I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL FORMAÇÃO PONTA GROSSA : HISTÓRIA, FÁCIES E FÓSSEIS PONTA GROSSA FORMATION: HISTORY, FACIES AND FOSSILS ELVIO P. BOSETTI Laboratório de Estratigrafia e Paleontologia, Departamento de Geociências, Universidade Estadual de Ponta Grossa. R: Otaviano Macedo Ribas, nº 164, Bairro Boa Vista, CEP 84070 540, Ponta Grossa, Paraná. <[email protected]> DRIELLI PEYERL Universidade Estadual de Ponta Grossa, Departamento de História Bolsista do CNPq Praça Santos Andrade, Centro <[email protected]> RODRIGO S. HORODYSKI Pesquisador do Laboratório de Estratigrafia e Paleontologia, Departamento de Geociências, Universidade Estadual de Ponta Grossa. R: Otaviano Macedo Ribas, nº 164, Bairro Boa Vista, CEP 84070 540, Ponta Grossa, Paraná. <[email protected] > CAROLINA ZABINI Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Bolsista do CNPq <[email protected]> Abstract - The designation "Schistos of Ponta Grossa" was used for the first time by Euzébio Paulo de Oliveira (Oliveira, 1912), to designate the loamy layers abundantly fossiliferous of the Devonian lands close to the city of Ponta Grossa, in the Paraná State, Brazil. However, layers of sedimentary rocks containing concentrations of fossil sea invertebrate animals, were first registered in the State of Paraná, for the Geological commission of the Empire of Brazil (1875-1877), constituted by the government of Emperor D. Pedro II. There are three phases identified in the evolution of the knowledge of the Devonian of the Paraná State. The first, acted by the phase of pioneering works, begins among the end of the XIX century and beginning of the XX century. It is characterized by an intense descriptive and qualifying phase of analyses that reflected the tendencies of the Natural History of that time. Later, among the decades of 1940 and 1980, a second phase of studies is promoted. In this cycle it was looked for by answers and questions of interpretative character where themes and propositions of models were approached involving the autoctonia or aloctonia of the fossils, its apparent endemism and their relationships with other contemporary sedimentary basins. In this time the studies also suffered progress in the area of Sedimentology and Stratigraphy, and the Paleogeography of the period began then to be unmasked. In the current apprenticeship of the knowledge of south-Brazilian Devonian, a tendency is observed to the revaluation of the concepts, as well as the reverse-investigation of the fossiliferous graves under the perspective of Taphonomy and of the Stratigraphy of Sequences. Keywords - Devonian; Ponta Grossa Formation; Paraná. Resumo - A designação “Schistos de Ponta Grossa” foi usada pela primeira vez por Euzébio Paulo de Oliveira (Oliveira, 1912), para designar as camadas argilosas abundantemente fossilíferas dos terrenos devonianos próximos à cidade de Ponta Grossa, no Estado do Paraná, Brasil. No entanto camadas de rochas sedimentares, contendo concentrações de invertebrados marinhos fósseis, foram pioneiramente registradas no Estado do Paraná pela comissão Geológica do Império do Brasil (1875-1877), constituída pelo governo do Imperador D. Pedro II. São identificadas três fases na evolução do conhecimento sobre o Devoniano do Estado do Paraná. A primeira, representada pela fase de trabalhos pioneiros, inicia-se entre o final do século XIX e início do século XX. É caracterizada uma intensa fase de análises descritivas e classificatórias que refletiram as tendências da História Natural daquela época. Posteriormente, entre as décadas de 1940 e 1980, uma segunda fase de estudos é promovida. Neste ciclo se buscou por respostas e questionamentos de caráter interpretativo onde foram abordados temas e proposições de modelos envolvendo a autoctonia ou aloctonia dos fósseis, seu aparente endemismo e suas relações com outras bacias sedimentares contemporâneas. Nesta época os estudos também sofreram avanços na área de Sedimentologia e Estratigrafia, e a Paleogeografia do período começou então a ser desvendada. No atual estágio do conhecimento sobre o Devoniano sul-brasileiro, observa-se uma tendência à reavaliação dos conceitos, bem como à reinvestigação dos jazigos fossilíferos sob a perspectiva da Tafonomia e da Estratigrafia de Seqüências. Palavras-chave - Devoniano; Formação Ponta Grossa; Paraná. 353 I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL Linha temática - História das Ciências da Terra rochas devonianas no sul do Brasil (Bergamaschi, 1999, p. 40) e posteriormente envia uma coleção de fósseis encontrados na região ao paleontólogo John Mason Clarke (1857–1925) do New York State Museum (Albany, NY). Clarke foi estudante profundo e intérprete agudo da significação da Paleontologia de invertebrados; autor de muitas memórias significativas, especialmente das faunas devonianas da Bacia de Nova Iorque; administrador capaz e precursor dos estudos paleontológicos do Devoniano brasileiro. Esta coleção retornou posteriormente ao Brasil e é a referência paleobiológica mais completa da Formação Ponta Grossa. Encontra-se depositada na Divisão de Paleontologia do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) na cidade do Rio de Janeiro. Os trabalhos básicos mais importantes desta fase inicial são representados pelas publicações de Orville A. Derby, em 1879 e 1883; Josef v. Siemiradski, em 1898; I. C. White, em 1908; J. B. Woodworth, em 1912, e pelas notas paleontológicas de E. Kayser, em 1900. Clarke (1890) descreve o trilobita Dalmanites gonzaganus, que, embora tenha sido revisado mais tarde pelo próprio autor, foi o primeiro fóssil especificamente identificado para o Estado do Paraná (Lange, 1954). Clarke (1913) publica a monografia que se tornaria a obra clássica das descrições paleontológicas do Devoniano da Bacia do Paraná (Fósseis Devonianos do Estado do Paraná). No mesmo ano é publicada outra obra de grande importância para a paleontologia do devoniano paranaense. Trata-se do trabalho de Roman Kozlowski (1913), que foi efetivado em concomitância ao trabalho de Clarke, porém foi publicado posteriormente e por esse motivo não obteve a prioridade dos termos. As denominações geológicas que viriam a ser consagradas pelo uso por grande parte dos pesquisadores subseqüentes foram introduzidas por Oliveira (1912), que definiu da base para o topo a seguinte subdivisão litoestratigráfica: “grés de Furnas”, “schisto de Ponta Grossa” e “grés de Tibagy”. Uma quarta unidade devoniana foi acrescentada no topo desta seção por Maack (1947), e foi denominada “Folhelhos São Domingos”. Como já referido, a formalização das unidades devonianas paranaenses acontece com Petri (1948), onde foram propostas as denominações “Formação Furnas e Formação Ponta Grossa”, para designar a base e o topo da seqüência, respectivamente. 1 Evolução do Conhecimento A designação “Schistos de Ponta Grossa” foi usada pela primeira vez por Euzébio Paulo de Oliveira (Oliveira, 1912), para designar as camadas argilosas abundantemente fossilíferas dos terrenos devonianos próximos à cidade de Ponta Grossa, no Estado do Paraná, Brasil. A proposição formal desta unidade litoestratigráfica como “Formação Ponta Grossa” foi efetuada por Petri (1948) e posteriormente, Lange e Petri (1967), a subdividiram em três membros. No entanto camadas de rochas sedimentares, contendo concentrações de invertebrados marinhos fósseis, foram pioneiramente registradas no Estado do Paraná pela comissão Geológica do Império do Brasil (1875-1877), constituída pelo governo do Imperador D. Pedro II. Coordenada pelo geólogo canadense Charles Friederich Hartt, a comissão iniciou seus trabalhos em 1875 e o planejamento preliminar enfocou o estudo da Geologia, da Paleontologia e das minas do Império. Como assistentes imediatos foram designados ainda os geólogos norteamericanos Orville A. Derby, Richard Rathbun, John Casper Branner e Herbert Smith. Além destes, os exploradores Elias Pacheco Jordão, Luthero Wagoner, Francisco de Freitas e Marc Ferrez fizeram parte da equipe atuando diretamente nos trabalhos de campo (cf. Lange, 1954). No ano seguinte Charles F. Hartt, então empenhado no reconhecimento da bacia carbonífera do Estado de Santa Catarina encarrega o auxiliar Luthero Wagoner de percorrer parte do Estado do Paraná. Durante esta excursão, Wagoner investiga a região de Ponta Grossa e encontra alguns fragmentos fósseis, que foram identificados posteriormente por Orville A. Derby e Richard Rathbun como sendo de provável idade devoniana. Outra excursão é realizada no Estado do Paraná no ano de 1877. Desta vez o próprio Orville Derby visita as localidades fossilíferas do Município de Ponta Grossa, descobertas no ano anterior por Luthero Wagoner. O relatório desta excursão noticia a presença de espécies de moluscos, braquiópodes e equinodermas muito semelhantes e provavelmente idênticas às já identificadas do Devoniano do Estado do Amazonas. Estes fósseis fazem parte dos primeiros registros genéricos do Estado do Paraná. No ano de 1878, Orville A. Derby publica a primeira notícia de caráter eminentemente científico sobre a existência de 354 I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL perspectiva da Tafonomia e da Estratigrafia de Sequências. Na Formação Ponta Grossa a Tafonomia vem sendo utilizada como ferramenta de análise com uma freqüência cada vez maior. Pode-se tomar como início da aplicação desse ramo da Paleontologia nesta formação, a dissertação de Ciguel (1989), que aborda o grau de achatamento de espécimens de Tentaculites, característica importante em um trabalho que se utilize de caracteres taxonômicos, uma vez que estes podem apresentar-se tendenciados (Simões, 2003). Bolzon & Bogo (1996) e Azevedo (1996) publicam trabalhos com referências à tafonômica de crinoides e ostracodas. Mas foi somente a partir do final da década de 1990 que trabalhos de cunho estritamente tafonômicos começaram a surgir na literatura. Nunes (1999) tece monografia de conclusão de curso utilizando-se da tafonomia dos Lingulídeos do Membro Jaguariaíva, analisandoos sob os seguintes aspectos: modo de ocorrência, qualidade de preservação, tipo de preservação e distribuição vertical e horizontal dos padrões de preservação. Simões et al. (2000b) publica o primeiro artigo que tem como tema a tafonomia de conularídeos da Formação Ponta Grossa. Neste trabalho os autores retratam o modo incomum de preservação deste (até então) pouco compreendido grupo fóssil, indicando a presença de três modos típicos de ocorrência de tais animais, inferindo, com estes dados, o hábito de vida do grupo, graus de bioturbação do substrato associado e interpretando também a fácies de ocorrência de tais animais. Rodrigues et al. (2001) trabalham com a ocorrência de acumulações de Tentaculita na seção Jaguariaíva. Os autores observaram a ocorrência destes animais alinhados de formas diametralmente opostas, e atribuíram tal fato à remobilização dos bioclastos associada ao movimento orbital de ondas; o modo de ocorrência, as classes de tamanho, o tipo de fossilização e o grau de empacotamento dos bioclastos também foram analisados. Rodrigues et al. (2003) publicam artigo relacionado à dissertação de mestrado da primeira autora, no qual aplicam tafonomia de alta resolução para os Conulatae da Formação Ponta Grossa e identificam três classes tafonômicas. Simões et al. (2003) tratam sobre a ocorrência de taphotaxa e de artefatos tafonômicos (taphonomic taxa e No ano de 1954, vários trabalhos tratam da geologia e paleontologia devonianas da Bacia do Paraná. Entre eles destacam-se o de Caster (1954), Almeida (1954), Sommer (1954) e Bigarella (1954). Lange (1954) publica um detalhado histórico das pesquisas até aquele ano e Lange e Petri (1967) propõem uma divisão tripartite para os sedimentitos da Formação Ponta Grossa, constituída a partir da base pelos membros Jaguariaíva, Tibagi e São Domingos. A partir daí, a nomenclatura estratigráfica do Devoniano da Bacia do Paraná é marcada por intensa discussão. Bergamaschi (1999) observa que nas antigas referências da pesquisa sobre o Devoniano da Bacia do Paraná, ou seja, aquelas anteriores à década de 1960, o enfoque principal das análises é essencialmente descritivo segundo uma visão generalizada. A partir daí surgem trabalhos que procuram abordar os aspectos genéticos das rochas devonianas. Sobre os trabalhos de cunho paleontológico observa-se que a partir e em exceção ao trabalho de Clarke (1913), até meados da década de 1950, foram raros os trabalhos que se preocuparam com aspectos paleoecológicos, a grande maioria ocupou-se da taxonomia dos fósseis, em revisão aos trabalhos precedentes (Bosetti, 2004). Foi preciso pouco menos de meio século em relação ao trabalho de Clarke (1913) para que Boucot e Gill (1956), ao estabelecerem uma diferenciação genérica de um fóssil abundante e hoje reconhecidamente característico da fauna devoniana austral, o braquiópode Australocoelia tourtelloti, iniciassem o que se poderia denominar de uma "época moderna das pesquisas". Esta época culminou com a introdução de um conceito quantitativo do problema do provincialismo faunístico dos mares devonianos do Hemisfério Sul. O termo “Província Malvinocáfrica” passou a ser constante na bibliografia, aceito por alguns autores e muito discutido por outros. O termo define um isolamento geográfico para esta fauna marinha, e é embasado em caracteres morfológicos e genéticos (Melo, 1985). No atual estágio do conhecimento sobre o Devoniano sul-brasileiro, observa-se uma tendência à reavaliação dos conceitos anteriormente propostos, bem como a reinvestigação dos jazigos fossilíferos sob a 355 I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL taphonomic artifacts) na utilização de caracteres biométricos e outros nas diagnoses de espécies fósseis, utilizando como exemplo os Conulatae da Formação Ponta Grossa. Bosetti (2004), aplica a tafonomia de alta resolução na fácies de offshore da região de Ponta Grossa, utilizando-se de metodologia específica de coleta, e analisando o controle da ocorrência dos bioclastos pelas superfícies estratigráficas. Como resultados demonstra a presença de tal controle, e fornece exemplos de tendenciamentos tafonômicos. Ghilardi (2004) trabalha com a tafonomia e a paleoecologia dos macroinvertebrados, dando ênfase aos trilobitas da Formação Ponta Grossa. Também implementa metodologia de coleta inovadora, utilizando-se de até 60 tipos diferentes de informações acerca de cada fóssil encontrado. Reconhece duas classes tafonômicas principais para os trilobites (articulados e desarticulados) e explica a gênese de tais classes, associando-as às fácies nas quais são encontradas. Rodrigues et al. (2006) analisam conulários da Formação Ponta Grossa sob o ponto de vista paleobiológico; analisando o modo de ocorrência dos fósseis para se determinar se possuíam hábito gregário ou se formavam colônias. E finalmente Zabini (2007) efetua análise tafonômica básica dos lingulídeos da Formação Ponta Grossa. 2 A Formação Ponta Grossa – Fácies e Fósseis A Formação Ponta Grossa sobrepõe-se à Formação Furnas (fig 1) e é constituída por uma superposição de folhelhos, folhelhos sílticos, arenitos e siltitos cinza escuros a negros, localmente carbonosos, fossilíferos, micáceos. Quando alterada apresenta cores variegadas, predominando as colorações amarela, aroxeada e castanha. A estrutura sedimentar predominante é a laminação plano-paralela. Em certos intervalos observam-se estratificações do tipo hummocky cross stratification de pequeno porte, laminação flazer, marcas onduladas, bioturbação e estruturas de escorregamento. A sua espessura maior é numa seção de 654 m de rochas que vão do Lockoviano ao Frasniano. Assine (1996) atesta o paleoambiente plataformal marinho para grande parte da formação. Apesar da subdivisão tripartite proposta por Lange e Petri (1967) ser ainda amplamente utilizada, Northfleet et al. (1969) e Schneider et al. (1974), ao trabalharem com a estratigrafia do devoniano paranaense embasada em dados de subsuperfície utilizam a designação “Grupo Paraná”, englobando as formações Furnas e Ponta Grossa sem mencionarem membros ou fácies, tratando-as como indivisas. 356 I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL Seguindo os novos conceitos da Estratigrafia de Seqüências e apoiando-se em dados mais reveladores, principalmente de subsuperfície, destacam-se os trabalhos de Assine (1996, 2001) e Bergamaschi (1999). Assine (1996), resume as seqüências devonianas da Bacia do Paraná correlacionando-as em parte com as unidades litoestratigráficas na seguinte ordem da base para o topo: Seqüência Lochkoviana; Seqüência Praguiana-Eifeliana; Seqüência Eifeliana-Frasniana . Bergamaschi (1999) identificou para a sucessão devoniana paranaense seis seqüências deposicionais definidas da base para o topo pelas letras A, B, C, D, E e F, sendo as cinco últimas correlatas à Formação Ponta Grossa. A fauna fóssil na sucessão é composta por braquiópodes, trilobitas, equinodermas, celenterados, pelecípodes, gastrópodes, cricoconarídeos, ostracodes, caliptoptomatídeos, anelídeos e traços fósseis, com predominância dos braquiópodes e faz parte do domínio paleogeográfico definido como Província Malvinocáfrica. Os invertebrados marinhos devonianos da Bacia do Paraná, tomados em seu 357 I SIMPÓSIO DE PESQUISA EM ENSINO E HISTÓRIA DE CIÊNCIAS DA TERRA III SIMPÓSIO NACIONAL SOBRE ENSINO DE GEOLOGIA NO BRASIL conjunto, distinguiram-se essencialmente por incluir gêneros distintivos de braquiópodes, trilobitas e moluscos bivalves que são desconhecidos ou mal representados nos conjuntos faunísticos de mesma idade do Hemisfério Norte e Oceania. Em oposição às entidades zoogeográficas contemporâneas que dominavam essas regiões de águas mais aquecidas, a Província Malvinocáfrica caracterizou-se por apresentar uma baixa diversidade, em que relativamente poucos taxa seriam bem representados por numerosos indivíduos com ampla dispersão regional. Esta fauna peculiar habitou regiões de águas plataformais, provavelmente frias, que então ocupavam porções do atual território brasileiro (Paraná, São Paulo, Goiás e Mato Grosso) e ainda o sul do Peru, Bolívia, Paraguai, Uruguai, Argentina, Ilhas Falklands, Antártica e África do Sul. O Eodevoniano e, até certo ponto, também o Mesodevoniano foram tempos de acentuado endemismo ecológico, principalmente para certos grupos de invertebrados marinhos que, como os trilobitas e os braquiópodes, habitaram os mares rasos epiplataformais de então (Melo, 1985). O grau de distinção inter-regional, segundo o autor, em termos genéricos, observados entre representantes contemporâneos daqueles grupos de organismos marinhos no lapso geocronológico supracitado foi, no seu conjunto, suficientemente elevado para permitir a definição de entidades paleozoogeográficas apreciavelmente distintas entre si, numa escala mundial, embora jamais implicando isolamento completo entre as diversas faunas endêmicas. A despeito destas considerações, as regiões dominadas por faunas malvinocáfricas não foram imunes à penetração de representantes provenientes (via migração secular) de stocks boreais, isto ocorrendo mesmo entre os gruposchave de trilobitas e braquiópodes. Considerações Finais São identificadas três fases na evolução do conhecimento sobre o Devoniano do Estado do Paraná. A primeira, representada pela fase de trabalhos pioneiros, inicia-se entre o final do século XIX e início do século XX. É caracterizada uma intensa fase de análises descritivas e classificatórios que refletiram as tendências da História Natural daquela época. Posteriormente, entre as décadas de 1940 e 1980, uma segunda fase de estudos é promovida. Neste ciclo se buscou por respostas e questionamentos de caráter interpretativo onde foram abordados temas e proposições de modelos envolvendo a autoctonia ou aloctonia dos fósseis, seu aparente endemismo e suas relações com outras bacias sedimentares contemporâneas. Nesta época os estudos também sofreram avanços na área de Sedimentologia e Estratigrafia, e a Paleogeografia do período começou então a ser desvendada. No atual estágio do conhecimento sobre o Devoniano sulbrasileiro, observa-se uma tendência à reavaliação dos conceitos, bem como à re-investigação dos jazigos fossilíferos sob a perspectiva da Tafonomia e da Estratigrafia de Sequências. Referências Bibliográficas Assine, M. L. (1996). 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