creditos auto c h a p e u crédito foto A carnavalesca conceitual por Cynthia Garcia fotos Fernando Martinho A artista diante da interferência Bailinho, de vinil sobre vidro, à maneira de um enorme vitral, 34 revista feita por ela para a exposição É assim que a carioca Beatriz Milhazes se autodefine como artista. Coisa que pode ser comprovada na sua maior mostra de obras, recém-aberta no museu mais importante do Brasil 1. Lacta, colagem sobre papel, 96 x 66,5 cm, 2004, coleção particular, Rio de Janeiro. Em exposição na Pinacoteca D esde sábado último, a Estação Pinacoteca, no prédio da Pinacoteca do Estado, de uns anos para cá o mais importante e atuante museu do país, em São Paulo, tem as três galerias do quarto andar ocupadas pela mostra não-cronológica Beatriz Milhazes: pinturas e colagens. Composta por 23 pinturas, cinco gravuras e quatro colagens, produzidas de 1989 a 2008, das quais 11 nunca expostas no Brasil, é a primeira individual num museu brasileiro dessa artista, atualmente um dos expoentes do cenário internacional das artes. O peso do evento também está no nome do curador, Ivo Mesquita, à frente da 28.ª Bienal de São Paulo, que inaugura em outubro. Para o acervo do museu, ela fez uma doação de uma série completa de 16 gravuras (“dedico meu tempo igualmente para a gravura, que venho desenvolvendo na Durham Press, nos Estados Unidos”). Sem dúvida, um gesto de valor da ex-aluna de artes que surgiu na coletiva Como Vai Você, Geração 80?, em 1984, no Parque Lage, e hoje tem cinco anos de fila de espera para compra de um trabalho seu. A importância do gesto vai além, se considerarmos que sua tela O Mágico, adquirida por um colecionador espanhol durante uma individual, em 2001, em Madri, por US$ 15 mil, foi arrematada sete anos depois por US$ 1,049 milhão, em março deste ano, num leilão na Sotheby´s, em Nova York, pelo investidor argentino Eduardo Constantini, um dos maiores colecionadores da América Latina. Provavelmente, poucos investimentos têm uma valorização de 985,7% ao ano. Com isso, ela, que havia batido o recorde de venda de artista brasileiro vivo com sua tela Laranjeiras – vendida em Londres por 228 mil libras (cerca de R$ 800 mil), domingo no ano passado –, quebrou a própria marca anterior, e desde então detém o título de maior venda alcançada por obra de arte 1 brasileira de artista vivo ou morto. Beatriz Milhazes iniciou sua carreira no Rio, mas foi ao integrar o time de artistas do galerista carioca radicado em São Paulo João Manuel Sattamini, já falecido, dono da ex-Galeria Subdistrito, centro da efervescência artística dos anos 80, que começou sua ascensão. Hoje, na capa da bíblia do cultuado Art Now, Vol. 2, da editora alemã Taschen, está um fragmento de uma obra dessa carioca, escolhida entre os 136 principais nomes da arte internacional publicados no livro. A obra em questão é Maresias, de 2002, uma pintura em tinta acrílica sobre uma gigantesca tela de 300 x 266,5 cm, que não está presente na mostra. No capítulo dedicado a essa artista, que batiza suas obras com o charme de nomes bem brasileiros (Sonho de Valsa, Joá, Serpentina, O Macho, O Turista, O Popular, Mariposa, Periquita, Nega Maluca), o crítico de arte Jens Asthoff, que vive em Hamburgo, na Alemanha, escreveu: “Os seus painéis, quase todos em grande formato, ostentam um colorido intenso e uma abundância extravagante de motivos que se traduzem numa presença fascinante”. Beatriz Milhazes falou com exclusividade para Domingo na sala da Estação Pinacoteca, onde ela fez uma intervenção nas fachadas laterais do prédio de aproximadamente 500 m2. Batizada Bailinho, ela foi criada com vinil transparente colorido, aplicado em formas geométricas nos vidros das janelas dos dois lados da galeria central. Como um vitral, Beatriz trabalhou, em suas palavras, “a questão da cor”. Certa vez, diga-se, a artista se referiu a si mesma como uma “carnavalesca conceitual”. revista domingo 35 c a p a b e a t r i z m i l h a z e s Os destaques da mostra O que achou do resultado da exposição na Estação Pinacoteca? É um projeto que estamos desenvolvendo há três anos. Fiquei muito feliz com a curadoria do Ivo Mesquita. Ele levantou obras minhas que nunca tinham sido vistas e colocou-as com telas de produção recente para ver como dialogam. “ter meu estúdio no rio é um prazer. e levo a cidade comigo para o mundo todo” 2. Coisa Linda II, acrílica sobre tela, 300 x 190 cm, 2001, coleção Mario Testino, Londres. Tem 3 metros de altura, uma das maiores da exposição entenda Beatriz Ivo Mesquita, curador da exposição, explica como poucos o trabalho da artista 3. Os Três Músicos, acrílica sobre tela, 220 x 190 cm, 1998, coleção Marcos Coimbra, São Paulo “O trabalho de Beatriz Milhazes está entre os mais conhecidos e originais no não num museu carioca? panorama da visualidade contemporânea, Os cariocas querem que eu faça tudo no Rio. tendo criado um vocabulário plástico próprio, Na Pinacoteca existe um departamento especializado com superfícies compostas por planos e formas em papel que funciona. Amo o Rio, não tenho interesse em coloridas, vibrantes e evocativas. Ele tem sido entendido, por sair da cidade, preciso do Rio para a criação do meu trabaum amplo espectro de intérpretes e apreciadores, como uma lho. Ter meu estúdio no Rio é um prazer e acabo levando produção diretamente relacionada com certo imaginário em torno da minha cidade para o mundo todo, mas questão profissiopaisagem, da flora e da fauna tropicais, dos territórios do feminino, nal é outra história. Não conheço, no Rio, museu com das tradições das expressões populares. Nesse sentido sua pintura condições técnicas para expor obras de papel. É preciseria uma celebração da brasilidade; uma experiência da vida carioca, so separar instituição cultural de museu, que é um local do carnaval, do universo das formas do Barroco e da decoração onde há uma coleção, um programa e uma reserva técreligiosa. nica para o cuidado do acervo. No Rio, poderíamos É evidente que todos esses elementos estão nas pinturas de Milhazes, pois ter, mas ainda não temos essa estrutura. É uma cidaela é uma artista brasileira e o seu lugar de trabalho é o Rio de Janeiro.” Por que a exposição num museu paulista, de balneária, muito úmida, o que requer cuidado ainda maior com obra de papel devido aos fungos. No meu estúdio fazemos um trabalho permanente de acondicionamento. A galeria que a representa no Brasil não é cario- 4. Help Yourself, acrílica sobre tela, 178 x 180 cm, 1995, coleção privada, Bandeirante, Paraná 2 entrada principal do museu. Como não dá para fazer um diálogo com a luz na sua totalidade, usarei, também, vinis opacos. São diferentes, o de Tóquio será mais um painel que um vitral, o da Pinacoteca é um vitral concebido para funcionar com luz natural. Arte impressa Há várias publicações com reproduções das obras de Beatriz Milhazes A curadora internacional do Tate Modern, Tanya Barson, disse textualmente a Domingo que tem 2007 – Art Now, Vol. 2, por Uta Grosenick (Editora Taschen), Alemanha. Trata-se de uma seleção de grandes novos artistas. Beatriz está também na capa do livro 2006 – Beatriz Você faz de oito a dez trabalhos por ano. É uma questão Milhazes – Cor e de mercado? Volúpia, por Paulo Minha produção sempre foi lenta e pequena. Na verdade, eu Herkenhoff (Editora produzia menos antes. Aumentou porque tenho mais demanda e, Francisco Alvesl), até 96, eu só era pintora, a partir daí passei a fazer gravuras. Esses Rio de Janeiro trabalhos não significam apenas pinturas, incluem interferências, cola2003 – Mares do Sol – Beatriz Milhazes, gens e séries esporádicas de gravuras. A pintura é o maior desafio porque CCBB, Rio de Janeiro é a matéria-prima para todos os outros projetos, e as interferências arquitetô2002 – Urgent Painting, Musée d´Art nicas ganharam um vulto no meu trabalho, é algo que me interessa continuar Moderne de la Ville de Paris desenvolvendo. 2001 – Beatriz Milhazes, Ikon Gallery, Birmingham Você tem feito interferências na arquitetura de museus importantes, como esta na Museum & Art Gallery ca. Por quê? interesse na aquisição de uma obra sua. Como Minha primeira galeria foi a Cesar Aché, depois a Saramenha e, por último, a Ana Maria Niemeyer, todas no Rio, mas, a partir do final dos anos 80, meu centro, em termos de galeria, sempre foi São Paulo. O Rio melhorou muito como mercado, está com várias galerias novas. isso funciona? 4 Sou latino-americana, mas estou na categoria de artista internacional em termos de visibilidade e de preço, com isso a minha situação fica num impasse. No caso do MoMA e do Guggenheim de Nova York, ambos com obras suas, como foi? Os museus americanos possuem um sistema mais ágil porque têm colecionadores que são doadores. O processo de compra é casado, o sponsor (doador) faz em conjunto com o Aqui na Pinacoteca trabalhei com vinis translúcidos e luz natural. Lá vou fazer uma intervenção na 36 Quando envolve museu, a questão é complexa. O ideal é que o museu esteja interessado na obra do artista, que é o caso do Tate, e não interessado na aquisição de uma peça. Já fiz um projeto com o Tate, ela (Tanya Barson) tem sido apoiadora do meu trabalho. Mas o contexto da divisão de verbas, que é relativamente recente, devido à separação de acervos do Tate Modern e do Tate Britain, que ficou com todo o acervo de arte inglesa, e o (Tate) Modern, com arte internacional, ainda está sendo definido. Mas o Tate Modern tem um fundo para obras da América Latina. Pinacoteca. Como é a interferência para o museu de Tóquio, em outubro? 3 5. Sem título, acrílica sobre tela, 182 x 176 cm, 1993, coleção Gilberto Chateaubriand/MAM, Rio de Janeiro 5 revista domingo revista domingo 37 c a p a museu, que escolhe a obra. Esse sistema ainda não existe na Europa. No Tate ainda é o sistema de verba levantada pelo governo. E no Brasil? É o sistema europeu. Mas há pouca verba para compra de obras e, em muitos casos, nenhum programa de aquisição. A Pinacoteca tem feito um trabalho louvável, tem conseguido levantar fundos para a compra de obras. b e a t r i z m i l h a z e s 6. Férias de Verão, acrílica sobre tela, 149 x 399 cm, 2005, coleção Franck Petigas, Londres “ainda são poucas as mulheres respeitadas na área da pintura internacional” 7. My Baby, acrílica sobre tela, 179 x 178 x 6 cm, 2000 6 7 Matisse, Bridget Riley, Oiticica, Mondrian e Sonia Delaunay são referências na sua arte. Todos E o colecionador alemão Benedikt estão mortos, exceto a inglesa Bridget Riley, artista Taschen, dono da Editora Taschen? central do movimento pop art. Você a conhece? Benedikt é um entusiasta do meu trabalho. Tem apoiado não só colecionando minha obra como estamos produzindo um livro, que será lançado em 2009, e o convite que me fez para criar um mural na livraria Taschen, de Nova York, projeto de Philippe Starck, foi uma experiência única. Nunca a encontrei, temos até pessoas conhecidas em comum, em Londres. Mas o triunvirato da minha referência é Matisse, Mondrian e Tarsila (do Amaral). Na seqüência vem a Bridget Riley, por causa da questão op (de op art), e a Sonia Delaunay. A arte abstrata em geral mas principalmente a construtiva e a geométrica são os meus pontos principais de observação. Gosto do Kandinsky e do surrealismo de Magritte. Como movimento de arte, me sinto próxima do modernismo, tanto o brasileiro dos anos 20, 30 como o europeu, e da relação que tinha de aproximar a pintura à vida, como fez Matisse. Nosso modernismo se inspirou na nossa cultura, que é uma coisa que introduzo na minha pintura. Pequeno Glossário de arte: Arte abstrata – Arte não-figurativa. Arte como comentário cultural Arte conceitual – Surgida nos anos 1960, define a arte regida por uma idéia, não por uma imagem Colagem – Obra de arte realizada com objetos justapostos ou sobrepostos presos a uma superfície Abapuru, de Tarsila do Amaral, de 1928, e O Mágico, de Beatriz Milhazes, de 2001, ambas das duas artistas de maior valor de mercado da arte brasileira, estão na coleção do argentino Eduardo Constantini. O que acha disso? Coletiva – Ou mostra coletiva, exposição dos trabalhos de mais de um artista Corrente dominante – Tendência predominante que reflete o gosto do público em geral Ele é um grande colecionador latino-americano, ama arte, Crossover – Refere-se à tem um museu importante (o Malba – Museu de Arte Latinopermeabilidade dos americana de Buenos Aires). Saber que esse trabalho está na limites entre a arte e América Latina – porque os meus mais importantes estão fora – é a cultura popular muito bom. Que venham mais... e entre as Vendida na Sotheby´s, em Nova York, por US$ 1,049 milhão, sua tela O Mágico bateu recorde histórico na arte brasileira de venda em leilão de diferentes culturas artista vivo ou morto. Antes foi vendida por uma galeria em Madri, por Individual – Ou mostra individual, exposição dos trabalhos de somente um artista Mercado primário – Primeira venda de uma obra de arte. Significa que a obra nunca havia sido posta à venda antes Mercado secundário – Revenda de uma obra de arte após a venda inicial (primária). Diz-se uma venda no mercado secundário Op art – Tipo de arte abstrata dos anos 60 que joga com efeitos ópticos Como foi trabalhar com Starck? 8. O Beijo, acrílica sobre tela, 190 x 300 cm, 1995, coleção particular, Colônia, Alemanha (Risos) Nunca o encontrei. Mais globalizada que a Taschen é impossível. O projeto começou em 2005, tinha eu no Rio, a coordenação na Ale8 manha, o Philippe Starck em Paris, a loja em Nova York, a produção feita em três estados dos Estados Unidos e a impressão na Alemanha (risos). Tivemos um encontro, no início, mas o Starck não foi, mandou o arquiteto braço direito dele, e depois um encontro para celebrar a abertura da loja, em março do ano passado, mas ele também não foi. 9. O Leme, acrílica sobre tela, 179 x 197 cm, 2002, coleção The Monsoon Accessorize Art, Londres Pop art – Estratégia artística da década de 60 que transformou a iconografia popular do cinema, da música e do comércio em arte O mercado internacional de arte ainda é dominado por homens. Como conseguiu ultrapassar essa barreira? Por meio da qualidade, inteligência e raciocínio da minha pintura. A arte, principalmente da minha área, a pintura, ao contrário do que muitos pensam, é de domínio masculino. A entrada da mulher é restrita. Ainda são poucas as mulheres respeitadas nesse setor das artes internacionais. O Brasil é um caso à parte, temos mulheres centrais na nossa história da arte: Tarsila do Amaral, Lygia Clark, Ligia Pape, Regina Silveira, Tomie Ohtake e por aí vai. Isso não acontece nos Estados Unidos nem na Europa. Na minha carreira internacional isso me surpreendeu, não achei que fosse assim. Tive de provar dobrado, ser forte e ter um trabalho inteligente para ganhar espaço. Surrealismo – Movimento artístico e literário dos anos 20 no qual a arte gira em torno de sonhos e do inconsciente (Fonte: Coleccionar Arte contemporáneo por Adam Lindemann, editora Taschen, 2006) US$ 15 mil. Por quanto você a vendeu inicialmente? Não me lembro. Ela fazia parte da exposição que fiz em Madri, em 2001. Foi vendida a um colecionador espanhol, que a colocou no leilão da Sotheby´s, e aí saiu por esse valor. 38 revista domingo 9 revista domingo 39 Marcus Leight e Andrew Dunkley, Londres c a p a Como lida com a inveja dos outros artistas? (Risos) Ah, não penso mesmo. disse na abertura da exposição “não confundir arte com mercado de arte”. Alguns chamam seu trabalho de “estamparia”. É uma visão ignorante. Ninguém é obrigado a gostar. Tenho um público importante, os principais críticos de arte do mundo, do The New York Times, do The Guardian e outros, já escreveram sobre meu trabalho. “uma das coisas mais comentadas é o quanto meu trabalho é artesanal” 10. Guanabara, painel temporário no restaurante do museu Tate Modern, Londres, Inglaterra, 2005 Como é ver seu nome ao lado de expoentes da arte contemporânea como Takashi Murakami, Ron Mueck, Thomas Struth e Jeff Koons? 11. Gávea, vinil sobre vidro, interferência na fachada da loja de departamentos Selfridge’s de Manchester, Inglaterra, 2004 10 12. Painel permanente de Beatriz Milhazes para livraria Taschen, projeto de Philippe Starck, Nova York, 2007 13. Tempo de Verão, cenografia para Márcia Milhazes Cia. de Dança, 2004 Como elabora a sua técnica? Ivo Mesquita, curador da exposição, diz que você tem um “raciocínio pro- A retirada do plástico deve ser complicada. (Risos) Principalmente no Rio, que é muito úmido. Em geral, colo à noite e retiro no dia seguinte, mas, às vezes, ainda continua molhado. Dependendo da espessura da película que faço, posso criar efeitos na retirada do plástico. Tenho um repertório de imagens que reutilizo. Crio imagens novas e repito as antigas. 11 O valor da arte Por quanto foram leiloadas algumas telas dela 2008 O Mágico, vendida na Sotheby´s, em Nova York, por US$ 1,049 milhão. Valor recorde alcançado por uma obra de artista brasileiro vivo ou morto Há dois anos você deu uma palestra na FAAP (Facul- 2007 dade Armando Álvares Penteado), em São Paulo, paLaranjeiras, vendida na Christie´s, em Londres, ra os estudantes de artes plásticas, que deixou dúbia a por 228 mil libras (cerca de R$ 800 mil) questão em que revelou trabalhar com um assistente. Agora é Hora de Fazer Nana, vendida na casa de leilões Vamos esclarecer, meu assistente não cria nada, quem cria Aloisio Cravo, em São Paulo, por R$ 315 mil tudo sou eu. Essas películas que faço, por exemplo, se é preciso O Periquito, vendida pela casa de leilões Phillips de dar dez camadas de tinta branca, não preciso fazer isso, ele faz. Ele Pury, em Londres, por US$ 293 mil. No mesmo leilão prepara a tela e aplica coisas que eu desenvolvo. foram vendidas a tela O Peixe, por US$ 281 mil, e a colagem Sonho de Valsa, por US$ 263 mil Muitas vezes, na arte contemporânea, o artista nem “toca” na tela. O que diz disso? 2006 São Jorge 2, vendida pela leiloeira carioca Soraia Cals, no Rio, por R$ 440 mil Meu trabalho é extremamente artesanal. No caso de Bailinho (a interferência nos vidros das janelas da Estação Pinacoteca), primeiro faço o desenho à mão sobre uma planta, depois vai para o computador. Uma das coisas mais comentadas é o quanto meu trabalho ainda é artesanal. Isso quase não existe mais na arte contemporânea. Hoje, mesmo entre pintores conceituados, existe uma parcela que não “toca” mais na tela por questões conceituais da contemporaneidade, que não tem absolutamente nada a ver com a qualidade do trabalho deles. 40 revista domingo Eric Laignel, NY Meu processo é baseado na colagem. Os materiais que uso são os tradicionais da pintura. Crio motivos pintados com tinta acrílica sobre um plástico. Essa tinta se torna uma película, posteriormente colada sobre a tela de lona. Quando a película está totalmente seca, o plástico é retirado. Selfridges & Cº gramático”. 12 Onde ver a artista Além da mostra na Pinacoteca paulista, há obras de Beatriz em outros museus pelo planeta Rio de Janeiro – MAM e Museu Nacional de Belas-Artes Niterói – MAC São Paulo – Estação Pinacoteca e MAM Nova York, EUA – MoMa, Metropolitan e Guggenheim São Francisco, EUA – MoMa Madri, Espanha – Centro de Arte Reina Sofia Inglaterra – Birmingham Museum of Art Japão – Museu de Arte Contemporânea de Kanazawa Cada artista tem sua própria história. Obviamente atingi um patamar alto em nível brasileiro e internacional. É a primeira vez que a arte brasileira chega a esse patamar, não só comigo, mas com alguns artistas brasileiros também. É um aprendizado para todos. No cenário internacional não é todo artista que chega a esses valores, que tem essa aceitação, convites para participar de museus e exposições, boas vendas no mercado secundário (em leilões). Amo o que faço, fiz carreira internacional, obviamente torcendo para que tudo desse certo, mas não esperava esse reconhecimento. Minha escola é brasileira, carioca, nunca estudei fora do Rio. Fico superfeliz em ver meu trabalho nas melhores coleções do mundo, registrado pelos críticos de arte e curadores mais influentes. É um presente. Amir Sfair Filho e Alceu Bett, Rio de Janeiro Houve um artista plástico que me mundo afora E a exposição que você está preparando para fevereiro de 2009, na Fundação Cartier, em Paris? Vai ter semelhanças com a da Pinacoteca, farei uma interferência na fachada do prédio, mas vou expor, no máximo, dez telas. 13 O prédio é do arquiteto Jean Nouvel, tem uma arquitetura forte. Na fundação Cartier, o artista, juntamente com o curador da mostra – no meu caso é o próprio diretor da fundação, Hervé Chandès –, tem de projetar, desenhar e construir tudo. Estou tendo a colaboração do arquiteto Chico Cunha no desenvolvimento do projeto arquitetônico, que terá um diálogo com a fachada dos vidros com os vinis, com as obras no espaço interno, com o desenho das salas e com o jardim. Sua exposição, em São Paulo, termina em novembro. Alguma obra da mostra da Pinacoteca será exibida em Paris? É possível que sim, mas ainda não houve a seleção final. O que diria a um artista principiante? Invista na qualidade do seu trabalho que é a única coisa que faz você construir uma carreira. Uma coisa é o trabalho, outra é a carreira. Sem trabalho ninguém desenvolve carreira. É o que fez com que eu construísse o que consegui até hoje. D Beatriz Milhazes Pinturas e Colagens – Estação Pinacoteca, Largo General Osório, 66. São Paulo. Tel.: (11) 3337-0185. De 6 de setembro a 30 de novembro revista domingo 41