POESIA MARGINAL Ana Cristina César Chacal – Ricardo carvalho Duarte Cacaso – Antônio Carlos de Bristo Paulo Leminski Francisco Alvim Leminski Nasceu em Curitiba, PR, em 1944, foi tradutor, professor de história e de judô, publicitário, romancista e músico. Sua poesia, altamente elaborada e construída, era sintética, concisa e debochada. Caetano Veloso dizia que ele misturava a poesia concreta com a literatura beatnik dos americanos dos ano 50. Foi letrista de MPB e publicou vários livros independentes – reunidos pela primeira vez em 1983, na coletânea Caprichos & relaxos. Leminski morreu em 1989. POESIA MARGINAL Você provavelmente já se acostumou a ouvir a palavra marginal usada para xingar "maconheiros" e "trombadinhas” ou então para designar algumas avenidas que contornam a Florianópolis. Mas quando esse termo é aplicado a poetas e poesia, torna-se um rótulo confuso. É natural que desperte indagações do tipo: Como um poeta pode ser marginal? Existe uma poesia marginal? Marginal é o poeta ou a poesia? E por aí afora. POESIA MARGINAL A palavra marginal, sozinha, não explica muito. Veio emprestada das ciências sociais, onde era apenas um termo técnico para especificar o indivíduo que vive entre duas culturas em conflito, ou que, tendo-se libertado de uma cultura , não se integrou de todo em outra, ficando à margem das duas. Cultura, no caso, não significa grau de conhecimento, e sim padrão de comportamento social. POESIA MARGINAL Foi esse sentido, de elemento não integrado, que passou da sociologia para o linguajar comum: um delinquuente, um indigente, e mesmo qualquer representante de uma minoria discriminada foram classificados de marginais. Tudo que não se enquadrasse num padrão estabelecido ficou sendo marginal: cabelo comprido, sexo livre, gibi, gíria, rock, droga e outras bandeiras recentes que tipificam um fenômeno de rebeldia das novas gerações ocidentais denominado justamente contracultura. POESIA MARGINAL Tratando-se de arte, toda obra e todo autor que não se enquadram nos padrões usuais de criação, apresentação ou veiculação seriam também marginais. Na verdade, marginal é simplesmente o adjetivo mais usado e conhecido para qualificar o trabalho de determinados artistas, também chamados independentes ou alternativos (por comparação com a imprensa nanica, teoricamente autônoma em relação à grande imprensa e contestadora em relação ao sistema). POESIA MARGINAL Dizer que um poeta é marginal equivale a chamá-lo ainda de sórdido e maldito (por causa da noção de antissocial), mas esses adjetivos soam mais como elogio porque viraram sinônimos de alternativo e independente. Ou seja, o sentido deixa de ser pejorativo e se inverte a favor de quem recebe o rótulo, muito embora alguns dos assim chamados prefiram outros rótulos ou não aceitam nenhum. POESIA MARGINAL À primeira vista, essa inversão de valores e outras formas de "não enquadramento" serviriam como ponto de partida para tentarmos entender o que pode ser chamado de poesia marginal, quem pode ser chamado de poeta marginal e por que nem todos estão de acordo com essa maneira de chamar. Fiquemos com o rótulo mais colado, ainda que provisoriamente. E vamos, por parte, testar à margem de quê estão esses poetas e essa poesia, do ponto de vista da perspectiva histórica, da proposta artística, da conjuntura política, do contexto cultural e dos esquemas comerciais de consumo. POESIA MARGINAL “Poesia Marginal” reúne os poetas, ditos marginais, Ana Cristina César, Cacaso, Chacal, Francisco Alvim e Paulo Leminski. Cinco vozes dissonantes, mas que têm um traço comum: passaram pela experiência da poesia marginal. CARACTERÍSTICAS DA POESIA MARGINAL Explorando todas as possibilidades do papel – folhetos, jornais, revistas, manuscritos –, a poesia chegou aos muros através de pichações, foi às praças, aliou-se à música, organizou exposições. A poesia que floresceu nos anos 70 é inquieta, anárquica: não se filia a nenhuma estética literária em particular, embora se possa encontrar nela traços de algumas vanguardas que a precederam, tais como o Concretismo dos anos 50/60 ou o poema-processo. CARACTERÍSTICAS DA POESIA MARGINAL Os poetas jovens foram, principalmente, contra. Contra as portas fechadas da ditadura, contra o discurso culto, contra a poesia tradicional e/ou universal. A poesia saiu da página impressa do livro e ganhou as ruas. Ela podia ser lida nos muros, nos banheiros públicos, nas margens de outros textos em forma de uma carona literária. Ela estava em folhetos mimeografados, distribuídos de mão em mão, nos bares, nas praias, nas feiras, em qualquer parte. CARACTERÍSTICAS DA POESIA MARGINAL Recuperaram-se alguns laços com a produção do primeiro Modernismo (1922) – poemas-minuto, poemaspiada; experimentaram-se técnicas, como a colagem e a desmontagem dadaístas; praticam-se formas consagradas, como o soneto ou o haicai: tudo foi possível dentro do território livre da poesia marginal. Constituindo um antagonismo total em relação aos recursos poéticos tradicionais e questionando veementemente o conceito de poesia, os marginais – assim como os concretistas – procuraram aproximar-se da comunicação visual e explorar a palavra em várias dimensões. CARACTERÍSTICAS DA POESIA MARGINAL A proximidade com as artes visuais e plásticas provoca um diálogo entre os poetas concretos e os poetas marginais. Técnicas próprias de outras artes passam a ser usadas para compor o poema – colagens, desenhos, grafismos, fotografias (como ressaltado anteriormente) –, provocando uma linguagem visual fragmentária. Note a “brincadeira” com os sons e escrita: a aliteração do S; a ausência do O; a duplicidade do nome “Sara” (nome e verbo). Poema que tematiza o ato de escrever, metalinguagem. O título nos remete à Ana Cristina Cesar e o final é feito com um trocadilho: voceu. A falta de letras nos remete ao “quase” O eu-lírico mostra o paradoxo do sentimento dizendo que é da ausência que nasce o sentir. Leminski, de forte origem concretista gosta de brincar com as palavras, com os significantes e significados, como o verso: “sinto muito” o qual dá ideia de desculpa ou do sentir muito. A efemeridade do desejo e do amor. Poema metalinguístico. No poema, o sentido do provisório está impresso – principalmente no fim do poema quando simplesmente é suspenso o verso pelos dois pontos. Além de ser o poema uma metáfora da vida: uma página em branco. Poema metalinguístico. Neste poema, Leminski discorre sobre o ato de fazer versos e o poder das palavras. Não adianta técnica pois a poesia é maior que isso, é sentimento. Notar no sexto verso a aliteração. O poema se diz utilitário, pois ao poeta cabe dar voz dos que não têm vez. Notar a paronomásia no jogo sabor/saber da primeira estrofe. Na segunda estrofe há o jogo intertextual com o herói de Cervantes: Quixote, o que lutava contra os moinhos de vento. Ser poeta é poder de luta. acreditar nesse Ainda na 2ª estrofe temos a figura de linguagem chamada anáfora, na repetição dos dois versos finais. A última estrofe é um recado aos que fazem arte pela arte, pois o poema é sangue e luta. Poesia fragmentária, telegráfica. Escrever é ser escrava do tempo e sentimento, não há regras. Em tempos de repressão política, de ditadura, não se podia “falar”. O silêncio, de forma “paradoxal” é o grito. A censura não deixava espaço pra voz. Crítica à ditadura militar. Repare na gradação do 6º verso: a “inteligência” militar vem por último. O “ele” (dele), na certa, é um general opressor, dos “negros verdes anos”. De forma sincopada a voz de quem precisou se esconder, na época da repressão. Uma paródia da oração, demonstrando a solidão dos duros tempos. A rima dá o tom de prece. Notar, ainda, a grafia “mi” em vez de “me”, demonstrando o registro oral. A figura do general nos remete á ditadura militar; de outro, o pássaro é o poeta que mesmo sem forças resiste. No meio do poema, formatados no meio da página vemos a anáfora, ressaltando que o poeta estava atento à sua época. No 12º verso, a conjunção adversativa demonstra que apesar dos tempos duros, a poesia tem seu poder de luta. Bem ao gosto da poesia marginal, o poeta brinca com os tipos e duplo sentido das palavras. O poeta joga com as estrofes na página em branco. Notar que Chacal usa a linguagem coloquial: pronome pessoal / entre. O certo seria: “entre mim e...” A anáfora – repetição – nas estrofes reforça a sonoridade do poema. O eu-lírico e sua solidão. Os poetas marginais mesclam, fundem poesia e vida. Neste poema, o corpo, ao contrário da escrita sempre tão marginal, tem a vontade de permanecer. Ana Cristina escreve desespero do sangue. Uma posição demolidora de questionamento. com o sarcástica, eterno FIQUE ATENTO... Os poetas marginais bebiam de todas as fontes: do modernismo à vanguarda concretista. As poesias são curtas, rápidas, poucos versos, falavam do “aqui, agora”. É conhecida também como Geração-mimeógrafo. O tropicalismo, que sob o lema de “sem lenço e sem documento”, abriu espaço para o movimento marginal, questionando os padrões culturais estabelecidos (contracultura) em busca de raízes novas, identificadas com o momento brasileiro. FIQUE ATENTO... A poesia marginal é mutante, anárquica, desestruturante, linguagem fragmentária e visual, poesia de captação de flagrantes e de domínio público com os grafites. A poesia marginal posiciona-se contra a poesia estabelecida, consagrada, das editoras, das academias. Ana Cristina Cesar dizia que o feminino talvez fosse mais terra, mais violência, contestando assim a visão tradicional que a mulher deve escrever apenas sobre coisas diáfanas, leves etéreas etc. FIQUE ATENTO... A repressão e a censura da ditadura atingiu os estudantes, intelectuais e classe média, fazendo com que a poesia fosse produzida de forma alternativa.