóideo, é prolongado. Enquanto em um animal eutireóideo a EGL tem seu período de máxima expansão em P10 e desaparece por completo até P21, no hipotireoidismo o pico proliferativo ocorre em P15 e a EGL permanece até P24. Já no hipertireóideo, a EGL expande de forma acelerada até P10, mas apesar disso ela é sempre menor em relação ao controle e desaparece também em P21. Lauder propôs que a persistência da EGL no animal hipotireóideo leva a um atraso no desenvolvimento das demais camadas, possivelmente por um retardo na migração, o que acarreta em um período maior de foliação, caracterizado pelo aumento no número de fissuras observado no animal hipotireóideo. Interessante observar que encontramos uma redução de 41% na área e de 38% na espessura da EGL do HO em P9, idade em que detectamos as alterações no padrão 72 de foliação. A análise morfométrica dos cerebelos P21 não detectou persistência da EGL nesta idade, o que sugere que a mutação em TRβ não esteja associada a um quadro de hipotireoidismo cerebelar. Estes achados talvez se devam ao fato dessa mutação levar à interrupção do mecanismo de retro-alimentação negativa exercido pelo T3 no eixo hipotálamo-hipófise-tireóide, o que mantém níveis elevados de TSH, T3 e T4 circulantes, característicos da síndrome de resistência ao hormônio tireoidiano (Carvalho & Ramos, 2004; Refetoff et al., 1967). Soma-se a isso, o fato dos GCPs expressarem principalmente TRα1, que exposto a elevados níveis hormonais pode estar levando estas células a um padrão de hipertireoidismo com uma expansão acelerada da EGL nos primeiros dias associada a uma saída antecipada do ciclo celular. Porém, outros fatores podem estar levando a esta redução da expansão da EGL. Cabe ressaltar que a maior parte dos efeitos decorrentes da mutação pôde ser observado no cerebelo dos animais HO, entretanto, o animal mutante em heterozigose apresentou uma certa variação morfológica, alguns eram muito semelhantes ao animal S, enquanto outros mostravam alterações no tamanho e forma do cerebelo. Porém, as análises quantitativas, em sua maioria, não revelou diferenças estatísticas entre o S e o HE, nesses animais deve haver uma competição entre os receptores normais e mutados, pelo sítio de ligação ao DNA. Isso sugere que a mutação do TRβ é muito mais grave para o desenvolvimento cerebelar quando ocorre em homozigose. Sabe-se que a interação entre as células de Purkinje e os GCPs é muito importante para a proliferação destes últimos bem como para a foliação cerebelar. Isto foi demonstrado em camundongos com mutações que afetam o número das células de 73 Purkinje como Lurcher e Staggerer (Caddy & Biscoe, 1979; Herrup, 1983; Sidman et al., 1962; Smeyne et al., 1995; Wetts & Herrup, 1982). Quando as células de Purkinje são retiradas ou têm sua quantidade muito diminuída, a população de GCPs é extremamente reduzida e a foliação fica prejudicada. Esses trabalhos mostraram que as células de Purkinje possuem um papel essencial na atividade mitótica normal da EGL provavelmente por secretar fatores ou mitógenos específicos. A célula de Purkinje é reconhecidamente a mais importante liberadora do morfógeno-chave para o desenvolvimento cerebelar, Shh (Dahmane & Ruiz i Altaba, 1999). Esse fator é secretado pelo neurônio de Purkinje desde o final do período embrionário até a idade adulta em camundongos (Lewis et al., 2004). Sua via de sinalização envolve o receptor patched (Ptch) e os componentes smoothened (Smo), gli1, gli2 e gli3. Todas essas moléculas estão expressas nos GCPs no período pós-natal (Traiffort et al., 1998; 1999), embora participem de eventos distintos. Foi mostrado que Shh induz a proliferação dos GCPs em cultura, e a injeção de anticorpos neutralizantes contra Shh no cerebelo reduz a proliferação destas células (Dahmane & Ruiz-i-Altaba, 1999; Wallace, 1999; Wechsler-Reya & Scott, 1999). Alterações na via de Shh, normalmente por mutações em Ptch, são as principais causas da formação de meduloblastomas, tumores do SNC caracterizados por intensa proliferação dos GCPs (Ruiz i Altaba et al., 2002). Alterações na expressão de Shh no cerebelo estão associadas a grandes prejuízos no padrão de foliação cerebelar. Vale ressaltar que este padrão varia espacial e temporalmente (Lewis et al., 2004; Corrales et al., 2004). As moléculas e os mecanismos envolvidos no processo de foliação cerebelar ainda são pouco elucidados. Interessante é que algumas das alterações encontradas no nosso animal mutante para TRβ, como a redução da EGL e ausência de algumas fissuras, são 74 semelhantes as que foram encontradas nos animais mutantes para Shh. Contudo, nenhum trabalho mostrou, até hoje, a relação entre as vias de sinalização desses dois fatores (Shh e HT) no sistema nervoso. Como nos animais de nosso estudo, as células de Purkinje estão com sua morfologia e função comprometidas, apresentando-se em número reduzido e com consideráveis prejuízos na sua arborização dendrítica (Hashimoto et al., 2001 e este trabalho), é possível que a secreção de Shh por estas células esteja prejudicada, levando a uma redução da expansão da EGL nos locais que darão origem aos lóbulos VI, VII e IX e alterando a morfologia cerebelar no HO. O estudo dos níveis de Shh nos animais mutantes poderá, no futuro, contribuir para caracterizar o envolvimento desta molécula nos mecanismos de ação do hormônio tireoidiano. Importante observarmos que na região de encontro dos lóbulos, a EGL é sempre maior nos três genótipos, corroborando a idéia proposta por Lauder e colaboradores (1974) de que a formação das fissuras está intimamente ligada à expansão desta camada. Além da molécula Shh, as neurotrofinas BDNF e NT-3 também parecem ser importantes para a foliação cerebelar (Bates et al., 1999; Schwartz et al., 1997). Neurotrofinas (NGF, BDNF, NT-4/5, NT-3) e seus receptores (Trk) são amplamente expressos no cerebelo em desenvolvimento e na idade adulta, sendo indispensáveis para a diferenciação e sobrevida neuronal, bem como para a plasticidade sináptica (Gao et al., 1995; Neveu & Arenas, 1996; Segal et al., 1992; Tanaka et al., 2000). Sadakata e colaboradores (2007) demostraram que camundongos knock-out para a proteína CAPS2, envolvida na liberação de BDNF e NT-3, e localizada nas fibras paralelas das células granulares, exibem muitos déficits no desenvolvimento cerebelar 75 como: ausência da fissura que separa os lóbulos VI e VII; prejuízos na arborização dendrítica das células de Purkinje; atraso na migração celular durante o desenvolvimento; prejuízos na sinalização via Trk; aumento da apoptose na EGL e prejuízos na sinapse entre fibras paralelas e células de Purkinje. A esse quadro está associado um sério comprometimento funcional do cerebelo caracterizado por incoordenação motora e alterações nos movimentos oculares. Este trabalho sugere que a necessidade das neurotrofinas no desenvolvimento cerebelar varia de acordo com regiões específicas, sendo o BDNF e o NT-3 mais importantes para a formação dos lóbulos VI, VII e IX. Esses dados são muito relevantes para o nosso estudo, já que o hormônio tireoidiano participa da regulação dessas proteínas no sistema nervoso (Giordano et al., 1992). Diversas evidências demonstram que grande parte dos efeitos do HT é mediada pela síntese e secreção de fatores de crescimento. No cerebelo, a secreção de NT-3 pela célula granular induzida pelo hormônio tireoidiano, promove a diferenciação da célula de Purkinje (Lindholm et al., 1993). O T3 também induz os astrócitos cerebelares a secretar uma combinação de fatores que agem através de vias autócrinas e parácrinas, modulando a proliferação de astrócitos e neurônios, respectivamente (Gomes et al., 1999). Esses dados apontam a importância das ações indiretas do T3 no desenvolvimento do sistema nervoso. Sendo assim, futuramente, um passo importantíssimo de nosso trabalho poderá ser a investigação da expressão de alguns desses fatores nos animais mutantes e tentar relacionar com a ação genômica do hormônio através de sua ligação ao TRβ. 76 ¾ Efeito da mutação do TRβ na laminação cerebelar: proliferação, migração e desenvolvimento da glia de Bergmann As três camadas cerebelares encontradas no adulto (ML, PL e GL) são resultado de uma série de eventos que, em camundongos, começa por volta dos 10 dias embrionários, mas que ocorrem em sua maior parte no período pós-natal. A morfogênese cerebelar iniciada no período embrionário caracteriza-se pela origem de suas células a partir de duas regiões distintas: a zona ventricular, onde são geradas as células de Purkinje e alguns interneurônios inibitórios do cerebelo (Altman & Bayer, 1997); e o lábio rômbico, de onde partem os neurônios de projeção dos núcleos profundos, as células unipolares em escova e os primeiros precursores das células granulares (Englund et al., 2006; Machold & Fishell, 2005; Wang et al., 2005) . Estes últimos migram tangencialmente à superfície pial do cerebelo primitivo formando a camada granular externa. A EGL é considerada a segunda zona germinativa do cerebelo e é a responsável pela geração das células neuronais mais numerosas do SNC, as células granulares. A EGL é então uma região marcada por intensa proliferação celular a partir de (E15) em camundongos, atingindo o seu pico por volta do início da segunda semana de vida. A maior parte do desenvolvimento cerebelar ocorre no período pós-natal. À medida que os GCPs saem de seus ciclos celulares, eles começam a se diferenciar em células granulares emitindo prolongamentos horizontais e movimentando-se tangencialmente pela camada mais interna da EGL, até que emitem um terceiro prolongamento, agora vertical, que interage com a fibra da glia de Bergmann por onde essas células migram, então, radialmente até a IGL, passando pela camada de Purkinje. A migração e maturação das células granulares estão completas 77 poucos dias após o desaparecimento da EGL (Hatten, 1997; 1999; Komuro & Rakic,1998; Espinosa & Luo, 2008). Todos estes eventos, desde o período embrionário até a idade adulta, são criticamente regulados por diversos fatores, moléculas, proteínas de matriz extracelular e interações celulares; e seus efeitos precisam ocorrer no tempo exato. Qualquer alteração pode levar a grandes prejuízos na estrutura final e principalmente na função do cerebelo. Nossos ensaios de incorporação de BrdU in vitro e in vivo revelaram uma redução significativa na marcação para esta molécula nos animais HO. Esses dados demonstram que direta ou indiretamente, o hormônio da tireóide modula a proliferação dos GCPs via TRβ. Três possibilidades são discutíveis: 1) a proliferação dos GCPs está, de fato, reduzida nos HO; 2) a mutação em TRβ induz a saída precoce dos GCPs do ciclo celular, não sendo possível a detecção de muitas destas células; 3) déficits na migração tangencial dos precursores da EGL a partir do lábio rômbico. A redução da proliferação pode ocorrer em conseqüência da diminuição de mitógenos liberados pelas células de Purkinje que, como dito anteriormente, são as principais estimuladoras da proliferação na EGL através da secreção de Shh (Dahmane & Ruiz-i-Altaba, 1999). Importante lembrarmos que o T3 modula a expressão de laminina no cerebelo em desenvolvimento (Farwell & Dubord-Tomasetti, 1999; Trentin et al., 2003). Esta proteína de matriz extracelular é secretada pelos astrócitos e age através de sua ligação a receptores transmembrana específicos, as integrinas. Camundongos knockout para o gene da subunidade β1 das integrinas (Itgb1) apresentam prejuízos na 78 laminação e foliação de estruturas corticais devido a defeitos na zona marginal e a não formação dos pés-terminais das fibras da glia radial (Graus-Porta et al., 2001). Nestes animais, há uma notável redução de tamanho do cerebelo, causada por defeitos na proliferação dos GCPs (Blaess et al., 2004). Integrina-β1, laminina e Shh formam um importante complexo na regulação da proliferação dos GCPs. A integrina ajuda no recrutamento de laminina-Shh para a superfície do GCP e depois afeta vias de sinalização importantes para a proliferação destas células, através do recrutamento de proteínas citoplasmáticas como a ILK (do inglês: integrin-linked kinase) (Blaess et al., 2004; Mill s et al., 2006). Recentemente, nosso grupo demonstrou que a síntese e secreção de proteínas de matriz extracelular, como laminina e fibronectina pelos astrócitos cerebelares, é modulada pela ação do EGF em resposta ao tratamento com T3 induzindo a proliferação de GCPs e a neuritogênese (Gomes et al.,1999; Martinez & Gomes, 2002; 2005), mostrando que o T3 é capaz de regular a proliferação agindo de forma indireta. A redução das células BrdU positivas no mutante HO pode ser decorrente de uma alteração no ciclo celular dos GCPs. A saída precoce do ciclo pode ser ocasionada pela diminuição da expressão de ciclinas, como ciclina D2, pelos GCPs, o que pode acarretar também no aumento da apoptose na EGL (Poguet et al., 2003). Um terceiro fator a ser considerado para esta redução da EGL é a migração dos precursores do lábio rômbico. A migração tangencial dos GCPs ocorre entre E13-E15 e pouco se sabe sobre fatores e moléculas envolvidas na formação da EGL neste período. A fibronectina foi apontada como uma glicoproteína importante neste processo (Hatten et al., 1982). Uma densa região desta proteína pode ser detectada sobre o lábio rômbico estendendo-se pela superfície cerebelar durante o período de migração 79 tangencial, desaparecendo até o nascimento. Ela pode facilitar a migração dos GCPs por promover uma maior adesão destas células ao substrato. Apesar de já haver expressão de TRs no período pré-natal, as células do cerebelo neste estágio parecem não ser responsivas a alterações dos níveis deste hormônio. A indução do hipo- e hipertireoidismo em ratos embrionários não revelou diferenças na EGL, na migração para a IGL, nem na foliação cerebelar (Schwartz et al., 1997). Além disso, a expressão de TRβ no período pré-natal é muito baixa (Schwartz et al., 1992; Strait et al., 1990). Desta forma, podemos relacionar as alterações encontradas no TRβ mutante com eventos exclusivamente pós-natal e dependentes da ação de T3. O mecanismo de migração das células granulares do cerebelo a partir da EGL até o seu destino final na IGL pode ser melhor compreendido separando-se este evento de acordo com a camada pela qual a GC está se movimentando. Durante o seu estágio migratório esta célula passa por diversas modificações, tanto em sua forma quanto no seu padrão de deslocamento. Komuro & Rakic (1998) mostraram que antes de penetrar na IGL as GCs passam por um período estacionário na PL e que a velocidade de migração pela ML que ocorre através das fibras de glia de Bergmann é apenas um pouco maior que na IGL, porém, mesmo sem esta “trilha”, na IGL as GCs continuam seguindo uma trajetória radial e unidirecional nesta camada, sugerindo a possível participação de moléculas de matriz extracelular distribuídas de maneira distinta entre as camadas de Purkinje e granular interna, o que pode explicar este período estacionário na PL com a expansão de prolongamentos, como se estivessem “tateando” o ambiente a sua volta. 80 A existência de vias migratórias específicas no sistema nervoso sugere que a migração neuronal ocorra sob o controle de pistas direcionadoras. Vários estudos vêm mostrando a participação de diversos fatores e moléculas no mecanismo de migração do cerebelo. Componentes da matriz extracelular como laminina e fibronectina possuem funções importantes neste processo dando suporte à migração neuronal (Trentin & Moura Neto, 1995; 2003), enquanto outras moléculas como relina e tenascina podem atrair ou repelir os precursores neuronais e axônios através da interação com receptores de membrana agindo como pistas direcionadoras (Alvarez-Dolado, 1999; Husmann et al., 1992). Relina tem um importante papel na migração neuronal, seu gene é expresso nas células granulares durante o desenvolvimento cerebelar e, além disso, é conhecidamente regulado pelo HT durante a fase de migração (Alvarez-Dolado, 1999). Outros fatores envolvidos com a migração são as neuregulinas, integrinas, trombospondinas e mais recentemente tem sido descrito o papel da astrotactina. (Anton et al., 1997; Edmondson et al., 1998; Fishell & Hatten, 1991; O’ Shea et al., 1990). A ausência de astrotactina no cerebelo resulta em uma diminuição da habilidade das células granulares ligarem-se à glia de Bergmann, resultando em uma queda da velocidade de migração. Isto leva a um aumento da apoptose na camada granular e altera o desenvolvimento das células de Purkinje. A astrotactina é importante também para a morfologia da célula granular durante a migração e parece que sua principal função está relacionada à facilitação e manutenção da ligação entre a célula granular e a glia de Bergmann. A remoção da astrotactina leva também a um atraso da saída das GCs da EGL (Adams et al., 2002). 81 Fatores de crescimento como o EGF, também estão relacionados a eventos pós-mitóticos no desenvolvimento cerebelar (Carrasco et al., 2003; Seroogy et al.,1995). Células granulares expressam o receptor de EGF (EGFR) durante a migração e quando chegam na IGL esta expressão é reduzida, sugerindo um papel na diferenciação e/ou na migração dessas células. Camundongos que não expressam EGFR apresentam atraso na migração celular. Além disso, um dado importante é que o hormônio tireoidiano regula a indução de ligantes e receptores da família do EGF. Além da redução observada na EGL, nossos resultados mostraram também uma diminuição em todas as camadas cerebelares do HO (EGL, ML e IGL) resultando em um cerebelo menor. Como o hormônio tireoidiano participa de diversos eventos do desenvolvimento cerebelar é possível que vários deles possam estar sendo comprometidos em conseqüência da mutação. Algumas hipóteses para essas alterações podem ser levantadas como a redução da proliferação na EGL, modificação do padrão de migração das células pósmitóticas; inadequada diferenciação ou má distribuição das células granulares na IGL; e ainda pode estar havendo um aumento da morte celular na IGL. A glia de Bergmann é a célula responsável pela migração das células pósmitóticas localizadas na região mais interna da EGL (região pré-migratória), guiando-as até a IGL (Yamada & Watanabe, 2002). Para que isso seja possível ela emite longos prolongamentos desde a camada de Purkinje, onde está o seu corpo celular, até a superfície pial. Vimos que os animais mutantes, principalmente o HO, apresentam uma considerável redução no número de fibras de Bergmann in vivo, além disso, a cultura derivada do animal HO apresentou diferenças importantes em relação ao S e ao HE com um número muito reduzido de células GFAP positivas das quais apenas 25% 82 apresentaram-se radializadas, em contraste com as culturas derivadas dos animais S e HE que possuíam células mais alongadas, ideais para o mecanismo de migração. Esses achados sugerem que o efeito da não ligação do T3 ao TRβ pode prejudicar fortemente o processo de maturação das células gliais. No mecanismo de radialização da glia de Bergmann as neuregulinas possuem uma grande participação. Neuregulinas são expressas nas células granulares quando estas estão migrando pelas fibras da glia de Bergmann. Elas se ligam aos receptores erb-B na superfície celular da glia. Sabe-se que esta interação neurônio-glia é capaz de induzir a diferenciação morfológica da glia radial através da via de sinalização neuregulina-erb-B e a sinalização a partir de erb-B na glia radial é necessária para a migração neuronal (Rio et al., 1997). O contato com as células granulares ativa a via de sinalização de Notch-1 nos astrócitos cerebelares e a ativação de Notch-1 é suficiente para induzir a diferenciação morfológica da glia radial e a expressão do gene BLBP (Patten et al., 2003). A via de sinalização de Notch possui muitas implicações no desenvolvimento cerebelar, principalmente por afetar a interação entre glia de Bergmann e célula granular atuando na diferenciação de uma e na migração da outra. Jagged 1, componente da via de Notch, é necessário para a migração das células granulares, a sua perda leva a uma persistência destas células já diferenciadas na EGL, também é importante para a integridade estrutural da glia de Bergmann e sua ausência leva a uma redução no número de glia e na alteração de sua morfologia que parece ser prejudicada na projeção de suas fibras até a superfície pial (Weller et al., 2006). A proteína transmembrana específica de neurônio DNER conhecida por ser ligante de Notch-1 durante a morfogênese da glia de Bergmann, é altamente expressa nos 83 dendritos da célula de Purkinje e sua deficiência retarda a formação das fibras radiais resultando em um arranjo anormal da glia de Bergmann (Eiraku et al., 2005). Os dados apresentados neste trabalho mostraram que a não-ligação do hormônio ao seu receptor altera de forma importante a morfologia cerebelar, com notáveis reduções em todas as suas camadas no animal mutante HO em P9, levando a um cerebelo menor e com déficits na foliação. A incorporação de BrdU pelas células da EGL e a redução do número de fibras da glia de Bergmann sugerem que tanto a proliferação quanto a migração destas células está prejudicada. Além disso, há uma redução no número de glia de Bergmann com morfologia alongada em cultura apontando para a participação do TRβ na maturação desta célula. Algumas das alterações podem ser percebidas até 3 semanas pós-natal. Em P21, os mutantes apresentaram significativas reduções das áreas cerebelares, mas os prejuízos em sua morfologia parecem estar reduzidos, pois a fissura que divide os lóbulos VI e VII está presente e o lóbulo IX não está diferente do animal selvagem, porém, o lóbulo VI ainda mostra-se pouco desenvolvido. Nestes animais parece que a redução observada na área do lóbulo IX ocorre em conseqüência de alterações na IGL, pois a ML não está diferente do selvagem em contraste com o que foi mostrado por Hashimoto e colaboradores (2001). Esta diferença pode ser resultante de uma quantificação em regiões distintas do cerebelo, pois em seu artigo não fica claro qual lóbulo está sendo analisado e isto é bastante relevante já que os lóbulos cerebelares não se desenvolvem ao mesmo tempo. Já na idade adulta a área cerebelar do mutante está inesperadamente semelhante ao selvagem, porém, significativas alterações na camada de Purkinje estão presentes (Hashimoto et al., 2001; e este trabalho). Apesar dos elevados níveis de 84 hormônio circulante (TSH, T3 e T4), estas deficiências na arborização dendrítica são semelhantes ao quadro de hipotireoidismo. Observamos também uma notável desorganização da PL no HO e ainda que as alterações morfológicas tenham sido consideravelmente revertidas, um prejuízo nas células de Purkinje pode ser suficiente para causar danos funcionais ao cerebelo. Parece haver, nesses animais mutantes, uma mistura de características hipo- e hipertireóideas que vai depender do efeito exercido pelo hormônio em tipos celulares específicos e de acordo com o receptor expresso. Na síndrome de resistência ao hormônio tireoidiano este quadro é observado em muitos pacientes. No cerebelo, sabe-se que há expressão de níveis consideráveis de TRβ1 nas células de Purkinje, já as células granulares expressam mais a isoforma α1 e os astrócitos possuem altos níveis de TRα2, a isoforma não ligante de T3, esta isoforma inclusive é encontrada em altos níveis em roedores na idade adulta. Esta heterogeneidade de receptores encontrada no cerebelo pode explicar a variação dos efeitos da mutação. Embora já esteja claro que a célula de Purkinje participa fortemente do desenvolvimento cerebelar, que ela seja altamente responsiva à ação do T3 e ainda que esta ação possa se dar através do TRβ, há poucos estudos mostrando a importância deste receptor no desenvolvimento deste órgão. Em contraste, muitos trabalhos vêm apresentando a ação do TR α1 na ontogênese cerebelar (Heuer & Mason, 2003; Manzano et al., 2003; Morte et al., 2002; 2004). Com isso, nosso trabalho torna-se uma fonte de novas informações para o melhor entendimento do papel deste receptor. 85 Como a mutação da isoforma β do receptor do hormônio tireoidiano pode estar afetando tantos eventos da morfogênese cerebelar? A interação entre célula granular, célula de Purkinje e glia de Bergmann é fundamental durante todas as etapas do desenvolvimento deste órgão. Como dito anteriormente, a célula de Purkinje expressa principalmente TRβ1 e nos animais mutantes ela possui morfologia e função comprometidas. Há um importante prejuízo na sua arborização dendrítica o que altera sua interação com as células granulares e com a glia de Bergmann. A glia de Bergmann é essencial para a migração dos precursores das células granulares da EGL para a IGL e apesar delas, talvez, não sofrerem a ação direta do HT através do receptor tipo beta, sabe-se que as células de Purkinje são capazes de secretar fatores que interferem no desenvolvimento e manutenção de sua morfologia alongada (Sotelo et al.,1994). Nossos dados sugerem que a isoforma beta do receptor nuclear do HT pode estar envolvida nas diferentes etapas da morfogênese cerebelar como, proliferação dos GCPs na EGL, migração das células granulares pela glia de Bergmann, maturação glial e neuronal e também na foliação do cerebelo. Sugerimos também que a ação do T3 via TRβ possa ocorrer de forma indireta induzindo a síntese e secreção de fatores importantes para estes eventos (Figura 29). Não podemos descartar a possibilidade de uma ação direta do T3 na modulação destes eventos regulando de forma positiva ou negativa a transcrição de determinados genes-alvo, sendo assim, este trabalho tem grande relevância para o entendimento do mecanismo de ação do HT através de sua interação com receptores nucleares. Embora muitas questões não tenham sido ainda esclarecidas, este estudo poderá contribuir 86 enormemente para a investigação mais aprofundada dos efeitos diretos e/ou indiretos do hormônio tireoidiano no SNC. Figura 29: Efeitos da mutação do TRβ no desenvolvimento cerebelar. A mutação do TRβ impede a ligação do T3 a este receptor, e como conseqüência observamos uma redução da proliferação dos precursores das células granulares na EGL, prejuízos na radialização da glia de Bergmann comprometendo a migração das células granulares pela ML e consideráveis déficits na arborização dendrítica das células de Purkinje. Estas alterações podem estar levando também à desequilíbrios da síntese e secreção de importantes fatores moduladores das diferentes etapas da morfogênese do cerebelo, resultando na redução de suas camadas celulares e na modificação do padrão de foliação cerebelar. 6 CONCLUSÕES 87 6 CONCLUSÕES 1) A mutação do TRβ induz importantes alterações na morfologia do cerebelo durante o desenvolvimento pós-natal, prejudicando a sua foliação e formação de suas diferentes camadas. 2) O TRβ mutado promove a redução do cerebelo e de suas diferentes camadas, principalmente, da EGL em P9 e da IGL em P21. 3) Esta mutação provoca a redução da proliferação dos GCPs na EGL e pode levar a uma alteração no padrão de migração das células granulares, já que há uma redução no número de fibras de glia de Bergmann in vivo e em cultura elas não apresentaram morfologia radial. 4) Algumas destas alterações são mantidas até idades mais tardias como observado nos animais P21, porém não comprometem de forma permanente a estrutura cerebelar, pois com exceção das células de Purkinje que estão desorganizadas em sua camada, o animal mutante adulto possui um cerebelo semelhante ao do animal normal. 5) O efeito da mutação é mais severo nos animais em homozigose e varia muito nos animais em heterozigose. De uma maneira geral, podemos concluir que a ação do hormônio tireoidiano através de sua ligação ao TRβ é muito importante para o desenvolvimento normal do cerebelo e que esta ação pode promover efeitos diretos e/ou indiretos nos seus diferentes tipos celulares 7 REFERÊNCIAS 88 7 REFERÊNCIAS ADAMS NC, TOMODA T, COOPER M, DIETZ G, HATTEN ME. Mice that lack astrotactin have slowed neuronal migration. Development 129 (4): 965-72, 2002. ALDER J, LEE KJ, JESSEL TM, HATTEN ME. Generation of cerebellar granule neurons in vivo by transplantation of BMP-treated neural progenitor cells. Nature Neuroscience 2(6): 535-540, 1999. ALLEN G & COURCHESNE E. Differential effects of developmental cerebellar abnormality on cognitive and motor functions in the cerebellum: an fMRI study of autism. Am J Psychiatry. 160 (2): 262-73, 2003. ALTMAN J & BAYER SA. Embryonic development of the rat cerebellum. II. Translocation and regional distribution of the deep neurons. J Comp Neurol. 231 (1): 27-41, 1985. 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