UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI PEDRO ALVES CABRAL FILHO ANÁLISE DA VIABILIDADE DE UM CENTRO DE TRANSPLANTE PULMONAR EM SANTA CATARINA Itajaí 2013 PEDRO ALVES CABRAL FILHO ANÁLISE DA VIABILIDADE DE UM CENTRO DE TRANSPLANTE PULMONAR EM SANTA CATARINA Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Gestão de Políticas Públicas, da Universidade do Vale do Itajaí como requisito para a qualificação no Curso de Mestrado em Gestão de Políticas Públicas. Área de concentração: Gestão de Políticas Públicas – instituições, cultura e sustentabilidade. Orientador: Itajaí 2013 Prof. Dr. Gonçalo. Cláudio Reis FOLHA DE APROVAÇÃO PEDRO ALVES CABRAL FILHO ANÁLISE DA VIABILIDADE DE UM CENTRO DE TRANSPLANTE PULMONAR EM SANTA CATARINA Esta dissertação foi julgada adequada para a obtenção do título de Mestre em Gestão de Políticas Públicas e aprovada pelo Programa de Pós-graduação em Gestão de Políticas Públicas da Universidade do Vale do Itajaí. Área de concentração: Gestão de Políticas Públicas – instituições, cultura e sustentabilidade. Itajaí, 19 de dezembro de 2012 Prof. Dr. Cláudio Reis Gonçalo. Orientador Prof. Dr. Flavio Ramos Avaliador 1 UNIVALI Prof. Dr. Claudio Reis Gonçalo Avaliador 2 UNIVALI AGRADECIMENTOS Aos funcionários e aos professores do mestrado por toda ajuda e orientação. Ao Prof. Claudio Gonçalo, pela orientação nesta jornada. Ao meu novo amigo, Flavio Magajewski, pelo seu apoio e presteza. Ao meu grande amigo, Joel de Andrade, por sua amizade e parceria incondicional. Aos meus pais, irmãos e sobrinhos, por serem a minha referência de respeito à vida e às pessoas. Ao meu filho, por ser minha fonte inspiradora para aprender e lutar por um mundo melhor. À minha esposa e companheira, por ser a base e o alicerce de todas as minhas conquistas. Os desafios nos ajudam a descobrir coisas que não sabíamos sobre nós mesmos. - Cecily Tyson - RESUMO O transplante pulmonar tem se consolidado nos últimos 20 anos como uma opção de tratamento de sucesso para uma variedade de doenças pulmonares em estágios finais. Diversos estudos têm demonstrado a melhora da qualidade de vida, a função pulmonar e a satisfação dos pacientes transplantados quando comparados com aqueles pacientes que estão na fila de espera para um transplante. O Estado de Santa Catarina não realiza transplante pulmonar e encaminha os pacientes que necessitam deste procedimento para o Rio Grande do Sul. Objetivo: Avaliar a viabilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina. Metodologia: O estudo foi realizado em cooperação com a central de transplantes de Santa Catarina, a diretoria de educação permanente em saúde da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina e o Centro de Transplante do Hospital Santa Casa de Porto Alegre – RS. Utilizou-se a Metodologia de Multicritério de Apoio à Decisão (MCDA), e foram identificados elementos fundamentais de análise ou critérios utilizados para avaliar a viabilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina, os quais foram agrupados em elementos primários de avaliação (EPAs). Resultados: Em relação à demanda de transplantes, em função de sua população, Santa Catarina permanece com uma perspectiva menor que a do Rio Grande do Sul – 15 a 32 procedimentos/anos em Santa Catarina e 82 a 137 procedimentos/ano no Rio Grande do Sul. Quanto ao número de pulmões disponibilizados, Santa Catarina possui uma estimativa de geração de enxertos de 10 pulmões/ano, enquanto a estimativa do Rio Grande do Sul é de 25 pulmões/ano; o tempo em fila de espera para um transplante e a sua mortalidade foram favoráveis à Santa Catarina, por ter fila própria e menos pacientes em lista, porém nossa população de base para procura de órgãos seria menor; o custo financeiro para a implantação do serviço foi desfavorável, se comparado a manter um paciente no Rio Grande do Sul; a curva de aprendizado mostrou-se um obstáculo grande a ser vencido, em função do tamanho da população de Santa Catarina e dos seus reflexos na demanda de transplante, e por ser o Rio Grande do Sul o serviço com maior experiência de enxertos com uma média de 27 procedimentos ao ano; o custo de manutenção do serviço em Santa Catarina mostrou-se desfavorável, se comparado ao custo atual de manter o paciente no RS, além disso, o serviço de referência do Rio Grande do Sul possui a melhor relação custo-financiamento possível pelas normas do SUS; o número de pulmões efetivamente transplantados e a taxa de aceitação dos órgãos disponibilizados foram favoráveis ao serviço de transplante em Santa Catarina, com melhora do aproveitamento dos pulmões aqui gerados e ofertados; a sobrevida dos pacientes pós-transplantes mostrou-se desfavorável num primeiro momento para Santa Catarina, visto que está diretamente relacionado à curva aprendizado e à experiência da equipe para o controle pós-transplante; o custo econômico final incorporado ao estado possui um risco potencial de deficit financeiro se não for bem planejado. Conclusão: A implantação de um serviço próprio de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina poderia incrementar o aproveitamento dos enxertos pulmonares com potencial redução do tempo e da mortalidade em lista de espera, porém é uma opção inquestionavelmente mais onerosa que a de manter os pacientes em tratamento no Rio Grande do Sul. Palavras-chave: Transplante pulmonar. Políticas públicas. Viabilidade. ABSTRACT In the last 20 years lung transplantation has become an established and successful treatment option for a variety of end-stage pulmonary diseases. Several studies have demonstrated improvement in the quality of life, lung functions and the satisfaction of the transplant-patients compared with those patients who are on the long waiting list. The hospitals in the state of Santa Catarina (SC) South of Brazil, do not perform lung transplantation procedures, therefore patients who need lung transplants are referred to the hospitals of neighboring state of Rio Grande do Sul (RS). Objective: To evaluate the feasibility of implementing a service of lung transplantation in the state of SC. Method: A study was conducted in cooperation with the Transplant Center of SC, the board of the Permanent Health Education Agency/Office of SC, and, the Transplant Center of Santa Casa de Porto Alegre Hospital in RS. The study used the Multicriteria Decision Aid Methodology (MCDA) and it has identified key criteria to assess the feasibility of implementing a service for lung transplantation in SC. These criteria were grouped into primary elements of the evaluation (EPAs). Results: With regard to the demands for lungs transplants, SC remains a smaller prospect than RS – 15 to 32 procedures per year in SC compared to 82 to 137 procedures per year in RS. Concerning the availability and accessibility of lung organs, SC has an estimated generation of 10 lung grafts per year while the estimates of RS are 25 lungs grafts per year.The study show that long waiting list and mortality favor SC for having their own waiting list although the ratio of the number of patients and demands for lungs organs to the base population would be lower.The study show that the financial cost to implement the service in SC is not favorable if compared to maintaining the patient in RS. The learning curve proved to be a major obstacle to be overcome, the ratio of the base population of SC to the demands for lung transplantation, and, RS has more experience with grafts and an average of 27 procedures per year. Additionally, the study show the cost of maintaining the center in SC is unfavorable if compared to the current cost of maintaining the current center in RS. Also the referral service in RS has a good relationship with SUS (National Health Service) regulation for financing.The existing number of lungs transplanted procedures and the acceptance rate of available organs were favorable to the implementation of the transplantation center in SC specially if combined with improved utilization of the lungs generated and offered. At first, patient post-transplant survival showed unfavorable for SC, since it is directly related to staff learning curve and experience of posttransplantation procedures. The final economic cost of the center incorporated to the state has a potential financial impact if not well planned and managed. Conclusion:The implementation of a lung transplantation service in the state of SC could increase the usage of lung grafts and potentially reduce waiting times and waiting list mortality, although it is undeniably more costly option than keeping the patients lung treatment center in RS. Keywords: Lung transplantation. Public politics. Feasibility. LISTA DE QUADROS E FIGURAS Quadro 1: Profissionais e experiência mínima exigida para autorização de equipe de transplante. ................................................. Erro! Indicador não definido. Quadro 2: Sumário dos custos de treinamento de uma equipe de transplante pulmonar. ................................................................................................. 76 Quadro 3: Número de transplantes pulmonares realizados no Brasil. ...................... 79 Quadro 4: Vencimentos dos profissionais da saúde. ................................................ 83 Quadro 5: Resumo do Custo Variável do Transplante em Instituição Pública de Santa Catarina. ........................................... Erro! Indicador não definido. Quadro 6: Classificação dos estabelecimentos de saúde e percentuais de incremento na remuneração. ...................... Erro! Indicador não definido. Quadro 7: Caracterização dos distintos níveis estabelecimentos de saúde. ............. 85 Quadro 8: Comparação entre centro próprio de transplante pulmonar em Santa Catarina e manutenção do transplante pulmonar no Rio Grande do Sul, conforme os Elementos Primários de Avaliação (EPAs). ...................... 112 Figura 1: Ciclo da Política Pública. ............................................................................ 22 Figura 2: Sobrevida geral com o transplante de pulmão. ............. Erro! Indicador não definido. Figura 3: Mapa cognitivo realizado para avaliação da viabilidade de um serviço de Transplante Pulmonar. ................................. Erro! Indicador não definido. Figura 4: Árvore de pontos de vista para análise da viabilidade de um centro de Transplante Pulmonar. ................................. Erro! Indicador não definido. Figura 5: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012. ............................... 70 Figura 6: Número de doadores efetivos por milhão de população no ano de 2012...72 Figura 7: Tempo de espera dos pacientes transplantados de pulmão no Estado do Rio Grande do Sul. .................................................................................... 73 Figura 8: Capacidade instalada para transplantes no Estado de Santa Catarina. Erro! Indicador não definido. Figura 9: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2010. ............................... 79 Figura 10: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2011. ............................. 80 Figura 11: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012. ............................. 81 Figura 12: Transplantes realizados fora do Estado de Santa Catarina pagos por TFD em 2011. ................................................................................................... 82 Figura 13: Sobrevida pós-transplante pulmonar........................................................ 87 Figura 14: Relação entre a necessidade estimada de transplante e o número de procedimentos realizados em 2012. ......................................................... 91 Figura 15: Taxa de doação efetiva por milhão de população e transplantes realizados nas regiões brasileiras no ano de 2012................................... 92 Figura 16: Número absoluto de transplantes no Brasil em 10 anos. ....................... 108 Figura 17: Ciclo de Políticas Públicas Adaptado. .................................................... 114 13 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 13 2 OBJETIVOS........................................................................................................ 20 3 2.1 Objetivo Geral .............................................................................................. 20 2.2 Objetivos Específicos ................................................................................... 20 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 21 3.1 Políticas Públicas ......................................................................................... 21 3.1.1 Formação da Agenda de Políticas Públicas .......................................... 25 3.1.2 Implementação de Políticas Públicas .................................................... 27 3.1.3 Avaliação das Políticas Públicas ........................................................... 29 3.2 Políticas Públicas de Saúde e Transplante .................................................. 30 3.3 Transplante pulmonar .................................................................................. 38 3.3.1 Complicações ........................................................................................ 41 3.3.2 Captação ............................................................................................... 43 3.3.3 Custos ................................................................................................... 45 4 CONTEXTO DA PESQUISA............................................................................... 49 5 METODOLOGIA ................................................................................................. 60 6 RESULTADOS ................................................................................................... 62 6.1 Levantamento dos elementos primários de avaliação.................................. 63 6.2 Elaboração do mapa cognitivo ..................................................................... 64 6.3 Determinação dos pontos de vista fundamentais ......................................... 66 6.4 Demanda de transplantes da população de Santa Catarina ........................ 69 6.5 Número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de captação de órgãos. .................................................................................... 71 6.6 Tempo na fila de espera............................................................................... 72 6.7 Índice de mortalidade na fila de espera........................................................ 73 6.8 Custos de implantação do serviço ............................................................... 73 6.9 Custo para estruturação/capacitação da equipe multidisciplinar.................. 75 6.10 Concentração de modalidades de transplantes por serviço ......................... 77 6.11 Curva de aprendizado da equipe de transplante.......................................... 78 6.12 Custo de manutenção do serviço ................................................................. 81 14 6.13 Número de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de referência para transplante de pulmão e taxa de aceitação dos órgãos disponibilizados. .......................................................................................... 86 6.14 Sobrevida pós-transplante ........................................................................... 86 7 DISCUSSÃO....................................................................................................... 89 7.1 Demanda e Oferta ........................................................................................ 90 7.2 Implantação.................................................................................................. 96 7.2.1 Tempo e mortalidade na fila de espera ................................................. 96 7.2.2 Custo de implantação ............................................................................ 99 7.3 Manutenção ............................................................................................... 102 7.3.1 Curva de Aprendizado ......................................................................... 102 7.3.2 Custo de manutenção.......................................................................... 105 7.4 Eficiência/Eficácia (Qualidade)................................................................... 107 7.4.1 Número de pulmões efetivamente transplantados e taxa de aceitação..... ............................................................................................................. 107 7.4.2 8 Sobrevida e qualidade de vida pós-transplante ................................... 109 CONCLUSÃO ................................................................................................... 114 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 117 13 1 INTRODUÇÃO O transplante pulmonar é, atualmente, uma modalidade de tratamento eficaz para pacientes com doenças pulmonares graves, dentre elas a Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), que possui uma prevalência alta na população e é uma das maiores causas de morbimortalidade, tornando-se por isso uma questão de saúde pública. Cabe ao governo, dentro de uma política de saúde, analisar a melhor forma de minimizar ou atenuar o impacto desta doença na população, priorizando o melhor acesso possível ao tratamento adequado. Santa Catarina possui um dos melhores índices nacionais em transplantes de órgãos e tecidos, porém não possui um centro próprio de transplante pulmonar, necessitando encaminhar seus pacientes ao centro de referência no Rio Grande do Sul. A questão é se a implantação de um centro de transplante pulmonar próprio facilitaria e melhoraria o acesso da população catarinense a este tipo de tratamento. O estudo da viabilidade de um centro de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina pretende contribuir para o debate e para a análise destes fatores dentro da formulação de políticas públicas. Segundo Souza (2007, p. 68), a definição mais clássica de políticas públicas é atribuída a Lowi: “política pública é uma regra formulada por alguma autoridade governamental que expressa uma intenção de influenciar, alterar, regular, o comportamento individual ou coletivo através do uso de sanções positivas ou negativas”. […] Políticas Públicas repercutem na economia e na sociedade, em função disto, qualquer teoria de política pública precisa também explicar as inter-relações entre Estado, política, economia e sociedade. […] Pode-se, então, resumir política pública como o campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, colocar o governo em ação e/ou analisar essa ação e, quando necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações. A política pública se caracteriza por um processo dinâmico e de aprendizado formado por vários estágios e área de atuação, e seu ciclo compreende: definição da agenda de governo, identificação de alternativas, avaliação e seleção das opções, implementação e avaliação. (SOUZA, 2007,p. 69). O processo de formação da agenda de políticas governamentais procura investigar de que forma uma questão se torna importante em um determinado momento, chamando a atenção do governo e passando a integrar sua agenda. 14 Agenda governamental, para Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), é definida como o conjunto de assuntos sobre os quais o governo e as pessoas ligadas a ele concentram sua atenção em um determinado momento. Fazem parte dela um subgrupo denominado agenda decisional que contempla questões prontas para uma decisão ativa dos formuladores de pesquisa, e agendas especializadas que refletem a natureza setorial da formulação de políticas públicas (saúde, transportes e educação). A questão dos transplantes de órgãos (em específico do transplante pulmonar) entraria neste organograma dentro da agenda especializada. Segundo Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), a mudança da agenda é resultado da convergência de três fluxos: problemas, soluções ou alternativas e política. Problemas: Como uma determinada questão se torna um problema e passa a ocupar a agenda governamental? Para Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), isso ocorre quando a questão chama a atenção dos participantes de um processo decisório, despertando a ação por meio de três mecanismos básicos: a) indicadores (custos de um programa, taxas de mortalidade, variações na folha de pagamento de servidores, evolução do defict público…) que apontam para a existência de uma questão que pode se tornar um problema para os formuladores de política. Exemplo: o custo operacional de um transplante pulmonar no Estado é viável para se criar um serviço próprio e eliminar a transferência de pacientes para estados vizinhos? b) eventos, crise e símbolos: quando são em grandes magnitudes, concentram a atenção a um determinado assunto; c) feedback das ações governamentais: o monitoramento dos gastos, o acompanhamento das atividades de implementação, o cumprimento ou não de metas, as possíveis reclamações de servidores ou cidadãos… Exemplo: os gastos do governos estão excedendo ao estipulado para pacientes transplantados? A atividade de implementação de um setor específico dentro do governo para transplantes pulmonares pode ser analisada? Soluções ou alternativas: a geração de alternativas e soluções é avaliada em comunidades e flutua em um “caldo primitivo de políticas”. As ideias são levadas a esse “caldo” e alternativas emergem para a consideração dos participantes do processo decisório. As comunidades geradoras de alternativas são compostas por especialistas (pesquisadores, assessores parlamentares, acadêmicos, funcionários 15 públicos) que compartilham uma preocupação em relação a uma determinada área. Exemplo: o médico responsável pelo setor de transplante pulmonar observa que poderia se tentar reduzir custos com um serviço dentro do próprio Estado e compartilha suas ideias e suas alternativas com autoridades responsáveis na área. Desta forma, as ideias são difundidas basicamente por meio de persuasão. Política: aqui as coalizões são construídas por meio de barganha e negociação política. Três elementos exercem influência neste fluxo: a) Clima ou humor nacional; b) Forças políticas organizadas; c) Mudanças dentro do próprio governo – o melhor período para mudanças na agenda é o início de um novo governo. Quando estes três fluxos (problemas, soluções e alternativas, e política) são reunidos, gera-se uma oportunidade de mudança na agenda. A convergência destes fluxos é denominada como policy windows (janelas políticas) e é influenciada diretamento pelo fluxo de problemas e pelo fluxo político. Por outro lado, o fluxo de soluções, embora não exerça influência sobre a formação da agenda governamental, é fundamental para que uma questão já presente nesta agenda tenha acesso à agenda decisional (CAPELLA, 2007). No caso dos transplantes pulmonares, se esta questão for inserida no fluxo de problemas (por meio de indicadores que se pretende demonstrar neste trabalho) num momento de convergência do fluxo político (mudança de governo, por exemplo) pode passar de agenda especializada para a agenda decisional, quando já se possuem alternativas e soluções viáveis para o problema. Isto reafirma a importância do estudo sobre a viabilidade da implantação do serviço próprio de transplante pulmonar no Estado. A implantação de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina se torna relevante a partir do momento que isto proporcione vantagens do ponto de vista político, social e da saúde. Segundo Chaves (1998), dentro dos outros setores da sociedade, a saúde tem como objetivo proporcionar à população de um país ou região um nível mais alto à que se é possível alcançar num dado momento histórico com os recursos disponíveis. Saúde é parte integrante do bem-estar social. Os indicadores de saúde, por conseguinte, são componentes essenciais de indicadores mais complexos de qualidade de vida. São importantes na dimensão econômica da saúde questões ligadas à eficiência, ao custo-efetividade, à avaliação de tecnologia, 16 ao estabelecimento de prioridades, à alocação de recursos, à gestão orientada para qualidade e resultados. Doenças que geram um grande impacto na saúde pública, seja pela elevada incidência, seja pela alta morbimortalidade, seja pelo alto custo, merecem especial atenção no âmbito das políticas públicas. A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) tem elevada prevalência em todo o mundo. Estima-se que entre 7-10% da população adulta seja afetada. Conforme estudo de Miravithes, em 2004, no Brasil, a bronquite crônica, usada como exemplo de DPOC, tem uma prevalência de 12,7% na população geral adulta. Num estudo realizado nos Países Baixos por Feenstra et al. em 2011, estimou-se que, até 2012, o total de anos de vida perdidos por DPOC crescerá 60%, os anos de vida acometidos por incapacidade crescerão 70% e os custos sanitários por DPOC aumentarão 90%. Os tabagistas serão os causadores de 90% destes casos. A Organização Mundial de Saúde (OMS), juntamente com Universidade de Harvard, desenvolveu um indicador de saúde que permite uma visão conjunta da mortalidade e da morbidade de determinadas doenças, a qual é expressa em somatório de anos de vida perdido por morte prematura e anos de vida vividos com uma doença de duração e severidade especificadas. Dentro disso, seguindo esta lógica, foram feitas projeções com bases em dados do ano de 1990 para o ano de 2020, e as doenças pulmonares (DPOC, infecções e câncer) figuram entre as cinco principais cargas de doença para o futuro (CHAVES, 1998). Sendo assim, por ser uma doença de elevada prevalência, pressupõe uma grande carga assistencial e demanda uma importante preocupação dentro da política de saúde pública de cada governo. Ainda, conforme Miravithes (2004), um paciente com DPOC gera um custo anual direto de U$ 1.200 a U$ 1.800. O custo relaciona-se com a gravidade da doença: quanto maior a gravidade, maiores os custos. Em estágios avançados da doença, a hospitalização é a responsável pelos custos mais elevados. No âmbito brasileiro, o custo médio de uma internação para essa doença representa equivalência ao valor anual de um tratamento ambulatorial, cerca de R$ 2.761,00. Estes gastos estão relacionados aos custos diretos de um paciente portador de DPOC, que pode ser entendido por custos relacionados a um ciclo específico desta doença: detecção, tratamento, prevenção e reabilitação. Somam-se ainda os custos indiretos referentes à morbidade e à mortalidade da doença, e aqui se tenta medir o impacto da doença sobre o aparato produtivo 17 nacional: falecimento ou dias de ausência no trabalho. Particularmente, nas doenças pulmonares crônicas, a qualidade de vida não é apenas uma mera consequência da sua gravidade: múltiplos fatores que se interrelacionam estão envolvidos, e a despeito da introdução de novas modalidades de tratamento, são responsáveis por um considerável e crescente aumento na morbimortalidade em países ocidentais (RAMOS; CREPALDI, 2000). A possibilidade de melhoria da qualidade de vida, por meio de intervenção clínica, tem levado à ampliação dos objetivos do tratamento das doenças pulmonares para além da melhora da função do órgão, procurando atuar também na recuperação dos prejuízos funcionais (falta de ar, cansaço, fraqueza), condições essas que têm importância indiscutível para o bem-estar dos pacientes. O transplante pulmonar tem se consolidado nos últimos 20 anos como uma opção de tratamento de sucesso para uma variedade de doenças pulmonares em estágios finais, a saber DPOC, Fibrose Cística e Hipertensão Pulmonar (CAMARGO, 2006). Baseia-se na retirada cirúrgica de um ou dois pulmões doentes do paciente receptor e colocação de um ou dos dois pulmões sadios em um paciente doador. Para aqueles enfermos com pneumopatia terminal, o transplante é a única opção terapêutica capaz de evitar a morte, em poucos meses, oferecendo expectativa de uma nova vida. Nestes últimos anos, esta atividade vem crescendo e evoluindo rapidamente, com o refinamento das técnicas cirúrgicas e a descoberta de novas drogas imunossupressoras (LAU; PATTERSON, 2003; TRULOCK et al., 2006). Diversos estudos têm demonstrado a melhora da qualidade de vida, a função pulmonar e a satisfação dos pacientes transplantados, quando comparados com aqueles pacientes que estão na fila de espera para um transplante (LANUZA et al., 2000; LAU; PATTERSON, 2003; LIMBOS et al., 2000; TENVERGERT et al., 1998; VAN DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT, 2009). Apesar dos avanços, há muito ainda por evoluir nesta área e algumas dificuldades ainda fazem deste tipo de transplante um dos menos realizados no Brasil (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012; CAMARGO; CARMORI, 2001; PEGO-FERNANDES; GARCIA, 2010;). O Estado de Santa Catarina não realiza transplante pulmonar. No Brasil, existem cinco estados que possuem centro de transplante pulmonar: São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. As outras regiões do país necessitam transportar seus pacientes a esses estados em busca desta modalidade 18 terapêutica no momento em que se consegue o órgão a ser transplantado. Santa Catarina encaminha seus pacientes para o Rio Grande do Sul. A situação atual dos tranplantes pulmonares encontra-se hoje dentro de um subsistema estável, na qual os pacientes que necessitam deste procedimento são encaminhados aos estados que possuem um centro especializado. Se a questão da implantação de um serviço próprio conseguisse ascender o macrosistema (seja por uma suposta mudança na percepção da questão que a transformasse em problema, ou por uma mobilização da opinião pública), o subsistema acataria esta mudança e promoveria reorganizações institucionais que poderiam tornar-se posteriormente estáveis e aceitas como definitiva. Uma série de estudos está disponível para orientar a decisão em relação a alternativas para investimentos em políticas e intervenções na área da saúde. Inúmeros trabalhos utilizam estimativas sobre a eficácia e o custo-efetividade de intervenções, indicando as melhores opções para a gestão. No entanto, as análises com origem na economia são resistentes à inclusão de outros critérios que possam também desempenhar papéis importantes na tomada de decisão eficaz, como preocupações éticas e sociais. Como exemplo, é possível que a preferência da sociedade em determinado momento histórico possa incluir outros objetivos que não só os relacionados com a eficiência, mas com a ampliação dos serviços para pacientes graves ou hoje fora das possibilidades terapêuticas. Por conta disso, optou-se por utilizar uma metodologia de análise do objeto de pesquisa por múltiplos critérios de apoio à decisão (MCDA), para permitir a incorporação de outros critérios, além da eficácia e do custo-efetividade no processo de tomada de decisão para a implantação de serviço de transplante de pulmão em Santa Catarina. Como ponto de partida para a construção da matriz de desempenho, as opções de investimento elegíveis para a implementação são identificadas. No nosso caso, as opções foram utilizar as informações do serviço de transplante de pulmão localizado em Porto Alegre (RS) ou investir para criar um novo serviço no Estado de Santa Catarina. Em seguida, os critérios que compuseram a matriz de decisão foram estabelecidos. Tendo em vista o caráter acadêmico da dissertação, os critérios selecionados foram escolhidos a partir de reuniões técnicas com gestores responsáveis pela coordenação do sistema de captação e doação de órgãos para transplante em Santa Catarina. Entretanto, é cada vez mais comum identificar 19 processos participativos de seleção de critérios com reuniões e técnicas de ponderação e priorização, nas quais participam todos os interessados – gestores, pacientes em lista de espera, financiadores do sistema público e de planos de saúde, profissionais de saúde, etc. Assim, transformar a questão do transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina em um problema que possa ser conceituado no processo de formulação de políticas públicas, torná-lo relevante num determinado momento, mobilizando esforços e recursos para que se torne viável, e a maneira pela qual as alternativas serão apresentadas e selecionadas, focalizando sua atenção para a formação da agenda de governo, é a razão que motivou este trabalho. A questão a ser definida é: a criação de um serviço de transplante pulmonar próprio no Estado de Santa Catarina pode ser viável e vantajosa do ponto de vista técnico e econômico para o estado, e do ponto de vista de satisfação e eficiência para a população, quando comparado ao sistema que vigora atualmente? 20 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral Avaliar a viabilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina. 2.2 Objetivos Específicos a) Identificar a demanda de transplante pulmonar em Santa Catarina; b) Reconhecer a base populacional para viabilizar um centro de transplante pulmonar; c) Levantar dados econômico-financeiros para a implantação e a manutenção de um centro de transplante pulmonar. Resultados e aplicação da pesquisa: os resultados do estudo servirão de base para a tomada de decisão da Secretaria de Estado da Saúde do Governo de Santa Catarina para o desenvolvimento ou não de um programa de transplante pulmonar em nosso estado. Observações: o estudo foi realizado em cooperação com a central de transplantes de Santa Catarina e a diretoria de educação permanente em saúde da Secretaria de Estado da Saúde de Santa Catarina. 21 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1 Políticas Púlicas A política é parte constitutiva e essencial da vida social. O termo política, no inglês, politics, faz referência às atividades políticas: o uso de procedimentos diversos que expressam relações de poder (ou seja, visam influenciar o comportamento das pessoas) e se destinam a alcançar ou produzir uma solução pacífica de conflitos relacionados a decisões públicas. Já o termo policy é utilizado para referir-se à formulação de propostas, à tomada de decisões e à sua implementação por organizações públicas, tendo como foco temas que afetam a coletividade, mobilizando interesses e conflitos. Em outras palavras, policy significa a atividade do governo de desenvolver políticas públicas a partir do processo da política (RUA, 1998). Avançando um pouco mais, é possível sustentar que as políticas públicas (policy) são uma das resultantes da atividade política (politics): compreendem o conjunto das decisões e das ações relativas à alocação imperativa de valores envolvendo bens públicos. O conceito de políticas públicas é um conceito evolutivo, na medida em que a realidade a que se refere existe num processo constante de transformações históricas nas relações entre estado e sociedade, e que essa mesma relação é permeada por mediações de natureza variada, mas que, cada vez mais, estão referidas aos processos de democratização das sociedades contemporâneas (SOUZA, 2007). É importante desenvolver a compreensão de que as políticas públicas são resultantes da atividade política e que esta consiste na resolução pacífica de conflitos, processo essencial à preservação da vida em sociedade. Ham e Hill (1993) apontam que a preocupação com as políticas públicas dá origem ao surgimento da Análise de Política, classificando os estudos de Análise de Política em duas grandes categorias: a) a análise que tem como objetivo produzir conhecimentos sobre o processo de elaboração política (formulação, implementação e avaliação) em si, revelando assim uma orientação predominantemente descritiva. Esta categoria corresponde, na literatura anglo-saxã, ao que se conhece como analysis of policy, referindo-se à atividade acadêmica visando, basicamente, ao melhor 22 entendimento do processo político; b) a análise destinada a auxiliar os formuladores de política, que agrega conhecimento ao processo de elaboração de políticas, envolvendo-se diretamente na tomada de decisões e assumindo um caráter prescritivo ou propositivo. Corresponde, na literatura anglo-saxã, ao que se conhece como analysis for policy, referindo-se à atividade aplicada voltada à solução de problemas sociais. As políticas públicas (policies) ocorrem em um ambiente tenso e de alta densidade política (politics), marcado por relações de poder, extremamente problemáticas, entre atores do Estado e da sociedade, entre agências intersetoriais, entre os poderes do Estado, entre o nível nacional e os níveis subnacionais, entre comunidade política e burocracia. Uma forma de lidar com essa complexidade sem descartar a dinâmica sistêmica é associar o modelo sistêmico com o modelo do ciclo de política (policy cycle), que aborda as políticas públicas como um ciclo deliberativo, formado por vários estágios e constituindo um processo dinâmico e de aprendizado (SOUZA, 2007), como se pode verificar por meio da Figura 1: Ciclo da Política Pública. Figura 1: Ciclo da Política Pública 23 FORMAÇÃO DA AGENDA - Definição do problema. - Análise do problema. FORMAÇÃO DE ALTERNATIVAS - Avaliação das opções. - Seleção das opções. IMPLEMENTAÇÃO - Monitoramento. AVALIAÇÃO - Ajustes. Fonte: Souza (2007). Na concepção do ciclo de políticas, a política pública é considerada a resultante de uma série de atividades políticas que, agrupadas, formam o processo político. Essa visão conduz os estudiosos a examinar como as decisões são ou poderiam ser tomadas e permite identificar e analisar os processos políticoadministrativos, os mecanismos e as estratégias definidas para a realização da política e o comportamento dos diferentes atores envolvidos em cada etapa do processo de produção de políticas. Conforme Rua (2009), o ciclo de políticas é uma abordagem para o estudo das políticas públicas, identificando fases sequenciais e interativo-iterativo-iterativas no processo de produção de uma política. Essas fases são: a) formação da agenda, que ocorre quando uma situação qualquer é reconhecida como um problema político e a sua discussão passa a integrar as atividades de um grupo de autoridades dentro e fora do governo; b) formação das alternativas e tomada de decisão: ocorre quando, após a inclusão do problema na agenda e alguma análise deste, os atores começam a apresentar propostas para sua resolução. Essas propostas expressam interesses diversos, os quais devem ser combinados de tal maneira que se chegue a uma solução aceitável para o maior número de partes envolvidas. Ocorre, então, a 24 tomada de decisão; c) a tomada de decisão não significa que todas as decisões relativas a uma política pública foram tomadas, mas, sim, que foi possível chegar a uma decisão sobre o núcleo da política que está sendo formulada. Quando a política é pouco conflituosa e agrega bastante consenso, esse núcleo pode ser bastante abrangente, reunindo decisões sobre diversos aspectos. Quando, ao contrário, são muitos os conflitos, as questões são demasiado complexas ou a decisão requer grande profundidade de conhecimentos, a decisão tende a cobrir um pequeno número de aspectos, já que muitos deles têm as decisões adiadas para o momento da implementação; d) a implementação consiste em um conjunto de decisões a respeito da operação das rotinas executivas das diversas organizações envolvidas em uma política, de tal maneira que as decisões inicialmente tomadas deixam de ser apenas intenções e passam a ser intervenção na realidade. Normalmente, a implementação se faz acompanhar do monitoramento: um conjunto de procedimentos de apreciação dos processos adotados, dos resultados preliminares e intermediários obtidos e do comportamento do ambiente da política. O monitoramento é um instrumento de gestão das políticas públicas e o seu objetivo é facilitar a consecução dos objetivos pretendidos com a política; e e) a avaliação é um conjunto de procedimentos de julgamento dos resultados de uma política, segundo critérios que expressam valores. Juntamente com o monitoramento, destina-se a subsidiar as decisões dos gestores da política quanto aos ajustes necessários para que os resultados esperados sejam obtidos. Para Souza (2007), o ciclo de política pública enfatiza sobremodo a formação ou a definição da agenda. À pergunta de como os governos definem suas agendas, são dados três tipos de resposta: a) a primeira focaliza os problemas, isto é, problemas entram na agenda quando se assume que se deve fazer algo sobre eles. O reconhecimento e a definição dos problemas afetam os resultados da agenda; b) a segunda focaliza a política propriamente dita, ou seja, como se constrói a consciência coletiva sobre a necessidade de se enfrentar um dado problema. A construção de uma consciência coletiva sobre determinado problema é fator poderoso e determinante na formação da agenda; c) a terceira focaliza os participantes, que são classificados como visíveis, ou seja, 25 políticos, mídia, partidos, grupos de pressão, etc.; e invisíveis, tais como acadêmicos ou burocratas. Segundo esta perspectiva, os participantes visíveis formam a agenda e os invisíveis, as alternaivas. 3.1.1 Formação da Agenda de Políticas Públicas Uma agenda de políticas consiste em uma lista de prioridades inicialmente estabelecidas, às quais os governos devem dedicar suas energias e atenções, e entre as quais os atores lutam arduamente para incluir as questões de seu interesse. A agenda de políticas resulta de um processo pouco sistemático, extremamente competitivo, pelo qual se extrai, do conjunto de temas que poderiam ocupar as atenções do governo, aquelas questões que serão efetivamente tratadas. O processo de evidenciação de temas varia de acordo com: a) o reconhecimento da existência de problemas, a partir de eventos momentâneos, da forma de manifestação das demandas, das crises e das informações sobre os eventos (indicadores, estatísticas, pesquisas e outras fontes); b) a proposição de políticas, que é afetada pela ação dos atores visíveis, dos atores invisíveis e das comunidades políticas. Ou seja: nas organizações governamentais, no meio acadêmico, nos partidos políticos ou nas organizações da sociedade, costumam já existir propostas que viabilizam a solução de determinados problemas; e c) o fluxo da política, que envolve o clima ou o sentimento nacional com relação aos governos e aos temas, às forças políticas organizadas e à disputa interpartidária e eleitoral. Para Kingdon (2003 apud CAPELLA, 2007), entre os elementos considerados no fluxo político, o clima nacional e as mudanças dentro do governo são os maiores propulsores de transformação na agenda governamental. Conforme Rua (2009), para que um “estado de coisas” se torne um problema político e passe a figurar como um item da agenda governamental, é necessário que apresente pelo menos uma das seguintes características: a) mobilize ação política: seja ação coletiva de grandes grupos, seja ação coletiva de pequenos grupos dotados de fortes recursos de poder, seja ação de atores individuais estrategicamente situados; b) constitua uma situação de crise, calamidade ou catástrofe, de maneira que o 26 ônus de não dar uma resposta ao problema seja maior que o ônus de ignorá-lo; e c) constitua uma situação de oportunidade, ou seja, uma situação na qual algum ator relevante perceba vantagens a serem obtidas com o tratamento daquele problema. Ao deixar de ser um “estado de coisas” e se transformar em um “problema político”, uma questão qualifica-se à inclusão na agenda governamental. Não quer dizer que vá seguramente dar origem a uma política pública, mas, apenas, que passa a receber a atenção dos formuladores de políticas. Embora mais atenção seja destinada à formulação de alternativas e à tomada de decisões, a formação de agenda representa uma das mais importantes fases do ciclo da política pública, especialmente porque mobiliza fortes recursos de poder. Quando as alternativas para solucionar um problema começam a ser formuladas, as aspirações dão origem às expectativas. Expectativas não significam desejos. Expectativas são suposições que os atores formulam sobre as consequências de cada alternativa, sobre os seus interesses. Obviamente, há atores que têm expectativas de obter vantagens com uma decisão e outros que acreditam que esta decisão vá lhes trazer desvantagens. A partir destas expectativas é que os atores se mobilizam, defendendo o seu interesse, expresso em preferências. Todo ator possui preferências. Uma preferência é a alternativa (meio) de solução para um problema que mais beneficia um determinado ator. Assim, dependendo da sua posição, os atores podem ter preferências muito diversas uns dos outros quanto à melhor solução para um problema político. As preferências dependem do cálculo de custo/benefício de cada ator. O cálculo de custo/benefício é o cálculo das perdas e dos ganhos ou das desvantagens e vantagens que cada ator atribui a cada meio proposto para solucionar um problema. Este cálculo não se restringe a custos econômicos ou financeiros. Envolve também elementos simbólicos, como prestígio; ou elementos políticos, como ambições de poder e ganhos ou perdas eleitorais, por exemplo. As preferências se formam em relação aos issues ou às questões. Issue é um item ou aspecto de uma decisão, que afeta os interesses de vários atores. Por esse motivo, os issues mobilizam as expectativas dos atores quanto aos resultados da política e catalisam o conflito entre eles. Por exemplo, na viabilidade de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina, podem-se identificar alguns issues, como: 27 a) o conceito viabilidade de um centro de transplante, que critérios poderiam ser usados para avaliar a viabilidade e assim proceder à sua implantação? Seria pelo fator econômico? Seria pelo fator social? b) qual a forma de viabilizar a realização deste centro? Seria pela demanda de transplantes? Seria pela infraestrutura estadual? Seria pela distância territorial? c) como proceder à mudança do padrão vigente hoje? A fim de realizar as suas preferências quanto às soluções que poderão ser adotadas para cada um dos issues de uma política, os atores procuram se situar dentro da estrutura de oportunidades, ou seja, o contexto formado pelo conjunto de recursos de poder e regras do jogo. Para entender o processo de formulação (e também a implementação), é essencial se definir quais são os issues de uma política e se identificar as preferências dos atores em relação a cada um deles. A formulação das alternativas é um dos mais importantes momentos do processo decisório, porque é quando se evidenciam os vários issues e é quando se colocam claramente as preferências dos atores. É o momento em que os diversos atores entram em confronto e/ou constroem suas alianças, visando às decisões favoráveis às suas preferências. Para isso, cada um deles procurará mobilizar seus recursos de poder e pressionar os tomadores de decisão: influência, capacidade de afetar o funcionamento do sistema, argumentos de persuasão, votos, organização, etc. O principal foco analítico da política pública está na identificação do tipo de problema que a política visa corrigir, na chegada desse problema ao sistema político e à sociedade, no processo percorrido nestas duas arenas e nas instituições/regras que irão modelar a decisão e a implementação da política pública (SOUZA, 2007). 3.1.2 Implementação de Políticas Públicas A implementação pode ser compreendida como o conjunto de decisões e ações realizadas por grupos ou indivíduos, de natureza pública ou privada, as quais são direcionadas para a consecução de objetivos estabelecidos mediante decisões anteriores sobre uma determinada política pública. Em outras palavras, a implementação consiste em fazer uma política sair do papel e funcionar efetivamente. Envolve os mais diversos aspectos do processo 28 administrativo: desde a provisão de recursos no orçamento, na formação de equipes e na elaboração de minutas de projeto de lei, autorizando realização de concurso para contratação de servidores, elaboração de editais para aquisição de bens ou contratação de serviços. Caso seja uma política que envolva os níveis de governo estadual e/ou municipal, será preciso realizar reuniões para decidir e pactuar as responsabilidades de cada uma das partes, em seguida firmar protocolos de cooperação, estabelecer os mecanismos de transferência de recursos entre instâncias governamentais, etc. Esse processo precisa ser acompanhado, entre outras coisas, para que se possa identificar por que muitas coisas dão certo, enquanto muitas outras dão errado, desde a formulação da política até seu resultado concreto. De maneira especial quando uma política envolve diferentes níveis de governo – federal, estadual, municipal – ou diferentes regiões de um país, ou, ainda, diferentes setores de atividade, a implementação pode se mostrar mais problemática, já que o controle do processo se torna mais complexo. Mesmo quando se trata apenas do nível local, para o sucesso da implementação, é necessário considerar, ainda, a importância dos vínculos entre diferentes organizações e agências públicas no nível local. Geralmente, quando a ação depende de certo número de elos numa cadeia de implementação, o grau necessário de cooperação entre as organizações para que esta cadeia funcione pode ser muito elevado. Se isto não acontecer, pequenas deficiências acumuladas podem levar a um grande fracasso. Os processos administrativos e técnicos ligados à implementação de programas são as ferramentas básicas que as organizações usam para fazer seu trabalho, e as pessoas que nela atuam passam quase todo o seu tempo nisso. Portanto é essencial acreditar que esses processos funcionam, produzindo os resultados esperados. Entre eles, o de planejamento se destaca, principalmente pelo fato de que se tornou, nos últimos tempos, símbolo de uma boa administração (MEDINA, 1987). Estudos indicam dez precondições necessárias para que haja uma implementação perfeita (BAIER; MARCH; SAETREN, 1989; DAGNINO et al., 2002); a) as circunstâncias externas à agência implementadora não devem impor restrições que a desvirtuem; 29 b) o programa deve dispor de tempo e recursos suficientes; c) não apenas não deve haver restrições em termos de recursos globais, mas, também, em cada estágio da implementação, a combinação necessária de recursos deve estar efetivamente disponível; d) a política a ser implementada deve ser baseada numa teoria adequada sobre a relação entre a causa (de um problema) e o efeito (de uma solução que está sendo proposta); e) esta relação entre causa e efeito deve ser direta e, se houver fatores intervenientes, estes devem ser mínimos; f) deve haver uma só agência implementadora, que não depende de outras agências para ter sucesso; se outras agências estiverem envolvidas, a relação de dependência deverá ser mínima em número e em importância; g) precisa ter completa compreensão e consenso quanto aos objetivos a serem atingidos e esta condição deve permanecer durante todo o processo de implementação; h) ao avançar em direção aos objetivos acordados, deve ser possível especificar, com detalhes completos e em sequência perfeita, as tarefas a serem realizadas por cada participante; i) é necessário que haja perfeita comunicação e coordenação entre os vários elementos envolvidos no programa; e j) os atores que exercem posições de comando devem ser capazes de obter efetiva obediência dos seus comandados. O acompanhamento, o monitoramento e o controle das políticas devem incluir, também, o tipo de política e de arena política; o contexto inter e intraorganizacional dentro do qual ocorre a implementação; e o mundo externo sobre o qual a política deverá exercer o seu impacto. 3.1.3 Avaliação das Políticas Públicas A avaliação de políticas públicas consiste estritamente na avaliação formal, que é o exame sistemático de quaisquer intervenções planejadas na realidade, baseado em critérios explícitos e mediante procedimentos reconhecidos de coleta e análise de informação sobre seu conteúdo, estrutura, processo, resultados, qualidade e/ou impactos. 30 Assim, pode-se afirmar que a avaliação formal é um julgamento (porque envolve valores) sistemático (porque se baseia em procedimentos e indicadores reconhecidos e previamente estabelecidos), que incide sobre o conteúdo (problemas eleitos e suas soluções), as estratégias, o desenho ou concepção (estrutura), os processos (insumos, atividades, capacidades, hierarquias de precedência e mecanismos de coordenação), os produtos (preliminares, intermediários e finais), os efeitos e os impactos. É uma política, programa ou projeto que tem como referência critérios explícitos, a fim de contribuir para o seu aperfeiçoamento, a melhoria do processo decisório e o aprendizado institucional (RUA, 2009). Por meio desta definição, pode-se reconhecer que a avaliação contém duas dimensões. A primeira é técnica e caracteriza-se por produzir ou coletar, conforme procedimentos reconhecidos, informações que poderão ser utilizadas nas decisões relativas a qualquer política, programa ou projeto. Esta dimensão diz respeito à pesquisa avaliativa, que representa um instrumento da avaliação. A segunda dimensão é valorativa, consistindo no exame das informações obtidas, à luz de critérios específicos, com a finalidade de extrair conclusões acerca do valor da política, do programa ou projeto. Porém a finalidade da avaliação não é classificar as intervenções “boas” ou “más”, “exitosas” ou “fracassadas”. Muito mais importante e proveitoso é apropriar-se da avaliação como um processo de apoio a um aprendizado contínuo, de busca de melhores decisões e de amadurecimento da gestão. Diante do exposto, pode-se afirmar que a avaliação contribui para aperfeiçoar a formulação de políticas e projetos – especialmente tornando mais responsável a formulação de metas – e apontar em que medida os governos se mostram responsivos frente às necessidades dos cidadãos. O acompanhamento, o monitoramento, a avaliação e o controle das políticas são processos importantes para que as políticas ganhem efetividade, resultando não apenas em intervenção na realidade, mas sim em transformações dos problemas em situações solucionadas. 3.2 Políticas Públicas de Saúde e Transplante A criação do Sistema Único de Saúde (SUS) se deu por meio da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que “dispõe sobre as condições para a promoção, 31 proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes” (REIS; ARAÚJO; CECÍLIO, 2012). A primeira lei orgânica do SUS detalha os objetivos e as atribuições; os princípios e as diretrizes; a organização, a direção e a gestão, a competência e as atribuições de cada nível (federal, estadual e municipal); a participação complementar do sistema privado; os recursos humanos; o financiamento e a gestão financeira e o planejamento e o orçamento. Logo em seguida, a Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros. Institui os Conselhos de Saúde e confere legitimidade aos organismos de representação de governos estaduais (Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde - CONASS) e municipais (Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde - CONASEMS). Finalmente estava criado o arcabouço jurídico do Sistema Único de Saúde, mas novas lutas e aprimoramentos ainda seriam necessários. No ano de 1993, foram publicadas as Normas Operacionais Básicas (NOBSUS 93), que procura restaurar o compromisso da implantação do SUS e estabelecer o princípio da municipalização, tal como havia sido desenhada. Institui níveis progressivos de gestão local do SUS e estabelece um conjunto de estratégias que consagram a descentralização político-administrativa na saúde. Também define diferentes níveis de responsabilidade e competência para a gestão do novo sistema de saúde (incipiente, parcial e semiplena, a depender das competências de cada gestor) e consagra ou ratifica os organismos colegiados com grau elevado de autonomia: as Comissões Intergestoras (Tripartite e Bipartite). A população foi a grande beneficiada com a incorporação de itens de alta complexidade, que antes eram restritos aos contribuintes da previdência. Com a grande extensão de programas de saúde pública e serviços assistenciais, deu-se o início efetivo do processo de descentralização política e administrativa, a qual pode ser observada pela progressiva municipalização do sistema e pelo desenvolvimento de organismos colegiados intergovernamentais. A participação popular trouxe a incorporação dos usuários do sistema ao processo decisório, com a disseminação dos conselhos municipais de saúde, ampliando as discussões das questões de saúde na sociedade (LEVCOVITZ; LIMA; MACHADO, 2001). 32 Em 1996, a edição da NOB 96 representou a aproximação mais explícita com a proposta de um novo modelo de atenção. Para isso, ela acelera a descentralização dos recursos federais em direção aos estados e aos municípios, consolidando a tendência à autonomia de gestão das esferas descentralizadas, criando incentivo explícito às mudanças, na lógica assistencial, rompendo com o produtivismo (pagamento por produção de serviços, como o INAMPS usava para comprar serviços do setor privado) e implementando incentivos aos programas dirigidos às populações mais carentes, como o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e as práticas fundadas numa nova lógica assistencial, como Programa de Saúde da Família (PSF). As principais inovações da NOB 96 foram: a) A concepção ampliada de saúde - considera a concepção determinada pela Constituição, englobando promoção, prevenção, condições sanitárias, ambientais, emprego, moradia, etc.; b) O fortalecimento das instâncias colegiadas e da gestão pactuada e descentralizada - consagrada na prática com as Comissões Intergestores e Conselhos de Saúde; c) As transferências fundo a fundo (do Fundo Nacional de Saúde direto para os fundos municipais de saúde, regulamentados pela NOB-SUS 96) com base na população, e com base em valores per capita previamente fixados; d) Novos mecanismos de classificação determinam os estágios de habilitação para a gestão, cujos municípios são classificados em duas condições: gestão plena da atenção básica e gestão plena do sistema municipal. Na gestão plena da atenção básica, os recursos são transferidos de acordo com os procedimentos correspondentes ao Piso da Atenção Básica (PAB). A atenção ambulatorial especializada e a atenção hospitalar continuam financiadas pelo Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA-SUS) e pelo Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS). No caso dos municípios em gestão plena do sistema, a totalidade dos recursos é transferida automaticamente. No ano 2002 é editada a Norma Operacional de Assistência à Saúde/NOASSUS, cuja ênfase maior é no processo de regionalização do SUS, a partir de uma avaliação de que a municipalização da gestão do sistema de saúde, regulamentada e consolidada pelas normas operacionais, estava sendo insuficiente para a configuração do sistema de saúde, por não permitir uma definição mais clara dos 33 mecanismos regionais de organização da prestação de serviços. Nestes seus mais de 20 anos de criação, conforme balanço elaborado por Nelson Rodrigues dos Santos (2007), militante histórico do Movimento Sanitário brasileiro, o SUS transformou-se no maior projeto público de inclusão social em menos de duas décadas: 110 milhões de pessoas atendidas por agentes comunitários de saúde em 95% dos municípios e 87 milhões atendidos por 27 mil Equipes de Saúde da Família. Em 2007: 2,7 bilhões de procedimentos ambulatoriais; 610 milhões de consultas; 10,8 milhões de internações; 212 milhões de atendimentos odontológicos; 403 milhões de exames laboratoriais; 2,1 milhões de partos; 13,4 milhões de ultrassons, tomografias e ressonâncias; 55 milhões de seções de fisioterapia; 23 milhões de ações de vigilância sanitária; 150 milhões de vacinas; 12 mil transplantes; 3,1 milhões de cirurgias; 215 mil cirurgias cardíacas; 9 milhões de seções de radioquimioterapia; 9,7 milhões de seções de hemodiálise e controle mais avançado da AIDS no terceiro mundo. São números impressionantes para a população atual, em marcante contraste com aproximadamente metade da população excluída antes dos anos oitenta, a não ser pequena fração atendida eventualmente pela caridade das Santas Casas. Apesar de seus avanços, como atestam os números citados, a construção do SUS encontra vários entraves, entre os quais se destacam: a) O subfinaciamento, isso é, os recursos destinados à operacionalização e ao financiamento do SUS, fica muito aquém de suas necessidades. b) As insuficiências da gestão local do SUS. A gestão municipal dos recursos do SUS vem funcionando apenas em parte – sem desconsiderar que os recursos para o SUS são insuficientes. Santos (2007), falando das dificuldades do SUS, aponta ainda para outros problemas, como: a) A atenção básica expande-se às maiorias pobres da população, mas na média nacional estabiliza-se na baixa qualidade e resolutividade; não consegue constituir-se na porta de entrada preferencial do sistema, nem reunir potência transformadora na estruturação do novo modelo de atenção preconizado pelos princípios constitucionais; b) Os serviços assistenciais de média e alta complexidade, cada vez mais congestionados, reprimem as ofertas e as demandas (repressão em regra iatrogênica e frequentemente letal); 34 c) Os gestores municipais complementam valores defasados da tabela do SUS na tentativa de aliviar a repressão da demanda, nos serviços assistenciais de média e alta complexidade; d) Com o enorme crescimento das empresas de planos privados, e consequente agressividade de captação de clientela, as camadas médias da sociedade, incluindo os servidores públicos, justificam e reforçam sua opção pelos planos privados de saúde; e) As diretrizes da integralidade e da equidade pouco ou nada avançam; f) A judicialização do acesso a procedimentos assistenciais de médio e alto custo às camadas média-média e média-alta da população aprofundam a iniquidade e a fragmentação do sistema; g) O modelo público de atenção à saúde vai se estabilizando direcionada aos pobres e está focalizado aos 80% pobres da população, e em complementar e menos pobre aos 20% compradores de planos privados. O SUS não tem conseguido atingir com eficácia os princípios e as diretrizes, como a Universalidade, que vê a saúde como um direito de cidadania de todas as pessoas, cabendo ao Estado assegurar esse direito; a Equidade, princípio de justiça social, procura tratar desigualmente os desiguais e investir onde há mais necessidade; e a Integralidade, que considera a pessoa como um todo, e que pressupõe a promoção da saúde, a prevenção de doenças, o tratamento e a reabilitação e a integração entre as demais políticas públicas. O Sistema Único de Saúde é responsável por executar ações e serviços de promoção, proteção, recuperação e reabilitação da saúde dos cidadãos brasileiros. A execução pode ser feita diretamente pelo gestor público ou por entidade contratada/conveniada, desde que de forma regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente. A atividade de transplantes de órgãos e tecidos no Brasil iniciou-se em 1964 e, desde aquela época até os dias atuais, ocorreu uma evolução considerável em termos técnicos, resultado e número de procedimentos realizados. Mesmo com a existência da Lei nº 5479 de 10 de agosto de 1968, revogada posteriormente pela Lei nº 8489 de 18 de novembro de 1992, que dispunha sobre a retirada e o transplante de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, com fins terapêuticos e científicos, não havia, até então, uma legislação apropriada que regulamentasse a atividade transplantadora, visto que havia apenas regulamentações regionais 35 desenvolvidas na informalidade quanto à inscrição de receptores, retirada de órgãos e tecidos, critérios de distribuição de órgãos e tecidos captados e ordem de transplantes. Essa lei e o decreto que a regulamentou tiveram o mérito de definir mais claramente os critérios de distribuição dos órgãos com base num cadastro técnico único e em princípios básicos a serem obedecidos em todo o país. Como grande parte dos procedimentos realizados é financiada com recursos públicos, aliada ao fato da evolução do conhecimento científico e do entendimento de que os órgãos doados são bens públicos, cresceram, na sociedade, nos gestores do SUS e na própria comunidade transplantadora, o propósito e a necessidade de uma regulamentação para essa atividade. Por meio da criação do Sistema Nacional de Transplantes conseguiu-se então essa regulamentação e, a partir daí, a definição de critérios claros, tecnicamente adequados, socialmente aceitáveis, justos e éticos na destinação dos órgãos captados. Em 1997 foi então promulgada uma nova lei dos transplantes e com isso a criação do Sistema Nacional de Transplante (SNT) e das Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgão (CNCDOs). Foi estabelecida a distribuição dos órgãos e dos tecidos por meio das listas de espera regionalizadas. Com a participação da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), foi implementada nova política de transplante no país, simultaneamente com medidas legais, financeiras, organizacionais e educacionais, a saber (GARCIA; IANHEZ; PESTANA, 2006): Medidas legais: a) Modificação da forma de consentimento, retornando ao consentimento informado, com decisão da família após a morte; b) Tornado sem efeito legal a manifestação do doador ou não doador em documento de identidade ou de habilitação; c) Agilização da necrópsia, se possível no bloco cirúrgico, após a remoção dos órgãos, quando for exigida. Medidas financeiras: a) Criação de um fundo específico para financiamento dos transplantes (FAEC); b) Pagamento da procura de doadores: processo dividido por módulos e pagamento por procedimento; 36 c) Pagamento do acompanhamento ambulatorial pós-transplante: não por consulta, mas por paciente acompanhado; d) Pagamento uniforme para hospitais universitários e não universtários. Medidas organizacionais: a) Modelo de organização em quatro níveis (nacional, estadual, regional e hospitalar); b) Definição do SNT como responsável pela política de transplantes no país, com função principalmente normatizadora; c) Criação da CNCDOs, atuando na alocação e no intercâmbio de órgãos e tecidos entre estados; d) Criação da CNCDO em todos os estados, com funções de organização e de alocação de órgãos e tecidos (listas únicas regionais) em seu âmbito; e) Criação do cargo de coordenador de transplante nos hospitais com UTI, os quais devem ficar responsáveis pela procura de doadores; f) Recredenciamento de todos os centros de transplante de órgãos e tecidos do país; g) Incentivo à formação de centros de transplante em regiões menos assistidas (Norte e Nordeste). Medidas educacionais: a) Cursos de formação de coordenadores educacionais de transplante; b) Encontros regionais com intensivistas; c) Cursos sobre doação e transplante para todos profissionais que trabalham nos hospitais; d) Encontros periódicos com jornalistas, especialistas em comunicação e formadores de opinião; e) Desenvolvimento de programas educacionias específicos para estudantes de ensino médio; f) Incentivo à formação de organizações não governamentais atuando na área de doação e transplante; g) Palestras e debates sobre doação nas escolas; h) Semana nacional da doação (dia nacional do doador: 29 de setembro). 37 O SNT é o responsável pela política de transplante no país, com funções normativas em âmbito nacional, e cada estado, pelas funções de normatização, distribuição e fiscalização, enquanto a procura e a captação de órgãos são função do hospital por meio de seu coordenador (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012). O credenciamento de novos centros de transplante, a regulamentação das várias modalidades de transplante, dos bancos de tecidos e a realização de cursos de formação de coordenadores de transplante são também atribuições do SNT. O grau de complexidade de cada central estadual depende da sua extensão territorial e da sua população, do número de hospitais de detecção de referência e dos tipos de transplantes disponíveis. A política nacional de transplantes de órgãos e tecidos está fundamentada na Legislação (Lei nº 9.434/1997 e Lei nº 10.211/2001), tendo como diretrizes a gratuidade da doação, a beneficência em relação aos receptores e não maleficência em relação aos doadores vivos. Estabelece também garantias e direitos aos pacientes que necessitam destes procedimentos e regula toda a rede assistencial por meio de autorizações e reautorizações de funcionamento de equipes e instituições. Toda a política de transplante está em sintonia com as leis nº 8.080/1990 e nº 8.142/1990, que regem o funcionamento do SUS (DUTRA; SILVA, BADALOTTI, 2003). A proposição de uma Política Estadual de Captação e Transplante de Órgãos e Tecidos em Santa Catarina constitui uma iniciativa para o processo de organização de um sistema efetivo de captação e transplante de órgãos e tecidos no território catarinense, de modo a ampliar o espectro das ações e das áreas envolvidas, numa perspectiva de busca progressiva da integralidade e da universalidade das ações de saúde. Como resultado do esforço na construção do modelo assistencial de Santa Catarina, a Secretaria de Estado da Saúde firma o compromisso de orientar e conduzir a execução das diretrizes políticas. Os diferentes instrumentos de ordenamento desse modelo, cujo fundamento principal reside na possibilidade de definição de prioridades de intervenção coerentes com as necessidades de saúde da população, garantem o acesso dos cidadãos a todos os níveis de atenção. Assim, a Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos e Tecidos de Santa Catarina (CNCDO/SC) foi criada pelo Decreto Estadual nº 553 de 21 de 38 setembro de1999, por força da Lei nº 9.434/97 e Decreto 2.268/97, como unidade integrante da estrutura administrativa da Secretaria de Estado da Saúde (SC TRANSPLANTE, 2012). Atualmente, a CNCDO/SC está inserida na Gerência da SC Transplantes, sendo esta um órgão da estrutura da Secretaria de Estado da Saúde, responsável pela coordenação operacional da Política Estadual de Captação e Transplantes de Órgãos e Tecidos no Estado de Santa Catarina. Está vinculada diretamente à Diretoria de Serviços Especializados, da Superintendência da Rede de Serviços Próprios, aprovada na reforma administrativa, Lei Complementar nº 284, de 28 de fevereiro de 2005 (SC TRANSPLANTE, 2012). O Plano Estadual de Transplantes foi elaborado, aprovado e publicado em 2006, por meio da Deliberação 081/CIB/06. O documento, pioneiro em termos de planejamento de um sistema estadual de transplante no Brasil, não define uma política específica para a atividade de transplante pulmonar para o Estado de Santa Catarina. 3.3 Transplante pulmonar A história do transplante de pulmão remonta ao início do século XX, quando o primeiro procedimento foi realizado no John Hopkins Hospital em 1907. Em 1963, depois de numerosos experimentos em animais, mas contando com recursos escassos para o controle da rejeição, James Hardy, nos EUA, realizou o primeiro transplante em humano. Já na época, o transplante pulmonar se revelou um procedimento tecnicamente factível, mas havia um longo caminho a ser percorrido até a sua definitiva incorporação à moderna terapia das enfermidades pulmonares terminais (CAMARGO, 2006 ). Os anos que se seguiram foram úteis do ponto de vista de aprendizado, mas absolutamente desastrosos quanto aos resultados, dos 38 pacientes transplantados, em 20 centros diferentes, apenas um teve sobrevida maior do que poucas semanas. O pulmão era considerado o pior órgão a ser transplantado em virtude das complicações, evidentemente mais frequentes do que em outros órgãos. No final da década de 1980, ocorreram alguns progressos importantes no transplante pulmonar: a demonstração, realizada por um grupo de Paris, que o transplante unilateral podia ser utilizado em enfisema com excelentes resultados 39 (MAL; ANDREASSIN; FABRICE, 1990), e a proposição de modificações técnicas que facilitaram sobremaneira o procedimento (CALHOON et al., 1991). Isto motivou e impulsionou o transplante pulmonar, dada a elevada prevalência desta doença. Outro dado relevante, neste período, foi a descoberta da ciclosporina, na década de 70, e a sua aplicação clínica inicial como medicamento imunossupressor no início dos anos 80, levando melhores resultados no transplante (PEGO-FERNANDES; GARCIA, 2010). O primeiro transplante pulmonar na América Latina foi realizado em Porto Alegre em maio de 1989. Conforme Borro (2005), até 2005, na Espanha, foi realizado uma média de 1.162 transplantes pulmonares, com um aumento progressivo nos últimos 10 anos e mantendo uma estabilidade de 150 transplantes/ano nos últimos 4 anos. Do ponto de vista clínico, a última década caracterizou-se pela otimização dos cuidados pós-operatórios e pela busca contínua de melhor controle dos episódios de infecção e rejeição. Os números cresceram vertiginosamente nos últimos anos, mas os resultados ainda se mantêm inferiores aos obtidos com outros órgãos. Dados brasileiros confirmam esta realidade no aumento crescente no número de transplante pulmonar nos últimos 10 anos. De 21 procedimentos realizados em 2001, aumentou para 61 procedimentos em 2010, com um leve descrécimo em 2011 para 49 procedimentos; porém são números irrisórios quando comparados ao transplante de outros órgãos realizados no mesmo ano de 2011: 4957 de rim, 1492 de fígado, 181 de pâncreas e 160 de coração. O Rio Grande do Sul foi o estado que mais realizou transplante pulmonar no ano de 2011: 27 dos 41 procedimentos, seguido por São Paulo 17, Ceará 4 e Minas Gerais 1 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012). Para Camargo e Caramori (2001), estes resultados menos satisfatórios para o transplante pulmonar devem-se, em parte, a peculiaridades do órgão, que o tornam menos propício à transplante: a) É o órgão menos resistente à isquemia e o que mais facilmente desenvolve lesão; b) Funcionando como uma espécie de sentinela imunológica, o pulmão é mais suscetível a episódios de rejeição; c) O pulmão é o único órgão transplantado que permanece em contato com o ambiente, tornando-o mais vulnerável às infecções oportunistas. Há consenso de que o sucesso de transplante pulmonar depende 40 criticamente da rigidez nos critérios de seleção dos candidatos. Nos últimos anos, com o avanço da experiência, novos elementos passaram a ser utilizados na seleção do melhor procedimento para cada enfermidade (STUDER et al., 2004). As principais indicações de transplante pulmonar são (CAMARGO; SCHIO; SANCHEZ, 2006 ): Transplante unilateral: a) enfisema puro; b) enfisema pulmonar em pacientes com mais de 50 anos de idade; c) fibrose pulmonar idiopática; d) hipertensão pulmonar. Transplante Bilateral a) fibrose cística; b) bronquiectasias; c) Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) infectado; d) enfisema em pacientes jovens (<50 anos); e) hipertensão pulmonar primária ou secundária. Porém a indicação geral é de um paciente portador de uma pneumopatia terminal, com severa limitação funcional, com expectativa de vida inferior a 18 meses, sem alternativas terapêuticas, sem comorbidades, com menos de 65 anos de idade, com adequada condição psicossocial e familiar e boa motivação para viver (GLANVILLE; ESTENNE, 2003; STUDER et al., 2004). Diversos estudos têm demonstrado uma melhora na qualidade de vida, função pulmonar e satisfação dos pacientes transplantados em comparação com aqueles pacientes que estão na fila de espera (LAU; PATTERSON, 2003; LANUZA et al., 2000; TENVERGERT et al., 1998; VAN DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT, 2009). Limbos et al. (2000) compararam 36 pacientes na fila de espera do transplante pulmonar com 72 pacientes que receberam o pulmão e mostraram que pacientes transplantados apresentaram uma melhora estatisticamente significativa na saúde física, na vitalidade e na sua função social. Ainda, em relação à qualidade de vida, Trulock et al. (2004) publicaram o registro da Sociedade Internacional de Transplante de Coração e Pulmão, que mostrou que 83% dos pacientes que sobrevivem ao transplante levam uma vida normal e sem limitações ao cabo de um 41 ano e que essa porcentagem se mantém ao longo de cinco anos. 3.3.1 Complicações Yusen (2009), contudo, alerta que os médicos deveriam ajudar seus pacientes a decidir sobre fazer ou não o transplante de pulmão, porque a despeito da melhora da qualidade de vida em algumas das funções essenciais, ainda é um procedimento com consideráveis riscos e alto custo. Trulock et al. (2006) afirmam que, embora os progressos conquistados na última década e meia em relação ao transplante de pulmão tenham melhorado substancialmente a expectativa de vida dos pacientes transplantados, ela é ainda muito inferior à observada nos transplantes de fígado, rim e coração. Estima-se que aproximadamente 1600 procedimentos sejam realizados ao redor do mundo, contudo a taxa de sobrevida em 5 anos é muito variável (de 5 a 45%). Embora a sobrevida ao longo dos anos tenha melhorado, as complicações pulmonares continuam afligindo o seguimento do pós-transplantado e permanecem sendo as maiores causas de morbidade e mortalidade. Para Ahmed, Shlabin e Nathan (2001), é essencial o entendimento do impacto destas complicações, já que muitos destes pacientes serão entregues aos cuidados do médico da sua comunidade. A morbidade e a mortalidade no seguimento do transplante de pulmão devem ser consideradas no contexto do tempo pós-procedimento (STUDER et al., 2004). A morbidade e a mortalidade encontradas no primeiro ano dizem respeito aos eventos ocorridos durante o transplante e na fase pós-operatória (primeiros trinta dias iniciais), que conduzem à obrigatoriedade do uso de altas doses de drogas imunossupressoras nestes primeiros doze meses. A Síndrome da Bronquiolite Obliterante (rejeição crônica) e as complicações do longo tempo de uso dos imunossupressores, particularmente as infecções, são as principais causa de morbimortalidade nos anos subsequentes. Os primeiros trinta dias de um tranplante pulmonar são os que demonstram um maior declínio na sobrevida. A mortalidade nestes primeiros dias do pósoperatório é de 10%, conforme Meyer (2006). Estudos mostram que as principais complicações neste periodo são: injúria de reperfusão, disfunção primária do enxerto, rejeição aguda e infecção (AHMED, SHLABIN, NATHAN, 2001; 42 GLANVILLE; ESTENNE, 2003; LAU; PATTERSON, 2003; STUDER et al., 2004). Ao longo da última década, com o aperfeiçoamento das técnicas cirúrgicas e da preservação dos pulmões, com o manejo mais adequado da injúria de reperfusão e da imunossupressão, ocorreu aumento da sobrevida no primeiro ano póstransplante pulmonar de 70 a 80%, conforme Figura 2. No entanto, a sobrevida a longo prazo continua ameaçada pelo desenvolvimento da rejeição crônica (MORAES; CAMARGO; SCHIO, 2006). Figura 2: Sobrevida geral com o transplante de pulmão Fonte: Moraes, Camargo e Schio (2006). Entre os principais responsáveis pela mortalidade tardia encontram-se a 43 Bronquiolite Obliterante (traduzido pela rejeição crônica), a sepse e as neoplasias malignas (BORRO, 2005; MORAES; CAMARGO; SCHIO, 2006; STUDER et al., 2004). Dados do registro da Sociedade Internacional de Transplantes do Coração e Pulmão, em 2009, mostram que 28% e 74% dos pacientes desenvolvem rejeição crônica em 2,5 anos e 10 anos, respectivamente. A rejeição crônica é responsável por menos de 5% das mortes no primeiro ano do transplante pulmonar, mas é a responsável por cerca de um quarto das mortes após este período (CHRISTIE et al., 2009). As infecções também representam uma das maiores causas de morbimortalidade deste procedimento, seja na fase inicial ou tardia (MORAES; CAMARGO; SCHIO, 2006). Os pacientes transplantados de pulmão são mais vulneráveis a infecções imunossupressão crônica, oportunistas da e possibildade nosocomias de em desnutrição decorrência e das da longas permanências em ambiente hospitalar. Studer et al. (2004) reforçam que o sucesso de um transplante pulmonar e a sua relação com as complicações dependem de vários fatores, como a experiência da equipe, particularmente com as técnicas cirúrgicas e o manejo peri-operatório; a profilaxia antimicrobiana; a seleção dos pacientes transplantados (receptores) e as características do doador. A dificuldade em obter um órgão doador e o número crescente de pacientes na fila de espera têm aumentado, com isso, o limite de aceitabilidade do doador tem se extendido. Em particular, a idade do doador tem aumentado ao longo dos anos e isto pode ter implicações na sobrevida póstransplante. 3.3.2 Captação O processo de obtenção de órgãos para transplante é iniciado pelos médicos intensivistas ou assistentes, que identificam potenciais doadores, diagnosticam morte encefálica, notificam a família e fazem a comunicação à coordenação de transplante. Segue-se com a entrevista e o consentimento da família para remoção dos órgãos e dos tecidos, considerando as condições clínicas do potencial doador e viabilidade dos órgãos a serem extraídos. O processo termina com a remoção e a distribuição dos órgãos e dos tecidos doados e com a análise dos seus resultados, 44 realizada por organizações regionais de procura de órgãos. Em virtude do complexo processo de obtenção de órgãos, o número de doadores é insuficiente para atender à lista de espera, e a falta de órgãos para transplante reflete não apenas a falta de potenciais doadores, mas também a falha em convertê-los em doadores efetivos e a crescente flexibilidade de critério para inclusão em lista de espera. Num estudo realizado na Espanha, Del Rio et al. (2009) enfatizam que, mesmo sendo um país com um alto grau de doação de pulmão, a necessidade do transplante é sempre maior que o número de órgãos obtidos. Isto se deve ao fato de que o pulmão é o órgão que mais precocemente sofre as alterações da morte encefálica. Borro (2005), no mesmo país, afirma que a porcentagem de doadores pulmonares é baixa em relação aos outros órgãos, mas que se deve insistir na necessidade de pensar nos pulmões desde o princípio da geração de um doador de múltiplos órgãos. O manejo cuidadoso e precoce do doador melhora os índices de captação de pulmão. Rajamiyer et al. (2008) acreditam que apenas 20% dos pacientes com morte encefálica sejam potenciais doadores de pulmão. Westphal et al. (2011a) mostram que a morte encefálica induz a várias alterações fisiopatológicas e isso pode levar danos aos diversos órgãos a serem transplantados; portanto, a atuação do médico intensivista durante a manutenção do potencial doador falecido exige cuidados específicos com estes órgãos, visando à sua maior viabilidade para transplantes. Particularmente, os pulmões são mais sensíveis à instabilidade hemodinâmica que ocorre com os pacientes em morte encefálica, quando comparados aos outros órgãos, pois são mais agredidos durante os esforços para a ressuscitação cárdio-respiratória e são mais expostos aos agentes infecciosos durante o periodo de hospitalização (FRANKLIN et al., 2010). Na mesma linha dos cuidados com o doador pulmonar, Westphal et al. (2011b) ressaltam a importância da ventilação protetora na modulação da resposta inflamatória e o consequente aumento do aproveitamento dos pulmões. Outros estudos corroboram esta ideia e crescentes esforços têm-se dispensado no intuito de idealizar protocolos que melhorem a manutenção e, consequentemente, o recrutamento de pulmões viáveis para o transplante (ANGEL et al., 2006; COBO; GALLEGOS, 2009; MASCIA et al., 2010; NOISEUX et al., 2009). Por fim, estudos têm mostrado que, em função da melhoria das técnicas cirúrgicas e dos cuidados peri-operatórios, existe a possibilidade de estender as 45 estratégias de inclusão de um potencial doador, aumentando o número de órgãos doados e, consequentemente, diminuir o número de pacientes na fila de espera para um transplante (KRUEGER; BERUTTO; AUBERT, 2011; LARDINOIS et al., 2005; MEERS et al., 2010; PERROT et al., 2004). Ao contrário dos candidatos a transplante renal, os candidatos a transplante pulmonar têm uma possibilidade de vida atrelada ao transplante, que deve ser realizado em tempo de espera inferior a 1 ou 2 anos. Raemdonck et al. (2009) estimam que 10 a 15% dos pacientes por muito tempo na fila de espera morrem antes de receber um transplante. Além disso, os candidatos a transplante pulmonar dependem da adequação do tamanho do órgão a ser transplantado em relação ao tamanho do receptor, de tempo de preservação limitado e de melhores condições hemodinâmicas do doador. Um órgão sem receptor ideal numa comunidade pode ser utilizado em outra região, dependendo de uma logística de transporte de equipes cirúrgicas e de critérios estabelecidos de distribuição dos órgãos, coordenados por organização centralizadas, estaduais e federais. Na vigência de muitos potenciais receptores, a seleção se inicia, usualmente, pela tipagem sanguínea, procurando a compatibilidade total com o doador. Um fator importante na seleção do receptor diz respeito ao tamanho do órgão disponível, aferido pelas medidas dos diâmetros torácicos e pela relação peso/altura entre doador e receptor e a compatibilidade imunológica direta com o doador. Se com esses elementos ainda houver disputa por dois ou mais candidatos ao mesmo órgão, o receptor será selecionado por: ter maior chance de sucesso, ser mais jovem, ter menor expectativa de vida sem o transplante e estar há mais tempo na lista de espera (CAMARGO; CAMARGO 2006 ). 3.3.3 Custos As metodologias para transplantar pulmões estão em fase evolutiva na medicina e pode-se afirmar que se trata de uma tecnologia recente (VAN DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT, 2009). Embora o primeiro transplante de pulmão tenha sido reportado em 1963, até início dos anos 80 ele não era considerado como uma técnica fácil e aceita como arsenal terapêutico, em função das dificuldades na implementação e do fracasso do seguimento (índice de mortalidade muito alto). Com o surgimento de novas técnicas cirúrgicas e de drogas imunossupresivas mais 46 eficientes, conseguiu-se uma melhora na qualidade e na sobrevida dos pacientes transplantados e o número deste procedimento tem crescido nas duas últimas décadas. Contudo, não há dúvidas que o transplante de pulmão é um procedimento que requer uma tecnologia extremamente cara (ANYANWU et al., 2002). Os cuidados intensivos, principalmente no primeiro ano pós-transplante, e o uso de medicamentos imunossupressores por um longo tempo tornam o custo efetivo do transplante pulmonar alto. Um estudo realizado no Canadá (VASILIADES et al., 2005), onde foram acompanhados, por um período de 4 anos, 124 pacientes submetidos a um transplante pulmonar, mostrou que o custo de um paciente sem transplante (fila de espera), por mês, é de $ 1.102,00; enquanto o custo de um paciente transplantado (incluindo o procedimento) é de $ 6.208,00 por mês. O aumento no custo de transplante pulmonar depende de vários fatores: os pacientes em fila de espera (quanto maior o tempo de espera, pior a condição do paciente transplantado); o tipo de doença pulmonar preexistente (exemplo fibrose cistica piora a sobrevida do transplantado); o tipo de transplante (um ou dois pulmões, pulmão e coração juntos) e, por fim, o tratamento imunossupressor instituído pós-transplante (ANYANWU et al., 2002; GROEN et al., 2004; GROSS, 1997). Um estudo realizado no Reino Unido, onde foram acompanhados, por 5 anos ou até a morte, 356 transplantados de pulmão, analisou os principais eventos clínicos pós-transplante e os custos relacionados a estes eventos com o impacto do uso de diferentes imunossupressores. Os pacientes foram acompanhados em três tempos (0-6, 7-12 e 13-60 meses) e divididos em evolução clínica (pacientes bem, com rejeição aguda, com infecção por Citomegalovírus, com Bronquiolite obliterante e morte). Os custos relacionados aos pacientes com boa evolução clínica foram contabilizados pelo uso de imunossupressão, profilaxia e visitas clínicas, e os custos dos pacientes com complicação foram contabilizados com os gastos com diagnóstico, tratamento e dias de internação. O custo mensal, conforme o tempo de sobrevida, nos pacientes pós-tranplantados que evoluíram bem foram de $ 2.658,00 nos primeiros 6 meses; $ 752,00 de 7 a 12 meses e $ 523,00 até completarem 5 anos. Nos pacientes com complicação, a média mensal foi igual nos três tempos: $ 2.766,00 para pacientes com rejeição (seja aguda ou crônica-bronquiolite obliterante); $ 5.013,00 para pacientes com infecção por Citomegalovísus e $ 4.171,00 para pacientes com outras infecções. Todos os pacientes foram tratados 47 com um imunossupressor estabelecido pelo protocolo do serviço (ciclosporina), porém quando necessitaram da troca da droga, os custos mensais em cinco anos aumentaram de 5 a 23%, conforme a droga escolhida (SHARPLES et al., 2001). Assim, os gastos com um paciente pós-transplantado são muito maior no primeiro ano pós-procedimento e variam enormemente conforme o tipo de droga imunossupressora (ENCKEVORT et al., 1997). Em função dos diferentes tipos de sistema de saúde, custos e dados econômicos não podem ser extrapolados internacionalmemte, por isso é muito importante estudos de performance econômica de cada país. A avaliação econômica promove uma importante noção sobre custos e é particularmente útel para tomada de decisões. Ramsey et al. (1995), nos EUA, promoveram um estudo piloto sobre custoefetividade no transplante de pulmão, e mostraram que, apesar da amostra pequena (comparação de 25 pacientes transplantados e 24 pacientes em fila de espera), o transplante pulmonar é muito caro, embora possa melhorar substancialmente a qualidade de vida dos pacientes; dois terços dos gastos ocorrem no primeiro ano de vida pós-transplante; e a expectativa de vida não foi diferente nos dois grupos. Neste estudo, o custo médio do transplante pulmonar foi de U$ 152.000 dólares (incluindo cirurgia e cuidados pós-operatórios), o custo mensal no primeiro ano de vida póstransplante foi de U$ 11.917 dólares e nos anos seguintes U$ 4.525 dólares. O custo mensal de um paciente na fila de espera foi de 3.395 dólares. Tenvergert, Groen e Vermeulen (2010), avaliando quatro tipos de análise econômica (minimização de custos, custo-eficácia, custo-utilidade e custo-benefício), mostraram que, no transplante de pulmão, a análise do custo-efetividade mostrou ser um procedimento efetivo (melhora a sobrevida em anos), porém caro. Como em relação à sobrevida, não se pode falar apenas em anos vividos, mas em qualidade de vida nestes anos. Vários estudos também mostram que os pacientes transplantados têm uma melhora em vários domínios da qualidade de vida, justificando assim os custos gerados pelo transplante pulmonar (GROSS; RAGHU, 1997; RAMSEY et al., 1995). No Brasil, existem poucos estudos relativos à avaliação econômica dos transplantes. Conforme Sanches e Dain (2008), em seu estudo sobre terapias substitutivas renais, a utilização da avaliação econômica, particularmente a análise de custo-efetividade, é um importante aliada para subsidiar uma alocação de 48 recursos exequível, eficiente e tendo a equidade como uma dimensão relevante a ser considerada. Segundo ela, em nosso país, é muito difícil viabilizar uma avaliação econômica não só pela inexistência de uma padronização metodológica para sua operacionalização, como também pelo seu alto custo e pela disponibilidade de dados e informações necessárias. Um estudo realizado no Rio de Janeiro mostrou que os gastos reais (cirurgias, procedimentos associados e medicamentos) com transplante pulmonar no Brasil, entre 1997 a 2003, giraram em torno de R$ 30.000,00 por paciente, e que só no ano de 2003 o gasto total com transplante pulmonar foi de R$ 1.037.986,00. O objetivo do trabalho foi avaliar a eficiência do Sistema Nacional de Transplante (SNT), mas mostrou também que o tempo médio na fila de espera para um transplante pulmonar em 2003 foi de 1,77 anos. O tempo de espera prolongado, como já citado anteriormente, é um dos fatores de aumento nos custos pré e pós-transplante. Ainda conforme esse estudo, o Brasil é um dos países com maior programa público de transplantes no mundo. De acordo com SNT, em 2005, foram realizados 15.527 transplantes de órgãos e tecidos no Brasil, sendo que destes 11.095 foram pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O gasto total com transplantes, incluindo medicamentos, em 2005, foi de R$ 521,8 milhões (MARINHO; CARDOSO, 2007). Para Chaves (1998), as questões ligadas à eficiência, ao custo-efetividade, à avaliação tecnológica, ao estabelecimento de prioridades, à alocação de recursos e à gestão orientada para qualidade e resultados, são fatores importantes na dimensão econômica da saúde. 49 4 CONTEXTO DA PESQUISA O Brasil possui hoje um dos maiores programas públicos de transplante de órgãos e tecido do mundo. Com 548 estabelecimentos de saúde e 1.376 equipes médicas autorizadas a realizar transplante, o Sistema Nacional de Transplante está presente em 25 estados do país, por meio das Centrais Estaduais de Transplante (ABTO, 2013). No Brasil, o transplante de órgãos, por doação ao Estado, somente pode ser feito após a morte cerebral do doador, que pode ser natural ou acidental, e com o concomitante funcionamento dos órgãos que serão doados, sendo que a morte cerebral deve ser devidamente diagnosticada por uma equipe médica; e o transplante, autorizado pelo SNT e pelo SUS. O paciente deve ter manifestado, em vida, para a família, a sua intenção de se tornar doador. Uma vez constatada por médicos a necessidade de transplante, o paciente candidato a receptor é colocado na fila. A fila para transplantes no SUS para cada órgão ou tecido é única, e o atendimento é por ordem de chegada, considerados critérios técnicos, geográficos e de urgência específicos para cada órgão, de acordo com a Portaria 91/GM/MS, de 23 de janeiro de 2003. A fila é disciplinada pela Portaria 3.407/GM/MS, de 05 de agosto de 1998 (BRASIL, 2008). A problemática dos transplantes de órgãos pode ser mais bem compreendida com a observação de algumas das características econômicas dos órgãos transplantáveis. Entre essas características destacam-se: a) São essenciais. b) Não podem ser estocados por muito tempo (com exceção de ossos e medula) e somente podem ser utilizados uma vez. Um coração dura entre 4h e 6h, um pulmão de 4h a 6h, um pâncreas entre 12h e 24h, um fígado entre 12h e 24h e um rim até 48h. Uma córnea pode durar até sete dias. c) Têm pouco uso. Portanto, existe baixo custo de oportunidade, pois não há muito a ser feito com os órgãos doados, que se deterioram rapidamente. d) Têm poucos substitutos, com exceção de rins que, durante algum tempo e com baixa qualidade de vida, admitem as terapias renais substitutivas. e) Os candidatos a receptores não comandam a aquisição dos órgãos. A aquisição é comandada pelos profissionais de saúde, o que configura um modelo do tipo 50 principal/agente. f) Existe elevada “capacidade ociosa”, pois há um desperdício considerável de órgãos. No Brasil, de cada 8 potenciais doadores, apenas 1 é notificado e somente 20% destes são utilizados como doadores de múltiplos órgãos. g) Os doadores não comandam a oferta. São os profissionais de saúde que, em última instância, decidem se um órgão doado pode ser aproveitado e para quem ele pode ser cedido. A demora no atendimento exerce impactos significativos sobre o bem-estar; as probabilidades de cura; a sobrevida dos enxertos e dos pacientes; a natureza e a extensão das sequelas nos pacientes, nos familiares envolvidos, e na sociedade. Pior situação ocorre quando, além de elevados, os prazos são imprevisíveis. Com tal agravante, as incertezas decorrentes dessa imprevisibilidade impedem o planejamento das vidas dos pacientes e dos seus familiares, da atuação do sistema de saúde e do funcionamento do sistema produtivo em que eles, por ventura, trabalhem. Tempo de espera elevado implica, além dos custos e sofrimentos dos pacientes na fila, o aproveitamento de órgãos de qualidade inferior e a consequente redução do tempo de duração dos enxertos. Com esse sistema organizacional, a taxa de doação no país permaneceu estável, variando de cerca de 3 por milhão de população (pmp) entre 1993-1998, aumentando para 7,4 pmp entre 1999 e 2004, diminuindo para 5,4 pmp entre 2005 e 2007 e voltando a subir entre 2008 e setembro de 2009 para 8,6 pmp. A meta, conforme estudos, seria de 10 pmp para o ano de 2010, 14 pmp para 2013 e 20 pmp para 2017 (PEGO-FERNANDES; GARCIA, 2010). O número de transplantes realizados por ano, em cada estado ou unidade federada (UF), representa o equilíbrio possível e efetivo entre a taxa média de serviço (a oferta) e a taxa média de chegada de pacientes (a demanda) candidatos a transplantes no SNT. No conjunto das UFs, fica evidente um predomínio do menor tempo de espera nas regiões Sul e Sudeste, que também concentram a maior parte dos transplantes realizados e dos pacientes em filas (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2007). Conforme registro da Associação Brassileira de Transplante (ABTO), em 2011 foram realizados 4.975 transplantes de órgãos no Brasil, sendo São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina os responsáveis por 73% deste total (3.628 transplantes). Já no ano de 2012, este número aumentou para 5.385 transplantes, sendo que os estados que mais se 51 destacaram em número de transplantes por milhão de população foram RS (51,2 pmp), seguido de SP (47,2 pmp), PR (41,5 pmp) e SC (39,2 pmp) (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). Santa Catarina não realiza transplante pulmonar, porém um dado interessante em relação ao número de transplantes mostrou que, no ano de 2011, enquanto o Brasil chegou próximo de 11 doadores por milhão de habitantes, Santa Catarina alcançou 25 doadores efetivos por milhão de habitantes, sendo esse o melhor resultado já alcançado por um estado brasileiro na realização de transplante de órgãos. No ano de 2012, Santa Catarina superou expectativas e tornou-se líder no país com melhor taxa de doação de órgãos por milhão de população (26,4 pmp), comparando-se às melhores taxas de países desenvolvidos. Santa Catarina ocupa hoje, no Brasil, o segundo lugar nos transplantes de fígado, quarto lugar em transplante de rim, quinto em medula óssea e sexto em pâncreas por milhão de população (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). A Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos e Tecidos de Santa Catarina (CNCDO/SC) foi criada pelo Decreto Estadual nº 553 de 21 de setembro de 1999, por força da Lei nº 9.434/97 e Decreto 2.268/97, como unidade integrante da estrutura administrativa da Secretaria de Estado da Saúde (SC TRANSPLANTE, 2012). Atualmente, a CNCDO/SC está inserida na Gerência do SC Transplantes, sendo este um órgão da estrutura da Secretaria de Estado da Saúde, responsável pela coordenação operacional da Política Estadual de Captação e Transplantes de Órgãos e Tecidos no Estado de Santa Catarina. Está vinculada diretamente à Diretoria de Serviços Especializados, da Superintendência da Rede de Serviços Próprios, aprovada na reforma administrativa, Lei Complementar nº 284 de 28 de fevereiro de 2005. A Gerência do SC Transplantes está localizada no 3° andar do Posto Assistência Médica em Florianópolis, funciona 24 horas e possui um número de discagem gratuita para todo o território nacional (0800 643 74 74). Sua equipe multiprofissional e interdisciplinar é composta por 2 médicos, 6 enfermeiros, 4 técnicos em atividades administrativas, 2 assistentes sociais e 1 digitadora. Atualmente, a manutenção operacional da Gerência do SC Transplantes é custeada por recursos vinculados ao orçamento da GEPAM. A principal competência da Gerência do SC Transplantes consiste em atender 52 a população catarinense no que diz respeito à doação, à captação, à distribuição e ao transplante de órgãos e tecidos humanos. Com esse propósito, a Gerência do SC Transplantes registra e organiza informações, por meio de cadastros de receptores, de estabelecimentos de saúde, de equipes, de profissionais, entre outros. São 128 profissionais cadastrados para captação e transplante, entre todas as especialidades exigidas pelas portarias e leis, para todos os tipos de órgãos e tecidos. Em relação às Unidades de Saúde cadastradas para atendimento em transplantes de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), a rede conta com 12 unidades, distribuídas em 5 macrorregiões de saúde, estando ausente nas macrorregionais do planalto norte, serrano e meio oeste. Também estão cadastradas, junto à Gerência da SC Transplantes, 5 unidades de natureza privada, hospitalares e ambulatoriais para atendimento em transplantes de córnea exclusivamente a pacientes em caráter privado. Todas as unidades vinculadas ao SUS, cadastradas para realização de transplantes, estão também cadastradas para captação de órgãos e tecidos. Além dessas, estão cadastradas 09 unidades que realizam exclusivamente captação. Na rede privada, estão cadastradas 03 unidades para captação de órgãos e tecidos. O financiamento destinado à realização de captação e transplante, bem como a outras atividades inerentes a elas, é de responsabilidade compartilhada entre a União, o Estado e o Município. O financiamento federal ocorre por meio do Fundo de Ações Estratégicas e Compensação (FAEC), a partir das informações do SNT. São financiados os procedimentos de notificação do potencial doador; a manutenção do potencial doador; a captação de órgãos e/ou tecidos para transplante (cadáver e vivo); o transplante de órgãos e/ou tecidos (cadáver e vivo); as intercorrências póstransplante; os exames e as consultas em consequência do transplante ou da doação em vida; os medicamentos necessários em decorrência do transplante ou da doação em vida. O pagamento dos procedimentos é feito por meio de Autorização de Internação Hospitalar (AIH), extrateto financeiro, para todos os níveis de gestão. Os medicamentos são financiados por meio de Autorização de Procedimentos de Alto Custo (APAC). A contrapartida financeira estadual se dá por meio do custeio e da 53 manutenção da estrutura técnico-administrativa, incluindo local, equipamento, pessoal, material, publicidade, cursos, palestras, vistoria, veículos, entre outros. Desse modo, a Secretaria de Estado da Saúde, por meio da Gerência do SC Transplantes, mantém em funcionamento todas as atividades específicas de notificação, captação e distribuição de órgãos e tecidos, num período de 24 horas, no âmbito estadual. Desenvolvem também projetos na área educacional e esclarecimento à população em geral, referentes à doação e ao transplante de órgãos e tecidos. As consultas e os exames de pré-transplante se encontram inseridos no financiamento da média e alta complexidade, acordados na Programação Pactuada e Integrada (PPI). A Programação Pactuada Integrada (PPI) da Assistência é coordenada pelo gestor estadual, em estreita articulação com os gestores municipais em todas as suas etapas em respeito ao princípio do comando único do sistema de saúde em cada esfera do governo. A definição do limite financeiro para todos os municípios deve ser composta por uma parcela da população do próprio município, acrescido da parcela de recursos correspondentes à programação de referências de outros municípios e deduzida a previsão de necessidades de encaminhamento da população para outros municípios, pactuada entre os gestores. A cota financeira de cada município é determinada pela população do município, multiplicada pelos parâmetros predefinidos de cada grupo de procedimentos que compõem a PPI da Assistência, sendo que estes são fixos para todos os municípios. Os procedimentos de Alta Complexidade Ambulatorial possuem suas referências predefinidas pelos municípios sede que realizam os procedimentos específicos para cada grupo da Alta Complexidade. Portanto, é de responsabilidade do gestor estadual determinar quais são as referências para os procedimentos da Alta Complexidade Ambulatorial. Além do deslocamento das equipes de captação e transplante de órgãos e tecidos entre os estados brasileiros, é também garantido pelo SNT o deslocamento do órgão ou do tecido para transplante. Os procedimentos de pré-transplante, transplante e pós-transplante, realizados em caráter privado e/ou convênio, são financiados de acordo com a 54 regulamentação específica de cada plano ou seguro saúde, do início ao final de todo o tratamento, desde que o estabelecimento, a equipe, o profissional e o paciente estejam cadastrados no SNT, e respeitados o Cadastro Único de Receptores. A inscrição dos receptores se dá por meio dos profissionais médicos credenciados que cadastram seus pacientes na Gerência da SC Transplantes (CNCDO/SC), em formulário padrão de inscrição individual, sendo inserido no cadastro único, respeitando a data de chegada do formulário devidamente preenchido. A atualização das informações clínicas dos receptores cadastrados, tais como manutenção da soroteca, intercorrências clínicas, óbito, desligamento, entre outros, é de responsabilidade dos médicos credenciados. A distribuição de órgãos e ou tecidos respeitará a Legislação Federal, por meio do programa informatizado do Sistema Nacional de Transplantes, cujos dados estão organizados respeitando os critérios previstos para cada tipo de órgão e/ou tecido. Quando ocorre a doação de um órgão e/ou tecido, este é submetido a exames e os resultados são alimentados no programa, que então procede ao cruzamento entre os dados de doador e receptor e apresenta em ordem decrescente os receptores mais compatíveis com o órgão e/ou tecido. O médico do receptor é contatado para disponibilização do órgão e/ou tecido, e este deve confirmar o aceite ou não. No caso de recusa, deverá ser comunicada por escrito em formulário próprio à gerência do SC Transplantes. As diretrizes para organização de um sistema efetivo de captação e transplante de órgãos e tecidos no território catarinense seguirão os seguintes critérios na captação e na distribuição dos órgãos captados, conforme Plano Estadual de Transplante: a) Fluxos de referência e contrarreferência Os fluxos de referência e contrarreferência para a captação e transplante de órgãos e tecidos obedecerão à Política de Regionalização da Saúde, cujos critérios estão delimitados no Plano Diretor de Regionalização, obedecendo à territorialização municipal, microrregional, regional, macrorregional e estadual. Em Santa Catarina, na captação de órgãos e tecidos, as unidades hospitalares de menor complexidade deverão encaminhar o potencial doador de órgãos e/ou tecidos, seguindo os fluxos regionalizados da assistência à saúde, às 55 unidades de referência regional credenciadas para captação e posterior distribuição, por meio da Gerência/Central de Notificação e Captação de Órgão do Estado (CNCDO) às unidades de referência credenciadas para transplante. Em situações especiais de captação e transplante, como, por exemplo, para pulmão, equipes de outras unidades da federação poderão estar diretamente envolvidas no procedimento de retirada do órgão, mediante autorização prévia da CNCDO. Santa Catarina, como não possui um centro de transplante pulmonar, mantém parceria com o Rio Grande do Sul para atender à demanda estadual no transplante deste órgão. b) Serviços auxiliares e complementares pré-transplante Para a realização de determinados tipos de transplantes são necessários exames complementares, tais como angiorressonância, arteriografia e cintilografia. Esses exames são solicitados pelo médico transplantador integrante de equipe atuante em uma instituição credenciada para o procedimento. Atualmente, não existem pactuações de referência e contrarreferência para os procedimentos de pré-transplante. c) Sistemas assistenciais de alta complexidade Transplantes de órgãos sólidos, tanto na sua realização quanto no acompanhamento dos pacientes, dependem de estabelecimentos de saúde especializados no manejo das patologias, das disfunções ou das insuficiências orgânicas relacionadas a cada modalidade específica. Esse fato reforça a necessidade de vincular tais programas de transplante aos centros de referência de alta complexidade nas diversas regiões do estado. A inserção de serviços de transplante dentro das unidades da rede de assistência especializada (nefrologia, cardiologia, ortopedia, etc.) confere resolutividade ao sistema e permite um atendimento integral ao usuário. d) Integralidade da assistência Por se tratar de modalidade terapêutica que envolve alta complexidade e considerável investimento financeiro, as ações e os procedimentos de transplante devem atender ao princípio da integralidade da assistência, compreendida como: - Assistência pré-transplante, que inclui inicialmente o acesso a todo serviço de 56 saúde necessário para o preparo e a inclusão do paciente na lista de espera do respectivo programa. O SUS deverá garantir acesso a todos os procedimentos desta etapa. - Procedimentos de transplante, caracterizados pelo implante de órgão ou tecidos no receptor. Tal etapa inclui o transporte ágil e eficiente desde a residência do paciente até a unidade credenciada para transplante, com vistas a garantir melhores resultados no processo. - Assistência pós-transplante, realizada por meio de um conjunto de procedimentos destinados ao acompanhamento clínico ou atenção ao paciente na possibilidade de intercorrências. - Assistência de urgência e emergência: em situações de complicações agudas relacionadas direta ou indiretamente à imunossupressão; em situações de qualquer outra natureza que possa comprometer o êxito do transplante. Considerando o princípio da equidade, o paciente transplantado deve ter acesso priorizado na rede de assistência do SUS especialmente nas condições que caracterizem urgência e emergência. A assistência farmacêutica deve ser garantida e ofertada ao paciente transplantado na totalidade da prescrição e sob rigoroso controle, em virtude da estreita ligação entre o uso da medicação imunossupressora e o sucesso dos procedimentos de transplante. Antibióticos, antifúngicos e antivirais são drogas essenciais no manejo de condições comuns a esses pacientes. Do mesmo modo, medicações para o controle dos agravos crônicos degenerativos devem ser garantidas aos pacientes transplantados. e) Controle social O controle social, realizado por meio da atuação dos Conselhos de Saúde, confere legitimidade e visibilidade ao Sistema de Saúde. Considerando que é de responsabilidade dos Conselhos Municipais de Saúde a formulação de estratégias e o controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, toda solicitação para credenciamento de estabelecimento ou equipe de saúde para realização de captação ou transplante deverá ser previamente aprovada pelo Conselho Municipal de Saúde do município – sede da unidade ou da equipe, cuja ata de aprovação será anexada ao processo de credenciamento. 57 f) Gestão orçamentária e financeira A prestação de serviços de saúde exige uma previsão orçamentária e financeira. Santa Catarina, na condição de gestor pleno, possui seu teto financeiro definido pelo Ministério da Saúde. Toda alteração no teto financeiro estadual, em especial inclusão de novos serviços, deve ser previamente aprovada pelo gestor estadual. g) Gerência dos Transplantes de SC O cargo de gerente dos transplantes de Santa Catarina, a partir da aprovação deste documento pela CIB, só poderá ser ocupado por profissional de saúde não integrante de equipe de transplante e/ou remoção de órgãos ou tecidos no momento da posse e pelo menos nos 2 anos que a antecedam, segundo a análise do banco de dados do SNT. O gerente do SC Transplantes deverá possuir formação na área de saúde pública, gestão de serviços de saúde e coordenação intra-hospitalar de doação de órgãos e tecidos para transplantes. h) Subordinação das equipes às instituições A partir da aprovação deste documento pela CIB, fica estabelecida uma forte relação hierárquica entre equipes e instituições. As instituições poderão e deverão tomar parte nas decisões que alterem composições ou comandos das suas respectivas equipes de transplante. Quaisquer alterações nas equipes só poderão ser processadas mediante a anuência do gestor institucional (Diretor Técnico ou Clínico). No mesmo sentido, a atuação da equipe em outra instituição dependerá da autorização da instituição original. Santa Catarina, no primeiro semestre de 2011, conforme a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), foi um dos estados com maiores taxas de notificação de doadores potencias (59,2 por milhão de população-pmp) e o maior em notificação de doadores efetivos (25,6pmp) (doadores potenciais são aqueles diagnosticados com morte encefálica e exames suplementares e se tornam um doador elegível; doador efetivo é aquele que já iniciou a cirurgia e tem seu órgão transplantado). No final de 2011, foi o quinto estado em número total de transplantes no país. Ocupa, ainda, o segundo lugar nos transplantes de rim, terceiro em 58 pâncreas, quinto em medula óssea e décimo segundo em córnea por milhão de população (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012). Neste primeiro trimestre de 2012, ultrapassou a meta proposta para o ano de 2017, que era de 50 notificações pmp, para 65 pmp. Está em primeiro lugar no país em taxa de doadores efetivos (26,2 pmp), sendo que a média brasileira é de 13,1 pmp. A taxa de efetivação de transplante no Brasil, neste primeirro trimestre, foi de 29,7% e Santa Catarina ficou entre os quatro principais estados que ultrapassaram esta média (acima de 40%). Conclui-se, portanto, que nosso estado representa uma parcela importante no quadro nacional dos transplantes. O Estado de Santa Catarina não realiza transplante pulmonar. No Brasil, existem cinco estados que possuem centro de transplante pulmonar: São Paulo, Minas Gerais, Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, sendo que, nos últimos dois anos, o Estado do Rio de Janeiro não realizou nenhum procedimento (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). As outras regiões do país necessitam transportar seus pacientes a estes estados no momento em que se consegue o órgão a ser transplantado. No caso de Santa Catarina os pacientes são encaminhados para o RS. Apesar do crescimento que houve nos últimos 10 anos no Brasil (de 0,1 para 0,4 pmp), o pulmão é ainda um dos orgãos menos transplantado do país, em 2012 ocorreram 69 transplantes, sendo o Rio Grande do Sul o estado que mais realizou este procedimento (33), seguido de São Paulo (31), Ceará (4) e Minas Gerais (1). Embora com um número ainda reduzido, houve um significativo aumento no transplante de pulmão no ano de 2012, quando comparado ao ano de 2011, de 49 para 69 transplantes, atingindo o número de 0,4 pmp (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). Sendo Santa Catarina um estado com estatísticas favoráveis em relação aos transplantes de órgãos e com uma estrutura funcional extremamente organizada e reconhecida nacionalmente, fica a pergunta do por que da falta de um centro de transplante pulmonar próprio. É mais fácil encaminhar ao estado vizinho (RS) que, por sua vez, é o maior centro deste transplante do país? Nosso Estado não possui um número viável de pacientes para manter um serviço aqui? Não há uma equipe técnica que possa trabalhar com esse procedimento de alta complexidade em nosso estado? O financiamento seria muito maior se comparado ao deslocamento deste paciente para o outro estado? Qual o custo real da manutenção de um centro de 59 transplante pulmonar? São estes os principais questionamentos que deram início à proposta deste estudo, e que se pretende responder durante a execução desse trabalho. Os dados foram coletados na Secretaria de Saúde do Estado de Santa Catarina e no Centro de Transplante do Hospital Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (RS). 60 5 METODOLOGIA Este projeto de pesquisa é um estudo de caso no âmbito da economia da saúde, com abordagem quali-quantitativa e aplicação da metodologia multicritério de apoio à decisão (MCDA). A pesquisa qualitativa permite analisar os aspectos implícitos ao desenvolvimento das práticas organizacionais e a interação entre seus integrantes. É a técnica mais apropriada para compreender o fenômeno no contexto em que está inserido e do qual é parte, pois possibilita analisá-lo numa perspectiva integrada (TRIVINOS, 1987). Quanto aos fins, pode ser considerada descritiva, pois descreve as informações obtidas por meio da pesquisa documental e das entrevistas. A pesquisa descritiva expõe as características de determinada população ou de determinado fenômeno, mas não tem o compromisso de explicar os fenômenos que descreve, embora sirva de base para tal explicação (CHURCHIL JR., 1999). Quanto à estratégia de pesquisa, ela pode ser classificada como um estudo de caso. Por pretender estudar um único fenômeno, associado a um problema específico no âmbito do investimento em ampliação de serviços de saúde em uma circunstância singular, não tem a pretensão da generalização. Quanto aos meios de investigação, este trabalho foi dividido em duas etapas: a pesquisa bibliográfica; e outra final, que foi a pesquisa documental e levantamento de critérios de avaliação das alternativas para aplicação do modelo MCDA. Assim, os elementos primários de avaliação nesta pesquisa foram estabelecidos a partir de entrevistas e discussões com especialistas. A avaliação e agregação desses elementos primários por afinidade e relações de causa-efeito em uma matriz cognitiva permitiu seu agrupamento em áreas de interesse: Exemplo: (custo, impacto na sobrevida, ampliação da oferta, curva de aprendizado, etc.) que foi representada por uma árvore de critérios (FITZ; SOUZA, 2007). Para cada critério foi estabelecido um descritor (ou indicador). Para cada indicador ou descritor foi estabelecido o padrão e a escala utilizada para a sua avaliação. O cálculo das funções de valor definidas por cada critério será realizado com auxílio do software MacBeth – Measuring Attractiveness by a Categorical Based Evaluation Technique (BANA-E-COSTA; VANSNICK, 1999). 61 Em síntese, o MCDA procura sistematizar o processo de tomada de decisão em relação a alternativas diversas, comparando-as em seu resultado segundo múltiplos critérios ou valores percebidos pelo tomador de decisão (ENSSLIN; MONTIBELLER NETO; NORONHA, 2001). Os passos para a construção da metodologia são: a) Identificação dos Elementos Primários de Avaliação; b) Construção da matriz lógica, matriz cognitiva ou mapa cognitivo, que deve incluir todos os valores e dimensões relevantes do problema (os EPAs); c) Análise da matriz e da identificação dos Pontos de Vista Fundamentais, que sustentarão a construção do modelo multicritério; d) Definição dos descritores, que se tornarão as escalas para a medida de cada critério (avaliarão o desempenho de cada critério) quando submetido a cada uma das alternativas sob análise do decisor; e) Definição das diferenças de atratividade de cada ponto da escala em relação aos demais pontos da escala (Quanto vale a mudança do ótimo para o bom em uma escala que qualifica um determinado critério? Essa diferença é a mesma se se mudar do bom para o regular?). f) Com as diferenças de atratividade estabelecidas em relação à escala semântica, o software Macbeth transformará cada escala em diferenças numéricas ponderadas, permitindo a comparação das mesmas em relação a possíveis compensações entre elas para a definição da decisão do gestor. g) Esta fase pode ser considerada a fase da análise de viabilidade do projeto, já que determinará os resultados de cada alternativa em relação ao desempenho em cada critério incluído na matriz de decisão. 62 6 RESULTADOS A proposta deste trabalho foi identificar, tendo como escopo a Metodologia de Multicritério de Apoio à Decisão (MCDA), elementos fundamentais de análise ou critérios utilizados para avaliar a viabilidade da implantação de um serviço de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina. A operacionalização da metodologia MCDA ocorre por meio de três etapas básicas, diferenciadas, mas correlacionadas: a) a estruturação do contexto decisório; b) a construção de um modelo de avaliação de alternativas/ações; e c) a formulação de recomendações para os cursos de ações mais satisfatórias. O presente estudo, diante das características de sua proposta e a premissa de que o processo de decisão em relação ao tema deste trabalho tem pesquisas, aspectos políticos e conjunturais que exigem a sua contextualização para a sua efetiva definição, abordou apenas a primeira fase do modelo MCDA, deixando-a como referência para outros estudos ou a continuidade da aplicação da metodologia no contexto da gestão do Sistema Único de Saúde. O processo de estruturação do contexto e das variáveis decisórias é de suma importância para se ter um entendimento comum sobre o problema, orientar o processo de criação das ações e, por fim, servir de base para o processo de avaliação das mesmas. É nessa fase que se aplicam as ferramentas que irão apoiar o raciocínio, gerar conhecimento sobre o problema e comunicar sobre a realidade (ENSSLIN; MONTIBELLER NETO; NORONHA, 2001). Como primeira etapa a ser considerada, é útil a definição, junto ao eventual decisor, de um “rótulo para o problema”, no caso o estudo da viabilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina. A função principal do rótulo é delimitar o contexto decisório nesta etapa do processo, não sendo, portanto, definitivo. A segunda etapa, sintetizada na construção dos mapas de relações meiosfins, é centrada na definição dos elementos primários de avaliação (EPA’s). Estes elementos constituem-se de objetivos, metas e valores dos decisores e também de ações, opções e alternativas. Esses elementos, que podem ser registrados a partir de técnicas de brainstorms ou análise de discurso de informantes-chave, devem ser integrados da forma mais consistente possível em uma matriz lógica ou mapa 63 cognitivo (FITZ; SOUZA, 2007). 6.1 Levantamento dos elementos primários de avaliação O processo de identificação de elementos primários de avaliação e a sua organização em um mapa cognitivo talvez sejam os momentos mais demorados e onerosos da metodologia empregada. Os elementos primários de avaliação, peças constituintes do mapa cognitivo construído no contexto desta pesquisa, foram coletados a partir da realização de reuniões (brainstorms) com os agentes do processo decisório, a saber: Dr. Joel de Andrade (coordenador estadual de transplantes de Santa Catarina, mestre em Ciências Médicas pela Universidade Federal de Santa Catarina, especializado em Gestão Hospitalar pela UFSC e Doação e transplante de órgãos Tecidos e células pela Organização Nacional de Transplantes da Espanha), Dr. Flavio Magajewski (coordenador de ensino e pesquisa da central de notificação, captação e distribuição de órgãos de Santa Catarina - CNCDO/SC, mestre em Administração e doutor em Engenharia de Produção, ambos pela Universidade Federal de Santa Catarina e professor da Universidade do Sul de Santa Catarina), Dr. Sadi Marcelo Schio (médico do serviço de transplante pulmonar da Santa Casa de Porto Alegre, coordenador clínico do serviço de transplante pulmonar da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre - RS) e o próprio pesquisador, que atuou como observador participativo, mimetizando aspectos da metodologia de pesquisa. A partir das discussões, o autor da pesquisa, atuando também como facilitador, procurou reunir as ideias apresentadas pelos especialistas participantes, e que foram as incluídas na relação a seguir: a) custo de implantação do serviço; b) custo de manutenção do serviço; c) custo para estruturação/capacitação da equipe multidisciplinar responsável; d) concentração de modalidades de transplantes por serviço; e) custo do transplante (direto - TFD , transporte, SUS e indireto); f) curva de aprendizado da equipe de transplante; g) número mínimo de procedimentos necessários para manter o serviço do ponto de vista financeiro; 64 h) número mínimo de transplantes necessários para manter a equipe com expertise aceitável; i) sobrevida pós-transplante; j) qualidade de vida pós-transplante; k) tempo de espera na fila para transplante; l) custos financeiros associados à remoção do paciente para o centro transplantador; m) custos emocionais dos paciente e dos acompanhantes, associados à distância do serviço de transplante em relação ao local de residência; n) tempo na fila de espera para o transplante; o) índice de mortalidade na fila de espera para o transplante; p) demanda de transplantes da população de Santa Catarina; q) número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de captação de órgãos; r) número de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de referência para transplante de pulmão; s) taxa de aceitação dos órgãos disponibilizados. 6.2 Elaboração do mapa cognitivo A organização lógica dos elementos primários de avaliação definiu um mapa cognitivo que ficou estruturado conforme a Figura 3. 65 Figura 3: Mapa cognitivo realizado para avaliação da viabilidade de um serviço de Transplante Pulmonar Fonte: Elaborada pelo autor (2013). 66 A matriz lógica ou mapa cognitivo é, sinteticamente, um diagrama que deve reunir, de forma esquemática, as representações mentais de um decisor para uma dada situação-problema. A matriz lógica organizada neste trabalho foi se construindo de forma assistemática como uma estrutura orientada de meios para fins em uma concepção de linha de tempo, cujos elementos da base correspondem a causas primárias necessárias ou condicionantes para a ocorrência de elementos colocados em níveis sucessivamente mais altos da matriz. A construção da matriz lógica foi um processo bastante dinâmico. A análise dos elementos primários de avaliação (EPA’S) e a sua distribuição na matriz lógica foram alteradas inúmeras vezes, incorporando um processo de apropriação gradativo do pesquisador com as variáveis relevantes constituintes dessa estrutura lógica, tendo como resultado a definição dos Pontos de Vista Fundamentais (PVF’s). Salienta-se mais uma vez que, em se tratando do uso da metodologia de MCDA, a estrutura do mapa cognitivo reflete o juízo de valores dos atores participantes do processo no momento de sua confecção. 6.3 Determinação dos pontos de vista fundamentais Os pontos de vista (PVs) ou elementos primários de avaliação (EPAs) podem ser considerados como os aspectos que reúnem características e/ou objetivos percebidos como importantes pelo decisor para a construção de um modelo de avaliação de ações existentes ou construídas (SOUZA, 1999). Certos pontos de vista são essenciais para uma possível avaliação das futuras ações. Estes são considerados como Pontos de Vista Fundamentais (PVFs) e constituem-se como eixos ou critérios de avaliação do problema (FITZ; SOUZA, 2007). Seguindo este raciocínio, definiram-se como eixo para a avaliação dos critérios a serem discutidos dentro de um serviço de transplante pulmonar quatro etapas fundamentais, a saber: demanda e oferta, implantação, manutenção e eficiência/eficácia (qualidade), a partir dos quais se selecionaram os pontos de vista fundamentais (PVFs) que serviram de base para a discussão deste estudo. A etapa da demanda e oferta incluiu os elementos que correspondem à percepção social da necessidade de um serviço ou/as informações técnicas que 67 reinterpretam dados epidemiológicos na forma de um indicador de demanda para um procedimento técnico, e também as condições logísticas relacionadas à oferta do órgão a ser transplantado. Os PVFs fundamentais nesta etapa foram: a demanda de transplante e o número de pulmões ofertados pelo sistema de captação. A implantação corresponde aos critérios relacionados na estruturação de um serviço de transplante, e inclui os custos econômicos relacionados à criação deste serviço e custos sociais associados à sua ausência. Entram nesta etapa, como PVFs, o tempo de espera e a mortalidade na fila de espera para realização do transplante e o custo de implantação de um serviço. A manutenção corresponde aos critérios relacionados aos processos associados ao funcionamento de um centro de transplante e basicamente se referem à viabilidade de um serviço sustentável e efetivo. Compreende desde a atualização técnica da equipe até a apropriação dos custos para manter este serviço funcionando. Os elementos fundamentais selecionados do mapa cognitivo foram: a curva de aprendizado da equipe e os custos de manutenção de um serviço de transplantes de pulmão. A eficiência/eficácia (Qualidade) é a etapa que corresponde aos critérios relacionados aos resultados alcançados com este serviço de transplante caso fosse implantado no estado. Compreende a avaliação do serviço em termos de qualidade e satisfação dos usuários. Foram selecionados como PVFs desta etapa: o número de pulmões efetivamente transplantados, a taxa de sobrevida pós-transplante e a qualidade de vida pós-transplante, e o custo financeiro final. A organização dos PVFs nas etapas indicadas anteriormente foi inspirada nas formulações de Donabedian, que consagrou na área da gestão da qualidade de serviços de saúde uma visão baseada na Teoria Geral de Sistemas, na qual a qualidade em saúde pode ser sistematizada pelo controle de elementos agregados classicamente em uma tríade: estrutura, processo e resultado (DONABEDIAN, 1992). A estrutura inclui recursos físicos, humanos, materiais e financeiros necessários para a assistência médica. Inclui também o financiamento e a disponibilidade de mão de obra qualificada. Os processos agregam as atividades envolvendo profissionais de saúde e pacientes, com base em padrões sociais e técnicos aceitos. A análise pode ser sob o ponto de vista técnico e/ou administrativo. 68 Os resultados correspondem ao produto final da assistência prestada, considerando saúde, satisfação de padrões e de expectativas. A avaliação dos PVs incluídos na matriz lógica e a sua agregação nas etapas apresentadas permitiram uma seleção dos PVFs, reduzindo os dezenove PVs para nove PVFs. As etapas e os PVFs, que foram considerados elementos fundamentais para a tomada de decisão, foram representados em uma árvore de pontos de vista, os quais estão apresentados na Figura 4. Figura 4: Árvore de pontos de vista para análise da viabilidade de um centro de Transplante Pulmonar Transplante Pulmonar Demanda Oferta Demanda Manutenção Implantação oferta Curva de aprendizado Tempo e mortalidade custo Eficiência Eficácia custo N pulmões ofertados Sobrevida e qualidade de vida Custo final Fonte: Elaborada pelo autor (2013). Conforme Ensslin, Montibeller Neto e Noronha (2001), muitas vezes se faz necessária a decomposição de um PVF, a fim de que se possa realizar uma melhor avaliação do desempenho de suas ações potenciais. Como exemplo, pode-se citar a necessidade de um maior detalhamento de algum aspecto de um problema para uma melhor fundamentação da discussão. A análise detalhada de cada uma das variáveis incorporadas ao modelo pode subsidiar as decisões acerca da oferta de transplante pulmonar à população de 69 Santa Catarina em uma das duas hipóteses ou alternativas à disposição do gestor: a criação de um serviço local de transplante pulmonar ou a manutenção do referenciamento da população demandante de transplante de pulmão para o serviço existente no Rio Grande do Sul. Ainda que as variáveis individualmente possam apoiar decisões distintas, a análise global e agregada dos elementos considerados fundamentais para representar os valores do decisor deve fornecer uma orientação mais ampla e abrangente para apoiar o processo decisório. É importante enfatizar que este estudo incorporou, em uma dimensão associada ao processo decisório, algumas variáveis associadas aos benefícios que a mesma trará ao paciente, ou seja, qual estratégia teria melhor potencial de garantir acesso a este serviço de saúde especializado com os melhores resultados possíveis, alinhando-se à tendência dos estudos contemporâneos de economia da saúde, comparando alternativas (custo-benefício, custo-efetividade). 6.4 Demanda de transplantes da população de Santa Catarina O dimensionamento da necessidade da população catarinense de transplante pulmonar é um dado fundamental para a análise que se pretende desenvolver com este trabalho. A demanda por um determinado procedimento determina em grande parte a viabilidade de implantação de um novo serviço especializado em nosso estado, além de produzir efeitos em outros aspectos do processo decisório. A viabilidade financeira, a curva de aprendizado, a manutenção da expertise, bem como os resultados expressos pela sobrevida e a qualidade de vida dos pacientes transplantados, são alguns dos aspectos que sofrem impacto direto desta variável. A necessidade de transplante pulmonar, segundo Garcia, é estimada em 3-5 transplantes por milhão de população por ano (p.m.p./ano) (GARCIA, 2000). Considerando que a população de SC é de aproximadamente 6 milhões de habitantes, baseado nesta estimativa e considerando que toda a demanda fosse atendida, ter-se-ia um número absoluto de 18 a 30 procedimentos por ano. No Brasil, nos últimos 10 anos, foram realizados 552 transplantes pulmonares, década que se caracterizou pelos maiores avanços deste procedimento no país. Em 2012, ano com a melhor performance desta atividade no país, 69 procedimentos foram realizados nos 6 centros ativos autorizados. O Rio Grande do 70 Sul, onde foram realizados 33 desses procedimentos, obteve uma taxa de 3,1 transplantes pulmonares p.m.p./ano, conforme mostra a Figura 5. Figura 5: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012 71 Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). Nos anos de 2011 e 2012 a Secretaria de Estado de Saúde de Santa Catarina (SES-SC) registrou 35 pacientes com autorizações de tratamento fora do domicílio (TFD) para transplante de pulmão. Deste grupo, 15 pacientes iniciaram sua primeira avaliação para entrar em fila de espera, enquanto 20 estavam ou em fila de espera, ou em acompanhamento pós-transplante, confirmando uma demanda anual próxima do parâmetro de 3 transplantes de pulmão por milhão de população (p.m.p.). 6.5 Número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de captação de órgãos O sistema estadual de transplantes de Santa Catarina possui o melhor desempenho para captação de órgãos a partir de doadores falecidos em morte encefálica. No ano de 2012 obteve a maior taxa de doação efetiva de órgãos da história dessa atividade no país, com 165 doadores efetivos de órgãos, correspondendo a 26,4 doadores efetivos p.m.p./ano (Figura 6). Ainda assim, no período referido, apenas 10 pulmões foram disponibilizados para transplante. O resultado revela que apenas 6% dos doadores geraram pulmões possivelmente úteis para transplante. Quando se amplia a análise para os três últimos anos, observa-se que o padrão se mantém. Dentre as 433 doações efetivadas entre 2010, 2011 e 2012, apenas 29 pulmões foram gerados, ou seja, 6,7% do total. O que equivale a 1,39 pulmões gerados p.m.p./ano. 72 Figura 6: Número de doadores efetivos por milhão de população no ano de 2012 Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). 6.6 Tempo na fila de espera O tempo na fila de espera para os pacientes transplantados em 2012 no Rio Grande do Sul teve uma variação grande, de 30 dias a 5 anos, porém a grande maioria situou-se entre 3 meses a 2 anos ( 86,7%), conforme Figura 7. 73 Figura 7: Tempo de espera dos pacientes transplantados de pulmão no Estado do Rio Grande do Sul 36,7% 30,0% 20,0% 10,0% 0,0% < 30 dias 0,0% 30 dias < 90 dias 3,3% 0,0% 90 dias 6 meses 1 ano < 2 anos < 3 anos < 5 anos e <6 < 1 ano 2 anos 3 anos 5 anos + meses Fonte: CNCDO RS extraído do Sistema Informatizado de Gerenciamento (SIG) do Sistema Nacional de Transplantes (2013). 6.7 Índice de mortalidade na fila de espera Segundo dados obtidos na CNCDO do Rio Grande do Sul, a mortalidade em lista de transplante pulmonar no serviço da Santa Casa de Misericórdia é de 31,94% até dezembro de 2012. Entre janeiro e abril de 2013 os números reduzem para 20,89%. Ou seja, de cada 10 pacientes listados para transplante, 2 a 3 falecem na fila de espera. 6.8 Custos de implantação do serviço A projeção e a análise dos custos de implantação de um serviço de transplante pulmonar são bastante complexas e exigem um exercício direcionado pelo menos três cenários distintos. No primeiro deles, além da adequação de uma área física, o serviço seria implantado em uma instituição sem serviços de transplante cardíaco ou cirurgia torácica de urgência. Ter-se-iam nessa situação, 74 além da obra física, os custos de preparo da equipe e da criação de uma estrutura de funcionamento com cobertura 24h por dia, 365 dias por ano. Num segundo cenário, ter-se-ia uma área física adequada na qual já funcionaria um centro de transplantes de outros órgãos, com estrutura de centro cirúrgico e unidade de terapia intensiva, porém se teria o custo de preparo manutenção de uma equipe profissional para o transplante pulmonar. E, num último cenário, haveria aquele que já disporia de estrutura física adequada e de equipe profissional especializada e treinada. É fundamental entender que a natureza da instituição hospitalar tem influência direta nos custos. O custo de implantação de um serviço de saúde, em relação à estruturação física, está relacionado com os custos de construção, ampliação e adequação de áreas físicas, que incluem obras civis, instalações e equipamentos. Os custos das obras civis podem variar significativamente, conforme as necessidades e os materiais utilizados, especialmente os revestimentos e o acabamento da obra, que nas construções de serviços de saúde costumam exigir os de custo mais elevado, como azulejos e materiais impermeáveis. Moura (2008), utilizando dados da SUCAB, encontrou diferenças de mais de 465% entre o custo do revestimento de um metro quadrado com tinta PVA em relação ao revestimento da mesma área com azulejos, e de quase 3.000% se o revestimento for feito com mosaico vidroso. Segundo Mascaró (1995), o custo de construção das edificações recai nos aspectos de quantidade da área construída e qualidade da especificação dos materiais, especialmente aqueles referentes ao item acabamento. Em relação à dimensão da área a ser construída ou adequada para a implantação de um novo serviço de transplante de pulmão, ela é um fator dependente da escolha que será feita em relação à instituição que abrigará o serviço, e será tanto menor quanto maior a infraestrutura já existente para este tipo de procedimento. Nesse sentido, o item “concentração de modalidades de transplante” pode oferecer mais detalhes sobre a melhor estratégia para redução de custos de implantação de um novo serviço de transplante. Considerando que as necessidades das obras civis podem ser modulares, que o custo unitário básico (CUB) da construção civil para fins comerciais definido pelo SINDUSCON para maio de 2013 foi de R$ 1.323,72 e que o custo de uma obra destinada a serviços de saúde empiricamente pode custar até três vezes mais do que o de uma obra 75 residencial ou comercial (estabelecendo o CUB Saúde em R$ 3.971,16), pode-se estabelecer que o custo de cada 100 metros quadrados necessários para a implantação do serviço de transplante pulmonar terá custo estimado de R$ 397.116,00. 6.9 Custo para estruturação/capacitação da equipe multidisciplinar A composição do painel de custos relacionados à implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina deve iniciar elencando os recursos humanos mínimos exigidos pela Portaria GM/MS nº 2600 de 21 de outubro de 2009 necessários à implantação de um serviço. O Erro! Fonte de referência não encontrada. resume esses recursos e suas competências. No entanto, é fundamental ressaltar que as necessidades vão muito além do mínimo exigido e, sendo o transplante uma atividade com extrema interdisciplinaridade, a contribuição de profissionais de enfermagem, fisioterapia, psicologia, assistência social, nutrição e farmácia é fundamental para o sucesso do projeto. Quadro 1: Profissionais e experiência mínima exigida para autorização de equipe de transplante Quantidade Especialidade 01 Médico pneumologista 01 Cirurgião torácico 01 Cirurgião cardiovascular 02 Anestesistas 01 Intensivista Fonte: Brasil (2009). Qualificação Residência ou título de especialista com treinamento formal, com duração mínima de três meses, em serviço especializado em transplante de pulmão hospital de ensino ou de excelência. Residência ou título de especialista com treinamento formal, com duração mínima de doze meses, em cirurgia brônquica e traqueal, realizado em serviço especializado de transplante de pulmão em hospital de ensino ou excelência. Residência ou título de especialista. Residência ou título de especialista com treinamento formal, com duração mínima de três meses, em serviço especializado em transplante de pulmão. Residência ou título de especialista com treinamento de três meses em suporte inicial pósoperatório em transplante pulmonar em hospital de ensino ou de excelência. 76 Seguindo esta lógica, o primeiro custo a ser calculado é o treinamento dos profissionais envolvidos no projeto. Atualmente o Brasil possui bons centros de referência vinculados ao Sistema Único de Saúde que podem receber esses profissionais para treinamento e existe incentivo do Ministério da Saúde com essa finalidade. Utilizando como referência os valores de diárias da Secretaria de Estado de Saúde (SES-SC) para São Paulo (R$ 191,25) ou Porto Alegre (R$ 153,00), e as respectivas passagens aéreas para os destinos citados, ter-se-ia um investimento em treinamento, considerando uma equipe de 6 profissionais médicos e 2 profissionais de enfermagem pelos distintos períodos recomendados, da ordem de R$ 377.267,50 (* os cálculos das diárias obedecem à lógica dos valores médios repassados pela SES SC para viagens às cidades que são centros de referência em transplantes; ** os cálculos dos salários representam os valores médios brutos com profissionais de saúde de nível superior nas suas diversas especialidades nível 14F do plano de cargos e salários da SES/SC. ). Quadro 2: Sumário dos custos de treinamento de uma equipe de transplante pulmonar Equipe 01 Pneumologista Período de duração (dias) 120 Custo com diárias* (R$) 20.655,00 Custo com salários** (R$) 22.030,29 Custos com passagens aéreas (R$) 300,00 Total (R$) 42.985,29 02 Anestesistas 120 41.310,00 44.060,58 600,00 85.970,58 01 Cirurgião torácico 01 Cirurgião cardiovascular 01 Intensivista 360 61.965,00 88.121,16 300,00 150.386,16 120 20.655,00 22.030,29 300,00 42.985,29 120 20.655,00 22.030,29 300,00 42.985,29 02 Enfermeiros 30 10.327,50 6.436,36 600,00 17.363,86 382.676,47 * os cálculos das diárias obedecem à lógica dos valores médios repassados pela SES SC para viagens às cidades que são centros de referência em transplantes; ** os cálculos dos salários representam os valores médios brutos com profissionais de saúde de nível superior nas suas diversas especialidades nível 14F do plano de cargos e salários da SES/SC. Fonte: SES-SC (2013). O custo para estruturação e qualificação profissional da equipe multiprofissional responsável pelo serviço em estudo é ainda uma decisão mais difícil, tendo em conta as muitas possibilidades de formação prévia dos participantes da equipe, e que serão aproveitadas, sem custo, conforme os critérios incluídos no processo seletivo para a formação do grupo de profissionais. 77 Além disso, considerando a possibilidade de utilização de profissionais já contratados e em atuação em outras equipes de trabalho associados a transplante de órgãos na mesma instituição (ver concentração de modalidades de transplante em um mesmo serviço), é impossível definir antecipadamente o custo inicial para a formação e a qualificação da equipe. 6.10 Concentração de modalidades de transplantes por serviço Os custos de implantação de um serviço de transplante pulmonar e sua sustentabilidade técnica e econômica, como já colocado, são diretamente associados à densidade tecnológica já instalada na instituição que irá abrigar o serviço. Por conta disso, a lógica gerencial procura agregar o máximo de modalidades de transplantes em hospitais que já possuem atividades afins. Há especial interesse na coexistência de programas de transplante pulmonar e cardíaco, ou, ainda, outros transplantes de órgãos sólidos, em virtude da otimização das estruturas, dos recursos e dos insumos necessários aos diversos programas. A existência de serviço ativo de cirurgia torácico bem estruturado e funcionante tem especial relevância na facilidade de implantação, na redução dos custos e na obtenção de resultados mais adequados. A Figura 8 mostra os centros em que funcionam os diversos transplantes de órgãos em nosso Estado. Figura 8: Capacidade instalada para transplantes no Estado de Santa Catarina 78 Fonte: SC Transplante (2012). Por meio da Figura 8, pode-se verificar que as cidades de Joinvile, Blumenau e Florianópolis são as que mais concentram centros com vários tipos de transplantes e que Blumenau, além de concentrar cinco tipos de transplante, possuiu equipe de transplante cardíaco, o que, como mencionado, poderia otimizar a implantação do serviço de transplante pulmonar. Importante assinalar que a concentração dos centros de transplante, como mostra a Figura 8, foi projetada no ano de 2010. Atualmente não se possue o centro de transplante de córnea em Canoinhas, e o centro de transplante cardíaco de São José foi desativado, ficando, então, apenas as cidades de Blumenau com um centro de transplante cardíaco no Estado. 6.11 Curva de aprendizado da equipe de transplante Um dos critérios para análise da curva de aprendizado é o número mínimo de transplantes necessários para manter a equipe com expertise aceitável. Conforme registro da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), a Região Sul, representada pelo serviço de transplante da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, realizou, desde 1989, 423 transplantes pulmonares 79 nos 23 anos de atividade do serviço. Nos primeiros quatro anos, realizou 33 transplantes, a partir de então, manteve sua média em torno de 25 procedimentos/ano, sendo o ano de 2009 e 2012 os mais produtivos (40 e 30 procedimentos, respectivamente). Uma divisão por períodos de 5 anos revela a evolução da equipe em termos de procedimento, como pode ser verificado no *Projeção baseada nos resultados do triênio. . Quadro 3: Número de transplantes pulmonares realizados no Brasil Quinquênio Período Nº de Procedimentos/mês Nº de Procedimentos/5 ano 1 1989 - 1994 0,63 38 2 1995 - 1999 0,8 48 3 2000 - 2004 1,85 111 4 2005 - 2009 2,43 144 5 2010 - 2014* 2,27 *Projeção baseada nos resultados do triênio. Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). 136* O ideal, para se conseguir determinar em que momento se atingiu uma experiência razoável, seria comparar o número de procedimentos realizados com a taxa de mortalidade pós-cirurgia, porém não estando estes dados disponíveis, é relevante conhecer a frequência com que estes procedimentos são realizados no serviço de transplante pulmonar que constitui nossa referência. Destaca-se que os dados dos dez últimos anos revelam um total de 272 transplantes realizados, ou seja, 27,2 procedimentos ao ano, ou ainda 2,26 cirurgias a cada mês. As Figura 9, Erro! Fonte de referência não encontrada. e Figura 11 mostram os números de transplantes realizados no Brasil nos últimos três anos distribuídos por região e a evolução dos pacientes. Figura 9: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2010 PULMÃO – TOTAL DE TRANSPLANTES: 60 2010 Nome Centro Responsáveis MINAS GERAIS (total de transplantes: 2) Hospital Clínicas UFMG Silvio Paulo Pereira Cidade Belo Vivo Fal. Total % Tx, Evol.* Total Real.** Pac em Acomp.*** 0 2 2 0% 16 4 80 Horizonte RIO GRANDE DO SUL (Total de transplantes: 28) Santa Casa de Misericórdia José de Jesus de Porto Alegre Peixoto Camargo SÃO PAULO (total de transplantes: 30) Hospital Israelita Albert Fabio Biscegli Einstein Jatene INCOR – Instituto do Fabio Biscegli Coração Jatene Porto Alegre 1 27 28 100% 368 São Paulo 0 2 2 100% 3 3 São Paulo 0 28 28 100% 146 75 60 transplantes realizados por 4 equipes, 3 equipes evoluíram 100% dos transplantes (58 transplantes) Sobrevida do paciente 79% Sobrevida do exerto 79% As taxas de sobrevida de pacientes no período contemplan apenas as equipes que informaram 100% dos seus transplantes. Brasil Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). Figura 10: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2011 PULMÃO – TOTAL DE TRANSPLANTES: 35 2011 Nome Centro Responsáveis CEARÁ (total de transplantes: 2) Hospital de Messejana Antero Gomes Neto MINAS GERAIS (Total de transplantes: 1) Hospital Clínicas UFMG Silvio Paulo Pereira RIO GRANDE DO SUL (total de transplantes: 20) Hospital Clínicas Porto Amarilio Vieira de Alegre Macedo Neto Santa Casa de José de Jesus Misericórdia de Porto Peixoto Camargo Alegre SÃO PAULO (Total de transplantes: 12) Hospital Israelita Albert Fabio Biscegli Einstein Jatene INCOR – Instituto do Fabio Biscegli Coração Jatene Dados de 01/01/2010 até 30/09/2011 RBT % Total Evol. Evol.* Geral** Doador Vivo Fal. Total Fortaleza 0 2 2 2 100% 2 2 Belo Horizonte 0 1 1 4 75% 17 5 Porto Alegre Porto Alegre 0 1 1 1 0% 2 1 0 19 19 47 100% 387 São Paulo 0 2 2 4 100% 5 5 São Paulo 0 10 10 38 100% 156 84 Cidade Pac em Acomp.*** Brasil (01/10/2010 até 96 transplantes realizados por 6 equipes, 4 equipes evoluíram 100% dos transplantes (91 transplantes) 30/09/2011) Sobrevida do paciente 72% Sobrevida do exerto 72% As taxas de sobrevida de pacientes no período contemplan apenas as equipes que informaram 100% dos seus transplantes. * percentual de transplantes realizados no período de 01/01/2010 até 30/09/2011. ** total de transplantes realizados pelo centro, informação obtida por meio dos dados preenchidos pela equipe no sistema. *** pacientes em acompanhamento pós-transplante no centro, informação enviada pela equipe. Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). 81 Figura 11: Transplantes pulmonares realizados no ano de 2012 PULMÃO (69 TRANSPLANTES) Histórico Realizado Cidade Nome do Centro Nº. Realizado Pacientes Acomp. RBT Evolução Realizado 2012 Responsável Ceará (4) Hospital de Messejana Minas Gerais (1) Belo Hospital Clínicas Horizonte UFMG Rio Grande do Sul (33) Hospital Clínicas Porto Alegre Porto Alegre Santa Casa de Porto Alegre Misericórdia São Paulo (31) Hospital Israelita São Paulo Albert Einstein INCOR – Instituto do São Paulo Coração Fortaleza Vivo Falec. Total 0 4 4 0 1 1 0 3 3 1 29 30 CE 8 6 17 5 6 3 423 Antero Gomes Neto MG Nilson Figueiredo Amaral RS Amarilio Vieira de Macedo Neto José de Jesus Peixoto Camargo SP 11 10 Fabio Biscegli Jatene 0 4 4 185 93 Fabio Biscegli Jatene 0 27 27 Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). 6.12 Custo de manutenção do serviço O tratamento dos candidatos catarinenses a transplante pulmonar nas etapas de preparo e posterior acompanhamento, uma vez realizado o procedimento, é ofertado na estrutura do sistema único de saúde pelo programa de Tratamento Fora do Domicílio (TFD). O TFD interestadual tem por objetivo garantir aos pacientes acesso a serviços de saúde não disponíveis na unidade da federação de domicílio do usuário e possui financiamento federal. O TFD ainda é uma necessidade e é estratégico na regionalização dos serviços de mais alta complexidade, como transplante de medula óssea alogênico, transplante de pulmão, pâncreas isolado e, atualmente, coração. Os transplantes pediátricos não são feitos no Estado de Santa Catarina, assim como os transplantes de medula óssea alogênicos, pâncreas isolado e pulmão em adultos. Em Santa Catarina, desde 2006, todos os pacientes com processos de TFD para transplantes sofrem análise de médicos reguladores da CNCDO/SC. Durante o ano de 2011, realizou-se um registro sistemático de todos os processos, inclusive com detalhamento dos custos envolvidos. Passagens rodoviárias e aéreas, deslocamentos de ambulâncias, diárias de motoristas, pacientes e acompanhantes foram registradas para efeito de análise. Foram avaliados 507 processos de pacientes, autorizados 494 (97%) e negados 13 (3%) processos. Desse total apenas 16% eram processos novos, ou seja, de pacientes que tiveram seu diagnóstico e 82 tratamento em 2011 e 84% são pacientes de anos anteriores, com várias viagens para realizar o transplante e fazer o acompanhamento ad eternum. Quanto ao tipo de transplante realizado fora do Estado de Santa Catarina, o Transplante de Medula Óssea (TMO) Alogênico foi o mais frequente, com 37,7%, seguido pelo de rim, com 33, 9%; fígado, com 15,6%; e pulmão, com 3,9%. Também foram realizados transplantes de coração, pâncreas, rim-pâncreas, rim-fígado e córnea, conforme ilustrado na TOTAL 191 172 79 20 10 1 15 RIMTMO RIM FÍGADO PULMÃO CORAÇÃO PÂNCREAS PÂNCREAS 507 % 37,7 33,9 15,6 3,9 2,0 0,2 3,0 2 13 RIMFÍGADO CÓRNEA 0,4 2,6 . Figura 12: Transplantes realizados fora do Estado de Santa Catarina pagos por TFD em 2011 40 37,7 33,9 35 30 25 20 15,6 15 10 3,9 5 3 2 0,2 0,4 2,6 0,6 0,4 0 TOTAL 507 % 191 172 79 20 10 1 TMO RIM FÍGADO PULMÃO CORAÇÃO PÂNCREAS 37,7 33,9 15,6 3,9 2,0 0,2 15 2 13 RIMPÂNCREAS RIMFÍGADO CÓRNEA 3,0 0,4 2,6 Fonte: CNCDO/SC (2013). Os custos totais com o TFD no ano de 2011 foram de R$ 648.988,65 para todos os pacientes incluídos no programa. Em termos percentuais, pode-se afirmar 83 que 3,9% dos pacientes de transplante pulmonar representam um custo de R$ 25.959,54, ou seja, R$ 741,70 por paciente ao ano. Uma análise preliminar dos custos com TFD em Santa Catarina, ainda que não seja o foco do estudo, fornece uma boa informação acerca da relevância do transplante pulmonar, comparado ao transplante alogênico de medula óssea tanto em termos de prevalência quanto de custo. É fundamental entender que a natureza da instituição hospitalar tem influência direta nos custos. Uma vez mais, tomando por base o modelo de custos de um hospital público estadual de Santa Catarina e a necessidade de recursos humanos disponíveis para o funcionamento de um serviço de transplantes, contínuo e de tempo integral, passa-se a ter um componente de custo fixo da manutenção da equipe de saúde para cobertura das atividades. Ainda se se considerar que, por não se tratarem de procedimentos eletivos, um mínimo de 3 profissionais médicos e 2 profissionais de enfermagem devem trabalhar em regime que permita uma resposta adequada e contínua. Cabe ressaltar que nos transplantes de pulmão e coração, distintamente de outros órgãos, a retirada do enxerto é atribuição exclusiva da equipe transplantadora, tornando a questão da disponibilidade algo ainda mais relevante. Na mesma linha de um exercício de simulação de custos e tendo por bases os valores brutos correspondentes ao vencimento dos profissionais de saúde da SES (posição 14F para nível superior e 11F para nível médio), ter-se-ia um custo fixo anual de R$ 313.564,81, conforme se demonstra no Erro! Fonte de referência não encontrada.. Quadro 4: Vencimentos dos profissionais da saúde Profissional Médico Enfermeiro Técnico de atividades administrativas Vencimentos mês (R$) 7.343,43 3.218,18 Plantão/sobreaviso mês (R$) 5.021,04 5.021,04 3.516,68 14.078,29 10.042,08 Valor mensal (R$) 12.364,47 8.239,22 Valor anual (R$) 160.738,11 107.109,86 3.516,68 45.716,84 24.120,37 313.564,81 Fonte: SES-SC (2013). O custo varíável de cada procedimento foi calculado para estimativa dos custos de centro cirúrgico e hotelaria, com base nos dados dos centros de custos do Instituto de Cardiologia de Santa Catarina. Os demais itens da composiçao de custo 84 tem por base um detalhado estudo de 3 procedimentos realizados em 2003 no Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (GONÇALVES; DOEHLER, 2004), conforme se pode verificar no Erro! Fonte de referência não encontrada.. A despeito da defasagem que possam apresentar alguns valores do referido estudo, destaca-se que a hotelaria e a sala cirúrgica representam 65% dos custos do procedimento. Destaca-se que os valores de honorários profissionais não estão incluídos por se tratarem, nesta simulaçao, de custos fixos, já que se trabalha com a hipótese de profissionais contratados do serviço público. Quadro 5: Resumo do Custo Variável do Transplante em Instituição Pública de Santa Catarina Composição do Custo Hotelaria/Total das diárias Taxa de sala/cirurgia SADT Materiais Medicamentos Materiais cirúrgicos Líquidos de perfusão Custo total Fonte: SES-SC (2013). Valor Unitário/Quantidade Custo 578,43 – 40 dias R$ 30.71/min - 300 min R$ 23.137,20 R$ 9.213,00 R$ 3.985,06 R$ 771,90 R$ 6.897,60 R$ 1.835,87 R$ 9.968,16 R$ 55.808,79 Somando-se, então, mesmo que não de forma exata, os custos anuais para manter uma equipe de transplante pulmonar em atividade e os custos hospitalares do procedimento – presumindo-se que seja realizada uma média ideal máxima de 27 procedimentos/ano – ter-se-ia um valor de R$ 1.830.402,14 (R$ 313.564,81+ R$ 1.506.837,33) para manutenção de um serviço de transplante pulmonar em funcionamento 24h por dia, 365 dias por ano. A receita gerada pelo transplante pulmonar pode ser calculada a partir da remuneração estabelecida pelo SUS para este procedimento: código 05.05.02.008-4 do Sistema Informatizado de Custos (SIGTAP) que é de R$ 44.485,10, sendo componente de serviço hospitalar R$ 40.036,60 e o serviço profissional R$ 4.448,50 (SIGTAP, 2013). Os valores mencionados podem sofrer variação em decorrência da aplicação da Portaria GM 845 de 02 de maio de 2012, que institui o incremento financeiro para a realização de procedimentos de transplantes e o processo de doação de órgãos (BRASIL, 2012). Este programa de custeio diferenciado incrementa os valores dos procedimentos relacionados ao processo de doação e 85 transplantes de órgãos e tecidos, constantes na Tabela Unificada do Sistema Único de Saúde nos seguintes percentuais ( e Erro! Fonte de referência não encontrada.). Quadro 6: Classificação dos estabelecimentos de saúde e percentuais de incremento na remuneração Tipo I II III IV Nível A B C D IFTDO 60% 50% 40% 30% Fonte: Brasil (2012). Quadro 7: Caracterização dos distintos níveis estabelecimentos de saúde NÍVEL Caracterização Estabelecimentos de saúde autorizados para 4 ou mais tipos de transplantes de órgãos sólidos ou autorizados para pelo menos 1 tipo de Nível A transplante de órgão sólido e para transplante de medula óssea alogênico não aparentado. Estabelecimentos de saúde autorizados para 3 tipos de transplantes de Nível B órgãos sólidos. Estabelecimentos de saúde autorizados para 2 ou mais tipos de transplantes de órgãos sólidos ou para pelo menos 1 tipo de transplante Nível C de órgão sólido e para transplante de medula óssea alogênico aparentado. Estabelecimentos de saúde autorizados para 1 tipo de transplante de Nível D órgão sólido. Fonte: Brasil (2012). A portaria estabelece ainda em seu artigo terceiro que os estabelecimentos devem apresentar à Coordenação Geral do Sistema Nacional de Transplantes, por meio das centrais estaduais de transplantes, relatórios com os seguintes indicadores de qualidade: número de transplantes, por órgão, no ano anterior ao do relatório; número de transplantes por milhão de população, por órgão, no ano anterior ao do relatório; curva de sobrevida dos pacientes, por tipo de transplante, no ano anterior ao do relatório; e curva de enxertos funcionantes, por tipo de transplante, dos dois últimos anos anteriores ao relatório. A aplicação da referida portaria gera possibilidade de incremento de 30% a 60% nos valores repassados pelo SUS aos estabelecimentos de saúde, permitindo que ocorra uma variação de R$ 57.830,63 até R$ 71.176,16. Ressalta-se ainda que 86 uma instituição que inicie seu programa de transplantes pela atividade de transplante pulmonar deveria trabalhar um ano sem qualquer incremento, por não possuir possibilidade de enquadrar-se na referida portaria. 6.13 Número de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de referência para transplante de pulmão e taxa de aceitação dos órgãos disponibilizados Pelas regras do Sistema Nacional de Transplantes, todo o excedente de órgãos gerados em uma unidade da federação é encaminhado aos outros estados mediante regulação da Central Nacional de Transplantes, respeitando um critério regional de prioridade, ou seja, todo o excedente gerado em Santa Catarina deve atender prioritariamente à Região Sul. Por razões logísticas, em especial um tempo de isquemia fria de no máximo 4 horas, pulmões gerados em nosso estado são oferecidos ao Rio Grande do Sul, onde também se encontram nossos pacientes em lista de espera. No último triênio (2010, 2011 e 2012), foram aceitos e removidos 13 dos 29 doadores disponibilizados, resultando em uma taxa de aceitação de 44,82% das ofertas. 6.14 Sobrevida pós-transplante A sobrevida pós-transplante é um indicador que está relacionado diretamente com a captação do doador e com a seleção do receptor. No Brasil, os registros informam que a taxa de sobrevida, contada a partir de 2010, foi de 53% em 1.200 dias pós-transplante, conforme se pode verificar na 87 Figura 13. Figura 13: Sobrevida pós-transplante pulmonar 88 Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2012). 89 7 DISCUSSÃO A proposta deste estudo foi avaliar a viabilidade de um centro de transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina e, para isso, utilizou-se a metodologia de Multicritério de Avaliação (MCDA). O MCDA é uma ferramenta que auxilia o gestor a administrar seus problemas de acordo com suas percepções de valor, levando em consideração aspectos qualitativos e quantitativos. “Um problema pertence a uma pessoa (ou instituição), isto é, ele é uma construção pessoal que o indivíduo faz sobre os eventos associados ao contexto decisório”. (ENSSLIN; MONTIBELLER NETO; NORONHA, 2001, p. 75). A metodologia MCDA construtivista permite uma evolução específica do conhecimento no processo de apoio à decisão, ou, ainda, considera um desenvolvimento progressivo do entendimento do processo decisório dentro de algumas particularidades. Tratar-se-á nesta etapa de discutir a estruturação do problema, considerada como sendo a fase mais importante relacionada à atividade de estudo de problemas complexos nas organizações. A metodologia Multicritétio de Apoio à Decisão Construtivista (MCDA-C) adotada neste trabalho segue a corrente de pensamento da escola europeia (Multicriteria Decision Aid), segundo a vertente construtivista. Adotar a perspectiva da MCDA-C significa acatar os seguintes entendimentos: a) um problema é configurado como tal se for assim percebido por alguém (tem um dono); resultante de uma situação percebida como necessitando de intervenção; suficientemente relevante; passível de solução. Santa Catarina não realiza transplantes pulmonares, apesar de ser um estado de relevante importância no cenário brasileiro dos transplantes de órgãos e tecidos. Isso ocorre em função da pouca demanda, da dificuldade técnica de implantar este serviço na região ou pela inviabilidade financeira? Que ganhos seriam proporcionados aos catarinenses que necessitam transplante pulmonar? Teriam melhor acesso e melhores resultados? b) o entendimento do problema pressupõe a noção de produção de conhecimento por meio da descoberta de como o sujeito valora o contexto no qual o objeto se encontra; assim, levam-se em conta os sistemas de valores, as convicções e os 90 objetivos dos envolvidos, o momento atual e o grau de entendimento do decisor sobre todo o contexto. c) o reconhecimento do fato de que “não existe apenas um conjunto de ferramentas adequado para esclarecer uma decisão nem existe uma única melhor maneira de fazer uso delas”. Dentro do estudo da viabilidade de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina, procedeu-se à seleção de alguns critérios que se entende serem relevantes e que foram agrupados de forma acadêmica em: demanda/oferta, implantação, manutenção e eficiência, cada um contendo seus Pontos de Vista Fundamentais, com intuito de facilitar a compreensão da nossa visão do problema e que serão discorridos a seguir. 7.1 Demanda e Oferta A escassez de órgãos para transplante constitui um fator limitante fundamental para esta terapêutica. A demanda cresce de maneira exponencial à medida que melhoram os resultados de sobrevida, porém a taxa de doação não acompanha o mesmo ritmo. É fundamental reconhecer a limitação que a questão da doação impõe à realização dos transplantes. Mesmos nas regiões com melhores taxas mundiais de doação, existe uma consistente insuficiência de oferta de órgãos torácicos para transplante, sendo as dificuldades para obter pulmões ainda maiores que para a obtenção do coração. Na 91 Figura 14, pode-se observar a disparidade entre demanda estimada e oferta de transplantes para os diversos programas existentes no Brasil. Observa-se que o pulmão possui o pior desempenho nessa análise. Figura 14: Relação entre a necessidade estimada de transplante e o número de procedimentos realizados em 2012 Necessidade estimada (■) e nº de 20.000 transplantes realizados (■) no Brasil em 2012 15.000 10.000 Necessidade Transplantes realizados 5.000 0 Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). O Brasil realizou 522 transplantes pulmonares em 23 anos desta atividade no país, sendo 69 no ano de 2012. Comparando com a Espanha, nossa taxa ainda é baixa. Conforme dados da Organização Nacional de Transplantes (ONT) da Espanha, foram realizados, de 1990 a 2007, 1.827 transplantes pulmonares e esses números vêm crescendo anualmente (DEL RIO et al., 2009). A Espanha é um país de referência em doação e transplante de órgão no mundo todo, e isso particularmente ocorreu pela adoção de estratégias na melhora da doação de órgãos (MATESANZ, 2008). O Brasil possui o maior sistema público de transplante do mundo, o Sistema Nacional de Transplante, sustentado pelo SUS, e que 92 aperfeiçoou e regulamentou os transplantes de órgãos e tecidos em todo o país e estabeleceu unidades de coordenação em todos os estados da federação, porém ainda apresenta um cenário de acesso aos transplantes bastante desigual entre a população residente nos diversos estados, com vantagens para os estados mais desenvolvidos do Sul e do Sudeste. Na Figura 15, pode-se analisar a taxa de doação efetiva p.m.p e os órgãos transplantados em cada região do país. Destaca-se a disparidade entre as cinco regiões geográficas. O maior número de transplantes está concentrado nas regiões Sul e Sudeste, que detêm mais da metade da população brasileira. Figura 15: Taxa de doação efetiva por milhão de população e transplantes realizados nas regiões brasileiras no ano de 2012 93 Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). A necessidade de transplante pulmonar, segundo Garcia (2000), é estimada em 3 - 5 transplantes por milhão de população por ano (p.m.p./ano). O Rio Grande do Sul, para onde são encaminhados os pacientes catarinenses, obteve uma taxa de 3,1 transplantes pulmonares p.m.p./ano no ano de 2012, portanto dentro de média aceitável para este tipo de transplante. Como a distribuição dos órgãos doados ocorre prioritariamente na unidade da federação onde órgão é gerado, nossa base populacional para geração de doadores é de 6,2 milhões de habitantes. Aqui é fundamental ressaltar que a maior limitação à implantação de um serviço de transplantes é a escassez de órgãos. Na hipótese de implantar um serviço em Santa Catarina, perder-se-iam na base de procura por 94 doadores os 10 milhões da população gaúcha, tendo em vista a distribuição prioritariamente regional dos órgãos. Considerando a média calculada de 3-5 transplante por milhão de população por ano, haveria, para a população de Santa Catarina, uma média ideal de 18-30 procedimentos/ano, porém se se contar ainda que a mortalidade mínima em fila de espera gira em torno de 10%, este número cairia para 16-27 procedimentos/ano. Pelos dados do Rio Grande do Sul, existem 10 pacientes catarinenses em controle pós-transplante e mais 10 em fila de espera, mostrando que nosso número ainda se mantém baixo para os padrões de necessidade. Conforme Matesanz (2012), na Espanha, em comunidades pequenas que não dispõem de todos os programas de transplante, sobretudo o pulmonar, é necessário que se estabeleça o fluxo de receptores a um centro de referência, que deve zelar pela igualdade de acesso ao transplante para todos os cidadãos. Essas referências são estabelecidas com pactos entre as comunidades autônomas, e a oferta dos órgãos das regiões de origem dos pacientes segue a mesma lógica do encaminhamento dos pacientes. Esta organização otimiza o funcionamento de centros de transplante mesmo em comunidades uniprovinciais sem grandes populações. Na Espanha, país com 47 milhões de habitantes, existem 6 centros de transplante pulmonar que, juntos, realizaram 235 transplantes (5.0 p.m.p./ano) em 2010, ano em que a atividade brasileira foi de 60 procedimentos ao ano (0.4 p.m.p./ano) (MATESANZ, 2012; ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012). Muito importante assinalar que o número de pacientes candidatos a transplante pulmonar não deve, necessariamente, se ampliar com a abertura de um novo centro transplantador em Santa Catarina. Admite-se que o gargalo desse serviço de alta complexidade não seja somente a oferta em si do procedimento, mas, talvez, da rede especializada no atendimento, no reconhecimento ou, ainda, encaminhamento dos pacientes candidatos ao transplante pulmonar. É fundamental destacar que esse número de transplante necessário, ou seja, a demanda tem impacto direto na viabilidade econômica e técnica da implantação de um serviço em nosso Estado. Por outro lado, segundo a Lei de Roemer (1961, p. 38) “um serviço de saúde tem a capacidade de gerar a sua própria demanda, mesmo em mercados saturados”. Isto significa que o âmbito das relações de mercado na área da saúde está sujeito a um mecanismo invertido que determina a oferta de algum serviço de 95 saúde, uma capacidade extraordinária de induzir a criação da demanda para o seu consumo. Nesse sentido, prevê-se uma tendência de utilização plena da capacidade instalada de serviços de saúde em geral e do serviço de transplante de pulmão em particular (ROEMER, 1961). Além disso, estudos de avaliação da evolução das demandas futuras, associadas à carga de doença no mundo, indicam que as doenças obstrutivas pulmonares crônicas, que ocupavam a décima primeira posição em 1990, passarão à quinta posição entre as doenças responsáveis pela maior parte dos anos perdidos por incapacidade no mundo em 2020, sugerindo que a tendência da demanda por transplante de pulmão aumentará nos próximos anos (MURRAY; LOPEZ, 1996). Com tais indicações, é possível imaginar que a demanda atual por transplante de pulmão, que se encontra em torno de três transplantes pmp/ano, poderá aumentar, dentro do parâmetro indicado por Garcia (2000), para até cinco transplantes por milhão de população/ano. Nesse caso, a demanda por transplante em Santa Catarina pode ser estimada, para fins de avaliação de viabilidade de um novo serviço de transplante de pulmão, como sendo de até 32 transplantes/ano. Os dados de 2011 apontam que 50% da demanda máxima estimada, 15 dos 35 potencias pacientes, tiveram sua avaliação inicial. Levando em conta que todos os processos de TFD novos para transplante pulmonar foram autorizados, impõe-se uma análise mais detalhada das razões pelas quais os pacientes não são encaminhados para o procedimento. A falta de acesso a consultas especializadas em pneumologia e o escasso conhecimento acerca dos reais benefícios do transplante pulmonar pelos especialistas podem fazer parte do universo deste problema. Embora exista divulgação para as gerências regionais de saúde acerca do acesso aos serviços de transplantes que não se dispõem em Santa Catarina, é fundamental admitir este aspecto como outro possível ponto crítico. A análise dessa variável sugere que, para além da implantação de um novo centro de transplante pulmonar, é fundamental refletir sobre possíveis falhas assistenciais em todas as etapas do processo de atendimento do paciente com indicação do procedimento. Em relação ao número de pulmões disponibilizados, viu-se que, apesar do nosso estado ocupar o primeiro lugar do país na taxa de doador efetivo pmp/ano (26,4), apenas 6% dos doadores geraram pulmões possivelmente úteis para transplante. Em um estudo realizado na Espanha, um dos maiores centros de 96 transplantes do mundo, a taxa de aproveitamento dos pulmões em doadores de múltiplos órgãos entre os anos de 1997 e 2004 foi em torno de 11% (DEL RIO et al., 2009). Isso ocorre porque em torno de 70 a 80% dos doadores de múltiplos órgãos apresentam algum tipo de lesão pulmonar (edema, contusão ou aspiração), o que inviabiliza a utilização dos pulmões. Além disso, os órgãos não podem ser estocados por muito tempo, no caso do pulmão, em torno de 4 a 6 horas. Assim, no Brasil, de cada oito potenciais doadores, apenas um é notificado e somente 20% desses são utilizados como doadores de múltiplos órgãos (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2011). Conforme a experiência brasileira, sabe-se que não mais do que 15% dos doadores de rins se mostram aptos ao aproveitamento simultâneo de um dos pulmões e apenas cerca de 30% deles têm ambos os pulmões normais. Por outro lado, é dramática a constatação da má qualidade média das UTIs de trauma, principal fonte potencial de doadores, nas quais com grande frequência se observa a perda da condição pulmonar em período de poucas horas por descasos técnicos, como hiperhidratação, aspiração de vômitos, manejo contaminado de vias aéreas, etc. (CAMARGO; CAMARGO, 2006). É importante que haja padronização nas medidas a serem adotadas no potencial doador e que ele seja visto sempre como um doador de múltiplos órgãos. Pode-se concluir, então, que o aproveitamento do pulmão para o transplante depende das peculiaridades do próprio órgão e das condições técnicas do centro transplantador. Sendo Santa Catarina o estado com maior taxa de doador efetivo pmp no ano de 2012, pode-se inferir que não foi esse último critério que resultou no baixo aproveitamento do pulmão, mas sim, e provavelmente, as dificuldades e as características inerentes ao próprio órgão. 7.2 Implantação A implantação de um serviço de transplante pulmonar pressupõe a necessidade, a viabilidade e as vantagens deste serviço no Estado. Elencam-se como Pontos de Vista Fundamentais os itens descritos em 7.2.1 e 7.2.2. 7.2.1 Tempo e mortalidade na fila de espera 97 O fenômeno de disparidade geográfica em transplantes de órgãos é amplamente relatado na literatura (MORRIS; MONACO, 2003). Existem relatos do problema em países desenvolvidos como Austrália, Espanha, Estados Unidos, França e Reino Unido. No Brasil, as eventuais consequências desse fenômeno podem ser agravadas pelas dimensões continentais do país, como já se viu anteriormente. Entretanto, não existem indicadores oficiais gerais do tempo de espera nas filas e de outras variáveis relevantes relacionadas aos transplantes de órgãos no Brasil. O transplante de órgãos, em nosso país, por doação ao Estado, somente pode ser feito após a morte encefálica do doador, que pode ser natural ou acidental, e com o concomitante funcionamento dos órgãos que serão doados, após obrigatório consentimento familiar. A morte encefálica deve ser devidamente diagnosticada por uma equipe médica e o transplante autorizado pelo SNT. Uma vez constatada por médicos a necessidade de transplante, o paciente candidato a receptor é colocado na fila. A fila para transplantes no SUS para cada órgão ou tecido é única e o atendimento é por ordem de chegada, considerando critérios técnicos, geográficos, de compatibilidade e de urgência específicos para cada órgão, de acordo com a Portaria nº. 91/GM/MS 10, de 23 de janeiro de 2001 (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2010). Barr et al. (2005) relataram que o número de pacientes na lista de espera para transplante pulmonar nos EUA têm progressivamente aumentado devido a fatores que tornaram o transplante pulmonar uma técnica bem aceita para o tratamento de doenças pulmonares em fase avançada, como, por exemplo, melhoras no manuseio dos doadores, na técnica operatória, na imunossupressão e nos cuidados pós-operatórios. Segundo esses autores, havia 3888 pacientes na lista de espera nos EUA ao final de 2003, número que representava um aumento de 147% em relação há dez anos. Esses mesmos autores relatam que, no mesmo período, houve um aumento de apenas 51% no número de órgãos disponíveis, mostrando que há uma desproporção entre os doadores e os receptores (2005). Um estudo mais recente, realizado nos EUA, mostrou que, no ano de 2005, após a implantação de um sistema efetivo de aproveitamento do pulmão do doador (LAS - lung allocation score system), que basicamente aumentou as notificações e as taxas de consentimento, melhorou o manejo do potencial doador e os critérios de expansão do doador e houve uma diminuição no número de pacientes ativos em 98 lista de espera, no tempo de espera e na taxa de mortalidade. Em 1999, o tempo médio de espera em fila era de 2.897 dias e em 2005 a 2008 foi de 200 dias em média/ano. A morte em fila de espera, que em 1999 era de 190,5 por 1000 pacientes /ano, baixou em 2006 para 103,5 por 1.000 pacientes/ano (YUSEN et al., 2010). A Espanha, país que também possui um sistema nacional de transplantes eficiente e que realiza uma média de 150 transplantes pulmonares por ano, possui um tempo médio em fila de espera de 187,2 dias (BORRO, 2005). No Brasil, um estudo onde foram avaliados alguns aspectos dos transplantes de órgãos nas Unidades da Federação, nos anos de 2004, 2005 e 2006, mostrou resultados que indicaram redução no tempo de fila de espera por alguns órgãos (córnea e pâncreas); elevação em outros (fígado, coração, rim/pâncreas) e ligeiras flutuações, sem tendência muito definida, nos transplantes de rim e nos transplantes de pulmão ao longo do período estudado. Os estados das regiões Sul, Sudeste (com a exceção do Rio de Janeiro) e Centro-Oeste, tiveram os menores tempos de espera, as maiores produtividades e a maior capacidade de realização de transplantes do país (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2007). Atualmente, no Brasil, segundo o Registro Brasileiro de Transplantes (RBT), existem 165 pacientes ativos em lista de espera para transplante pulmonar até dezembro de 2012, assim divididos: 3 no Ceará, 14 em Minas Gerais, 54 no Rio Grande do Sul e 97 em São Paulo (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). Os dados obtidos no serviço da Santa Casa de Porto Alegre mostram 30 pacientes em lista de espera. Marinho, Cardoso e Almeida, em estudo realizado em 2010, comparando o tempo em fila de espera dos diversos órgãos e tecidos no Brasil, mostraram que, para o transplante pulmonar, o limite inferior de tempo de espera foi de 1,14 anos em 2004; 1,35 anos em 2005; e 1,03 em 2006. Os limites superiores seriam iguais ao dobro desses valores. No serviço da Santa Casa de Porto Alegre, local para onde são encaminhados nossos pacientes catarinenses, o tempo em lista de espera teve uma variação muito grande de 30 dias a 5 anos, porém mais da metade dos pacientes (66,7%) permaneceu entre 6 meses a 2 anos em fila de espera. Apesar de o nosso país ter um grande destaque no cenário mundial de transplantes, principalmente no transplante renal, ainda possui, para o transplante pulmonar, um tempo em fila de espera muito além dos padrões internacionais (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). 99 A demora no atendimento exerce impactos significativos sobre o bem-estar; as probabilidades de cura; a sobrevida dos enxertos e dos pacientes; a natureza e a extensão das sequelas nos pacientes, nos familiares envolvidos e na sociedade. Pior situação ocorre quando, além de elevados, os prazos são imprevisíveis. Com tal agravante, as incertezas decorrentes da imprevisibilidade impedem o planejamento das vidas dos pacientes e dos seus familiares, da atuação do sistema de saúde e do funcionamento do sistema produtivo em que eles por ventura trabalhem. Tempo de espera elevado implica, além dos custos e dos sofrimentos dos pacientes na fila, o aproveitamento de órgãos de qualidade inferior e a consequente redução do tempo de duração dos enxertos (MARINHO; CARDOSO; ALMEIDA, 2010). Um estudo brasileiro, realizado num serviço de transplante pulmonar de São Paulo, revelou que havia, de 2001 a 2008, 164 pacientes em lista de espera para transplante pulmonar. Desses, 31 pacientes do total de 164 (18,9%) faleceram enquanto aguardavam em lista e o restante (133/164, 81,1%) se enquadrava em uma das seguintes categorias: aguardando em lista (62/164, 37,8%), vivo após ter sido transplantado (45/164, 27,4%) ou falecido após ter sido transplantado (26/164, 15,9%) (SILVA JR. et al., 2009). Com relação à taxa de mortalidade em fila de espera, o Rio Grande do Sul apresentou um índice de 31,94% até dezembro de 2012 e 20,89% no primeiro trimestre de 2013, índice também considerado alto para padrões internacionais, que giram em torno de 10% (YUSEN et al., 2010). Sendo esse índice relativamente alto, sabendo-se que o tempo de espera está diretamente relacionado à mortalidade e o prejuízo que esta demora acarreta a vida do paciente, será que a implantação de outro serviço de transplante na Região Sul, particularmente em Santa Catarina, não ajudaria a diminuir essas taxas? Pode-se analisar esta questão de duas maneiras: considerando que um centro de transplantes em SC supriria as necessidades apenas do nosso estado, ter-se-ia tecnicamente um tempo de espera menor, porém, se se considera que o transplante pulmonar é um tratamento muito específico para uma população pequena, haveria uma demanda pequena e uma captação menor ainda, aumentando com isso o tempo em fila de espera para o transplante. 7.2.2 Custo de implantação 100 A economia da saúde seria o ramo do conhecimento que tem por objetivo a otimização das ações de saúde, ou seja, o estudo das condições ótimas de distribuição dos recursos disponíveis para assegurar à população a melhor assistência à saúde e o melhor estado de saúde possível, tendo em conta meios e recursos limitados (DEL NERO, 1995). A responsabilidade governamental é enorme quando se trata do uso racional dos recursos públicos investidos em saúde. Isto quer dizer destinar recursos de forma a se obter resultados positivos nos indicadores de saúde selecionados para medir o impacto das políticas e dos programas públicos. Dentro desta visão, é importante a discussão sobre o papel dos serviços de saúde: a) Os serviços de saúde têm conseguido promover saúde? b) Quais os princípios que regem a organização e o financiamento desses serviços? c) É possível manter certo número de serviços disponíveis sempre que necessários e em todas as localidades? d) É possível diminuir o custo dos serviços sem alterar sua qualidade? A função do gestor público está diretamente relacionada a esses questionamentos. O transplante pulmonar é um procedimento muito específico para uma população pequena. Assim, qual sua melhor opção: fornecer um centro de qualidade e eficiência para a população em nosso estado, ou fornecer o acesso a um dos melhores centros de referência do país? Dentro dessa visão, a análise de custos, tanto para implantação como para manutenção de um centro de transplante em nosso estado, se torna irrelevante a partir do momento que esse serviço próprio proporcione um aumento na demanda e na oferta do órgão, um menor tempo e mortalidade em fila de espera e uma melhora na sobrevida e na qualidade de vida desses pacientes. Os custos para implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina foram divididos em três cenários, com o único objetivo de se estimar um cálculo, que, longe de ser exato, proporcione uma pequena demonstração dos gastos efetivos nesse processo: instalação de área física e investimento em recursos humanos; utilização de área física preexistente e investimentos em recursos humanos e utilização tanto de área física como de recursos humanos preexistentes. 101 Conforme registro da ABTO, atualmente, Santa Catarina possui 6.248.436 habitantes, numa extensão territorial de 95.346,18 km², tendo 225 hospitais, sendo 22 na capital e 203 no interior do estado. Tem 901 leitos de UTI e 66 hospitais possuem mais de 80 leitos. Registra 28 hospitais com serviço de neurocirurgia e 28 com Comissão Intra-Hospitalar de Doador de Órgãos e Tecidos para Transplante (CIHDOTTs). Dentro desse contexto, há de se supor que a implantação de um serviço de transplante no Estado de Santa Catarina se enquadra no segundo cenário, no qual haveria alguns centros de unidade de terapia intensiva com qualidade suficiente para manter o serviço de transplante em funcionamento (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2013). Na Espanha, um dos modelos de maior sucesso em transplantes do mundo, e que serve de exemplo para diversos países, inclusive o Brasil, recomenda-se que, em grandes hospitais que possuem centros ativos de transplantes, a equipe seja formada por um médico e por um número de enfermeiros igual ao número de programas de transplantes (rim, fígado, pulmão, coração e outros) que permaneçam por tempo integral. Em hospitais pequenos e médios, sem programa de transplante, porém com unidades de terapia intensiva, que a equipe seja composta por um médico em tempo parcial; ajudado por uma enfermeira, dependendo da capacidade potencial de geração de órgãos (MATESANZ, 2008). Além do serviço de unidade de terapia intensiva, os hospitais que têm serviço de neurocirurgia possuem maior capacidade de gerar potenciais doadores de órgãos dada a gravidade e a complexidade dos pacientes que internam com patologias neurológicas e neurocirúrgicas agudas que podem evoluir para morte encefálica. Santa Catarina possui 28 hospitais com serviços de neurocirurgia já instalados e funcionando. As vantagens de se ter uma comissão intra-hospitalar de doação de órgão e tecido para transplante num determinado serviço seriam: manter uma logística de atuação intra-hospitalar frente a um potencial doador; valorização mais adequada dos potenciais doadores subótimos e idosos e uma maior participação; implicação e conscientização hospitalar no processo de doação e transplante de órgãos. Santa Catarina possui 28 CIHDOTTS distribuídos nos hospitais do estado. Dentro do exposto, haveria um cenário considerado satisfatório em termos de estrutura hospitalar para a implantação de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina. Pode-se, ainda, sugerir que, na avaliação da capacidade instalada 102 para transplante no Estado, conforme se vê na Figura 8, Blumenau, por concentrar um número considerável de transplantes de outros órgãos e por possuir serviço de transplante cardíaco (órgão estreitamente ligado ao pulmão), seria, na possibilidade de implantação de um serviço de transplante pulmonar, a região mais favorável do estado. 7.3 Manutenção A manutenção de um serviço de transplante pulmonar depende e está diretamente relacionada à primeira etapa. A partir do momento que exista uma demanda de transplantes adequada, consegue-se manter a atividade e os custos de um centro de transplante. Nessa fase, a qualidade do serviço depende muito intimamente da quantidade dos procedimentos realizados. Destaca-se alguns Pontos de Vista Fundamentais: 7.3.1 Curva de Aprendizado Na fundamentação do conhecimento médico, na medicina como tal, encontram-se todas as práticas que se desenvolvem a partir do momento em que esse conhecimento é aplicado a doentes e contextos concretos. O conhecimento médico “puro” é transformado no decorrer da sua aplicação e se concretiza por meio das suas utilizações. A curva de aprendizado nada mais é do que o tempo empregado para que a prática clínica permita estabelecer uma experiência passível de segurança e eficácia. Está diretamente relacionada com o número de procedimentos realizados e quanto maior for, mais habilidade e mais confiança. A base da teoria da curva de aprendizado é simples: um trabalhador aprende com o seu trabalho e quanto mais frequente ele repete a operação, mais eficiente se torna e melhores resultados se obtêm. O conceito de curva de aprendizado foi introduzido na medicina nos anos 1980, principalmente depois do advento da cirurgia minimamente invasiva (SUBRAMONIAN; MUIR, 2004). Os métodos para definir uma curva de aprendizado na cirurgia (surgical learning curve) são basicamente dois: a) o tempo que se leva, e/ou 103 b) o número de procedimentos que um cirurgião médio necessita para ser capaz de desempenhar um procedimento com um resultado razoável. Isto pressupõe a capacidade de identificar um cirurgião médio. As learning curves (ou curvas de aprendizagem) referem-se às vantagens de custo que são obtidas por meio do acúmulo de experiência no processo de produção. No caso em questão, tem-se que o que é medido é o tempo das cirurgias e/ou o número de procedimentos realizados. Os benefícios da aprendizagem se manifestam, eles próprios, em menores custos, na melhoria da qualidade e nos menores preços. Fatores que afetam a curva de aprendizagem: a) Eficiência da mão de obra: os cirurgiões tornam-se fisicamente mais hábeis e tornam-se mais habilidosos. Eles se tornam mentalmente confiantes e gastam menos tempo hesitando, aprendendo, experimentando ou cometendo erros. b) Padronização, especialização e melhoria nos métodos de produção: à medida que o processo de produção ocorre e criam-se protocolos incorporando o aprendizado obtido, a eficiência tende a aumentar. Quando os cirurgiões se especializam num limitado conjunto de tarefas e cirurgias, eles ganham mais experiência com aquelas tarefas e operam a uma taxa mais rápida, com isso aprendem a programar o processo produtivo com maior eficácia, conforme o tempo que exercem esse procedimento. As curvas de aprendizado dependem também da frequência com que os procedimentos são realizados num período específico. Estudos sugerem que as taxas de complicação são inversamente proporcionais ao volume de cirurgias realizadas (HU; CLARK; MA, 2003). Um estudo realizado nos EUA, para determinar a relação entre a experiência com transplante cardíaco e a mortalidade após procedimento, revelou uma taxa de mortalidade mais alta nos pacientes que receberam os primeiros 5 transplantes quando comparados aos que receberam o transplantes subsequentes: 20% versus 12% (LAFFEL et al., 1992). De um modo geral, com relação à cirurgia, quanto maior a prática cirúrgica, menor o tempo de procedimento, menores as complicações e maior o sucesso da intervenção. A curva de aprendizado também está diretamente relacionada à complexidade do procedimento. Em um artigo de revisão que comparava técnicas cirúrgicas de ressecção hepática, viu-se que a intervenção por laparoscopia exige um tempo maior na curva de aprendizado quando relacionada à cirurgia 104 convencional (HERMAN et al., 2009). A cirurgia de transplante pulmonar é considerada um procedimento de alta complexidade, que requer aperfeiçoamento específico. Envolve uma equipe multidisciplinar e seus resultados interferem na sobrevida dos pacientes transplantados (REYNARD et al., 2003). Da mesma forma, Laffel et al. (1992), em seu estudo, encontraram relação entre o treinamento específico da equipe de transplante e a taxa de mortalidade dos pacientes transplantados e concluíram que quanto maior a experiência em transplante, melhor o seguimento dos pacientes transplantados. Sendo assim, quantas cirurgias são necessárias para que o médico alcance experiência suficiente para manter sua expertise e, ainda, quantas cirurgias são necessárias para que ele mantenha essa sua competência? Na avaliação de um centro de transplante pulmonar no Estado, precisa-se lembrar de que, atualmente, nossos pacientes são encaminhados a um serviço referendado como um dos melhores do país, senão o melhor, com uma liderança nacional na quantidade de cirurgias de transplantes pulmonar. Qual seria, então, para o Estado de Santa Catarina, o número viável de cirurgias para manter a mesma qualidade do serviço atual? Viu-se que, conforme dados do CNDCD/RS, existem, hoje, 10 pacientes catarinenses em acompanhamento pós-transplante no serviço do RS, levando-se em conta que a estimativa ideal é de 3-5 pmp/ano de transplante pulmonar, considerando a população catarinense em torno de 6,2 milhões, ter-se-ia 18 a 30 transplantes por ano. Descontando a mortalidade em lista no último ano no RS em torno de 30%, haveria um número ideal máximo de 21 transplantes pm/ano. Com esse cenário, haveria uma média de 1,75 transplantes/mês. Um estudo interessante realizado por Serra (2007) analisa a construção e a reprodução do conhecimento técnico médico numa unidade de transplante hepático. Por ser um estudo observacional e de entrevistas, em várias ocasiões, foi possível constatar que alguns doentes, imediatamente antes de tomarem contacto com a unidade transplantadora, tinham como referência um dos elementos da equipe. Ela mostra que a importância da experiência clínica é, de fato, fundamental também do ponto de vista da opinião pública “de uma forma geral, os médicos, e os serviços a que estão associados, são reconhecidos pelo número de casos tratados, pelos resultados que apresentam e pelos anos de experiência em áreas específicas de intervenção”. Ela ainda conclui que, “seja qual for o motivo, a experiência tem primazia na formação médica”. Assim, a experiência acumulada também permite ao 105 serviço conquistar um lugar de referência no panorama nacional ou mundial. Na análise da implantação de um serviço de transplante pulmonar em nosso estado, precisa-se avaliar se é possível manter a qualidade e referência do estado vizinho, onde são encaminhados nossos pacientes atualmente e que possui essa referência no panorama nacional (SERRA, 2007). 7.3.2 Custo de manutenção Antes de se avaliar o custo para manter um centro de transplante pulmonar em nosso estado, é importante lembrar que a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), uma das principais indicações para o transplante pulmonar, é também uma das principais causas de doença e de morte em todo o mundo, representando um custo econômico e social representativo. Ela cobra seu preço de maneira perversa e democrática, enviando a fatura para seus doentes e sua família, para governo e sociedade. No núcleo familiar provoca preocupação, limita a vida social e o lazer, compromete o orçamento e abrevia a vida. No campo profissional, reduz a produtividade, antecipa a aposentadoria e é causa de pagamento de pensões e de benefícios. Na área do Sistema de Saúde, motiva atendimentos repetidos em pronto-socorros e em ambulatórios e é causa frequente de hospitalizações, o que provoca despesas elevadas para governo e sociedade. Para avaliação econômica do impacto que ela determina, duas parcelas devem ser consideradas: os custos diretos, que incluem as depesas médicas e não médicas associadas à doença; e os custos indiretos, que refletem as perdas causadas pela cessação ou pela redução da produtividade causadas por adoecimento e morte (CAMPOS, 2004). O transplante pulmonar é uma alternativa viável para esses pacientes. Apesar de ser um procedimento que requer uma tecnologia extremamente cara, promove uma melhora na sobrevida e em vários domínios da qualidade de vida, justificando assim os custos gerados pelo procedimento (GROSS; RAGHU, 1997; RAMSEY et al., 1995). Um estudo realizado no Canadá, onde foram acompanhados, por um período de 4 anos, 124 pacientes submetidos a um transplante pulmonar, mostrou que o custo de um paciente sem transplante (fila de espera) por mês é de U$ 1.102,00, enquanto o custo de um paciente transplantado (incluindo o procedimento) é de U$ 106 6.208,00 por mês (VASILIADES et al., 2005). Em 2005, conforme registro da SNT, foram realizados 15.527 transplantes de órgãos e tecidos no Brasil, sendo que desses, 11.095 foram pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O gasto total com transplantes, incluindo medicamentos, em 2005 foi de R$ 521,8 milhões (MARINHO; CARDOSO, 2007). Um estudo realizado no Rio de Janeiro mostrou que os gastos reais (cirurgias, procedimentos associados e medicamentos) com transplante pulmonar no Brasil, entre 1997 a 2003, foi de aproximadamente R$ 30.000,00 por paciente e que só no ano de 2003 o gasto total com transplante pulmonar foi de R$ 1.037.986,00. Se se comparar com os cálculos previstos para o Estado de Santa Catarina, com base em valores atuais, ter-se-ia um dispêndio só para este estado de R$ 1.830.402,14 ou R$ 67.792,67 por paciente. Aqui, duas observações são fundamentais: Como o componente dos serviços profissionais é fixo nesta simulação, o incremento no número de procedimentos reduziria o custo individual para cada procedimento. Aqui, é importante destacar a limitação imposta por nossa capacidade de gerar enxertos pulmonares que permitiriam ampliar o número de procedimentos. Outro ponto fundamental é o que trata dos custos variáveis dos procedimentos. Tomando por bases nosso cálculo e somando os custos de honorários profissionais (com base em 30 procedimentos ano, capacidade máxima, sem contar taxa de mortalidade), tem-se que cada procedimento geraria um custo de R$ 10.452,16 que, somados aos R$ 55.808,79 do custo variável, totalizaria R$ 66.260,95. Quando se compara aos valores repassados pelo SUS para o procedimento, variando de R$ 44.485,10 (hospital com programa de transplante pulmonar em implantação) até R$ 71.176,16 (hospital nível A da classificação IFTDO), tem-se uma clara sinalização de que tipo de estabelecimento pode desenvolver este tipo de programa de transplante sem maiores riscos financeiros. Dentro desta variação, cada procedimento pode gerar um deficit de R$ 21.775,85 ou um superávit de R$ 4.915,21 no melhor de todos os cenários. Atualmente os pacientes catarinenses que necessitam de transplante pulmonar são referidos, por meio de Tratamento Fora de Domicílio (TFD), para o serviço de Porto Alegre e isto, como citado anteriormente, gera um custo anual em torno de R$ 25.959,54. Este custo torna-se irrisório se comparado ao custo de manutenção de um serviço próprio, principalmente porque, a partir do momento que 107 o paciente chega ao serviço de referência, todas as suas necessidades: exames de imagem, laboratório, pareceres das mais diversas especialidades e outros, são executados no complexo hospitalar da referência. Este fato é muito positivo para o paciente, pois facilita muito sua investigação, porém é mais oneroso ao centro transplantador e deve ser levado em conta no projeto de instalação de um futuro centro de transplante pulmonar em Santa Catarina. 7.4 Eficiência/Eficácia (Qualidade) 7.4.1 Número de pulmões efetivamente transplantados e taxa de aceitação O uso de órgãos no Brasil é extremamente variável, excedendo 70% para rins e fígado, 15% para coração e apenas 5% para pulmões (PEGO-FERNANDES; GARCIA, 2010). Esses resultados menos satisfatórios para o transplante pulmonar devem-se às peculiaridades do órgão, que o torna menos propício ao transplante quando comparado aos outros órgãos (CAMARGO; CARAMORI, 2001). De uma maneira geral, no Brasil, os transplantes de órgãos vêm crescendo na última década. Apesar do transplante de rim e do fígado apresentar um crescimento mais acentuado; o transplante de pulmão, disponível em seus seis centros de transplante no país, também mostrou um ligeiro acréscimo, conforme demonstrado na Figura 16. 108 Figura 16: Número absoluto de transplantes no Brasil em 10 anos Fonte: Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (2013). Santa Catarina, apesar de não realizar transplante de pulmão, apresenta um cenário favorável no país em relação à efetivação de transplantes de outros órgãos, com uma taxa de 26,4 doadores efetivos pmp/ano. 109 Estratégias ao redor do mundo têm sido realizadas para melhorar as técnicas de preservação do pulmão: prevenir o barotrauma do pulmão do doador, modificar as soluções de preservação do órgão e diminuir o tempo de isquemia (ANGEL et al., 2006; AHMED; SHLABIN; NATHAN, 2011; COBO; GALLEGOS, 2009). Apesar da evolução dos sistemas de alocação de pulmão, tanto na Europa como nos EUA, a taxa de aceitação de pulmão não chega a 50% (KRUEGER; BERUTTO; AUBERT, 2011). Um estudo realizado no Canadá mostrou que, mesmo com a implantação de um protocolo para aumentar o recrutamento de pulmão, a taxa de utilização do pulmão para transplante chegou a 33% em 2006 e 24% em 2007 e 2008 (NOISEUX et al., 2009). No Brasil, um estudo retrospectivo realizado no Estado de São Paulo mostrou que, no ano de 2006, houve uma taxa de utilização dos pulmões doados muito baixa (4%) em relação às taxas médias mundiais. Conforme Pego-Fernanades et al. (2008), os motivos para a baixa taxa de aproveitamento dos pulmões doados foram: gasometria (30,1%), infecção (23,7%), distância (10,9%) e idade (8,8%). Se se analisar Estado de Santa Catarina, no último triênio, foram aceitos e removidos 13 pulmões dos 29 doadores disponibilizados, resultando em uma taxa de aceitação do órgão de 44,82% das ofertas. É um índice considerado muito alto até para padrões internacionais. Sabe-se que o aproveitamento do órgão doado está diretamente relacionado com o cuidado e o manejo do potencial doador e isso reflete o preparo da equipe transplantadora e a qualidade das unidades de terapia intensiva. Santa Catarina foi avaliada pela ABTO no ano de 2012 como: (...) o Estado que lidera o número de doadores efetivos pmp no Brasil. Tem 28 CIHDOTTs ativas, além de programas líderes em transplante renal e hepático. Possui equipe específica para retirada de órgãos com cirurgiões dedicados a esse processo. Possui grande suporte do governo estadual. (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE TRANSPLANTE..., 2012). Talvez esses motivos expliquem o sucesso na aceitação dos pulmões doados e favoreça a avaliação da implantação de um centro de transplantes pulmonar no estado. 7.4.2 Sobrevida e qualidade de vida pós-transplante 110 Apesar dos avanços conquistados na área do transplante pulmonar na última década, a sobrevida em curto e em longo prazo dos pacientes transplantados ainda é menor, quando comparada a de outros órgãos sólidos. Estima-se uma sobrevida de 94%, 88% e 80% em um, três e cinco anos, respectivamente, para transplante renal; 86%, 78% e 73% para transplante hepático; 87%, 80% e 74% para transplante cardíaco e 84%, 68% e 52% para transplante pulmonar (YUSEN, 2009). Na Espanha, um registro publicado sobre 15.267 pacientes transplantados no período de 1990 a 2002 mostrou uma sobrevida de 74% em 1 ano, 58% em 3 anos e 47% em 5 anos. A enfermidade de base (enfisema e fibrose cística têm melhores resultados) e a situação clínica do paciente no momento do transplante são os principais fatores que influenciam na sobrevida (BORRO, 2005). Um estudo realizado nos EUA mostrou resultados semelhantes apenas na sobrevida de 3 anos (83% em 1 ano, 54% em 3 anos e 29% em 5 anos). Eles acreditam que a idade (pacientes maiores de 65 anos), tipo de transplante (unilateral), severidade do quadro clínico no momento de transplante (pacientes internados em unidade de terapia intensiva) e tipo de doença de base podem piorar os resultados da sobrevida (YUSEN et al., 2010). Neste mesmo estudo, Yusen et al. (2010) afirmam que, mesmo tendo uma taxa de sobrevida menor em relação aos outros transplantes de órgãos sólidos, de uma maneira geral, sem contar a patologia de base, ela ainda é maior quando comparada aos pacientes em fila de espera para o transplante. Um estudo realizado em Zurique em pacientes com fibrose cística pulmonar mostrou uma taxa de sobrevida de 72,7% em pacientes transplantados e 33% em pacientes sem transplante (HOFER et al., 2009). No Brasil, conforme registro da ABTO, tem-se uma sobrevida em 3 anos de 53%, contados a partir de 2010. Estes dados são semelhantes aos resultados dos melhores centros mundiais de transplante e isso se torna importante porque a sobrevida tem sido um dos principais critérios para avaliar o sucesso deste procedimento. O Guideline Internacional para seleção de candidatos a transplante pulmonar de 2006 baseia-se muito nas suas recomendações no tempo de espera por transplante e no tempo estimado de sobrevida pós-transplante (ORENS et al., 2006) e o Lung Allocation Score System (LAS), utilizado nos EUA, solidificou-se como um excelente método de captação de órgão baseado no seguimento da sobrevida antes e após o transplante pulmonar (YUSEN et al., 2010). 111 A Região Sul, particulamente o Rio Grande do Sul, foi a responsável pela maioria dos transplantes pulmonares do país em 2012 (33 de 69 procedimentos), com a melhor taxa de transplante pulmonar por milhão de população (3,1). Estando o Brasil inserido numa taxa de sobrevida similar às taxas mundiais e tendo o Estado do Rio Grande do Sul como centro de referência, fica o questionamento se a implantação de outro serviço na mesma região ajudaria a incrementar ainda mais esta taxa de sobrevida. A taxa de sobrevida nos pacientes transplantados é um importante marcador do sucesso do procedimento, que é, sem dúvida, a opção terapêutica mais favorável ao doente terminal quando comparado ao paciente em fila de espera. Porém, além do número de pacientes que sobrevivem, precisa-se analisar a qualidade de vida que proporciona o transplante pulmonar a estes sobreviventes, principalmente por se tratar de um procedimento que não está isento de riscos. De acordo com Gross e Raghu (1997), “na clínica médica, qualidade de vida representa o efeito da doença e sua consequente terapia sobre o paciente, na percepção do própio paciente”. De uma maneira geral, critérios como saúde física, mental e social, como bem-estar, ajudam a definir qualidade de vida (GROSS; RAGHU, 1997). Vários estudos têm demonstrado uma melhora na qualidade de vida, função pulmonar, e satisfação dos pacientes transplantados em comparação com aqueles que estão em fila de espera (LAU; PATTERSON, 2003; LANUZA et al., 2000; VAN DER BIJ; REYNAUD-GAUBERT, 2009). Um estudo comparando 36 pacientes na fila de espera com 72 pacientes que receberam transplante pulmonar mostrou que os pacientes transplantados apresentaram uma melhora estatisticamente significativa na sua saúde física, na vitalidade e na sua função social (LIMBOS et al., 2000). Ainda em relação à qualidade de vida, Trulock et al. (2004) publicaram o registro da Sociedade Internacional de Transplante de Coração e Pulmão, que mostrou que 83% dos pacientes que sobrevivem ao transplante levam uma vida normal e sem limitações ao cabo de um ano, e que essa porcentagem se mantém ao longo de cinco anos. Na análise da viabilidade de se implantar um centro de transplante pulmonar em nosso estado, a qualidade de vida teria um papel importante para nossos pacientes. É difícil inferir qual o custo emocional para pacientes e seus familiares que são deslocados para outro estado para realizar este procedimento, e que permanecem por um longo período fora do seu convívio familiar, porém isto, com 112 certeza, interfere na sua qualidade de vida. Pacientes fora do Rio Grande do Sul precisam permanecer naquele estado um tempo médio de 6 meses após a realização de transplante. Isto demanda hospedagem, alimentação, saudades da sua casa e outros. Um estudo realizado por Ramsey et al. (1995) mostrou que a qualidade de vida é tempo dependente, e que os primeiros quatro meses póstransplante apresentam um escore mais baixo de qualidade de vida. Sendo assim, para nossos pacientes catarinenses que permanecem o período pós-operatório em outro estado, a distância não seria um fator adicional para sua piora na qualidade de vida? De uma maneira sintética, agrupou-se os elementos primários de avaliação (EPAs) e comparou-se a análise de um centro próprio de transplante em Santa Catarina com a manutenção do transplante pulmonar no serviço de referência do Rio Grande do Sul, conforme Quadro 8. Quadro 8: Comparação entre centro próprio de transplante pulmonar em Santa Catarina e manutenção do transplante pulmonar no Rio Grande do Sul, conforme os Elementos Primários de Avaliação (EPAs) EPAs Serviço Próprio em SC 1. Demanda de transplantes da população de Santa Catarina População de 6,3 milhões de habitantes e demanda de 3 – 5 Tx pulmonares p.m.p. limita as perspectivas a 15 a 32 procedimentos ano. 2. Número de pulmões disponibilizados para transplante pelo sistema de captação de órgãos Com 26,4 doadores p.m.p. e 6,7% de aproveitamento para órgãos torácicos, a estimativa de geração de enxertos é de 10 pulmões/ano. 3. Tempo na fila de espera 4. Índice de mortalidade na fila de espera Possibilidade de redução por se ter fila própria e menos pacientes em lista. A perda de 10,7 milhões da base da população doadora pode comprometer a melhora. Na mesma linha do item 3, acrescenta-se a possibilidade que um serviço em SC eleva o aproveitamento dos pulmões ofertados, reduzindo ambos tempo em fila e mortalidade. Manter referência no RS População de 10,7 milhões de habitantes. Demanda estimada de 32 a 53 Tx ano. Como única referência na Região Sul potencial de 82 a 137 procedimentos ano. Com 18 doadores p.m.p. e 13% de aproveitamento para órgãos torácicos, geração estimada de enxertos de 25 pulmões/ano. Número maior de pacientes em lista, incluindo candidatos de todo o Brasil. População de base para procura de órgãos 4,3 X maior que a de SC. Possibilidade de criação de uma equipe de captação de pulmões em SC para aprimorar a logística e o aproveitamento dos pulmões. 113 EPAs 5. Custo de implantação do serviço 6. Curva de aprendizado da equipe de transplante 7. Custo de manutenção do serviço 8. Nº de pulmões efetivamente transplantados pelo serviço de referência para transplante de pulmão e taxa aceitação dos órgãos disponibilizados Serviço Próprio em SC Desfavorece a hipótese se comparado ao custo atual de manter os pacientes no RS. Maior obstáculo a ser vencido pelo tamanho da população de SC e seus reflexos em demanda de transplante pulmonar e geração de enxertos. Desfavorece a hipótese se comparado ao custo atual de manter os pacientes no RS. Precisa ser confrontado com a receita gerada a partir da realização dos transplantes em SC. A escolha do perfil da instituição pode neutralizar a dificuldade. É real a possibilidade que um serviço em SC elevasse o aproveitamento dos pulmões aqui gerados e ofertados, com impacto no tempo de espera e mortalidade em lista. Pesa novamente a questão da curva de aprendizado e ampliase pelo expertise de toda a equipe de saúde no cuidado 9. Sobrevida pós- pós Transplante pulmonar e acompanhamento. transplante O eventual melhor acesso ao serviço hospitalar especializado poderia ter algum impacto. Potencial benefício por tratar10. Custos se de equipe local sem emocionais do deslocamento de pacientes e paciente e familiares para o RS. Deve-se acompanhantes relativizar, pois um único centro associados à em SC implica que a maior distância do local parte dos pacientes será de residência tratada longe do domicílio. Manter referência no RS Menos oneroso ainda que se leve em conta o custo do tratamento fora do domicílio. Experiência de 423 enxertos com média de 27 procedimentos ao ano na última década. O serviço de referência no RS tem a melhor relação custofinanciamento possível pelas normas do SUS. Possibilidade de criação de uma equipe de captação de pulmões em SC para aprimorar a logística e o aproveitamento dos pulmões. Possibilidade de criação de uma equipe de acompanhamento de transplantados pulmonares integrada ao serviço do RS. Estrutura de complexo hospitalar com acesso facilitado a todos os recursos necessários ao paciente sem precisar deslocamento e esforços adicionais. Instituição vinculada sem restrições ao SUS. 11. Custo Há risco potencial de deficit econômico final Risco de perda de receita para financeiro se o projeto não for incorporado ao o serviço do RS. bem planejado. estado Fonte: Elaborado pelo autor (2013). 114 8 CONCLUSÃO No ciclo das políticas públicas, a formação da agenda política representa uma das mais importantes fases, porque mobiliza fortes recursos de poder. A formação da agenda é fortemente afetada pelos atores políticos e pelos processos de evidenciação do tema que poderiam ocupar a atenção do governo. Neste sentido, este estudo procurou apresentar informações sobre a viabilidade ou não da implantação de um centro de transplante pulmonar em Santa Catarina, dando instrumentos que possam ser úteis para a atenção dos formuladores de política no processo de formação da agenda e formação de alternativas, conforme pode ser verificado na Figura 17. Figura 17: Ciclo de Políticas Públicas Adaptado FORMAÇÃO DA AGENDA - Definição do problema: Transplante Pulmonar em Santa Catarina. - Análise do problema: viabilidade de um centro próprio. FORMAÇÃO DE ALTERNATIVAS - Avaliação das opções: criar um centro em nosso estado ou manter o sitema vigente. - Seleção das opções: análise dos pontos de vistas fundamentais. IMPLEMENTAÇÃO - Monitoramento. AVALIAÇÃO - Ajustes. Fonte: Elaborada pelo autor (2013). Sendo assim, a análise dos dados obtidos para avaliação da viabilidade de implantação de um serviço de transplantes de pulmão em Santa Catarina permite inferir: 115 a) A demanda anual para este procedimento deve variar entre 18 a 30 procedimentos. b) A pequena oferta de pulmões para transplante consiste em uma ameaça real ao desenvolvimento de um programa de transplantes em Santa Catarina. c) O desenvolvimento de um programa de transplante pulmonar em nosso estado poderia incrementar o aproveitamento dos enxertos pulmonares com potencial redução do tempo e da mortalidade em lista de espera. d) A redução da base populacional de procura de doadores pode neutralizar o suposto benefício da redução do tempo de espera. e) A opção pela implantação de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina é inquestionavelmente mais onerosa que a de manter os pacientes em tratamento no Rio Grande do Sul. f) O maior desafio à implementação desta proposta consiste em expor os pacientes a uma curva de aprendizado da nova equipe e seu estabelecimento, bem como a garantia de uma demanda que permita a esta manter a expertise. g) O desenvolvimento da nova equipe e do estabelecimento pode comprometer o resultado dos transplantes de pulmão em Santa Catarina nos seus primeiros anos de atividade. h) O desenvolvimento de um serviço de transplante pulmonar em Santa Catarina pode trazer mais conforto e facilidade de acesso aos catarinenses. i) O perfil de um estabelecimento de saúde catarinense para o desenvolvimento de deste projeto deve contemplar a existência do maior número possível de programas de transplante de órgãos sólidos, incluindo coração e um serviço ativo e qualificado de cirurgia torácica. j) Há um considerável risco de deficit financeiro para este programa de transplantes se o estabelecimento não atender às características dos níveis A ou B do programa de incremento financeiro para a realização de procedimentos de transplantes e o processo de doação de órgãos da Portaria GM 845 de 02 de maio de 2012. Este estudo procurou analisar diversos fatores relevantes na avaliação de políticas públicas referentes ao transplante pulmonar no Estado de Santa Catarina. Sua contribuição teórica promoveu a discussão de aspectos que precisarão ser desenvolvidos, em momento oportuno, pelos formuladores da política de saúde na tomada de decisões pertinentes à mudança ou não da configuração atual da rede de 116 serviços de saúde de alta complexidade, não sendo, portanto, definitivo. O autor reconhece como limites desta pesquisa alguns aspectos importantes: por ter assumido o contexto específico de processo de tomada de decisão que interessa apenas dois gestores e duas instituições prestadoras de serviço (as Secretarias de Estado da Saúde de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, o Hospital da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e outro hospital de grande porte de Santa Catarina não definido), assumiu o caráter de estudo de caso, não sendo suas conclusões generalizáveis. Por outro lado, apesar de ter sido elaborado a partir de informações e opiniões colhidas em reuniões com importantes agentes do processo decisório, restringiu-se a um grupo limitado de participantes e a um momento histórico e político específico e limitado. Dentro da metodologia adotada, o presente estudo abordou a primeira fase do modelo MCDA – estruturação do contexto decisório. A continuidade da aplicação da metodologia no contexto da gestão do Sistema Único de Saúde é uma opção dos formuladores das políticas de saúde, e o presente trabalho pode ser uma contribuição relevante para a elaboração de estudos futuros. 117 REFERÊNCIAS AHMED, S.; SHLABIN, O. A.; NATHAN, S. D. Pulmonary complication of lung transplantation. Chest, v. 139, n. 2, p. 402-411, 2001. ANGEL, L. F. et al. Impact of a lung transplantation donor-management protocol on lung donation and recipient outcomes. American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine, v. 174, n. 6, p. 710-716, 2006. ANYANWU, A. 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