Considerações introdutórias acerca da Pessoa de Jesus Cristo, da União das Duas Naturezas e das Afirmações Teológicas e Doutrinárias na História da Igreja. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA CRISTOLOGIA – A DOUTRINA DE CRISTO 1 O que é Cristologia? A palavra Cristologia vem de duas palavras gregas: Χριστου, ως (gr. “ungido”, termo usado na tradução da palavra hebraica ַ ָמשִׁיח, māšîaḥ, no texto da Septuaginta); e Δογος (gr. “palavra” [em João 1.1-3,14 é traduzido como o Verbo], “estudo”, “análise”, “consideração, tratado, sobre”, “doutrina”); Etimologicamente, a palavra significa “estudo ou doutrina acerca de Cristo”. Designa o estudo sistemático da doutrina de Cristo nas Sagradas Escrituras, envolvendo os seguintes temas: A Pessoa de Cristo (Divindade e Humanidade) e a União Hipostática; A Encarnação e o Nascimento Virginal; Os Ensinamentos e o Ministério Terreno; O Sofrimento, a Morte e a Ressurreição; e A Ascensão ao Céu e o Advento Futuro (o Retorno Triunfante e Iminente). 2 A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA CRISTOLOGIA Certa ocasião, Cristo perguntou aos seus discípulos o que as multidões pensavam acerca dele (Mt 16.13-20; Mc 8.27-30; Lc 9.18-21). Segundo os discípulos, as respostas foram variadas: • Alguns disseram que ele era João Batista, que havia ressuscitado (Mt 16.14a; Mc 8.28a; Lc 9.19a ; sobre a morte de João Batista ver Mt 14.1-12; Mc 6.1429); • Outros que ele era Elias (Mt 16.14b; Mc 8.28b; Lc 9.19b); • Alguns, sem saber quem ele era, disseram: “Jeremias” (só em Mt 16.14c) “ou um dos profetas” (Mc 8.28c; Lc 9.19c). A seguir Jesus direciona a pergunta inicial aos seus discípulos, tendo como resposta a afirmação de Pedro: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16); “Tu és o Cristo” (Mc 8.29b); “O Cristo de Deus” (Lc 9.20b). 3 A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA CRISTOLOGIA O estudo da Cristologia Bíblica nos é importante: a. Teologicamente; b. Apologeticamente; c. Homileticamente; e d. Devocionalmente. Alister McGrath: “A pessoa de Cristo é de central importância para a teologia cristã. Embora ‘teologia’ pudesse ser definida como ‘falar acerca de Deus’ em geral, a ‘teologia cristã’ confere um papel central a Jesus Cristo”. 4 A IMPORTÂNCIA DO ESTUDO DA CRISTOLOGIA RAZÕES PARA SE ESTUDAR A CRISTOLOGIA Porque as pessoas precisam conhecer a Cristo (1Co 2.2): • O Conteúdo da Pregação: Cristo; • A Predileção da Pregação: Cristo crucificado; • A Determinação da Pregação: Cristo; Porque o conhecimento de Cristo é superior aos outros conhecimentos (Cl 2.3,4); Porque o conhecimento de Cristo é o centro das Escrituras; Porque o conhecimento de Cristo é sobrenatural e produto da graça de Deus (Mt 11.27); Porque o conhecimento de Cristo é a maior descoberta que alguém pode fazer; Porque o conhecimento de Cristo é fundamental: • Para o conhecimento do próprio Deus (Cl 3.10); • Para se desfrutar a vida eterna (Jo 17.3; 2Co 4.6); • Para o exercício da fé (Rm 10.14); • Para recebermos muitas graças (2Pe 1.2-4); Porque o conhecimento de Cristo é sublime (Fp 3. 8,9). 5 Ideias Erradas a Respeito de Cristo: Kenneth Copeland Citado por Ferreira, Franklin e MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo; Vida Nova, 2007, p. 486. 6 Cristologia vs. Cristocentrismo Cristologia Cristocentrismo É o estudo da doutrina de Cristo, do Seu nascimento virginal, das suas Naturezas (Humana e Divina), da Harmonia entre as duas naturezas (“União Hipostática”), da sua Encarnação, da Sua Obra redentora, da sua Morte, da sua Ressurreição, da sua Ascensão e do seu Advento Futuro (“seu Retorno Triunfante e Iminente”). É a atitude de uma pessoa ou um grupo delas enfatizar a importância da presença centralizada de Cristo e de fundamentar todos os ensinamentos a partir do conhecimento cristológico adequado e de acordo com as Escrituras. Só é possível Cristo estar no centro de nossa vida se, antes de tudo, nós o conhecermos 7 Divisões da Cristologia: Áreas de Estudo Existem duas áreas do conhecimento teológico que tratam sobre o tema da Cristologia: A Teologia Bíblica e A Teologia Sistemática. Diferenças entre Teologia Bíblica e Teologia Sistemática: Teologia Bíblica: análise através de um ponto de vista individual da doutrina com relação a um autor e/ou livro; Teologia Sistemática: análise através de um ponto de vista generalizado da doutrina e a harmonia dos tópicos. 8 A PESSOA DE CRISTO 9 1. Definição Teológica, Doutrinária e Histórica FORMULAÇÕES TEOLÓGICAS E DOUTRINÁRIAS NA HISTÓRIA DA IGREJA I. CREDOS CREDO DE ANTIOQUIA (Concílio de Antioquia: começo de 325 d. C.): credo contido na Carta do Sínodo de Antioquia; CREDO DE NICÉIA (Concílio de Nicéia: 325 d. C.); CREDO DE NICÉIA RATIFICADO (Concílio de Constantinopla: 381 d.C.); CREDO DE CALCEDÔNIA (Concílio de Calcedônia: 451 d.C.); II. CONFISSÕES DOUTRINÁRIAS: REFORMA PROTESTANTE SEGUNDA CONFISSÃO HELVÉTICA (1566): Capítulo XI; CONFISSÃO DE FÉ DE WESTIMINSTER (1648) 10 1. Definição Teológica, Doutrinária e Histórica “[Creio] E em um só Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, gerado pelo Pai, unigênito, isto é, da substância do Pai, Deus de luz, Luz de Luz, Deus verdadeiro do Deus verdadeiro, gerado e não feito, de uma só substância com o Pai, pelo qual foram feitas todas as coisas, as que estão no céu e as que estão na terra; o qual, por nós homens e para nossa salvação desceu, encarnou-se e se fez homem, e sofreu e ressuscitou ao terceiro dia, subiu ao céu e novamente deve vir para julgar os vivos e os mortos” (Credo de Nicéia). “Verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, de alma e corpo racional e sensível, consubstancial com o Pai de acordo com a divindade, e consubstancial conosco de acordo com a humanidade” (Credo de Calcedônia). “[Creio] (...) E em um Senhor Jesus Cristo, o único unigênito Filho de Deus, gerado do Pai antes de todos os mundos, Luz de Luz, o próprio Deus do próprio Deus, gerado, não feito [criado], sendo de uma substância com o Pai (...).” (Credo de Constantinopla). “Portanto, quanto à sua divindade, o Filho é co-igual e consubstancial com o Pai; verdadeiro Deus, não de nome ou por adoção, ou por qualquer dignidade, mas em substância e natureza... Abominamos, pois, a doutrina ímpia de Ário e de todos os arianos contra o Filho de Deus...” (Segunda Confissão Helvética, 1566). “O Filho de Deus, a segunda pessoa da Trindade, sendo verdadeiro e eterno Deus, da mesma substância do Pai e igual a Ele” (Confissão de Fé de Westminster, 1648). 11 1. Definição Teológica, Doutrinária e Histórica CATECISMO MENOR (Martinho Lutero); CONFISSÃO DE AUGSBURGO (Filipe Melanchthon); CATECISMO DE HEIDELBERG; BREVE CATECISMO DE WESTMINSTER; Seção “Creio” Jornal Mensageiro da Paz. 12 1. Definição Teológica, Doutrinária e Histórica “Creio em Jesus Cristo, verdadeiro Deus, nascido do Pai desde a eternidade, e também verdadeiro homem, nascido da Virgem Maria, é meu Senhor, que me remiu a mim, homem perdido e condenado, me resgatou e salvou de todos os pecados, da morte e do poder do diabo; não com ouro ou prata, mas com seu santo e precioso sangue e sua inocente paixão e morte, para que eu o sirva em eterna justiça, inocência e bemaventurança, assim como ele ressuscitou da morte, vive e reina eternamente. Isto é certíssima verdade” (Martinho Lutero. Breve Catecismo); “O que você entende, quando diz que Cristo ‘foi concebido pelo Espírito Santo e nasceu da virgem Maria’?” (pergunta 35). Resposta: “Entendo que o eterno Filho de Deus, que é e permanece verdadeiro e eterno Deus, tornou-se verdadeiro homem, da carne e do sangue da virgem Maria, por obra do Espírito Santo. Assim ele é, de fato, o descendente de Davi igual a seus irmãos em tudo, mas sem pecado” (Catecismo de Heidelberg); “Quem é o Redentor dos escolhidos de Deus?” (pergunta 21). Resposta: “O único Redentor dos escolhidos de Deus é o Senhor Jesus Cristo que, sendo o eterno Filho de Deus, se fez homem, e assim foi e continua a ser Deus e homem em duas naturezas , e uma só pessoa, para sempre” (Breve Catecismo de Westminster). 13 2. Heresias Históricas e Tendências Hermenêuticas Ebionismo: Jesus era meramente um homem chamado por Deus, filho de José e Maria; não era Deus completamente (cristãos judaizantes). Às vezes recaía em um subordinacionismo, Filho é ontologicamente subordinado ao Pai; Gnosticismo: ensinava que Cristo não era Deus, mas, sim, um ser superior aos homens, considerado como uma das emanações da divindade; Docetismo (vertente do gnosticismo): dizia que o corpo de Cristo não era verdadeiramente humano. Era uma espécie de ilusão; Monarquianismo: era um equivocada defesa do monoteísmo, ele é subdividido em: a. Monarquianismo dinâmico (humanitarianismo): difundida por Paulo de Samosata (c. 260 d. C.), ensinava que devido ao recebimento do δύναμις do céu, ele (Cristo) passou a ser um mero portador do Λογος; b. Monarquianismo modalista (conhecido no Oriente como Sabelianismo, e no Ocidente como Patripassianismo): elaborada por Sabélio, presbitéro de Ptoleimada (c. 215 d. C.), dizia que não havia três pessoas, e, sim, três Πρόσωπατα (gr. faces, semblantes) de um só Deus. 14 Representação da Ideia Monarquianista Modalista Retirado de: DA COSTA, Hermisten Maia Pereira. Eu Creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São Paulo: Edições Parakletos, 2002, p. 234. 15 2. Heresias Históricas e Tendências Hermenêuticas Adocionismo: dizia que Jesus Cristo foi homem comum, sem qualquer reivindicação divina, até que, em um dado momento [impreciso de se dizer], Deus o “adotou” como Filho (provavelmente no seu batismo, ou na sua ressurreição). Arianismo (doutrina de Ário [c. 250-c. 336 d. C.]): dizia que só há um só Deus (Pai) não-gerado, sem começo, verdadeiro, único detentor da imortalidade, e que Jesus não era ὁμοούσιος (“mesma substância”) do Pai, mas ele era ὅμοιὅυσιος (“substância similar”) do Pai. Quatro (4) Implicações: a. O Filho é uma criatura de Deus; b. O Filho, como criatura de Deus, teve um começo e não é coeterno com o Pai (“Tempo houve em que ele não existia”); c. O Filho não tem comunhão substancial com o Pai; e d. O Filho estava sujeito ao pecado e à rebelião (tal como o diabo), não pecou porque foi envolvido pela graça preventivamente. 16 Representação da Idéia de Ário Retirado de: DA COSTA, Hermisten Maia Pereira. Eu Creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São Paulo: Edições Parakletos, 2002, p. 237. 17 2. Heresias Históricas e Tendências Hermenêuticas Apolinarismo (doutrina de Apolinário [c. 310-c. 390 d. C.], bispo de Laodicéia na Síria): defendia a divindade de Cristo, entretanto, dizia que, na Encarnação, a alma humana fora substituída pelo Λόγος divino. a. Isso significava que houve uma espécie de fusão do homem (carne) com o divino (Λόγος); b. Como elemento mais predominantemente forte era o divino, o Λόγος subjuga a carne e a controla, então esse era o motivo dele usar a terminologia “carne de Deus”, “carne divina”, “natureza encarnada da Palavra divina”. 18 Representação da Ideia de Apolinário Retirado de: DA COSTA, Hermisten Maia Pereira. Eu Creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São Paulo: Edições Parakletos, 2002, p. 239. 19 2. Heresias Históricas e Tendências Hermenêuticas Nestorianismo (Nestório, bispo de Constantinopla): ideia que dizia que Jesus Cristo era constituído por duas naturezas distintas e, consequentemente, por duas pessoas distintas. Ele, numa série de sermões proferidos em 428, declarou ser veementemente contra a designação dada à Maria: Θεοτόκος , “Mãe de Deus”, e preferiu usar a terminologia de que ela era Χριστοκος (“Mão de Cristo”) e/ou Θεοδόχος (“que recebe de Deus”). Considerava que a união entre as duas naturezas era de ordem moral, simpática e afetiva (não era do tipo ontológica). 20 Representação da Ideia de Nestório Retirado de: DA COSTA, Hermisten Maia Pereira. Eu Creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São Paulo: Edições Parakletos, 2002, p. 241. 21 2. Heresias Históricas e Tendências Hermenêuticas Eutiquianismo (Arquimadrita de um mosteiro em Constantinopla, foi discípulo de Cirilo de Alexandria): ideia que dizia que a encarnação era definida como sendo o resultado da fusão do divino com o humano em Jesus. Êutico disse que a natureza humana dele foi absorvida pela divina, de modo que dessa absorção nasceu uma “nova substância” híbrida, um “terceiro tipo de natureza”. Ou seja, ele não era nem homem nem Deus, pois era uma mistura das duas naturezas, mistura resultante não sendo definido o que era (o que foi chamado de tertiun quid.) 22 Representação da Ideia de Êutico (= Eutiques, Eutíquio) Retirado de: DA COSTA, Hermisten Maia Pereira. Eu Creio no Pai, no Filho e no Espírito Santo. São Paulo: Edições Parakletos, 2002, p. 242. 23 Quadro-Resumo: Heresias Históricas a respeito da Pessoa de Cristo Retirado de: Ferreira, Franklin e MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007, p. 488. 24 Ortodoxia: Definição Ortodoxia: vem de duas palavras: ὀρθός (orthos), que deriva de ὄρος (“colina”, “monte”), que significa “correto” (no sentido de erguer-se), “ereto (perpendicularmente)”, “honesto”, “(horizontalmente) nivelado”, “reto”, “vertical”, “não tortuoso”; δόξια (doksia), que deriva do verbo δοκέω (“pensar”, “considerar”), que significa “glória”, “dignidade”, “honra”, “louvor”, “adoração”, “glorioso”. A Ortodoxia, portanto, indica alguma coisa que é de natureza “honesta”, “reta”, “correta”, “certa”, “verdadeira” e que, por tal fato, é “digna de louvor”, é “honrosa”; Historicamente, essa palavra passou a designar um conjunto de doutrinas confessadas por toda a igreja e consideradas como verdadeiras e de acordo com as Sagradas Escrituras. 25 Estrutura do Estudo O nosso estudo da Cristologia: • É bíblico, porque sua fonte primeira se encontra nas Escrituras; • É teológico, porque a verdadeira teologia tem Cristo como doutrina fundamental; • É prático, porque direciona toda a nossa existência em torno de Cristo. A Estrutura do Nosso Estudo (de acordo com o tempo disponível): • A União das Duas Naturezas na Pessoa de Cristo; • A Kenōsis de Cristo: Entendendo a Kenōsis; Aplicando a Kenōsis. 26 A “UNIÃO HIPOSTÁTICA” DE CRISTO De que modo a natureza divina (“divindade”) de Cristo se relacionava com a sua natureza humana (“humanidade”)? Duas afirmações doutrinárias equivocadas (apropriadamente “heréticas”) sobre o relacionamento entre as duas naturezas da Pessoa de Cristo: HERESIAS SOBRE O RELACIONAMENTO ENTRE AS NATUREZAS DE CRISTO HERESIA PRESSUPOSIÇÃO BÁSICA Nestorianismo Duas naturezas em Cristo indicava a existência de duas pessoas distintas. Eutiquianismo As duas naturezas se “misturaram”, formando uma natureza híbrida. 27 A “UNIÃO HIPOSTÁTICA” DE CRISTO 1. 2. 3. 4. Alternativa para essa questão: a Doutrina da “União Hipostática” de Cristo. A natureza da União Hipostática: Não é Teantrópica; Pessoal; Inclui Atos e Qualidades Humanos e Divinos; Assegura a Presença Constante Tanto da Humanidade como da Divindade; ENTENDO A PALAVRA HIPÓSTASE: A palavra hipóstase deriva da palavra grega ὑπόστασις, termo que se origina de ὑπό (“sob”, “debaixo”, “através”) e ἳστημι (“permanecer”); Literalmente, significa “colocar debaixo”, “sustentar”; Figurativamente, representa concretamente essência ou abstrato certeza; Esse termo só se encontra em Hebreus 1.3, onde Cristo é a expressão exata do ser [ὑπόστασις] de Deus. 28 A “UNIÃO HIPOSTÁTICA” DE CRISTO Segunda Carta a Nestório (escrita por Cirilo): kath’ hypostasin enosis; “O Logos uniu a carne a si próprio” (kath’ hypostasin); 2º Artigo: “Duas naturezas inteiras e perfeitas, ou seja, a Divindade e a Humanidade, forma unidas simultaneamente na mesma pessoa” (Artigos Anglicanos”); “As duas naturezas inteiras, perfeitas e distintas – a Divindade a Humanidade – forma inseparavelmente unidas em uma só pessoa, sem conversão, composição ou confusão” (Confissão de Fé de Westminster, VII.II); Resume três verdades sobre Cristo: 1. Que ele é uma pessoa; 2. Que a união surge do fato de que as duas naturezas pertencem a uma e única pessoa; e 3. Que essa pessoa é o Senhor Jesus Cristo, o Filho de Deus, agente por detrás de todas as suas ações. 29 A IMPECABILIDADE DE CRISTO A Pergunta: “Cristo podia pecar?” A resposta: “Não!” O motivo: o “Qual de vocês pode me acusar de algum pecado? Se estou falando a verdade, porque vocês não creem em mim?” (Jo 8.46); o “É de um sumo sacerdote como este que precisávamos: santo, inculpável, puro, separado dos pecadores, exaltado acima dos céus” (Hb 7.26). o Ele era (e ainda é) Deus verdadeiro; sendo ele Deus e homem, e as duas naturezas viviam harmoniosamente, então se houvesse a possibilidade de pecar, ele não era Deus verdadeiro! Donald MacLeod diz que a impecabilidade de Cristo envolve dois elementos: 1. “Cristo estava isento de pecado real”; 2. “Cristo estava isento do pecado inerente”. 30 A IMPECABILIDADE DE CRISTO A Objeção: “Cristo era humano como nós e, portanto, podia pecar”; Representantes dessa ideia: Edward Irving; Karl Barth; C. E. B. Cranfield; “A carne de Cristo, como a minha carne, era, em sua própria natureza, mortal e corruptível” (Edward Irving); “Não deve haver nenhum enfraquecimento ou obscurecimento da verdade salvadora de que a natureza que Deus assumiu em Cristo é idêntica à nossa natureza como nós a vemos à luz da Queda. Se fosse de outra maneira, como Cristo poderia ser realmente igual a nós? Que ligação nós poderíamos ter com ele? Nós estamos diante de Deus caracterizados pela Queda. O Filho de Deus não somente assumiu a nossa natureza, mas ingressou na forma concreta da nossa natureza, sob a qual nós estamos diante de Deus como homens condenados e perdidos” (Karl Barth); “Por sarx hamartias Paulo queria dizer, obviamente, ‘carne pecaminosa’, isto é, natureza humana decaída” (C. E. B. Cranfield). 31 A IMPECABILIDADE DE CRISTO • Argumentos a Favor dessa ideia (a “Pecabilidade” de Cristo): “O que não é assumido não é curado” (uso indevido das palavras de Gregório de Nazianzo): Refutações: a. “Embora ele tenha se revestido, como dizem, de Adão, ele não era terreno como Adão, mas celestial e incomparavelmente superior ao que era terreno” (Cirilo); b. “Pois o que nasceu não foi uma natureza corrompida pelo contágio da transgressão, mas o único remédio para tais corrupções” (Santo Agostinho”); c. “Foi a natureza que foi recebida pelo Senhor de sua mãe, não os defeitos” (Leão); “Esse é o primeiro ponto do mistério da constituição de Cristo, o fato de ele receber a substância da virgem Maria decaída” (Edward Irving, in The Collected Writings of Edward Irving): Refutações: a. “O Espírito Santo fez a virgem gerar, mas ela gerou um corpo verdadeiro, tomado do corpo dela” (Leão). Ver Lc 1.35; 32 A IMPECABILIDADE DE CRISTO • Argumentos a Favor dessa idéia (a “Pecabilidade” de Cristo): “Se Cristo não fosse decaído, ele não seria como nós”: Refutação: a. “Ele tomou um corpo verdadeiro. Ele tomou uma alma racional. Ele viveu em nosso ambiente físico, social e espiritual. Ele participou de nossas dores, nossas tristezas e nossos temores – até mesmo a perda de Deus. O que mais podemos pedir?” (Donald MacLeod); “Cristo assumiu a natureza humana decaída porque é a única natureza humana que existe”: Refutação: a. Isso gera a idéia que a condição de ‘ser’ humano só é possível se for ‘decaído’! “Então”, argumenta MacLeod, “quer dizer que que ser decaído é parte da definição da natureza humana? Certamente que não! Se o fosse, então o primeiro Adão não teria sido um homem. De fato, nesses termos, Deus simplesmente não criou um homem. O que ele criou tornou-se homem somente pela queda. [...] O homem glorificado não seria humano”. 33 A IMPECABILIDADE DE CRISTO • Argumentos a Favor dessa idéia (a “Pecabilidade” de Cristo): “Se Cristo não tivesse uma humanidade decaída, ele não poderia ter sido tentado”: Refutação: a. Cristo não foi tentado por algo dentro de si: Ele não foi arrastado e atraído por seu desejo mal (Tg 1.14); não havia nenhuma lei do pecado em seus membros (Rm 7.23); o “príncipe deste mundo” não tinha influência sobre ele (Jo 14.30). REFLEXÃO: “Nós devemos tomar cuidado para não representar mal o efeito da integridade sem pecado de Jesus nesse momento. (...) [a resistência dele foi prolongada] Precisamente porque ele não cedeu facilmente e não era, como nós, uma presa fácil, [então] o diabo teve de utilizar todos os seus ardis e aplicar todos os seus recursos. O próprio fato de que ele era invencível significa que ele suportou a plena força da ferocidade da tentação, até que o inferno se retirou, derrotado e exausto. Contra nós, basta uma pequena tentação. Contra ele, Satanás foi forçado a ir até o seu limite.” (Donald MacLeod, A Pessoa de Cristo, p. 246). 34 A IMPECABILIDADE DE CRISTO Algumas citações: “O seu santo comportamento era necessário; era impossível que fosse de outro modo, senão que ele se conduzisse santamente, e que ele fosse perfeitamente santo em cada ato individual de sua vida... Era impossível que o Messias deixasse de perseverar em integridade e santidade, como fez o primeiro Adão” (Jonathan Edwards); “Quando o Logos entra em união com uma natureza humana, de modo a constituir uma única pessoa com ela, ele se torna responsável por tudo o que essa pessoa faz por meio da instrumentalidade dessa natureza... Caso Jesus Cristo pecasse, o Deus encarnado pecaria” (W. G. T. Shedd); 35 A KENŌSIS DE CRISTO Apresentando o “Problema”: Filipenses 2.7 (texto grego): ἀλλὰ ἑαυτὸν ἐκενωσεν μορφὴν δούλου λαβὼν, ἐν ὁμοιώματι ἀνθρώπων γενόμενος. (ênfase minha); O “Problema” reside no significado da palavra ἐκενωσεν. Teoria (“Teologia”) da Kenōsis (Representantes): Thomasius e Delitzsch (Alemanha); Charles Gore e H. R. Mackintosh (Inglaterra); P. T. Forsyth e David W. Forrest (Escócia); Crosby (EUA). Opositores da Teoria: Willian Temple. O que diz (ia) a Teoria Kenótica? 36 A KENŌSIS DE CRISTO Afirmações da Teoria Kenótica: “[a humilhação de Cristo consistia no] abstendo-se do exercício daquilo que possuía , ou até mesmo do próprio modo divino de ação” (Charles Gore); “O suicídio de Deus não é parte alguma da ideia kenótica, a qual é apenas o autodespojamento do poder moral do eterno Filho: ele retém sua consciência, mas renuncia às condições de infinitude e sua forma reproduzida” (P. T. Forsyth); “A condescendência em si consistiu no fato de Cristo ter abandonado a glória, prerrogativas e privilégios da divindade, e isso resultou em uma ‘vida completamente restrita aos limites da humanidade. Fora das condições impostas pela escolha da vida como homem, o Filho não possui nenhuma atividade ou conhecimento’” (MacLeod citando H. R. Mackintosh, em A Pessoa de Cristo); “[Cristo não reteve a sua Onipotência, mas realizou seus milagres] por virtudes de poder a Ele conferido pelo Pai, recebido em resposta à oração, e condicionado em exercício à Vontade Suprema à qual Ele submetia a sua própria vontade” (David W. Forrest). 37 A KENŌSIS DE CRISTO ENTENDO A KENŌSIS: A palavra ἐκενωσεν: “aniquilou-se” (ARC), “esvaziou-se” (NVI); Deriva do verbo grego κενόω, “ser vazio”, ou “esvaziado”, (figurativamente) “humilhar”, “neutralizar”, “falsificar” – a raiz primária é κενός, “vazio”. Da palavra κενός derivam-se mais duas palavra gregas: κενόδοξος, “arrogante, convencido”, e κενοφωνία, “discussão infrutífera”, “conversas vãs”, “pessoa que fala futilidades”. Significado Etimológico: • “Em o Novo Testamento, usada de modo figurado: (I) Esvaziar-se, i.e., despir-se de uma dignidade justa, descendo a uma condição inferior, humilhar-se (Fp 2.7); (II) Tornar vazio, vão, infrutífero (Rm 4.14; 1 Co 1.17). Consequentemente, mostrar que alguma coisa é sem fundamento, enganosa (1 Co 9.15; 2 Co 9.3)”. (Bíblia de Estudo Palavras-Chave, p. 2264, verbete 2758, “κενόω”). 38 A KENŌSIS DE CRISTO ENTENDO A KENŌSIS: O que significa, então, a kenōsis? Significa que Cristo, o Deus eterno e verdadeiro, assumiu a forma de servo, a forma de um homem frágil, deixando no céu a sua glória, sua majestade (Jo 17.5); “Ele possuiu toda a majestade da Divindade, realizou todas as suas funções e desfrutou de todas as suas prerrogativas. Ele foi amado por seu Pai e adorado pelos anjos. Ele era invulnerável à dor, frustração e perturbação. Ele existiu na serenidade límpida. Sua supremacia era total, sua satisfação era completa, seu contentamento era perfeito. Tal condição não era algo que ele havia conquistado por esforço, elas eram naturais e sempre foram assim, e não havia nenhuma razão pela qual elas devessem mudar” (Donald MacLeod, op. cit., p. 230); Cristo era Deus antes de vir à Terra e ainda o era quando, de fato, veio (Jo 8.58), mas ele preferiu não insistir nos seus direitos. 39 A KENŌSIS DE CRISTO 1. 2. ENTENDO A KENŌSIS: O que significa, então, a kenōsis? “Cristo, na verdade, não poderia desviar-se da divindade, mas ele a manteve escondida por certo tempo, a fim de que ela não fosse vista sob a fraqueza humana. Dessa forma ele colocou de lado a sua glória sob a perspectiva humana, não diminuindo-a, mas escondendo-a” (João Calvino); “[...] Esse é o incógnito mais profundo e a impossibilidade de conhecimento mais impenetrável que pode existir, pois o contraste entre Deus e um ser humano individual e isolado é o maior contraste possível, e é definitivamente qualitativo. Todavia, essa foi a sua vontade, sua livre vontade e, portanto, é um incógnito mantido por sua onipotência” (Martinho Lutero); Voluntariedade de abaixar-se: Ele mesmo decidiu assumir a forma de servo e a semelhança de homem; Após sua encarnação, decidiu abaixar-se cada vez mais. 40 A KENŌSIS DE CRISTO APLICANDO (“VIVENDO”) A KENŌSIS: Paralelo entre Fp 2.7,8 com Jo 13.2ss; O Deus Criador lavando os pés de sua criação! O que significa para nós a kenosis? Ela precisa ser mais do que um mero conceito teológico; É um princípio essencial, fundamental, para vida cristã. 41 A KENŌSIS DE CRISTO APLICANDO (“VIVENDO”) A KENŌSIS: Perguntas Cruciais aos Cristãos do Século XXI: 1. Estamos prontos para: • Servir aos outros? • Doar-nos integralmente à Obra do Senhor sem pensar em nossos interesses? • Pregar sem pensar em obter fama e sucesso? • Evangelizar com intuito apenas de fazer com que as pessoas conheçam a Cristo? • Discipular com intuito de fazer crescer a semente da Palavra? • Ajudar ser querer autopromoção e prestígio? • Amar incondicionalmente a todos? 42 A KENŌSIS DE CRISTO APLICANDO (“VIVENDO”) A KENŌSIS: Perguntas Cruciais aos Cristãos do Século XXI: 1. Estamos prontos para: • Sermos fiéis à Palavra de Deus? • Ensinarmos o fundamento para os “novos” antes de persuadi-los a buscar a presença de Deus? • Rejeitarmos todo e qualquer ensinamento e doutrina que seja contra a Palavra de Deus, mesmo que traga e faça chover milagres? • Abandonarmos os velhos modelos deteriorados de evangelismo? • Recusarmos as inovações infrutíferas, as revelações estranhas, as “novas ‘unções’”, os movimentos espirituais desprovidos de espiritualidade? 43 A KENŌSIS DE CRISTO COMO NÃO APLICAR A KENŌSIS: Deixar que o coração seja tomado pelo (a): Inveja; Arrogância; Malícia; Sentimento de superioridade; Ódio ao Próximo; Fanatismo e Radicalismo religiosos (“Farisaísmo”); Ambição desenfreada; Deixar que a mente seja poluída por: Heresias e Modismos; Insensibilidade Espiritual. 44 BIBLIOGRAFIA • CAMPOS, Heber Carlos. As Duas Naturezas do Redentor. [Coleção Fé Evangélica: A Pessoa de Cristo]. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004. • _____________________. A União das Naturezas do Redentor. [Coleção Fé Evangélica: A Pessoa de Cristo]. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004. • _____________________. A Humilhação do Redentor: encarnação e sofrimento. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. • FERREIRA, Franklin e MYATT, Alan. Teologia Sistemática: uma análise histórica, bíblica e apologética para o contexto atual. São Paulo: Vida Nova, 2007. • GEISLER, Norman. Teologia Sistemática.4 v. 1ª ed. [trad. Marcelo Gonçalves e Luís Aron de Macedo]. Rio de Janeiro: CPAD, 2010, vol. 2. • GILBERTO, Antonio.(ed.). Teologia Sistemática Pentecostal. 2ª ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2008. • CRONINGEN, Gerard van. Revelações Messiânicas no Velho Testamento. [trad. Cláudio Wagner]. Campinas: Luz Para o Caminho (LPC Publicações), 1995. 45 BIBLIOGRAFIA • GRUDEM, Wayne. Manual de Teologia Sistemática: uma introdução aos ensinos fundamentais da fé. [trad. Heber Carlos de Campos]. São Paulo: Editora Vida, 2001. • MACLEOD, Donald. A Pessoa de Cristo. Série Teologia Cristã. [trad. Valdeci da Silva Santos]. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2007. • SILVEIRA FILHO, José Valter. Teologia Sistemática: Cristologia e Soteriologia. Fortaleza: Seminário Teológico Cidade dos Funcionários (STCF), 2005. Apostila. • SOARES, Esequias. Cristologia: a doutrina de Jesus Cristo. São Paulo: Hagnos, 2008. • ZUCK, Roy B. (ed.). Teologia do Novo Testamento. [trad. Lena Aranha]. 1ª ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2008. 46 Recomendação Quem quiser esta aula introdutória à Cristologia, e outras que eu farei, é só acessar o blog e “esperar com paciência no Senhor”: Da Teologia e da Igreja 47