Maria Lúcia Miranda Afonso Psicóloga com mestrado e doutorado em Educação; professora aposentada da UFMG e atual professora do Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA-BH Reflexões sobre a complexidade do trabalho social com famílias nos níveis de proteção social do SUAS Maria Lúcia Miranda Afonso Centro Universitário UNA - BH SEMINÁRIO Trabalho Social com Famílias: significado, concepções e metodologias - São Paulo, 30.05.2014 NECA - Associação dos Pesquisadores de Núcleos de Estudos e Pesquisas sobre a Criança e o Adolescente O trabalho social com famílias no SUAS e no PNCFC: breve contextualização • A PNAS (2004) como política ancorada no paradigma de direitos e que é parte do Sistema de Proteção Social (CF88). • As diretrizes gerais para o Trabalho Social com Famílias (TSF) no SUAS foram elaboradas a partir de uma concepção ampla e flexível de família, partindo dos princípios da matricialidade sociofamiliar e da responsabilidade do Estado em assegurar direitos e prover apoio para que as famílias, em situação de vulnerabilidade, tenham condições de exercer o seu papel protetivo junto aos seus membros (PAIF e PBF/SUAS). • No PNCFC (2006), as diretrizes são reiteradas, entendendo-se que o TSF deve ser desenvolvido nos diferentes níveis de proteção social: básica e especial de média e alta complexidade. Brevíssimo resumo das diretrizes do SUAS para o TSF Responsabilidade do Estado para apoiar as famílias, por meio de políticas públicas, para a ampliação de sua capacidade protetiva e superação de vulnerabilidades sociais e riscos pessoais e sociais; Ampliação do acesso a direitos de forma integrada às demais políticas públicas, fortalecendo a cidadania; Participação social e construção coletiva no contexto sociocultural; Construção de autonomia e projetos de vida individual e coletivos; Fortalecimento de vínculos familiares, comunitários e sociais, inclusive com transformação das relações, quando necessário para superar vulnerabilidades, apoiar projetos e transformar as condições de vida. Reconhecimento e respeito à diversidade (familiar, cultural, etc.); Promoção da igualdade dentro de uma concepção de cidadania emancipatória (gênero, etnia, gerações, etc). Desafios colocados para o TSF a partir da complexidade do SUAS • As diretrizes básicas são mantidas para os diferentes níveis de proteção. Mas surgem desdobramentos, também abordados aqui de maneira não exaustiva; • Em 2009, as Orientações Técnicas para os Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes. As diretrizes para o TSF são aprofundadas. Reconhece-se a relação entre a violação de direitos com a questão social e a necessidade do apoio sociofamiliar, dentre outros; • Em 2012 e 2013, os cadernos do PAIF: avanços na metodologia de TSF, ligada à territorialidade, com sugestão de uso da pedagogia problematizadora de Freire e da pesquisaação. O TSF nas Orientações Técnicas • Acompanhamento e inserção social das famílias para fortalecimento de sua função protetiva, preservação dos vínculos e reintegração familiar; • Articulação intersetorial com outras políticas públicas e órgãos do SGD-CA; • Relação do serviço com a família: realização de atividades diversas que favorecem a aproximação entre as famílias, crianças e adolescentes, e, ainda, a aproximação das famílias entre si, de modo a construir uma rede de apoio mútuo, identificação e trocas de experiência; • Fortalecimento de vínculos, emancipação e inclusão social das famílias, por meio do acesso às políticas públicas e às ações comunitárias; • Estudo diagnóstico: recomendações para abordagem da família (conhecer as condições materiais, as relações familiares, as vulnerabilidades, a inserção na rede, e assim por diante, buscando preservação de vínculos e reintegração familiar a família de origem e, quando isto não é possível, a colocação em família substituta); • O estudo diagnóstico leva a um Plano de Atendimento Individual e Familiar, que deve ser articulado à rede de serviços. Nos diferentes níveis de Proteção • Para superação do assistencialismo e promoção do paradigma de direitos, a questão que se coloca não é “apenas” promover acessos (seguranças básicas) e superar vulnerabilidades, mas também fortalecer os vínculos (familiares, comunitários, social), promoção da igualdade e da autonomia, participação na cultura, na sociedade e no controle social das políticas públicas e buscar a articulação com as demais políticas públicas para a consolidação da proteção social; • Nas proposições da política: cidadania emancipatória. • Mas será que, na prática dos serviços, tais concepções estão sendo desenvolvidas da mesma maneira na PSB e na PSE? • Será que a situação de violência/violação de direitos introduz dificuldades específicas para o TSF? Não apenas pelas dificuldades de compreender a violência relacionada à questão social, mas principalmente pelas dificuldades de superação das vulnerabilidades e das situações de violência imbricadas na questão social? Reflexões a partir de dados empíricos (1) • Os dados apresentados nesta seção do powerpoint foram retirados da pesquisa realizada para a Prefeitura de BH: • MIRANDA, Geralda Luiza de. Atendimento à criança e ao adolescente na assistência social: possibilidades e desafios do acolhimento institucional. Relatório de pesquisa. Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gestão e Políticas Públicas – Publicus, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2013. - É uma pesquisa bem ampla, mas vou me referir apenas a alguns dados sobre o TSF no Acolhimento Institucional (A.I.). - - É uma pesquisa que se orienta pelas diretrizes do SUAS, ECA, Orientações Técnicas e demais normativas correlatas. Dados empíricos (Miranda, 2013) • A pesquisa é ampla: vários dados mostram avanços no • • • • • • • • reordenamento do A.I., tais como: 80,3% dos casos foram discutidos na rede (SUAS, SGD, rede ampla); Mas o TSF apresenta dificuldades. Antes de abordá-las, é interessante ver os dados sobre os principais motivos de entrada e de saída das cr/ad do A.I.; - Entrada: toxicomania ou prisão dos pais (28%); pobreza (6,9%), negligência (18,3%), violência física (14,5%) e violência sexual (6,7%). Notam-se diferenças com os dados de uma década atrás; Dados empíricos (Miranda, 2013) • - Motivos de saída em 2012 (totais para Abrigo, Casa-Lar • • • • • • • e Casa de Passagem). Total de casos 561 (100%): Reinserção Familiar 25,5%; Inserção Familiar 22,6%; Transferência 20%; Evasão 30,7%; Falecimento 1,2%; Há grande diferença entre meninos (57,6%) e meninas (42,4%), em relação ao tipo de violência e abandono. Questões de gênero e raça/etnia – como trabalhar no PSE? Dados empíricos (Miranda, 2013) • Para o total de crianças cujos pais não tiveram o poder familiar destituído (N=384, 84,2% do N total= 561): • • - A maioria possui mãe, pai e/ou outros parentes - 47% e 55,6% são visitadas pelo pai ou pela mãe, respectivamente. - 25,5% são visitadas pelo irmão, 35,4%, por parentes - 10,8% e 11,5% visitam os pais e/ou mães, - 19,9% visitam irmãos, e 14,7% outros parentes. - 3,6% e 6,7% das crianças e adolescentes que possuem pai e ou mãe estão abrigadas na mesma regional de residência desses parentes, respectivamente. Dados empíricos (Miranda, 2013) • Mantido o poder familiar, a família deve ser alvo de atividades desenvolvidas pela unidade de acolhimento e dos serviços do SGD, Rede Suas e Rede de Políticas Sociais (Orientações Técnicas); • - 43% das famílias são atendidas em programas sociais (a maioria na própria PSE ou no CRAS). Mas... • - Baixa inserção em programas de transferência de renda, considerando que 32 crianças e adolescentes foram abrigadas pelas condições de pobreza; • - Baixa inserção em serviços da área da Saúde, sendo que registrava-se 104 pais toxicômanos ou doentes e famílias com negligência ou violência (física, sexual etc.). Dados empíricos (Miranda, 2013) • Atividades desenvolvidas com as famílias (número de citações= 287): • Visita domiciliar 74, • Contatos telefônicos 36, • Atendimento 24, • Reuniões 23, • Atendimento familiar 22, • Atendimento individual 14, • Encontros com famílias 13, • Festas comemorativas 12, • Orientações 11, • Outras • - Nota-se diversidade de nomenclaturas para mesma atividade. Reflexões sobre os dados empíricos • Insuficiência de diretrizes (e parâmetros – como já demandava o PNCFC, em 2006) para oferecer/viabilizar metodologias (para o TSF na PSE) consistentes com os objetivos do SUAS como política de promoção de direitos; • - Dificuldade de Incorporação de diretrizes existentes para o TSF: poderia revelar a dificuldade de incorporação das novas concepções de família. E isto não apenas no A.I. mas também na rede que se articula com o A.I.? • É importante pensar a questão de gênero e etnia das famílias e tentar vinculá-la à questão social e à questão da cidadania? Em consultorias... Mais reflexões • Dificuldades envolvidas na construção de metodologia no • • • • PAEFI: Construção de vínculo das famílias com o serviço e acompanhamento X Responsabilização das famílias; Tempo da criança x tempo da família x tempo do serviço; Dificuldades de introduzir as formas grupais e coletivas de TSF – diferenças com a PSB – na concepção de uma politica de direitos e de uma cidadania emancipatória (não apenas acessos mas também inclusão e participação); Diferenças na articulação intersetorial: refletem também diferenças de concepções de família e de TSF? Questões ao longo do caminho (1) Desafio de desenvolver o TSF na PSE considerando as complexidades na direção de uma cidadania emancipatória (não “apenas” os acessos mas também a inclusão social, o sentimento de filiação, a participação na sociedade e na cultura). - Estamos conseguindo pensar a cidadania da família como cidadania emancipatória na PSB e na PSE? • A situação de violência/violação de direitos traz especificidades mesmo quando sabemos da sua correlação com a questão social, pois o trabalho de empoderamento pode ser bem mais complexo? • - Que impactos isto traz para o trabalho interdisciplinar na equipe multiprofissional (trabalho com subjetividade & condições de vida e cidadania) Questões ao longo do caminho (2) • Pessoal técnico nos diz que falta uma metodologia para o TSF na PSE e para a articulação de rede. • - Na PSB, há dificuldade de fazer o acompanhamento integrado das famílias do território que também estão na PSE, essa dificuldade se refere não apenas à integração entre PSB e PSE mas também à integração da rede. • - Nesse sentido, é importante pensar na articulação dos programas voltados para a família (PAIF, Família-Escola, PSF e outros existentes) com a PSE para atendimento dessas famílias no território ou pelo menos de acordo com os princípios da territorialização. • - Como fazer valer o princípio de territorialização na PSB e na PSE? • - Como trabalhar as demandas na PSB e na PSE para a cidadania emancipatória? O trabalho com coletivos? A coletivização das demandas a partir das violações, buscando fazer valer o paradigma de direitos? Obrigada! • Divulgação de site com materiais educativos para trabalho com direitos humanos e download gratuito www.recimam.org