002498_Inicio.book Page 11 Monday, September 29, 2003 3:05 PM Problemas Ambientais, Ética e Política Ambientais: os riscos ecológicos como desafio para a ética do discurso *1 ENVIRONMENTAL PROBLEMS, ENVIRONMENTAL ETHICS AND ENVIRONMENT POLITICS: THE ECOLOGICAL RISKS AS CHALLENGES FOR DISCOURSE ETHICS Resumo O presente tratado oferece um panorama sociológico do desenvolvimento da política ambiental moderna, dos novos movimentos ambientalistas e seus paradigmas, bem como uma reflexão ético-discursiva (diskursethisch) sobre as relações problemáticas entre o ser humano e a natureza. Essa reflexão estará vinculada à visão empírica do problema por parte dos agentes de políticas ambientais (a ser descrita), sistematizará o teor ético das diferentes perspectivas e fundamentará, no âmbito da ética do discurso, um tratamento social da natureza pleno de responsabilidade.2 Palavras-chave MEIO AMBIENTE – ECOLOGIA – ÉTICA AMBIENTAL – POLÍTICA AMBIENTAL – ÉTICA DO DISCURSO. HORST GRONKE Freie Universität Berlin, Institut für Philosophie, Berlim, Alemanha [email protected] Abstract The present essay offers a sociological panoramic view of the development of modern environmental policy, of the new environmental movements and their paradigms, as well as a discourse-ethics (diskursethisch) reflection about the problematic relationship between the human being and nature. This reflection will connect the issue to an empirical vision of the problem as shown by the agents of environmental policies (to be described), systematize the ethical element of the different perspectives and will also provide a foundation, within the realm of discourse ethics, for a social approach to nature based on responsibility. Keywords ENVIRONMENT – ECOLOGY – ENVIRONMENTAL ETHICS – ENVIRONMENTAL POLICY – DISCOURSE ETHICS. 1* Tradução do alemão de Paulo Astor Soethe (Universidade Federal do Paraná). Sobre o debate atual acerca de questões de fundamentação e aplicação da ética da responsabilidade, cf. BÖHLER et al., 2000. 2 impulso nº 30 11 BEATE LITTIG Institut für Höhere Studien, Viena, Áustria [email protected] 002498_Inicio.book Page 12 Monday, September 29, 2003 3:05 PM NOTA PRÉVIA A visão do problema que se amplia na dimensão aqui proposta está subjacente à noção de uma cooperação e produção de saber capaz de abranger várias disciplinas, uma noção transdisciplinar que se revela interessada na solução de problemas sociais.3 No presente caso, a cooperação restringiu-se ao trabalho interdisciplinar conjunto de uma socióloga e um filósofo prático (praktischer Philososoph). A pesquisa, nesse sentido – muito embora reflita criticamente sobre si mesma e esteja submetida ao tribunal da razão –, assume uma atitude posicionada (parteiisch). Isso fica evidente pela exigência de justiça social e se revela, no que tange aos sistemas ecológicos, sob a forma de uma tomada de posição em favor da natureza e das gerações presentes e futuras. PANORAMA DA POLÍTICA AMBIENTAL E DOS MOVIMENTOS AMBIENTALISTAS O desenvolvimento da política ambiental como seara política autônoma está intimamente ligado à história dos movimentos ecológicos (Umweltbewegungen) nascidos no final dos anos 60 nos países industrializados ocidentais. É seu mérito ter trazido o tema da destruição e defesa do meio ambiente aos debates públicos, e com isso também às arenas de discussão política.4 Ao mesmo tempo, eles são entendidos (assim como outros movimentos sociais) enquanto força inovadora favorável à mudança da cultura política e à mudança da democracia partidária, atuando em prol de uma participação política direta dos cidadãos e cidadãs.5 De uma perspectiva histórica, os movimentos ecológicos dos países industrializados ocidentais podem ser ordenados em três fases:6 1. a fase da defesa tradicional da natureza, no final do século XIX e início do século XX; 2. a dos movimentos ecológicos dos anos 70 e 80; 3. e a da crise ecológica globalizada (final dos anos 80 e início dos anos 90). Na pesquisa angloamericana em ciências sociais, as atividades sociais e abordagens teóricas que se ocupam das relações entre os seres humanos e a natureza são denominadas ambientalismo (environmentalism). Esse conceito cumulativo, apesar das dificuldades de traduzi-lo (para o alemão), será utilizado no texto a seguir para descrever as múltiplas abordagens e desbobramentos complexos das relações modernas entre o ser humano e a natureza. Primeira fase A primeira fase da proteção da natureza teve início na virada do século XX, quando, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, difundiu-se a preocupação com a destruição de espaços naturais, através da industrialização e 3 4 5 6 GIBBONS et al., 1994; GEHMACHER & SINGER, 1999; e BRAND, 2000. EDER, 1996. BECK, 1992. PEPPER, 1996; MOL, 1997; KRIESE & GUIGNI, 1996. 12 impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 13 Monday, September 29, 2003 3:05 PM da urbanização crescentes.7 Nessa época se dá a fundação de associações de proteção da natureza, as quais se posicionam em favor da defesa ambiental sobretudo por razões estéticas e pelo desejo de vivenciar a natureza. A destruição da natureza não era entendida, então, como questão existencial para a humanidade, mas sim como um problema pontual que deveria ser enfrentado através da proteção seletiva das espécies, da preservação e proteção de áreas naturais selecionadas (reservas naturais). Apesar de diferenças específicas de país para país, o tratamento político e de debate público dedicado à proteção da natureza até os anos 60 teve antes um caráter marginal.8 Segunda fase Na virada dos anos 60 para os 70 teve início a segunda fase do ambientalismo, que se estendeu até o final da década de 80. Em todos os países industrializados ocidentais foram formados movimentos ecológicos de forças variáveis, como expressão de uma consciência modificada; e na maioria dos Estados ocidentais a política ambiental institucionalizou-se como um campo político específico. Ela começou a se firmar também no plano internacional: em 1972, como resultado da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente (UN Conference on the Environment); em Estocolmo, criaram-se os Programas Ambientais das Nações Unidas (United Nation Environmental Programs, UNEP), seguidos de uma série de grandes conferências e declarações de política ambiental pela ONU. “The central notion of environmentalism in the 1970s was that a fundamental reorganization of the social order was a conditio sine qua non for an ecologically sound society.”9 Nessa época, acumulavam-se as conseqüências nocivas à natureza ocasionadas pela rápida onda de crescimento econômico e tecnológico do pósguerra.10 A rápida expansão da produção industrial, do transporte e do crescimento urbano foi acompanhada por um consumo crescente de energia e matéria-prima, pelo loteamento da paisagem, pela mo7 8 9 MOL, 1997. RUCHT, 1994, p. 235ss. MOL, 1997, p. 138. impulso nº 30 bilidade elevada, pelo consumo de massa progressivo e por uma tendência ao uso de produtos descartáveis. As conseqüências desse desenvolvimento nocivas à natureza nem sempre puderam ser notadas de forma imediata; em muitos casos foi preciso estabelecer cientificamente as relações de causa e efeito para só então tornar perceptível a concatenação entre a destruição da natureza e o modo de vida industrial. Nesse contexto, coube a uma série de publicações sobre o assunto despertar a opinião pública de maneira apropriada, entre elas cabe mencionar o livro de Rachel Carson, Silent Spring (1962), assim como The Limits of Growth, de Denis Meadows (1971).11 Até alcançarem efeito público, esses conhecimentos tiveram que ser divulgados pelos meios de comunicação, o que em muitos casos levou a embates acalorados entre os adeptos do progresso e crescimento tecnológico-econômico e seus críticos.12 A expansão e difusão do saber ecológico, no entanto, é considerado apenas um dos fatores que concorreram para o surgimento dos movimentos ecológicos. Para entender seu aparecimento nos anos 70, é preciso levar em conta sua interação com outros três fatores efetivos junto à opinião pública: 1. uma série de escândalos e catástrofes ambientais (acidentes, testes nucleares etc.) 2. algumas iniciativas de política ambiental por parte dos governos (valorização do tema da proteção ambiental e apoio financeiro a organizações ambientais); e 3. diversos conflitos locais e regionais ligados ao meio ambiente, em torno da criação de parques ambientais, estradas, canais, diques, fábricas, usinas nucleares etc.13 O núcleo organizacional dos movimentos ecológicos foi formado de início por uma grande quantidade de movimentos de cidadania (Bürgerinitiativen), que freqüentemente se posicionavam como parte interessada em casos de conflito, aliando-se a outros movimentos e às tradicionais associações de prote10 O que se entende por nocivo ao meio ambiente – e em razão de quais causas – tem por base diversos modelos de pensamento, que possuem noções específicas do que seja risco e dano, uma lógica argumentativa própria, tradições políticas e científicas diversas e várias situações de vínculo a determinados grupos (FISCHER-KOWALSKI & HABERL, 1993; e FISCHER-KOWALSKI, 1997). 11 Cf. NELLISSEN, 1997. 12 JAMISON, 1996. 13 RUCHT, 1994, p. 239. 13 002498_Inicio.book Page 14 Monday, September 29, 2003 3:05 PM ção à natureza. Nas controvérsias sobre política ambiental, chegou-se com freqüência a uma generalização da crítica e à radicalização das formas de ação.14 A partir de um campo de conflito pontual e de exigências moderadas, a crítica estendia-se muitas vezes a um complexo de causas mais amplo, até alcançar a crítica ao sistema, que também era expressa, em parte, por meio de ações de militância. Um exemplo foi o movimento antinuclear, de protesto contra as usinas atômicas. O que confere unidade aos movimentos ecológicos é a noção de que todos os organismos vivos – inclusive os seres humanos – têm de ser considerados em meio a relações de reciprocidade (Wechselbeziehungen) com seu meio ambiente natural. Os ecossistemas locais e globais determinam as condições de vida dos organismos e impõem limites a suas atividades. A crise ecológica global da atualidade resulta da falta de respeito da humanidade em face dos limites ecológicos e da ameaça do equilíbrio ecológico ocasionada por suas atividades. Isso põe em risco não apenas as condições de vida dos organismos não-humanos, mas também a capacidade de sobrevivência das futuras gerações humanas. Com base nesse conhecimento, correntes ecológicas diversas tiram conclusões também diversas. Grosso modo, elas podem ser agrupadas em dois pólos: por um lado a deep ecology, por outro lado a shallow ecology. Os deep ecologists, ou dark green ecologists, são de opinião que as relações humanas com a natureza devem ser essencialmente revistas e reconfiguradas com base em uma bioética.15 Os light green, ou shallow ecologists, por sua vez, tomam como ponto de partida que a crise ecológica pode ser superada em primeira linha com o auxílio de inovações técnicas e eventualmente com inovações sociais adicionais. Não se põe em questão a relação moderna entre o ser humano e a natureza, que funcionaliza a natureza a fim de que ela satisfaça as carências humanas. Rucht caracteriza os movimentos ecológicos como uma rede de organizações e agrupamentos não-estatais que anseiam por proteção ambiental abrangente e cientificamente fundamentada, e que procuram intervir politicamente, de maneira explícita.16 Mesmo que esses agentes sociais selem alianças, ainda assim são heterogêneos em suas formas de organização, grau de institucionalização e na demarcação de seus objetivos: The number and kinds of environmental organizations vary considerably from one country to another, but in most countries long established conservation organizations exist alongside newer organizations such as Friends of the Earth and Greenpeace, which began as beares of a more radical and wide ranging environmental and ecological critique.17 Atualmente é possível distinguir quatro correntes no interior dos movimentos ecológicos nas democracias ocidentais:18 1. a proteção ambiental tradicional, que visa à proteção das espécies ou à instituição de áreas de proteção ambiental e que trabalha com os métodos tradicionais da formação de lobbies ou campanhas informativas. A esse grupo pertencem, por exemplo, as sociedades de proteção aos pássaros ou campanhas de salvação das baleias; 2. a ecologia política, que anseia por uma transformação social ampla e se orienta pela visão de uma sociedade descentralizada, igualitária e democrática, que se desenvolva em harmonia com a natureza. Um exemplo típico dessa corrente é o movimento antinuclear; 3. a proteção ambiental se realiza pragmaticamente através de campanhas políticas concretas ligadas a problemas ambientais (defesa dos recursos naturais, luta contra poluição do solo, da água e do ar, proteção contra poluição sonora, alimentação natural etc.), fazendo uso de formas de ação mais ou menos convencionais. Segundo Kriese e Giugni,19 a maioria das organiza16 14 Ibid., p. 240; e MOL, 1997. 15 Para uma apreciação detalhada da deep ecology, cf. PEPPER, 1996, p. 17ss. 14 17 18 19 RUCHT, 1994; e ROOTES, 1997. ROOTES, 1997, p. 326. KRIESE & GIUGNI, 1996. Ibid. impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 15 Monday, September 29, 2003 3:05 PM ções ecológicas deve ser incluída nessa corrente; 4. a ecologia global, dimensionada no final dos anos 80 sob a forma de organizações ambientais transnacionais, em decorrência da globalização de problemas ambientais (buraco na camada de ozônio, efeito estufa, desmatamento de florestas etc.), e que marca presença nas arenas políticas internacionais (União Européia e ONU, por exemplo). Pesquisas de opinião na Europa demonstram que o potencial de mobilização dos movimentos ecológicos tornou-se surpreendentemente grande nesse meio tempo, ainda que haja diferenças relevantes entre os países em particular.20 De acordo com essas pesquisas, no final dos anos 80 a maioria da população britânica, alemã, francesa, italiana e holandesa (em especial integrantes da classe média) simpatizava com os objetivos dos movimentos ecológicos.21 Esses resultados estão em concordância com a constatação de um alto grau de consciência ecológica em muitos países no mundo.22 Como mencionado anteriormente, a segunda fase dos movimentos ecológicos não se caracteriza somente pela formação de movimentos ecológicos. Para essa fase também é importante o estabelecimento de instituições estatais de política ambiental, a criação de diversos instrumentos políticos para planejamento e controle ambiental, que visam no seu conjunto primeiramente à constatação e redução das emissões de gases poluentes, do consumo de recursos naturais e a uma melhora ou preservação da qualidade do meio ambiente. Os esforços de política ambiental dos governos dos países ocidentais seguem uma programação que se denomina modernização ecológica.23 Essa modernização ecológica investe em uma transformação da sociedade industrial, ecologicamente motivada, com auxílio da ciência e tecnologias modernas, da sociedade de mercado e de intervenções do Estado.24 Com isso também as instituições sociais 20 21 22 23 ROOTES, 1997. KRIESE & GIUGNI, 1996, p. 328. DUNLAP et al., 1993. HAJER, 1996; e MOL, 1997. impulso nº 30 tornaram-se co-responsáveis pela solução da crise ecológica que elas decisivamente ajudaram a criar. Nesse ínterim, os representantes da modernização ecológica têm entendido que se confirmou a capacidade de transformação e de aprendizagem por parte dessas instituições, por exemplo na adequação ecológica da indústria química e no direcionamento preventivo da política ambiental.25 A isso também se opõem avaliações completamente céticas. Pois, mesmo que se tenha alcançado uma série de melhorias, através de inovações técnicas e de medidas e instrumentos estatais de política ambiental (ordem jurídica, instrumentos fiscais e acordos voluntários), os problemas ambientais (ao menos quando considerados em nível global) não diminuíram nos últimos 30 anos.26 Muitas das melhorias em campos individuais, as quais dão mostras de uma reviravolta que leva da proteção ambiental remediadora (end of the pipe) a uma proteção ambiental preventiva ou integrada, são freqüentemente compensadas e ultrapassadas por um crescimento dos usos. Um exemplo disso é o automóvel, que atualmente, graças a melhorias tecnológicas, emite menos CO2. Os potenciais de contenção de poluentes, no entanto, são neutralizados por números crescentes de novos veículos em circulação e por uma diminuição do número total de pessoas transportadas por quilômetro rodado. Da perspectiva de teorias ecológicas de modernização, a crise ecológica é entendida como resultado das ineficiências ecológicas das sociedades industriais modernas. Ao mesmo tempo, porém, ela também é o motor de uma nova onda de inovação ecológica e representa uma nova fase de modernização social: As before, society has to modernise itself out of the crisis. Remedying environmental damage is seen as a positive sum game: environmental damage is not an impediment for growth; quite the contrary, it is the new impetus for gro24 HAJER, 1996; MOL, 1997; JÄNICKE, 1993; SPAARGAREN & MOL, 1992; e HUBER, 1991. 25 MOL, 1997; JÄNICKE, 1993; e estudos de caso em JÄNICKE & WEIDNER, 1995. 26 Cf. OECD, 1991; e relatórios bienais do WIR (Wirtschaftsring ou, em inglês, Business Circle), a partir de 1986. 15 002498_Inicio.book Page 16 Monday, September 29, 2003 3:05 PM wth. In ecomodernist discourse environmental pollution is framed as a matter of inefficiency, and producing “clean technologies” (clean cars, waste incinerators, new combustion processes) and “environmentally sound” technical systems (traffic management, road pricing, cyclical product management etc.), it is argued, will stimulate innovation in the methods of industrial production and distribution.27 Nesse processo, atribui-se aos movimentos ecológicos uma espécie de função corretiva. Cabe a eles apoiar a modernização ecológica por meio de seus pareceres especializados e de seu potencial de mobilização. Apesar da institucionalização crescente, certamente elas devem se manter independentes; mas sem permanecer como observadores críticos externos ao desenvolvimento social, e sim atuar efetivamente como participantes críticos da transformação ecológica social.28 Por parte dos movimentos ecológicos, nem sempre se deseja essa incorporação (por medo de cooptação, entre outras coisas); em muitos casos, ela é até mesmo motivo de polêmica.29 Para várias tendências verdes radicais (radikal greens, deep ecology, ecofeminism) a modernização ecológica é inaceitável, em razão de sua orientação tecnicista, cientificista e objetivista de cunho ocidental.30 A partir da visão radicalmente ecológica desses enfoques, a crise ecológica só pode ser resolvida com um distanciamento da forma de vida industrial e do crescimento econômico. Terceira fase Com a configuração da ecologia global mencionada acima, tem início a terceira fase dos movimentos ecológicos: The concern over global environmental issues can be seen as the most recent phase in the development of post-war environmentalism, a phase marked by the dominance of powerful and influential transnational organisations such as Greenpeace International, the Worldwatch Institute and World Resources Insti- tute and the Worldwide Fund for Nature. In recent years, these well financed and highly professionalised environmental NGOs (nongovernmental organisations) have largely supplanted the more activist groups that dominated environmentalism in the 1970s as the main articulators of the environmentalist message.31 O que há de novo nessa fase é, por um lado, a definição e prioridade dos problemas ambientais em nível global e, por outro lado, a tentativa de negociar esses problemas no plano internacional com agentes sociais múltiplos – os 192 Estados nacionais, organizações internacionais, empresas, associações, ONGs. Cientistas políticos vêem nisso o começo de uma “política ambiental mundial”.32 As grandes ONGs transnacionais desempenham um papel significativo nas novas arenas políticas. Elas se caracterizam por um alto grau de profissionalismo, perfeitamente comparável ao de corporações internacionais. Isso se revela tanto na eficiente organização da arrecadação de recursos, da pesquisa e da administração, quanto nas estratégias de informação e nas atividades integradas em rede. Contudo, o êxito internacional das grandes ONGs não é julgado apenas de forma positiva. Entre outros fatores, isso se deve a que a dominância das grandes ONGs pode ocasionar que se tire a atenção dispensada a grupos ecológicos locais e menores. Além disso, há o perigo de se ignorar, sobretudo, a crítica à definição de problemas ambientais globais por parte de agrupamentos e intelectuais do chamado Terceiro Mundo.33 Essa crítica volta-se em primeira linha ao poder de definição dos países do Hemisfério Norte e à “globalização de definições locais”, inadequada aos problemas dos chamados países em desenvolvimento.34 O Brundlandt Report35 e a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, de 1992, no Rio de Janeiro, são considerados os marcos iniciais dessa fase da ecologia global. 31 27 28 29 30 HAJER, 1996, p. 249. MOL, 1997, p. 142; e ROOTES, 1999. ROOTES, 1997, p. 328. HAJER, 1996, p. 256ss; PEPPER, 1996; e SHIVA, 1993. 16 32 33 34 35 JAMISON, 1996, p. 225. SIMONIS, 1996. JAMISON, 1996; e HAJER, 1996. SHIVA, 1993. WCED, 1987. impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 17 Monday, September 29, 2003 3:05 PM No mais tardar, a partir do final dos anos 80, a crise ecológica passa a ser vista como crise global indissociável de suas relações sociais e econômicas. A seguir, sob o emblema do “desenvolvimento sustentável” deu-se continuidade ao discurso sobre a necessidade ecologicamente induzida de transformações sociais e institucionais profundas. Ao mesmo tempo, a problemática ambiental global foi associada aos conflitos entre os países industrializados do Norte e os países em desenvolvimento do Hemisfério Sul. As ONGs participaram decisivamente da formulação desse emblema, incluída entre elas uma série de ONGs transnacionais de orientação feminista.36 Deve-se a essas últimas o fato de que, nos documentos oficiais sobre o “desenvolvimento sustentável”, também sejam levados em conta interesses políticos das mulheres.37 Em resumo, podem-se entender as fases de desenvolvimento do ambientalismo ocidental, na teoria e na prática, como um processo de transformação social que ocasionou o estabelecimento internacional da idéia da proteção ambiental como uma força social e cognitiva.38 Ainda parece incerto quais serão os agentes sociais e os temas dominantes do discurso ecológico no futuro. Em todo caso, os movimentos ecológicos já deixaram de ser as únicas vozes ecológicas nas agendas públicas, tal como ocorria nos anos 80; ao contrário, eles hoje concorrem com uma multiplicidade de agentes sociais no “marketplace of communication on the environment”.39 Klaus Eder considera improvável a sobrevivência dos movimentos ecológicos como movimentos de massa. Mais do que isso, eles deveriam firmar-se como “collective actor” na agenda pública, a fim de ganhar ouvidos na discussão política. A agenda pública, porém, segundo Eder, é dominada de maneira determinante pelos meios de comunicação social e suas leis. Nesse sentido, o futuro dos movimentos ecológicos dependeria de sua capacidade de comunicar seus anseios de maneira exclusivamente pública: 36 JAMISON, 1996, p. 226; BRAIDOTTI et al., 1994; e MOGHADAM, 2000. 37 ONU, 1992, cap. 24; e LITTIG, 2001. 38 JAMISON, 1996, p. 226. 39 EDER, 1996, p. 203. impulso nº 30 They will survive as a collective actor, concerned with negros and risks not covered by traditional pressure groups such as trade unions. Such a survival depends on their capacity to keep control of their stake in the public discourse, since survival in this market is contingent upon the successful communication of symbolic packages that resonate with the respective constituency.40 Face a esse desafio, já existem propostas práticas, como as do Partido Verde da Alemanha,41 que – em consonância com a idéia de uma sustentabilidade econômica, ecológica e social – pretende superar o risco de que outras áreas dos problemas sociais suplantem a proteção ambiental. Para a imposição de melhorias ecológicas, é preciso criar novas alianças e coalizões de interesse entre todos os agentes sociais relevantes. Pensa-se aqui – quanto à proteção do clima, por exemplo – na cooperação política entre todos os agentes sociais que possam colaborar com a redução da emissão de CO2: os proponentes de energias alternativas, empresas de gás natural, empresas de tecnologia, além de construtoras e sindicatos, que poderiam dar as boas-vindas ao potencial de geração de empregos trazido por essa aliança ecológica inovadora. Ou então, na área da agricultura, seria possível promover a confluência entre os interesses de uma melhora e asseguramento do sustento para os trabalhadores do campo (com agricultura orgânica, turismo natural, cultivo de plantas para consumo e passíveis de reaproveitamento, proteção natural mediante contrato etc.) e os de associações de proteção da natureza e consumidores conscientes em relação à própria saúde, que procuram alimentos orgânicos a preços acessíveis. Essas propostas indicam uma ampliação da modernização ecológica, na medida em que, ao lado de questões ecológicas, também passam a ser consideradas questões sociais – sobretudo o futuro da sociedade do trabalho. No entanto, propostas como essas deparam um grande ceticismo por parte de representantes mais radicais dos movimentos ecológicos e suas organizações, pois eles temem um 40 41 Ibid., p. 215. LOSKE, 2000. 17 002498_Inicio.book Page 18 Monday, September 29, 2003 3:05 PM esvaziamento dos objetivos da proteção ambiental em decorrência das alianças heterogêneas e dos acertos que elas implicam. NOCIVIDADE AMBIENTAL: DIMENSÕES E PARADIGMAS Há uma série de tentativas de classificar as múltiplas correntes do ambientalismo ocidental, com base em diferentes características por elas apresentadas.42 Particularmente famosa é a distinção entre deep ecology e shallow ecology, que propõe uma diferenciação tosca entre as orientações ecológicas, com base no radicalismo das transformações pleiteadas quanto à relação entre o ser humano e a natureza.43 Entre os dois extremos, as demais delimitações nem sempre são claras e se superpõem a outras orientações ideológicas, entre elas, o socialismo, o feminismo, o new age, o modernismo, o pós-modernismo, o anarquismo etc.44 A solução que resta é empreender uma classificação detalhada de concepções ligadas ao meio ambiente,45 segundo Marina Fischer-Kowalski,46 já que, desse modo, com a aplicação de um número restrito de critérios, tem-se uma diferenciação clara e panorâmica de quatro paradigmas,47 como a seguir: 1. paradigma tóxico (poison paradigma); 2. paradigma do balanceamento natural (natural balance paradigma); 3. paradigma da entropia (entropy paradigma); 4. paradigma convivial (conviviality paradigma). O paradigma tóxico é provavelmente o modelo de senso comum mais difundido. Em uma tradição científica da química e da medicina, ele se concentra sobre o acréscimo social de substância tóxica ao meio ambiente natural. Pergunta-se pelas causas dos danos ambientais e pelos limites da tolerância ecológica e em termos de salubridade. Essas questões devem ser respondidas primeiramente com 42 PEPPER, 1996. NAESS, 1973. 44 PEPPER, 1996; e REDCLIFT & WOODGATE, 1995. 45 Cf. PEPPER, 1996; e REDCLIFT & WOODGATE, 1995. 46 FISCHER-KOWALSKI et al. 47 FISCHER-KOWALSKI & HABERL, 1993; e FISCHER-KOWALSKI, 1997. 43 18 base em métodos das ciências naturais. A fixação jurídica de valores limitativos, entretanto, é um processo de negociação política em que se trata da imputabilidade de valores limitativos a diferentes grupos sociais. Da mesma forma, a efetivação e o controle da observância desses valores também não passam de uma questão política. O paradigma de balanceamento natural, por sua vez, tem raízes na biologia. A sociedade, na condição de agente, defronta-se com os ecossistemas naturais, limitando e ameaçando com sua ação a capacidade de autoconservação deles. Esse paradigma, numa visão abrangente (e sem referir-se a substâncias, em particular), pergunta-se pelas relações funcionais dos sistemas naturais, suas suscetibilidades e possibilidades de reação produtiva, para daí deduzir as políticas ambientais de preservação deles ou as medidas de conservação de sua regenerabilidade. Também sob esse enfoque, e com vistas à regulação política dos danos ambientais, superam-se os limites do saber das ciências naturais: a resposta à questão sobre que sistemas vale a pena ou não preservar não pode ser fundamentada cientificamente. Que contra-argumentos científicos existem em favor de se dever conservar o equilíbro ecológico per se? Do ponto de vista das ciências naturais, sempre depois de cada destruição do equilíbrio estabelece-se um novo estado de equilíbrio, não importando para que seres vivos venha ser propício esse novo estado. Em favor da conservação dos ecossistemas subsistentes só se podem apresentar argumentos morais, tais como a responsabilidade por gerações humanas futuras, que necessitarão de condições ecológicas favoráveis para viver. O paradigma da entropia leva em consideração processos de intercâmbio de substâncias, tendo como pano de fundo os fluxos energéticos: The entropy paradigma is founded in theoretical physics, the so-called laws of thermodynamics, and, at the same time, relates well to economics. All processes are processes in which energy is used; it is not “used up” though, but only changed in quality: It becomes dispersed, less concentrated. In other words, its entropy increases. In an isolated system each process impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 19 Monday, September 29, 2003 3:05 PM can only increase, but never decrease entropy – and finally all processes stop.48 Sob esse enfoque, a sociedade é um sistema que tanto consome energia quanto produz entropia, à medida que consome reservas fósseis de energia desenvolvidas ao longo de milhões de anos. O mesmo se aplica à matéria de alta concentração (metais, por exemplo); ela não se perde, mas depois de processada é despejada no meio ambiente em uma forma mista e desconcentrada. Na visão da política ambiental, esse modo de pensar preocupa-se com reduzir ao máximo o consumo de recursos e de energia não-renovável e, ao invés disso, atuar economicamente com base em “proventos naturais” (como a radiação solar), mais do que com base no dispêndio de “capital natural”. O paradigma convivial, sobre o pano de fundo de tradições éticas e filosóficas, questiona a posição predominante do ser humano em relação a outros seres vivos. A natureza não é encarada como meio ambiente, e sim como criatura (em parte, divina) merecedora de respeito e tendo, por ela mesma, direito à existência. Em conformidade com essa imagem de mundo biocêntrica, importa orientar o agir humano a fim de impor aos demais seres vivos e espécies o mínimo possível de sofrimento, limitação ou destruição. Sobretudo nos países anglo-americanos é a proeminente deep ecology que segue o “paradigma convivial”. Os deep ecologists rechaçam a separação dualista entre ser humano e natureza. Seu ponto de partida é que os seres humanos fazem parte da natureza e, portanto, não lhe são fundamentalmente diversos, nem dela estão desvinculados. Opõem-se a uma visão antropocêntrica da natureza, que mede o valor do mundo natural segundo o que ele pode ter para os seres humanos. Mais do que isso, a natureza tem para eles um valor intrínseco, independente de sua utilidade ou malefício aos seres humanos. Apoiando-se nessa visão biocêntrica e ecocêntrica, os ecossistemas e a diversidade ecológica devem ser preservados em virtude deles mesmos. Disso decorre a exigência de uma transformação social radical, levando afinal de contas a uma restrição maciça das intervenções humanas na natureza e do seu uso por parte dos seres humanos. Uma sociedade ecológica no sentido da deep ecology estaria constituída com base em regiões ou comunidades autônomas, pequenas e descentralizadas, às quais não seria permitido ultrapassar a capacidade máxima (carrying capacity) de seu território. A fundamentação para essa auto-restrição ecológica nem sempre se orienta pelos conhecimentos obtidos por uma ciência ecológica e seus procedimentos científicos, mas também por um saber espiritual, supostamente emocional e intuitivo, aproximando a deep ecology dos enfoques holísticos da new age e do ecofeminismo espiritualista.49 A deep ecology recebeu críticas de vários lados, entre eles, de uma parte do ecofeminismo.50 Em suas formas extremas, esse enfoque foi criticado por ser, na melhor das hipóteses, politicamente ingênuo, e na pior delas, reacionário. Ingênuo, porque toma mudanças de atitude e comportamento individuais como se fossem o motor da transformação social, e desconsidera plenamente as estruturas de dominação, bem como os interesses políticos e econômicos como possíveis empecilhos a uma transformação ecossocial. As tendências reacionárias, por sua vez, são identificadas na invocação de comunidades pequenas, tradicionais e próximas à natureza, cujo centro vital está na busca de uma unicidade (oneness) com a natureza, como modelo oposto ao mundo urbanizado das sociedades modernas. Também o ecocentrismo (ecocentrism) da deep ecology não deixa de mostrar-se como problemático, já que tende a ser anti-humano, no sentido de os seres humanos serem tratados como fatores de perturbação da natureza.51 Resulta daí um campo de tensão entre as carências naturais da humanidade e os valores intrínsecos da “natureza intocada”. O paradigma da ecologia profunda representa, sem dúvida, uma posição extrema e sequer parece estar acessível a um enfoque embasado na razão (humana); apesar disso, é possível opor a ele, de forma muito evidente, uma visão intermediária das coi49 PEPPER, 1996, p. 26ss; e SPRETNAK, 1989. Ver PEPPER, 1996, p. 28ss; e MELLOR, 1997, p. 130ss. TOKAR, 1990. O ideal de natureza é wilderness, pois ela é unspoilt by man (MELLOR, 1997). 50 51 48 FISCHER-KOWALSKI & HABERL, 1993, p. 434. impulso nº 30 19 002498_Inicio.book Page 20 Monday, September 29, 2003 3:05 PM sas, buscando estabelecer um equilíbrio qualificado entre “direitos naturais” e “direitos sociais”. A análise a seguir pretende mostrar de que maneira se pode fundamentar um enfoque ético como esse, ao tomar para si algumas considerações de Hans Jonas e continuar refletindo segundo a ética do discurso. A CONCEPÇÃO ÉTICO-DISCURSIVA: ORIENTAÇÃO PARA UMA POLÍTICA AMBIENTAL RESPONSÁVEL Dimensões da responsabilidade A questão sobre a qual muitos filósofos morais se concentram hoje em dia é de justiça distributiva: como, ou de acordo com que concepção ética, pode-se resolver o problema da justa distribuição dos bens entre os diversos grupos populacionais e as diversas gerações? A esse questionamento social está vinculado um outro de caráter ecológico. Ele resulta da simples constatação de que os bens a serem distribuídos entre as gerações são essencialmente bens naturais. A captura técnico-industrial desses bens naturais esconde perigos que ameaçam tanto os seres humanos quanto a natureza. Assim, a ameaça da natureza só parece ter relevância moral na medida em que se associa a perigos que ponham em risco os seres humanos, ou seja, o cumprimento dos interesses vitais dos homens e mulheres. “Proteção da natureza sempre é também proteção do ser humano.”52 Diferentemente do que se dá na deep ecology, não se atribui à natureza, como mero recurso destinado a saciar as carências e os interesses dos seres humanos, nenhum valor moral autônomo. A responsabilidade pela garantia de um ciclo natural intacto, por exemplo, o sistema da floresta tropical brasileira ou a criação de animais segundo interesses de preservação da espécie, não se alimenta exclusivamente da dimensão social ou subjetiva da responsabilidade: temos obrigações de um tratamento complacente com a natureza porque temos responsabilidade em face dos demais seres humanos que convivem conosco. Um agir responsável diante da natureza, portanto, é apenas um mandamento da prudência moral: “não aba- ter a gansa dos ovos de ouro, nem muito menos serrar o galho sobre o qual se está sentado”.53 Segundo essa concepção ética antropocêntrica, os deveres morais subsistem apenas em face de sujeitos racionais, eles mesmos, capazes de agir moralmente e justificar a sua ação. Só quem pode ser sujeito (do dever) de um agir responsável também pode ser considerado um objeto (jurídico) do agir responsável: trata-se aí dos seres humanos. Ao contrário, diante da natureza (inumana) – desprovida de uma reciprocidade de direitos e deveres, com a qual só se pode manter uma relação de responsabilidade unilateral, e que, na condição de objeto putativo de um agir responsável, não pode se comprometer a um agir responsável – não subsiste nenhuma obrigação de responsabilidade autônoma e independente de interesses humanos. A ética antropocêntrica, que entende serem os direitos a uma deferência responsável algo vinculado à competência racional, só pode mesmo considerar a natureza irracional um instrumento do agir responsável. Conseqüências nocivas à natureza extra-humana, portanto, só devem ser levadas em conta quando acarretam conseqüências nocivas também aos seres humanos. “O direcionamento antropocêntrico de toda a ética clássica será mantido desde que o destino do ser humano em sua dependência do estado de natureza continue sendo o pólo de referência que torna o interesse pela conservação da natureza um interesse moral.”54 Na ética antropocêntrica da natureza, a dimensão de uma justificação da responsabilidade acaba por coincidir com a relação objetual da responsabilidade. Há muito tempo se debate o antropocentrismo na ética, sobretudo com referência a seu teor negativo, à exclusão do que não é humano do campo dos objetos imediatos da responsabilidade. Usualmente não se põe em dúvida seu teor positivo, isto é, a idéia de uma obrigação de responsabilidade (prioritária e de princípio) em face de tudo que seja humano. A concepção de uma ética antropocêntrica parece encerrar um potencial normativo o suficiente para garantir o tratamento responsável 53 52 KETTNER, 1995, p. 303. 20 54 JONAS, 1979, p. 27. Ibid., p. 27. impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 21 Monday, September 29, 2003 3:05 PM das situações-problema socioecológicas e dos efeitos (diretos e secundários) do desenvolvimento tecnológico e industrial. Ela abrange, por exemplo, as seguintes dimensões de responsabilidade da ética antropocêntrica: 1. a dimensão de uma consideração adequada das carências e interesses de todos os seres humanos, especialmente as carências e interesses potenciais das gerações futuras por parte das gerações atuais; • em primeiro lugar trata-se aqui de distribuir os bens naturais de maneira justa. Como a quantidade de bens naturais é restrita, resulta daí como exigência mínima o esforço por um tratamento zeloso dos recursos naturais; • além disso, trata-se de manter ou melhorar as condições sociais, políticas e culturais para os que vivem hoje e viverão amanhã, as quais lhes permitirão, em um âmbito defensável, amoldar a própria vida de acordo com suas noções, variáveis de indivíduo para indivíduo e de cultura para cultura; 2. ao lado da consideração de carências e interesses, a ética antropocêntrica contempla a dimensão de uma consideração das possibilidades de ação moral; • essa exigência contém, de início, o mandamento incondicionado de não pôr em risco a existência da humanidade e, com isso, a existência do que seja moral. Portanto, as tecnologias atuais, capazes de, pela primeira vez, ocasionar tais efeitos na história da humanidade, só podem ser utilizadas com grande precaução, se é que podem sê-lo. O potencial ameaçador de uma aniquilação plena da humanidade pode tornar imperioso que se renuncie por completo ao uso de uma tecnologia, mesmo que ele possa ser útil aos interesses essenciais da vida de determinados grupos populacionais; • A exigência de que se respeite a moralidade futura também obriga a preservar e melhorar as condições pessoais e institucionais que possibilitem às gerações futuras agir por si mesmas de maneira responsável. Restri- impulso nº 30 ções da liberdade para o exercício da responsabilidade podem ser implementadas, por exemplo, quando se torna necessário manter um sistema de vigilância e controle em larga escala, capaz de tolher quase totalmente a liberdade de livre ação do indivíduo, a fim de evitar contaminações decorrentes do uso de tecnologias com alto potencial de ameaça tóxica. Essa composição das dimensões mais essenciais da responsabilidade futura, a partir da visão de uma ética antropocêntrica, comprova que dependemos de éticas fisiocêntricas e natural-metafísicas para podermos conservar uma orientação moral à solução de muitos dos problemas ambientais urgentes hoje em dia. Por certo, a comprovação de um alcance suficientemente amplo da ética antropocêntrica ainda não garante que ela seja obrigatória. Ainda temos que apontar uma razão para a obrigatoriedade. De outro modo, não poderíamos, com seriedade, exigir dos agentes sociais (sobretudo empresas de economia e tecnologia, além dos consumidores) que eles viessem a aceitar limitações (voluntárias e involuntárias) impostas a produções nocivas ao meio ambiente. Tais limitações, a propósito, se reportam a um sentimento de condolência com gerações futuras. Muitas éticas contemporâneas (que entendem a si mesmas como éticas aplicadas, no sentido de que apenas transformariam em realidade as convicções valorativas pretensamente partilhadas por todos) sequer levam em conta a tarefa de uma fundamentação dos princípios morais; eis aí a razão para que seus postulados morais revelem, de forma latente, um déficit no reconhecimento a eles conferido. Princípio moral Um princípio moral capaz de oferecer orientação deve cumprir sobretudo duas condições. Em primeiro lugar, sua formulação tem de ser tão aberta, e o alcance de sua validação tão amplo, que ela possa ser aplicada a situações-problema as mais diversas, e mesmo totalmente imprevisíveis; ao mesmo tempo, ela deve ser expressiva o bastante para permitir por princípio sua transformação em normas conteudísticas e direcionadoras de um comportamento con- 21 002498_Inicio.book Page 22 Monday, September 29, 2003 3:05 PM cretamente ligado a situações. A formulação do princípio moral tem que ser “válida a ponto de que se queira segui-la” (befolgungsgültig).55 Em segundo lugar, a fundamentação do princípio moral deve ter uma qualidade lógico-validante (geltungslogisch) tão elevada, que dela emane uma pretensão de obrigatoriedade absoluta e resistente a se tornar relativa, em virtude de outros interesses ou posturas de valor, sejam quais forem. O princípio moral tem de ser válido a ponto de criar obrigações (pflichtgültig). Enquanto a questão sobre a formulação em definitivo e conteudística das concepções éticas (ou seja, sobre o “como” do agir moral) já vem recebendo há tempo um número de respostas a perder de vista, a maioria das éticas contemporâneas não se acha mais em condições de responder à pergunta sobre o “porquê” do agir moral.56 No entanto, quando não se pode apresentar razão alguma para a obrigatoriedade, concepções morais elaboradas com tão alto grau de detalhamento simplesmente perdem o seu chão. O agir moral torna-se dependente do reconhecimento fático da respectiva concepção moral, a qual, sem acarretar quaisquer obrigações incondicionadas, se mantém sempre incerta (mesmo sendo possível motivar pessoas em favor dela, com o uso de uma retórica da plausibilidade). Essa posição cética e de retraimento por parte de muitas éticas contemporâneas tem certamente uma razão que se pode reconstituir. Parece quase impossível chegar às duas coisas: preservar e formular adequadamente uma reivindicação universal de validação, por um lado, e, ao mesmo tempo, por outro, dispor de um método para justificar essa mesma reivindicação como obrigatória, sem, contudo, recorrer aos paralogismos (Fehlschlüsse) tão característicos à argumentação moral. Tem-se, em geral, a opinião de que todas as pretensões de fundamentação absolutas acabam caindo no vazio porque levam inevitavelmente a um regresso infinito. Paga-se apressadamente o preço de uma redução lógico-validante: abdica-se da pretensão de fundamentação de uma obrigatoriedade absoluta e 55 NIQUET, 1999. Uma resposta convincente à questão da obrigatoriedade é dada, entretanto, por Dietrich Böhler (BÖHLER, 1999). 56 22 opta-se por se deixar levar pelas intuições morais do senso comum profundamente arraigadas. Mesmo que essas últimas não tragam com elas qualquer obrigatoriedade racional, têm, no entanto, um grau de força motivacional tão elevado que se mostram capazes de gerar nos agentes sociais um constante sentimento de obrigatoriedade. Na medida em que ganhamos em uma sociedade o elogio resultante do comportamento moralmente valorizado, e interiorizamos as ameaças sancionadoras que recaem sobre o agir imoral, passamos, então, a formar uma consciência moral que nos motiva ao agir moral, mesmo que não tenhamos de contar com sanções por um agir imoral. Hans Jonas deixou claro que enfoques como esses são ineficientes para dar conta de problemas que ultrapassem o território clássico do agir moral, ou seja, da área afim das relações inter-humanas.57 Se temos precisado de concepções capazes de se alimentar de fontes transconvencionais, isso ocorre desde que o progresso técnico conferiu ao ser humano o poder de alcançar efeitos de longo alcance no espaço e no tempo (efeitos para cujo julgamento moral não se podem obter critérios na práxis dos respectivos mundos vitais). Será que precisamos recorrer, para isso, a uma ontologia material de base metafísica? Um sim a essa pergunta, que na verdade já não se admite mais em uma era pós-metafísica, pode certamente esconder possibilidades de uma compreensão mais adequada de uma ética planetária de responsabilidades. Hans Jonas, por exemplo, havia firmado uma via de fundamentação de mão dupla. Por um lado, ele havia apoiado sua argumentação ontológica e ético-valorativa na concludência de uma teoria da filosofia natural,58 que deriva as obrigações de responsabilidade do ser humano de uma fenomenologia da liberdade de caráter evolucionista. Por outro lado, ele firmou como critério essencial de validação a autenticidade de uma declaração emocional de fé, que de57 Uma composição panorâmica das novas constelações de problemas pode ser encontrada em WERNER, 1994, p. 310. 58 Essa linha de fundamentação foi assumida particularmente por Vittorio Hösle e levada adiante de maneira “objetivo-idealista” em seu desenvolvimento. “O mundo ideal está presente no desenvolvimento da natureza que culmina na geração do espírito; à medida que a natureza participa das estruturas do mundo, ela mesma é algo de valor” (HÖSLE, 1991, p. 71). impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 23 Monday, September 29, 2003 3:05 PM veria comprovar-se com base em sua qualidade moral de causar impressões e na coesão interna de um agir exemplar. Ao fazer tal coisa, Jonas ocupou-se da ética de valores (até então domínio do aristotelismo conservador, limitado a prestar contas a uma eticidade internalizada), levando-a a um grau de qualidade mais elevado, adequado a uma crítica da tradição. Todavia, ela ainda é insuficiente do ponto de vista de uma lógica da validação. Envolve-se em um círculo vicioso ao elevar o factum de que o ser humano tem a liberdade de poder agir responsavelmente à condição de um factum normativo de que ele deve agir responsavelmente, para daí derivar o dever ou a obrigação do agir responsável. No âmbito do movimento transcendentalpragmático iniciado por Karl-Otto Apel empreendeu-se uma série de tentativas diversas para se chegar a uma fundamentação consistente do princípio moral, empenhando-se em associar uma pretensão de fundamentação máxima a um dispêndio de fundamentação minimalista.59 Em primeiro lugar, deve-se renunciar à procura de premissas últimas, a partir das quais se possa desenvolver um sistema moral abrangente. Essa renúncia torna a restrição a paralogismos ou a fixações dogmáticas isenta de quaisquer objetos; mas baseia-se na pressuposição de um modelo de fundamentação da derivação lógica de sentenças apoiado em premissas. A segunda renúncia metódica diz respeito ao embate travado pelas diferentes éticas entre si acerca da correção e adequação de seus teores materiais. Ao se assumir uma postura ascética, em face de uma participação que se posicione em disputas moral-filosóficas, paga-se um pesado tributo à visão de que os discursos sobre conteúdos morais concretos jamais são levados a cabo, e de que eles não oferecem, portanto, comprovação de uma obrigatoriedade absoluta. Ao invés de procurar pela via das fundamentações dedutivas aquilo que detenha em si o caráter 59 Essa estratégia de argumentação “reflexiva”, no entanto, só é aconselhável para a fundamentação do ponto arquimediano de uma concepção moral. Todos os resultados para além desse ponto só podem ser alcançados através de uma cooperação entre o método reflexivo e a pesquisa empírica. Essa cooperação, quando restrita ao que seja fundamentador, assume a forma de uma reconstrução empírico-pragmática empenhada em buscar a coerência dos resultados de pesquisa reconhecidos. O exemplo mais brilhante de tal reconstrução é dado por Jürgen Habermas, em sua “teoria do agir comunicativo”. impulso nº 30 de um princípio, do ponto de vista moral, o que faz o filósofo da ética transcendental-pragmática do discurso é dar um passo reflexivo para trás, até estar diante das fundamentações normativas concretas (e das considerações meramente lingüístico-analíticas e metaéticas).60 Manifesta-se então o que, na verdade, já esteve aí desde o início, muito próximo, mas que permaneceu oculto ou esquecido em decorrência da atenção teórica dedicada aos conteúdos morais concretos: o simples fato de todos os filósofos morais que reivindicam validação para suas próprias concepções, ou duvidam da validação de outras, serem também eles participantes de uma argumentação. Não há ser racional que possa negar por completo esse mínimo de traços comunicativos em comum, sem, com isso, abandonar sua própria razão. À medida que alguém manifesta uma reivindicação de validação, não pode mais retirar-se da práxis argumentativa. Nesse sentido, apresenta-se uma alternativa às tentativas tradicionais de averiguar o princípio moral por meio de uma fundamentação regressiva que se dê pela atribuição de conclusões a premissas últimas. Tal alternativa antepõe a essas tentativas a reflexão sobre o que pertence aos pressupostos necessários do procedimento de fundamentação, ou da argumentação racional como tal – seja qual for o seu conteúdo. Para essa reflexão sobre a práxis argumentativa importam exclusivamente os pressupostos moralmente relevantes ao êxito de um discurso racional de fundamentação. Ela não recorre, portanto, a nenhum tipo de conteúdo para além disso, sejam pretensas obrigações em prol da diminuição do sofrimento, obrigações de direitos à obtenção máxima de felicidade, do esforço pela paz, do desejo de 60 Um exemplo da maneira de proceder lingüístico-analítica é a abordagem ética de Tugendhat. Segundo ele, “devemos iniciar uma préconsideração formal antes da discussão (conteudística, H. Gronke) de um determinado conceito de moral; e nessa pré-consideração deve-se esclarecer de antemão como é que, enfim, se pode entender um juízo moral, e com ele uma concepção moral. Em uma situação como a nossa, na qual já não estamos mais seguros de uma determinada fundamentação da moral (nem, portanto, de uma determinada concepção moral) e na qual diversas concepções morais concorrem umas com as outras, precisamos nos assegurar previamente do que é que se deve entender por moral” (TUGENDHAT, 1993, p. 26). Essa maneira de proceder é conseqüente, mas não o bastante, pois, no sentido de uma auto-responsabilidade do pensamento, ainda seria necessário antecipar um passo reflexivo a mais, qual seja, explicitar os pressupostos normativamente substanciais que precisariam estar subjacentes a cada investigação direta e formal. 23 002498_Inicio.book Page 24 Monday, September 29, 2003 3:05 PM ser reconhecidamente membro de uma comunidade, sejam a suposição da santidade da vida, o desejo de viver em unidade com a natureza etc. A ética do discurso transcendental-pragmática sintetiza o conteúdo moral que, nessa atitude consciente de reflexão sobre o discurso, se revela como iniludível (unhintergehbar), em um imperativo moral categoricamente vinculativo, qual seja, o princípio discursivo: empenha-te em agir de tal modo que o consenso obtido em um discurso argumentativo ilimitado, voltado ao acordo mútuo e conduzido de maneira séria, seja favorável à legitimação de tua maneira de agir! Quando o princípio discursivo se refere especificamente às maneiras de agir concernentes a problemas de responsabilidade consecutiva (Folgenverantwortung) em situações de conflito moralmente relevantes, conserva-se então um princípio de universalização,61que indica as condições de legitimação para a assumpção de responsabilidade (Verantwortbarkeit) pelas conseqüências de um agir, bem como as de imputabilidade dessas conseqüências, para os atingidos. Princípio de legitimação da ética de responsabilidade por parte da ética discursiva (princípio de universalização): uma maneira de agir está moralmente justificada exatamente quando as conseqüências e os efeitos secundários resultantes de ela se consumar para todos os atingidos, levando-se em conta as posições de interesse e orientações de valor assumidas por eles, puderem ser aceitos por todos os que argumentam de modo sensato, mediante boas razões para isso. A fundamentação segura dessas fórmulas do princípio moral está no discernimento (resultante de reflexão sobre o diálogo ou a comunicação) segundo o qual o êxito do acordo mútuo humano depende de um saber intersubjetivo e implicitamente pressuposto. Esse saber expresso nos princípios acima mencionados transforma a pragmática do discurso no objeto de um “discurso sobre o discurso” (Diskursdiskurs), o qual, em uma “estrita reflexão”62 sobre a situação discursiva atual, dá a conhecer os 61 O princípio de universalização aqui formulado remonta, quanto à sua forma, ao princípio formulado por J. Habermas; no referente a seu conteúdo, porém, ele se afasta, em aspectos centrais, do princípio habermasiano (Cf. HABERMAS, 1996, p. 60). 62 KUHLMANN, 1985. 24 pressupostos de sentido cuja validação jamais pode ser contestada seriamente, já que a simples afirmação de sua contestabilidade seria pragmaticamente inconsistente, além de incompreensível aos demais, como contribuição ao discurso. Não é sem empecilhos que se transpõe para o campo da realização o estado de validação ou a plausibilidade lógico-validante do princípio moral, que não posso senão supor nesse contexto. O que fazer concretamente em um caso de conflito, quando se pretende seguir o princípio geral de realizar o que é digno de apreciação consensual? Como administrar, por exemplo, situações de conflito em que interesses e expectativas econômicas, como o agenciamento do crescimento econômico voltado a desonerar o mercado de trabalho, entram em contradição com a exigência de respeito à ecologia? Se, de acordo com os princípios discursivo e de universalização, não é intenção dos teóricos da ética do discurso simplesmente abandonar o agir concreto ao juízo do indivíduo, é preciso que eles possam derivar do princípio discursivo também outros princípios que, mesmo sem fixar conteudisticamente a realização do princípio discursivo, venham ao menos orientá-la de maneira vinculativa. Princípios de realização da responsabilidade ecológica Indicar de maneira correta o caminho para realização do princípio discursivo, e sobretudo não desgastá-la indevidamente, exige considerar, antes de mais nada, uma diferenciação importante no conceito de dever moral. Se é possível distinguir duas compreensões de dever moral, por certo concatenadas entre si, também não é pouco freqüente que elas sejam confundidas. Segundo uma dessas compreensões, o dever é concebido como aquilo a que uma pessoa se vê obrigada; de acordo com a outra, o dever moral se refere à maneira de agir verdadeiramente correta do ponto de vista moral. Entretanto, no caso concreto, jamais se pode dizer algo definitivo sobre este último elemento, ou seja, a correção moral de uma maneira de agir. Para ter segurança absoluta acerca da correção de uma maneira de agir, teríamos que já saber o impossível, isto é, em que poderia consistir o consenso que viesse a se estabelecer em um universo discursivo ilimitado. A impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 25 Monday, September 29, 2003 3:05 PM correção moral, portanto, só pode ser entendida como idéia reguladora que indica a direção em que nossos esforços discursivos devem caminhar. Em certa medida, o princípio discursivo é um dever incondicionado que contém um dever regulador: sempre se deve fazer esforços da maneira dada, ou seja, em favor de um modo de agir cuja legitimidade jamais poderá ser comprovada com absoluta segurança em um mundo finito e limitado. Há duas formas de obter princípios de responsabilidade ou de realização a partir do princípio moral ético-discursivo. Primeiro, pode-se investigar o esforço discursivo concreto implicado pela idéia reguladora de um consenso argumentativo. Tem-se, assim, a ética do discurso como ética procedimental.63 Segundo, é possível depreender do esforço discursivo teores materiais que possam preceituar uma orientação reguladora de objetivos voltada ao esforço concreto em favor de um agir responsável. Temse, então, a ética do discurso como ética de responsabilidade material. 1. Se, de acordo com o princípio discursivo, só é considerado moralmente correto o comportamento que se mostra digno de consenso em um discurso comunicativo ilimitado, decorre daí a exigência concreta de não julgar a própria maneira de agir somente a partir da perspectiva própria e limitada, mas desembaraçá-la por meio de sua submissão à apreciação crítica em discursos reais mantidos com outros interlocutores discursivos, em número tão grande quanto possível. Como primeiro princípio de realização no âmbito de uma ética de responsabilidade, surge o imperativo discursivo de concreção e execução do princípio moral, referidas a uma situação. Princípio de realização 1, no âmbito da ética de responsabilidade: princípio de concreção e execução da ética do discurso – esforça-te por encontrar nos discursos reais e orientados para o acordo mútuo um consenso argumentativo sobre a maneira correta de agir em favor da solução de uma situação de conflito moralmente relevante: • por um lado, à medida que te esforces por averiguar com os outros a maneira de agir 63 A esse recorte Habermas limitou a ética do discurso. impulso nº 30 que realmente possa se justificar mediante a pressuposição de uma comunidade de ação64 moralmente posicionada; • por outro lado, à medida que te esforces por averiguar com os outros a maneira de agir que, sob as condições de ação do mundo da vida real,65 possibilite que se imponha e faça vigorar da melhor maneira possível a ação verdadeiramente moral! 2. A ética contida no princípio de realização 1 é uma ética para discursos. Ela afirma que devemos manter discursos, sobre o que eles devem versar e quais os que devemos manter. Nela não se diz nada sobre os resultados concretos dos discursos que devam ser convertidos em ações moralmente justificadas. E isso tem uma boa razão de ser. Simplesmente não se pode determinar de antemão o que se irá revelar digno de consenso nos discursos concretos. Descobrir tal coisa é assunto dos respectivos parceiros do discurso, e, se possível, em especial dos que participam das decisões e são atingidos pelas conseqüências, dos especialistas, conhecedores dos interesses em questão e com o know-how necessário à conversão dos resultados do discurso em realidade. O reverso desagradável dessa abertura de uma ética procedimental, que permite reagir de maneira flexível a situações conflitivas em permanente estado de mudança, é a carência de teor materialcriteriológico. Além de critérios de validação formal como ausência de contradição, coerência, evidência etc., parece não haver à disposição dos parceiros do discurso quaisquer critérios conteudísticos fundamentais para que encontrem um consenso racional. Isso poderia levar – segundo supõe Vittorio Hösle,66 entre outros – a conseqüências absurdas ou formas de comportamento cínicas: 64 Trata-se aí do pressuposto idealizante de uma sociedade que quer o que seja moral e que também estaria em condições de fazer o que fosse moral. Não se supõe aí um mundo moral, mas simplesmente um posicionamento moral dos que integram, em situações de conflito, o grupo daqueles que podem exercer influência sobre os acontecimentos. 65 No mundo real da vida não se pode contar de forma corrente com um posicionamento moral dos agentes sociais. Quando o imperativo de realização prática refere-se ao mundo real da vida, ele então desidealiza o imperativo do consenso, sem negá-lo como elemento regulador. 25 002498_Inicio.book Page 26 Monday, September 29, 2003 3:05 PM Pois se pode conceber de fato a situação em que a maioria avassaladora da humanidade diga: “Vamos aproveitar bem a vida nos próximos dez anos, vamos continuar destruindo a natureza; recusemo-nos a assumir os desgastes que trariam para nós as mudanças necessárias – e então naufraguemos!” O que dizer em face de uma decisão como essa? Para um filósofo da ética do discurso ela seria moral – ao menos se tomada de forma unânime –; para um filósofo da ética material, como Jonas, ela seria o cúmulo da imoralidade.67 Por que esse raciocínio de Hösle não se aplica à ética transcendental-pragmática do discurso? Porque os pragmáticos transcendentais também extraem conteúdos materiais da reflexão sobre a situação discursiva atual; por certo, não os que determinam previamente a saída dos discursos concretos, mas os que, de acordo com o princípio discursivo ou o de universalização, fazem parte dos pressupostos necessários ao êxito de um agir. A partir da reconstituição reflexiva dos pressupostos de sentido vinculados ao reconhecimento do princípio moral ético-discursivo, evidencia-se que o consenso a ser obtido em um discurso ilimitado, e que venha a garantir um agir moralmente correto, jamais pode ser suposto na realidade histórica e limitada. Em todo consenso factual também é preciso considerar que ele possa ser refutado por um contra-argumento futuro. Mas se o que cabe fazer – segundo a exigência do princípio moral – é esforçar-se por obter o melhor consenso possível, então, é imoral, por exemplo, colocar em risco a existência de gerações futuras, cujos integrantes po66 Não me dedicarei aqui às confusões geradas por Hösle ao aglomerar e embaralhar o consenso factual, a mera unificação, opinião de maioria, consenso argumentativo factual, consenso argumentativo ideal etc. (cf. HÖSLE, 1990, p. 248ss). Até que ponto a argumentação de Hösle simplesmente passa ao largo do âmago da ética transcendental-pragmática do discurso, ao ignorar, por exemplo, que ela entende o consenso argumentativo da comunidade discursiva ilimitada como critério regulativo de validação, e não meramente como concordância meramente factual, fica evidente na seguinte passagem: “Quando um sádico e um masoquista, por exemplo, decidem por vontade livre e de comum acordo instrumentalizarse um ao outro da maneira mais sórdida, o comportamento de ambos, aos olhos da pragmática transcendental é tão moral quanto o de dois seres que se decidem de comum acordo a não praticar coisas desse tipo – pois nos dois casos há consenso (sic!)” (HÖSLE, 1990, p. 249). 67 Idem, 1991, p. 257. 26 deriam apresentar contra-argumentos melhores.68 Da mesma maneira, seria imoral converter o resultado falível de um discurso factual em um agir que firmasse condições imutáveis para todo o sempre (ao extremo, um “naufrágio” total da humanidade). Afinal, o esforço por um comportamento digno de consenso pressupõe também o de conservar e melhorar as condições que tornem possível alcançar o consenso mais racional possível. Isso significa, sobretudo, o dever de esforçarse pela melhora duradoura das condições discursivas sociais e institucionais, à medida que se luta contra a ditadura e o terror, assume-se a defesa das relações democráticas, empenha-se pela melhora das oportunidades de formação escolar e humana (em especial para as camadas desprivilegiadas da população), exige-se judicialmente a liberdade de argumentação, tornam-se acessíveis os meios de informação e se impede sua manipulação, colabora-se com o desenvolvimento do Estado de direito etc. Princípio de realização 2, no âmbito da ética de responsabilidade: princípio institucional de progresso da ética do discurso – esforça-te por atuar de tal modo que tua maneira de agir dê contribuição duradoura para a melhora das condições sociais e institucionais, de modo que a legalidade de ações ou decisões seja testada em discursos públicos tão voltados ao acordo mútuo quanto possível, e em prol de que o que seja considerado legítimo sob o princípio regulador do merecimento de consenso possa vigorar e impor-se da melhor maneira possível! A obrigação de melhorar as relações institucionais do discurso e do direito já contém em si o dever de evitar seu pioramento. Sem dúvida, no engajamento em favor do progresso moral da sociedade, perde-se freqüentemente de vista o risco que possa estar associado a maneiras de agir bem intencionadas e voltadas à conservação das relações discursivas já existentes. Portanto, é recomendável expressar, 68 Pelo fato de Hösle não apreender o conceito de um universo discursivo ilimitado ou de um discurso ilimitado como idéia regulativa, e, mais do que isso, sobpor a ele o significado das gerações que existiram factualmente em algum momento do passado, ele crê que a ética do discurso tem de ligar as pretensões de direito que essas gerações pudessem ter tido à real existência delas. “A obrigação de preservar a vida humana neste planeta não pode se fundamentar sobre os direitos das gerações vindouras – pois ainda não há essas gerações; sim, o que fazemos com nosso comportamento é mesmo decidir se elas existirão” (idem, 1990, p. 257). impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 27 Monday, September 29, 2003 3:05 PM sob a forma de um princípio independente, a obrigação de tomar precauções durante a perseguição de objetivos próprios ou então sociais e morais, no sentido de que as relações discursivas e jurídicas vigentes não sofram piora com a aplicação dos meios utilizados (por exemplo, a condução de uma chamada guerra “justa”, revolução, golpe político, embargo comercial, condenação pública, medidas de regulação e desregulamentação etc.). Princípio de realização 3, no âmbito da ética de responsabilidade: princípio institucional da preservação da ética do discurso – esforça-te por atuar de tal modo que tua maneira de agir não destrua ou ameace essencialmente o acervo de condições sociais e institucionais alcançado segundo a disposição do princípio de progresso, acervo este que torna possível provar a legalidade de ações ou decisões em discursos públicos, tão voltados quanto possível ao estabelecimento de acordos mútuos, bem como impor e fazer vigorar, da melhor maneira possível, o que seja considerado legítimo sob o princípio regulador do merecimento de consenso! Com base na visão de uma ética antropocêntrica, subjazem três pressupostos normativos aos princípios de realização 2 e 3, princípios que podem levar a omissões inevitavelmente vinculativas. Os três pressupostos normativos são: tem de haver razão prática!; tem de haver uma humanidade como portadora da razão prática!; tem de haver uma humanidade com orientações de interesse e valores, sendo elas objetos da razão prática! Uma maneira de agir que negasse por completo as condições de realização desses mandamentos teria, em todo caso, que deixar de ser levada a cabo, mesmo que através dessa omissão se obstruísse o cumprimento de outros interesses (embora moralmente reconhecidos). Com referência à questão da ética ecológica, resulta daí um Princípio de realização 4, no âmbito da ética de responsabilidade: princípio ético-natural de omissão da ética do discurso – omita-se de todas as ações que puderem ocasionar conseqüências ou efeitos secundários dos quais se possa temer, com boas razões, que eles destruam o acervo natural indispensável à: • sobrevivência; • vida responsável e autodeterminada; impulso nº 30 • satisfação material e cultural dos interesses e da configuração de orientações de valor das gerações de hoje e futuras. Com os quatro princípios de realização do princípio moral ético-discursivo apresentados acima, estabeleceu-se a moldura para a solução da maior parte dos problemas moralmente relevantes. Dizer de que maneira essa moldura será concretamente preenchida é tarefa tanto dos discursos especializados ligados a situações específicas quanto da opinião pública dotada de senso crítico. Ainda há, certamente, uma série de problemas morais relevantes, dos quais supostamente não se pode dar conta através da concepção moral esboçada até aqui; e, com freqüência, eles entram em discussão justamente quando se fala da defesa do meio ambiente e da natureza. Podemos pôr em risco a extinção de espécies de plantas e animais? Temos de respeitar as carências de seres vivos que não sejam humanos? Podemos infligir sofrimento a animais? Podemos fazer da natureza um simples meio para atingir nossos fins? Podemos sacrificar um biótopo em virtude da instalação de uma estabelecimento industrial? A essas questões uma concepção moral antropocêntrica não é capaz de dar respostas satisfatórias. No máximo, ela pode argumentar no sentido de uma prudência moral, ao tornar o tratamento dedicado à natureza dependente do proveito moral daí resultante em favor dos seres humanos. Se um tratamento zeloso da natureza for bom para a existência humana, cabe adotá-lo. Se a danificação da natureza for nefasta ao ser humano, deve-se evitá-la; e se ela for inofensiva ou benéfica para o ser humano, então, se pode ou se deve, respectivamente, permitir que ela ocorra. Essa concepção da responsabilidade ecológica (pela natureza) deixa lacunas em nossa consciência ética diante da natureza. Afinal, temos intuições e sentimentos morais que nos levam a considerar um comportamento ofensivo à natureza ou aos animais como moralmente questionável em si mesmo. E possuímos essas intuições independentemente de esse comportamento ter ou não conseqüências negativas para o ser humano. 27 002498_Inicio.book Page 28 Monday, September 29, 2003 3:05 PM Com isso, resta a seguinte questão fundamental: há uma responsabilidade em face da natureza, em virtude da natureza em si mesma? “Há uma responsabilidade em face da natureza, que subsiste independentemente da responsabilidade pela humanidade que ora vive e que viverá no futuro? De que tipo, em especial, é a nossa obrigação de defender os animais?”69 OBRIGAÇÕES DE RESPONSABILIDADE DIANTE DA NATUREZA? À medida que ele (o poder do ser humano gerado pela técnica moderna) ultrapassa o horizonte das redondezas de espaço e tempo, o alcance ampliado do poder humano rompe com o monopólio antropocêntrico da maioria dos sistemas éticos iniciais, sejam eles religiosos sejam seculares. Era sempre o bem humano que se tinha que fomentar, eram os interesses e direitos dos demais seres humanos que deviam ser respeitados, o mal que acontecia a eles deveria ser reparado e seus sofrimentos é que se deviam amenizar. O objeto da obrigação humana eram os seres humanos ou, na pior das hipóteses: a humanidade, e além dela nada mais na Terra. (...) nada disso deixa de ter sua força vinculativa. Mas agora é a biosfera toda do planeta – com sua plenitude de espécies, e com sua fragilidade (descoberta há pouco tempo) em face das intervenções desmedidas do ser humano – que reivindica uma parte do respeito devido a todos os que têm em si mesmos seu fim – ou seja, a todo vivente. O direito exclusivo de homens e mulheres ao respeito humano e deferência ética foi cassado juntamente com sua própria vida. Enquanto poder planetário de primeira linha, ele já não pode mais pensar apenas em si mesmo.70 Hans Jonas chama a atenção aqui para o fato de que a responsabilidade do ser humano diante da natureza, e em face do crescente poder técnico à disposição do homem, carece de uma fundamentação 69 70 HABERMAS, 1991, p. 219. JONAS, 1987, p. 46. 28 que vá além da fundamentação puramente antropocêntrica. Surge, então, a pergunta: “Como pode a natureza ser objeto de obrigações éticas, se ela mesma, é claro, não pode ser sujeito dessas mesmas obrigações? Como ela pode ter direitos, se está despojada da capacidade de exigi-los judicialmente?”.71 Uma fundamentação consistente dos direitos da natureza parece ter se tornado praticamente impossível nesse ínterim. As respostas mais freqüentes dadas sob uma perspectiva não-antropocêntrica – e sim fisiocêntrica – são o patoscentrismo ou o biocentrismo. A versão fundamental do patoscentrismo baseia-se na assumpção de que todos os seres a que se podem atribuir interesses têm direito à consideração de seus interesses. Os animais, como se supõe, têm interesses; por conseguinte, eles também têm direitos que nos obrigam a um comportamento responsável em relação a eles e em virtude deles mesmos.72 O biocentrismo vai ainda mais longe: reconhece um valor moral consistente em si mesmo para tudo o que pertence à natureza orgânica. Já mencionamos que o “movimento de ecologia profunda” defende quanto a isso uma opinião radical, uma vez que ainda atribui esse mesmo reconhecimento a toda a natureza inorgânica. Seu primeiro teorema reza: “O bem-estar e prosperidade da vida humana e não-humana na Terra têm valor em si mesmos (sinônimos: valor intrínseco, valor inerente). Esse valor independe da utilidade do mundo não-humano para os fins humanos”.73 Trata-se de enfoques que cabe levar a sério por acrescentarem argumentos altamente plausíveis à questão. Naturalmente, não há um argumento sequer do tipo que pudesse valer como fundamento de uma obrigatoriedade. Os enfoques fisiocêntricos não abarcam suposições factuais sobre as quais construam todo o seu sistema. Por isso, suas conclusões são circulares, pois partem de uma premissa da qual não se podem mais apartar, ou falsas do ponto de vista lógico, na medida em que deduzem um 71 HÖSLE, 1991, p. 74. Um papel pioneiro no desenvolvimento dessa posição foi desempenhado por Leonard Nelson. Sobre isso, cf. BIRNBACHER, 1998, pp. 1336; e GRONKE, pp. 89-113. 73 NAESS, 1997, p. 188; DEVALL, 1997; e SPRIGGE, 1997. 72 impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 29 Monday, September 29, 2003 3:05 PM dever ou um desconsentimento a partir de um estado de coisas (Sachverhalt) (ligado à orientação finalista da natureza, a interesses ou desejos etc.) já existente ou suposto. Como a ética do discurso considera irremediável toda e qualquer tentativa de fundamentar deveres e direitos morais mediante um regresso a algo que esteja fora da razão intersubjetiva, ela procura por novos enfoques de fundamentação internos à razão. São duas as linhas de argumentação que poderiam ser significativas nesse contexto. A primeira linha de argumentação apóia-se em que “estamos ligados a ela [uma parte da natureza orgânica] por uma atadura do compreender – a saber, nós mesmos enquanto seres naturais sensíveis, ansiosos, persistentes”.74 A concernência da natureza inumana à moral community poderia resultar, de acordo com isso, de nossa capacidade de compreender a natureza orgânica e iniciar com ela um relacionamento comunicativo. Podemos reconhecer direitos da natureza se ela surgir para nós como algo semelhante ou análogo aos co-sujeitos humanos da comunicação.75 No entanto, essas não são soluções suficientes para a questão da fundamentação de uma ética da natureza. Argumentos analógicos não são concludentes; com eles, só é possível motivar para um comportamento, e não comprovar obrigatoriedades incondicionadas. A segunda linha de fundamentação remonta à acusação de dogmatismo feita por Hans Jonas contra os que deduzem, com base na contestação da falácia naturalista, uma impossibilidade de fundamentação (por princípio) no campo da ética da natureza. A contestação surgida no âmbito de uma crítica à metafísica, que acusa as éticas ontológicas valorativas da suposição injustificada de uma natureza dotada de valor e requeredora de obrigações, estaria 74 BÖHLER, 1994, p. 63ss. APEL, 1994, p. 397. Ao encontro dessa proposta de fundamentação também vem a consideração de Jürgen Habermas, de que se fundamentem os direitos dos animais sobre a nossa relação comunicativa com eles: “À medida que seres vivos tomam parte de nossas interações sociais, deparam conosco no papel de um alter ego, qual fossem um ‘diante-de’ que carece de zelo e que fundamenta assim a expectativa de uma consideração tutelar em face de suas pretensões. Uma responsabilidade análoga, do ponto de vista moral, subsiste em face de animais que assumem o papel de segunda pessoa (mesmo que esse papel não se cumpra por completo) – e aos quais olhamos nos olhos qual fossem um alter ego” (HABERMAS, 1991, p. 224). 75 impulso nº 30 apoiada ela mesma – segundo Jonas – sobre uma suposição injustificada, a saber: o dogma moderno de um ser da natureza desprovido de valor.76 Se for seguida essa linha de fundamentação e, optando-se por ela, não se tomar como apoio figuras metafísicas de argumentação – como faz Jonas – , mas uma argumentação rigorosamente crítico-racional, então, não se poderá contrapor um dogma (da natureza dotada de valor) a outro (da natureza valorativamente neutra). Será preciso apenas mostrar, isso sim, o que acontece no caso de se abandonar um dogma. Decorre daí, em primeiro lugar, o discernimento socrático de que não se sabe como são as coisas na realidade e tampouco (talvez jamais se saiba) se a natureza inumana tem ou não direitos em relação a nós. Mas será que esse discernimento quanto à insciência já não poderia ser o bastante para fundamentar obrigações vinculativas do ser humano em face da natureza inumana, e em virtude dela mesma? Nas considerações discursivo-reflexivas, apresentadas em dois momentos a seguir, tenta-se dar uma resposta positiva a isso. O primeiro passo reflexivo consiste em provar que a tese de que não estamos, de forma alguma, obrigados a um agir responsável em face da natureza, e em virtude dela mesma, não pode ser simplesmente defendida em um discurso logicamente consistente, pois ela se baseia em um paralogismo logocêntrico. A partir do discernimento ético-discursivo de que seres racionais e discursivos têm direitos, conclui-se aqui, de maneira inadmissível, que os seres que não sejam racionais nem discursivos não têm direitos. O paralogismo logocêntrico apóia-se sobre um engano categorial: quando o campo dos que podem legitimar as normas morais por si mesmos é identificado com o campo daqueles cujas carências e interesses são o objeto das normas morais, ocorre, então, que o plano de validação do discurso funda-se com o plano objetal do discurso. O segundo passo reflexivo começa por abordar nossa compreensão acerca da reflexão moralfilosófica. A filosofia procede de maneira reconstituinte, ou seja, procura desvelar um saber de que 76 GRONKE, 1994, p. 416ss. 29 002498_Inicio.book Page 30 Monday, September 29, 2003 3:05 PM precisamos dispor para que nosso agir cotidiano possa ser tão bem-sucedido quanto qualquer agir em geral e como tal. Dispomos provavelmente desse saber, mas, via de regra, não o temos sob a forma de um saber conceitual claro e expresso. Logo, a tarefa da filosofia e da ciência reconstituinte consiste em conferir forma conceitual a nosso saber operativo (Handlungswissen) implícito e ainda sem expressão. O critério para que tenhamos a teoria correta sobre esse saber só pode ser a práxis pré-teorética, especialmente a conversacional (Redepraxis) e a do juízo. Em resumo, resulta daí ser preciso podermos referenciar as teorias filosóficas, e, portanto, também as teorias éticas, a nossa práxis operativa (Handlungspraxis). As teorias têm que poder confluir com nossas intuições pré-teoréticas, e ser coerentes com elas. “Ética normativa é também (...) a reconstituição crítica dessas intuições. Os resultados desses esforços da ética normativa não podem contradizer essencialmente essas intuições (seja lá o que isso queira dizer em cada caso individual).”77 Essa compreensão da reflexão filosófica só pode ser validada se for possível discutir os direitos da natureza a um tratamento responsável; por exemplo, o direito dos animais a serem poupados do sofrimento. Também nesse caso as teorias moral-filosóficas têm que ser coerentes com nossas intuições pré-teoréticas de que é condenável infligir sofrimentos a animais sem que para isso haja uma boa razão. Por mais bem concebida que seja a teoria que fundamenta obrigações em relação a animais e seus direitos, a ela se garante primazia sobre outra teoria que conteste tais coisas; e isso no sentido – e somente no sentido!78 – de que o ônus da fundamentação recaia sobre a teoria contrária, oposta às intuições pré-teoréticas. Tal reflexão é apoiada pelo princípio discursivo. Na medida em que ele torna a correção moral de uma maneira de agir dependente da idéia reguladora de uma condição digna de consenso no interior de uma comunidade discursiva ilimitada, também nos obriga, como membros de comunidades discursivas 77 KUHLMANN, 1992, p. 133. Isso não significa ver nossas intuições morais como infalíveis. Com boas razões, pode-se corrigi-las. 78 30 limitadas, a considerar em nossas decisões a falibilidade de todas as afirmações e teorias concretas. Como resultado, de modo geral, devemos tomar nossas decisões de maneira extremamente cuidadosa, isto é, de modo que o excedente de fixações contingentes a que recorremos nessa situação permaneça o menor possível. Sob o aspecto da ética da natureza, isso significa que nós, quando logramos comprovar a neutralidade moral da natureza, devemos, até segunda ordem, agir como se os setores da natureza, diante dos quais temos fortes intuições morais, tivessem uma relevância moral por si mesma: in dubio, manifestemo-nos em prol do direito da natureza, mesmo que apenas pressentido!79 Contudo, pode-se chegar a conseqüências absurdas, caso não se considere um aspecto a mais do princípio discursivo. Holistas radicais, entre eles, os do movimento de ecologia profunda, poderiam sucumbir à idéia de que, com essa obrigação de responsabilidade baseada no mandamento de precaução (Vorsichtsgebot), tenhamos reconhecido uma obrigação de responsabilidade em face de todas as coisas existentes na natureza, e em virtude delas mesmas. Teríamos, assim, que atribuir às plantas um direito consistente por si mesmo, respeitar os direitos de um rio e prestar deferência à matéria natural em seu todo.80 O princípio discursivo impõe limites a um transbordamento da consciência ligada à ética da natureza, uma vez que torna a validação moral de uma maneira de agir dependente de ser justificada em discursos sérios, ou seja, em discursos aos quais se trazem apenas as convicções de que estamos sinceramente convencidos, e as quais podemos transmitir aos outros de forma acreditável. O mandamento de precaução, por conseguinte, só pode estar referido às áreas da natureza (os seres naturais passíveis de sofrimento, por exemplo) cujo direito à proteção possa ser socialmente sustentado pelas instituições morais solidamente alicerçadas e partilhadas de modo geral, por instituições que nos dizem ser injusto molestar um 79 A justificação desse princípio não é afetada pelo fato de, com ela, se criarem problemas consecutivos, por exemplo, o problema relativo a como atribuir, em casos específicos, pesos diversos aos direitos de seres humanos e aos dos seres naturais. 80 MEYER-ABICH, 1984 e 1990. impulso nº 30 002498_Inicio.book Page 31 Monday, September 29, 2003 3:05 PM animal sem uma boa razão ou devastar uma paisagem por um ensejo fútil. O mandamento “Em caso de dúvida, sê favorável ao direito da natureza” só é válido sob a ressalva de um teste positivo de seriedade aplicado aos parceiros do discurso. Tais restrições constituem a diferença essencial em relação aos chamados ecofilósofos éticos (Öko-Ethikern), que pretendem atribuir à natureza um valor em si, independente do ser humano.80 A argumentação apresentada – mantida por completo, mesmo sem o registro de premissas metafísicas e, mais do que isso, atendo-se de maneira estrita à dependência de todos os “valores naturais” relativamente aos (inter)sujeitos judicantes – nos conduz a um princípio discursivo talhado de acordo com o interesse próprio à ética da natureza. Princípio discursivo próprio à ética da natureza – em face da natureza inumana, e em virtude dela mesma, esforça-te por agir responsavelmente, e de modo que argumento algum apresentado em um discurso conduzido com seriedade venha a enfraquecer instituições ligadas à ética da natureza e partilhadas de maneira geral. A responsabilidade em face da natureza fundamentada dessa maneira pode ser subdividida em: 1. uma obrigação de responsabilidade incondicionada; e 2. obrigações de responsabilidade condicionadas e com base na primeira. Incondicionada é a obrigação de considerar determinados setores da natureza em geral como membros da “moral community”. Condicionadas, por sua vez, são as obrigações concretas que daí decorrem. O fato de reconhecermos pretensões de valores a alguns setores da natureza não significa que lhes devemos conferir validação incondicionada. Para a determinação das obrigações concretas também se devem levar em conta as respectivas circunstâncias. Ainda que, por princípio, estejamos obrigados, com relação aos animais, a não torturá-los ou matá-los, é possível que boas razões referidas a condições situativas condicionem uma restrição dessa obrigação. Caso um comportamento ligado à ética da natureza restrinja direitos fundamentais de seres humanos (como os seres que podem legitimar o comportamento moral), então, as obrigações de responsabilidade diante de seres humanos devem ter prioridade sobre aquelas perante a natureza. Ocasionalmente, para fins médicos bastante sérios, é possível, por exemplo, que resulte disso o direito ou mesmo a obrigação de realizar experimentos com animais. O primado de direitos dos seres humanos em relação aos da natureza também precisa articular-se em um princípio de responsabilidade em que tenha lugar a perspectiva da forma de existência futura da natureza. Com referência ao setor da natureza dos seres passíveis de sofrimento ou privações, o princípio poderia assumir a seguinte forma: Princípio de realização 5, no âmbito da ética de responsabilidade: princípio de responsabilidade em ética da natureza de uma responsabilidade pelo futuro- preserva as possibilidades dos seres humanos ou da humanidade de assumir sua responsabilidade por seres passíveis de sofrimento ou privações, e melhora-a a tal ponto que com isso não sejam diminuídas as possibilidades dos seres humanos de assumir sua responsabilidade pelos interesses vitais humanos! Os princípios de responsabilidade ético-discursivos aqui apresentados possibilitam, em seu conjunto, responder de forma diferenciada aos desafios dos riscos ecológicos referidos ao meio ambiente e à sociedade. Referências Bibliográficas 81 APEL, K-O. Die ökologische Krise als Herausforderung für die Diskursethik (A Crise Ecológica como Desafio para a Ética Do Discurso). In: BÖHLER, D. 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