Aulas 5 e 6 – Funções da linguagem Elementos da comunicação Para que qualquer gênero textual se realize são necessários os seguintes elementos: Referente - contexto (REFERENCIAL) Emissor (EMOTIVA) (CONATIVA) Mensagem (POÉTICA) Código (METALINGUÍSTICA) (FÁTICA) Receptor Canal Mãos Dadas Não serei o poeta de um mundo caduco. Também não cantarei o mundo futuro. Estou preso à vida e olho meus companheiros Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças. Entre eles, considere a enorme realidade. O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas. Não serei o cantor de uma mulher, de uma história. não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela. não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida. não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins. O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente. (Carlos Drummond de Andrade) TIL José de Alencar I Capanga Eram dois, ele e ela, ambos na flor da beleza e da mocidade. O viço da saúde rebentava-lhes no encarnado das faces, mais aveludadas que a açucena escarlate recém aberta ali com os orvalhos da noite. No fresco sorriso dos lábios, como nos olhos límpidos e brilhantes, brotava-lhes a seiva d’alma. Ela, pequena, esbelta, ligeira, buliçosa, saltitava sobre a relva, gárrula e cintilante do prazer de pular e correr; saciando-se na delícia inefável de se difundir pela criação e sentir-se flor no regaço daquela natureza luxuriante. Ele, alto, ágil, de talhe robusto e bem conformado, calcando o chão sob o grosseiro soco da bota com a bizarria de um príncipe que pisa as ricas alfombras, seguia de perto a gentil companheira, que folgava pelo campo, a volutear e fazendolhe mil negaças, como a borboleta que zomba dos esforços inúteis da criança para a colher. AO VERME QUE PRIMEIRO ROEU AS FRIAS CARNES DO MEU CADÁVER DEDICO COMO SAUDOSA LEMBRANÇA ESTAS MEMÓRIAS PÓSTUMAS Ao leitor Que Stendhal confessasse haver escrito um de seus livros para cem leitores, coisa é que admira e consterna. O que não admira, nem provavelmente consternará, é se este outro livro não tiver os cem leitores de Stendhal, nem cinqüenta, nem vinte, e quando muito, dez.. Dez? Talvez cinco. Trata-se, na verdade, de uma obra difusa, na qual eu, Brás Cubas, se adotei a forma livre de um Sterne, ou de um Xavier de Maistre, não sei se lhe meti algumas rabugens de pessimismo. Pode ser. Obra de finado. Escrevia-a com a pena da galhofa e a tinta da melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio. Acresce que a gente grave achará no livro umas aparências de puro romance, ao passo que a gente frívola não achará nele o seu romance usual; ei-lo aí fica privado da estima dos graves e do amor dos frívolos, que são as duas colunas máximas da opinião. Mas eu ainda espero angariar as simpatias da opinião, e o primeiro remédio é fugir a um prólogo explícito e longo. O melhor prólogo é o que contém menos coisas, ou o que as diz de um jeito obscuro e truncado. Conseguintemente, evito contar o processo extraordinário que empreguei na composição destas Memórias , trabalhadas cá no outro mundo. Seria curioso, mas nimiamente extenso, aliás desnecessário ao entendimento da obra. A obra em si mesma é tudo: se te agradar, fino leitor, pago-me da tarefa; se te não agradar, pagote com um piparote, e adeus. Brás Cubas Violência versus compaixão Alba Zaluar Em 1968, na Inglaterra dos Beatles e dos sindicatos fortes, uma linda menina de olhos azuis – Mary Bell – foi julgada como adulto quando tinha 11 anos de idade. Ela havia assassinado sem nenhum motivo dois meninos de 3 e 4 anos provavelmente com outra amiga. Mary foi condenada, depois de uma série de reportagens e investigações apressadas em que a sua imagem foi pouco a pouco associada ao demônio. Ela ficou internada até 1980 em várias instituições, todas com o objetivo de recuperar crianças e adolescentes que ali cumprem pena, mas das quais saiu sem conseguir admitir o mal que havia feito. Em 1995 foi procurada por uma escritora interessada em entender por que as crianças matam. Foi nas longas conversas com essa mulher, durante as quais pôde reconstituir o seu passado, inclusive o descaso e a série de abusos sexuais sofridos por ela nas mãos de sua própria mãe com seus namorados, que Mary pôde finalmente um dia reconhecer ser a assassina e acrescentar: "O que fiz, não tem desculpa". Ela havia recuperado sua consciência moral, e os sentimentos da vergonha, da culpa e da compaixão. Não foi apenas a disciplina da instituição, a horta das verduras, o contato com animais, a oficina mecânica, ou as aulas que lhe permitiram atingir esse ponto. Foi algo muito mais profundo. A diminuição da idade na responsabilidade criminal de 18 para 16 anos poderia diminuir os efeitos da manipulação perversa do Estatuto da Criança e do Adolescente por impedir que jovens nessa faixa de idade sejam usados para garantir a impunidade de maiores. Mas, enquanto as medidas socioeducativas forem mera ficção na letra da lei, enquanto não houver atendimento médico e psicológico a adolescentes tão precocemente comprometidos com a crueldade e a indiferença ao próximo, tal mudança de nada adiantará. Se o sistema de Justiça no Brasil não for capaz de estancar as absurdas taxas de impunidade nos homicídios, se o sistema de punição específica para menores homicidas não tiver meios de lhes devolver a consciência moral mal formada ou desmantelada ao longo de suas abusadas vidas, continuaremos a ver os mesmos jovens a repetir tais atos sem remorso. Falta-lhes empatia, falta-lhes capacidade de avaliar o sofrimento que causam no outro, falta-lhes a fala que permite colocar-se no lugar do outro, ou seja, compaixão. Enquanto isso não acontecer, não resta senão a alternativa da prisão para que outras Lianas não sejam imoladas e não fique apenas o olhar doloroso de seu pai a dizer: foi a minha filha, mas poderia ter sido a sua.