TRABALHO DECENTE E A BANALIZAÇÃO DA EXPLORAÇÃO. Kátia Magalhães Arruda SUMÁRIO 1. 2. 3. 4. A banalidade do mal A reconstrução dos direitos humanos A banalidade da exploração: 3.1. Desemprego e Trabalho Informal 3.2. Trabalho Infantil 3.3. Acidente de Trabalho 3.4. Trabalho Forçado 3.5. Terceirização O papel da justiça do trabalho na efetivação do trabalho decente 2 1. “A BANALIDADE DO MAL” CONCEITO DE HANNAH ARENDT O conceito de “banalidade do mal”, advém do trabalho forçado e do extermínio de judeus na II Guerra Mundial; Adolf Eichmann – Executor-chefe do III Reich – responsável pela “solução final”: extermínio dos judeus; “Banalidade do mal” como repetição de atos e comportamentos dentro de um sistema, sem questionar sua crueldade ou suas consequências: tortura, violência, exploração. 3 QUEM FOI HANNAH ARENDT? Pensadora judia. Foi impedida de defender sua tese para lecionar na Universidade em 1933. Fugiu da Alemanha para Paris, onde ajudava crianças expatriadas. Após sua segunda prisão, mudou para os EUA, onde residiu até a sua morte, em 1975. Hannah Arendt (1906 – 1975) 4 HANNAH ARENDT O genocídio foi possível não apenas pela vontade de seus generais, mas pela banalidade em que foi admitido, abdicando da capacidade de pensar” Sobre Eichmann: “o crime era enorme, mas o criminoso era medíocre” 5 2. A RECONSTRUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS Necessário combate ao totalitarismo, em que tudo é possível para quem tem o poder; Totalitarismo e Neoliberalismo O mundo moderno deveria caminhar em sentido contrário ao totalitarismo, com predomínio da pluralidade e diversidade, mas persiste a miséria, a violência, o terrorismo, a exclusão. 6 A RECONSTRUÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS Retomar os valores consagrados na justiça: distribuição equitativa de bens; repúdio à tortura e punições desproporcionais; resgatar o homem como “valor-fonte”; - centralizar o homem em seu valor superior, que é a sua própria condição humana. “A essência dos direitos humanos é o direito a ter direitos.” Hannah Arendt “Contraponto: Herrera Flores: liberdade e igualdade são duas faces da mesma moeda – não há liberdade sem oportunidades e bens iguais 7 3. A BANALIDADE DA EXPLORAÇÃO 1. 2. 3. 4. 5. Desemprego e trabalho informal Trabalho infantil Acidente de trabalho Trabalho escravo Terceirização 8 3.1 DESEMPREGO E TRABALHO INFORMAL Trabalho Informal = Trabalho Precário X Trabalho formal = Trabalho não precário? Trabalhadores informais representam 22,2% do total de empregados (formais e informais) *pesquisa FGV Fevereiro/2012. Segundo o IPEA: crescimento de 43,5% no emprego formal nos últimos anos. Pejotização: “A empresa do eu sozinho”. Lei 11.196/2005, art. 129: possibilita a prestação de serviços intelectuais e artísticos de pessoa jurídica 9 3.2 TRABALHO INFANTIL NO BRASIL 10 TRABALHO INFANTIL NO BRASIL Constituição Federal: EC nº 20 – 16 anos de idade (14 a 16 na condição de aprendiz). No Brasil: 1992: 8,4 milhões de crianças e adolescentes (19,6% do total) 2011: 3,6 milhões (8,6% o total) *Fonte: IBGE Maior percentual é de negros, pardos, oriundos das áreas rurais (60%) do Norte-Nordeste. No caso de trabalho urbano-metropolitano, as taxas são mais elevadas no Sul e Sudeste. 11 CONVENÇÃO Nº 182 DA OIT E AS PIORES FORMAS DE TRABALHO INFANTIL: a) o trabalho escravo ou semiescravo (art. 144 do CPB); b) a prostituição e pornografia de menores (art. 244-A do ECA); c) uso de crianças para atividades ilícitas; inclusive produção e tráfico de entorpecentes (art. 239 do ECA); d) recrutamento de crianças para conflitos armados; e) o trabalho prejudicial à saúde e segurança (lixo, fumo, carvão). Trabalho doméstico (Decreto nº 6.481/2008). 12 3.3 ACIDENTE DE TRABALHO O Brasil é o quarto país do mundo em acidentes fatais no trabalho. Os trabalhadores terceirizados sofrem cinco vezes mais acidentes do que os empregados diretos. 13 ACIDENTE DE TRABALHO 14 F FONTE: ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL 15 ACIDENTE DE TRABALHO 16 JURISPRUDÊNCIA DO TST Súmula nº 378 ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº 8.213/1991. CONSTITUCIONALIDADE. PRESSUPOSTOS. (...) III – O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego, decorrente de acidente de trabalho, prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/1991. Súmula nº 440 AUXÍLIO-DOENÇA ACIDENTÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO. RECONHCIMENTO DO DIREITO À MANUTENÇÃO DE PLANO DE SAÚDE OU DE ASSISTÊNCIA MÉDICA. Assegura-se o direito à manutenção de plano de saúde, ou de assistência médica, oferecido pela empresa ao empregado, não obstante suspenso o contrato de trabalho em virtude de auxíliodoença acidentário ou de aposentadoria por invalidez. 17 3.4 TRABALHO FORÇADO 18 TRABALHO FORÇADO - Convenções da OIT – nºs 29 (1930) e 105 (1957): Definem o trabalho forçado como o trabalho executado involuntariamente (com ausência ou fraude no consentimento) e sob ameaça de pena (violência, punições financeiras e perda de direitos). - Dois casos históricos: a. denúncia de D. Pedro Casaldáliga em 1971, no Pará, em fazendas multinacionais; b. a fuga de José Pereira e “Paraná” em 1989 (Pará). - Entre 2003 e 2010 foram resgatadas 32.986 pessoas em situação de trabalho forçado no Brasil; - 68,4% das metas do Plano Nacional para a erradicação do trabalho escravo foram cumpridas (OIT). O menor avanço está na impunidade, na garantia de emprego e na reforma agrária. 19 TRABALHO ESCRAVO ESTATÍSTICAS EM 31/12/2014 Trabalho escravo Ranking 2010 2011 2012 2013 2014 Nº de trabalhadores envolvidos Estados campeões 4163 3929 2952 1716 2493 GO,PA, SC,MA GO, MS, PA, TO, MA, PA PR, AM MA, PA, TO, SP MG, PA, TO, PI Nº de escravos libertados Estados campeões 2914 2095 1089 1241 GO,PA, SC,ES GO, MS, PR, TO, PA, MG PA, AM SP, PA, CE, MS PI, PA, TO, MG 2044 Soluções Estruturais: política de geração de emprego e renda; reforma agrária e qualificação; sansões radicais e imediatas. Fonte: Comissão Pastoral da Terra (Relatório Conflitos de Campo no Brasil – 2014) 20 AÇÕES FISCAIS EM 2014 FONTE: MTE 21 PRECEDENTES NA JURISPRUDÊNCIA DO TST RECURSO DE REVISTA – DANO MORAL COLETIVO – REDUÇÃO DE TRABALHADOR A CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO – REINCIDÊNCIA DAS EMPRESAS - VALOR DA REPARAÇÃO. Recurso de revista não conhecido. (TST – RR 178000-13.2003.5.08.0117; Relator: Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho; 1ª Turma; DEJT 27/8/2010) Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRABALHO DEGRADANTE. CARACTERIZAÇÃO. Recurso de revista conhecido e provido. (TST – RR 2652-94.2010.5.08.0000; Relator: Min. Maurício Godinho Delgado; DEJT 16/12/2011) RECURSO DE REVISTA. 1. EFEITOS DA REVELIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. DEFESA APRESENTADA PELA TOMADORA DOS SERVIÇOS. REVELIA E CONFISSÃO FICTA DA PRESTADORA DOS SERVIÇOS. Recurso de revista não conhecido. 3. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS (TST – RR 345-77.2010.5.08.0127 ; Relatora: Min. Dora Maria da Costa; DEJT 16/12/2011) NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. AMBIENTE DE TRABALHO DEGRADANTE. (TST – ARE 49300-54.2009.5.09.0093; Relator: Min. Emmanoel Pereira; DEJT 15/12/2011) 23 Escravos da moda. Quem se importa com a procedência? 24 3.5 TERCEIRIZAÇÃO 25 Oficina em que eram costuradas peças da le lis blanc TERCEIRIZAÇÃO (PARÂMETROS PARA ANÁLISE) Principais questionamentos: Requisitos atuais de licitude, Isonomia de direitos e Responsabilidade (solidária ou subsidiária) Regra Geral: Responsabilidade subsidiária Responsabilidade solidária: nas contratações ilícitas ou fraudulentas Responsabilidade solidária da empresa: a) danos materiais e morais oriundos de acidente de trabalho. (TST-RR nº 152100-50.2005.5.17.0006; relator: Min. Kátia Arruda); b) danos ao meio ambiente do trabalho. 26 PRECARIZAÇÃO Efeitos da terceirização sobre as condições de trabalho: Diminuição dos benefícios sociais ............................................72% Salários mais baixo.................................................................67,5% Ausência de equipamentos de proteção/falta de segurança/ insalubridade............................................................................2,5% Trabalho menos qualificado...................................................17,5% Trabalho sem registro..............................................................7,5% Perda de representação sindical.................................................5% Jornada mais extensa..................................................................5% Fonte: DIEESE: Departamento Intersindical de Estatística e Estudos SócioEconômicos, 1993, apud BATISTA, Eraldo Leme. Terceirização no Brasil e suas implicações para os trabalhadores. Campinas, SP:[s.n.], 2006. 27 Terceirização no Brasil, visando principalmente à redução dos custos do trabalho, provoca precarização, discriminação, redução de direitos e aumento dos acidentes de trabalho. Alta rotatividade: “Somente 1/3 dos trabalhadores demitidos consegue emprego nos 12 meses seguintes” Márcio Pochmann Não cria empregos, uma vez que somente substitui os empregados diretos pelos28 terceirizados. 4. O PAPEL DO DIREITO DO TRABALHO NA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA O trabalho como elemento de dignidade – em sua perspectiva ética o trabalho digno é direito fundamental do trabalhador e dever fundamental do tomador de serviços. A efetividade do artigo 7º da Constituição Federal: “São direitos dos trabalhadores (...) além de outros que visem a melhoria de sua condição social”. O patamar civilizatório do direito do trabalho: normas e convenções internacionais, Constituição Federal e CLT – saúde e segurança no trabalho. O direito do trabalho é um mecanismo de 29 construção social da igualdade A consolidação do trabalho decente (OIT) : “Aquele desenvolvido em ocupação produtiva (postos de trabalho que possuam qualidade aceitável), justamente remunerada (redistribuição de renda para o desenvolvimento) e que se exerce com condições de liberdade, equidade (igualdade nas relações laborais – inclusive de gênero), seguridade e respeito à dignidade da pessoa humana.” Trabalho digno = trabalho minimamente 30 protegido. promoção dos direitos fundamentais no Segundo a OIT, trabalho; conceito de trabalho - geração de mais e decente exige melhores empregos; políticas públicas que - extensão da estabeleçam: proteção social; - fortalecimento do diálogo social. 31 SÓ HÁ DESENVOLVIMENTO COM JUSTIÇA SOCIAL “O crescimento econômico não é um fim em si mesmo, mas um meio de alcançar avanços sociais e benéficos para a população.” Amartya Sen “Para haver crescimento econômico, é necessário superar a exploração e a desigualdade” Paul Krugman (Prêmio Nobel de Economia) 32 Nossa reação diante da exploração é: Concordância? Indiferença? Indignação? O holocausto de hoje não é o extermínio dos judeus, mas a banalidade da exploração, o agravamento da exclusão social. A indignação leva à solidariedade que “é o sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana” Franz Kafka 33 34