POPPER VS. KUHN (I)
Aula 3 de filosofia da ciência
Popper
1) O problema da indução
2) O problema da demarcação
3) O problema da base empírica
4) A noção de corroboração
5) A noção de verossimilhança
Problema da indução
• Popper chama o problema da indução de “Problema de
Hume”, distinguindo dois casos, a saber, o problema
lógico e o problema psicológico da indução:
• (PL) Estamos racionalmente justificados em raciocinar a
partir dos casos que tivemos experiência para casos que
ainda não tivemos experiência? (da conjunção constante
observada entre A e B podemos inferir B a partir da
ocorrência de A?)
• (PP) Por que pessoas razoáveis esperam e acreditam
que casos que ainda não tiveram experiência se
conformarão aos casos que tiveram experiência?
Argumento de Hume
• A resposta de Hume para PL é: não.
• Considere que tipo de raciocínio é este: se eu soltar este botão, a luz irá
acender? De acordo com Hume, trata-se de uma inferência do seguinte
tipo:
• (3) Se eu apertar o botão, a luz irá acender.
• (2) Eu aperto o botão,
(1)A luz se acende (segue-se de (3) e de (2))
• Mas o que permite estabelecer (3)? Hume argumenta vivamente contra
a suposição de que a relação entre o antecedente e o consequente de
(3) pode ser estabelecida a prioristicamente apenas pelo pensamento.
Em sua opinião, somente a repetição da experiência garantirá (3).
Temos então:
• (4) Eventos passados do tipo A (apertar o botão) sempre foram seguidos
de eventos do tipo B (a luz se acender);
Argumento de Hume
Temos então:
(4) Eventos passados do tipo A (apertar o botão) sempre
foram seguidos de eventos do tipo B (a luz se acender).
(3) Se eu apertar o botão, a luz irá acender.
(2) Eu aperto o botão,
(1) A luz se acende (segue-se de (3) e de (1))
Porém, a inferência de (4) para (3) não é dedutivamente
válida e a premissa adicional que torna a inferência válida
não pode ser justificada. Vejamos a premissa.
Argumento de hume
(5) o futuro será semelhante ao passado.
O argumento de Hume para responder a PL:
• Há dois modos de estabelecer uma proposição por
raciocínio: demonstrativamente ou indutivamente;
• (5) não pode ser estabelecido demonstrativamente,
porque a sua negação não implica uma contradição;
• (5) não pode ser estabelecida indutivamente, pois toda
inferência indutiva é baseada em (5), tornado, pois, um
argumento indutivo circular;
• Logo, (5) não pode ser estabelecida.
Argumento de Hume
• A resposta de Hume ao PP é:
• Todos as inferências a partir da experiência são efeitos
do costume, não do raciocínio.
• Russell considera as respostas de Hume ao PL e PP
conduz ao irracionalismo, e comenta:
• É importante descobrir se há uma resposta à Hume em
uma filosofia que seja total ou principalmente empirista.
Se não há, não há diferença intelectual entre sanidade e
insanidade. O lunático que acredita ser um ovo escaldado
será condenado só porque está em minoria.
• Popper propõe uma solução para o problema de Hume
sem rejeitar a solução cética para PL.
A teoria do balde
• Um aspecto importante da solução popperiana do
problema da indução é a consideração de que o
conhecimento (inclusive o conhecimento científico) deve
ser encarado como conjectural. Um fator que impedenos aceitar isso é a teoria da mente como um balde:
•
A solução de Popper
• Popper aceita a resposta de Hume para PL, mas não para PP, alegando
que a resposta de PL deve ser a mesma que a resposta para PP.
• Reformulação de PL:
• (PL*) Estamos racionalmente justificados em raciocinar de instâncias ou
contra-instâncias que tivemos experiência para a verdade ou falsidade
das leis correspondentes?
• A inferência de instâncias confirmatórias para leis é inválida e não é
justificada; porém, a inferência de contra-instâncias para a falsidade de
leis é um raciocínio válido e justificado.
dedutivismo
Teorias são avançadas, delas são retiradas dedutivamente
consequências, as consequencias são comparadas entre si e
com outros enunciados relevantes.
Diferentes linhas de teste:
a) As conclusões da teoria são comparadas a fim de testar a
sua consistência.
b) Investigação da forma lógica da teoria a fim de averiguar o
seu caráter empírico ou tautológico (tautologias não excluem
a ocorrência de eventos no mundo, enquanto teorias com
conteúdo empírico o fazem).
c) Comparação com outras teorias a fim de determinar se a
teoria constitui um avanço (há graus de testabilidade
diferenciados).
d) Teste por meio da aplicação empírica das conclusões
deduzidas da teoria (corroboração ou falsificação).
demarcação
Não exijo de uma sistema científico que ele seja capaz de ser
selecionado de uma vez por todas em um sentido positivomas exijo que a sua forma lógica seja tal que ele possa ser
selecionado por meio de testes empíricos em um sentido
negativo: um sistema científico empírico tem de poder ser
refutado pela experiência.
Costuma-se criticar a proposta popperiana afirmando que a
ciência é conservadora, e o cientista não abandona a sua
teoria quando surgem indícios contrários. Mas ataca-se aqui
uma caricatura de Popper. Há na sua proposta lugar para o
dogmatismo na ciência, assim como para a regra de evitar
estratagemas convencionalistas de proteger as falsificações.
Para haver racionalidade na ciência, deve haver equilíbrio
entre dogmatismo e ceticismo.
Racionalidade da ciência
• A ciência e as especulações do lunáticos são
conjecturais. Porém, algumas conjecturas são preferíveis
a outras.
• Popper propõe:
• A nossa análise lógica leva-nos diretamente a uma teoria
metodológica, e especialmente à seguinte regra
metodológica: teste e procure teorias audaciosas, com
grande conteúdo informativo- e então deixe que essas
teorias entrem em competição, discutindo-as criticamente
e testando-as severamente.
• Tal consideração responde à objeção de que não há
jamais uma falsificação definitiva de teorias.
Teorias e Explicação Científicas
• Teorias são redes lançadas para capturar o que
chamamos de
dominá-lo.
“o mundo”: racionalizá-lo, explicá-lo e
• Uma explicação causal de um evento é uma dedução de
uma proposição que o descreve usando como premissas
da dedução um ou mais leis universais (proposições
universais estritas e não numéricas) junto com certas
proposições singulares, as condições iniciais. Veremos
que há problemas nessa concepção de explicação. Por
exemplo, o problema da relevância das premissas para a
conclusão.
PUE e PEE
• Proposições universais estritas PUE e proposições
existenciais estritas PEE.
• A negação de uma PUE corresponde à afirmação de uma
PEE.
• Teorias e leis científicas são PUE, que podem receber a
forma da negações de PEE. Por exemplo: Todo a é b =
Não há um a que não seja b. Nesse sentido, teorias e leis
científicas são proibições: não afirmam que algo é o caso,
mas proíbem a ocorrência de certos eventos. Por isso
são falsificáveis.
• Proposições existenciais estritas não podem ser
falsificadas. Elas podem ser consideradas proposições
metafísicas. Por exemplo: “Há um marciano em OP” não
Convencionalismo
• Para o convencionalista, a ciência natural teórica não é
um quadro ou representação da natureza, mas é
meramente uma construção lógica. Não são as
propriedades do mundo que determinam a sua
construção, mas é a sua construção que determina as
propriedades artificiais do mundo.
• De acordo com o convencionalista, leis da natureza não
são falsificáveis por observação, pois elas são exigidas
para determinar o que é uma observação ou uma
mensuração. Convencionalistas agem contrariamente
aos verificacionistas, chamando a atenção para o modo
como nós determinamos os experimentos a partir das
nossas teorias e decisões. Mas eles têm algo em comum:
a negação do caráter conjectural do conhecimento
científico.
• O Convencionalista procura fundar a ciência em uma
base última, contrariamente a Popper.
Hipóteses ad hoc e auxiliares
• Todo teste empírico envolve, além de leis e teorias,
hipóteses auxiliares que permitem tirar consequências
empíricas que irão ser testadas.
• Popper entende que, quando uma teoria esbarra em
contra-instâncias, é natural protegê-la de falsificação com
a introdução de hipóteses auxiliares.
• É um erro adotar a estratégia convencionalista e proteger
teorias de falsificação por meio de hipótese ad hoc.
• A diferença entre hipóteses auxiliares e hipótese ad hoc é
que podemos construir um teste independente para as
primeiras, mas não para as segundas. Ela aumenta,
portanto, o grau de testabilidade ou falseabilidade do
sistema.
falseabilidade
• Uma teoria é “empírica” e “falsificável” se ela divide a
classe de proposições básicas possíveis de forma não
ambígua em duas subclasses não vazias. A primeira é a
classe das proposições básicas com as quais ela é
inconsistente (ou que ela exclui ou proibe): chamamos a
essa classe de falsificadores potenciais da teoria; em
segundo lugar, a classe daquelas proposições básicas
com as quais ela não entra em contradição (ou que ela
“permite”).
• A falsificação de uma teoria depende da descoberta de
um efeito reprodutível que refuta a teoria. I.e., uma teoria
é refutada somente se uma hipótese que descreve este
efeito é proposta e então corroborada.
O Problema da base empírica
• Problema da base surge em função do teste empírico,
visto que este assume proposições básicas como
premissas para a falsificação.
• Estamos justificados em aceitar essas prosições?
Popper alega que o importante não é assumir somente
aquilo que é testado (isso conduziria a um regresso),
mas aquilo que é testável.
O Trilema de Fries
• Se as proposições da ciência não devem ser aceitar
dogmaticamente, devemos justificá-las. Se demandamos
justificação por argumento racional, então proposições só
podem ser justificadas por proposições. A demanda pela
justificação de todas as proposições conduz a um
regresso ao infinito. Se queremos evitar os dois, o nosso
único recurso é o psicologismo, i.e., a doutrina que as
proposições podem ser justificadas não por proposições
apenas, mas também pela experiência perceptual.
• A visão da ciência que se tem é a de uma apresentação
sistemática de nossas convicções imediatas e
indubitáveis. Popper propõe separar a ciência objetiva do
nosso conhecimento indubitável.
Contra o psicologismo
• Argumento de Popper contra o psicologismo procede
por analogia com o psicologismo em lógica.
• A comparação dos métodos de certificação da correção
de uma prova em lógica ou matemática com a
confirmação de um experimento fornece a Popper uma
saída do psicologismo.
• Exigência formal para uma proposição ser considerada
básica: ter a forma de proposiçao singular existencial.
• Exigência material: o evento que a proposição descreve
tem de ser observável, i.e., testável intersubjetivamente
por observação.
A solução do trilema
• Todo teste tem um fim: o fim é uma proposição básica
que decidimos aceitar.
• A posição é dogmática, mas o dogmatismo é inócuo, visto
que sempre podemos colocar estas proposições em
teste, caso haja necessidade.
• A posição gera um regresso, mas o regresso é inócuo,
visto que não há tentativa de provar proposições por meio
do regresso.
• Em relação ao psicologismo, Popper salienta que a
decisão acerca das proposições básicas é causalmente
ligada com nossas experiências, mas não há tentativa de
justificação dessas proposições por meio delas. Elas são
motivo ou causa da aceitação, mas não a sua razão.
Teorias rivais
• Entre teorias rivais, escolhemos aquela que sobrevive
aos testes, aquela que por seleção natural mostra-se
como a mais apta a sobreviver. Não só a que sobreviveu
a teste severos, mas também a que for mais testável de
maneira rigorosa.
Contra todos
• A diferença de Popper em relação ao convencionalistas é
que ele assume que as proposições que decidimos por
acordo não são universais, mas singulares. Popper
distingue-se do positivismo ao assumir que as
proposições básicas não são justificáveis por nossas
experiências imediatas, mas são, de um ponto de vista
lógico, aceitas por um ato, por uma decisão livre (de um
ponto de vista psicológico isso pode ser uma reação que
tem uma finalidade e é bem adaptada ao meio).
O Fundamento da ciênca
• A ciência não se apoia sobre um rochedo sólido. A
estrutura arrojada de suas teorias ergue-se em um
pântano. Ela é parecida com um edifício erguido sobre
pilares. Os pilares são fixados de cima para baixo no
pântano, mas não chegam a uma base natural dada- e se
paramos de introduzir os pilares mais a fundo, não é
porque chegamos a uma base sólida. Simplesmente
paramos quando ficamos satisfeitos que os pilares são
firmes o suficiente para suportar a estrutura, pelo menos
para o tempo vindouro.
corroboração
• Pouco a pouco Popper reconhece um papel positivo para
evidências e indícios empíricos.
verossimilhança
• Crescimento da ciência é medido pela sua aproximação
com a verdade.
• O grau de verossimilhança de uma teoria é a diferença
entre a medida de consequências verdadeiras de uma
teoria e a medida de suas consequências falsas.
• Estamos interessados na verdade, mas não em
qualquer verdade. Estamos interessados em verdades
interessantes, e por isso preferimos teorias mais
informativas.
• Quanto mais informativa for uma teoria, menos provável
ela é. Considere que o conteúdo de uma confunção a&b
é maior do que o conteúdo de cada proposição isolada.
Porém, a probabilidade da conjunção é menor do que a
probabilidade das proposições isoladas.
• Ambiguidade de Popper quanto à falsificação:
a.A falseabilidade é uma propriedade de asserções
b.A falseabilidade é uma prescrição sobre como os
cientistas devem agir.
• No primeiro caso, o critério é fraco, uma vez uma teoria
científica T, mais um enunciado maluco qualquer C que
não tenha consequências empíricas, terá as mesmas
consequencias que T, mas T & C não é científico. Popper
pode, no máximo, dizer que a falseabilidade é uma
condição necessária, mas não suficiente, pois nem tudo
que é falseável é ciência.
• O Segundo caso é muito forte, pois nem sempre o
Download

Popper vs. kuhn