1
Universidade Federal do Rio de Janeiro
A COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DOS PLANOS DE
SAÚDE:
Márcia Garcia
Rio de Janeiro
2004
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
NÚCLEO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA
DEPARTAMENTO DE MEDICINA PREVENTIVA
MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA
PLANEJAMENTO E POLÍTICA DE SAÚDE
LINHA DE PESQUISA RELAÇÃO ENTRE O PÚBLICO E O PRIVADO
A COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO DOS PLANOS DE SAÚDE:
Márcia Garcia
Dissertação apresentada ao
Núcleo
de
Estudos
de
Saúde
Coletiva e ao Departamento de
Medicina da UFRJ como requisito
parcial para a obtenção do título de
Mestre em Saúde Coletiva.
Orientador: Profª. Drª Lígia Bahia
Rio de Janeiro, novembro de 2004
3
Banca Examinadora da Dissertação de Mestrado
Orientador: Drª Lígia Bahia
Membros:
1. Drª Amélia Cohn - USP
2. Drª Maria Lúcia Teixeira Werneck Vianna - UFRJ
3. Drª Regina Cele A. Bodstein - ENSP/FIOCRUZ
Dissertação submetida ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ,
Curso de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Núcleo de Saúde Coletiva da
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Data: 19/11/04
4
Ficha Catalográfica
Garcia, Márcia
A Comissão Parlamentar de Inquérito dos Planos de Saúde/
Márcia Maria Garcia Gomes. Rio de Janeiro: UFRJ/ Centro de
Ciências da Saúde/ Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva, 2004.
Xix, 142 p.:il
Orientadora: Lígia Bahia
Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) – Universidade
Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Programa de Pós-Graduação
em Saúde Coletiva do Núcleo de Estudos de Saúde
Coletiva/NESC, 2004.
1. Saúde Pública. 2. Planejamento e Política de Saúde. 3.
Relação
Público/Privado
I.
Bahia,
Lígia
(orientadora).
II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Núcleo de Estudos de
Saúde Coletiva. III. Título.
5
RESUMO
O tema da regulação dos planos e seguros de saúde no Brasil ingressou
definitivamente na agenda pública do país. A importância que lhe foi conferida
pela mídia reflete preocupações, interesses e conflitos que envolvem clientes,
prestadores de serviços, e empresas de assistência suplementar. No âmbito
acadêmico, observa-se o crescente empenho de pesquisadores para examinar
sob diversas perspectivas as relações entre Estado, políticas públicas e o
mercado de planos e seguros de saúde.
Este estudo teve como principal alvo a primeira Comissão Parlamentar
de Inquérito(CPI) para apurar as irregularidades cometidas pelos planos de
saúde no ano de 2003 com a perspectiva de compreender o que aconteceu, o
que ela fez e a que conclusões chegou, além de examinar os conflitos e
consensos de agentes envolvidos com o sistema privado de saúde no Brasil.
Foi realizada uma análise do processo de debate e das conclusões da CPI,
identificando os temas predominantes e os posicionamentos de empresários,
entidades da sociedade civil e parlamentares em uma arena legislativa
específica.
A estratégia metodológica utilizada para o desenvolvimento dessa
temática foi: analisar os aproximadamente 70 depoimentos contidos nas Notas
Taquigráficas; traçar o perfil dos membros da CPI, visando conhecer as suas
várias formas de vinculação com o tema “saúde”; identificar os temas
debatidos. Após a identificação, agrupá-los em seis categorias de debate:
Política de Saúde; Jurídico/Legal Regulação, Financiamento, Recursos
Humanos e Ética; identificar os atores e interesses envolvidos e suas
vinculações; identificar os posicionamentos dos parlamentares, das autoridades
do governo, dos representantes da sociedade civil, dos clientes de planos de
saúde, dos representantes do judiciário, dos profissionais de saúde, dos
representantes dos hospitais e por fim dos representantes das empresas
operadoras de planos de saúde, a partir de depoimentos dados nas audiências,
todas registradas nas Notas Taquigráficas.
Aprofundou-se a reflexão sobre os processos de mediação de interesses
do setor saúde no âmbito do legislativo e compreendendo a trajetória das
políticas de saúde e as questões individuais envolvidas, além de perceber o
6
imbricamento da relação público e privado. Finalmente, a presença de
empresários médicos no cenário político, que também se vinculam tanto ao
SUS quanto às operadoras, configura a complexidade e a dinâmica de
funcionamento do sistema de saúde no país.
7
Summary
It may positively be said that the regulation of health insurance plans in
Brazil has finally found its niche in the government agenda. Such a relevance is
visible through the midia attention to issues concerning conflict of interests that
involve users and services providers. It is also noteworthy the growing attention
given by investigators at academic level, mainly to issues concerning the
interplay among Government, public policies and the arena of multiple formats
of health insurance plans.
The focus of the present investigation was the analysis of the 1rst
Parliamentary Inquiry Commission (PIC) throughout its endeavors to clear a
series of irregularities imputed to health insurance plans in 2003. The objective
of the study was (i) to have a general picture of the context in which the
proceedings occurred; (ii) to know how the PIC conducted the discussions; (iii)
to understand how conclusions and consensus were attained in cases where
public and private agencies had different and conflicted interests. In sum, the
discussion took into account the content of the debates and which were the
major themes, the legislative arena where it was being held, and the principles
and arguments held by each sector which got to be represented in the PIC:
private services providers, non-governmental organizations and policy-makers.
The study was supported by the following evidences: 70 depositions
extracted from the Shorthand Notes; profile of all the members of the PIC and
its linking with the health sector; identification of all the debating themes. Once
identified these themes were grouped 6 categories: (1) Health Policy, (2) Legal
Regulation, (3) Financing, (4) Human Resources and (6) Ethics. The study also
tried to sort out the arguments according to the representatives and their arena
of action: politicians, government agents, civil rights people, private providers,
users, legal advisors, health professionals, and hospital managers.
Hopefully, this study has contributed to understand a bit more about the
way of making politics in the country, mainly in the health sector. It tried to
understand how quite particular issues become public ones, affecting the
society as a whole. Finally, it tried to contribute to understand the role of the
private health manager, that intermediary character that links the public health
8
system with profit-seekers health organizations. This kind of relationships
contribute to give the high grade of complexity of the Brazilian health system.
9
Dedicatória
Dedico este trabalho a meu pai (in memorian),
com quem muito aprendi.
À minha mãe, que torceu para que eu seguisse
em frente.
À minha família, pelo carinho e presença
constantes
estimulando
caminhada.
em
e
todos
me
os
momentos,
incentivando
me
nessa
10
Agradecimentos
À orientadora, Lígia Bahia, pela liberdade que deu à minha construção, e às
palavras de alerta e incentivo com que sempre soube corrigir os rumos do
trabalho.
Aos professores e funcionários do Núcleo de Estudos em Saúde Coletiva/UFRJ, por
terem conseguido enriquecer minha compreensão sobre a saúde brasileira.
Aos colegas do mestrado, por toda a força, pelo companheirismo e pelas
brincadeiras que compartilhamos.
À Virginia Hortale, amiga e companheira de trabalho, por ter aceito ser ledora,
apresentando sempre sugestões de pontos específicos.
À Célia Leitão, pelo carinho e olhar analítico com que sugeria as correções
metodológicas que precisaram ser feitas.
Ao Álvaro Nascimento, pelo desprendimento em ler e revisar o trabalho, por
mais de uma vez.
À Profª. Regina Cele A. Bodstein (ENSP/FIOCRUZ) e à Profª Maria Lúcia
Teixeira Werneck Vianna (UFRJ), por aceitarem participar de minha banca de
qualificação, quando apresentaram importantes contribuições.
À Mirian Cohen, pelo incentivo inicial dado à realização deste trabalho.
Ao Mario Scheffer, pela interlocução de idéias que me ajudaram a entender o
processo da CPI.
Aos meus colegas de departamento, Clarice Melamed, Mônica Campos e
Marcelo Rasga, que sempre tiveram atitudes cooperativas comigo.
11
À equipe da secretaria do DCS/ENSP/FIOCRUZ: Fábio, Érica, Jeferson e
Moacir, que, mesmo sem saber, colaboraram muito na realização do trabalho.
Ao André, meu companheiro de vida - com quem tenho o privilégio de conviver
e retirar ensinamentos - e aos meus amados e sempre carinhosos filhos, Daniel
e Thiago. Pessoas fundamentais em minha vida, que tão bem souberam
entender os dias mais tensos e ajudar a vencer as dificuldades deste percurso,
estando sempre a meu lado.
12
De tudo ficaram três coisas:
A certeza de que estamos começando,
a certeza de que é preciso continuar e
a certeza de que podemos
ser interrompidos antes de terminar.
Fazer da interrupção um caminho novo,
da queda um passo de dança,
do medo uma escada,
do sonho uma ponte,
da procura um encontro.
E assim terá valido a pena existir!
Fernando Sabino
13
Sumário
PÁG
Apresentação
Introdução
Objetivo e objeto de investigação
01
Capítulo I: Políticas de Saúde no Brasil
06
1. Antecedentes
08
2. Assistência Médica Supletiva
12
3. Situação Atual
16
Capitulo II: Reforma Institucional do Aparelho do Estado
Brasileiro e Criação da Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS).
1. Reforma do Aparelho do Estado
19
19
2. Desdobramentos da Reforma para a
Institucionalização do Sistema de Saúde
25
3. Criação da Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS)
29
Capitulo III: Comissão Parlamentar de Inquérito dos Planos de
Saúde
35
1. Origem e Instauração da CPI dos Planos de Saúde
37
2. Constituição da CPI e Formas Organizativas
42
3. Agenda de Debates na CPI dos Planos de Saúde
56
a. Política de Saúde
64
i. Limites do SUS e a importância dos planos
de saúde
64
ii. Custos das empresas de planos e seguros de
saúde
67
3.1.3 A dupla porta de entrada dos hospitais universitários
públicos
3.2 Aspectos Jurídicos e Legais
75
77
14
3.2.1 Fragmentação da legislação e migração dos
contratos antigos
3.3 Regulação
79
84
3.3.1 Papel da ANS
84
3.3.2 Atividade de fiscalização
86
3.4 Financiamento
3.4.1
88
Taxa de Saúde Suplementar e Ressarcimento
ao SUS
88
3.4.2 Financiamento público e privado
92
3.5 Recursos Humanos
97
3.6 Ética
100
Resultado Final da CPI
103
Considerações Finais
110
Referências Bibliográficas
119
15
Lista de Abreviaturas e Siglas
ABRAHUE – Associação Brasileira de Hospitais Públicos e Universitários
ABRAMGE – Associação Brasileira de Medicina em Grupo
ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade
ADUSEPS – Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos de
Saúde e Sistemas de Saúde
AIS – Ações Integradas de Saúde
ALAC – Associação de Laboratórios Clínicos
AMB – Associação Médica Brasileira
AMOMB – Associação de Obesidade Mórbida
AMS – Pesquisa. Assistência. Médico-Sanitária
ANS – Agencia Nacional de Saúde Suplementar
ANVISA – Agência de Vigilância Sanitária
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CAP – Caixas de Aposentadoria e Pensão
CBHPM – Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos
CDC – Código de Defesa do Consumidor
CFM – Conselho Federal de Medicina
CND – Certidão Negativa de Débito
CONASP – Conselho Nacional de Administração da Saúde Previdenciária
CONSU – Conselho de Saúde Suplementar
CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito
DATASUS – Dados e Informações a Serviço do SUS
EAS – Estabelecimento Assistencial de Saúde
EOPS – Empresas Operadoras de Planos de Saúde
FAZ – Fundo de Apoio de Desenvolvimento Social
FENASEG – Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados
IAP – Instituto de Aposentadoria e Pensões
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor
16
INCOR – Instituto Nacional do Coração
INPs – Instituto Nacional de Previdência Social
ISS – Imposto Sobre Serviços
LOS – Lei Orgânica de Saúde
MARE – Ministério de Administração e Reforma do Estado
NEPP – Núcleo de Estudos de Políticas Públicas
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil
PIAC – Programa de Incentivo à Adaptação de Contratos
PIB – Produto Interno Bruto
PNAD – Pesquisa Nacional p/ Amostra de Domicíiio
PROCON – Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor
SAMHPS – Sistema de Assistência Médico-Hospitalar da Previdência Social.
SIH/SUS – Sistema de Informações Hospitalar
STF – Supremo Tribunal Federal
SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
SUSEP – Superintendência de Seguros Privados
TUNEP – Tabela Única Nacional de Equivalência de Procedimentos
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
17
Lista de Tabelas
PÁG.
Tabela 1: Leitos para internação nos estabelecimentos de saúde
por classificação da entidade mantenedora
– Brasil – 1976/2002
126
Tabela 2: Multas aplicadas, por artigos da Lei nº 9.656/98, às principais
operadoras
Tabela 3: Índice de Reclamações Pós-CPI
127
128
18
Lista de Quadros
PÁG.
Quadro 1 – Cadastro de Beneficiários por Classificação de Operadoras. 129
Quadro 2 – Operadoras Registradas segundo Região e Classificação
130
Quadro 3 – Perfil dos Componentes da CPI
43
Quadro 4 – Artigos 35, 36 e 37 da Constituição Federal
131
Quadro 5 – Relação dos Convidados pela CPI
51
Quadro 6 – Doações Recebidas pelos Deputados que Compõem
a CPI nas Eleições de 2002
Quadro 7 – Ofício de Solicitação de Aumento da tabela do SUS
55
132
Quadro 8 – Descrição das Reclamações por Grupo de Interesse
e por Depoente
58
Quadro 9 – Resumo da Votação Final
133
Quadro 10 – Defesas Contra e a Favor das Emendas Supressivas
139
19
Lista de Gráficos
PÁG.
Gráfico
1
–
Operadoras
Registradas
segundo
Percentual
Acumulado
de Beneficiários
Gráfico 2 – Beneficiários por Classificação de Plano.
15
16
20
Apresentação
O tema da regulação dos planos e seguros de saúde no Brasil ingressou
definitivamente na agenda pública do país. As manchetes e seções
econômicas dos principais jornais passaram a divulgar os problemas dos
preços e por vezes de
negação de coberturas de empresas de planos e
seguros de saúde. A importância conferida ao tema pela mídia reflete
preocupações, interesses e conflitos que envolvem clientes, prestadores de
serviços, e empresas de assistência suplementar. No âmbito acadêmico,
observa-se o crescente empenho de pesquisadores para examinar, sob
diversas perspectivas, as relações entre Estado, políticas públicas e o mercado
de planos e seguros de saúde.
Quando se estabelece uma combinação das informações amplamente
difundidas sobre clientes e empresas com a reflexão de cunho acadêmico,
pode-se constatar que a polarização das idéias sobre o que deve ser feito para
reduzir os conflitos e os diagnósticos díspares sobre a situação da base de
sustentação financeira do setor estão longe de convergir para a formulação de
proposições que indiquem mudanças estruturais. Apesar das profundas
divergências, a necessidade de preservação das coberturas mediadas pelas
empresas privadas tem sido um eixo comum nas arenas de negociação que
reúnem financiadores, compradores de serviços e clientes de planos de saúde.
Tal consenso, obtido em função dos diferenciais assistenciais para quem está
ou não vinculado aos planos privados de saúde, subtrai do debate as
polêmicas sobre universalidade, eqüidade e de certo modo também amortiza
as possíveis críticas sobre a qualidade da assistência organizada pelas
empresas de assistência suplementar.
Ao se afastar muito do ponto de partida sobre as finalidades das
políticas e ações de saúde, o debate sobre planos e seguros privados de saúde
assume um caráter de conservação de benefícios individualizados, sejam eles
de acesso a serviços de saúde, sejam de obtenção de remuneração e lucro. No
entanto, as polêmicas sobre coberturas e preços dos planos de saúde
mobilizam uma constante atualização de posicionamentos dos interessados em
variadas instâncias de debates e negociação. Durante 2003 e no primeiro
semestre de 2004, os conflitos entre diversos agentes e instituições envolvidos
21
com os planos e seguros de saúde se intensificaram. Uma das instâncias onde
essas
demandas adquiriram uma expressão mais nítida foi a Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Planos de Saúde.
As lacunas no conhecimento sobre os processos que envolvem a
conciliação de interesses entre os diversos níveis de governo e alguns setores
da sociedade no âmbito do subsistema privado de saúde e minha pequena
participação como integrante da comissão de relatoria da CPI de Planos de
Saúde ensejaram a perspectiva da realização desse estudo.
A análise mais pormenorizada dos posicionamentos de empresários,
entidades da sociedade civil e parlamentares em uma arena legislativa
específica pode contribuir para o aprofundamento da reflexão sobre processos
de mediação de interesses do setor saúde no âmbito do legislativo.
22
Introdução
Objetivos e objeto de investigação
Para se situar a conjuntura em que se dá essa pesquisa é necessário
compreender a complexidade do desafio representado pela implementação do
Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. Se por um lado a crise econômica e
a democratização dos anos 80 favoreceram o debate político na área da saúde,
que se refletiu nos avanços da Constituição brasileira de 1988 e em mudanças
objetivas no sistema, nos anos 90 a concretização dos princípios do SUS
esteve em contínua tensão, por diversos obstáculos estruturais e conjunturais1
Ademais, o que se esperava era que o projeto político para a Saúde, que
se consolidou na Constituição e na Lei Orgânica de Saúde - LOS (n.º 8.080/90
e n.º 8.142/90), fosse suficientemente capaz de transferir esses princípios
democráticos para o SUS, e que de forma sistêmica fossem desenvolvidas
diretrizes e normas capazes de permitir um racional processo de avaliação.
Na prática, os constrangimentos ao processo de implementação da
Seguridade Social e do SUS impuseram a conservação dos critérios pretéritos
para o financiamento e alocação de recursos financeiros. A distribuição de
recursos para a assistência médica continuou sendo pautada pelos interesses
dos prestadores de serviços. Ao mesmo tempo em que eram realizados
esforços
nos
princípios
e
diretrizes
de
integralidade,
eqüidade,
descentralização, o sistema de saúde supletiva era revigorado pelo
deslocamento da distribuição de serviços públicos. (Bahia 2001).
Apesar do aparente paradoxo, autores como Cordeiro (2001) ilustram
que o processo de privatização da saúde vem ocorrendo com o patrocínio do
Estado. Fleury (1995) e Urbano (2003) reiteram esta afirmação, quando dizem
que a partir da década de 60 grandes investimentos foram feitos pelo Estado
na construção e modernização dos hospitais privados e na compra de
equipamentos de alta tecnologia, em detrimento dos hospitais e serviços
próprios que, gradativamente, tornaram-se sucateados, conduzindo o Sistema
1
Vários instrumentos foram criados para implantação de uma política privatista, desde o financiamento a hospitais
privados através do Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAZ), criado em 1974 com recursos das loterias e
saldos operacionais da Caixa Econômica Federal nos empréstimos a baixos juros, que, além de beneficiar o setor
privado, proporcionou a remodelação da rede implantada, até o credenciamento para compra de serviços e convênios
com empresas. Vale registrar que os serviços contratados entre 1969 e 1975 representavam cerca de 90% da despesa
geral do INPS (Oliveira et all, 1985).
23
Único de Saúde a uma dependência cada vez maior dos serviços privados,
principalmente no que se relaciona ao atendimento nos níveis secundário e
terciário.
Salienta-se também o fato de que, ainda que a Constituição Federal
estabeleça como atribuição do Estado o direito à saúde aos cidadãos através
da criação do Sistema Único de Saúde, garantindo ao setor de assistência
médico-hospitalar a oferta de serviços de assistência à saúde pela iniciativa
privada sob controle do Estado, e em seu artigo 198 que “as ações e serviços
públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e que
constitui um sistema único”, este mesmo artigo, em seu parágrafo primeiro,
afirma que as instituições privadas poderão participar do SUS de forma
complementar. Assim, ao se referir ao setor privado, o texto legal não tratou
especificamente dos planos de saúde e sim dos estabelecimentos de saúde,
sobretudo dos hospitais privados vinculados às instituições públicas. Portanto,
nem a Constituição nem a Lei Orgânica da Saúde definiram o papel dos planos
de saúde no sistema de saúde brasileiro. Tal omissão propiciou que a
reprodução e a expansão do sistema privado de saúde no Brasil se
mantivessem auto-reguladas nos marcos de um novo arcabouço legal do
sistema de saúde brasileiro.
Os incentivos oferecidos à iniciativa privada pelo Estado e o modelo
médico-assistencialista privatista, sobre o qual o sistema de saúde foi
construído, possivelmente colaboram e se associam a variáveis estruturais,
como as desigualdades sociais no país e as características do federalismo
brasileiro, para os desafios à consolidação do SUS, bem como para a
expansão e desenvolvimento do mercado de saúde suplementar. (Abrucio,
1988; Cordeiro, 1984; CNS, 2002).
Na década de 90, a existência de um mercado com perspectivas de
expansão, a entrada de grandes seguradoras no mercado de saúde
suplementar, e o aumento do poder de compra com o advento do plano real em
1994 incentivam sobremaneira a comercialização de planos de saúde. Sem
controle do Estado, os clientes de planos de saúde começam a sofrer
imposições unilaterais das empresas. Para coibir os abusos das operadoras de
planos de saúde contra os clientes, corrigir distorções e proteger os direitos dos
24
usuários, tornou-se necessária a intervenção estatal sobre a atuação dessas
empresas (Bahia et al, 2002).
A Lei nº 9.656/98 entra em vigor e institui garantias aos clientes de
planos de saúde, como tornar obrigatório o plano de referência e proibir a
rescisão unilateral de contratos. Mas a exigência do respeito aos clientes de
planos de saúde, tanto no contrato como na prática, resultou em um relatório
do Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), que evidencia a urgência da
implementação de procedimentos de fiscalização mais rígidos e eficazes para
combater o desrespeito aos direitos dos clientes de planos de saúde.
O relatório do IDEC consolida, portanto, os já conhecidos problemas, e
motiva o deputado Henrique Fontana a colocar em pauta a CPI.
A aprovação junto à mesa diretora da Câmara dos Deputados, para
constituir a Comissão Parlamentar de Inquérito dos Planos de Saúde, se
apresentou num momento propício, haja vista que a ANS se encontrava em
período de transição da diretoria e a nova presidência da Câmara dos
Deputados era exercida pelo deputado João Paulo Cunha do PT/SP.
Em 1º de maio de 2003, a instauração da CPI dos Planos de Saúde foi
publicada, no Diário da Câmara, com prazo regimental de 120 dias para a
realização dos trabalhos.
Em entrevista ao Jornal Medicina, de maio-junho de 2003, Fontana
afirma que “as empresas que operam planos de saúde são as líderes absolutas
nos rankings de reclamações dos órgãos de defesa do consumidor em todo
país”. A título de demonstração da expectativa do deputado em relação à CPI,
recorremos à transcrição de um trecho desta entrevista:
J. MEDICINA – Serão propostas modificações nas leis que
regulam a atividade do setor?
Henrique Fontana – Os limites das lacunas da lei serão
analisados e as operadoras, usuários, órgãos de defesa do
consumidor e associações médicas serão ouvidos. Vamos
fazer
um
diagnóstico
amplo
deste
setor
e
um
credenciamento universal poderá surgir a partir dele. A
conclusão poderá apontar para mudanças no arcabouço
geral da lei. Há inúmeros projetos tramitando no Congresso
25
Nacional, referentes a planos de saúde. Só eu sou autor de
cinco ou seis projetos que propõem alterações nos planos
de saúde. Um deles propõe o credenciamento universal,
proposta que já defendo há alguns anos. O paciente
escolhe e se credencia a um plano de saúde e a empresa
paga o médico escolhido pelo usuário. A empresa
estipularia apenas o valor da consulta e o paciente fica livre
para escolher onde quer se consultar. Outro pede a
obrigatoriedade da cobertura de medicamentos de uso
contínuo. Um terceiro, o fim da divisão entre planos
ambulatoriais e hospitalares, dentre outras propostas2.
Destarte, uma arena de discussões e questionamentos se apresenta
trazendo uma riqueza de informações favoráveis à realização de um estudo
mais detalhado sobre a política de saúde no Brasil.
Assim, o objeto central deste trabalho é estudar a CPI dos planos
de saúde com a perspectiva de compreender o que aconteceu, o que ela
fez e a que conclusões chegou. Além disso, identificaremos os temas
predominantes observando os fundamentos sob os quais foram tratados,
os principais atores e interesses envolvidos que participaram desse
debate e com que posições.
O trabalho é apresentado em três capítulos. Inicia com um breve
histórico das Políticas de Saúde no Brasil e Sistema de Atenção. A seguir
identifica-se a Reforma do Aparelho do Estado e seus desdobramentos,
relacionando-a com a temática do desenvolvimento e com a política de saúde
no período posterior à promulgação da Constituição Federal. Reconstitui o
processo de criação das agências reguladoras, descrevendo o contexto em
que a Agência Nacional de Saúde Suplementar se originou e as mudanças
estruturais e conjunturais ocorridas.
No terceiro capítulo mostramos resumidamente o funcionamento do
sistema legislativo e suas Comissões. Em seguida descrevemos o processo de
origem e instauração da CPI dos Planos de Saúde, sua constituição e forma de
organização, os temas abordados e seus resultados, e nas considerações
2
Entrevista de 14/05/03, disponível em www.henriquefontana.com.br.
26
finais explicitamos nossa interpretação sobre a atual política de saúde no setor,
respaldando-nos no que foi identificado no processo.
O estudo teve como base a leitura dos depoimentos contidos nas
audiências realizadas pela CPI através das Notas Taquigráficas3.
Depois disso, para sumarizar os conteúdos e observações desse
conjunto de informações, elaboramos um “corpus”4 tanto dos depoimentos
quanto das falas dos deputados, de modo a subsidiar nosso estudo.
Para melhor compreender a dinâmica, o funcionamento e as articulações
da CPI, e reconstruir essa história, adotaremos as seguintes estratégias:
1.
Traçar o perfil dos membros da CPI, visando conhecer as suas
várias formas de vinculação com o tema “saúde”;
2.
Identificar os temas debatidos. Após identificá-los, e como
facilitador da análise, agruparemos os temas em seis categorias de debate:
Política de Saúde, Jurídico/Legal, Regulação, Financiamento, Recursos
Humanos e Ética;
3.
Identificar atores e interesses envolvidos e suas vinculações;
4.
Identificar
os
posicionamentos
dos
parlamentares,
das
autoridades do governo, dos representantes da sociedade civil, dos clientes de
planos de saúde, dos representantes do judiciário, dos profissionais de saúde,
dos representantes dos hospitais e representantes das empresas operadoras
de planos de saúde, através dos depoimentos realizados nas audiências e que
foram registradas nas Notas Taquigráficas.
Além da revisão da bibliografia, também foram exploradas as fontes
oficiais de pesquisas realizadas pelo IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílio (PNAD), Pesquisa Assistência Médico-Sanitária (AMS), o Relatório
Final da CPI dos Planos de Saúde e informações das Empresas Operadoras
de
Saúde
(EOPs)
fornecidas
pela
Agência
Nacional
de
Saúde
Suplementar(ANS) à CPI.
3
Todas as informações estão disponíveis na página da Câmara dos Deputados(www.camara.gov.br). Do total de 24
reuniões realizadas não estão disponíveis na Internet as Notas Taquigráficas dos dias 18/08/03 e 16/10/03.
4
Dá-se o nome de corpus à coletânea ou conjunto de documentos selecionados sobre determinado tema. Para este
trabalho utilizamos a maneira apresentada por Bourdieu (1999).
27
Capítulo I: Políticas de Saúde no Brasil
Durante o período denominado desenvolvimentista5, que vai de 1930 a
1988 (Fausto, 1989), a Assistência Médica Previdenciária era a principal forma
de prestação de atenção à saúde, caracterizando-se pelo atendimento clínico
individual, com privilégio da atenção hospitalar e especializada.
As medidas de saúde pública de promoção da saúde ou prevenção de
doenças eram executadas em serviços de saúde pública organizados por uma
estrutura governamental diversa e com aporte financeiro extremamente
reduzido.
A
assistência
médica
nestes
serviços
era
completamente
subordinada ao enfoque coletivo, sendo oferecida com o objetivo de controlar a
incidência/prevalência das doenças infecciosas, em detrimento da demanda
espontânea por assistência médica individual. Ao longo da história do Brasil,
diversos arranjos de financiamentos e provisão foram propostos para dar conta
da saúde pública e privada.
De 1923 a 1930 surgem as Caixas de Aposentadoria e Pensões (Caps)
que eram organizadas por empresas, de natureza civil e privada, responsáveis
pelos benefícios pecuniários e serviços de saúde para os empregados de
empresas específicas. As Caps eram financiadas com recursos dos
empregados e empregadores e administradas por comissões formadas por
representantes da empresa e dos empregados. Ao poder público cabia apenas
a resolução de conflitos.(Cohn & Elias, 1996).
Do ponto de vista organizativo, o período de 1930 a 1945 é marcado
pelos Institutos de Aposentadorias de Pensões (IAPs), entidades organizadas
não mais por empresas, mas por categorias profissionais. Diferentemente das
CAPs, a administração dos IAPs era bastante dependente do governo federal.
O conselho de administração, formado com participação de representantes de
empregados e empregadores, tinha uma função de assessoria e fiscalização, e
era dirigido por um presidente, indicado diretamente pelo presidente da
República. Há uma ampliação da Previdência com a incorporação de novas
categorias antes não cobertas pelas Caixas de Aposentadorias e Pensões
(Caps). Com o golpe de 1964 e o discurso de racionalidade, eficácia e
saneamento financeiro, ocorre a fusão dos IAPs, com a criação do Instituto
5
Foi denominado “Estado desenvolvimentista” o período em que o poder estatal financiava o desenvolvimento do país
(Fausto, 1989).
28
Nacional de Previdência Social (INPS). As alterações na conjuntura política
forçaram o Estado a fortalecer a opção pela Seguridade Social como forma de
buscar legitimidade, o que leva à intensificação do modelo por meio do
aumento crescente de cobertura e ampliação de benefícios. (Cohn & Elias,
1996).
Com relação à assistência médica nesse período, houve um crescimento
dos serviços médicos próprios da Previdência e dos gastos com assistência
médica em geral, mas persistia uma demanda elevada, agravada pelo fato de
este direito ter sido estendido a todos os segurados. O aumento dos gastos
com assistência médica permanece e consubstancia as relações de
convivência entre o Estado e o setor privado contratado prossegue em franca
expansão.
O marco da década de 80 é um quadro político/econômico com muitas
dificuldades. Esse momento se caracteriza por um processo inflacionário e uma
crise fiscal sem controle. Ao lado do crescimento dos movimentos
oposicionistas e de divisões internas nas forças que apoiavam o regime militar
apresenta-se a necessidade de reestruturação e ampliação dos serviços de
saúde. O resultado dessa luta ideológica foi a formulação das propostas de
mudança do setor de saúde, consolidadas na Reforma Sanitária brasileira
através da realização, em 1986, da VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS),
com ampla participação de trabalhadores, governo, usuários e parte dos
prestadores de serviços de saúde.
Durante o processo de elaboração da Constituição Federal, outra
iniciativa de reformulação do sistema foi implementada, o Sistema Unificado e
Descentralizado de Saúde (SUDS). Idealizado como estratégia de transição em
direção ao SUS, ele propunha a transferência dos serviços do INAMPS para
estados e municípios.
Já se percebe nesse momento a consolidação de empresas de planos
de saúde como alternativa de assistência.
Em 1988, a Assembléia Nacional Constituinte aprova a Constituição
Federal e com ela a criação do SUS, reconhecendo a saúde como um direito a
ser assegurado pelo Estado e pautado pelos princípios de universalidade,
eqüidade,
integralidade
e
organizado
de
hierarquizada e com participação da população.
maneira
descentralizada,
29
Em 1990, foram aprovadas as Leis que regulamentam e detalham o
modelo de implementação do SUS. Bahia (1999) chama a atenção para a
contradição entre a universalização do sistema público e a consolidação das
empresas de planos e seguros de saúde, que se evidencia na medida em que,
no ano de 1989, o sistema de saúde suplementar cobria 22% da população.
1. Antecedentes
Apesar do grande crescimento econômico no Brasil, o início do século
XX é marcado também como um período de crise sócio-econômica e sanitária.
A febre amarela, entre outras epidemias, ameaça a economia agro-exportadora
brasileira, prejudica a exportação de café, já que navios estrangeiros se
recusavam a atracar nos portos brasileiros, e se reflete na redução da
imigração e da mão-de-obra. Para resolver isso, o governo criou medidas para
garantir a saúde da população trabalhadora, através de campanhas sanitárias
de caráter autoritário (SCLIAR, 1987).
Segundo Labra (1993), na década de 10 a medicina liberal já detinha
60% dos leitos no país. O setor caritativo era responsável pelos pobres. As
iniciativas de patrões e empregados, tais como as caixas de socorros e outros
arranjos mutualistas iniciados por comunidades imigrantes ou sindicatos, e o
pagamento direto a médicos e hospitais estruturaram serviços privados de
saúde orientados pela lógica de mercado.
Em 1923, a Lei Eloy Chaves institui as Caixas de Aposentadoria e
Pensão (CAPs), vinculadas a cada empresa. As CAPs, organizadas por
empresas (ferrovias, marítimas e bancárias) estão ligadas à exportação e ao
comércio,
atividades
que,
na
época,
eram
fundamentais
para
o
desenvolvimento do capitalismo (Luz, 1991).
São criados em 1930 os Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs),
que, diferentemente das antigas Caixas, são organizados por categorias
profissionais e não mais por empresas. Em 1950, os leitos hospitalares
privados chegaram a 53,9% do total. Em 1960, o percentual de hospitais
privados é de 62,1%, dos quais 14,4% com fins lucrativos.
30
A dinâmica do capitalismo começa a consolidar o complexo médicoindustrial da saúde desde a década de 506,de forma cada vez mais intensa,
transformando
a
assistência
médica
num
crescente
empreendimento
dependente de capital. (Cordeiro, 1984).
Em 1966, os IAPs são unificados num sistema único. Surge o INPS
(Instituto Nacional de Previdência Social), que passa a concentrar todas as
contribuições previdenciárias, incluindo a dos trabalhadores do comércio, da
indústria e dos serviços. (Cohn & Elias, 1996)
Para Cordeiro (1984), as bases do apoio estatal às empresas médicas
se consolidaram no momento da unificação e da centralização da Previdência
Social no INPS, a partir de 1967, onde as fortes relações patrimonialistas entre
o setor público e o privado ficam definitivamente institucionalizadas. A criação
do INPS levou à ampliação da cobertura da assistência médica e provocou um
aumento da demanda por serviços médicos muito superior à capacidade de
atendimento disponível nos hospitais e ambulatórios. Para tanto, foi necessário
fazer contratos, credenciamentos e convênios junto à rede privada. Esta
solução marca uma mudança da política governamental, que passa a ser
favorável à utilização de uma rede privada na prestação de serviços públicos
Assim, o planejamento autoritário resultou:
(...) na substituição da participação sindical nas decisões da
Previdência pela consolidação do entrelaçamento entre a
tecnoburocracia previdenciária, defensora da transferência da
assistência médico-hospitalar para a responsabilidade de particulares,
e os empresários da saúde (Cordeiro, 1984, página 102).
Com o aumento da crise do sistema de saúde brasileiro, o setor privado
de medicina começou a pressionar o governo federal para restringir ou mesmo
interromper os planos de construção de hospitais públicos. Para empresários
do setor saúde, o Estado não deveria competir com a medicina privada e sim
fazer doações e empréstimos a juros baixos, para promover a remodelação e a
ampliação dos hospitais da rede privada (Mendes, 1994). Em 1968, o governo
anuncia linhas de financiamento, a fundo perdido, para a construção de
hospitais particulares visando aumentar o número de leitos e atender os
trabalhadores inscritos na Previdência Social. (Cohn & Elias, 1996)
6
Atualmente, de acordo com dados da AMS/2002, do total de leitos disponíveis para internação 68,9% são leitos
privados e 31,1% são leitos públicos. (Tabela 1)
31
Já era possível observar no Brasil a formação de empresas médicas
com características similares às do atual setor de planos e seguros de saúde.
Essas empresas mantinham uma clientela pequena, mas possuíam um alto
grau de dependência em relação ao sistema público e fortemente integrado ao
modelo de assistência previdenciária vigente à época. (Bahia, 1999)
A lógica assistencial privatista foi incorporada às concepções e aos
discursos previdenciários que diziam estar buscando a eficácia. Tendo as
condições de expansão do investimento e a garantia de demanda por parte do
setor público, o setor privado, atrelado ao Estado, expandiu-se fortemente ao
longo dos anos 70 (Cohn, 2003).
Na segunda metade da década de 70, o país passa a sofrer as
conseqüências do modelo econômico e do endividamento junto às instituições
financeiras internacionais. O modelo previdenciário vivencia uma agudização
de sua crise financeira. Muitas foram as explicações para este momento de
crise. Destacam-se aqui as mais relevantes: i) o privilegiamento do setor
privado e especializado na prestação de assistência médica, oneroso e de
baixo impacto no incremento da qualidade de saúde da população; ii) a
dificuldade de controle das contas e dos gastos, já que os hospitais
relacionavam-se diretamente com a instância federal num país com dimensões
continentais; e iii) o paralelismo de ações da Previdência Social e dos órgãos
vinculados à saúde. (Cordeiro, 1984)
Agregue-se a isto uma característica de extrema importância para a
conformação do modelo de política social desenhado pelos dois últimos
governos militares: a “reedição” ampliada “dos mecanismos de intermediação
de interesses (corporativismo e clientelismo), usuais no Brasil, no processo de
formação de políticas sociais” (Draibe, 1993).
Dentre as inúmeras medidas para a contenção da crise financeira e para
responder à necessidade crescente de ampliação da assistência médica,
destaca-se a formulação do Plano de Reorientação da Assistência Médica da
Previdência Social, em 1982, pelo CONASP (Conselho Nacional de
Administração da Saúde Previdenciária), com as seguintes recomendações,
dentre outras: a instituição das Ações Integradas de Saúde7 (AIS), com o
7
Apesar de ter como objetivo inicial a integração interinstitucional, as AIS acabaram transformando-se em compra de
serviços públicos de estados e municípios à semelhança da relação entre o INAMPS e os prestadores privados,
32
estabelecimento de convênios com as Secretarias de Saúde, estaduais e
municipais, objetivando a integração e racionalização da atuação do setor
público; e a criação do Sistema de Assistência Médico-Hospitalar da
Previdência Social (SAMHPS), que instituiu um novo modelo de pagamento
das internações hospitalares realizadas pelos serviços privados e filantrópicos
contratados e conveniados ao INAMPS, e hoje ainda vigente sob a
denominação de Sistema de Informações Hospitalares (SIH/SUS).
A consolidação do empresariamento privado da saúde gera uma disputa
por segmentos de clientela e especializações, e a tentativa do segmento
privado de preservar suas bases de financiamento público mediante a
presença cada vez mais organizada nas arenas decisórias (Labra, 1993).
Concomitante ao debate em torno da crise da previdência e da saúde, o
país viveu na década de 80 o processo de abertura política e neste clima
surgem diversos movimentos reivindicatórios por garantia de direitos sociais.
Entre eles destaca-se o movimento pela reforma sanitária e pelo direito à
saúde, envolvendo a participação da população organizada e de técnicos do
setor saúde. Sua ação mais notória ocorreu na 8ª Conferência Nacional de
Saúde de 1986, a partir da qual registram-se iniciativas voltadas para a
implementação do processo de descentralização, cuja marca no período foi a
implantação do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) (Luz,
1994).
O movimento pela reforma sanitária representou um fato singular em
toda a história das políticas de saúde no Brasil. Pela primeira vez a
Constituição Brasileira (1988) determinava explicitamente a existência da
Seguridade Social no país, tendo como um de seus capítulos as diretrizes para
o setor saúde, que resumidamente são:
a) universalização da assistência, agora não mais restrita aos
trabalhadores formalmente inseridos no mercado de trabalho e seus
dependentes, mas acessível a todo cidadão brasileiro;
b) descentralização da gestão do sistema, com direção única em cada
esfera de governo;
Estimulando no setor público a produção de assistência médica individual em detrimento das ações coletivas que já
eram precárias à época.(Campos et al, 1993)
33
c) integralidade da atenção, com ações de promoção, prevenção, cura e
reabilitação oferecidas pelo mesmo sistema de saúde;
d) participação da comunidade.
A Constituição estabeleceu, como pilares principais da reforma do setor
saúde, a cobertura universal e a eqüidade no acesso a cuidados de saúde, e
definiu o papel do Estado no seu artigo 196:
Saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas
sociais e econômicas que visem à redução do risco da doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e
recuperação. (Constituição Federal, 1988)
A implementação do Sistema Ùnico de Saúde de acordo com essas
diretrizes deveria constituir uma rede de serviços de saúde públicos e privados,
descentralizados, regionalizados e hierarquizados. O setor privado participaria
do sistema de forma complementar, por intermédio de contratos ou convênios
com o setor público, com prioridade para as intuições filantrópicas e sem fins
lucrativos. (Constituição Federal, 1988)
A partir desse momento, e com a promulgação da Lei Orgânica de
Saúde , Lei nº 8.080/90, que vincula a descentralização à municipalização, e da
Lei nº 8.1142/90, registram-se as experiências de descentralização da gestão,
com ênfase na criação de instrumentos e estruturas que dessem a estados e
municípios maior capacidade gerencial, tais como Conselhos e Fundos de
Saúde, planos estaduais, municipais e relatórios de gestão.
Com a universalização, há uma incorporação crescente do segmento
privado no setor público e credenciamento universal. (Noronha et.al, 1944)
Com a presença do setor privado de saúde cada vez mais significativa
no mercado, uma das teses do movimento sanitário, a de fortalecimento do
sistema público, se inviabiliza definitivamente, na medida em que, com a
recessão econômica da década de 90, são reduzidos os gastos públicos
impondo ao SUS crescentes restrições financeiras. (Labra, 1993)
2. Assistência Médica Supletiva
Como dito anteriormente, na década de 80 o Conselho Nacional de
Administração as Saúde Previdenciária (Conasp) propõe medidas
racionalizadoras dos gastos com assistência médica, em decorrência da crise
34
financeira da Previdência Social. Curiosamente, é nesta década que ocorre o
crescimento do setor de saúde suplementar. Entre as medidas do CONASP
situa-se a redução dos valores de remuneração dos procedimentos médicos e
hospitalares. Simultaneamente, a legislação que permite a dedução fiscal para
os clientes empresas e pessoas físicas se consolida. A adição das restrições
da Previdência aos prestadores de serviços com a expansão das demandas
aos planos de saúde tem como vetor resultante a abertura definitiva do
mercado de planos individuais de saúde e incremento e diversificação dos
planos empresariais. É nesse contexto que as seguradoras intensificam a
comercialização de produtos no mercado de saúde, sinalizando um processo
integrado de empresariamento da assistência médico-hospitalar no país. Nessa
época, já havia 15 milhões de beneficiários registrados na Associação
Brasileira de Medicina em Grupo (ABRAMGE), conforme afirmou Bahia (2001).
Tanto a Constituição como a Lei nº 8.080/90 não conseguiram implantar
mecanismos reguladores do setor privado, seja na vertente de produtor de
insumos, seja na definição do papel dos planos de saúde no sistema de saúde
brasileiro. (Mendes, 1994) O crescimento do setor privado de saúde ocorreu
sem que houvesse sobre sua atividade uma regulamentação exercida pelo
Estado.
Os chamados "planos e seguros de saúde" constituem o que foi
denominado "subsistema de atenção médica supletiva". Esse termo foi
cunhado pelos próprios empresários do setor. A terminologia consagrada pela
Lei nº 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde) refere-se exclusivamente ao conjunto
de serviços privados de assistência à saúde, que, devido à insuficiência dos
serviços estatais, complementam a assistência médico-hospitalar do SUS.
Essa participação complementar se faz mediante contrato ou convênio, sendo
que as normas de atuação e valores de remuneração são estabelecidas pelo
Poder Público (grifos da autora).
O setor privado de saúde, no entanto, não é formado apenas por essa
modalidade. Além de hospitais, clínicas e laboratórios privados que não
possuem qualquer vínculo com o SUS, há um crescimento bastante acentuado,
nas duas últimas décadas, das chamadas "empresas de planos de saúde". Por
força da existência do subsistema dito complementar, esse conjunto de
empresas e de modalidades de intermediação da assistência médico-hospitalar
35
passou a ser denominado de "subsistema suplementar" (Bahia, 1999).
A medicina supletiva foi inicialmente representada por modelos
mutualistas (autogestão), passando depois a incorporar, sucessivamente,
planos de saúde de medicinas de grupo, cooperativas médicas e, finalmente,
seguros-saúde. Desta forma, surgiram sub-redes para atender essas diferentes
clientelas (Bahia et al, 2002).
No mercado supletivo, o seguro saúde era a modalidade mais
regulamentada, assim como toda atividade do mercado de seguros de
previdência aberta e de capitalização no Brasil era regulamentada pela
Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), autarquia então vinculada ao
Ministério da Fazenda.
É claro que este processo de regulamentação foi naturalmente
prolongado, em função de diversos conflitos e interesses envolvidos. Também
é evidente que, por trás de interesses tão diversos, os próprios segmentos são
os que mais contribuem para a postergação da legislação. Na realidade, as
empresas de medicina de grupo, antes da aprovação da Lei nº 9.656/98, não
eram submetidas à regulamentação e/ou fiscalização oficial. Assim, a
inexistência de regulamentação sempre pareceu benéfica a todas as
operadoras.
O referido subsistema é composto de várias modalidades assistenciais,
que podem ser agrupadas nas seguintes categorias: sistemas próprios,
medicina de grupo, cooperativas médicas, seguro-saúde e planos de
administração8.
8
a. Sistemas próprios: congregam vários sistemas sob a forma de pós-pagamento, tais como: autogestão na compra
de serviços, produção própria de serviços, serviços comuns para grupos de empresas e auto-seguro de saúde. Os
participantes, empresas e respectivos funcionários, dividem, no todo ou em parte, as despesas após a sua realização,
geralmente dentro de limites estabelecidos nos documentos de adesão. É a modalidade que apresentou o maior
crescimento nos últimos anos.
b. Medicina de grupo: constitui-se de empresas que administram, sob a forma de pré-pagamento, planos de saúde
para indivíduos, famílias ou empresas. O contratante paga antecipadamente, no mais das vezes a cada mês, e tem
direito à cobertura de eventos previstos no contrato, seja por intermédio dos serviços próprios do contratado, seja
através de uma rede conveniada, sendo que, nesse caso, o contratado remunera os serviços profissionais e
hospitalares prestados.
c. Cooperativas médicas: essa modalidade, representada principalmente pelas UNIMED’s, pretende viabilizar uma
forma de prática profissional sem a intermediação de terceiros. O médico cooperado atende ao paciente vinculado à
UNIMED mediante pré-pagamento, recebe proporcionalmente a seus atendimentos, deduzidas as despesas de custeio
e, ao final do exercício, pode fazer jus aos resultados da cooperativa. Embora seja apregoada por seus defensores
como um sistema ideal, sem patrões e sem interferência na atuação do médico, na prática, para o cliente de plano de
saúde de seus serviços, a cooperativa pouco ou nada difere das empresas de "medicinas de grupo".
d. Seguro-saúde: restringe-se a uma forma de financiamento de despesas médico-hospitalares baseada em leis
atuariais e nos princípios do mutualismo. A empresa seguradora compromete-se, diante da ocorrência de determinados
eventos previstos em contrato, a ressarcir as despesas realizadas pelo contratante, dentro de limites estabelecidos. É
uma forma de atenção supletiva cara, praticada por grandes seguradoras vinculadas ao capital financeiro e bem aceita
pela classe médica, uma vez que não interfere no aspecto comercial da relação entre médicos e pacientes. (Bahia,
1999).
36
Hoje o setor de empresas de planos e seguros de saúde reúne mais de
2.000 empresas operadoras de planos de saúde de diferentes portes e áreas
geográficas de atuação, milhares de médicos, dentistas e outros profissionais,
hospitais, laboratórios, farmácias e clínicas. Essa rede prestadora de serviços
de saúde atende a mais de 37 milhões de consumidores (vide Quadro 1, em
anexo), que utilizam planos privados de assistência à saúde para realizar
consultas, exames ou internações, seja na condição de seguradoras,
instituições
de
autogestão
ou
operadoras
de
medicina
de
grupo,
(www.ans.saude.gov.br , acesso em 05/11/03).
O setor de empresas de planos e seguros de saúde é extremamente
concentrado. A ANS (2003) estima que aproximadamente duzentas operadoras
detêm 80% do mercado, (Gráfico 1) e que cerca de 95% dos consumidores de
planos de saúde estão localizados na Região Sudeste (vide Quadro 2 em
anexo).
Gráfico 1: Operadoras
Beneficiários
registradas
segundo
percentual
acumulado
de
100%
2.012
514
90,0
%
285
80,0
%
167
70,1
%
100
60,0
%
56
50,1
%
30
40,1
%
16
30,6
%
7
20,5
%
2
10,3
%
0
500
1.000
1.500
2.000
Fonte: Cadastro de Beneficiários - ANS/MS - 07/2003. Cadastro de Operadoras/ANS/MS - 03/09/2003
2.500
37
A regulação dos planos de saúde, a partir da Lei nº 9.656/98, não
conseguiu incorporar a maioria dos clientes de planos de saúde, na medida em
que aproximadamente 62% dos beneficiários optaram por manter o plano
anterior à Lei, como pode ser observado no Gráfico 2. Todavia algumas
medidas, como a proibição dos limites de utilização ou a permissão para
pessoas com mais de 65 anos poderem contratar planos de saúde, já não se
encontram entre as dificuldades que desafiem a capacidade de solução destes
clientes.
Gráfico 2: Beneficiários por Classificação de Plano
Planos Anteriores à Lei
Planos Coletivos
ju
l/0
3
ja
n/
03
ju
l/0
2
ja
n/
02
ju
l/0
1
ja
n/
01
ju
l/0
0
ja
n/
00
ju
l/9
9
ja
n/
99
40.000.000
35.000.000
30.000.000
25.000.000
20.000.000
15.000.000
10.000.000
5.000.000
0
Planos Individuais
Total
Fonte: Cadastro de Beneficiários - ANS/MS - 07/2003. Cadastro de Operadoras/ANS/MS - 03/09/2003
3. Situação Atual
O SUS nasce no mesmo momento em que emergem na arena política
os organismos internacionais de monitoramento da dívida pública brasileira. O
Banco Mundial vinha se consolidando ao longo da década de 80 como
formulador de recomendações a políticas da área social. O ideário do Banco
Mundial reafirma as propostas de segmentação entre serviços básicos e
convencionais, focalização dos gastos públicos nos pobres e fortalecimento de
setores não governamentais ligados à prestação de serviços, com busca no
mercado de serviços não cobertos pelo pacote essencial e estímulo à criação
de seguros públicos e privados. Essas pressões incidiram fortemente na área
econômica e social do governo e o caráter universalista do SUS passou a ser
considerado como mera utopia (Rizzoto, 2000).
38
Atualmente, o SUS parece estar caminhando com o preconizado pelo
Banco Mundial. As políticas de saúde formuladas nos últimos anos contemplam
discursos históricos do Movimento Sanitário e vão ao encontro de interesses do
empresariamento nacional da saúde, propiciando a expansão do mercado
privado. (Rizzotto, 2000).
A má alocação de recursos, a iniqüidade, a
ineficiência, a explosão dos custos, e a baixa qualidade dos serviços (Costa,
1996) são alguns dos indicadores utilizados pelo Banco Mundial para
redirecionar a agenda da política setorial de saúde, ficando a cargo do Estado
apenas a atenção primária, e, ao mercado, a oferta dos serviços de alto custo
àqueles que podem comprá-los.
A
lógica
da
universalização
assegurada
na
Constituição
é
paulatinamente substituída pelo atendimento restrito aos setores mais
carentes. A estruturação do sistema privado nos moldes atuais encarregou-se
de reduzir pressões, dando consistência à articulação global de oferta de
serviços de saúde no país. Além disso, observa-se um processo de
proletarização do trabalho médico, sua subordinado a critérios de rentabilidade.
(Machado, 1996).
Desprezando as recomendações das últimas Conferências Nacionais de
Saúde, o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) é absolutamente
leal e cumpre as orientações do Banco Mundial, expressas no relatório de 1993
– “Investimento em Saúde”, que podem ser resumidas nos seguintes itens: a)
Transferência dos serviços públicos potencialmente lucrativos ao setor privado;
b) Concentração da ação direta do Estado em programas de baixo custo e
voltados para as populações pobres; c) Ampliação da atuação dos “planos de
saúde” pelas camadas médias da população, submetendo-os a certa
“regulação” para refrear um pouco a voracidade das empresas do setor.
(Dados do Relatório Final da XI Conferência Nacional de Saúde).
A utilização dessa estratégia para minimizar os problemas do setor, ao
imprimir um discurso de busca da eficácia, acaba beneficiando o empresariado
da saúde e colocando os sistemas público e privado articulados e protegidos
por mecanismos que possibilitam a transferência de recursos do setor público
para o privado.
Segundo Urbano (2003), como um reflexo da implantação dessa política,
as mudanças ocorrem no âmbito da produção dos serviços de saúde que,
39
juntamente com a apropriação dos fundos a serem destinados à saúde e a
regulamentação do setor, convertem-se no centro da disputa do capital
hospitalar e do capital financeiro que tentam conseguir uma política de saúde
conveniente aos seus interesses e orientados pela lógica do capital.
Ainda segundo a autora os benefícios estatais que acompanharam a
construção das políticas de proteção social e que foram tomados para si pela
iniciativa privada fazem com que o mercado suplementar se apresente sob
várias modalidades de atuação. A justificativa para esta afirmação é de que:
Os grupos de interesse beneficiam-se dos recursos estatais pela ação
eficiente dos seus representantes no congresso, articulados e
representados na burocracia estatal nas várias instâncias do poder
(União, estado e município) que elaboram leis, e as aprovam dessa
rede promíscua de intermediação de poder e interesses
público/privado. (Urbano, 2003:66)
No capítulo seguinte, para melhor compreensão desse processo, faremos uma
pequena abordagem sobre a Reforma do Aparelho do Estado e seus reflexos
na saúde.
40
Capítulo II: Reforma Institucional do Aparelho do Estado Brasileiro e a
Criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
1.
Reforma do Aparelho do Estado
O processo de formação e desenvolvimento do Estado brasileiro teve
suas raízes ainda no período colonial, onde existia uma relação tutelar entre o
Estado e a nação. Segundo Faoro, a origem da organização do Estado
brasileiro remonta à época do estado português.
A comunidade política conduz, comanda, supervisiona os negócios
como negócios privados seus, na origem, como negócios públicos
depois. Dessa realidade se projeta a forma de poder,
institucionalizada num tipo de domínio: o patrimonialismo, cuja
legitimidade assenta no tradicionalismo – assim é porque sempre foi.
(Faoro, 2001).
Entretanto, é nos anos 30 que nascem o Estado Burocrático, fortemente
centralizador e intervencionista e, ao mesmo tempo, uma classe empresarial
altamente dependente de autorizações, proteções e favores oficiais. Este
Estado aparece dentro de um cenário de aceleração da indústria brasileira, e
assume um papel decisivo que lhe permite intervir diretamente no setor
produtivo de bens e serviços. A partir de 1930, durante o governo Vargas, o
objetivo principal era a reorganização total do Estado brasileiro. O Estado
assume a liderança do processo de modernização econômica e social do país,
intervindo na produção e criando um "modelo desenvolvimentista". (Nogueira,
1996).
O governo provisório de Getúlio Vargas inicia, em 1933, os estudos de
reforma da administração pública (Martins, 1997).
O desafio é criar uma
administração pública moderna, burocrática, sintonizada com os novos tempos
capaz de desempenhar papéis relevantes na regulamentação econômica, no
fomento ao crescimento industrial, no atendimento das crescentes demandas
sociais e dos novos encargos impostos ao Estado pelo “sistema produtivo
nacional” (Nogueira, 1996). A queda da ditadura Vargas e a democratização do
Brasil, em 1945, não contribuíram muito para modernizar a administração
pública como um todo. Se por um lado a administração pública ficou mais
transparente frente ao Congresso, por outro, os partidos políticos ampliavam
41
suas práticas clientelistas “profundamente enraizadas” para cargos públicos
(Martins, 1997).
O Estado se torna objeto de desejo dos grupos patrimonialistas que
utiliza essa moeda para assegurar lealdades e apoios políticos. (Faoro, 2001).
Em 1967, no auge de um Estado autoritário, realiza-se uma grande
reforma nas estruturas do Estado e dos procedimentos burocráticos, através do
Decreto-Lei nº 200. A precária institucionalização do Decreto-Lei nº 200 trouxe
“um número razoável de conseqüências negativas para a organização interna
do Estado”. Segundo Martins este modelo trouxe “a supressão ou obstrução,
pelo regime autoritário, dos canais institucionais de representação de
interesses, com a autonomia adquirida por alguns órgãos governamentais, fez
surgir novas formas de articulação e relacionamento entre a burocracia pública
e os interesses privados” e conseqüentemente “o tráfego, novo e incontrolável,
entre os interesses públicos e privados – indo muito além dos limites das
práticas convencionais de lobby”9. (Martins, 1997).
No final da década de setenta, começa a se manifestar a crise do
Estado, em decorrência do esgotamento do modelo de atuação estatal gerado
pela crise de financiamento e da conseqüente perda da capacidade do Estado
de continuar como indutor do crescimento econômico. Segundo Mota (1995:88)
essa crise se enseja em pelo menos duas perspectivas: a primeira centrada
fundamentalmente na crise fiscal do Estado e no modo de intervenção deste
nos sistemas econômico e social; e a segunda como o "conjunto de
transformações econômicas, políticas, sociais, institucionais e culturais".
Associada a estes fatores, a conjuntura econômica se agrava com as duas
crises do petróleo (1974 e 1979) e faz emergir um novo cenário onde a inflação
e o déficit público foram constantemente apontados como fatores nocivos ao
equilíbrio econômico.
Em 1980, a lógica que propagava a redução do papel do Estado
especula que este Estado deve delimitar suas áreas de atuação, mantendo sua
presença apenas em setores como educação, saúde, segurança, e
administrando a Justiça. Segundo esta visão, o Estado deveria se adaptar às
tendências globais e ser visto como meio e não como fim em si mesmo, um
9
É o processo por meio do qual os representantes de grupos de interesses, agindo como intermediários, levam ao
conhecimento dos legisladores os desejos de seus grupos. (Bobbio, 2000).
42
amparo ao cidadão, um respaldo para sua realização como pessoa com
direitos e obrigações.
Em outubro de 1988, a Assembléia Nacional Constituinte produz uma
Carta Magna, inclusiva, que incorpora diversos princípios, direitos e garantias
nunca antes vistos nas constituições anteriores.
Nascida após duas décadas de ditadura, a Constituição Federal de 1988
veio responder aos anseios da sociedade, que exigia um conjunto de normas
capaz de assegurar direitos e garantias ao cidadão frente a um Estado
autoritário. Era urgente e necessária uma Carta Magna que configurasse um
novo cenário de desenvolvimento das relações políticas, sociais e econômicas
do país.
A luta política da sociedade civil na aprovação da nova Constituição
Federal de 1988 pode ser a explicação da complexidade da conjuntura da
década de 1980, no Brasil. A Constituição que garantia os direitos sociais é
marcada pela contradição histórica. Fruto da mobilização popular, a redemocratização da sociedade, num contexto onde a ofensiva neoliberal
cobrava a redução do papel do Estado na regulação econômica e social,
acontece no mesmo momento em que a Europa e os Estados Unidos
começam o desmantelamento do Estado de Bem-Estar Social.
A Constituição de 1988 incorpora conceitos, princípios e uma nova
lógica de organização da saúde da reforma sanitária10, expressos nos artigos
196 a 200.
a) o conceito de saúde entendido numa perspectiva de articulação
de políticas econômicas e sociais;
b) a saúde como direito social universal derivado do exercício da
cidadania plena e não mais como direito previdenciário;
10 O que levou os constituintes a proporem essa transformação foi o consenso, na sociedade, quanto à total
inadequação do sistema de saúde caracterizado pelos seguintes aspectos, entre outros: 1) um quadro de doenças de
todos os tipos, condicionadas pelo modelo de desenvolvimento social e econômico do país e que o sistema de saúde
vigente não conseguia enfrentar; 2) irracionalidade e desintegração do Sistema de Saúde, com sobre oferta de serviços
em alguns lugares e ausência em outros; 3) excessiva centralização, levando a decisões muitas vezes equivocadas; 4)
recursos financeiros insuficientes em relação às necessidades de atendimento e em comparação com outros países; 5)
desperdício de recursos alocados para a saúde, estimado nacionalmente em pelo menos 30%; 6) baixa cobertura
assistencial da população, com segmentos populacionais excluídos do atendimento, especialmente os mais pobres e
regiões mais carentes; 7) falta de definição clara das competências entre os órgãos e as instâncias políticoadministrativas do sistema; 8) desempenho descoordenado dos órgãos públicos e privados; 9) insatisfação dos
profissionais da área da saúde, principalmente devido a baixos salários e falta de política de recursos humanos justa e
coerente; 10) baixa qualidade dos serviços oferecidos em termos de equipamentos e profissionais; 11) ausência de
critérios e de transparência nos gastos públicos; 12) falta de participação da população na formulação e na gestão das
políticas de saúde; 13) falta de mecanismos de acompanhamento, controle e avaliação dos serviços; 14) imensa
insatisfação e preocupação da população com o atendimento à sua saúde.
43
c) a caracterização dos serviços e ações de saúde como de
relevância pública;
d) a criação de um Sistema Único de Saúde (descentralizado, com
comando único em cada esfera de governo, atendimento integral e
participação da comunidade);
e) a integração da saúde à Seguridade Social.
A chamada "Constituição Cidadã", que instaurou o Estado Democrático
de Direito no Brasil, representou para a sociedade brasileira um precioso
instrumento de proteção aos direitos e garantias individuais, bem como ao
patrimônio público.
Em 1990 é elaborada a Lei nº 8.080 e a Lei nº 8.142, a chamada Lei
Orgânica da Saúde que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção
e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços de
saúde, regulamentando o capítulo da saúde na Constituição. Os interesses
corporativos do setor privado, de grupos ameaçados com a extinção de seus
órgãos (como os dos funcionários do INAMPS, SUCAM, SESP, etc.) e as
divergências internas no Poder Executivo retardaram a regulamentação da
saúde.(Cordeiro, 1984)
Mas a década de 1990 trouxe mudanças. A agenda política e a retórica
oficial passam a ser bem diferentes. Na década anterior, com o agravamento
da crise da dívida externa dos países em desenvolvimento, o Banco Mundial
criou uma nova modalidade de empréstimo: o de ajuste estrutural, ou seja, o
cenário político/econômico mundial, a partir da crise dos anos 80, é de uma
retração dos bancos privados internacionais que concediam empréstimos para
os países periféricos, sendo necessária uma intervenção direta. O Fundo
Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial passam a intermediar e a
ampliar o fornecimento de empréstimos aos países membros em crise. A
liberação de empréstimos vincula-se à realização de planos de estabilização
econômica e de ajustes estruturais e setoriais. (Mosley, 1995). Em novembro
de 1989, é realizado um encontro que se denominou “O Consenso de
Washigton”11, onde se reuniram especialistas americanos em assuntos latino11
Este nome se originou devido ao fato das recomendações feitas pelo Banco Mundial para diferentes países no
contexto da negociação dos empréstimos de ajuste estrutural, representarem um consenso em seus pontos centrais:
rígida austeridade fiscal, redução dos gastos públicos, programas de privatização, medidas de abertura da economia
nacional, entre outros (Batista, 1994).
44
americanos,
representantes
Internacional – FMI e
do
Banco
Mundial,
do
Fundo
Monetário
do Banco Interamericano – BDI, com o objetivo de
avaliar as reformas econômicas empreendidas nos países da América Latina.
Neste encontro foram estabelecidas linhas de políticas macroeconômicas.
Estas linhas compreendem a desregulamentação da economia com abertura
comercial e financeira, o equilíbrio das contas públicas com a privatização das
empresas estatais, a flexibilização da mão-de-obra e o estabelecimento de uma
taxa cambial realista (Batista, 1994).
A partir de 1990, entretanto, o Estado Brasileiro se vê diante da
realidade do chamado competitivismo internacional, evidenciado pela rápida
abertura aos capitais e comércio internacionais, associados à privatização das
empresas estatais e à redução do papel do Estado na economia. Começa a se
redefinir a presença do Estado, que, de um modelo paternalista, empresarial e
burocrático deveria urgentemente assumir o papel de gestor. (Bresser Pereira,
1998).
A proposta do governo Fernando Henrique Cardoso, feita pelo ministro
Bresser Pereira e comandada pelo Ministério da Administração e da Reforma
do Estado (MARE), procura situar a questão da reforma do aparelho do Estado
no conjunto mais amplo das atividades e do papel do Estado na sociedade. Ela
começa argumentando que os países altamente endividados promoveram o
ajuste estrutural (ajuste fiscal, liberalização do comércio, privatização e
desregulamentação), alcançando resultados positivos no controle da balança
de pagamentos e das taxas de inflação. No entanto, tal ajuste não foi capaz,
de retomar o crescimento econômico. Associado a este estava a implantação
de um Estado mínimo dentro dos parâmetros do ideário neoliberal (Santos,
2000).
A revisão do papel do Estado na economia brasileira, operada na
década de 1990, fez surgir um novo aparato institucional, formado por órgãos
de defesa da concorrência e agências regulatórias de serviços públicos. Esses
entes públicos foram criados com base nos princípios ordenadores da
economia inscritos na Constituição de 1988, quais sejam, a livre iniciativa, a
livre concorrência e a defesa dos consumidores. A Constituição de 1988
marcou a mudança da inserção do setor público no espaço econômico, ao
definir a livre iniciativa e a livre concorrência como fundamentos da ordem
45
econômica. (Constituição, 1988)
Com a revisão do papel do Estado no ambiente econômico, no início da
década de 1990, estabeleceu-se o novo desenho institucional composto pelas
agências reguladoras, desenho este que traria como garantia a independência
de pressões e interesses que não fossem do interesse público.
Com medidas dessa natureza, teríamos um Estado gerencial enxuto
com a função de criar agências encarregadas de contratar e controlar os
serviços privados.
Contudo, essas agências não se subordinariam a qualquer controle
direto de organismos políticos, como o Congresso ou as Assembléias
Legislativas. Sem controle público, elas se transformariam em poderosas
instâncias decisórias.
Assim, em 1995, o governo federal lança o Plano Diretor da Reforma do
Aparelho do Estado, que definiu os objetivos e diretrizes para a reforma da
administração pública brasileira. Em síntese, a reforma do aparelho do Estado
desse período se resume aos seguintes aspectos:
a) delimitação do tamanho do Estado;
b) redefinição do papel regulador do Estado;
c) recuperação da governança12; e aumento da governabilidade13
(...), o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de
serviços, mantendo-se, entretanto no papel de regulador e provedor
ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais como
educação e saúde, que são essenciais para o desenvolvimento, na
medida em que envolvem investimento em capital humano; para a
democracia, na medida em que promovem cidadãos; e para uma
distribuição de renda mais justa, que o mercado é incapaz de garantir,
dada a oferta muito superior à demanda de mão-de-obra nãoespecializada. Como promotor desses serviços, o Estado continuará
a subsidiá-los, buscando, ao mesmo tempo, o controle social direto e
a participação da sociedade.
(Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado-1995)
12
O conceito de governança foi definido então como "a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos
recursos econômicos e sociais do país, com vistas ao desenvolvimento" (World Bank, 1992, p. 1).
13
A governabilidade se refere às condições sistêmicas de exercício do poder em um sistema político. (Melo, 1995).
46
2. Desdobramentos da Reforma para a Institucionalização do Sistema
de Saúde
Na área da saúde, a partir da década de 80 surge uma proposta de
reestruturação da política social do Brasil. Esta proposta se propunha a
organizar a saúde, a assistência e a previdência num mesmo sistema, com
novas bases de financiamento e a inclusão de toda a sociedade.
De acordo com Baptista (1998), entre os anos de 85/86 há quatro grupos
de interesses contrários a este modelo de Seguridade Social:
1. Conservadores da área econômica, política e administrativa,
porque significava um único órgão gerindo a saúde/previdência/assistência
e isto era igual a uma estrutura política forte;
2. Técnicos e burocratas da Previdência, pois a este grupo
interessava o poder institucional já conquistado pela Previdência Social
(desde de 1974 com o MPAS)14;
3. Trabalhadores e aposentados, pois tinham medo em primeiro
lugar da universalização e de que fossem o principal pagador, e ainda da
perda da qualidade dos serviços assistenciais;
4. Reformistas do Estado.
Assim, o maior desafio para a implantação do SUS frente à organização
desse Estado é transformar um sistema público centralizado, institucionalmente
fragmentado e com culturas institucionais diferentes, em um sistema
descentralizado, regionalizado, hierarquizado e com controle social.
Com a implementação das políticas de saúde nos anos 90, houve um
esforço em construir um modelo federativo na saúde, e a tentativa de definição
do papel de cada esfera no sistema, além da criação de estruturas e
mecanismos institucionais específicos de relacionamento entre os gestores do
SUS e destes com a sociedade.
As instâncias do SUS se pautam por diretrizes contidas na Constituição
de 1988 – saúde como direito de cidadania e dever do Estado, resultante de
política públicas que elevem a qualidade de vida – pelo arcabouço jurídico legal
14
É bom lembrar que o INAMPS concentrava enorme poder institucional e a transferência de gestão para o Ministério
da Saúde significava mais que uma transferência de recursos, mas uma transferência também de poder político e a
perda de autonomia na gestão. Esta transferência estava contemplada na Constituição de 1988, através do SUS.
Assim, os pilares institucionais do setor público da saúde eram o INAMPS, o MS e as SES (Cordeiro, 1984).
47
– Lei nº 8080 e Lei nº 8142/90; pelos instrumentos normativos – NOB (91,
93,96) e NOAS (2001/2002).
O inicio do governo Collor coincide, portanto, com o processo de
implantação do Sistema Único de Saúde e de um novo arcabouço jurídico, com
os respectivos vetos efetuados pelo governo e aprovados pelo Congresso
Nacional15.
Além disso, a idéia da eficiência do setor privado foi a bandeira desse
governo, que trazia atrás de si a ofensiva contra o funcionalismo público, tendo
em vista a inoperância dos serviços públicos, conseguida através do
desmantelamento da saúde pública e da inviabilização financeira das propostas
de descentralização do SUS.
Por baixo do aparente consenso de sucesso da reforma sanitária, o
projeto neoliberal foi se consolidando, enraizado no modelo médico-assistencial
privatista hegemônico na década de 80. A ordem, no campo das políticas
sociais, passa a significar a fragilização do papel do Estado, a diminuição do
seu papel redistributivo, a privatização e a focalização das políticas para grupos
populacionais carentes e frágeis do ponto de vista de sua capacidade de
organização e pressão sobre o Estado.
Esse projeto neoliberal criou um sistema privado forte e com baixa
regulação pelo Estado, que se consolida pelo financiamento sem recursos,
dependência direta do Estado e por sua expansão às custas da perda de
qualidade do setor público.
O processo de consolidação do projeto neoliberal para a saúde tem
continuidade e acentua-se com o governo FHC (1995-2002). Aproveitando-se
da crítica à “falência do SUS” e do descompromisso do governo com a saúde,
interessado na consolidação do projeto neoliberal, há uma deliberada ação
governamental pela destruição do SUS.
O documento aprovado pelo presidente da República, Fernando
Henrique Cardoso, o "Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado",
apresenta como tese central a "crise do Estado" (pág. 9), associando-a aos
modelos de desenvolvimento adotados pelos governos passados. Apresenta
uma argumentação que coloca como hipótese que o Estado deve estar fora do
15
Os vetos concentravam-se, basicamente, nos artigos referentes à regulamentação da participação e controle social;
e na regulamentação do financiamento do SUS (Bahia, 1999).
48
setor produtivo, com a justificativa de que o excesso de atuação do Estado
nesse setor
provoca a deterioração dos serviços públicos. A reforma do
Estado passou a ser instrumento indispensável para consolidar a estabilização
e assegurar o crescimento sustentado da economia (1995). Buscando
demonstrar uma imagem de neutralidade do governo, o Plano Diretor define
como objetivo da Reforma "a reconstrução da administração pública em bases
modernas e racionais”. O governo critica a herança patrimonialista, clientelista
e o nepotismo como vícios, que através da burocracia e hierarquia entravam o
setor público. Assim, a Administração Gerencial proposta pelo governo seria a
única opção racional e moderna de governar.
O Plano Diretor também propõe que a reforma do Estado deve ser
refletida a partir da mudança de suas funções, onde ele deixa de ser o
responsável pela execução do desenvolvimento econômico e social para ser o
regulador do processo de desenvolvimento.
Desta forma, a partir das colocações de seus princípios, o governo
expõe claramente o caráter privatizante de sua proposta: "reformar o Estado
significa transferir para o setor privado as atividades que podem ser
controladas pelo mercado (1995)”.
Resumidamente o governo Fernando Henrique Cardoso propõe uma
reforma de caráter privatizante, com um claro retrocesso na questão dos
direitos sociais, especialmente quando coloca que o papel do Estado é
subsidiar e facilitar as ações nas esferas que considera não-exclusivas, sendo
colocado como não-exclusivas desde hospitais a universidades e centros de
pesquisa.
Portanto
o
SUS,
que
pretendia
implementar
os
princípios
de
universalidade, eqüidade e controle social, surge no bojo de uma Reforma do
Aparelho do Estado que propõe justo o oposto: uma menor participação do
setor público e o crescimento do livre mercado, implementado a partir de
políticas de privatização onde estrategicamente se diminui o investimento
público, inclusive para a área de seguridade social16.
16
Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações, de iniciativa dos poderes e da sociedade,
destinados a assegurar os direitos relativos a saúde, previdência e assistência social (Art. 194 da Constituição Federal
de 1988).
49
Se por um lado houve a universalização da assistência à saúde com o
SUS, por outro não foram alocados os recursos, proporcionais a esta meta,
definidas constitucionalmente, provocando a queda na qualidade dos serviços
disponíveis e afastando a classe média e/ou categorias de trabalhadores mais
organizados.
A ampliação da privatização dos serviços de saúde, segundo a
política de ajuste, levaria a uma diminuição dos gastos públicos, a
uma melhoria na qualidade do atendimento e na eficiência dos
serviços, além disso “as atividades ligadas à saúde constituem uma
atividade econômica de crescente importância, com grande
participação no Produto Interno Bruto (PIB) de vários países latinoamericanos, chegando em alguns casos a igualar-se à participação
de alguns ramos industriais... (Urbano, 2003).
A agenda liberal impulsiona a privatização ao reduzir uma série de
benefícios sociais, com o argumento de que a saúde é um empreendimento
muito caro para ser assumido pelo setor público. Não é à toa que Urbano
(2003) afirma que:
(...) a produção dos serviços de saúde, a apropriação dos fundos e a
regulamentação do setor convertem-se no centro da disputa tendo
como principal interessado o capital hospitalar e financeiro tentando
conseguir uma política da saúde favorável aos seus interesses
orientados pela lógica do capital, sendo que a privatização do setor
saúde dificulta a democratização dos processos decisórios e de
gestão.
Paralelo aos avanços e retrocessos do movimento comprometido com a
implantação dos princípios constitucionais da seguridade social, que apontava
para a democratização, descentralização e controle social das políticas sociais,
fica claro que o setor privado de saúde buscou novas estratégias de integração
ao mercado.
O percurso político-econômico da década de 1990, marcado pela onda
neoliberal, significou para o SUS uma trajetória não linear e, também, de um
certo distanciamento na ação política, se considerarmos os princípios
constitucionais.
Além disso, a implantação do SUS gerou uma arena política extensa, no
sentido de que esta não se limita à esfera ministerial, já que, pela via da
descentralização da política de saúde, o processo decisório passa a envolver
instituições, políticas e atores sociais da esfera federal, estadual e municipal.
Conseqüentemente, a presença de organizações setoriais e de representações
50
de vários segmentos da sociedade torna complexo o processo decisório no
setor da saúde.
3. Criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
Segundo Bahia (1991), com a mudança do perfil da atividade produtiva
na década de 80, há uma ampliação da autonomia do subsistema privado de
assistência à saúde na sustentação e definição de seu processo expansivo,
determinando o crescimento de três mecanismos:
1. Proliferação de planos de saúde individualmente contratados;
2. Planos de seguro de grupo, com participação financeira das
empresas privadas;
3. Caixas próprias das empresas estatais.
A expansão das demandas à assistência médica suplementar, no início
dos anos 90, tem como referência a deterioração dos serviços públicos de
saúde, incluindo os credenciados ao SUS, bem como a penetração do capital
financeiro internacionalizado e, como diz Bahia (1999), um novo momento se
apresenta para o setor.
O debate sobre as dimensões, formulação e implementação de políticas
públicas direcionadas para a regulação da assistência suplementar se apóia no
entendimento sobre a existência de dois subsistemas independentes: o
subsistema público (composto de rede própria e conveniada/contratada) e o
subsistema privado (composto de planos de saúde). (Bahia, 1999)
Em 1997, de acordo com Pereira, a regulamentação de planos de saúde
foi
uma
demanda
de
consumidores,
entidades
médicas
e
setores
governamentais ligados à área econômica, tendo em vista que os motivos mais
freqüentes de queixas à Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor
(PROCON) eram os aumentos de preços e as restrições de cobertura. O tema
alcançou a mídia e os clientes de planos de saúde começavam a obter ganhos
favoráveis em instâncias judiciais. Essa demanda repercutiu no Executivo, que
se viu obrigado a colocar na agenda a necessidade de regulação do setor de
saúde suplementar (Pereira et al, 2001).
51
Em 1998, a despeito da relutância política17 e das dificuldades para se
chegar a um consenso, é aprovada a Lei de Regulamentação de Planos e
Seguros de Saúde, que pressupõe que a competição entre as operadoras será
baseada apenas nos procedimentos e não em padrões diferenciados de
cobertura (Pereira et al, 2003).
O
marco legal da regulação18
é formado pelo conjunto da Lei nº
9.656/9819, de 3 de junho de 1998, e pela MP 2177–44, além da Lei nº
17
A Lei n. º 9.656, que regulamenta os planos privados de assistência à saúde, foi sancionada em 3 de junho de 1998,
após mais de sete anos de discussões e diversos projetos apresentados na Câmara e no Senado Federal. A discussão
se aprofundou em fevereiro de 1994, quando o Senado aprovou o projeto 93/93 do então senador Iram Saraiva,
contendo apenas três artigos. (Bahia, 199)
Em julho de 1993, o então senador apresenta Projeto de Lei proibindo "a exclusão de cobertura de despesas com
tratamento de determinadas doenças em contratos que asseguram atendimento médico-hospitalar pelas empresas
privadas de seguro saúde ou assemelhadas". A matéria vai a Plenário no Senado Federal em fevereiro de 1994, é
aprovada sem emendas e, imediatamente, encaminhada à Câmara dos Deputados, com a finalidade de se processar a
revisão constitucional prevista.
Já tramitavam no Congresso, nesta ocasião, duas proposições versando sobre o mesmo tema. o Projeto de Lei n.º
929/91, que "dispõe sobre obrigações e limitações dos planos de assistência médico-hospitalar privado"; e o Projeto
de Lei n.º 4.417/94, que "disciplina os planos de saúde privados". Em virtude do disposto no art. 142 do Regimento
Interno, tais proposições, por tratarem de "matéria idêntica ou correlata" foram apensadas ao PL 4.425/94. (Regimento
Interno da Câmara dos Deputados,1989)
Mais tarde, devido à magnitude que o tema adquiriu, outros projetos foram apresentados, sendo do mesmo modo
apensados ao PL 4.425/94 (Projeto de Lei n.º 4.572/94. São eles o Projeto de Lei n.º 944/95, o Projeto de Lei n.º
1.390/95 e o Projeto de Lei n.º 2.104/96. (Estudo Técnico do Legislativo, 1997).
O projeto segue para a Câmara dos Deputados, sendo-lhe atribuído o número 4.425/94. Em setembro de 1996, após
longo tempo ausente da pauta dos debates, a Câmara criou uma comissão especial para examinar o assunto e dar
seqüência aos trâmites legais. O Governo através do então ministro da Saúde Adib Jatene, em 1997 cria um grupo de
trabalho interministerial, formado pelos ministérios da Saúde, Justiça e Fazenda, sendo o representante da Saúde o
então secretário executivo do Ministério da Saúde, Barjas Negri, com o objetivo de propor medidas para regular
o setor de saúde suplementar. Ao terminar e divulgar a minuta de Projeto de Lei o Ministério sofre várias criticas, já
que o documento era bastante favorável aos pleitos das empresas de planos e seguros de saúde (Estudo Técnico da
Câmara dos Deputados) que apresenta uma versão preliminar para discussão. Até agosto de 1997, tinham sido
apresentados 24 novos projetos e 131 emendas, das quais somente 13 foram aceitas e incorporadas no substitutivo ao
projeto de Lei nº 4.425/94, apresentado pelo relator, deputado Pinheiro Landim. Em 14/10/1997 o plenário da Câmara
dos Deputados votou o substitutivo.
Entretanto, devido às alterações sofridas na Câmara, era preciso que o projeto retornasse ao Senado para apreciação
e votação, sem possibilidade de mudança no texto. Em obediência ao regimento interno, seria possível apenas
supressão de parte do texto. Após várias audiências públicas, onde participaram representantes de órgãos e entidades
envolvidas com o tema, e da promessa do governo em editar Medida Provisória regulamentando as questões mais
polêmicas, em 6/05/98 a Comissão de Assuntos Sociais do Senado manifestou-se, por unanimidade, favorável ao
parecer do senador Sebastião Rocha e à proposta de redação final do Projeto de Lei do Senado n.º 93, de 1993 (n.º
4.425, de 1994, na Câmara dos Deputados), que dispunha sobre os Planos e Seguros Privados de Assistência à
Saúde, consolidando as disposições aprovadas no Substitutivo da Câmara, com algumas supressões no texto,
negociadas com o Governo.
18
Regulação trata, em linhas gerais, do modo como a coordenação entre empresas, consumidores e os diferentes
órgãos do governo se dá quanto à edição de normas, cujo objetivo primordial é o de estimular, vedar ou determinar
comportamentos envolvendo determinados mercados que, por seus traços próprios, requerem a interferência estatal. A
regulação econômica vem para, na presença das “falhas de mercado”, assegurar que o resultado da interação entre os
produtores e consumidores de determinado bem ou serviço seja eficiente, tendo como resultado adequados níveis de
quantidade, qualidade e preço.(Relatório do grupo interministerial, 2003).
19 O texto legal estabeleceu critérios para entrada, funcionamento e saída de operação de empresas no setor,
discriminou os padrões de cobertura e de qualidade da assistência e transferiu para o Poder Executivo Federal a
responsabilidade pela regulação da atividade econômica das Operadoras, da assistência à saúde por elas prestada e
o dever de fiscalização do cumprimento das normas vigentes. Em adição, a legislação definiu os atributos essenciais e
específicos dos planos de saúde que servem de referência para todos os contratos que venham a ser celebrados.
Citado expressamente na Lei nº 9.656/98, o Plano Referência é o modelo mínimo de cobertura a ser oferecida pelos
planos de saúde em comercialização. A Lei também introduziu a obrigatoriedade de informações que podem permitir à
ANS promover diversas análises e, em especial, acompanhar a evolução dos custos, condição essencial para a
autorização de aumento das mensalidades dos planos individuais. Pela nova Lei, os contratos firmados entre cliente
de plano de saúde e operadoras de planos de saúde têm garantia de assistência a todas as doenças reconhecidas
pela Organização Mundial de Saúde, além de impedimento às restrições de número de consultas e internações, dentre
outros benefícios.
De acordo com a legislação, um plano de saúde pode oferecer dois tipos de cobertura: a cobertura integral do Plano
Referência ou a cobertura integral por segmento (ambulatorial, hospitalar, hospitalar com obstetrícia ou odontológico).
A lei não impede, contudo, a comercialização de planos com coberturas e características superiores às do Plano
52
9.961/00 e da Lei nº 10.185/01(www.ans.gov.br, acesso em 05/11/03).
Conforme se esgotava o prazo de cada Medida Provisória, o que ocorria a
cada 30 dias, o governo era obrigado a editar uma nova MP20 (quando
houvesse alteração no seu texto) ou reeditar a mesma, até que o Congresso a
colocasse em pauta.
Após a aprovação imediata da legislação, começa a discussão sobre o
lócus regulatório, e a disputa se desloca do Congresso Nacional para o
Ministério da Saúde, onde se inicia junto à Câmara de Saúde Suplementar a
intermediação dos diversos interesses envolvidos.
Os
modelos
antigos
de
planos
puderam
continuar
sendo
comercializados até 31/12/1998 – quando entraria em vigor o disposto na Lei
nº 9.656 – permanecendo com validade por tempo indeterminado, a não ser
que o seu cliente manifestasse o interesse de migrar para enquadrar-se na
nova regulação. Já os novos planos que, então, deveriam ser protocolados na
SUSEP, passariam a ser oferecidos já enquadrados na legislação pertinente.
O tema da regulação do setor supletivo da saúde penetra a agenda
política, mobilizando, direta ou indiretamente, o conjunto de atores envolvidos
na produção, comercialização e consumo destes serviços de saúde (Farias et
al, 2003). É necessária uma intervenção estatal sobre a atuação das
operadoras de planos de saúde21. A legislação, que entrou em vigor em 1999,
e o modelo bipartite22 de regulação começaram a demonstrar os seus limites.
Segundo o documento “Evolução e Desafios da Regulação do setor de saúde
suplementar”, (2003), a separação da regulamentação e fiscalização
econômico-financeira da regulamentação e fiscalização da produção dos
serviços de assistência à saúde, dificultou a coordenação e impediu a unidade
estratégica necessária ao processo de regulação. Ao final de 1999, para
corrigir os problemas decorrentes dessa separação, todas as atribuições de
Referência, como aqueles com diferentes condições de acomodação ou com cobertura para procedimentos não
obrigatórios.
A cobertura geográfica - que deve ser especificada no contrato - pode alcançar um município (abrangência municipal),
um conjunto de municípios, um estado (cobertura estadual), um conjunto de estados ou todo o país, a chamada
cobertura nacional. A modalidade apenas define como se organiza a rede de serviços que deve garantir, ao cliente de
plano de saúde - individual ou coletivo - a cobertura assistencial contratada.
20
O presidente da República, em caso de relevância e urgência, poderá adotar medidas provisórias, com força de Lei,
devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional (EC Nº32, de 11/09/2001)
21 Em 1997, essa atividade, através de centenas de empresas dos mais diversos tipos e sobre o qual pouco se sabia,
atingia mais de 30 milhões de brasileiros profundamente descontentes com os serviços recebidos.
(Montone, 2003).
22 A regulação da atividade econômica é da esfera do Ministério da Fazenda e a da atividade de produção dos serviços
de saúde e da assistência à saúde do Ministério da Saúde.
53
regulação do setor foram reunidas no Ministério da Saúde. A unificação da
regulação e da fiscalização numa agência reguladora única, vinculada ao
Ministério da Saúde através de contrato de gestão, se dá pelo Conselho de
Saúde Suplementar – CONSU23, sendo transformado em Conselho Ministerial.
A Câmara de Saúde Suplementar24 – CSS teve as suas atribuições ampliadas,
passando a manifestar-se, também, sobre o aspecto econômico-financeiro da
regulação.
Neste contexto, e no âmbito do debate sobre Reforma do Aparelho do
Estado, é criada pela Lei nº 9.961, de 28 de janeiro de 2000, a Agência
Nacional de Saúde Suplementar (ANS), autarquia sob regime especial,
vinculada ao Ministério da Saúde com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro,
a fim de garantir a regulação deste setor.
Ainda de acordo com Pereira (2001), o arranjo institucional regulatório
escolhido pelo Congresso Nacional deu preferência à criação de uma Agência
reguladora com grande autonomia e concentração de funções de fiscalização
financeira e da qualidade do setor.
Os parlamentares preferiram regular este setor através da
constituição de uma agência reguladora autônoma por perceberem
que os custos de uma regulação direta, contrária aos interesses do
Executivo, seriam excessivamente altos. Além do mais, a criação de
uma nova agência implica também a criação de um expressivo
número de cargos de confiança suscetíveis assim a indicações
políticas. Esta, inclusive, foi uma das razões principais da disputa do
local da nova agência. Como o Executivo explicitou quais as suas
preferências em relação ao desenho regulatório do sistema de saúde
suplementar, através da delegação de poderes para uma agência
reguladora, os parlamentares, principalmente os que fazem parte da
base de sustentação do governo, se comportaram no sentido de
apoiar tais preferências, pois só assim, cooperando com o governo,
poderiam ter acesso aos recursos políticos concentrados pelo
Executivo. (Pereira et al, 2001)
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é criada, portanto com
a finalidade de promover a defesa do interesse público na assistência
suplementar à saúde; regular as operadoras setoriais – inclusive quanto às
suas relações com prestadores e consumidores – e contribuir para o
23
Criado pela Lei n° 9.656/98, e posteriormente alterado pelo Decreto n° 4.044, de 6 de dezembro de 2001, o CONSU
é um órgão colegiado integrante da estrutura regimental do Ministério da Saúde, sendo composto pelo ministro da
Justiça, que o preside, pelo ministro da Saúde, pelo ministro da Fazenda e ministro do Planejamento, Orçamento e
Gestão, além do presidente da ANS, que atua como secretário das reuniões.
24 A Câmara tem caráter consultivo, e como principal objetivo promover a discussão de temas relevantes para o setor
de saúde suplementar no Brasil, além de dar subsídios às decisões do CONSU e da ANS.
54
desenvolvimento das ações de saúde no país. (Evolução e Desafios da
Regulação do Setor de Saúde Suplementar, 2003)
A Lei nº 9.656/98 previa, inicialmente, que os contratos de todos os
beneficiários deveriam obrigatoriamente se adequar às novas determinações,
entretanto essa cláusula foi revogada na reedição da Medida Provisória
(Figueiredo et al, 2001)25.
Cada Empresa Operadora de Plano de Saúde (EOP) deveria oferecer ao
beneficiário a opção de aderir a um novo contrato que incorporasse os
benefícios assistenciais agregados pela legislação, devendo a oferta ser
reiterada anualmente. Segundo Farias e Melamed (2003) a ampliação de
coberturas e o estabelecimento de parâmetros mínimos na composição dos
produtos comercializados fazem com que os planos formatados de acordo com
a regulamentação apresentem custos e preços mais elevados do que os planos
formatados e vendidos antes da vigência da Lei nº 9.656/98.(FENASEG, 2003)
A partir de janeiro de 99 as operadoras que desejam atuar no setor têm
que obter na ANS um registro provisório de funcionamento. Da mesma forma,
para ser comercializado cada plano de saúde precisa estar registrado na
Agência Nacional de Saúde Suplementar. As operadoras também estão
impedidas de recorrer à concordata e seus credores, de pedir a sua falência.
Agora, uma operadora só pode ser liquidada a pedido da ANS, fórmula
encontrada para assegurar os direitos dos consumidores.
A ANS pode recorrer sempre que verificar alguma irregularidade grave
ou insanável que coloque em risco o atendimento à saúde contratada no plano
através dos chamados regimes especiais de direção fiscal e direção técnica e
as liquidações extrajudiciais de empresas sem condições de operar.
Assim, com base nas informações recolhidas no setor, a ANS definiu
oito modalidades de operadoras. São elas: administradoras, cooperativas
médicas, cooperativas odontológicas, instituições filantrópicas, autogestões
(patrocinadas e não patrocinadas), seguradoras especializadas em saúde,
medicina de grupo e odontologia de grupo. As formas de contratação das
25 Com a decisão do Superior Tribunal de Justiça proferida na ADI25 n.º 1931 julgada em 21 de agosto de 2003 que
declarou inconstitucional a retroatividade da Lei 9656/98 aos contratos anteriores a sua vigência, os contratos antigos
não podem ser rescindidos de forma unilateral pela operadora, as internações não podem ser encerradas a não ser por
alta médica e as mensalidades dos planos individuais ou familiares só podem ser aumentadas com autorização
expressa da ANS.(www.stf.gov.br, acessado em 05/07/04)
55
operadoras são individual ou familiar26, coletivo com patrocinador27, coletivo
sem patrocinador28 e contrato adaptado29
Pela primeira vez o Congresso Nacional instaura uma Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar um mercado que movimenta
aproximadamente R$ 23 bilhões por ano no país, soma muito próxima ao valor
que o governo federal destina anualmente para a saúde, e atende cerca de 35
milhões de brasileiros. O projeto da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)
foi aprovado no dia 22 de abril de 2003.
Antes de analisar os resultados da CPI é preciso, ainda que brevemente,
discorrer sobre o funcionamento do sistema legislativo e de uma CPI. O
próximo capítulo se dedica a estes esclarecimentos e posteriormente à análise
da CPI dos planos de saúde.
26 Contrato assinado entre um indivíduo e uma operadora de planos de saúde para assistência à saúde do titular do
plano (individual) ou do titular e de seus dependentes (familiar).
27 Contrato assinado entre um indivíduo e uma operadora de planos de saúde para assistência à saúde do titular do
plano (individual) ou do titular e de seus dependentes (familiar). Inclui também os contratos mantidos por autogestão
em que o beneficiário paga parcialmente a mensalidade.
28 Planos contratados por pessoa jurídica com mensalidade integralmente paga pelo beneficiário diretamente à
operadora.
29 É o contrato antigo adaptado às normas estabelecidas na Lei nº 9.656/98. O contrato adaptado tem que ter registro
na ANS e está totalmente submetido à nova legislação.
56
Capítulo III: Comissão Parlamentar de Inquérito dos Planos de
Saúde
O Art. 1 da Constituição define que o Estado brasileiro é uma República
Federativa, constituída pela União, pelos Estados, pelos Municípios e pelo
Distrito Federal. O sistema legislativo brasileiro se amolda à composição do
Estado e é dela decorrente, e se divide em tantos subsistemas quantos são os
entes políticos constitucionais. Todos os entes políticos são dotados de
competência legislativa, e da complexidade estatal e política decorre o sistema
legislativo. O Poder Legislativo é encarregado de exercer a função legislativa
do Estado, que consiste em regular as relações dos indivíduos entre si e com o
próprio Estado, mediante a elaboração de leis. No Brasil, o Poder Legislativo é
organizado em um sistema bicameral e exercido pelo Congresso Nacional, que
é composto pela Câmara dos Deputados, como representante do povo, e pelo
Senado Federal, representante das Unidades da Federação. Esse modelo
confere às duas Casas autonomia, poderes, prerrogativas e imunidade
referentes à organização e ao funcionamento em relação ao exercício de suas
funções.( www.senado.gov.br, Corsatto, 2001)
Apesar do Congresso Nacional ser um órgão legislativo, sua
competência não se resume à elaboração de leis. Além das atribuições
legislativas, o Congresso dispõe de atribuições deliberativas, de fiscalização e
controle, de julgamento de crimes de responsabilidade, além de outras
privativas de cada Casa, conforme disposto na Constituição Federal (1998).
As Comissões Parlamentares são órgãos colegiados da Câmara dos
Deputados, participam das funções legislativas ou fiscalizadoras da Câmara
dos Deputados e podem ser Permanentes ou Temporárias. As Temporárias,
criadas para apreciar determinado assunto, podem ser: Especiais, de Inquérito
e Externas. Cada uma delas tem um presidente e três vice-presidentes, eleitos
por seus pares.
As Comissões Temporárias são compostas pelo número de membros
que for previsto no ato ou requerimento de sua constituição, designados pelo
presidente por indicação dos líderes dos partidos, ou no prazo de quarenta e
oito horas após criar-se a Comissão, caso os partidos não façam a indicação.
Além disso, é importante salientar que na constituição das Comissões
Temporárias é observado o rodízio entre as bancadas não contempladas, de
57
tal forma que todos os Partidos ou Blocos Parlamentares30 possam se fazer
representar,
assegurando-se,
tanto
quanto
possível,
a
representação
proporcional dos Partidos e dos Blocos Parlamentares que participem da Casa,
incluindo-se sempre um membro da Minoria, ainda que pela proporcionalidade
não lhe caiba lugar (Art. 23 do Regime Interno).
Já as CPI’s funcionam com prazo determinado e destinam-se à
apuração de determinado fato de relevante interesse para a vida pública e a
ordem constitucional, legal, econômica e social do país. Têm poderes de
investigação próprios das autoridades judiciais, conforme o § 3º do art.58 da
Constituição Federal. Contudo, não cabe a elas julgar, definir culpabilidade ou
aplicar punição de qualquer ordem. Entretanto, devem investigar os fatos que
originaram a sua convocação, bem como outros que vierem ao seu
conhecimento (Constituição Federal, 1988). Podem ser constituídas mediante
as seguintes exigências:
1. Requerimento de um terço dos membros da Casa, caso em que
somente poderão funcionar até cinco Comissões concomitantemente,
ficando as demais requeridas aguardando vez para instalação;
2. Projeto de resolução, subscrito por um terço dos membros da
Casa, dependendo, nesta hipótese, de votação pelo Plenário, sem limitação
de número de Comissões em funcionamento.
No Quadro 4 poderão ser observados na íntegra os artigos 35, 36 e 37
do Regimento Interno da Câmara, o que cabe especificamente a uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Ao final dos trabalhos, a Comissão
deverá apresentar um relatório com suas conclusões, que, além de ser
publicado no Diário Oficial da Câmara dos Deputados, será encaminhado: I - à
Mesa, para as providências de alçada desta ou do Plenário, oferecendo,
conforme o caso, projeto de lei, de decreto legislativo ou de resolução, ou
indicação, que será incluído em Ordem do Dia dentro de cinco sessões; II - ao
Ministério Público ou à Advocacia-Geral da União, com a cópia da
documentação, para que promovam a responsabilidade civil ou criminal por
30
Bloco Parlamentar é a união de dois ou mais Partidos, sob liderança comum. Tem direito ao tratamento dispensado
às organizações partidárias com representação na Casa. Constitui a Maioria o Partido ou Bloco Parlamentar integrado
pela maioria absoluta dos membros da Casa, considerando-se Minoria a representação imediatamente inferior que, em
relação ao governo, expresse posição diversa da Maioria. Se, nenhuma representação atingir a maioria absoluta,
assume as funções regimentais de Maioria o Partido ou Bloco Parlamentar com o maior número de representantes.
(Regimento Interno da Câmara, 1989)
58
infrações apuradas e adotem outras medidas decorrentes de suas funções
institucionais; III - ao Poder Executivo, para adotar as providências
saneadoras de caráter disciplinar e administrativo decorrentes do art. 37, §§ 2º
a 6º, da Constituição Federal, e demais dispositivos constitucionais e legais
aplicáveis, assinalando prazo hábil para seu cumprimento; IV - à Comissão
Permanente que tenha maior pertinência com a matéria, à qual caberá
fiscalizar o atendimento do prescrito no inciso anterior; V - à Comissão Mista
Permanente de que trata o art. 166, § 1º, da Constituição Federal, e ao
Tribunal de Contas da União, para as providências previstas no art. 71 da
mesma Carta.
Nos casos dos itens II, III e V, a remessa será feita pelo presidente da
Câmara, no prazo de cinco sessões. (Regimento Interno da Câmara dos
Deputados, 1989)
1. Origem e Instauração da CPI dos Planos de Saúde
Ainda que a Constituição de 88 incluísse todos os cidadãos na
universalização dos benefícios do sistema público de saúde, as políticas de
“ajuste”
impediram
que
as
políticas
sociais
cumprissem
seu
papel
compensatório, restringindo-as com cortes substanciais de recursos e
substituindo-as por programas focalizados e emergenciais. Reflexo desta falta
de alocação de recursos adequados, a queda da qualidade dos serviços
públicos acabou por expulsar usuários provenientes de segmentos das
camadas médias e do operariado mais qualificado.
O sistema público passa a ser uma modalidade assistencial para
“pobre”.
Esse
fenômeno
é
chamado
por
Favaret
et
al
(1990)
de
“universalização excludente”, porque acarreta, por um lado, a incorporação das
classes mais desprovidas através da universalização total e, por outro, a
expulsão de grupos sociais mais abastados para o sistema privado de atenção
supletiva.
Concomitante à expulsão destes usuários mais abastados dos serviços
públicos de saúde, houve também, em relação aos prestadores de serviços,
uma busca de maior rentabilidade, com a migração na direção da medicina
supletiva.
59
Um teste realizado em todo o país, entre os meses de junho e setembro
de 2002, pelo Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), organização não
governamental, para avaliar se as oito principais operadoras de planos de
saúde cumpriam a legislação sobre planos e seguros privados de assistência à
saúde demonstra que, no Brasil, os planos de saúde desconsideram os textos
legais que buscam regulamentar o setor. A pesquisa que analisou a atuação
da Amil (Assistência Médica Internacional Ltda.), Assistência Médica São Paulo
S. A. (Blue Life-Servital), Bradesco Saúde S.A., Golden Cross Assistência
Internacional de Saúde Ltda., Interclínicas Planos de Saúde S.A., Medial Saúde
S.A., Sul América Aetna Seguro Saúde S.A. e Unimed Paulistana Sociedade
de Trabalho Médico apontou o desrespeito à legislação e aos direitos do
consumidor. (Relatório do IDEC, 2002)
O relatório completo do teste foi encaminhado ao ministro da Saúde, ao
diretor-presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar e ao
Departamento de Proteção de Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça,
pedindo providências imediatas.
Os testes foram feitos por dezesseis técnicos do IDEC, que aderiram
aos planos de saúde como consumidores comuns – dois deles em cada
empresa. A avaliação foi feita em três etapas: na contratação; na vigência do
contrato, e no cancelamento. Os procedimentos foram testados por meio de
ligações telefônicas junto às operadoras e por meio de situações vivenciadas
pelos técnicos, além dos contratos terem sido examinados por advogados do
IDEC.
O teste avaliou a adequação à legislação de doze práticas recorrentes
no setor e quatro aspectos nos contratos, quais sejam:
1. Conteúdo da declaração de saúde e oferta de entrevista médica
para preencher a declaração;
Esta declaração corresponde ao preenchimento de um formulário
elaborado pela operadora para verificar se o futuro consumidor do plano é ou
não portador de doença preexistente no momento da contratação. Sendo
portador, o consumidor tem que optar por uma cobertura parcial temporária por
dois anos, período durante o qual ele não tem cobertura para eventos
cirúrgicos, leitos e procedimentos de alta complexidade.
60
2. Oferta de agravo para diabéticos de 31 anos e oferta de agravo
para diabéticos de 60 anos;
O agravo é o pagamento adicional à mensalidade para que o portador
de doença preexistente, apontada na declaração, tenha a cobertura integral
garantida pelo plano de saúde, sem ter de aguardar o período de dois anos
para ter atendimento de “eventos cirúrgicos, leitos e procedimentos de alta
complexidade (art.11, da Lei 9.656/98), definidos pela ANS para a referida
doença. Optando pelo agravo, o consumidor tem direito a cobertura total do
plano”;
3. Exigência do comprovante de pagamento para realizar a consulta;
4. Solicitação do boleto para fazer exames;
5. Cobertura de exames solicitados por médicos não credenciados;
6. Informações sobre cobertura de exames para inadimplentes no
laboratório;
7. Informações sobre cobertura de exames para inadimplentes na
operadora;
8. Envio do aviso sobre inadimplência e suas conseqüências ao
consumidor;
9. Aceitação do cancelamento; e
10. Procedimentos para formalizar a rescisão contratual.
Segundo este relatório, os percentuais de desrespeito à legislação
foram:
1.
Amil (Assistência Médica Internacional Ltda.).
– 38%;
2.
Assistência Médica São Paulo S. A.
(Blue Life-Servital) – 44%;
3.
Bradesco Saúde S.A. – 38%;
4.
Golden Cross Assistência Internacional
de Saúde Ltda. – 44%;
5.
Interclínicas Planos de Saúde S.A. – 38%;
6.
Medial Saúde S.A. – 38%;
7.
Sul América Aetna Seguro Saúde S.A. - 31%;
8.
Unimed Paulistana Sociedade de
Trabalho Médico – 50%.
61
De acordo com o IDEC, o mau aproveitamento da “declaração de saúde”
está entre os principais problemas para a contratação de um plano de saúde.
No teste, o IDEC constatou que a maioria das empresas, ao receber o
formulário respondido pelo consumidor, não se preocupou em verificar se o
consumidor havia declarado ser portador de doença preexistente. Para o
Instituto o conteúdo dos questionários enviado pelas operadoras também está
incorreto, pois não consideram, por exemplo, fumantes e casos de diabetes na
família como fatores de preexistência, o que pode prejudicar sobremaneira o
consumidor no futuro, já que talvez ele não venha a ter a cobertura desejada.
Outro problema apontado foi a falta de oferecimento de agravo por parte
da operadora. Os testes comprovaram que a maioria das operadoras não
reconhece esse direito do consumidor.
Por outro lado, resultados positivos são apontados pelo relatório. Para
ser atendido, pela operadora ou por um laboratório, o consumidor só precisa
apresentar um documento de identidade e a carteira do plano de saúde.
Desta forma o IDEC considera que os resultados foram “muito ruins” e
“preocupantes”, já que o teste analisou a adequação à legislação de 12
práticas do setor e quatro aspectos nos contratos. (Relatório IDEC, 2002)
Com o envio desse relatório para o governo federal, o IDEC, em
entrevista ao Jornal “Carta Maior”, esperava que as autoridades competentes
despertassem para os problemas no setor e buscassem alternativas para
solucioná-los, tomando atitudes para impedir que as operadoras continuassem
infringindo a legislação, bem como acreditava que a ANS passasse a fiscalizar
com maior rigor as operadoras de saúde.31
A ANS, por sua vez, contestou o trabalho e pediu que a Universidade
Estadual de Campinas (UNICAMP) fizesse uma averiguação da metodologia
utilizada.
O relatório da UNICAMP afirma que a pesquisa do IDEC é “um
importante instrumento para levantar questões que podem impactar a relação
entre o consumidor e as empresas do setor de saúde suplementar, mas jamais
31
Entrevista acessada em 12/12/03 (www.idec.org.br)
62
pode ser tomado como instrumento de avaliação do setor, dada a fragilidade
dos critérios e da metodologia utilizados”.32
Embora admitindo que, enquanto demonstrativo de problemas que
afligem o consumidor, o teste do IDEC produziu um bom relatório. A
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), através do Núcleo de Estudos
de Políticas Públicas (NEPP), conclui em sua avaliação que as oito empresas
foram escolhidas de maneira não aleatória, o que pode ter “comprometido a
confiabilidade dos seus resultados”, já que estas operadoras atendem apenas
cinco milhões de clientes de planos de saúde num mercado de 35 milhões de
pessoas. Outro problema apontado é a pesquisa estar restrita aos
consumidores de planos privados, que constituem a menor parcela de clientes
de planos de saúde no Brasil, não incluindo os consumidores de planos de
saúde de empresas (NEPP, 2003).
Ainda assim, motivado pelas reclamações dos clientes de planos de
saúde e tendo as informações apresentadas pelo relatório do IDEC, o deputado
Henrique Fontana33 persistiu na aprovação, junto à Mesa Diretora34 da Câmara
dos Deputados, da constituição de Comissão Parlamentar de Inquérito dos
Planos de Saúde, através do Requerimento n. º 12/2003. Conforme entrevista
ao Jornal Medicina (2003), o deputado fala:
O que me motivou a persistir na aprovação da criação de uma CPI
dos Planos de Saúde foi o grande número de reclamações dos
usuários. As empresas deste setor são as líderes absolutas de
reclamações dos órgãos de defesa do consumidor em todo o país.
Batalho pela instalação desta CPI dos Planos de Saúde há três anos.
O montante que este mercado movimenta é muito alto, cerca de R$
23 bilhões por ano. Soma muito próxima ao valor que o governo
federal destina anualmente para a Saúde: R$ 25 bilhões. Mas o que
realmente me motivou a persistir na aprovação da CPI foi o grande
número de reclamações dos usuários. E a situação se agravou nos
últimos anos, em função do conflito entre médicos e empresas.
Existe, em alguns casos, uma chantagem de caráter econômico.
Ressalto que não estou generalizando. Isso não acontece
necessariamente em todas as empresas. Mas temos conhecimento
de inúmeros casos. Há médicos sendo ameaçados de
descredenciamento por cumprirem de forma exemplar sua função. As
empresas alegam que pedem exames demais. E esta pressão
indevida feita pelas operadoras pode gerar sérios danos à saúde da
população35.
32
Reportagem publicada no Diário de S.Paulo em 14/07/03.
Além de autor do projeto da CPI , foi ex-secretário de saúde de Porto Alegre, médico e exerce seu segundo mandato
na Câmara Federal.
34 A Mesa Diretora da Câmara dos Deputados é responsável pela direção dos trabalhos legislativos e dos serviços
administrativos da Casa. Compõe-se de Presidência – presidente e dois vice-presidentes – e de Secretaria, composta
por quatro secretários e quatro suplentes. Os membros efetivos da Mesa não podem fazer parte de Liderança nem de
Comissão Permanente, Especial ou de Inquérito (art. 14 do Regimento Interno, 1989).
35 Entrevista de 14/05/03, disponível em www.henriquefontana.com.br.
33
63
Em 1º de maio de 2003 é publicada no Diário da Câmara a instauração
da CPI, com prazo regimental de cento e vinte dias para a realização de
trabalhos, a partir da data de constituição da Comissão. Esta iniciou seus
trabalhos em 30 de maio e estendeu-se, devido às prorrogações, até o dia 25
de novembro de 2003.
Segundo Fontana, o trabalho teria por base as milhares de reclamações
registradas contra as empresas de planos de saúde nos órgãos de defesa do
consumidor das principais cidades do país.
2. Constituição da CPI e Formas Organizativas
A CPI foi constituída com a finalidade de “investigar denúncias e
irregularidades na prestação de serviços por empresas e instituições
privadas de planos de saúde”.
A Comissão foi composta a partir de indicações dos líderes e em
consonância com o disposto no Art.23 do Regimento Interno da Cãmara dos
Deputados, por vinte e quatro (24) membros titulares e vinte e quatro (24)
suplentes.
Apesar do prazo regimental de cento e vinte (120) dias ter se iniciado em
30 de maio, data de constituição da comissão, a primeira reunião só foi
realizada em 10 de junho de 2003, conforme o Regimento Interno da Cãmara e
a partir das indicações dos líderes dos partidos onde foi realizada a eleição do
presidente e dos vice-presidentes.
Para ocupar a presidência foi indicado o deputado Henrique Fontana;
seguido do 1º vice-presidente, Arlindo Chinaglia; do 2º vice-presidente, Vago,
do 3º vice-presidente, a deputada Yeda Crusius, e como relator o deputado
Ribamar Alves.
A seguir, apresentamos o Quadro 3 com o perfil dos componentes da
CPI, que inclui as atividades profissionais e os vínculos que os parlamentares
possuem com as comissões ligadas à saúde.
64
Quadro 3 - Perfil dos componentes da CPI
Nome
TITULARES
Partido Político
PT – (Partido
Trabalhadores)
Estado
Henrique Fontana
RS
Vice-líder do PT
Antonio
Biscaia
Carlos
Arlindo Chinaglia
RJ
Líder do PT
SP
Florisvaldo Fier
(Dr. Rosinha).
SUPLENTE
PT – (Partido
Trabalhadores)
dos Vice-líder do PT
João Batista
Santos
(João Grandão)
Roberto Gouveia
Júlio
César
Carvalho Lima
Médico
Administrador
empresas
Advogado
Professor
Universitário
Procurador
Justiça
Médico
PR
Médico
Servidor Público
SP
Advogado
Professor
Bancário
Médico
SP
de
PI
RJ
Robson Tuma
SP
SUPLENTE
Presidente da CPI
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
de
Advogado
Professor
Produtor rural
Advogada
Servidora Pública
Advogado
Empresário
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
PFL – (Partido da Frente
Liberal)
José
Aristodemo
Pinotti
(Dr. Pinotti)
SP
Médico
Ney Lopes de Souza Vice-líder do PFL
RN
Advogado
Jornalista
Professor
Universitário
Advogado
Professor
José
Francisco
PI
36
Paes Landim
TITULAR
PMDB - (Partido do
Movimento Democrático
Brasileiro)
Luiz
José
GO
Bittencourt
Max Rosenmann
PR
José Saraiva Felipe
MG
37
de
PFL – (Partido da Frente
Liberal)
Laura Carneiro
36
Vinculo Parlamentar
dos
Vice-líder
TITULAR
Atividade Profissional
dos
Hoje o Deputado é vice-líder do PTB
Fonte: Notas Taquigráficas – Audiência 11/09/03, (pág 41)
Engenheiro Civil
Professor
Universitário
Advogado
Empresário
Médico
Professor
Empresário
37
Hospitalar
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
65
Quadro 3 - Perfil dos componentes da CPI
Nome
SUPLENTE
Asdrúbal
Bentes
Darcísio
Perondi
Partido Político
Estado
PMDB - (Partido do
Movimento Democrático
Brasileiro).
Mendes Vice-líder PMDB
PA
Paulo
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Coordenador
Geral
da
Bancada do Cooperativismo
39
de Saúde
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
MA
Advogado
Empresário
Médico
RS
Economista
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
PR
Economista
Professor
Médico
Professor
Universitário
Fundador
das
primeiras
UNIMED’s
do
40
Brasil em B.H.
Médico
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Presidente
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Médico
Empresário
Sócio Proprietário
da Clínica santa
Rita Ltda
Diretor do Plano
de
Assistência
Médica Santa Rita
Diretor do Hospital
e
Maternidade
Santa Rita
Agropecuarista
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Advogado
Empresário
Padre
Presidente
da
Confederação das
Santas Casas de
41
Misericórdia
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
MG
TITULAR
PSDB – (Partido da
Social
Democracia
Brasileira).
João
Castelo
Ribeiro Gonçalves
Sebastião
Torres
Madeira
Yeda
Rorato Vice-líder do PSDB
Crusius
SUPLENTES
PSDB – (Partido da
Social
Democracia
Brasileira).
Luiz Carlos Hauly
Vice-líder do PSDB
MA
José Rafael Guerra
Pinto Coelho
MG
Walter
Feldman
SP
Meyer Vice-líder do PSDB
TITULAR
Benedito
Carvalho
PP
–
Progressista)
Dias
de
SUPLENTE
AP
PR
PP
–
Progressista)
PB
José
Ponte
CE
Linhares Vice-líder do PP
Roberto Jefferson
Monteiro Francisco
Silas Câmara
PTB
–
(Partido
Trabalhista Brasileiro)
RJ
Advogado
AM
Empresário
Fonte: www.bsb.netium.com.br/cmb
Fonte: Notas Taquigráficas – Audiência 25/09/03, (pág 24).
40
Fonte: Notas Taquigráficas – Audiência de 25/09/03.
41
Fonte: www.bsb.netium.com.br/cmb
39
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
(Partido
Enivaldo Ribeiro
TITULAR
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
(Partido
Nelson Meurer
38
Vinculo Parlamentar
Advogado
Servidor Público
Médico
Vice-Presidente da
Confederação das
Santas Casas de
38
Misericórdia
Empresário
Produtor Rural
RS
Silas Brasileiro
(Continuação)
Atividade Profissional
66
Quadro 3 - Perfil dos componentes da CPI
Nome
SUPLENTE
Arnaldo Faria de Sá
Partido Político
Estado
PTB
(Partido
Trabalhista Brasileiro)
Vice-líder do PTB
SP
TITULAR
PL – (Partido Liberal)
Vanderval Lima dos
Santos
(Bispo Vanderval)
José
Maurício
Rabelo
(Continuação)
Atividade Profissional
Advogado
Contabilista
Radialista
Professor
SP
Radialista
Empresário
TO
Radialista
Professor
Empresário
Lavrador
SUPLENTE
PL – (Partido Liberal)
Almir
Oliveira
Moura
RJ
Carlos Mota
MG
Radialista
Ministro
Evangélico
Procurador
Federal
TITULAR
MA
Alexandre Cardoso
RJ
TITULAR
PPS – (Partido Popular
Socialista)
Colbert Martins
SUPLENTE
BA
PPS – (Partido Popular
Socialista)
Vice-líder do PPS
MS
Geraldo Resende
TITULAR
SUPLENTE
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Médico
Diretor do Hospital
Santa Rita
Diretor do Hospital
Santa Inês
Médico
Sócio da Clínica
42
Segumed Ltda
Relator da CPI
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Médico
Médico
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Médico
Chefe de Serviço
da Casa de Saúde
São Bernardo
Diretor Presidente
da Casa de Saúde
Santa Maria
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
PDT
–
(Partido
Democrático Trabalhista)
Lúcio
MG
PDT
–
(Partido
Democrático Trabalhista)
Ricardo Wagner de
MA
Carvalho Lago
TITULAR
PCdoB
–
(Partido
Comunista do Brasil)
Jandira Feghali
RJ
42
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
PSB – (Partido Socialista
Brasileiro)
José Ribamar Alves
Mário
Heringer
Vinculo Parlamentar
Advogado
Medica
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Familia
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
Fonte: Declaração de Imposto de Renda do candidato à Prefeitura de Duque de Caxias, eleições 2004.
67
Quadro 3 - Perfil dos componentes da CPI
Nome
SUPLENTE
Jamil Murad
TITULAR
Partido Político
Estado
PCdoB
–
(Partido
Comunista do Brasil)
Vice-líder do
SP
PC do B
Vanderlei Assis
Vinculo Parlamentar
Médico
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
Membro
da
Frente
Parlamentar da Saúde
SP
Médico
Membro
da
Comissão
Permanente de Seguridade
Social e Família
SP
Médico
Professor
PRONA – (Partido de
Reedificação da Ordem
Nacional)
Elimar
Máximo
Damasceno
SUPLENTE
(Continuação)
Atividade Profissional
PRONA – (Partido de
Reedificação da Ordem
Nacional).
Fonte: www.camara.gov.br, acessado em 31 de maio de 2004
68
A CPI se inicia com o pressuposto de que o Congresso Nacional, através
de seus parlamentares, daria uma resposta à sociedade. Pelos discursos iniciais,
percebe-se o interesse em transformar a CPI num instrumento propositivo, numa
grande oportunidade para se superar os problemas do setor. Na seção iniciada no
dia 10/06/03, o deputado Carlos Mota chega a dizer que a CPI “com certeza
destampará para a sociedade uma panela bem profunda, cheia de desmandos na
área dos planos de saúde”.43
A expectativa criada é de que seriam apuradas as irregularidades, e o
subproduto deste trabalho constituiria um salto de qualidade para a política
pública.
Observadas as normas fixadas no Regimento e no Regulamento das
Comissões, as comissões podem estabelecer regras e condições específicas para
a organização e o bom andamento dos seus trabalhos. Além disso, para que as
pessoas possam ser convidadas ou convocadas para as audiências de tomada de
depoimentos, é necessário que os deputados submetam sua solicitação, através
de requerimento, à apreciação e votação. (Regimento Interno da Câmara, 1989)
Das informações colhidas nas Notas Taquigráficas observa-se que já havia
uma gama de problemas consolidados anteriormente. A representante44 de
pacientes renais crônicos em seu depoimento revela que a proposta de investigar
denúncias e irregularidades em contratos de planos de saúde já era uma iniciativa
da legislatura passada. Complementa a informação dizendo que, com os mesmos
objetivos, outras CPI’s foram criadas em Assembléias Legislativas Estaduais45.
Estas informações, agregadas, nos levam a crer que o relatório do IDEC,
embora contestado pela pesquisa do NEPP, deu forma a esses problemas e
serviu como motivo, aparentemente declarado pelo Legislativo, para a instalação
desta CPI.
Após a instalação da CPI, alguns parlamentares se preocuparam com o tom
mais investigativo que pudessem lhe conferir ou que contrariasse as forças do
43
Fonte: Audiência 10/06/03, (pág. 18).
Fonte: Audiência de 08/07/03.
45
Como foi o caso de Pernambuco e de Curitiba.
44
69
mercado. O cuidado para não torná-la “policialesca” pode ser observado no
depoimento do deputado Roberto Jefferson:
(...) eu não tenho simpatia por CPI. Eu entendo que a CPI transforma
todos nós em delegados de polícia, e é um papel que não gosto de
exercer.... Eu temo, Presidente, esse sentimento que às vezes invade até
os liberais, porque as disputas ideológicas a gente entende, saúde é
direito de todos e dever do Estado. A gente percebe que há posturas que
são ideológicas em relação à saúde complementar. E eu respeito, porque
eu sei respeitar as posturas ideológicas. E admiro quem pugna: “A minha
postura é socialista. Saúde é só coisa do Estado. Não aceito a iniciativa
privada lucrando com o sofrimento, com a doença...” Eu acho um
discurso perfeito, porque é ideológico, mas eu tenho medo é de o liberal
se deixar levar por uma luta contratual. De repente, são os médicos, as
confederações médicas que têm um conflito de interesse econômico, os
46
hospitais, os laboratórios. (Deputado Roberto Jefferson)
De todo modo, apesar dos limites de uma CPI, fundamentalmente, ela é
portadora de uma proposta de investigação. Investigar significa procurar causas e
conseqüências, seguir vestígios, fazer diligências para descobrir algo e possibilitar
que decisões sejam tomadas após o reconhecimento e análise dos problemas.
A expressão “precisamos ter um diagnóstico” do setor foi utilizada pelos
parlamentares repetidas vezes com o intuito de aproximar as terminologias da
prática, e balizou as investigações. Segundo eles, a partir deste diagnóstico, seria
possível oferecer uma “proposta terapêutica”.
(...) nós, através desta Relatoria, sugerimos que fizéssemos dela um
diagnóstico igual ao que fazemos no nosso consultório: ouvindo primeiro
as queixas, fazendo exame do paciente, pedindo exames
complementares, fazendo diagnóstico o mais preciso possível e
sugerindo a terapêutica a mais ideal possível. A busca da perfeição é a
busca de todo ser humano. Alcançá-la é o problema, mas buscaremos
fazer o melhor possível de nós, até porque esta CPI não foi criada para
acabar com os planos de saúde, mas, sim, para aperfeiçoar o sistema de
saúde no Brasil, não só os planos de saúde privados, mas também o
SUS, que não é o responsável direto por toda essa situação do País, mas
se o SUS estivesse funcionando, com certeza, muitas das pessoas que
buscam os planos de saúde, não estariam lá. (Deputado Ribamar
Alves).47
46
47
Fonte: Audiência de 01/07/03.
Fonte: Audiência de 26/06/03.
70
Apesar da tentativa de encontrar um eixo comum para a condução dos
trabalhos, as diferentes interpretações acerca do objetivo da CPI existiram,
tornando sua dinâmica por várias vezes confusa. Para uns ela poderia
contratualizar de forma mais transparente a relação entre planos e usuários, bem
como estabelecer o grau de qualidade do atendimento a ser prestado. Para outros
serviria para identificar quais os verdadeiros beneficiários do sistema de saúde
suplementar. Para o relator “era uma oportunidade para um grande fórum de
debate nacional”.48
O modelo de organização da CPI, proposto pelo presidente e aprovado
pelos membros que a compunham, foi dividir as audiências em quatro blocos:
1)
no primeiro se ouviriam as diferentes representações da
sociedade, com o objetivo de elencar as denúncias e os problemas do
cotidiano;
2)
no segundo seriam convidados os profissionais de saúde que
atuam na área e atendem a população e os prestadores de serviços
(profissionais e hospitais);
3)
num terceiro bloco, seriam ouvidas as empresas tomadoras
de serviço, as operadoras de planos e seguros de saúde; e por fim
4)
a ANS, para verificação de sua atuação.
A deputada Yeda Crusius sugeriu um quinto bloco de audiências, que
seriam os formuladores e gestores da política de saúde, para que fosse iniciada
também uma discussão sobre acesso e universalização dos serviços de saúde no
país, o que acabou não ocorrendo. E por último, a deputada Jandira Feghalli
sugeriu que, além do bloco de gestores, também fosse criado um bloco do
Judiciário e do Ministério Público, já que eles arbitravam muitos dos conflitos
instalados no setor de planos e seguros de saúde.
O que se observa das informações transcritas nas Notas Taquigráficas é
que não houve um planejamento de como começar, e o que solicitar. Vários
requerimentos foram apresentados e submetidos à votação, tendo como principal
referência o critério dos “blocos”. Todavia, a aprovação dos requerimentos não
48
Fonte: Audiência de 10/06/03, (pág 8).
71
significava seu encaminhamento imediato ao destinatário. Com o estabelecimento
de blocos, conforme iam sendo aprovados, os requerimentos eram separados no
escrutínio correspondente. Nosso entendimento é de que a Mesa Executiva da
Comissão e o Relator definiam quais dos requerimentos aprovados seriam
efetivamente enviados e em que ordem isso aconteceria.
Alguns deputados chamaram atenção para o fator tempo. Diziam que a CPI
não deveria ser preenchida com inúmeros depoimentos, pois inviabilizaria outras
investigações necessárias. Para esse grupo de parlamentares as audiências eram
importantes para municiá-los de informações, mas também era necessário haver
tempo para que pudessem executar outros trabalhos, como investigar, pensar a
legislação, outros organismos de controle, a própria regulação, etc.
(...) a Comissão Parlamentar de Inquérito é uma Comissão de
investigações. Então, nós temos que ter muito cuidado... Deferindo
requerimentos, ampliando de uma forma descontrolada as investigações,
nós não vamos chegar ao resultado que todos nós aguardamos.
(Deputado Antonio Carlos Biscaia). 49
Mesmo com este alerta, houve vinte e quatro (24) reuniões considerando o
prazo regimental e suas respectivas prorrogações. As informações das Notas
Taquigráficas sugerem não ter havido um preparo a priori, por parte dos
deputados, dos questionamentos e esclarecimentos que queriam obter dos
convidados ou convocados. O convidado prestava seu depoimento de forma livre.
Se houvesse necessidade de esclarecimento de algum ponto em sua fala – e
obedecida a ordem de inscrição dos deputados - as dúvidas eram esclarecidas. O
Quadro 5 apresenta a relação dos convidados a depor e os cargos que ocupam,
conforme a categorização realizada pela própria CPI, qual seja: representante do
governo, dos clientes de planos de saúde, da sociedade, do Judiciário, dos
profissionais de saúde, dos hospitais, das empresas operadoras de planos e
seguros de saúde, e testemunhas.
49
Fonte: Audiência 01/07/03.
72
Quadro 5: Relação dos convidados pela CPI50
NOME
DO MINISTÉRIO DA SAÚDE E ANS
1. Humberto Costa
2. Januário Montone
3. Solange Beatriz Palheiro Mendes
DE CLIENTES DE PLANOS DE SAÚDE
1. Haydee Argeme;
2. Sabatino Adrien Levy
3. Jorge Adiren Beloqui
4. Roberto Junqueira Torquato
5. Regina Célia Zanke
6. Kelly Cristina de Castro Queiroz
DA SOCIEDADE
1. Ricardo Morishita
2. Gustavo José Marrone de Castro
Sampaio
3. Marilena Lazarini
4. Karina Rodrigues
5. Áurea Celeste da Silva Abbade
7. Neide Regina Cousin Barriguelli
8. Maria Lêda Dantas
10. Algacir Túlio
DO JUDICIARIO
1. Rosana Chiavassa
2. Duciran Van Marcen
3. João Henrique Vilela da Silveira
4. Luís Fux
5. Luiz Antonio Rizatto Nunes
6. Marco Antonio Zanellato
7. Paulo Valério Dal Pai Moraes
DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE
1. Edson de Oliveira Andrade
2. Heder Murari Borba
3. José Mário Morais Mateus
4. Eleuses Vieira de Paiva
5. Jaldo de Souza Santos
6. Paulo de Argollo Mendes
7. Luiz Augusto Pereira
8. Ben Hur Godolphin Horn
9. Maria Do Carmo Abade
10. Márcia Rosa de Araújo
11. Florisval Meinão
50
INSTITUIÇÃO
Ministro de Estado da Saúde
Diretor-Presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS.
Diretora de Normas e Habilitação de Operadoras da Agência Nacional
de Saúde Suplementar – ANS
Consumidora de plano de saúde;
Cliente de plano de saúde da Associação Auxiliadora das Classes
Laboriosas
Cliente de plano de saúde do plano Omint Serviços De Saúde Ltda
Cliente de plano de saúde do Bradesco Saúde S/A
Usuária do plano de saúde SAMCIL
Saúde Internacional Assistência Médica
Diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor
Diretor-Executivo da Fundação Procon de S.P.
Coordenadora Executiva do Instituto de Defesa do Consumidor – IDEC
Advogada do Instituto de Defesa do Consumidor – IDEC
Advogada do Grupo de Apoio à Prevenção à Aids – GAPA
Presidente da Federação das Associações de Pacientes Renais
Crônicos e Transplantados.
Representante da Confederação Brasileira dos Aposentados - COBAP,
no Conselho Nacional de Saúde.
Diretor do PROCON do Paraná
Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB – São Paulo
Procurador do Ministério Público Federal da Paraíba
Representante do Sr. Ralph Luis Vidal Sabino dos Santos,
Coordenador de Apoio das Promotorias de Justiça de Defesa do
Consumidor.
Ministro do Superior Tribunal de Justiça
Juiz do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo e Professor
Especialista em Direito do Consumidor
Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de
Justiça do Consumidor
Promotor de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional
de Defesa do Consumidor do Ministério
Presidente do Conselho Federal de Medicina
Presidente da Federação Nacional dos Médicos
Presidente das Comissões Fixas do Conselho Federal de Odontologia;
Presidente da Associação Médica Brasileira – AMB
Presidente do Conselho Federal de Farmácia.
Presidente do Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Sul - SIMERS
Vice-Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio
Grande do Sul, representando Marco Antônio Becker, Presidente do
Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul CREMERS.
Presidente do Conselho Regional de Odontologia do Rio Grande do
Sul;
Diretora do Sindsaúde
Presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro
Diretor de Defesa Profissional da Associação Paulista de Medicina
Todas as audiências foram extraídas das Notas Taquigráficas disponíveis na página da Câmara dos Deputados
(www.camara.gov.br) . Às audiências realizadas nos dias 18/08/03 e 16/10/03 não estão disponibilizados acesso.
73
Quadro 5: Relação dos Convidados pela CPI
12. Samir Dahas Bittar
13. Francisco Silveira
14. Léo Cristiano de Castro Horn
15. Miguel Nobre
DOS HOSPITAIS
1. Erimar Carlos Brehme de Abreu
2. Dante Ancona Montaghana
3. Paulo Gilvane Lopes Pena
4. José Francisco Schiavon
5. Júlio Dornelles de Matos
6. Guilherme Xavier Jaccoud
DAS EMPRESAS
1. Arlindo de Almeida
2. Luiz Roberto Del Porto
3. Celso Corrêa Barros
4. José Antonio Diniz de Oliveira.
5. João Elísio Ferraz de Campos
6. Nilson Luiz May
7. Léo Cristiano
8. Mohamed Akl
9. Aldo Francisco Schmidt.
10.Sérgio Vieira
11 Luiz Roberto Silveira Pinto
12. Ricardo Silveira de Paula
13.Cid Carvalhaes
TESTEMUNHAS
1. Reginaldo Czezacki
2. Márcio Da Silva Branco
3. Wilson Martins Marques
4. Daniel Bastos da Silva Ligeiro
5. Tsutomu Matsumoras
6. Fernando Moredo
CONVIDADOS
1. Deputado Paulo Pinheiro
2. Eduardo Simões Ramos
(continuação)
Representante da Associação Médica Brasileira - AMB
Médico
Cirurgião dentista
Presidente do Conselho Federal de Odontologia
Representante da Confederação das Santas Casas de Misericórdia,
Hospitais e Entidades Filantrópicas - CMB.
Presidente do Sindicato de Hospitais, Casa de Saúde, Clínicas e
Laboratórios de Análises Clínicas e demais Estabelecimentos de
Serviços de Saúde do Estado de São Paulo – SINDHOSP;
Diretor do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho, do M. do
Trabalho e Emprego;
Presidente da Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de
Serviços de Saúde do Estado do Paraná
Presidente do Sindicato dos Hospitais Beneficentes, Religiosos e
Filantrópicos-SINDIBERF.
Presidente da Associação dos Hospitais do Rio de Janeiro
Presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo ABRAMGE;
Diretor-Presidente da Associação Brasileira de Análises Clínicas - São
Paulo;
Presidente da Confederação Nacional das Cooperativas Médicas, –
UNIMED do Brasil.
Presidente da União Nacional das Instituições de Auto Gestão em
Saúde – UNIDAS
Presidente Da Federação Nacional das Empresas de Seguros
Privados e de Capitalização - FENASEG
Presidente da Federação das Cooperativas Médicas do Rio Grande do
Sul Ltda. – UNIMED;
Cirurgião-dentista Público do Rio Grande do Sul.
Presidente da Central Nacional UNIMED;
Ex-Diretor-Superintendente da UNIMED São Paulo
Presidente da Abramge Regional Rio de Janeiro;
Presidente da SAMCIL
Presidente da Saúde ABC Convênios Médico-Hospitalares Ltda.
Ex-Presidente da UNIMED São Paulo;
Proprietário das Empresas Cliniprev LTDA e Prever Serviços
Póstumos Ltda
Proprietário da empresa ORSAF – Organização de Serviço
Assistencial e Funeral, em nova Friburgo – RJ.
Proprietário das Empresas Cliniprev LTDA. e Prever Serviços
Póstumos Ltda
Proprietário da empresa Vital Assistência Funerária, em Petrópolis –
RJ.
Presidente da NIPOMED
Presidente do Centro Transmontano de São Paulo
Presidente da Comissão de Assuntos da Criança, do Adolescente e
Idoso da ALERJ.
Corretor de Seguros
74
Foram prestados aproximadamente 70 depoimentos – e nenhuma das
operadoras convocadas a depor - exceto a Unimed Paulistana, que se encontrava,
à época, em processo de liquidação judicial – fazia parte do universo analisado
pelo teste do IDEC. Talvez a justificativa para essa opção esteja na fala do
deputado Roberto Jefferson, líder do PTB, que derruba o requerimento de seu
companheiro de partido, o deputado Arnaldo Faria de Sá.
(...) não tive oportunidade de falar com ele hoje. Mas o requerimento
começa a "fulanizar”. Requer seja convocado o Presidente da Golden
Cross para prestar esclarecimento acerca de irregularidade...Quer dizer,
51
já parte para uma acusação (Deputado Roberto Jefferson) .
A empresa Blue Life - que junto com a Golden Cross aparecia no teste do
IDEC em segundo lugar no ranking de desrespeito à legislação - também não foi
convidada, embora tenha sido lembrada:
Os planos de saúde têm deputados eleitos. Havia um aqui que era dono
de um plano de saúde, da Blue Life. “Numa audiência pública, ele disse
que o problema do plano de saúde era o idoso, porque ocupava muito o
plano de saúde”.
(...) a Blue Life, cujo dono foi Deputado Federal. Numa reunião do
Conselho Nacional de Saúde ele disse: os nossos problemas aqui... Era
o Deputado Ayres da Cunha. Se tiver lá registrado nos arquivos vocês
podem encontrar a declaração dele no debate sobre a regulamentação
dos planos. Ele falou: o nosso problema são os idosos. Plano de saúde,
se eliminasse o idoso, era muito melhor, diminuiria muito os problemas
52
(Deputado Jamil Murad).
Para se entender melhor os possíveis interesses dos deputados, foi
pesquisada a página do Tribunal Superior Eleitoral (setor prestação de contas das
eleições de 2002), com o intuito de se verificar as doações de campanhas dos
deputados que estavam participando dessa CPI. Algumas operadoras que
estavam incluídas no teste do IDEC, como podem ser observadas no Quadro 6,
fizeram doações para as eleições de 2002.
51
52
Fonte: Audiência 01/07/03.
Fonte: Audiências 24/06/03 e 07/08/03, respectivamente.
75
A dependência de recursos de empresas para fazer as campanhas53 pode
sugerir que determinadas políticas públicas podem ser implementadas para
favorecer alguns doadores, ou de que certas doações são retribuições a políticas
que favoreceram as empresas. Tomamos como base, para a afirmação acima, um
estudo desenvolvido por Mény (1996), concluindo que:
A formação de grupos é um fenômeno comum a todas as sociedades.
Esses grupos formam-se em nome de interesses comuns. Grupos de
interesses têm sido denominados aqueles que mediante formas múltiplas
e variadas, procuram fazer valer seus interesses junto ao poder político.
Inversamente, o poder político estabelece relações com esses grupos
para, eventualmente, os interditar, controlar ou associar à sua ação.
53
Um fator a destacar é que as campanhas eleitorais são fortemente dependentes das doações de empresários. Nas
eleições presidenciais de 2002, 80% dos recursos declarados pelos candidatos vieram de doações das empresas.
(www.tse.gov.br ).
76
Quadro 6: Doações Recebidas pelos Deputados que compõem a CPI nas Eleições de 2002
Deputado
Empresa
Valor
•
Colbert Martins da Silva Filho
•
•
Darcisio Paulo Perondi
Florisvado Fier
José Aristodemo Pinotti
Clínica Sr. do Bomfim Ltda.
Farmácia Silva Ltda.
Clínica Pro-Renal Ltda.
Medirp Sistema De Saúde Ltda.
Pró-onco Instituo Paranaense de
Cancerologia
Laboratório Ferring
R$ 5.000,00
R$ 1.000,00
R$ 4.500,00
R$ 500,00
R$ 1.000,00
•
-
•
José Francisco Paes Landim
-
R$ 13.000,00
R$ 20.000,00
•
José Linhares Ponte
•
•
José Rafael Guerra Pinto Coelho
-
Humana Assistência Médica Ltda.
Clínica de Urologia Modesto
Jacobino Ltda.
Medirp Sistema De Saúde Ltda.
Medial Saúde S/A
Associação Nacional Farmacêuticos Magistrais
Maternidade Otaviano Neves S. A.
R$ 10,000. 00
R$
500,00
R$ 20.000,00
R$ 5.000,00
R$ 1.000,00
-
Grupo Mineiro de Pediatria Ltda
Hospital da Criança
-
Casa de Saúde Santa Maria Ltda.
-
Associação De Hospitais De Minas Gerais
R$ 1.000,00
R$ 1.000,00
•
Laura Carneiro
-
Grupo Hospitalar do Rio de Janeiro Ltda.
Proteção médica a empresas Ltda. - PROMEDIC.
•
Mário Lúcio Heringer
-
Hospital Cardoso Rodrigues Ltda.
Casa de Saúde Nossa Senhora do
Carmo
Hospital - Med. Cirúrgica Ltda.
Abbutt Laboratórios do Brasil Ltda.
Casa de Saúde Santa Maria Ltda.
Casa de Saúde Grajaú
Oncologistas Associados
Regional Saúde Ltda.
Evangélico Saúde S/C Ltda.
Nossa Saúde - Operadora de Planos
Privados de Assistência À Saúde
Organização Médica Clinihauer Ltda.
Saúde Ideal-Irmandade Santa Casa de Misericórdia
de Curitiba
Uniclínicas – Assistência Médica
Hospitalar Ltda.
Medial Saúde S/A
S.I.M. Serviço Ibirapuera de Medicina S/C
Interclinicas - Planos de Saúde S/A
•
Max Rosenmann
-
•
•
Roberto Jefferson Monteiro
-
Benef. Médica Bras. S/A – Hosp. E Maternidades S.
Luiz
Fonte: Prestação de contas eleitorais, eleições 2002 – TSE.
Walter Meyer Feldman
-
R$ 2.500,00
R$ 1.858,70
R$ 2.000,00
R$ 3.000,00
R$ 3.000,00
R$ 100,00
R$ 200,00
R$ 67.399,61
R$ 1.000,00
R$ 6.000,00
R$ 1.000,00
R$ 1.000,00
R$ 2.000,00
R$ 8.000,00
R$ 1.000,00
R$ 1.000,00
R$ 20.000,00
R$ 1.000,00
R$ 4.000,00
R$ 10.000,00
77
3. Agenda de Debates na CPI dos Planos de Saúde
A CPI abordou temas bastante variados, desde a prática de “sobrepreço”
dos hospitais até a universalização da saúde no Brasil. Para categorizá-los
buscou-se identificar quais os que haviam sido mencionados com maior
freqüência. Depois disso esforçamo–nos em achar os fundamentos que
orientaram os pocisionamentos dos participantes durante as audiências da CPI.
Ou seja, identificamos os temas predominantes associando-os aos seus
expositores.
Considerando uma década de privatizações, baixo crescimento econômico,
aumento da carga tributária e precarização do mercado de trabalho associada à
antiga e sistêmica polêmica entre médicos, operadoras e consumidores de planos
de saúde, a CPI trouxe um volume de temas bastante variado.
Os conflitos envolvidos neste debate deram um tom bastante diferenciado
aos depoimentos. A chamada divisão por “blocos”, sugerida pelo presidente da
CPI, demonstrou de forma bem resumida que as reclamações mais reincidentes,
relatadas pelos clientes de planos de saúde e pelos órgãos de defesa do
consumidor, foram (detalhamento das reclamações por grupo de interesse e por
depoente no Quadro 8):
1. Exclusão de doenças preexistentes;
2. Reajuste por faixa etária;
3. Aumento de mensalidades;
4. Falta de cobertura necessária;
5. Planos não oferecem a opção “agravo”.
Quanto aos profissionais de saúde, as reclamações iam desde o fato de os
planos de saúde interferirem de várias formas na autonomia profissional até as
práticas, sobretudo implementadas pelas cooperativas médicas, chamadas de
“meta referencial”, que punem, com desconto dos honorários, o médico que
exceder o número de exames e procedimentos impostos pela operadora.
78
Foi unânime neste segmento que a falta de repasse aos profissionais
médicos dos aumentos concedidos às operadoras de planos de saúde tem trazido
sérios problemas tanto para eles quanto para os clientes de planos de saúde.
Existe até aí um sistema que o Conselho Federal de Medicina repudia,
que as empresas ligadas ao grupo da UNIMED estão lançando mão, que
é chamado de meta referência. (Diretor de Defesa Profissional da
Associação Paulista de Medicina Florisval Meinão). 54
54
Audiência 01/09/03.
79
Quadro 8: Descrição das Reclamações por grupo de interesse e por depoente:
1. Sociedade Civil
Sociedade Civil
1.
Departamento
Nacional de Proteção e
Defesa do Consumidor
(MF)
2. PROCON
3. Coordenadora IDEC
4. Advogada IDEC’
5. Advogada do GAPA
6. Representante dos
pacientes
Renais
Crônicos
8. Representante da
Confederação Brasileira
dos Aposentados
2.
Usuários
1. H.
2. S.
3. J.
4. R.
5. R.
6. K.
Reclamações
1
2
X
X
3
X
4
X
X
X
x
X
X
X
X
X
X
X
X
5
X
6
7
8
9
10
x
X
X
X
X
X
X
X
X
X
11
X
X
X
12
13
X
X
14
X
15
26
X
X
x
x
x
x
X
Usuários
Reclamações
4
13
X
x
14
19
20
23
24
x
x
x
X
x
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
X
Descredenciamento de médicos, hospitais e clínicas.
Reajuste por faixa etária
Falta de clareza nos conceitos urgência e emergência
Exclusão de doenças consideradas pré-existentes
Falta de atendimento
Aumento de mensalidades
Revisão Técnica
Falta de cobertura necessária
Necessidade de mobilidade
Reclamações da ANS
Necessidade de regras de Migração
Rescisão unilateral pelos planos
Imposição pelos planos de limitação no período de
internação
Longos períodos de carência
Fragilidade da legislação
Não há fiscalização na propaganda
Tabelas diferenciadas de reembolso
Hospitais aumentam tabela quando querem
Não fiscalização nos contratos coletivos
Limitação de consultas, exames médicos, laboratoriais ou
Meta Referencial.
Carência em caso de pagamento em atraso
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
x
Exigência de cheque caução
Restrições por ser plano antigo (órtese e prótese)
Limitação de internação de doentes mentais
Negativa de exames
Planos não oferecem a opção “Agravo” para os contratos
novos
Problemas nos contratos empresariais
Falta de repasse para os médicos e prestadores de
serviços dos aumentos concedidos às operadoras
Exclusão da Odontologia do Plano de Referência Básico
Precisa ter fontes alternativas (saúde suplementar) para
sobreviver
Colapso financeiro da rede hospitalar
Formação Médica
Controle de novas Tecnologias
Demora na autorização de procedimentos gerais por parte
da operadora
Aumento do número de atores
Falta de financiamento para o sistema público e privado
Necessidade de entendimento pelo usuário da importância
e valo do plano de saúde
Necessidade dos hospitais cuidarem de seus custos
39.
Operadoras precisam reduzir problemas de relação com a
parte de comissionamento
Judiciário precisa ter mais informações sobre o setor
Precisam ser chamadas à responsabilidade as empresas
de material médico/hospitalar
42.
Os órgãos de defesa do consumidor precisam entender
que não se pode criar despesas sem prever receita
43.
Governo Federal precisa definir qual política de saúde
quer
44.
A ANS não tem que ser um órgão de defesa do
consumidor. Precisa é regular o sistema de saúde
suplementar
45.
O médico precisa de conscientização nas suas decisões
médicas
46.
Definição errada do seu negócio (negócio de cunho
financeiro)
47.
Plano de saúde é uma atividade privada e precisa de
equilíbrio econômico
48.
População esta satisfeita
49.
Insatisfação dos clientes por aumento de mensalidades se
decorre da perda do poder aquisitivo da população
Fonte: Informações retiradas de cada um dos depoimentos registrados
nas
Notas
Taquigráficas
40.
41.
80
Quadro 8: Descrição das Reclamações por grupo de interesse e por depoente:
(Continuação)
3. Judiciário
Judiciário
Reclamações
1
X
4
6
1. Conselheira da
Ordem
dos
Advogados
do
Brasil
2. Procurador do
Ministério Público
Federal
3.
Ministro
do
Superior
Tribunal
de Justiça
4. Juiz do Tribunal
de Alçada Civil de
São Paulo
X
x
5. Procurador de X
Justiça
e
Coordenador
do
Centro de Apoio
Operacional
das
Promotorias
de
Justiça
do
Consumidor
do
Estado
de São
Paulo
1.
Descredenciamento de médicos, hospitais e clínicas.
2.
Reajuste por faixa etária
3.
Falta de clareza nos conceitos urgência e emergência
4.
Exclusão de doenças consideradas pré-existentes
5.
Falta de atendimento
6.
Aumento de mensalidades
7.
Revisão Técnica
8.
Falta de cobertura necessária
9.
Necessidade de mobilidade
10.
Reclamações da ANS
11.
Necessidade de regras de Migração
12.
Rescisão unilateral pelos planos
13.
Imposição pelos planos de limitação no período de
internação
14.
Longos períodos de carência
15.
Fragilidade da legislação
16.
Não há fiscalização na propaganda
17.
Tabelas diferenciadas de reembolso
18.
Hospitais aumentam tabela quando querem
19.
Não fiscalização nos contratos coletivos
20.
Limitação de consultas, exames médicos, laboratoriais ou
Meta Referencial.
21.
Carência em caso de pagamento em atraso
10
X
11
X
12
13
x
15
X
16
X
17
X
18
X
19
x
20
21
22
26
X
27
x
X
x
x
x
x
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
x
Exigência de cheque caução
Restrições por ser plano antigo (órtese e prótese)
Limitação de internação de doentes mentais
Negativa de exames
Planos não oferecem a opção “Agravo” para os contratos
novos
Problemas nos contratos empresariais
Falta de repasse para os médicos e prestadores de
serviços dos aumentos concedidos às operadoras
Exclusão da Odontologia do Plano de Referência Básico
Precisa ter fontes alternativas (saúde suplementar) para
sobreviver
Colapso financeiro da rede hospitalar
Formação Médica
Controle de novas Tecnologias
Demora na autorização de procedimentos gerais por parte
da operadora
Aumento do número de atores
Falta de financiamento para o sistema público e privado
Necessidade de entendimento pelo usuário da importância
e valo do plano de saúde
Necessidade dos hospitais cuidarem de seus custos
X
39.
X
x
Operadoras precisam reduzir problemas de relação com a
parte de comissionamento
Judiciário precisa ter mais informações sobre o setor
Precisam ser chamadas à responsabilidade as empresas
de material médico/hospitalar
42.
Os órgãos de defesa do consumidor precisam entender
que não se pode criar despesas sem prever receita
43.
Governo Federal precisa definir qual política de saúde
quer
44.
A ANS não tem que ser um órgão de defesa do
consumidor. Precisa é regular o sistema de saúde
suplementar
45.
O médico precisa de conscientização nas suas decisões
médicas
46.
Definição errada do seu negócio (negócio de cunho
financeiro)
47.
Plano de saúde é uma atividade privada e precisa de
equilíbrio econômico
48.
População esta satisfeita
49.
Insatisfação dos clientes por aumento de mensalidades se
decorre da perda do poder aquisitivo da população
Fonte: Informações retiradas de cada um dos depoimentos registrados
nas Notas Taquigráficas
40.
41.
81
Quadro 8: Descrição das Reclamações por grupo de interesse e por depoente:
(Continuação)
4. Profissionais de Saúde
Profissionais de Saúde
Reclamações
1
X
4
1. Conselho Federal de
Medicina
2.
Presidente
da
Federação Nacional dos
Médicos
3.
Representante
da
Associação
Médica
Brasileira – AMB
x
4.
Presidente
da X
Associação
Médica
Brasileira - AMB
5. Presidente do Conselho
Regional de Medicina do
Rio de Janeiro
6. Diretor de Defesa x
Profissional da Associação
Paulista de Medicina
7. Conselho Federal de
Odontologia
8. Conselho Federal de
Farmácia
9. Conselho Regional de
medicina do Rio Grande
do Sul
1.
Descredenciamento de médicos, hospitais e clínicas.
2.
Reajuste por faixa etária
3.
Falta de clareza nos conceitos urgência e emergência
4.
Exclusão de doenças consideradas pré-existentes
5.
Falta de atendimento
6.
Aumento de mensalidades
7.
Revisão Técnica
8.
Falta de cobertura necessária
9.
Necessidade de mobilidade
10.
Reclamações da ANS
11.
Necessidade de regras de Migração
12.
Rescisão unilateral pelos planos
13.
Imposição pelos planos de limitação no período de
internação
14.
Longos períodos de carência
15.
Fragilidade da legislação
16.
Não há fiscalização na propaganda
17.
Tabelas diferenciadas de reembolso
18.
Hospitais aumentam tabela quando querem
19.
Não fiscalização nos contratos coletivos
20.
Limitação de consultas, exames médicos, laboratoriais ou
Meta Referencial.
21.
Carência em caso de pagamento em atraso
6
X
10
X
11
13
15
20
21
x
22
25
x
28
X
29
X
X
X
x
x
X
X
x
X
X
X
x
x
X
x
X
X
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
Exigência de cheque caução
Restrições por ser plano antigo (órtese e prótese)
Limitação de internação de doentes mentais
Negativa de exames
Planos não oferecem a opção “Agravo” para os contratos
novos
Problemas nos contratos empresariais
Falta de repasse para os médicos e prestadores de
serviços dos aumentos concedidos às operadoras
Exclusão da Odontologia do Plano de Referência Básico
Precisa ter fontes alternativas (saúde suplementar) para
sobreviver
Colapso financeiro da rede hospitalar
Formação Médica
Controle de novas Tecnologias
Demora na autorização de procedimentos gerais por parte
da operadora
Aumento do número de atores
Falta de financiamento para o sistema público e privado
Necessidade de entendimento pelo usuário da importância
e valo do plano de saúde
Necessidade dos hospitais cuidarem de seus custos
39.
Operadoras precisam reduzir problemas de relação com a
parte de comissionamento
Judiciário precisa ter mais informações sobre o setor
Precisam ser chamadas à responsabilidade as empresas
de material médico/hospitalar
42.
Os órgãos de defesa do consumidor precisam entender
que não se pode criar despesas sem prever receita
43.
Governo Federal precisa definir qual política de saúde
quer
44.
A ANS não tem que ser um órgão de defesa do
consumidor. Precisa é regular o sistema de saúde
suplementar
45.
O médico precisa de conscientização nas suas decisões
médicas
46.
Definição errada do seu negócio (negócio de cunho
financeiro)
47.
Plano de saúde é uma atividade privada e precisa de
equilíbrio econômico
48.
População esta satisfeita
49.
Insatisfação dos clientes por aumento de mensalidades se
decorre da perda do poder aquisitivo da população
Fonte: Informações retiradas de cada um dos depoimentos registrados
nas Notas Taquigráficas
40.
41.
82
Quadro 8: Descrição das Reclamações por grupo de interesse e por depoente:
(Continuação)
5. Hospitais
DOS HOSPITAIS
RECLAMAÇÕES
30
31
32
33
X
1. Confederação das Santas Casas de
Misericórdia, Hospitais e Entidades
Filantrópicos.
2. Presidente do Sindicato dos Hospitais
X
(SINDHOSP)
3. Presidente da Associação dos
Hospitais do Rio de Janeiro
4. Presidente do Sindicato dos Hospitais X
Beneficentes, Religiosos e Filantrópicos
(SINDIBERF).
1.
Descredenciamento de médicos, hospitais e clínicas.
2.
Reajuste por faixa etária
3.
Falta de clareza nos conceitos urgência e emergência
4.
Exclusão de doenças consideradas pré-existentes
5.
Falta de atendimento
6.
Aumento de mensalidades
7.
Revisão Técnica
8.
Falta de cobertura necessária
9.
Necessidade de mobilidade
10.
Reclamações da ANS
11.
Necessidade de regras de Migração
12.
Rescisão unilateral pelos planos
13.
Imposição pelos planos de limitação no período de
internação
14.
Longos períodos de carência
15.
Fragilidade da legislação
16.
Não há fiscalização na propaganda
17.
Tabelas diferenciadas de reembolso
18.
Hospitais aumentam tabela quando querem
19.
Não fiscalização nos contratos coletivos
20.
Limitação de consultas, exames médicos, laboratoriais ou
Meta Referencial.
21.
Carência em caso de pagamento em atraso
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
22.
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
Exigência de cheque caução
Restrições por ser plano antigo (órtese e prótese)
Limitação de internação de doentes mentais
Negativa de exames
Planos não oferecem a opção “Agravo” para os contratos
novos
Problemas nos contratos empresariais
Falta de repasse para os médicos e prestadores de
serviços dos aumentos concedidos às operadoras
Exclusão da Odontologia do Plano de Referência Básico
Precisa ter fontes alternativas (saúde suplementar) para
sobreviver
Colapso financeiro da rede hospitalar
Formação Médica
Controle de novas Tecnologias
Demora na autorização de procedimentos gerais por parte
da operadora
Aumento do número de atores
Falta de financiamento para o sistema público e privado
Necessidade de entendimento pelo usuário da importância
e valo do plano de saúde
Necessidade dos hospitais cuidarem de seus custos
39.
Operadoras precisam reduzir problemas de relação com a
parte de comissionamento
Judiciário precisa ter mais informações sobre o setor
Precisam ser chamadas à responsabilidade as empresas
de material médico/hospitalar
42.
Os órgãos de defesa do consumidor precisam entender
que não se pode criar despesas sem prever receita
43.
Governo Federal precisa definir qual política de saúde
quer
44.
A ANS não tem que ser um órgão de defesa do
consumidor. Precisa é regular o sistema de saúde
suplementar
45.
O médico precisa de conscientização nas suas decisões
médicas
46.
Definição errada do seu negócio (negócio de cunho
financeiro)
47.
Plano de saúde é uma atividade privada e precisa de
equilíbrio econômico
48.
População esta satisfeita
49.
Insatisfação dos clientes por aumento de mensalidades se
decorre da perda do poder aquisitivo da população
Fonte: Informações retiradas de cada um dos depoimentos registrados
nas Notas Taquigráficas
40.
41.
83
Quadro 8: Descrição das Reclamações por grupo de interesse e por depoente:
(Continuação)
6. Empresas
Das Empresas
1. Presidente da
UNIDAS
2. Presidente da
Federação
Nacional das
Empresas de
seguros Privados
3. Associação
Brasileira de
medicina de Grupo
(ABRAMGE)
4. Diretor
Presidente da
Associação
Brasileira de
Analises Clínicas
de São Paulo
5. Presidente da
Federação das
Cooperativas
Médicas do Rio
Grande do Sul
6. Confederação
Nacional das
UNIMED’s
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
16.
17.
18.
19.
20.
21.
22.
Reclamações
15
28
32
X
33
x
37
41
X
x
46
47
X
X
X
48
49
x
x
Descredenciamento de médicos, hospitais e clínicas.
Reajuste por faixa etária
Falta de clareza nos conceitos urgência e emergência
Exclusão de doenças consideradas pré-existentes
Falta de atendimento
Aumento de mensalidades
Revisão Técnica
Falta de cobertura necessária
Necessidade de mobilidade
Reclamações da ANS
Necessidade de regras de Migração
Rescisão unilateral pelos planos
Imposição pelos planos de limitação no período de
internação
Longos períodos de carência
Fragilidade da legislação
Não há fiscalização na propaganda
Tabelas diferenciadas de reembolso
Hospitais aumentam tabela quando querem
Não fiscalização nos contratos coletivos
Limitação de consultas, exames médicos, laboratoriais ou
Meta Referencial.
Carência em caso de pagamento em atraso
Exigência de cheque caução
X
x
x
23.
24.
25.
26.
27.
28.
29.
30.
31.
32.
33.
34.
35.
36.
37.
38.
39.
40.
Restrições por ser plano antigo (órtese e prótese)
Limitação de internação de doentes mentais
Negativa de exames
Planos não oferecem a opção “Agravo” para os contratos
novos
Problemas nos contratos empresariais
Falta de repasse para os médicos e prestadores de
serviços dos aumentos concedidos às operadoras
Exclusão da Odontologia do Plano de Referência Básico
Precisa ter fontes alternativas (saúde suplementar) para
sobreviver
Colapso financeiro da rede hospitalar
Formação Médica
Controle de novas Tecnologias
Demora na autorização de procedimentos gerais por parte
da operadora
Aumento do número de atores
Falta de financiamento para o sistema público e privado
Necessidade de entendimento pelo usuário da importância
e valo do plano de saúde
Necessidade dos hospitais cuidarem de seus custos
Operadoras precisam reduzir problemas de relação com a
parte de comissionamento
Judiciário precisa ter mais informações sobre o setor
41.
Precisam ser chamadas à responsabilidade as empresas
de material médico/hospitalar
42.
Os órgãos de defesa do consumidor precisam entender
que não se pode criar despesas sem prever receita
43.
Governo Federal precisa definir qual política de saúde
quer
44.
A ANS não tem que ser um órgão de defesa do
consumidor. Precisa é regular o sistema de saúde
suplementar
45.
O médico precisa de conscientização nas suas decisões
médicas
46.
Definição errada do seu negócio (negócio de cunho
financeiro)
47.
Plano de saúde é uma atividade privada e precisa de
equilíbrio econômico
48.
População esta satisfeita
49.
Insatisfação dos clientes por aumento de mensalidades se
decorre da perda do poder aquisitivo da população
Fonte: Informações retiradas de cada um dos depoimentos
registrados nas Notas Taquigráficas
84
Os Estabelecimentos Assistenciais de Saúde (E.A.S.), segundo seus
representantes, enfrentam problemas de relacionamento com as operadoras
pela falta de reajustes, as glosas e os pacotes com preços fechados. Outros
problemas também afetam o setor, como a falta de financiamento para o
sistema público e privado, e a falta de entendimento do setor por parte dos
clientes de planos de saúde, órgãos de defesa do consumidor e Judiciário.
Para os representantes dos EAS o governo federal precisa definir a política de
saúde que quer e a ANS precisa regular o sistema e não se transformar em um
órgão de defesa do consumidor. Finalmente, as operadoras e seguros de
saúde consideram a assistência prestada pelos planos de saúde uma atividade
privada, que como tal necessita de equilíbrio econômico-financeiro.
Assim, para uma apresentação mais sistemática dos posicionamentos
apresentados, os temas debatidos foram agrupados sob seis categorias de
análise, que apresentamos a seguir:
3.1
Política de Saúde
3.1.1 Os limites do SUS e a importância dos Planos de Saúde;
3.1.2 Os custos das empresas de planos de saúde;
3.1.3 A dupla porta de entrada dos hospitais universitários públicos.
3.2
Aspectos Jurídicos e Legais
3.2.1 Fragmentação da Legislação e a migração dos contratos antigos.
3.3
Regulação
3.3.1 Papel da ANS;
3.3.2 Atividade de Fiscalização.
3.4
Financiamento
3.4.1 Tabela Única de Equivalência de Procedimentos (TUNEP) e
Ressarcimento ao SUS;
3.4.2 Financiamento Público e Privado.
3.5
Recursos Humanos
3.6
Ética
85
3.1
Política de Saúde
O debate sobre a política de saúde se concentrou na análise sobre a
gênese dos planos de saúde. A falta de qualidade dos serviços do SUS foi
apontada como principal razão da existência de um mercado privado de planos
de saúde. Segundo parlamentares integrantes da CPI, os responsáveis pelo
malogro da universalização da assistência à saúde foram os sucessivos
governos que não lhe conferiram a devida prioridade.
3.1.1 Os limites do SUS e a importância dos Planos de Saúde
A
crise
das
instituições
públicas
induzidas
pela
redução
do
financiamento praticado pelo INAMPS desde a década de 80 (quando o
pagamento dos serviços não acompanhava as taxas inflacionárias), a
prevalência do sistema privado com forte apelo ideológico e sustentado por
uma política deliberada de desmonte do setor público eram questões vez por
outra lembradas por um pequeno número de parlamentares. Assim, a política
de saúde do país, ainda que trazida à pauta por meio da defesa de interesses
particulares, foi um tema recorrente no decorrer da CPI.
(...) se o SUS atendesse bem não precisava de plano de saúde. Na
verdade, nós temos plano de saúde porque o SUS atende mal. E
lógico que a culpa não é deste Governo. A culpa é histórica. E, na
verdade, por que existem os planos de saúde? Porque, no início dos
anos 90, inviabilizou-se a saúde pública para poder fazer o jogo da
saúde privada. Quer dizer, isso tudo acabou sendo um problema que
desaguou nessa atual situação. Os planos de saúde existem porque
a saúde pública é deficiente.(...) Quer dizer, então, nós estamos na
verdade focando o problema apenas no plano de saúde, e nós temos
duas outras pontas que também têm que ser analisadas e
observadas. A primeira delas é essa que o SUS infelizmente não
atende como deveria atender — tirando a alta complexidade.(...) Eu
acho que não adianta apenas a gente querer colocar os planos de
saúde como os diabos de plantão quando, na verdade, sabemos que
eles existem por culpa da própria política pública de saúde que existe
neste País. Deputado (Arnaldo Faria de Sá) 55
Para outros, apesar do “SUS ser o maior Plano de Saúde do Brasil”, as
ações de governo não conseguiriam suprir o atendimento a todos os usuários e
os planos privados de saúde são essenciais à própria preservação do SUS. Tal
argumento sobre o efeito de desoneração do SUS que os planos privados de
saúde propiciam é esgrimido como realista por um dos representantes de
interesses de prestadores de serviços.
55
Fonte: Audiência 26/06/03.
86
(...) nós, primeiro, temos que cuidar do nosso maior plano que existe
no Brasil e no mundo, que é o Sistema Único de Saúde, que é um
processo, não diria que é uma criança, mas eu acho que é um
adolescente e não chegou na idade adulta ainda. Isso nós temos que
defender com muita força, muita força, e no Orçamento do ano que
vem não deixar, na reforma tributária, o Relator desvincular recursos
da educação e da saúde. E defendê-lo como nunca. Mas o Brasil
não pode deixar de ter planos de saúde, e nós temos que ver
esse limite, esse mercado de 40 milhões de pessoas que estão
nos planos, classe média, média alta, talvez, planos também em
nível de empresa, são fundamentais. Eu já ouvi discurso que eu
considero altamente questionável de que... Aliás, ouvi da Diretora do
IDEC — não é? — que deveria ter só um plano de saúde, o SUS. Isso
significa quebrar o próprio SUS, e não há recursos. A lei ajudou os
planos de saúde, era uma selva. Talvez as medidas provisórias, as
normas podem ter complicado, mas também é um processo a
implantação definitiva da lei e a sua regulamentação. É um processo.
E esta CPI com certeza vai ajudar. Então a lei foi um avanço. Com
absoluta convicção, afirmo que foi um avanço... Para quem não me
conhece, sou Vice-Presidente da Confederação das Santas Casas do
Brasil. E nós estamos melhorando o nosso setor. Como há
dificuldades em todos os setores, têm provedores com dificuldade,
mas há Secretários Municipais que deveriam estar na cadeia. Então
todo cuidado é pouco ao analisar essa questão. Mas as Santas
Casas surgiram antes do Estado propriamente, e o SUS não vive sem
a Santa Casa, e essa é a missão das Santas Casas e nunca vai
deixar de ser. Se nós vivêssemos num país ideal, justo, sem
dificuldades de orçamento, de educação, a Santa Casa, sim,
poderia ser uma Santa Casa sem planos de saúde, mas visão
empresarial sempre: é gestão, é gestão. Isso eu vou repetir quando
Jamil aqui vier. Se uma Santa Casa busca cliente, de uma forma ou
outra, com piano, com carro, com propaganda na televisão, que bom.
Parabéns, provedor que está fazendo isso e administrador
competente que assim está fazendo. A Santa Casa não vive apenas
com o Sistema Único de Saúde, Deputado Arlindo Chinaglia, que eu
respeito tanto, e como aprendo com você. Não vive! E ela precisa ter
gestão empresarial, buscar mercado, ser agressiva no mercado, mas
nunca esquecendo a sua missão. Agora, nessa gestão empresarial,
já que (...) vivemos uma tabela do SUS muito baixa, que não é deste
Governo. Não resume à tabela....... Se a Santa Casa tem a estrutura,
tem know-how, tem história, tem ingerência, tem visão, é ligada à
comunidade, e se é uma estrutura, claro, com complexidade, com alta
complexidade, por que não fazer, por que deixar para a UNIMED, por
que deixar para a iniciativa privada? (Grifos da Autora, Deputado
Darcísio Perondi) 56.
Muitos planos são oferecidos pelas empresas, sob a ótica de melhorar a
assistência de seus funcionários, enquanto os mesmos permanecem em seus
quadros.
Nesse sentido, as afirmações de superioridade da qualidade da
assistência médica suplementar sobre o SUS, evocadas várias vezes na CPI,
são contraditadas pelas denúncias de negação de coberturas específicas.
56
Fonte: Audiência 14/08/03.
87
90% dos pacientes renais crônicos estão sendo atendidos pelo SUS,
apesar de muitos possuírem planos de saúde. E por que isto
acontece? [Ela mesma responde] Porque as operadoras dos planos
não estão oferecendo a cobertura necessária e a Agência Nacional
de Saúde - ANS tem uma atuação incipiente, incapaz de coibir as
práticas abusivas.
(Presidente da Federação das Associações de Pacientes Renais
Crônicos e Transplantados - Neide Regina Barriguelli) 57
Contudo, na opinião do parlamentar Serafim Venzon58, os planos de
saúde têm prestado um grande serviço à sociedade.
Ressalvadas algumas questões, que, muitas vezes, podem até se
repetir ou podem até acontecer nos planos de saúde mais sérios, a
grande maioria tem feito um grande trabalho. No Estado de Santa
Catarina nós temos, por exemplo, a UNIMED, que eu sei que não é
só no Estado de Santa Catarina, mas está em todos os Estados
brasileiros, que tem prestado, sim, um grande serviço à sociedade
pelo tipo de atendimento que é prestado, e que eles têm, com essas
denúncias que recebem, caprichado para corrigir muitas vezes
atitudes ou decisões que poderiam prejudicar a sua imagem num
caso especial. Mas enfatizar aqui que o Brasil, a sociedade, precisa
fiscalizar os planos de saúde, precisa da eficiência e, por causa dessa
eficiência, eles, a esta altura, são imprescindíveis também. Nós não
podemos quebrar essa galinha que coloca ovos de ouro, justamente
porque o SUS não teria como absorver todos os 170 milhões, dos
quais aproximadamente 40 milhões estão sob os auspícios dos
planos de saúde. (Deputado Serafim Venzon). 59
Em função da ausência de encaminhamentos e certamente da
complexidade do tema inerente ao debate sobre limites e vantagens da
segmentação do sistema nacional de saúde, não houve um posicionamento
definitivo dos variados segmentos sobre se é desejável corrigir as distorções do
atual modelo, com o objetivo de torná-lo apto a abrigar parcelas cada vez
maiores da população, e isso significaria a restrição ainda maior da atuação
direta do Estado, ou se a solução é garantir o funcionamento pleno do SUS
introduzindo políticas que tornem os Estabelecimentos Assistenciais de Saúde
parâmetros de referência e que sejam estabelecidos indicadores de qualidade
que avaliem e avalizem a permanência dos serviços privados no mercado.
Efetivamente esse é um ponto crucial no debate e na definição de uma
política de saúde que necessariamente enfrente os problemas decorrentes do
imbricamento entre público e privado.
Um outro ângulo de análise foi explorado pelos parlamentares para
57
Fonte: Audiência 19/07/03.
Parlamentar suplente do PSDB/SC, médico de profissão.
59
Fonte: Audiência 26/08/03
58
88
diagnosticar os problemas de implementação do SUS. O movimento que
propiciou o consenso dos constituintes em 1998, para que houvesse uma
transformação do sistema de saúde em vista da excessiva centralização,
desperdícios de recursos alocados para a saúde e/ou recursos insuficientes em
relação às necessidades para a saúde, dentre outros, parece dar sinais de
esgotamento. Para o relator da CPI, os princípios de organização do SUS e
seus mecanismos de gestão não têm favorecido o sistema público como foi
originalmente proposto.
(...) a municipalização da saúde é a filosofia mais bela que existe.
Infelizmente, o que nós temos assistido é a prefeiturização da saúde,
em que os Prefeitos têm a saúde como uma fonte de renda pessoal.
Eu mesmo já disse na Comissão de Seguridade Social — eu faço
parte da subcomissão de fiscalização da verba do SUS, já estou
trazendo uma série de denúncias do meu Estado, o Maranhão, para
que nós possamos fazer essa fiscalização — que já vi, testemunhei,
Prefeitos que compõem o Fundo Municipal da Saúde com dinheiro da
Prefeitura, que é constitucional e obrigatório, põem de manhã e de
tarde retiram, somente para que haja o arcabouço legal. Então, se
você procura uma ação de saúde em qualquer dos Municípios ela é
negada; as filas são enormes, as dificuldades são grandes. Daí a
existência da saúde suplementar, até porque é um direito do cidadão.
Se eu posso pagar, quero uma coisa diferenciada, eu posso fazer.
(Deputado Ribamar Alves). 60
3.1.2 Os Custos das empresas de planos e seguros de saúde
A política de preços, a falta de transparência nas planilhas de custo e a
margem de lucro tanto dos hospitais quanto das operadoras, bem como as
pressões que empresas de materiais hospitalares e medicamentos exercem
foram temas trazidos ao debate na CPI. Para Ricardo Morishita61, do
Departamento Nacional de Proteção e Defesa do Consumidor, os reajustes dos
planos de saúde de acordo com a faixa etária, autorizados pela ANS sem a
devida análise dos contratos, redundam na aplicação de aumentos com
percentuais elevadíssimos ou definidos unilateralmente pelas operadoras,
imputando ao idoso a maior conta.
Para os representantes do Judiciário e entidades de defesa dos
consumidores a política regulatória dos planos de saúde propicia a expulsão
dos usuários de mais de 50 anos de idade por causa do expressivo aumento
da mensalidade. Além disso, cerca de 60% dos contratos ainda não estão
plenamente regulamentados pela Lei nº 9.656/98. A proposta inicial do
60
61
Fonte: Audiência 26/08/03.
Fonte: Audiência 24/06/03.
89
relatório, que havia ido para votação62, era limitar a 100% o reajuste máximo
entre a primeira e a última faixa etária. Contudo, através de emenda, os
parlamentares suprimiram este artigo. O presidente da CPI imputou este
resultado ao lobby dos planos de saúde:
Venceu o lobby dos planos de saúde. O limite ampliaria a
solidariedade entre o usuário jovem e o mais velho. Os mais idosos
continuarão sendo expulsos dos planos por causa dos preços
63
abusivos, que continuarão sendo praticados.
O autor do destaque que derrubou o limite de 100% proposto no relatório
final, de votação, foi o deputado Darcísio Perondi, dirigente de entidades
ligadas às Santas Casas, sob o argumento de que as operadoras de planos de
saúde já praticam reajustes abaixo da inflação e atravessam dificuldades
financeiras. Segundo ele, a implementação deste índice iria desmontar o
sistema de saúde suplementar.
(...) estamos correndo o perigo de desequilibrar os planos de saúde
das santas casas, e tem gente aqui que não gosta, e tem o perigo de
nós desequilibrarmos os planos da iniciativa privada, que tem lei em
cima dela que ela tem que obedecer, mas não desequilibrar o
negócio. Se reduzir para o idoso — e já foi reduzido de 12 para 6, e
se reduzir mais — e aumentar para o jovem, os pais... Pode ficar o
pai e a mãe ou o pai e a mãe vão pagar para o vovô e para a vovó,
mas não vão pagar para os filhos. Ali estabelece um desequilíbrio. Aí
não precisa ser entendido para entender isso.
(...) Bom senso, caldo de galinha e cautela realmente não fazem mal
a ninguém, e eu aprendi nesta Casa. Muito obrigado.
64
(Deputado Darcísio Perondi).
A partir desse depoimento e do parlamentar José Linhares Ponte,
presidente da Confederação65 das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e
Entidades Filantrópicas e seus Hospitais Confederados, que congrega 1.693
entidades afiliadas, foram levantados alguns dados do setor.
Segundo o DATASUS/MS, no ano de 2003 a rede hospitalar do SUS
contava com 5.864 hospitais, dos quais 28,9% são filantrópicos.
Os leitos dos hospitais filantrópicos representam 33,3% (146.992
unidades) do total dos 441.591 leitos integrantes do SUS, além do que um
terço dos hospitais filantrópicos é de ensino e recebe recursos adicionais do
62
63
64
O quadro de votação do relatório e das emendas supressivas disponíveis nos Quadros 9 e 10 .
Fonte: Entrevista do deputado Henrique Fontana ao jornal “O Globo” de 26 de novembro de 2003.
Fonte: Audiência de 25/11/03.
90
Fator de Incentivo ao Desenvolvimento de Ensino e Pesquisa em Saúde
(FIDEPS). Estes hospitais têm, ainda, recursos do INTEGRASUS, que é um
incentivo
financeiro
destinado
a
integrar
mais
o
setor
ao
SUS.(www.saude.gov.br)
Estudo recente (Pereira, 2004) sobre a participação do setor privado,
que atua de forma “complementar” na prestação de serviços de saúde
mediante contrato ou convênio, ratifica a relevante e importante inserção do
setor privado no SUS.
A autora demonstra que os dois maiores prestadores de serviços ao
SUS são os setores contratados e filantrópicos, tanto na freqüência de
internações quanto no volume de recursos financeiros a estes repassados: “(...)
confrontamos estes dados com a chamada complementaridade que consta da
legislação do SUS. Ao confrontá-los, indica-se algo mais amplo que uma mera
complementaridade do setor na prestação de serviços de saúde no interior do
sistema nacional” (pág 158). Mais adiante questiona:
(...) de que forma a regulação efetiva do SUS poderá, por exemplo,
dar conta de amenizar a cartelização de determinados serviços bem
como a organização do sistema pela oferta e não pela demanda.(pág
192).
A indefinição de uma política de reajuste para o setor privado de saúde
estabelece uma sinergia das reclamações entre prestadores de serviços
(profissionais médicos e hospitais) e operadoras. A imposição da baixa
remuneração nos honorários médicos e a necessidade da prática de “sobrepreço” (realizado pelos hospitais para cobrir os custos de hotelaria) foi
evidenciada pelos representantes destes grupos.
A Associação Médica Brasileira (AMB), no depoimento do Sr. Samir
Bittar
66
, diz que “há uma crise de gravidade sem precedentes no setor de
saúde do país e que a ANS tem responsabilidade tanto com os planos quanto
com o sistema de saúde suplementar como um todo”. E que é “impossível
compreender como um setor que traz a atividade médica como eixo principal
pode permanecer 9 (nove) anos sem reajuste em seus honorários médicos”.
A Federação Nacional dos Médicos, através do Sr. Heder Murari
65
Fonte: Além do parlamentar houve também o depoimento do representante da Confederação das Santas Casas, na
audiência 07/08/03 e portal do DATASUS/MS (http://tabnet.datasus.gov.br)
66
Fonte: Audiência 31/07/03.
91
Borba67, sugere uma investigação de “como tem sido a forma de pagamento
dos planos de saúde aos profissionais de saúde, já que a baixa remuneração
dos profissionais piora a qualidade da assistência, obrigando os médicos a
fazerem um procedimento e descrever outro, para viabilizar o recebimento do
seu trabalho”. De acordo com denúncia da Associação Brasileira de
Laboratórios Clínicos (ALAC), Luiz Roberto Del Porto68, através de seu diretorpresidente, a qualidade dos exames diagnósticos também está comprometida,
já que, com o preço congelado há nove anos, estes laboratórios são obrigados
a alterar sua metodologia, com impacto negativo na qualidade, e na precisão
dos resultados destes exames.
Já para o setor hospitalar a “rede hospitalar privada está atravessando
um período caótico sem precedentes, à beira de um colapso financeiro”.
Segundo o presidente do Sindicato dos Hospitais de São Paulo, Dante Ancona
Montagnana69, as operadoras mantêm posturas unilaterais, predatórias, sem
parceria, visando exclusivamente a lucratividade. Para o diretor-presidente da
Associação Brasileira de Análises Clínicas de São Paulo, Luiz Roberto Del
Porto,70,o principal problema está na falta de repasse dos reajustes concedidos
às operadoras.
Evidencia-se, novamente, que a falta de política de preços e a ausência
de transparência proporcionam práticas nem sempre recomendáveis, como a
declarada pelo relator, deputado Ribamar Alves:
Sou daqueles que defendem o SUS. Na minha cidade, Santa Inês do
Maranhão, por ser proprietário de um hospital privado de pequeno
porte, com 48 leitos, quase fui crucificado........ como é que eu ia
defender o sistema unificado e descentralizado de saúde, se eu era
dono de hospital privado?...No momento em que tiver o protocolo
você vai evitar os abusos de hospitais. O que a Dra. Rosana colocou
aqui, os hospitais não lesam plano de saúde. Eles não lesam. O que
eles fazem é o seguinte: o nosso Presidente colocou a questão da
hotelaria. A diária do plano de saúde hoje, em média, é 60 reais. Há
um hospital em Recife, chamado hospital português, que é um luxo
só. Existem vários hospitais em São Paulo, aqui em Brasília, que têm
uma hotelaria caríssima. No Maranhão existem 2 grandes hospitais
que também têm uma hotelaria caríssima. Com 60 reais, por mais
pobre que seja o hospital, como no meu caso, dificilmente você
consegue dar um bom atendimento ao cliente com 60 reais. O que os
hospitais fazem? Isso os planos sabem disso. O que eles fazem? Se
gastam 10 gazes numa cirurgia, botam 20. Se gastam 3 envelopes de
67
Fonte: Audiência 26/06/03.
Fonte: Audiência 01/09/03.
69
Fonte: Audiência 07/08/03
70
Fonte: Audiência 01/09/03
68
92
fio, botam 10. Se gastam 4 soros, botam 30. Se usa a Cefalosporina
genérica, botam o Claforam, que é de marca e é caro. Mas aí tem
também, eles não estão fazendo isso e não estão sendo reprimidos
não. Tem a auditoria feita pelos planos. Não tem nenhuma operadora
que não faça auditoria, e vêem aquelas famosas glosas, e nas glosas
vão tanto quem age de má-fé, dessa forma, até como uma
compensação, como quem não age também. Foi criado no Maranhão
um plano de saúde que teve o lado bom e o lado ruim. O lado bom foi
que eles uniram os 2 melhores hospitais e o melhor laboratório da
cidade, construíram um plano e esse plano passou a pagar bem a
hotelaria... se houvesse uma melhor remuneração por parte dos
planos de saúde na hotelaria, com certeza iria diminuir muitos custos.
(Deputado Ribamar Alves). 71
A lógica que movimenta a discussão na CPI na realidade evidencia
problemas do dia-a-dia das empresas hospitalares e de planos de saúde,
favorecendo mesmo que indiretamente a centralidade do debate sobre o
sistema privado em detrimento do público. A qualidade da assistência médicohospitalar prestada aos consumidores é pouco questionada e as justificativas
para a necessidade dos aumentos se apresentam nas mais variadas nuances.
De toda a forma a modulação de interesses específicos em torno do
debate evidenciou certas contradições, tais como as inconveniências do
tratamento igual que a legislação confere a modalidades empresariais
diferenciadas.
Para o presidente da Confederação Nacional das Cooperativas
Médicas/UNIMED, Celso Corrêa Barros, a UNIMED, que foi convidada a
prestar esclarecimentos sobre desvio de dinheiro da UNIMED São Paulo, seu
principal diferencial é “sua prática de medicina ética, sem intermediação”.
Muitas pesquisas de opinião foram utilizadas por estes grupos, para
demonstrar que a população estava satisfeita com o serviço prestado e que na
verdade o maior problema do consumidor era a “perda de poder aquisitivo”72.
Nessa oportunidade, o parlamentar Mario Heringer73 tece alguns
comentários sobre as pesquisas de opinião, no caso específico da UNIMED,
dizendo que elas não demonstram satisfação com o sistema e sim com o
atendimento imediato, “porque somos todos donos – estou dizendo somos,
porque também sou um cooperado UNIMED”.
71
Fonte: Audiência 14/08/03.
Fonte: Audiência 25/09/03, Celso Correa, Presidente Nacional da UNIMED.
73
Fonte: Audiência 25/09/03.
72
93
O deputado Rafael Guerra74, fundador, inclusive, de uma das primeiras
UNIMEDs do Brasil, em Belo Horizonte, declara:
(...) me sinto como parte do sistema, como parte do processo. Isso
nos dá também, a todos, o direito de cobrar, de questionar, porque é
o que a gente também... . Eu só queria registrar, quer dizer, a
responsabilidade que eu vejo hoje do Sistema UNIMED, que é, sem
dúvida, o maior sistema de prestação de serviço na área de saúde
suplementar, a responsabilidade, portanto, é muito grande. É um
balizador.
A Audiência75 com o presidente da Confederação Nacional das
Cooperativas Médicas/UNIMED, Celso Corrêa Barros, é um momento ímpar na
CPI. Sugestões eram encaminhadas à mesa para que fossem submetidas a
avaliação e apreciação futuras do presidente da UNIMED. Surgem na
Comissão Parlamentar de Inquérito dúvidas e problemas de toda ordem.
(...) os critérios atuais para liberação de guias têm gerado a todos os
prestadores grandes dificuldades, porque sendo a UNIMED várias
cooperativas (o prestador recebe cliente de uma UNIMED de fora e
não pode cobrar cheque caução, porque a Lei não permite), O
prestador não tem garantias da UNIMED local de que vai receber
aquilo e ele não tem um contrato com a UNIMED singular, e isso é
uma “situação completamente equivocada”. (Deputado Rafael
Guerra)76.
A facilidade em se constituir uma cooperativa singular propicia uma
grande cobertura populacional e de acordo com Bahia (1999:101):
(...) a capacidade de organização e articulação das UNIMED’s com as
entidades médicas e a adoção de alianças com a defesa de um SUS
que se baseie fortemente na livre escolha de médicos autônomos
parecem variáveis relevantes quando se observa a existência e a
magnitude de sua clientela em cidades de grande e médio porte que
concentram recursos assistenciais e segmentos populacionais com
altas faixas de renda como em municípios do interior e na própria
capital de São Paulo.
Atualmente a UNIMED responde por 25% do mercado de saúde
suplementar. (www.unimed.com.br)
Para um dos representantes das empresas de seguro saúde, a
“classificação de sua atividade estava errada, na medida em que seu trabalho é
com a garantia de risco, ao contrário dos planos de saúde que prestam
74
75
Fonte: Audiência 25/09/03.
Fonte: Audiência 25/09/03.
94
serviços pré-pagos”. Assim, a necessidade dos reajustes devia-se ao fato de
que a “saúde financeira estava em risco e seus reajustes engessados pelo
governo”.
As seguradoras não podem ter um hospital próprio, não podem
empregar um médico para prestar assistência à saúde e, na verdade,
nem querem fazer isso. Esse não é o nosso negócio. O nosso
negócio é ter um cunho financeiro seguido e regido por princípios
atuais, princípios técnicos de reembolso ou de administração de rede
referenciada. Na verdade, o negócio hospitalar, o negócio clínica
deixamos para quem sabe fazer, quem faz melhor do que nós.
(Diretor de Saúde da FENASEG – Sr. João Alceu). 77
O representante das empresas de medicina de grupo pondera sobre a
necessidade de compreensão da assistência dos planos de saúde como uma
atividade privada e como tal requer equilíbrio econômico, portanto pouco
sensível às necessidades de redistribuição de renda.
A atividade privada depende essencialmente disso, e a atividade
privada, infelizmente, ela não pode promover uma igualdade social,
mesmo porque o plano de saúde só serve a uma população que
realmente pode pagar, de uma maneira ou de outra.
(Presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo/ABRAMGE –
78
Arlindo de Almeida).
O contraste entre poder da propriedade e poder impessoal do dinheiro
faz lembrar um provérbio francês que diz “não há terra sem senhor” e “dinheiro
não tem senhor”. Como a forma desenvolvida de circulação de mercadorias,
constituem as condições de origem do capital, lembramos Marx quando diz:
A circulação simples da mercadoria – vender para comprar – serve de
meio a um fim situado fora da circulação, a apropriação de valoresde- uso, a satisfação de necessidades. A circulação de dinheiro como
capital, ao contrário, tem sua finalidade em si mesma, pois a
expansão do valor só existe nesse movimento continuamente
renovado. Por isso o movimento do capital não tem limites. (Marx, p.
183).
76
Fonte: Audiência 25/09/03
Fonte: Audiência 11/09/03.
78
Fonte: Audiência 01/09/03.
77
95
A afirmação de que a atividade dos planos e seguros de saúde é um
negócio e como tal deve ser tratada também é compartilhada por alguns
parlamentares.
A assistência privada à saúde é um negócio. Hoje eu ouvi aqui uma
argumentação em determinado momento de que saúde não é
mercadoria; no caso, é mercadoria, sim. Não adianta dizer que não é
mercadoria; é mercadoria, sim. (Deputado Saraiva Felipe). 79
O presidente da União Nacional das Instituições de Autogestão em
Saúde (UNIDAS), José Antonio Diniz, explica que há uma recessão econômica
e uma dificuldade de os atores estarem se organizando e podendo receber
aquilo que acham que é justo. Para ele, as indústrias de tecnologia,
equipamentos médicos e de medicamentos é que efetivamente auferem os
lucros. Defendendo um maior empenho do Executivo, na qualidade da
formação médica e no controle de novas tecnologias, explicita a preocupação
com o uso irracional das mesmas, já que administrar planos de saúde, mesmo
sem finalidade lucrativa, como é a autogestão, necessita de rigor e controle
para que possa ser garantido o interesse de sua coletividade. Seu depoimento
também aponta para a necessidade do setor investir em serviços próprios.
Empolgados com as declarações, membros da CPI, como os deputados Max
Rosenmann e Robson Tuma, convidam o presidente da UNIDAS a colaborar
na elaboração de um plano básico em saúde. Sua explanação pode ser
resumida no seguinte depoimento:
(...) eu trago com o corolário do Dr. Justin Allen, do Colégio Real de
Médicos Generalistas do Reino Unido, que diz o seguinte: “Nenhum
país, rico ou pobre, pode se dar ao luxo de manter no sistema de
acesso livre a serviço de saúde”, que é o sistema que temos no Brasil
hoje no setor suplementar. Qual seria a conclusão para isso? A
solução para isso seria nós mudarmos o modelo assistencial. Não
tenho tempo de falar muito sobre isso. Não quero ser indelicado,
como disse de início, mas teríamos de instituir um sistema que, na
verdade, é um sistema que o SUS tenta implantar, de porta de
entrada, que hierarquize os acessos; que invista em serviços
próprios; que invista em atenção primária à saúde, através de médico
de família e médico generalista; que tenha uma rede referenciada de
especialistas para onde os casos mais complexos seriam
encaminhados; que atue fortemente em programas de prevenção e
promoção. (Presidente da UNIDAS, José Antonio Diniz)80.
79
80
Fonte: Audiência 11/09/03.
Fonte: Audiência 11/09/03.
96
O registro de início das atividades das empresas de autogestão
concentra-se na primeira metade da década de 90. Em relação à última
pesquisa realizada no setor, o número de empresas participantes aumentou em
46,5%. Dentre as entidades filiadas, encontram-se instituições públicas de
saúde como a FUNASA/MS, a Fundação de Seguridade Social (GEAP), e
outras.
3.1.3 A dupla porta de entrada dos hospitais universitários públicos
A possibilidade de captação de recursos através do atendimento nos
hospitais universitários, para quem tem plano de saúde, e que pode vir a criar a
discriminatória e excludente "dupla porta de entrada", mereceu atenção da CPI.
Essa prática assegura que a estrutura de equipamentos e de recursos
humanos do setor público venha a se tornar disponível de forma diferenciada
entre pacientes do SUS e aqueles que tenham planos de saúde, já que estes
trarão ganhos extras tanto para a unidade quanto para os profissionais.
Segundo a avaliação da Associação Brasileira de Hospitais Públicos e
Universitários, ABRAHUE(www.abrahue.org.br), a dupla porta de entrada - que
é o atendimento de pacientes de planos e seguros de saúde -
já está
implantada nos principais hospitais públicos universitários. Na matéria da Folha
de São Paulo de 22/07/03, o Instituto Nacional do Coração (INCOR) informa
que a porta de convênios responde por 51% do faturamento e 22% da
assistência (internações e consultas). Para os dirigentes dos hospitais, a
entrada de capital privado é a solução disponível para cobrir parte do déficit do
SUS e complementar o salário dos profissionais.
Lembrando a cirurgia bariátrica que o fez perder 70 quilos, o deputado
Roberto Jefferson relata que isso só foi possível graças ao Hospital
Universitário. E diz:
(...) no Rio de Janeiro há a Associação de Obesidade Mórbida —
AMOMB. Até o passado, operavam 1 da lista, por ano, no hospital
público, que era o Andaraí, porque o kit de grampo e o anel redutor
custam 2 mil e 800 reais, e o hospital público não tem para dar.
Sabem o que eu fiz? Associei-me à AMOMB. Estou dizendo isso
porque acho que essa porta é ideológica, mas não é boa na prática.
Acertei procedimento com a Universidade Federal, como o Hospital
do Fundão, e consegui, com empresas privadas, financiar o
ambulatório de obesos, os quartos, os banheiros de obesos — que
têm de ser de estruturas especiais, para não quebrarem —, macas,
camas, equipamentos de ventilação, mesa cirúrgica. Conseguimos
97
fazer esse esforço, no Hospital de Andaraí. O SUS só credencia o
hospital que opera depois de 40 cirurgias. No Hospital do Fundão, as
cirurgias estão sendo feitas por meio da AMOMB. Como é de uma
universidade federal, não pode receber doações, mas a AMOMB doa.
Recebemos as próteses e as pessoas são operadas. O hospital
público não conseguiu atender, no Rio, mas o Hospital Federal do
Fundão vem atendendo uma média de 2 cirurgias por semana, Sr.
Presidente. Então, não vejo com esse prurido ideológico, com esse
preconceito: é portador, não é portador. Precisa. O hospital público
vem sendo ressarcido por alguns pacientes ligados a planos de
saúde. Não vejo problema nisso. Estou vendo aqui que a coisa está
de novo ideologizada, como já o foi, no passado. O Brasil vive crise
monstruosa. Até para dar pão estamos buscando recursos para o
Fome Zero. E o hospital público não pode receber recursos de
instituições privadas de medicina pré-paga? Por que não? ...Sr.
Presidente, esta CPI tem uma coisa muito positiva: está sendo
moderada. Começou um pouco encandecida, com o debate
ideológico muito forte. Eu estive aqui nas reuniões do começo da
nossa Comissão Parlamentar de Inquérito. Mas ela acordou, porque
ela viu que a crise que estava desaguando aqui dentro não era o
conflito do usuário do sistema. No PROCON, no Ministério Público há
1%, 0,8% de reclamações em relação ao atendimento. E contra a
medicina pré-paga ou a medicina de grupo não há nenhuma
reclamação de usuário. Qual o conflito aqui? O dono do hospital, o
médico e o plano de saúde. Nós estamos aqui no meio de um conflito
de interesse do médico, de interesse do hospital, de interesse do
laboratório e da medicina de grupo. E esta CPI só não foi mais dura
porque percebeu que se apertar quebra o plano de saúde. O exMinistro da Saúde fez um pouco de política com os preços da
medicina pré-paga. Congelou por 4 anos. A Agência Nacional de
Saúde foi muito criticada aqui porque não cobrava o atendimento no
hospital público da medicina pré-paga, daquele que tivesse plano de
saúde. “Conivente! A Agência é conivente!” Um negocinho deste
tamaninho! A Agência Nacional de Saúde, na minha opinião, errou
gravemente quando se regozijou de ter congelado os preços, dizendo
que a inflação subiu, que a inflação médica foi altíssima, que os
combustíveis subiram, que a energia subiu, mas não subiu o preço da
medicina pré-paga, o que gerou esse conflito que vimos desaguar
aqui. A briga do médico aqui não é porque ele é bonzinho, porque é o
melhor do mundo. Não. É porque ele está ganhando mal. Ele quer
ganhar mais e tem direito. O hospital também. E nós estamos no
meio desse conflito. O que nos motiva aqui não é o conflito do
usuário. Só 1% a reclamação. Estamos num conflito econômico,
contratual. Mas não podemos transformá-lo num conflito ideológico. O
SUS não agüenta de volta a classe média que está na medicina prépaga. E, Presidente, eu ouvi ontem até discursos exacerbados,
dizendo que as multinacionais querem esse mercado. Conversa! Elas
foram embora. A Aetna, que era associada à Sul América, foi embora,
foi embora. A Prudential foi embora. Estava aqui associada com o
BRADESCO; foi embora. A Cigna foi embora. Essa Mapfre,
espanhola, que está no Brasil, está apenas no seguro. Não veio para
o seguro-saúde, não. Ficou só no seguro de roubo de carro, de
residência. Não quer saber de saúde, não, porque é ferro. Sabe que
não tem como se sustentar, com os preços que estão sendo
praticados. (Deputado Roberto Jefferson)81.
81
Fonte: Audiência 19/11/03.
98
Em entrevista à Folha de São Paulo de 22/07/02, o atual presidente
Amâncio Paulino de Carvalho, diretor-geral do Hospital Clementino Fraga Filho,
da Universidade Federal do Rio de Janeiro e presidente da ABRAHUE, com
mandato para o período 2003/2005, explica porque é a favor da dupla porta de
entrada:
Por que consideramos que é justo? Um percentual significativo da
população já é coberto pelos planos de origem não-pública. É uma
tendência generalizada dentro do objetivo de atendimento amplo. Cria
condições para investir mais.
Contrário a essa posição estava o deputado José Pinotti. Para ele, a
falta de recursos não justifica o atendimento melhor ao setor privado e não
pode servir de argumento para ferir princípios constitucionais de igualdade. E
afirma “é insustentável que um hospital público com patrimônio público e
servidores públicos preste serviço primeiro para quem paga, sem qualquer
base legal. Isso pode representar o fim da concepção original do SUS, de
universalidade e eqüidade”82.
As razões para a preservação da privatização da saúde pública se
apresentam na audiência de votação final do relatório. O deputado Rafael
Guerra, por exemplo, acha que o termo dupla porta é pejorativo e justifica:
(...) o Deputado Walter Feldman já fez a defesa do destaque, nós
assinamos juntos. Eu só queria me manifestar no sentido de que o
termo dupla porta, considero um termo pejorativo, e eu não aceito
que eu seja acusado de ser defensor da dupla porta. Eu sou defensor
da ética no atendimento, da eqüidade. Só que, dentro do que nós já
aprovamos anteriormente, eu não acho que devemos discutir isso em
regime de urgência. Eu tenho opiniões a esse respeito que eu
defendo há 3, 4 anos. Então, não precisa ser agora em 30 dias que
precisa tomar uma decisão. Só isso que eu queria registrar, quer
dizer, não posso aceitar que seja isso. Defendo a eqüidade, defendo
a igualdade, não concordo com o termo dupla porta porque ele é
pejorativo e só estou pedindo prazo para discutir.
(Deputado Rafael Guerra, grifo da autora)83.
Os interesses envolvidos com a manutenção da dupla porta nos
hospitais universitários públicos foram explicitamente monitorados durante a
votação do relatório.
82
83
Fonte: Audiência 25/11/03.
Fonte: Audiência 25/11/03.
99
Pela ordem, Sr. Presidente, uma questão de procedimentos. Sr.
Presidente, essa questão específica dos hospitais universitários foi
levantada por mim. Fui a primeira a discutir a matéria. Acabei de falar
com o Diretor do Hospital Clementino Fraga. São 15 hospitais, os
maiores hospitais federais universitários, que têm pelo menos 10% do
seu volume de recursos proveniente do que vocês chamam segunda
porta, enfim, dos convênios. E li para o diretor o texto que foi sugerido
pelo nobre Deputado Ribamar nesta última fase. Se cada vez a gente
for alterando, alterando, alterando, sem acordo geral, fica impossível.
A gente vai ter o quarto, o quinto, o sexto, o sétimo, o oitavo, o
décimo relatório (Deputada Laura Carneiro)84.
Todavia, a despeito de argumentos constitucionais, na audiência final de
votação do relatório, o relator, deputado Ribamar Alves, não acolhe a
modificação que proibia aos hospitais universitários e públicos que fizessem
credenciamento com as operadoras de plano de saúde.
A Constituição Federal reafirma a necessidade de fortalecer o caráter
público das ações e serviços de saúde como responsabilidade do Estado no
provimento da saúde do povo. Várias Conferências Nacionais de Saúde como
a XI, por exemplo, também reafirmam a posição dos participantes contra a
privatização do setor público, bem como reiteram que os princípios da
humanização e da eqüidade constituem objetivos para a consolidação do SUS.
Contudo, esses depoimentos sugerem que nem tudo que está previsto
na Constituição de fato está sendo cumprido.
Cal (2003:33), citando Eros Roberto Grau, lembra que, para determinar
se um serviço prestado pelo Estado constitui ou não um serviço público,
cumpre verificar se a atribuição constitucional do exercício de determinada
competência do Estado atende à imposição dos interesses do capital, ou se,
pelo contrário, outras razões determinam a atribuição desse exercício pelo
Estado”.
Ademais, a não proibição do atendimento de “clientes de convênio” traz
também em seu bojo um outro fator: o de contemplar uma antiga reivindicação
de parte da corporação médica que não aceita o assalariamento, já que essa
nova fonte viabiliza o pagamento adicional para quem atende a essa clientela.
84
Fonte: Audiência 25/11/03.
100
3.2 Aspectos Jurídicos e Legais
3.2.1 Fragmentação da legislação e migração dos contratos antigos
Segundo os representantes do Judiciário, a segmentação que a Lei nº
9.656/98 admite e as constantes alterações que sofre (através de uma série de
resoluções e regulamentações) acabam dificultando a compreensão da
matéria. Conseqüentemente, inseguranças no marco regulatório vêm se
apresentando, trazendo dificuldades tanto para os clientes de planos de saúde
quanto para o próprio Poder Judiciário.
Nós temos 40 MP’s. Vocês conseguem imaginar o trabalho do
Ministério Público e dos advogados para saber naquele mês qual era
a MP que estava valendo, para saber se vai incidir um benefício ou
não? Vocês não têm idéia do que é. É uma loucura. É preciso
novamente pegar a lei, baixá-la inteira. É resolução, é portaria, é não
sei o quê. Ninguém se acha. (Conselheira da Ordem dos Advogados
do Brasil/S.P., Rosana Chiavassa). 85
A fragilidade na legislação para a maioria dos representantes do
Judiciário e a necessidade de regras para a migração dos planos antigos para
a nova regulamentação são os maiores problemas que os clientes de planos de
saúde enfrentam.
Eu faço parte... a minha Santa Casa tem um pequeno plano de
saúde, é um plano que tem 3.800 vidas, e nós fizemos esse plano ao
tempo do plano que nós chamamos de plano velho, em que o aporte
financeiro dos usuários era muito pequeno. .... uma das grandes
ajudas que o Ministério poderia nos trazer seria como processar essa
migração, porque essa migração é que torna realmente... ou que faz
o nó górdio dos planos de saúde..... a lei contempla o problema das
exclusões, sobretudo que o ônus fica ao dono do plano, que o
prestador do plano que vai realmente dizer quem pode e quem não
pode entrar, a ele fica o ônus. No entanto, esse ônus tem de ser
bastante bem regulamentado. Nós já tivemos pessoas que
ingressaram num plano no 7º mês de gravidez. Aí, logo depois tem o
filho e, logo depois, deixa de pagar. Então, nós temos de ter também
posturas que coíbam esses abusos, porque isso é também. Se nós
estamos defendendo o usuário, tem usuário que abusa também.
(Deputado José Linhares). 86
Ainda que a ANS tenha uma certa independência nessa função
normativa, a edição de dezenas de resoluções sem mecanismo de controle
social também agrega dificuldades a esse debate. A permissão para a atuação
da iniciativa privada no setor saúde, prevista na Constituição, não a exime de
85
Fonte: Audiência 14/08/03.
101
controle social e do cumprimento das legislações, normas e regulamentos dos
órgãos governamentais. Quanto maior o controle, maior a probabilidade de que
abusos não sejam cometidos contra a população.
De acordo com informações na página da ANS, aproximadamente 62%
dos contratos com operadoras de planos de saúde foram firmados antes da Lei
nº 9.656/98. Estes contratos apresentam restrições, como a limitação do
período de internação (inclusive em UTI) e do número de exames; não
cobertura de procedimentos relacionados a doenças crônicas e infectocontagiosas e não-cobertura de próteses e órteses.
Com a CPI ainda em curso, foram suspensos os dispositivos da Lei n º
9.656/98, que garantiam aos consumidores de planos de saúde antigos
direitos, como a internação sem limite e a proibição de reajuste de mensalidade
dos associados com mais de 60 anos de idade, sem prévia autorização da
ANS. A decisão unânime dos ministros do Superior Tribunal Federal foi
decorrente da ação proposta pela Confederação Nacional de Saúde –
Hospitais,
Estabelecimentos
e
Serviços
(CNS),
que
questionava
a
constitucionalidade de vários dispositivos da Lei nº 9.656/98. O julgamento
dessa liminar estava suspenso desde outubro de 1999 pelo pedido de vista do
ministro Nelson Jobim, que, em 21 de agosto de 2003, a reapresentou aos
colegas.
Assim, o Supremo Tribunal Federal concede liminar declarando que os
contratos de planos de saúde celebrados antes da edição da Lei n. º 9.656/98
não podem ser atingidos pela regulamentação. Por essa decisão, os contratos
antigos são considerados atos jurídicos perfeitos e não podem ser equiparados
aos contratos novos, como prevê a Lei dos Planos de Saúde, o que torna este
problema quase insolúvel.
Antes de 1999, várias condutas consideradas abusivas (como a rescisão
unilateral de contrato, a limitação dos dias de internação e a imposição de
reajustes abusivos) já eram rechaçadas pela Justiça, com base no Código de
Defesa do Consumidor.
86
Fonte: Audiência 26/08/03.
102
Para o procurador da República Durcivan Von Marsen
87
, o Código de
Defesa do Consumidor ajudou a melhorar a vida tanto dos consumidores
quanto dos produtores, que passam a ter mais responsabilidade, organizando a
prestação de serviço de acordo com as disposições do código. Contudo, o
código não resolveu todos os problemas dos consumidores de planos de
saúde, sendo necessária uma integração entre os órgãos de defesa do
consumidor, Ministério Público, Procon’s, parlamentares e sociedade.
A conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil, Rosana Chiavassa88,
lembra que de 1993 a 1998, quando surgiu a Lei nº 9.656/98, o Judiciário
paulista estava julgando 80% de todas as ações de forma favorável ao
consumidor. Para ela, o Código de Defesa do Consumidor resolvia a questão
com muita amplitude e agora nos contratos não revisados, mesmo depois da
Lei, os problemas permanecem. Entre os principais problemas, destaca:
1. Exclusão de cobertura de doenças crônicas e
preexistentes;
2. Limitação de internação em leitos hospitalares ou
em
UTIs,
descredenciamento
de
hospitais
e
laboratórios;
3. Limitação ou restrição a procedimentos médicos,
consultas,
exames
laboratoriais
e
internações
hospitalares;
4. Prazo de carência em caso de pagamento em
atraso;
5. Rescisão unilateral do contrato;
6. Exigência de cheque caução ou nota promissória;
7. Alta complexidade – tudo que é novo na medicina
vem sendo taxado de alta complexidade. É preciso
definir o que é alta complexidade;
8. Vigência da Lei – quando interessa, as empresas
aplicam a nova Lei aos contratos antigos. Por
exemplo, rescisão contratual após 60 dias de falta
de pagamento, mas quando não interessa o
87
88
Fonte: Audiência 14/08/03.
Fonte: Audiência 14/08/03.
103
contrato válido é o antigo;
9. Adaptação – as empresas estão forçando a
adaptação e muitos consumidores estão aceitando
sem saber exatamente do que estão abrindo mão;
10. A falta de estrutura de todas as empresas para
acompanhar
a
legislação
favorece
alguns
monopólios;
11. Propaganda – não há fiscalização;
12. Reembolso – cada plano que dá direito a
reembolso fala de uma determinada tabela que
nunca é mostrada. “A questão do reembolso nos
contratos tinha de ser padronizada, mas não a
tabela “x” ou “y”, porque cada empresa cria uma
tabela que é ininteligível e ninguém tem acesso aos
coeficientes”;
13. Médicos – fazem discriminação entre o consumidor
credenciado e o consumidor não credenciado. “É
particular ou é convênio?” “É convênio.” “Ah! Daqui
a 3 meses.” Aí você responde: “Está bem,
obrigada”, e liga de novo: “É particular.” “A senhora
pode vir amanhã?” ;
14. Hospitais credenciados – aumentam o quanto eles
querem e como eles querem, porque sabem que as
empresas precisam deles. As empresas sofrem um
aumento dos hospitais, que não pode ser repassado
para o consumidor, porque a ANS não permite, e
não há esse tipo de fiscalização. “Não sei se vocês
sabem, mas hospitais chegam a cobrar 10 vezes o
preço do remédio da farmácia”;
15. Redirecionamento de hospitais – elas mandam os
pacientes para os hospitais próprios deles;
16. Contratos coletivos – não há uma regulamentação
para os contratos coletivos; aqueles que vêm por
conta de uma associação, sindicato são muitas
104
vezes confundidos com os contratos empresariais;
17. Descredenciamento – a Lei fala que se pode
descredenciar, desde que credenciem um hospital
nas mesmas condições. A Lei não define o que são
iguais condições.
O juiz do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Luiz Antonio Rizatto
Nunes89, e especialista em direito constitucional, lembra que segundo a
“Constituição Federal, no Art. 175, parágrafo único, aquele que tem poder
econômico, tem dinheiro, ou que possa obter capital no mercado e queira
explorar alguma atividade econômica, por exemplo, montando uma padaria, ou
uma loja para vender lingerie, ou um plano privado de assistência à saúde,
pode fazê-lo, mas o faz por conta e risco da sua decisão. Ele faz porque quer
e, ao fazê-lo, assume o risco da atividade”. Segundo seu entendimento, a
relação em si é de risco, e que quando falamos de relação jurídica de
consumo, estamos sempre levando em consideração que aquele que quer
empreender, não importa qual seja a atividade, assume o risco do seu negócio.
Portanto quando um consumidor resolve adquirir um plano de saúde, a
empresa assume o risco, e uma vez assumido, não é possível na
administração destes contratos criar-se algum tipo de cláusula que limite o uso
pelo consumidor, exatamente porque o risco é do empreendedor. E diz:
A natureza da relação em si é de risco, e uma vez sendo de risco a
legislação tem e pode controlá-la muito fortemente como faz com a
defesa do consumidor e como faz muito bem a Lei n. º 9.656, de
1998. É preciso que entendamos isso sob pena de não compreender
por que se discute ainda se a administradora pode tirar no serviço,
limitar o serviço, limitar o número de consultas como se a doença
escolhesse quantas vezes ela quer ser levada para o atendimento.
(Juiz do 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Luiz Antonio
Rizatto Nunes).
Concordando com a necessidade de ajuste na legislação, já que existem
vários problemas, o deputado Mário Heringer90 sugere:
(...) a primeira vertente seria a vertente de consertar essa lei, a 9.656,
que está cheia de buracos. Ela cuidou de 2 pernas de um banquinho
e esqueceu uma terceira, que o prestador foi relegado a segundo
plano ou a plano nenhum durante muito tempo. E, nesse contexto, a
gente acha que tem de acabar com esse descredenciamento
indiscriminado, tem de universalizar os formulários; os formulários
89
90
Fonte: Audiência 01/09/03, pág 07.
Fonte: Audiência de 26/08/03.
105
têm de ser iguais para todo mundo, até porque geraria informação e
geraria uma análise epidemiológica do sistema suplementar que nós
não temos na nossa saúde privada, e outras medidas dentro delas
que a gente sugeriria com mais tempo.
Para outros representantes do Judiciário, como o ministro do Superior
Tribunal de Justiça, Luís Fux, a Lei dos Planos de Saúde significou um avanço
na relação entre empresas e consumidor, apesar de acreditar que precise ser
ajustada, de forma a evitar o grande número de liminares que atualmente são
concedidas.
O presidente do Conselho Federal de Medicina, Edson de Oliveira
Andrade91, compartilha essa opinião, mas acredita que ela deva ser
aperfeiçoada:
Essa lei é excelente sob inúmeros aspectos. Ela foi um avanço social
que esta Casa deu à população brasileira de uma maneira exemplar,
mas ela precisa ser melhorada, porque, na medida em que não existe
a proteção... a garantia da relação entre operadora, médico e
prestadores... operadores e prestadores, o cidadão, com certeza, é
prejudicado. (Presidente do Conselho Federal de Medicina, Sr. Edson
de Oliveira Andrade).
3.3
Regulação
Ainda que esta dimensão e a anterior se entrelacem a todo o momento,
a análise procura respeitar estes limites.
3.3.1 Papel da ANS
Como visto anteriormente, a Constituição - ao estabelecer a criação do
Sistema Único de Saúde (universal, integral, e gratuito) - também definiu os
princípios da atuação privada no setor de saúde, permitindo sua operação
desde que sob a regulação do Estado. Para regular este setor, um conjunto de
regras pretendia dar segurança ao consumidor, garantindo, inclusive, que as
empresas que operam o setor teriam que demonstrar condições efetivas de
cumprir os contratos. Com a aprovação do Plano de Referência, fica proibida a
comercialização de qualquer plano de saúde com coberturas assistenciais e
garantias de acesso menores que as do plano de referência; a seleção de risco
pela
operadora
discriminando
consumidores
portadores
de
doenças
preexistentes; e o rompimento unilateral de contrato com clientes de planos de
91
Fonte: Audiência 26/06/03.
106
saúde de planos individuais.
Assim, as bases do modelo de regulação passam a ser não só da
atividade econômica, mas também da atividade assistencial. É criada a ANS,
em seu artigo 1o de criação e competência é dito:
É criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, autarquia
sob o regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede e
foro na cidade do Rio de Janeiro - RJ, prazo de duração
indeterminado e atuação em todo o território nacional, como órgão
de regulação, normatização, controle e fiscalização das
atividades que garantam a assistência suplementar à
saúde.(www.ans.gov.br), (grifo meu).
Além das principais características das agências reguladoras: i) Poder
regulador definido em Lei (caracterizando sua capacidade de regular, controlar,
fiscalizar e punir); ii) Autonomia administrativa (caracterizado pelo mandato de
seus dirigentes e na flexibilidade dos seus instrumentos de gestão); e iii)
Autonomia financeira, materializada na arrecadação direta de taxas específicas
(Boyer, 1990), são incorporadas à ANS novas atribuições, como a de monitorar
a evolução de preços de planos de saúde, prestadores de serviços, insumos,
autorizar os processo de cisão, fusão, incorporação, alteração ou transferência
do controle acionário e a articulação com os órgãos de defesa do consumidor.
Tema recorrente em quase todos os depoimentos foi o relacionado com
o papel da ANS no que diz respeito principalmente à regulamentação:
As agências foram criadas tirando poder do Executivo e tendo uma
autonomia que nós estamos observando que é uma autonomia
prejudicial ao estudo, planejamento e execução de políticas públicas.
No setor elétrico, deu apagão; agora, é colírio que cega; é a ANS com
os planos de saúde e não consegue resolver. ...Acho que as agências
foram uma cópia internacional feita pelo Governo passado,
construindo um arcabouço, para que o Governo que entrasse não
pudesse mudar os rumos de administração do País. (Deputado Jamil
Murad). 92
Os limites da função reguladora também foram questionados. É atribuído
à ANS poder de ditar normas e resoluções com força de Lei, e muitas delas
contrárias à própria Lei 9656/98 e ao Código de Defesa do Consumidor
trazendo graves prejuízos aos clientes de planos de saúde. Exemplo disso é
quando definiu a restrição de coberturas e procedimentos de alta complexidade
(RDC/ANS - 68).
Este procedimento, com mudanças contínuas na legislação, além de
107
trazer problemas para o Judiciário, favorece a formação de monopólios, na
medida em que pequenas empresas não possuem estrutura para acompanhar
essas diversas mudanças, além de abrir espaços para que as empresas
apliquem a Lei de acordo com seus interesses e acabem penalizando o cliente
de plano de saúde.
A ANS funciona para proteger o consumidor, o paciente, o usuário do
plano ou é um anteparo para proteger os interesses dos planos?.
(Deputado Jamil Murad). 93
3.3.2 Atividade de Fiscalização
A deficiência e timidez da atuação da ANS em seu papel fiscalizador
foram trazidas à tona por diversas vezes e por vários segmentos. As
reclamações variavam desde a omissão da ANS em planos coletivos, até
ignorar os pedidos de revisão das resoluções que colocavam em risco a saúde
e a vida dos clientes de planos de saúde. Muitas foram as reclamações de que
as ações de fiscalização da ANS são insuficientes e não têm conseguido coibir
as práticas abusivas e ilegais das operadoras.
Essas agências foram aprovadas como instituições da modernidade.
Quando eu me debrucei sobre as queixas e a atuação da ANS, eu vi
que se reservou um grande poder para um número pequeno de
pessoas nomeadas e que o mandato é fixo e que no caso da ANS
funciona mais para proteger as irregularidades das operadoras de
planos de saúde do que para proteger a sociedade, como seria a sua
função. (Deputado Jamil Murad). 94
É de competência da ANS fiscalizar os abusos cometidos pelas
operadoras, quando estas limitam a cobertura, os períodos de internações ou
as consultas e exames. Diversos segmentos denunciaram a prática de “Meta
Referencial”. Essa prática significa a criação de mecanismos de incentivo
econômico para que médicos diminuam os pedidos de exames, ou seja, a meta
referencial pode ser para bonificação ou para punição. As operadoras criam a
partir de diversos argumentos. Uma das formas é quando os consumidores
muitas vezes pagam por um contrato e no meio do tratamento, o médico, o
laboratório ou o hospital que não obedecem aos limites impostos é
descredenciado pelo plano.
Essa lacuna existe na Lei, que fala que pode
haver descredenciamento desde que seja substituído por outro em iguais
92
Fonte: Audiência 09/07/03.
Fonte: Audiência 01/07/03.
94
Fonte: Audiência 26/06/03.
93
108
condições, mas não define o que “são iguais condições”.
...sobre a questão da meta referencial do descredenciamento
imotivado, temos inúmeras ações, processos éticos contra diretores
técnicos das operadoras que agiram de maneira irregular e antiética,
apenas com cunho econômico e de descredenciamento pessoal.
(Presidente do Conselho Federal de Medicina, Edson de Oliveira
Andrade). 95
Apesar de haver a Resolução Nº 44 da ANS - que impede a exigência
de cheque caução por parte dos hospitais antes de atender o paciente
conveniado - este tema foi abordado na CPI. Como a resolução não está
sendo capaz de coibir os abusos cometidos contra os consumidores, que
continuam passando por constrangimentos a CPI introduz, através de Projeto
de Lei, o Art. 11A, que proíbe a exigência de depósito de caução ou outras
modalidades de garantia.
Contudo, não se pode passar ao largo das considerações de que o
quadro de fragmentação de interesses produz distorções sobre a concepção do
funcionamento das agências como pode ser observado na fala do deputado
Rafael Guerra, ao sugerir a delegação da atividade de regulação para a
UNIMED.
A UNIMED tem toda a condição de ser balizadora de todo esse
sistema, muito mais até do que a saúde suplementar, do que a
Agência Nacional de Saúde, que não tem balizado coisa nenhuma...
No meu modo de entender, tem criado muitos problemas à saúde
suplementar. E a UNIMED, sem cobrar taxa de 2 reais, que a Agência
Nacional de Saúde cobra.... sobre carga tributária......um assunto com
que a Frente Parlamentar de Saúde vai ter que se envolver — e já
está se envolvendo. Quer dizer, não há como eu, médico em Belo
Horizonte, pagar o meu ISS, e a cooperativa ter de pagar de novo
esse meu ISS. Isso é absolutamente absurdo e inexplicável.
(Deputado Rafael Guerra) 96.
A publicidade também não escapou das críticas. Como a publicidade se
aproveita da fragilidade do consumidor e não explicita os termos do contrato,
há o risco de o consumidor adquirir um plano que pensa ser completo, mas que
oferece uma série de restrições. Os anúncios basicamente destacam as
vantagens, como o preço baixo, mas não divulgam as limitações previstas pelo
contrato, omitindo informações importantes. Apesar de causar uma ação lesiva
ao consumidor, pelo que foi observado na CPI, a ANS pouco intervém ou
95
96
Fonte: Audiência 26/06/03.
Fonte: Audiência 25/09/03
109
reprime este tipo de ação.
(...) o nosso ponto de vista é o de que as agências reguladoras,
depois dessa sanha que privatizou o País todo, não estão
funcionando adequadamente. Esta é a realidade que todo cidadão
brasileiro — o usuário que não seja privilegiado — constata: as
agências não estão cumprindo o seu papel de fiscalizar, seja a
ANATEL, seja a Agência de Petróleo, seja a agência relacionada com
os planos de saúde. Essa é a grande realidade. (Deputado Antonio
Carlos Biscaia). 97
O principal objetivo da regulação é a qualidade dos bens e serviços de
saúde dos consumidores. De acordo com o que foi observado nas Notas
Taquigráficas, foi atribuída à falta de pessoal a ausência de fôlego na
fiscalização. Todavia não ficou evidenciado, na CPI, se a ANS produziu algum
estudo que possibilite, por exemplo, a diferenciação dos planos de saúde,
quanto à qualidade assistencial dos prestadores de serviços credenciados.
O procurador do Ministério Público Federal Duciran Van Marcen fez
algumas sugestões para o aprimoramento da legislação do setor, entre as
quais, introduzir a aferição de indicadores de qualidade - como existe nos
setores elétrico e de telefonia. Compartilhando em parte a idéia, a construção
de indicadores para este setor se faz mister e indicadores baseados no
cumprimento das normas do Ministério da Saúde poderiam ser um bom início.
Os clientes de planos de saúde precisam ter uma avaliação da qualidade
assistencial. Preço e propaganda não devem ser os principais critérios a serem
observados por ele na escolha de um plano de saúde.
3.4
Financiamento
3.4.1 A Taxa de Saúde Suplementar e Ressarcimento ao SUS
A Taxa de Saúde Suplementar98 foi criada a partir da criação da ANS em
função do exercício do poder de fiscalização, sob o fundamento de financiar as
atuações e diligências necessárias ao exercício do poder de polícia da agência.
É exercida sobre os planos de saúde, e instituída em duas modalidades: a
primeira cobrada das operadoras anualmente; a segunda é devida cada vez
97
Fonte: Audiência 01/07/03.
A Taxa será devida por plano de assistência à saúde, e seu valor será o produto da multiplicação de R$ 2,00 (dois
reais) pelo número médio de usuários de cada plano privado de assistência à saúde, deduzido o percentual total de
descontos apurado em cada plano, de acordo com as Tabelas I e II do Anexo II da Lei 9961 de 28/01/00
(www.ans.gov.br).
98
110
que a ANS for solicitada, quer através de solicitação de registros de produto,
alteração de dados referentes à operadora, pedido de reajuste de prestação,
etc.
Cal (2003) diz que as Leis de criação das agências reguladoras trazem
em seu bojo o estabelecimento de uma taxa de regulação ou taxa de
fiscalização dos serviços, como forma de atribuição de receita às agências,
sem que os recursos tenham que tramitar pelo Erário Público, e ao serem
instituídas ganham maior autonomia” (pág 126). Diz ainda que do ponto de
vista doutrinário, várias dúvidas e questionamentos permanecem e “o que nos
resta é aguardar a decisão final advinda do Supremo Tribunal Federal. (pág
136)”.
De qualquer forma, a falta de transparência na utilização destes recursos
mereceu críticas da Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
(...) não sabemos onde está aplicado esse dinheiro, não sabemos
onde está todo esse dinheiro repassado da Tabela TUNEP, e isso é
uma vergonha. (Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil/S.P.,
Rosana Chiavassa ). 99
O ressarcimento ao SUS também foi tema bastante polêmico. O modelo
atual refere-se aos casos de internação e atendimento de urgências e
emergência dos beneficiários de planos de saúde na rede pública e
conveniada. A legislação estabelece que devem ser ressarcidos pelas
operadoras, em valores superiores àqueles pagos pelo SUS, os procedimentos
previstos em contrato. A cobrança é feita com base na Tabela Única Nacional
de Equivalência de Procedimentos (TUNEP). A TUNEP indicará os
procedimentos e os valores de referência a serem ressarcidos, que são fixados
em Resolução da ANS e repassados ao Fundo Nacional de Saúde no
montante pago pelo SUS. (Resolução RDC Nº 62 de 20 de março de 2001)
Desculpem-me, mas a lei autorizou que o SUS, que o Governo, o
Ministério da Saúde cobre da empresa todo atendimento que um
associado seu fizer no SUS. Existe uma lei, pelo menos em São
Paulo, não sei nos outros Estados, pela qual qualquer acidente de
carro vai para um hospital público, o HC, lá em São Paulo, ou a Santa
Casa. É claro que esses tratamentos são muito caros. Normalmente
envolvem próteses, uma série de coisas. O SUS recebe o valor da
sua tabela, e o Ministério da Saúde vai cobrar da empresa 5 vezes o
99
Fonte: Audiência 14/08/03.
111
valor, até 5 vezes o valor que o SUS cobraria. Desculpem-me, isso
me até parece enriquecimento ilícito por parte do Ministério da Saúde.
Essa cobrança pela tabela é ilegal. (Conselheira da Ordem dos
Advogados do Brasil/S.P., Rosana Chiavassa). 100
O presidente da ANS à época, Januário Montone101, informou que do
montante dos recursos cobrados (R$ 225 milhões) das operadoras em relação
aos efetivamente pagos (R$ 45 milhões) ao Sistema Único de Saúde (SUS),
até aquele momento, apenas 20% tinham sido honrados. Segundo ele, a
efetividade do ressarcimento estaria comprometida por um conjunto de fatores:
i) a dificuldade de inscrição das operadoras em débito na dívida ativa; ii)
liminares suspendendo as cobranças, mesmo após a identificação de que o
SUS realizou a cobertura; iii) falta de informações (dados) completas nas AIHs,
com a ocorrência de homônimos e falhas no preenchimento dos campos
relativos a procedimentos e valores. Ademais das multas, aplicadas (das
operadoras que descumprem a regulamentação, vide Tabela 2), a ANS
arrecadou apenas 0,93% do valor. Conforme os processos publicados no
Diário Oficial da União, as multas102 fixadas no período de 2000 a agosto de
2003 perfazem um total de R$ 84.192.960,00, tendo sido arrecadados apenas
R$ 783.000,00.
Essas informações sugerem que se atribui às agências o poder de ditar
normas com a mesma força de Lei, esquecendo-se que há limites na função
reguladora. As empresas operadoras de planos de saúde, provavelmente,
devem utilizar a Lei maior que é a Constituição Federal, em seu inciso XXXV
do Art. 5, que prevê: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão
ou ameaça a direito” para procrastinar o pagamento.
(...) os planos de saúde acham muito mais fácil questionar
juridicamente
esses
valores
cobrados
do
que
pagar
administrativamente sobre o controle de um sistema que existe, que
tem documento para provar e, no entanto, não tem legalmente poder
de cobrar, porque o Judiciário sempre é acionado pelos planos de
saúde, que sabem que, no mínimo, vão ganhar tempo para discutir
esse valor lá na frente e, quando forem condenados, eles
imediatamente fazem o pagamento. Acho que esse sistema tem que
ser mudado, até para eles saberem que esse valor tem que estar, no
mínimo, depositado em juízo, para que eles também não possam
operar com recurso público a viabilidade dos planos de saúde. Ou
100
Fonte: Audiência 14/08/03.
Fonte: Audiência 02/10/03.
A principal causa de multas refere-se ao descumprimento do artigo da Lei 9656/98, que obriga as empresas a
fornecerem, periodicamente à ANS, todas as informações e estatísticas relativas às suas atividades. Em seguida, a
maior infração é o descumprimento do artigo 11, que veda a exclusão de cobertura às doenças e lesões preexistentes.
101
102
112
seja, eu jogo para o SUS, o SUS atende, eu discuto o valor e não
deposito em juízo. (Deputado Silas Câmara). 103
Os depoimentos nas Notas Taquigráficas sugerem que, baseados
nestes problemas, os parlamentares propõem então a criação da Taxa de
Ressarcimento ao SUS, cujo valor fixo deverá ser estabelecido por lei, a ser
pago por todas as operadoras à ANS com destinação final para o Fundo
Nacional de Saúde.
O que nós propomos? Apenas o estudo. A sugestão que nós temos
encaminhado aqui é que haja uma cobrança, através de uma, não
diria uma taxa, mas um percentual xis, para que o SUS possa ter nos
seus cofres milhões de reais por mês, que vai ajudar a manutenção
de vários e vários hospitais e atendimentos pelos postos espalhados
pelo País. Quero adiantar que já estou, inclusive, fazendo um projeto
de lei sobre isso. Já tive a anuência da ANS. Já estive com o Ministro
Humberto Costa. Já estive com o Dr. Fausto. Todos gostaram muito
do projeto. (Deputado Dr. Ribamar Alves)104
O relatório propõe o aperfeiçoamento do atual mecanismo de
processamento de informações, visando a identificação de todos os
beneficiários de planos de saúde que são atendidos pelo SUS, por meio do
cruzamento dos cadastros das operadoras enviados à ANS com as emissões
de AIHs (autorizações de internações) e demais atendimentos pelo SUS.
As contradições e a explicitação de interesses pelos atores envolvidos
com a regulamentação aparecem a todo o momento no debate da CPI.
As denúncias de retrocesso e de uso “predatório do sistema de saúde”
partiram de parlamentares como o deputado José Pinotti, que considerava que
a substituição do ressarcimento ao SUS por uma taxa tinha um significado
muito perigoso, pois “daria aos planos de saúde liberdade de usarem o sistema
público de saúde mediante este pagamento ou mesmo a ”depredação” do
sistema público pelo sistema privado”105.
Por outro lado, esta discussão traz à tona uma reflexão bastante
importante: a inversão da complementaridade do sistema. O SUS que teria
suas ações e serviços de saúde complementados pela iniciativa privada passa,
na verdade, a ser o complemento dessa iniciativa privada nos casos de
internação e atendimento de urgências e emergências.7
103
Fonte: Audiência 29/07/03.
Fonte: Audiência 25/11/03
105
Fonte: Audiência 25/11/03.
104
113
3.4.2 Financiamento Público e Privado
Basicamente, foram as operadoras de planos de saúde e as
representações dos EAS que trouxeram à tona este tema ao âmbito da CPI.
Apesar das distorções, parece inegável a estrutura de recursos das
seguradoras e operadoras de planos de saúde.
Chegamos à conclusão de que, terminado o prazo desta CPI, não há
alternativa para esse caso. Parece que o que foi colocado aqui é que
as empresas estão todas em dificuldade. Mas seus diretores não
aparentam essa dificuldade. Todos eles moram muito bem, têm
carros do ano, alguns têm aviões, navios, viajam para o exterior. Quer
dizer, então, eu não vejo aqui, Deputado Max Rosenmann, que uma
limitação em 100% entre a mais... a menor contribuição e a maior,
possa significar uma desestruturação econômica das empresas. Eu
não vejo dessa maneira. O que a gente vê é que cada vez mais
essas empresas lucram, inclusive aquelas que aqui tiveram uma
simpatia de todos os Parlamentares, eu senti, aquelas que estão
relacionadas com cooperativas médicas. Parece que contaram com
maior simpatia, quando, na realidade, eu entendo que essas
cooperativas médicas é que necessitariam talvez de uma maior
investigação, porque elas estão, inclusive, influenciando econômica e
financeiramente nos pleitos eleitorais para os Conselhos Regionais
de Medicina. Na minha cidade, no meu Estado, isso aí é evidente.
Nos últimos anos, as chapas vencedoras, numa disputa acirradíssima
do órgão que vai controlar o exercício da profissão, ele é financiado
pela UNIMED, com toda a tranqüilidade. Quer dizer, como alguém
que recebe o financiamento público de uma entidade como esta irá
fiscalizá-la depois? Essa interrogação não tem resposta nesse
relatório e, provavelmente, não terá. Quero também me manifestar
aqui que concordo com a ponderação e com a observação de que o
dispositivo legal de que o cheque caução tem que acabar.
(Deputado Antonio Carlos Biscaia). 106
Segundo representantes das seguradoras, o setor apresenta problemas
de solvência e liquidez. Dados apresentados pelo presidente da Federação
Nacional das Empresas de Seguros Privados e de Capitalização (FENASEG),
João Elísio Ferraz de Campos,107 em 2002, cerca de 50% de uma amostra de
749 operadoras apresentava problemas de solvência (medida pela relação
entre o volume total apurado no ano com contraprestações/prêmios e o
patrimônio líquido da operadora).
Dessas operadoras, 64,5% eram de grande porte (acima de 100.000
contratos); 68,4% de médio porte (entre 20.000 e 100.000 contratos) e 46% de
pequeno porte (até 20.000 contratos). O cálculo do endividamento não
106
Fonte: Audiência 19/11/03.
114
operacional (proporção das obrigações não operacionais, exceto as provisões
técnicas, em relação ao patrimônio líquido) mostra a existência de um número
significativo de operadoras em todas as categorias de porte com "passivos a
descoberto", isto é, empresas nas quais a proporção de empréstimos e
financiamentos é superior ao patrimônio líquido.
Contudo, segundo avaliação do LAFIS (Latin America Financial
Investment Service), que consta no relatório da CPI, o faturamento das
operadoras de planos de saúde no Brasil deverá crescer em 2003 entre 9.0% e
10%, somando cerca de R$ 29 bilhões. Além disso, a CPI identificou que
algumas operadoras ocupam posições destacadas no ranking das maiores
empresas do país. Elas figuram entre as mais rentáveis (lucro líquido ajustado/
patrimônio líquido ajustado em %), têm um alto desempenho no crescimento
das vendas e apresentaram grandes receitas operacionais. Já as duas maiores
seguradoras especializadas em saúde, no período de 1999 a 2002,
apresentaram aumento significativo do patrimônio líquido, fato que se repetiu
em 2003 (Revista Exame, julho 2004).
Para este segmento, a amplitude dos serviços imposta por mudanças na
legislação, e mais o encarecimento dos serviços médico-hospitalares vêm
criando um impasse no setor, principalmente porque traz à discussão a idéia de
mutualismo como base do sistema de planos de saúde, onde os participantes
rateiam entre si o atendimento dos que recorrem a estes serviços, e o custo do
plano deve ser proporcional ao seu uso, o que não é, segundo eles, uma
classificação
apropriada
para
as
atividades
que
desempenham.
As
seguradoras observam que não vem sendo realizada qualquer menção ao
impacto sobre os custos enfrentados por elas, sendo, portanto, repassados aos
segurados e detentores de planos de saúde. Lembram que as discussões têm
sido limitadas a expor suas posições e esquecem de abordar a questão em sua
variante mais importante: a econômica.
O parlamentar Saraiva Felipe chama a atenção para o fato de que ele,
como empresário hospitalar, não percebeu qualquer aumento nos últimos três
anos e que a CPI deveria trabalhar para aperfeiçoar parâmetros em relação à
ANS, resguardando a existência do negócio, mas diminuindo a insatisfação dos
clientes de planos de saúde.
107
Fonte: Audiência 11/09/03.
115
Eu sou médico, já fui Secretário de Saúde, fui, inclusive, SecretárioGeral de 2 Ministérios: da Previdência e da Saúde. Ele me chamava a
atenção. Mas para mim não aumentou nada, porque, de alguma
forma, eu estou recebendo como empresário hospitalar o mesmo
valor que eu recebia 2, 3 anos atrás, inclusive das empresas
108
seguradoras de saúde. ( Deputado Saraiva Felipe)
A afirmação tanto do setor de planos quanto dos hospitais é que o
modelo ora em vigência está caminhando para a exaustão, sendo necessária a
ajuda do governo. Segundo o presidente da Associação dos Hospitais do Rio
de
Janeiro109,
Guilherme
Xavier
Jaccoud,
apesar
de
ser
oferecido
financiamento pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES), as empresas não conseguem tirá-lo, tendo em vista não possuírem o
CND (Certidão Negativa de Débitos)110. Uma das formas apresentadas por ele,
para o governo ajudar o setor, seria uma renúncia parcial111 das empresas que
contratassem operadoras para dar assistência médica aos seus funcionários,
que não usariam o SUS, já que isso colocaria no mercado vinte milhões de
pessoas, o que poderia oxigenar o sistema. Parlamentares também acreditam
que a Saúde suplementar deva ser tratada de uma maneira especial:
(...) muito importante, é a recuperação do reequilíbrio econômico das
3 partes. Isso não estou dizendo usuário ou plano, não. Usuário,
tomador e prestador. Tem que reequilibrar porque existe uma
diferença, uma perda muito grande aí. E para se continuar esse
sistema, e se quisesse continuar esse sistema, nós teríamos de criar
uma situação onde Saúde fosse tratada de um maneira especial,
108
Fonte: Audiência 11/09/03, (pág 41).
Fonte: Audiência 27/10/03.
110
É o documento emitido pela Previdência Social, para comprovar a regularidade de contribuições com a Seguridade
Social, através de modelo próprio que pode ser impresso em papel tamanho A4 ou formulário contínuo, no ato do
pedido, se não houver restrições ou através de consulta às certidões emitidas. A CND somente será liberada depois de
verificada a Regularidade Fiscal do contribuinte. (www.mpas.gov.br).
111
Incentivos Fiscais consiste no fato do Executivo, mediante lei, abrir mão de parte da arrecadação de determinado
imposto para incentivar certas atividades ou regiões. Em contrapartida, a renúncia fiscal do Executivo constitui um
benefício fiscal para o contribuinte.
Essa renúncia já existe quer através da isenção de pagamento de impostos de instituições filantrópicas e Santas Casas
que vendem planos de saúde; atendimento de usuários de operadoras de planos de saúde em unidades do SUS, nos
casos de alta complexidade, idosos e portadores de patologias e que não são passíveis de ressarcimento; a prática da
chamada " fila dupla" nos hospitais universitários em que hotelaria é diferenciada para usuários de planos de saúde,
em detrimento dos pacientes do SUS.
Além disso e de acordo com documento a que a CPI teve acesso - Demonstrativos dos Gastos Governamentais
Indiretos de Natureza Tributária -, da Coordenação-Geral de Política Tributária da Secretaria da Receita Federal do
Ministério da Fazenda, a renúncia fiscal no Imposto de Renda das Pessoas Físicas (devido à dedução dos gastos com
as “despesas médicas” – que incluem planos de saúde e outros gastos diretos com médicos, dentistas, psicólogos etc)
será da ordem de R$ 1.729.162.262,00, em 2004. Já a renúncia fiscal do Imposto de Renda de Pessoas Jurídicas
(referente a gastos com assistência médica, odontológica e farmacêutica com funcionários) será da ordem de R$
689.265.882,00, em 2004. Isso totaliza R$ 2.418.428.144,00 de renúncia ou redução da arrecadação potencial. Outro
incentivo ao setor de saúde suplementar a partir de recursos públicos é representado pelos gastos com planos de
saúde de servidores.De acordo com Projeto de Lei do Orçamento Anual 2004 (PLOA), da Secretaria de Orçamento
Federal do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, estavam previstos os seguintes gastos com assistência
médica e odontológica aos servidores, empregados e seus dependentes. Os gastos referem-se, sobretudo a despesas
com planos de saúde para funcionários, sejam planos de autogestão ou comprados no mercado (Seguradoras,
Medicina de Grupo e Cooperativas), mediante licitação.
109
116
como está na nossa Constituição. Eu acho que o custo da saúde
suplementar é muito grande. Quer dizer, o custo de saúde é muito
grande, e se nós não tratarmos isso do ponto de vista de
financiamento que nós damos para as montadoras de automóveis, se
nós não pudermos tratar a Saúde com essa deferência especial, uma
vez que a Saúde gera 2 milhões de empregos diretos neste País, eu
acho que a gente vai estar perdendo tempo tanto na CPI quanto no
fórum. (Deputado Mário Heringer). 112
Ainda segundo o presidente da Associação dos Hospitais do Rio de
Janeiro, se a tabela do SUS remunerasse adequadamente muitos hospitais
particulares estariam atendendo e fazendo o SUS funcionar.
O financiamento do SUS também foi alvo de debate. É “uma tabela muito baixa
e infame”.
(...) Há alguns avanços, e nós precisamos ajudar a melhorar a tabela.
Mesmo melhorando a tabela do SUS, a Santa Casa não dispensa
outros mercados. E o plano de saúde é um dos mercados. (Deputado
Darcísio Perondi). 113
Na tentativa de melhorar a tabela do SUS foi encaminhado - pelo
presidente da Frente Parlamentar da Saúde, deputado Rafael Guerra, através
do OF/FPS: 011 – 2004, de 19/05/04 (vide Quadro 7 em anexo), ao ministro
da Saúde, a reivindicação de reajuste114 para a atenção ambulatorial e
hospitalar do SUS.
A proximidade do fim da CPI e a quantidade de reclamações até aquele
momento fizeram com que um dos deputados se preocupasse com a
possibilidade da CPI resolver a questão.
(...) precisamos, neste momento, na minha concepção, descobrir um
ponto comum, como sugeriu o Saraiva, sentar de porta fechada, para
descobrir os rumos disso aí, porque senão isso aqui vai ser uma
igreja, aonde todo mundo vem, reclama, reclama, reclama e nós, no
final, não podemos nem abençoar. ( Deputado Mario Heringer).115
A discussão da bitributação começa a se tornar clara nas audiências.
(...) como eu, médico em Belo Horizonte, pago o meu ISS, e a
cooperativa tem de pagar de novo esse meu ISS. Isso é
absolutamente absurdo e inexplicável. (Deputado Rafael Guerra). 116
112
Fonte: Audiência 26/08/03.
Fonte: Audiência 14/08/03.
114
Em junho de 2004 o Ministério da Saúde publicou portaria reajustando os valores da tabela de procedimentos
ambulatoriais e hospitalares do SUS. Os reajustes variaram de 5% a 136,67%. O conjunto de procedimentos sofreu
aumento diferenciado – 155 procedimentos de internação foram reajustados em 37,5% para serviços hospitalares, 10%
para serviços profissionais e 10% para serviços de apoio, diagnóstico e terapêutico. Outros 255 procedimentos, já
reajustado em 2003, tiveram aumento de 13% para serviços hospitalares.
115
Fonte: Audiência 11/09/03, pág 43.
116
Fonte: Audiência 25/09/03.
113
117
A aprovação da necessidade de apresentação de Projeto de Lei
Complementar117 dispondo sobre normas gerais relativas ao Imposto Sobre
Serviços de qualquer natureza (ISS), para evitar a tributação de profissionais
de saúde cooperados e da própria cooperativa (bitributação), foi encaminhada
à Mesa Diretora da Câmara dos Deputados. Teve como justificativa o fato de
que o “ato cooperativo tem regime jurídico especifico, e que não dá margem à
configuração de prestação de serviços sob o aspecto econômico, sujeito à
incidência do ISS”. Uma parte do texto do Projeto de Lei diz:
(...) a exigência, pelos Municípios brasileiros, do ISS sobre o
faturamento total das operadoras de planos de saúde gera uma
verdadeira bitributação, uma vez que as cooperativas não prestam
serviços hospitalares, médicos, odontológicos e outros. Esses
serviços são prestados, diretamente, pelos hospitais, laboratórios e
médicos que já pagam os tributos municipais. (PLP-128/2004).
A percepção de que o Estado destina-se a atender interesses individuais
em detrimento do interesse público faz parte de nossa cultura política. O
Estado que deveria ser um mentor público parece que é colocado a serviço dos
interesses privados, dando todas as garantias aos donos do dinheiro. (Faoro,
2001)
Ainda que parte dos empresários e interessados no setor afirme que os
planos de saúde desoneram o SUS e, portanto, não trazem custo para o
Estado, desobrigando-o com esta parte da população, oculta-se o fato de que
as empresas que oferecem planos de saúde a seus trabalhadores repassam os
custos desse benefício para seus preços finais e para a sociedade. Outras
formas de financiamento público envolvidas com os planos privados são as
deduções e isenções fiscais concedidas aos estabelecimentos e profissionais
de saúde que integram a rede das empresas de planos e seguros de saúde, o
denominado “desvio para o SUS” de pacientes, diminuindo seu custo e
“aumentando” os gastos do Estado com despesas consideradas de alto custo.
117
Vale lembrar, como visto no capítulo Sistema Legislativo e Comissões, que ao final dos trabalhos a CPI, além de
apresentar o relatório com suas conclusões, também encaminha à Mesa Diretora Projeto de Lei, se for o caso, com
suas proposições. Após aprovação do relatório, duas proposições foram encaminhadas. A primeira PL - 2934/2004 que
solicita alterações na Lei 9656/98 e a segunda é o PLP-128/2004 que altera a Lei Complementar Nº 116 que dispõe
sobre ISS. A última ação de ambas as proposições foi a designação do deputado Walter Feldman, como relator.
118
3.5
Recursos Humanos
O debate sobre Recursos Humanos mostra como são construídas as
relações entre capital e trabalho no setor de saúde suplementar. Reflexo
imediato dessa afirmação pode ser observado nas modalidades de vinculação
que vão se multiplicando e se diversificando.
Segundo a pesquisa Perfil dos Médicos no Brasil, em 1996 havia
183.052 profissionais médicos no país. O percentual de médicos no mercado
de trabalho com atividades no setor público, seja na esfera federal, estadual ou
municipal, àquela época, era de 69,7%. Já nesta oportunidade, a pesquisa
demonstra que 75 a 90% dos médicos declaram depender diretamente dos
convênios com empresas de saúde, medicina de grupo, cooperativas médicas,
entre outros, para a manutenção de seus consultórios em funcionamento.
(Machado, 1996)
(...) então, na prática, ou você está no SUS, vinculado a um salário...
— você é funcionário do Município, então você recebe um salário. E
aí a gente levanta uma luta nacional para aumentar o salário para um
patamar “x”, que é o chamado piso nacional da categoria médica. Em
geral, você é vinculado a um salário como servidor público de saúde.
Então, um neurocirurgião ganha a mesma coisa que uma enfermeira
de curso superior. Não estou aqui nem fazendo juízo de valor de qual
profissão é mais importante que a outra. Não é isso. Mas há uma
complexidade diferente entre as profissões. E no interior do SUS você
é remunerado dessa forma: ou é através do Programa de Saúde da
Família, ou através dos antigos credenciamentos do código 7.
...Em nenhum momento se pensou a instituição de um cartão de
atendimento no SUS, agora, para remunerar o profissional. Seria
muito interessante se o paciente fosse ao consultório do Dr. Tal — e
essa foi uma proposta debatida lá com o Ministério anterior —, nas
áreas em que os programas de atenção à saúde pública não
funcionassem. Por exemplo, oftalmologia e otorrino, que são um
gargalo do SUS, você tem muita dificuldade de ter disponibilidade
desses médicos, não é? O paciente do SUS, o cidadão brasileiro teria
seu cartão, como cidadão brasileiro teria direito de ir ao consultório do
otorrino, e se pagaria diretamente aquele profissional,
independentemente de relação dele com a rede. Quer dizer, essa era
uma reivindicação que a FENAM fez. E isso é polêmico demais. Tem
gente que é contra; tem gente que é a favor. Nós achávamos que
isso acabaria com muita fila no Brasil. Favoreceria colocar o médico
de novo querendo atender o SUS. Aí eu me remeto a outra pergunta:
se o SUS remunera bem. Hoje, a tendência do Ministério da Saúde é
não remunerar os profissionais através dos chamados procedimentos,
mas através de programas. Essa ótica de remuneração através de
procedimento, ela é muito combatida entre os gestores públicos —
quem foi aqui gestor de Município, de Estado, sabe disso. Ocorre que
ao combater essa forma de remuneração, tem que pôr outra no lugar.
(...) eu acredito que vamos ter que discutir então a tabela do SUS.
Porque isso é complicado. A gente defende o SUS. Mas qual é o
atrativo para que o médico trabalhe no SUS, se o SUS remunera
119
mal? Não tem. Então, nós precisamos fazer com que o médico queira
trabalhar no SUS e ganhe tão ou mais do que na medicina privada.
(Presidente da Federação Nacional de Médicos, Heder Murari
Borba).118
A Associação Médica e o Conselho Federal de Medicina119 acreditam
que é preciso fazer algo mais concreto com relação à participação dos médicos
no sistema de saúde suplementar, como a adoção de diretrizes de
procedimentos médicos. Para estas entidades, nas diretrizes e procedimentos
AMB/CFM existem parâmetros mais homogêneos da conduta médica, a
racionalização da indicação da conduta médica com redução de custos, que
também atua como instrumento de atualização profissional. Segundo dados
apresentados à CPI, em 1996 havia 86 escolas médicas no país e em 2002
esse número já havia passado para 112.
Em matéria publicada na revista Isto É, de 2 de abril de 2003, e
apresentada na CPI, o presidente da Associação Brasileira de Clínica Médica e
professor titular da disciplina de Clínica Médica na Universidade Federal de
São Paulo, Antônio Carlos Lopes, apresentada na CPI, diz:
O médico não devidamente formado, que não encontra uma
residência médica para se aprimorar, é um profissional que não tem a
menor condição de tratar nada mais além de gripe, diarréia e ânsia de
vômito. Isso se o problema não se complicar. O percentual de
médicos mal preparados é da ordem de 90% ou mais.
A necessidade do controle da abertura indiscriminada de cursos também
preocupa principalmente em relação à qualidade da assitência que é prestada
nos serviços. Segundo o presidente da União Nacional das Instituições de
Autogestão em Saúde (UNIDAS), José Antonio Diniz de Oliveira120,
Metade dos 10 mil, 11 mil médicos formados conseguem uma
residência médica e começam a clinicar a partir do internato. Isso traz
inegavelmente reflexos não só na remuneração do trabalho médico
como na qualidade da ciência prestada. Essa é uma questão muito
séria e grave, que nós queremos dividir com os senhores.
Estes depoimentos também sugerem que existe uma ligação direta entre
a formação do trabalho médico e os aumentos nos custos. Segundo eles, essa
afirmação pode ser verificada pela quantidade de pedidos de realização de
exames e procedimentos desnecessários; pelo aumento das infrações éticas;
118
119
Fonte: Audiência 26/06/03
Fonte: Audiência 15/09/03.
120
pela aceitação de salários irrisórios, honorários abaixo da média e condições
de trabalho desfavoráveis.
Neste sentido, faz parte do relatório final da CPI a proposição de Criação
de Comissão de Notáveis121, integrada por representantes do Conselho
Nacional de Saúde, do Conselho Federal de Medicina, da ANVISA, do
Ministério da Educação, do Ministério da Saúde, da Comissão de Seguridade
Social e Família da Câmara dos Deputados, da Comissão de Assuntos Sociais
do Senado, dos hospitais, das operadoras, da associação de médicos
residentes, da associação de reitores e representantes de estudantes de
Medicina, com a finalidade de analisar e avaliar as escolas de medicina
existentes no Brasil, estabelecer critérios mínimos para que determinado curso
possa obter licença para funcionamento junto ao Ministério da Educação e
transferência dos alunos de cursos suspensos para outras escolas, sem
prejuízo do andamento curricular.
120
Fonte: Audiência 11/09/03.
A necessidade de aferir o perfil das escolas e qualidade dos profissionais que elas formam surgiu em 1991, através
de outra “comissão de notáveis”, e que tinha como propósito avaliar e transformar o ensino médico no Brasil e de
recuperar a primazia da clínica e da razão científica sobre a tecnologia. Esta atividade era coordenada pela Comissão
Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico - CINAEM – e composta por entidades representativas a
nível nacional, tais como a Associação Brasileira de Educação Médica, Conselho Federal de Medicina, Conselho
Regional do Rio de Janeiro e de São Paulo, Sindicato Nacional dos docentes de ensino superior, Conselho de Reitores
das Universidades Brasileiras, Associação Médica Brasileira, Federação Nacional dos Médicos, dentre outras.
121
121
3.5
Ética
Durante o processo da CPI, o deputado Antônio Biscaia propôs um
debate sobre a relação institucional entre a UNIMED e os Conselhos
Profissionais. Segundo ele, as cooperativas estariam influenciando econômica
e financeiramente pleitos eleitorais para os Conselhos Regionais de Medicina,
com o financiamento de campanhas.
E uma outra questão que chegou ao meu conhecimento, com
diversas... lá no Rio de Janeiro, com muitas reclamações de médicos,
inclusive, é uma ostensiva intervenção da UNIMED nos processos
eleitorais dos Conselhos Regionais de Medicina, financiando
efetivamente campanhas. A gente vê um material de financiamento
de campanha com patrocínio da UNIMED de todas as eleições, e aí a
questão se é eticamente...(Deputado Antonio Biscaia). 122
A questão dos Honorários Médicos aportou na CPI como um grande “nó”
na relação entre prestadores de serviço e operadoras e tem gerado, até hoje,
muitos conflitos.
Em razão da busca de rendas adicionais pelo profissional médico, a
parceria público-privado ganha o nome de “questão particular do médico”, o
que sugere que tal prática pode trazer mais problemas do que soluções. As
declarações da presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio de
Janeiro, Márcia Rosa de Araújo, que considera como “particular” a necessidade
do médico ter diversos vínculos, evidencia isso:
Queria levantar para a CPI uma questão particular do médico: tenho
aqui um colega que é médico; ele é dono de hospital – está sentado
nesta mesa -, ele é dirigente de entidade hospitalar, ele é funcionário
público federal, ele é cooperado da UNIMED, e faz consultório
privado para vários outros planos de saúde; o que eu acho que é uma
particularidade da prática da medicina.123
Os conflitos de interesses público/privado passam, portanto, a ser o
maior entrave na busca de uma solução viável e adequada para o problema.
O médico neurologista, Francisco Silveira, convidado pela CPI traz um
exemplo claro. Segundo ele a placa da Associação Médica Fluminense está
junto com a placa da Unimed. Para ele nenhum diretor, quer seja do Bradesco,
da Sul América, da Unimed, ou de qualquer entidade, deveria fazer parte do
122
Fonte: Audiência 25/09/03.
Fonte: Audiência 27/10/03. Além dos membros da CPI foram convidados para esta audiência, realizada na
Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, o Deputado Paulo Pinheiro, Membro da Comissão de Assuntos da
Criança, do Adolescente e Idoso da Alerj; Sergio Vieira, Presidente da ABRAMGE Regional/RJ; Guilherme Xavier,
Presidente da Associação dos Hospitais do Rio de Janeiro; e Francisco Silveira, Médico Neurologista.
123
122
Conselho Regional de Medicina, ou Conselho Federal de Medicina, já que
existem interesses antagônicos.
A Unimed patrocina o Fluminense, o Romário, o ATL Hall, patrocina
o Bar do Tom, patrocina o RJ TV e tem uma campanha milionária. E
um reles exame de sangue não quer pagar! Então, algo de muito
sério está acontecendo aí!. Falo de exame de sangue ainda: acho
que temos que questionar, no futuro, até onde diretores de entidades,
que exploram o trabalho médico, podem ser representantes de
entidades de classe. Não tenho convênio. Posso falar tranqüilo. Mas
conheço dezenas de colegas que têm vários convênios e não vêm
porque têm medo de perder o credenciamento. !”(Francisco Silveira –
médico neurologista)124.
Um tema que também compõe este debate é o que trata das auditorias
médicas realizadas pelos planos de saúde por profissionais médicos e que
atuam definindo se está ou não correto o faturamento das contas. Caso não
haja consistência na informação, o procedimento é “glosado”. Segundo os
depoimentos, as auditorias implantadas são abusivas.
Esses auditores, muitos deles são contratados, e, quanto mais
glosam mais recebem de salário, de pagamento, de comissão,
percentual da glosa. Então, como é que fica? (Deputado Rafael
Guerra).125.
Para o presidente do Conselho Federal de Medicina, Edson Andrade126,
“o critério utilizado para as glosas, é arbitrário e unilateral por parte dos planos
de saúde” Ele sugere a interveniência de “uma terceira entidade de caráter,
com alguma neutralidade nesse processo”, que possa arbitrar situações de
glosas e que pudesse ver se a glosa foi justa ou não”.
Nós estamos aqui para, no final desta CPI, obtermos um diagnóstico
correto para um tratamento correto. E quando a gente faz isso, a
gente tem que procurar olhando para fora e olhando para dentro. No
momento em que a gente olha para dentro – e aí é que vem a minha
preocupação –, nós temos, dentro desse sistema, uma...não são
todos naturalmente, mas uma certa distorção nas auditorias médicas.
Nós temos colegas, submetidos a situações constrangedoras,
aceitando determinadas imposições, visitando hospitais e fazendo
análises retrospectivas sem a presença do paciente; determinando
condutas completamente extemporâneas, mesmo porque se o doente
já foi embora, está fora do tempo; determinando o número de fraudas
que se possa usar num doente, que é um absurdo. Eu tenho colhido
essas informações. Nós temos médicos, colegas médicos nossos e
dos senhores, nossos representantes, prestando esse tipo de
serviço. Se nós não trabalharmos efetivamente na correção dessa
doença que está no meio médico, nós também não vamos fazer um
diagnóstico adequado não, porque isso virou uma teia tão grande que
127
a gente não vai encontrar um culpado. (Deputado Mário Heringer).
124
Fonte: Audiência 27/10/03 pág 39.
Fonte: Audiência 31/07/03.
126
Fonte: Audiência 26/06/03.
127
Fonte: Audiência 26/06/03
125
123
Apesar deste debate ter aparecido por diversas vezes na CPI, a
evolução de sua discussão foi bastante prejudicada, tendo em vista que
problemas da categoria profissional e das empresas prevaleceram frente à
questão social e coletiva.
Para Truman, “qualquer grupo que - à base de um ou vários
comportamentos de participação - leva adiante certas reivindicações em
relação a outros grupos sociais, com o fim de instaurar, manter ou ampliar
formas de comportamento que são inerentes às atitudes condivididas”, é
chamado de grupo de interesse.
Utilizando a teoria dos grupos, Bobbio apud Arthur Bentley diz:
A grande função do estudo de qualquer forma da vida social é a
análise destes grupos. Quando os grupos são devidamente
apresentados, tudo é apresentado, e, se digo tudo, entendo tudo.
(208-09)
Tendo por base essa teoria, são preocupantes as várias declarações
feitas dentro do espaço de investigação de denúncias e irregularidades dos
planos de saúde.
(...) o sistema cooperativo nos une e faz com que tenhamos uma
grande paixão em razão do que ele representa, do associativismo,
acima de tudo pela oportunidade de geração de emprego e renda. E
nós temos que o futuro, não só do mundo, mas do Brasil, será através
do cooperativismo. (Deputado Silas Brasileiro).128
... a UNIMED é uma experiência exitosa em termos nacionais e acho
que poderia ser feita uma reflexão para contribuir para o
aprimoramento do atendimento feito pela UNIMED. (Deputado
Saraiva Felipe)129.
128
129
Fonte: Audiência 25/09/03.
Fonte: Audiência 25/09/03.
124
Resultado Final da CPI
A CPI, que por cinco meses ouviu mais de 70 pessoas, chega ao seu
final. O deputado Ribamar Alves130, antes de colocar o relatório em votação,
apresenta um relato dos acontecimentos decorridos durante este período:
Tratar de um assunto de tamanha importância para a saúde e para o
bem-estar de milhões de cidadãos, que tem implicações profundas
para o trabalho de outra parcela ponderável de trabalhadores e
empresários, de grande complexidade técnica, econômica e política e
que, portanto, afeta interesses e expectativas, muitos deles
plenamente legítimos, não foi tarefa fácil. O confronto entre nossos
desejos, de poder tudo resolver, e a realidade, que nos impõe limites
e prudência, por vezes pode deixar-nos um travo de frustração. No
entanto, um balanço final revela que, mesmo naqueles pontos que
gostaríamos de ver solucionados e que não logramos sucesso, há a
vitória de uma razão maior: a da ordem democrática. ...Merece
citação explícita a questão relativa aos assim chamados contratos
antigos de planos de saúde, que tanta polêmica têm causado. Muitos
protestos e pleitos foram feitos à Comissão e percebeu-se a grande
expectativa depositada na resolução dessa questão pela CPI. Assim,
duas observações se fazem necessárias em relação a esse tema. A
primeira é de que a CPI concluiu pela impossibilidade de a ANS
resolver os impasses decorrentes dos contratos anteriores à vigência
da Lei 9.656/98 usando seu poder de regulação do mercado, isto é,
aplicando multas e outras penalidades ao seu alcance. Isso não
significa que nada pode ser feito para a resolução dos conflitos entre
usuários portadores de contratos antigos e operadoras. A maioria
esmagadora desses instrumentos contratuais foi firmada sob a égide
do Código de Defesa do Consumidor e aquela norma tem-se
mostrado um valioso e poderoso recurso para coibir abusos e para
fazer valer os direitos dos cidadãos. Há ainda uma outra vertente a
ser explorada pela A Agência que consta de nossas conclusões e
recomendações ao Poder Executivo: a via negociada. Cremos que se
os representantes das operadoras, dos usuários e do Poder Público
buscarem, de forma franca e aberta, uma fórmula justa e conveniente
que atenda às expectativas das partes envolvidas, o quadro de
impasse poderá ser superado, sem a necessidade de que se recorra
freqüentemente ao Poder Judiciário. A segunda observação que se
faz imprescindível é sobre a própria decisão liminar do Supremo
Tribunal Federal em relação à medida cautelar concedida na Ação
Direta de Inconstitucionalidade — ADIN nº 1.931. A Relatoria recebeu
sugestões para apresentação de medidas pela CPI, de resto
consideradas inconsistentes pelo corpo técnico da Casa, com o
objetivo de reverter a aludida decisão liminar. Independentemente do
pronunciamento final que o STF vier a dar, lembremo-nos que a
decisão que ganhou destaque na mídia foi relativa a uma medida
cautelar e, portanto, pode ser reformulada. A universalidade do
SUS, infelizmente, não chega a todos os brasileiros e alguém tem
que suprir essa necessidade. A saúde suplementar é um veio, é
um segmento que está aí para ajudar, segundo disse aqui mesmo o
nosso Ministro Humberto Costa, que não gostaria de ver esta CPI e
muito menos o Fórum de Saúde Suplementar quebrando planos ou
quebrando usuários ou prestadores, mas sim achando soluções para
que continuassem a existir, mas existir de uma maneira democrática,
em que houvesse a maior interação possível entre os entes
130
Fonte: Audiência 12/11/03.
125
envolvidos. Vale lembrar, dessa forma, que as empresas de planos
de saúde, os estabelecimentos hospitalares, laboratórios, clínicas,
assim como os profissionais de saúde, em sua maioria exercem uma
atividade econômica legítima e constitucionalmente garantida. Não se
trata, portanto, de criar embaraço de qualquer espécie por considerar
que o ganho ou lucro advindo dessa atividade possa ser condenável
ou injustificável. É mister, contudo, que se reconheça que essa é uma
relação de consumo especialíssima em um mercado que tem
características próprias, pois lida, em última instância, com a vida e o
bem-estar dos seres humanos. A Constituição Federal é clara, aliás,
quando em seu art. 197 prevê questão de relevância pública as ações
e serviços de saúde. Por conseguinte, a parte mais fraca e mais
desprotegida dessa relação deve ser objeto de resguardos e de
cuidados excepcionais, diferentemente do que ocorre com o consumo
de um bem material, que pode ser garantido unicamente pela norma
genérica, o Código de Defesa do Consumidor. Ocorre que passados
5 anos da aprovação da lei e de quase 4 anos de experiência de uma
agência reguladora atuando no setor, faz-se necessária uma
reavaliação dos problemas, avanços e lacunas percebidos e
acumulados ao longo desse período, com vistas a tornar não apenas
justas as relações entre consumidores, operadoras e prestadoras,
mas também para dotar o setor de regras estáveis que lhe dêem
viabilidade e resguarde legítimos interesses existentes entre as
partes. A ponderação judiciosa dos depoimentos prestados, das
contribuições e dos documentos recebidos compôs um painel amplo e
diversificado de sugestões.
Vou realmente aceitar que venha por escrito as sugestões até
segunda-feira, meio-dia, para que eu possa analisá-las, estudá-las e
ver a conveniência ou não de introduzir, modificar o que for
necessário. Faço questão de frisar isso, porque é uma prerrogativa do
Relator aceitar ou não.(grifo nosso).
Após aprovação do relatório, foram propostos quatorze destaques de
emendas supressivas. Para cada um desses destaques, conforme as normas
da casa, foi dada a possibilidade de haver uma defesa contra e outra a favor. A
votação de cada deputado e as defesas das emendas podem ser examinadas
nos Quadros 9 e 10 respectivamente.
Pontos que foram suprimidos do Relatório Final da CPI:
1. Proibição da "fila dupla" ou “dupla porta de entrada” (atendimento, de
forma diferenciada, dos clientes de planos de saúde nas unidades do
SUS, especialmente nos hospitais universitários).
2. Declaração de relevância pública às ações e serviços de saúde
suplementar.
3. Propostas de penalidades aos responsáveis pela prática das chamadas
"metas referenciais”;
4. Obrigatoriedade de cobertura de acidentes do trabalho e doenças
profissionais pelos planos;
126
5. Apoio ao projeto de Lei nº 1.603/2003 do deputado Mario Heringer, que
restringe o descredenciamento de médicos e prestadores pelos planos
de saúde;
6. Proposta de controle social sobre as operadoras.
Segundo o Relatório Final da CPI, foram estas as medidas aprovadas:
1. Para alterações na Lei nº 9.656/98 e de Projeto de
Lei Complementar:
1) Proibição da prática de cheque caução exigido pelos hospitais, laboratórios
e demais prestadores de serviços de saúde, como condição para o
atendimento de conveniados de planos de saúde (o problema não foi
solucionado através de Resolução editada pela ANS em 2003);
2) Criminalização das empresas que atuam com falsos planos de saúde, os
chamados "cartões de desconto", inclusive praticados por diversas
funerárias;
3) Obrigatoriedade de formalização de contratos entre as partes, operadoras e
prestadores de serviços (médicos, hospitais e laboratórios), que devem
conter: tipo de atendimento contratado; valores; prazos e formas de
pagamento e de faturamento dos serviços contratados; definição das
formas de auditoria e dos procedimentos que requerem autorização prévia
da operadora; determinação dos prazos de vigência e de critérios para a
renovação e rescisão do contrato; determinação sobre fornecimento de
informações à ANS;
4) Redução, de 24 para 18 meses, do prazo de carência para a cobertura de
doenças ou lesões preexistentes. A CPI propôs também a extinção do
"agravo", que é o aumento da mensalidade em função da patologia, como
opção à carência de dois anos. Previsto em lei, o agravo não é cumprido
pelas operadoras ou é ofertado com preços proibitivos;
5) A ANS passa a fiscalizar todos os aspectos dos planos coletivos;
6) Mobilidade no sistema, que é a possibilidade do cliente de plano de saúde
mudar de plano de saúde sem cumprir novas carências. Para a CPI, o
direito à mobilidade deverá ser concedido após 180 dias da contratação do
plano, desde que o cliente de plano de saúde esteja em dia com o
pagamento das mensalidades;
127
7) Mudança da legislação visando a oferta do plano de assistência
farmacêutica. Trata-se de um novo plano, de uma segmentação opcional, e
não da cobertura obrigatória de medicamentos nos planos de saúde
atualmente dispostos na lei (referência, ambulatorial, hospitalar, hospitalar
com obstetrícia e odontológico). A CPI também propôs a oferta da opção de
cobertura do atendimento domiciliar e em hospitais-dia, como forma de
humanização do atendimento;
8) A regulamentação dos planos de saúde deve ser estendida aos institutos
municipais e estaduais que prestam serviços de assistência à saúde aos
servidores públicos;
9) Os planos de saúde devem ser obrigados a implementar campanhas
educativas e de promoção à saúde, e adotar os procedimentos necessários
à prevenção das doenças (a exemplo do câncer de mama, colo de útero,
etc), bem como os protocolos de prevenção consagrados pelas sociedades
de especialidades médicas e pelo Ministério da Saúde;
10) Adoção de mecanismos capazes de resguardar os direitos dos clientes de
planos de saúde quando ocorrerem intervenções da ANS, liquidação,
alienação de carteiras e falência de operadoras. Atualmente, estes clientes
de planos de saúde são jogados à própria sorte e precisam cumprir novas
carências, se contratarem um novo plano;
11) Pessoas jurídicas contratadas como prestadoras pelos planos de saúde
devem estar obrigatoriamente cadastradas no Ministério da Saúde, a fim de
facilitar o processo de fiscalização da ANS e o ressarcimento ao SUS;
12) Projeto de Lei Complementar dispondo sobre normas gerais relativas ao
Imposto Sobre Serviços de qualquer natureza (ISS). A maioria dos
municípios cobra o ISS sobre o faturamento total das operadoras de planos
de saúde. A CPI propôs que seja evitada a bitributação, pois muitas vezes o
ISS é cobrado também daqueles que prestam serviços às operadoras;
13) Introdução de formulário único para registro e faturamento de atendimentos
e procedimentos na relação entre as operadoras e prestadores.
2. Do âmbito do Executivo e consideradas como
prioridades:
128
1) Regulamentação da migração dos planos de saúde contratados antes de 2
de janeiro de 1999 para o regime instituído pela Lei n. º 9.656/98. Segundo
a CPI, a migração ou adaptação dos contratos deve ocorrer de forma
coletiva, em cada plano de saúde, visando o menor reajuste das
contraprestações e o menor prazo de carência possíveis. Além disso, deve
garantir a livre escolha do cliente de plano de saúde entre permanecer no
contrato original ou adaptar seu contrato, com a incorporação de novas
coberturas, de acordo com a Lei nº 9.656/98;
2) O acompanhamento, a regulação e a fiscalização dos contratos “antigos”
pela ANS devem ter como base as disposições da Lei n. º 8.078, de 11 de
setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor (CDC), inclusive para
fins de aplicação de penalidades, sempre que forem constatadas infrações;
3) A ANS deve estabelecer uma política de reajustes mais transparente para o
setor. Deve assumir papel mais efetivo, avaliando e instituindo política de
reajustes regionais, mantendo, contudo, o reajuste máximo nacionalmente
permitido. Para a CPI, as planilhas de custos das operadoras devem ser
analisadas e auditadas por órgãos independentes, de notório saber e
credibilidade, a exemplo da Fundação Getúlio Vargas e da Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE/USP), contratadas pela ANS.
4) Deve haver vinculação automática e repasse dos aumentos das
mensalidades dos planos de saúde aos reajustes concedidos aos
prestadores (médicos hospitais e laboratórios);
5) Estabelecimento de regras mais rígidas para que a ANS conceda o registro
e a autorização de funcionamento das operadoras, e também é solicitado
pela fixação de prazos máximos para que as empresas possam atuar com
registro provisório, devendo ser regulamentada, definitivamente, pela ANS,
a concessão do registro definitivo;
6) A ANS deve fiscalizar o cumprimento da obrigatoriedade de registro nos
Conselhos Regionais de Medicina e Odontologia, como condição para
funcionamento das operadoras (art. 8º, I, da Lei n. º 9.656/98);
7) A ANS deve tornar mais rígidas as regras de transferência de carteiras
entre operadoras de planos de saúde, com a adoção de mecanismos que
impeçam a prática de "arrendamento" de carteiras;
129
8) Promoção de concursos públicos para a composição do quadro de pessoal
da ANS. E que haja critérios rígidos, no sentido de que cidadãos ligados às
empresas do setor de saúde suplementar não ingressem no quadro de
diretores da ANS; bem como implantação da quarentena de diretores
sempre que deixarem os cargos;
9) Criação de mecanismos de controle e regulação do mercado, a fim de coibir
a prática das chamadas "metas referenciais", que consistem em restrições e
penalidades impostas aos médicos a partir de determinado número de
exames e procedimentos;
10) Criação de núcleos estaduais de fiscalização da ANS. O sistema atual de
fiscalização
regional
mostrou-se
bastante
inoperante,
apresentando
acentuado desequilíbrio entre localidades fiscalizadas e outras sem
qualquer ação da ANS;
11) Criação de um sistema de auditoria para exame de glosas feitas pelos
auditores das operadoras, pois muitas delas são exageradas e abusivas.
3. Que dependem da Agência Nacional de Saúde
Suplementar:
1) Criação da Taxa de Ressarcimento ao SUS, cujo valor fixo será
estabelecido por lei, a ser pago por todas as operadoras à ANS, com
destinação final ao Fundo Nacional de Saúde. O relatório propôs o
aperfeiçoamento do atual mecanismo de processamento de informações,
visando a identificação de todos os beneficiários de planos de saúde que
são atendidos pelo SUS, por meio do cruzamento dos cadastros das
operadoras enviados à ANS com as emissões de AIHs (autorizações de
internações) e demais atendimentos pelo SUS;
2) Criação de um Banco de Preços da Saúde Suplementar, com a finalidade
de tornar disponíveis as informações comparativas sobre os preços
praticados no mercado de órteses, próteses e outros equipamentos e
materiais especiais;
3) Adoção de parâmetros para o uso dos recursos e incorporação de novas
tecnologias pelos planos de saúde, além da instituição de protocolos e
diretrizes médicas baseadas em evidências científicas, como forma de
130
evitar procedimentos desnecessários, mas também de inibir as glosas e
restrições arbitrárias;
4) Controle da propaganda enganosa e abusiva dos planos de saúde, por
meio de monitoramento, fiscalização e aplicação do Código de Defesa do
Consumidor;
5) Revisão da Resolução nº 13 do CONSU (Conselho de Saúde Suplementar),
que limita diversos atendimentos de urgência e emergência, colocando em
risco a saúde e a vida dos clientes de planos de saúde;
6) Revisão da Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 68, da ANS, que
estipulou o Rol de Alta Complexidade, já que não são claros os critérios
técnicos utilizados para estipular os procedimentos que constam do rol e
que não são cobertos durante o prazo de carência de 24 meses para
doenças preexistentes;
7) Adoção de medidas legais para impedir a falsa coletivização de contratos,
artifício que vem sendo usado para fugir às regras mais rígidas dos
contratos individuais.
A CPI ouviu e encaminhou ao Ministério Público pedido de indiciamentos
de representantes das empresas Nipomed e Funerária Prever, bem como
solicitou aprofundamento na apuração do caso específico da UNIMED São
Paulo.
Aprovado, portanto, o relatório, duas proposições foram encaminhadas.
A primeira PL - 2934/2004, que solicita alterações na Lei nº 9.656/98 e o PLP128/2004, que altera a Lei Complementar nº 116, que dispõe sobre ISS. As
últimas ações de ambas as proposições estão datadas de 29/04/04 e 07/07/04,
respectivamente. Ambas aguardam parecer da Comissão Permanente de
Seguridade Social e Família, da qual, como visto no quadro de perfil dos
componentes da Comissão, vários parlamentares fazem parte. A última ação
registrada foi a designação do deputado Walter Feldman como relator das duas
proposições.
131
Considerações Finais
Após a CPI, ocorreram fatos importantes que voltaram a impactar o
segmento de assistência suplementar.
Em face da necessidade de se instituir uma regra em vigor antes do
Estatuto do Idoso131, a ANS propõe, logo após o término da CPI, mudanças na
regra de reajuste por faixa etária nos contratos, suprimindo as faixas de 60
anos em diante, mas mantendo o mesmo percentual máximo de reajuste de
500%, porém dividindo em dez faixas (ao invés das setes), sendo a primeira de
zero a 18 anos e a última acima de 59 anos. Além disso, a polêmica relativa
aos contratos “antigos” fez com que o governo, em 22 de dezembro de 2003,
através da Resolução RN 64, introduzisse o Programa de Incentivo à
Adaptação de Contratos (PIAC), utilizando -se da Medida Provisória nº 148, de
15 de dezembro de 2003. De acordo com este instrumento, os clientes de
planos de saúde que tinham contratos até 1998 receberiam uma proposta de
adaptação e/ou migração para um plano chamado de “novo”, adequado à Lei
nº 9.656/98.
Em março de 2004 o presidente da República em exercício, deputado
Inocêncio Oliveira, aprova a Lei nº 10.850, que atribui competência à ANS e
fixa diretrizes na definição de normas para implantação de programas especiais
de incentivo à adaptação de contratos anteriores à Lei nº 9.656/98.
Enquanto as propostas eram encaminhadas aos consumidores, a
Agência Nacional de Saúde Suplementar, valendo-se do aparecimento na
mídia de um profissional da saúde, o Dr. Draúzio Varela, fazia propaganda
incentivando a mudança de plano. Ocorre que, nessa proposta de migração, os
preços ficavam praticamente livres, o que implicou reajustes elevados,
tornando inviável a opção. A situação chegou a um ponto em que o Judiciário
foi provocado a se posicionar. Após todo este processo de intensa disputa de
interesses, o setor de saúde suplementar figura, novamente, como campeão de
reclamações (Tabela 3, em anexo). Se o número de reclamações era elevado
em 2003 e justificava a abertura de CPI, nada se compara ao que ocorre em
2004. A Lei nº 9.656/98, que regulamenta os planos de saúde, ainda é confusa
131
O Estatuto do Idoso que assegura uma série de benefícios para a população acima de 60 anos de idade. O que
proíbe o reajuste por faixa etária a partir desta idade.
132
e fragmentada e continua, conforme dados da ANS de março/2004, com cerca
de 60% dos contratos ainda considerados “antigos”. Paralelamente ao PIAC,
vieram os reajustes anuais, que chegaram a 85%. Para completar o confuso
cenário, em alguns estados, os clientes de planos de saúde enfrentaram
dificuldades para realizar consultas, devido à luta dos médicos por aumento na
sua remuneração. O Ministério da Justiça, por meio do Departamento de
Proteção ao consumidor, elaborou uma nota técnica, assinada conjuntamente
pelos PROCONs e pelo IDEC, condenando os aumentos abusivos. A Justiça
manifestou-se, por meio de liminares,
não aceitando aumentos acima de
11,75%, e até mesmo a ANS declarou que ia autuar as empresas que
aplicassem aumentos abusivos.
Em junho de 2004, o juiz da 1ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco
suspende, através de liminar132, o Programa de Incentivo à Adaptação de
Contrato (PIAC) da ANS, bem como a propaganda institucional que orientava
os clientes de planos de saúde a trocarem seus planos “antigos” pelos “novos”.
Em seu despacho, o juiz federal considera que a “ANS tem extrapolado
os limites éticos – legais de suas funções, haja vista que o Programa de
Incentivo à Adaptação de Contratos tem servido aos propósitos do mercado e
menos às legiões de hiposuficientes contratantes (...)”(Diário de Pernambuco,
23/06/04).
A ANS insiste em manter o programa, recorrendo ao Superior Tribunal
de Justiça. E começa a estudar as alterações das regras, na tentativa de
baratear os custos da transferência e evitar os aumentos nas mensalidades. A
idéia é que as operadoras possam oferecer planos mais simples, com
reembolsos menores, redução no número de hospitais credenciados e
cobrança de uma taxa por consulta ou exame.
Em julho de 2004, as empresas Bradesco, Sul América e Itaú reajustam
de forma unilateral as mensalidades dos clientes de planos de saúde que
optaram em não migrar para o novo sistema. Com o argumento de desrespeito
132
A liminar havia sido concedida a pedido da Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistemas de
Saúde (ADUSEPS), que acusava a ANS de induzir os consumidores a mudarem seus contratos para que as
operadoras conseguissem reajustar seus preços.
133
ao Código de Defesa do Consumidor,. os PROCONs de todo o país e a ANS
trabalham em conjunto, entendendo que as operadoras não podem cometer
abusos na correção das mensalidades, mesmo nos contratos anteriores à Lei,
em que vale o que está estabelecido nos próprios contratos.
A União e a ANS ajuízam na Justiça Federal de Brasília uma medida
cautelar preparatória de ação civil pública contra as empresas Itaú Saúde, Sul
América e Bradesco. Dessa forma, o reajuste dos planos destas operadoras
seria limitado a 11,75%. Simultaneamente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ)
derruba a liminar concedida à Associação de Defesa dos Usuários de Seguros,
Planos e Sistemas de Saúde (ADUSEPS), que suspendia o programa de
migração e adaptação dos contratos de planos de saúde.
Em agosto de 2004, uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
autoriza a ANS a retomar o Programa que incentiva os consumidores de planos
antigos.
Em setembro de 2004, é editada a RN nº 80, alterando os prazos de
adaptação dos contratos e reforçando problemas da Resolução nº 64, quais
sejam: permite reajustes de até 400% para clientes que optarem pela
migração; cria a possibilidade de um índice próprio para adaptação; condiciona
a adaptação à adesão de no mínimo 35% da carteira. Tais medidas são
consideradas prejudiciais aos clientes de planos de saúde pelas entidades de
defesa dos consumidores e instâncias do Poder Judiciário.
A ANS, com base nessa resolução e através do seu portal, sugere aos
clientes de planos de saúde as vantagens de se adaptar a uma nova regra,
apresentando as principais conquistas da Lei nº 9.656/98 e cria uma tabela
estabelecendo os direitos do cliente no plano “antigo” e no plano “novo”.
Atendendo a demandas dos consumidores e com a ameaça de
suspensão do atendimento de clientes de planos de saúde, a ANS, em abril de
2004, passa a ser a mediadora das negociações entre prestadores de serviços
e planos de saúde, com o intuito de obter um acordo. Também por solicitação
de
prestadores
de
serviços
e
entidades
profissionais
de
diferentes
especialidades, a ANS publica a Resolução nº 82/04 que reedita o Rol de
Procedimentos e unifica nomenclaturas.
Pode-se depreender que os conflitos e as tensões entre clientes,
prestadores de serviços, empresas de planos e seguros de saúde e mesmo o
134
padrão de atuação da ANS e a primazia da intervenção do Poder Judiciário no
segmento suplementar não foram alteradas após a CPI.
Nosso objetivo foi o de estudar a CPI dos planos de saúde e o
movimento de atores e
interesses envolvidos na arena parlamentar.
Chegamos à conclusão de que a Constituição de 1988, além de reorganizar a
relação entre os poderes Executivo e Legislativo no interior do Estado, impôs
um padrão diferenciado de representação do setor privado diante destes
Poderes ao longo dos anos 90. Por um lado, a transição para um governo
democrático não rompeu definitivamente as estruturas e os grupos políticos do
regime anterior, o que favorece a manutenção de uma estrutura autoritária que
convive com eleições, partidos políticos e corpo legislativo. Por outro lado,
ainda que de maneira pouco visível as ações e a produção parlamentar no que
se refere à área social e da saúde em especial foram essenciais não apenas à
formulação e aprovação dos preceitos da Reforma Sanitária na Constituinte de
1988, e à garantia de recursos para o Ministério da Saúde, ainda que em
patamares inferiores aos previstos pelo orçamento da Seguridade Social.
Analisando o intervencionismo regulatório, Boshi e Lima (2002) sugerem
que nas relações horizontais entre os Poderes, no novo regime regulatório,
persiste
o
papel
preponderante
do
Executivo
vis-à-vis
as
agências
independentes, sem que se tenha constituído, ainda, um sistema robusto de
fiscalização e prestação de contas horizontal. E se cobrarmos eficiência, na
fiscalização, o que temos na verdade é um mercado extremamente
desregulamentado. Os autores defendem que a “legitimidade da regulação
depende
da
sinergia
entre
responsabilização
de
resultados”
e
“responsabilização de processos” e quando há essa separação o predomínio
do mercado e dos interesses privados no ordenamento da arena pública se
constitui. (Boshi e Lima, 2002:194-253)
Ficou patente na CPI que tanto para as operadoras, e mais ainda para
os clientes de planos de saúde, é difícil de entender toda a legislação do setor
com o seu conjunto de resoluções.
Apesar de alguns pontos desfavoráveis ao consumidor, a Lei nº 9.656/98
que regula os planos de saúde trazia uma série de avanços para evitar os
abusos das empresas de assistência médica. Porém, uma série de medidas
provisórias do CONSU a desfigura, em prejuízo do consumidor. Uma destas
135
medidas é o reajuste de mensalidades. A Lei autorizava a cobrança por
mudanças de faixa etária e o CONSU autorizou as empresas a distribuir os
reajustes entre as faixas como quisessem. Como resultado, os aumentos estão
concentrados na faixa etária mais elevada que sofrem os maiores reajustes. A
CPI colaborou com esta configuração, na medida em que derrubou a emenda
que propunha limitar a 100% o reajuste máximo entre a primeira e a última
faixa etária.
A captação de recursos através do atendimento prestado a pacientes de
planos e seguros de saúde mediante a criação da "dupla porta de entrada"
esbarra em princípios éticos e legais, começando pela Constituição Federal e
passando pela Lei nº 8.080/90, já que institui uma diferenciação de
atendimento entre duas "classes" de paciente. Essa desigualdade pode ir além
das filas, da separação de portarias, consultórios, hotelarias, etc. correndo-se o
risco de, numa mesma instituição, doenças iguais serem diagnosticadas e
tratadas de forma diferente.
Também a aprovação de uma Taxa de Ressarcimento como proposta
para suprir as deficiências do Poder Público sugere que para fazer cumprir uma
Lei de ressarcimento abre-se caminho para que os planos de saúde se achem
no direito de acreditar que, por estarem pagando uma taxa ao SUS, podem
utilizar, a seu critério, as instalações de hospitais públicos. Tal prática também
pode vir a estimular a dupla porta de entrada nas unidades públicas.
Do ponto de vista do cliente de planos de saúde, se os motivos que
levaram à abertura da CPI foram as reclamações, consolidadas pelo relatório
do IDEC, o que se nota é que o efeito que irá produzir pela aprovação do
Projeto de Lei nº 2.934/04, solicitando alteração da Lei nº 9.656/98, contribuirá
muito pouco para mudanças significativas deste cenário. Além do mais,
consultando o andamento de tal proposição, percebe-se uma morosidade na
tramitação, haja vista que, sua última movimentação foi a designação, no dia
29/04/04, do relator, deputado Walter Feldman. Não está claro o motivo dessa
paralisação por cinco meses (ao ser concluída esta dissertação) de sua
tramitação já que vários parlamentares que fizeram parte da CPI também
fazem parte da Comissão Permanente de Seguridade Social e Família.
Contudo, esta demora, não ocorreu com a tramitação do Projeto de Lei
128/04, que autoriza a dedução da base de cálculo do ISS, dos valores
136
despendidos pelas operadoras de planos de saúde com hospitais, médicos e
demais profissionais de saúde, cujo relator também é o deputado Walter
Feldman já deu seu parecer favorável pela aprovação.
Na tentativa de encontrar uma justificativa para esta diferenciação de
tratamento, utilizamos estudo recente de Neto e Santos (2002), que mostra que
os deputados que conseguem ver seus projetos de lei aprovados têm uma
permanência no Congresso em média de 4,6 anos, ou seja, pouco mais de um
mandato. Este dado ainda não esclarece nossas dúvidas, já que a média de
legislatura dos parlamentares que participaram da CPI é de 2,6 mandatos.
Recorrendo a Figueiredo e Limongi (1999), eles mostram que, “as prerrogativas
legislativas do presidente permitem que este, em composição com a maioria no
Colégio de Líderes, centralize e nacionalize a agenda legislativa”. O que nos
leva a crer que os temas do primeiro projeto, temporariamente, não fazem
parte da agenda do Congresso Nacional.
Sem querer nos contrapor a Neto e Santos (2002), que defendem que a
produção de leis não sofre o impacto do interesse individual dos parlamentares,
porque “os procedimentos que regulam tal atividade transferem poder para o
presidente, cuja base política é nacional, ao passo que, no caso dos decretos,
o impacto do Executivo é muito reduzido porque a iniciativa e o veto
presidenciais não podem incidir sobre esse tipo de diploma legal”, as
evidências sugerem que neste caso específico o paroquialismo, no seu uso
mais informal, de grupos com interesses comuns, prevaleceu.
Por outro lado, as recomendações que vimos no capítulo anterior, feitas
ao Executivo e à ANS, como o oferecimento de proposta de migração dos
contratos anteriores a 2 de janeiro de 1999; a vinculação automática dos
reajustes das contraprestações pecuniárias dos planos de saúde aos reajustes
oferecidos pelas operadoras aos prestadores, dentre outras, estão sendo
implementadas com bastante velocidade.
Notícias veiculadas na grande imprensa dão conta de que o diretorpresidente da ANS está trabalhando ”a todo vapor” para concluir um Projeto de
Lei que vai substituir a Lei nº 9.656/98. Este projeto, a ser encaminhado ainda
em 2004 ao Congresso, consolida o arsenal normativo, e cria mecanismos que
permitem ao cliente de planos de saúde trocar de plano, sem ter que cumprir
novo período de carência, regras de regulação de cartões de descontos;
137
convênios e consórcios que se encontram até hoje sem regulação, dentre
outros.
Pessanha (2002) lembra que há sete décadas a maioria das normas
reguladoras sócio/políticas do país é oriunda de legislação emergencial.
O Poder Executivo tradicionalmente protege seu campo de atuação,
evitando a ação fiscalizadora e coadjuvante do Legislativo; por outro
lado, atua de forma deliberada no campo legislativo, dentro e fora dos
limites estabelecidos, em alguns momentos pela força das armas,
impondo regras de forma arbitrária, e em outros, pela força das
maiorias, operando à margem dos textos constitucionais e
beneficiando-se da aquiescência ou da resignação do Legislativo.
(Pessanha, 2002:180).
Esta posição do Legislativo e da ANS só vem corroborar o que vários
autores ilustram, quando afirmam que o Executivo junto com o Colégio de
Líderes possui meios e instrumentos para controlar as comissões e definir a
agenda (Pereira e Mueller, 2000, Figueredo e Limongi, 1999).
As Comissões Parlamentares de Inquéritos (CPI) foram instituídas como
instrumento do Poder Legislativo para investigar aquilo que prejudica o que é
público. O termo jurídico - de sessão de tribunal em que se interrogam as
partes e as testemunhas - foi substituído pelo ato de ouvir ou de dar atenção
àquele que fala. Nas audiências que a CPI realizou com representantes dos
órgãos de defesa do consumidor, todos acusaram as operadoras de cometer
irregularidades contra os usuários. O diretor do Departamento de Proteção e
Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça, Ricardo Morishita133, disse, por
exemplo, que as empresas abusam da boa-fé dos clientes ao dividir com eles o
risco do empreendimento,
sem compartilhar os lucros. Na fase de
depoimentos dos representantes dos profissionais da saúde, os presidentes da
Federação Nacional dos Médicos, Heder Murari134, e do Conselho Federal de
Medicina, Edson Andrade135, entregaram aos deputados dossiês com
denúncias de usuários e de médicos, acusando a ANS de não fiscalizar as
operadoras e estas de pôr em risco a vida dos usuários, ao interferir em nos
procedimentos médicos. Contudo, o relator da CPI - o deputado Ribamar Alves
- afirma que durante as investigações não foram notificadas ou aplicadas
133
Fonte: Audiência 24/06/03
Fonte: Audiência 26/06/03
135
Fonte: Audiência 26/06/03
134
138
sanções às empresas suspeitas de irregularidades porque:
(...) Não chegou às nossas mãos nenhum dado concreto que
mostrasse a necessidade de punir alguém. O que estamos propondo
é a modificação da lei, para que os usuários possam ter melhores
benefícios. Quando estabelecemos a CPI, deixamos bem claro que
não iríamos usar nossa prerrogativa de poder de polícia, mas
trabalhar como se estivéssemos fazendo uma consulta médica, ou
seja, ouvindo as queixas, examinando, fazendo um diagnóstico e
então propondo a melhor terapêutica possível".
Fonte: Agência Câmara (17/11/2003)
A incapacidade dos parlamentares de perceber os problemas e
transformá-los em decisões políticas sugere algumas vezes que as autoridades
públicas colocam seus interesses particulares em detrimento aos interesses da
sociedade. Ao invés das ações serem convertidas em ações públicas, são
executadas políticas de interesse próprio, o que é uma forma de privatizar o
Estado.
Ainda que seja natural nas votações um ou mais parlamentares
discordarem da decisão majoritária do partido, como foi o caso da dupla porta
de entrada, não se pode ignorar que apresentam lealdades incertas,
evidenciadas pelo fenômeno de intensa migração interpartidária (Figueiredo e
Limongi, 1999). Talvez por isso, nos confrontemos com uma impossibilidade de
aferir o grau de coincidência ou de compatibilidade que existe entre os anseios
da população através do voto e sua expressão ou representação parlamentar.
Clientes de planos de saúde estão temerosos de reajustes elevados nas
mensalidades dos seus planos. Médicos quererem obter melhor remuneração
pelos serviços prestados às operadoras. Hospitais, clínicas e laboratórios
reclamam das pressões que sofrem das operadoras para reduzir custos. As
operadoras reclamam que médicos, pacientes e hospitais pedem exames
demais, só porque estão no plano. Resumidamente estas foram as conclusões
a que chegamos ao analisarmos o trabalho da CPI.
Apesar do Brasil ter um sistema público universal de saúde, a maior
parte do gasto nesta área no Brasil não é feita pelos governos. Relatório da
Organização Mundial de Saúde (OMS,) mostra que de todos os gastos com
saúde apenas 41,6% são recursos públicos. O restante (58,4%) é proveniente
de fontes privadas, o que inclui despesas de pessoas e empresas com planos
de saúde, exames, consultas e remédios. A contradição entre o SUS
legalmente formulado e a forma do Estado se eximir de suas responsabilidades
139
na oferta de serviços de assistência à saúde, como prevista na Constituição
Federal, é patente. Nessa perspectiva, a questão básica que se apresentou
sobre o setor de saúde suplementar foi que para conter o poder econômico das
empresas e dar conseqüência aos princípios normativos é preciso que haja a
promoção comum dos objetivos das políticas de saúde. Perdeu-se de vista que
há um único sistema de saúde no Brasil cujas diretrizes devem ser emanadas
do Ministério da Saúde. Ser público ou privado é apenas uma questão de
atribuição da responsabilidade da atenção.
De tudo que foi visto, algumas perguntas se colocam: i) com o atual
sistema sócio/econômico é possível separar interesses público do privado?; ii)
a proposta original do SUS tem condições de alterar substantivamente a
qualidade e eficiência dos serviços públicos?; iii) quais as possibilidades de
regular a atenção à saúde suplementar mediante a regulação das Leis do SUS
e da Lei nº 9.656/98?; iv) sem nos afastarmos do caráter de obrigatoriedade da
ação pública, quem são os representantes que defendem e atendem às
demandas colocadas pela sociedade?.
O estudo deste tema possibilitou não só compreender a trajetória das
políticas de saúde e as questões individuais envolvidas, como também
perceber o imbricamento da relação público e privado. A presença de
empresários médicos no cenário político, que também se vinculam tanto ao
SUS quanto às operadoras, configura a complexidade e a dinâmica de
funcionamento do sistema de saúde no país.
A quantidade de informações coletadas e organizadas pela CPI aponta
para a necessidade de aprofundamento do debate sobre o setor em todas as
dimensões apresentadas neste trabalho, bem como o aprofundamento dos
desafios aqui colocados.
140
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147
ANEXOS
Tabela 1: Leitos para interação nos estabelecimentos de saúde, por
classificação da entidade mantenedora do estabelecimento - Brasil - 1976/2002.
Leitos para Internação nos Estabelecimento de Saúde
Ano
Entidade Mantenedora
Total
Público
Privado
1976
443.888
119.062
324.826
1977
455.712
121.209
334.503
1978
475.452
124.575
350.877
1979
488.323
118.463
369.860
1980
509.168
122.741
386.427
1981
522.769
124.866
397.903
1982
530.501
127.580
402. 921
1983
534.055
127.521
406. 534
1984
538.721
127.537
411.184
1985
532.283
137.543
394.740
1986
512.346
114.548
397.798
1987
519.698
115.842
403.856
1988
527.196
120.776
406.420
1989
522.895
119.530
403.365
1990
533.558
124.815
408.743
1992
544.357
135.080
409.277
1999
484.945
143.074
341.871
2002
471.171
146.319
324.852
Fonte: IBGE, Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária (AMS) 1976/2002.
148
Tabela 2: Multas Aplicadas, por artigos da Lei nº 9.656/987, às principais
operadoras
Multas Aplicada as Principais Operadoras
Operadora/ artigos
Art. 2
Art. 3
Art. 4
Art. 5
Art. 6
Art. 7
Art. 8
Art. 9
Art. 10
Art. 11
Art. 12
Art. 13
Art. 14
Art. 15
Art. 16
Art. 17
Art. 18
Art. 19
Art. 20
Art. 21
Art. 22
Art. 23
Art. 24
Art. 25
Art. 26
Art. 27
Art. 28
Art. 29
Art. 30
Art. 31
Art. 32
Art. 33
Art. 34
Art. 35
Total
HAPVIDA
AMÉRICA PETROBRAS SAUDE RIO
ASSISTENCIA
SAÚDE DISTRIBUID
DE
MEDICA LTDA
S.A.
ORA S.A.
JANEIRO
CA
CAS
CROSS
FUNDAÇÃO SAUDE E ASSISTÊNC
SISTEMA PLANOS DE ASSISTENC
DE
ASSISTENC IA M ÉDICA
DE SAUDE SAÚDE S/A
IA
SEGURIDA
IA S.A
INTERNACI
1
1
1
1
1
CASSI
UNIMED
3
6
2
5
1
17
2
30
19
3
2
1
5
2
1
12
3
1
1
3
5
3
28
21
8
4
1
1
3
9
8
61
17
66
1
1
25
7
3
2
Total
1
1
1
1
2
1
1
6
1
1
3
9
1
3
15
53
4
4
32
1
3
41
2
398
22
1
6
16
525
Fonte: Dados extraídos da planilha “Gerenciamento de Multas Pecuniárias – Posição em 10/09/2003”
fornecidas pela Diretoria de Gestão/ANS
1
1
1
28
4
9
3
6
0
2
0
4
1
107
41
44
4
0
2
11
41
2
430
0
0
0
0
27
0
0
0
0
0
0
0
0
0
54
792
149
Tabela 3: Índice de Reclamações Pós CPI
Operadoras com mais de 50.000 Beneficiários Ativos
Ordem descendente pelo Índice de Reclamações
Ranking
Julho
2004
Ranking
Agosto
2004
8
2
4
3
14
4
11
6
5
7
3
8
12
10
20
11
48
15
Razão Social
Qtde.
Benef.
Julho
2004
SUL AMERICA COMPANHIA
1.236.173
DE SEGURO SAÚDE
GOLDEN CROSS
ASSISTENCIA
372.102
INTERNACIONAL DE
SAUDE LTDA
BRADESCO SAÚDE S/A
2.442.496
UNIMED CAMPINAS 441.025
COOPERATIVA DE
TRABALHO MÉDICO
AMIL ASSISTÊNCIA
MÉDICA INTERNACIONAL
779.747
LTDA
UNIMED-SÃO GONÇALO NITERÓI 52.981
SOC.COOP.SERV.MED E
HOSP LTDA
INTERCLÍNICAS PLANOS
234.375
DE SAÚDE S/A
MEDIAL SAÚDE S/A.
612.897
SUL AMÉRICA SEGURO
1.017.971
SAÚDE S/A
Qtde.
Reclamações
Agosto
2004
Indice
Reclamações
Agosto
2004
Indice
Reclamações
Julho
2004
699
5,65
1,06
121
3,25
1,99
556
2,28
0,79
48
1,09
0,97
80
1,03
1,46
4
0,75
2,83
15
0,64
0,85
39
0,64
0,58
43
0,42
0,17
Fonte: ANS/set/04
Total de Operadoras com mais de 50.000 Beneficiários Ativos: 141
Total de Beneficiários das Operadoras ativas com mais de 50.000 Beneficiários Ativos: 6.144.589
% de Operadoras ativas com mais de 50.000 Beneficiários Ativos: 8,8
% de Beneficiários das Operadoras ativas com mais de 50.000 Beneficiários Ativos: 67,7
Total de linhas resultantes desta busca : 15
Observação: A ANS informa que o índice de reclamações foi calculado fazendo a razão entre o número
de ligações com indício de irregularidade e o número de beneficiários ativos informados ao Cadastro de
Beneficiários ANS, multiplicado por 10.000 (o índice maior indica um número maior de reclamações com
indício de irregularidade por beneficiário).
150
Quadro 1: Cadastro de Beneficiários por Classificação de Operadora
Em
Relação
Classificação
Operadora
à Beneficiários Anteriores à Beneficiários
da Lei
Pós Lei
N.º
Total de
Beneficiário
Administradora
N.º
5.532
%
0,02
N.º
30
0,00
5.562
Benef.
Anterior
X
Total
%
99,46
Autogestão
3.918.701
17,20
1.554.028
10,85
5.472.729
71,60
28,40
Cooperativa Médica
5.527.376
24,27
3.530.296
24,64
9.057.672
61,02
38,98
Cooperativa
591.837
2,60
616.339
4,30
1.208.176
48,99
51,01
Filantropia
870.254
3,82
484.206
3,38
1.354.460
64,25
35,75
Medicina de Grupo
7.192.624
31,58
5.218.276
36,42
12.410.900
57,95
42,05
Odontologia de Grupo
1.402.807
6,16
1.198.108
8,36
2.600.915
53,94
46,06
Seguradora
3.205.842
14,07
1.677.241
11,71
4.883.083
65,65
34,35
Seguradora
59.453
0,26
49.471
0,35
108.924
54,58
45,42
Ignorado
4.370
0,02
0
0,00
4.370
100,00
0
Total:
22.778.796
100
14.327.995
100
37.106.791
61,39
38,61
%
Benefic.Pós
X
Total
%
0,54
Odontológica
Especializada
em
Saúde
Fonte: Registro Cadastro de Beneficiários – jul/03 – ANS
151
Quadro 2: Operadoras Registradas Segundo Região da Sede e Classificação
Classificação da Operadora
Norte
Nordeste
Sudeste Sul
C. Oeste
Total
Administradora de Planos
0
1
6
2
0
9
Administradora de Serviços
1
4
19
4
1
29
Autogestão Não Patrocinada
3
21
70
23
15
132
Autogestão Patroc. Multipatrocinada
1
3
15
10
6
35
Autogestão Patroc. Multipatrocinada / RH
0
0
1
1
1
3
Autogestão Patrocinada Singular
0
7
17
2
11
37
Autogestão Patrocinada Singular / RH
5
5
98
21
9
138
Cooperativa Médica
18
66
183
67
36
370
Cooperativa odontológica
6
26
99
30
12
173
Filantropia
2
9
95
19
1
126
Medicina de Grupo
26
100
495
130
39
790
Odontologia de Grupo
8
67
268
86
19
448
Seguradora Especializada em Saúde
0
0
13
1
0
14
Total
70
309
1.379
396
150
2.304
Fonte: Cadastro de Operadoras - ANS/MS - 03/09/03. Censo Demográfico estimativa 2002 – IBGE.
Nota: Todas as operadoras com registro na ANS e que não foram descredenciadas são consideradas operadoras
registradas.
152
Quadro 4: Artigo 35, 36 e 37 da Constituição Federal
Subseção II
Das Comissões Parlamentares de Inquérito
Art. 35. A Câmara dos Deputados, a requerimento de um terço de seus membros, instituirá Comissão Parlamentar de
Inquérito para apuração de fato determinado e por prazo certo, a qual terá poderes de investigação próprios das
autoridades judiciais, além de outros previstos em lei e neste Regimento.
§ 1 o Considera-se fato determinado o acontecimento de relevante interesse para a vida pública e a ordem
constitucional, legal, econômica e social do País, que estiver devidamente caracterizado no requerimento de
constituição da Comissão.
§ 2 o Recebido o requerimento, o Presidente o mandará a publicação, desde que satisfeitos os requisitos regimentais;
caso contrário, devolvê-lo-á ao Autor, cabendo desta decisão recurso para o Plenário, no prazo de cinco sessões,
ouvida a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
§ 3 o A Comissão, que poderá atuar também durante o recesso parlamentar, terá o prazo de cento e vinte dias,
prorrogável por até metade, mediante deliberação do Plenário, para conclusão de seus trabalhos.
§ 4 o Não será criada Comissão Parlamentar de Inquérito enquanto estiverem funcionando pelo menos cinco na
Câmara, salvo mediante projeto de resolução com o mesmo quorum de apresentação previsto no caput deste artigo.
§ 5 o A Comissão Parlamentar de Inquérito terá sua composição numérica indicada no requerimento ou projeto de
criação.
§ 6 o Do ato de criação constarão a provisão de meios ou recursos administrativos, as condições organizacionais e o
assessoramento necessários ao bom desempenho da Comissão, incumbindo à Mesa e à Administração da Casa o
atendimento preferencial das providências que a Comissão solicitar.
Art. 36. A Comissão Parlamentar de Inquérito poderá, observada a legislação específica:
I - requisitar funcionários dos serviços administrativos da C7âmara, bem como, em caráter transitório, os de qualquer
órgão ou entidade da administração pública direta, indireta e fundacional, ou do Poder Judiciário, necessários aos seus
trabalhos;
II - determinar diligências, ouvir indiciados, inquirir testemunhas sob compromisso, requisitar de órgãos e entidades da
administração pública informações e documentos, requerer a audiência de Deputados e Ministros de Estado, tomar
depoimentos de autoridades federais, estaduais e municipais, e requisitar os serviços de quaisquer autoridades,
inclusive policiais;
III - incumbir qualquer de seus membros, ou funcionários requisitados dos serviços administrativos da Câmara, da
realização de sindicâncias ou diligências necessárias aos seus trabalhos, dando conhecimento prévio à Mesa;
IV - deslocar-se a qualquer ponto do território nacional para a realização de investigações e audiências públicas;
V - estipular prazo para o atendimento de qualquer providência ou realização de diligência sob as penas da lei, exceto
quando da alçada de autoridade judiciária;
VI - se forem diversos os fatos inter-relacionados objeto do inquérito, dizer em separado sobre cada um, mesmo antes
de finda a investigação dos demais.
Parágrafo único. As Comissões Parlamentares de Inquérito valer-se-ão, subsidiariamente, das normas contidas no
Código de Processo Penal.
Art. 37. Ao termo dos trabalhos a Comissão apresentará relatório circunstanciado, com suas conclusões, que será
publicado no Diário da Câmara dos Deputados e encaminhado:
I - à Mesa, para as providências de alçada desta ou do Plenário, oferecendo, conforme o caso, projeto de lei, de
decreto legislativo ou de resolução, ou indicação, que será incluída em Ordem do Dia dentro de cinco sessões;
II - ao Ministério Público ou à Advocacia-Geral da União, com a cópia da documentação, para que promovam a
responsabilidade civil ou criminal por infrações apuradas e adotem outras medidas decorrentes de suas funções
institucionais;
III - ao Poder Executivo, para adotar as providências saneadoras de caráter disciplinar e administrativo decorrentes do
art. 37, §§ 2 o a 6 o , da Constituição Federal, e demais dispositivos constitucionais e legais aplicáveis, assinalando
prazo hábil para seu cumprimento;
IV - à Comissão Permanente que tenha maior pertinência com a matéria, à qual incumbirá fiscalizar o atendimento do
prescrito no inciso anterior;
V - à Comissão Mista Permanente de que trata o art. 166, §1 o , da Constituição Federal, e ao Tribunal de Contas da
União, para as providências previstas no art. 71 da mesma Carta.
Parágrafo único. Nos casos dos incisos II, III e V, a remessa
será feita pelo Presidente da Câmara, no prazo de cinco sessões.
(Regimento Interno, Câmara dos Deputados,1989)
153
Quadro 7: Ofício de solicitação de aumento da Tabela do SUS
OF/FPS: 011 2004
Brasília - DF, 19 de maio de 2004.
A Sua Excelência o Senhor
Ministro de Estado Humberto Sérgio Costa Lima
Ministério da Saúde
Esplanada dos Ministérios - Bloco G
Fax.: 61-224-8747
70058-900 - Brasília - DF
Assunto: Reivindicação de Reajustes para a Atenção Ambulatorial e Hospitalar
Senhor Ministro
A Frente Parlamentar da Saúde (FPS), no exercício da sua missão de contribuir para o perfeito desenvolvimento do
Sistema Público de Saúde e conhecendo as dificuldades e os graves problemas que afligem os prestadores de
serviços ao SUS, muitos deles em situação pré-falimentar e outros já em fase de encerramento de suas atividades,
vem realizando inúmeras audiências públicas e reuniões com dirigentes dos vários segmentos que atuam nesta
áreas: hospitais, médicos, gestores públicos, parlamentares e técnicos, tendo obtido informações que substanciam as
suas suposições iniciais sobre o grave desfinanciamento do setor.
Em recente reunião com a Associação Brasileira de Hospitais Universitários e de Ensino, Confederação das Santas
Casas, Hospitais e Entidades Filantrópicas, Confederação Nacional de Saúde e Federação Brasileira de Hospitais, a
FPS teve ciência e está convencida, pelos documentos em anexo, de que a situação da rede prestadora de serviços ao
SUS, de todas as naturezas jurídicas - Universitária e Privada Filantrópica e Lucrativa - atravessa situação econômico
financeira insustentável, sendo necessário adoção de medidas imediatas para correção dos seus valores
remuneratórios, sob pena de total desassistência à população brasileira, no curto prazo.
Também reforçam os dados e números das entidades acima, o excelente trabalho de levantamento realizado pela
Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais, em anexo, onde se constata a real e assustadora defasagem entre os
custos reais da produção dos serviços e os valores das tabelas do SUS.
Embora se noticie que o Ministério da Saúde promoveu substancial reajuste na área de internação em 2003, a Frente
Parlamentar apurou que, na realidade, este foi aplicado em apenas 285 dos 2.200 procedimentos que integram a
Tabela do Sistema de Informações Hospitalares - SIH. Vale esclarecer, ainda, que os procedimentos reajustados foram
apenas os de média complexidade, com valor unitário de internação de até R$ 306,00 e impacto financeiro inferior a
8%. Os demais procedimentos não foram contemplados, o que gerou impacto global em toda a tabela inferior a 3%.
No momento, as propostas do Ministério da Saúde abrangem apenas outros 155 procedimentos de média
complexidade, com percentuais que, se aplicados ao faturamento dos hospitais, gerará impacto de inexpressivo
significado.
Embora tenha havido proposta de correções pontuais sobre alguns outros procedimentos ambulatoriais e de
internação, o total dos recursos até aqui disponibilizados para recomposição das tabelas (reajustes) representa menos
de 4% dos valores gastos em 2.003, quando o Orçamento do Ministério da Saúde para 2004 foi reajustado em 19%.
Por ocasião da votação do orçamento de 2004, os R$ 4 bilhões realocados permitem um reajuste mínimo de 15%, sem
necessidade de recurso suplementar. Acresça-se, ainda, a disponibilidade de outros R$ 600 milhões do orçamento de
2003, apurados pelo cálculo definitivo da variação nominal do Produto Interno Bruto (PIB), e não aplicados conforme
prevê a Emenda Constitucional n.º 29. Importante ressaltar que esta proposta considera estritamente os limites
orçamentários aprovados e não a real necessidade da área da saúde.
Diante dos fatos relatados e dos documentos apresentados, urge que o Ministério da Saúde reveja sua posição e
aplique na área assistencial os recursos necessários para o início da recuperação da péssima situação dos
prestadores de serviços de saúde.
Entendemos que um mínimo de 15% sobre os valores gastos no ano passado devem ser aplicados nessa área,
devendo ser priorizados os procedimentos e atos indicados pelas entidades representativas do setor saúde.
Atenciosamente,
Dep. Federal RAFAEL GUERRA
Presidente da Frente Parlamentar da Saúde
154
136
Quadro 9: Resumo da Votação Final
Deputados
Aprovação
Relatório
SIM NÃO
do
Destaque Nº
137
1 (*)
Aprovado
Destaque Nº Destaque Nº 7
138
6 (**)
e 9 (**)
SIM
NÃO
Rejeitado
139
Destaque Nº
140
8 (*)
Aprovado
Destaque
141
Nº10 (*)
Aprovado
Destaque Nº Destaque Nº
142
143
12 (*)
15 (*)
Aprovado
Aprovado
PT
Titular
Henrique Fontana
X
X
Antonio Carlos
X
X
Arlindo Chinaglia
-
-
Florisvaldo Fier
-
-
X
-
-
-
Biscaia
Suplente
João Batista dos
Santos
Roberto Gouveia
(*) Não foi possível identificar o voto por deputado tendo em vista que a votação aconteceu da seguinte
forma ” os Deputados que aprovam a supressão do texto permaneçam como se encontram. Aprovado o
Destaque.”
(**)Não foi possível identificar o voto por deputado tendo em vista que a votação aconteceu da seguinte
forma” os Deputados concordam com a manutenção do texto original do relator permaneçam como se
encontram. Rejeitado o Destaque
136 Quem vota inicialmente é o titular, não completando o número o suplente vota. Só estão marcados os votos que foram representados nas notas taquigráficas, talvés por isso nossa
contagem é diferente da declarada pelo presidente da CPI( para aprovação do relatório ele afirma que o número foi de 19 a favor e 2 contra, e só conseguimos identificar 17 e 3
respectivamente. Quanto ao destaque número 6 a diferença é ainda maior. O presidente declara 14 votos sim e 8 não, enquanto que só conseguimos levantar 7 votos sim e 5 não. Também
não foi possível esclarecer quem se absteve ou não estava realmente presente, já que apenas dois deputados justificaram sua ausência.
137 Destaque nº 1, assinado pelo Deputado Roberto Jefferson: “Requer, para votação, DVS supressivo do Item A - XIV[0], onde propõe a supressão do Item A - XIV”. Que altera o Art. 35[0]G, não permitindo a influencia da justiça
138 O destaque nº 6 propõe a supressão da letra “c” do relatório onde se sugere a urgência na tramitação do Projeto de Lei nº 830, do ilustre Deputado Dr. Pinotti, que dispõe sobre o
atendimento nos hospitais públicos da rede SUS. O destaque é para suprimir todo item “c”.
139 O deputado Pinotti e Jamil Murad propõe a retirada integral do § 12, que se refere às orientações de substituir o ressarcimento ao SUS por uma taxa
140 Destaque nº8 do Deputado Perondi propõe a supressão do parágrafo único do art. 15 do projeto de lei proposto pelo Relator que fala a respeito da variação de contraprestação
pecuniária por idades. E que diz o seguinte: A variação das contraprestações pecuniárias entre a primeira e a última faixa etária não poderá ser superior a 300% — conforme acolheu o
Relator durante a discussão — , observado o disposto no art. 15, § 3º, da lei tal, tal e tal.
141 A deputada Laura Carneiro encaminha destaque para a manutenção da ANS no Rio de janeiro
142 Destaque nº 12 - Apresentado pelo Deputado José Linhares, “propõe a supressão do item “d” do relatório. Propõe a supressão do pedido de urgência para um Projeto de Lei nº 1.603,
de autoria do Deputado Mário Heringer que contempla o plantão 24 horas para liberação de atendimentos fazendo contraponto à proibição do cheque caução, a uniformização dos formulários
onde vai poder se trabalhar a epidemiologia desses 35 milhões de brasileiros dos planos de saúde, contempla o descredenciamento indiscriminado, que é o mecanismo de pressão para
submissão financeira que os planos de saúde fazem sobre os seus credenciados, cria o credenciamento universal que aumenta a opção de escolha pelos usuários, diminui a exclusão
profissional de médicos e outros profissionais liberais
143 Destaque nº 15 do deputado Darcísio Perondi para suprimir o parágrafo Regulamentação do controle social em cada operadora, com instalação de conselhos gestores paritários,
assembléias anuais com participação dos usuários e telefone 0800 para prestar informações e atendimentos aos usuários”..
155
Quadro 9: Resumo da Votação Final
(Cont.)
Deputados
Aprovação
do
Relatório
SIM
Não
Destaque
Nº 1(*)
Aprovado
Destaque
Nº 6 (**)
SIM
NÃO
-
-
PFL
Titular
Júlio Cesar
-
-
de Carvalho
Lima
Laura
X
X
X
-
Carneiro
Robson
-
Tuma
Suplente
X
José
X
Aristodemo
Pinotti
Ney Lopes
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
de Souza
José
Francisco
Paes
Landim
144
PMDB
Titular
Luiz José
X
Bittencourt
Max
X
Rosenmann
José Saraiva
X
X
Felipe
Suplente
Asdrubal
-
-
-
Mendes
Bentes
144 Hoje o deputado Paes Landim é Vice líder do PTB
-
Destaque
Nº 7 e 9 (**)
Rejeitado
Destaque
Nº8 (*)
Aprovado
Destaque
Nº10 (*)
Destaque Nº Destaque Nº 15 (*)
12 (*)
Aprovado
Aprovado
Aprovado
156
Quadro 9: Resumo da Votação Final
(Cont.)
Deputados
Darcísio
Aprovação
Relatório
do Destaque
Nº 1 (*)
SIM
X
Não
-
-
Aprovado
Destaque
Nº 6
(**)
SIM NÃO
Paulo
Perondi
Silas
-
-
-
-
Brasileiro
PSDB
Titular
João Castelo
X
Ribeiro
Gonçalves
Sebastião
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
-
X
-
-
X
-
-
Torres
Madeira
Yeda Rorato
Crusius
Suplente
Luiz Carlos
Hauly
José Rafael
Guerra Pinto
Coelho
Walter
Meyer
Feldman
Destaque
Nº 7 e 9
(**)
Rejeitado
Destaque
Nº8 (*)
Destaque
Nº10 (*)
Destaque Nº Destaque Nº 15 (*)
12 (*)
Aprovado
Aprovado
Aprovado
Aprovado
157
Quadro 9: Resumo da Votação Final
(Cont.)
Deputados
Aprovação do Destaque
Relatório
Nº 1
SIM
Não
Aprovado
Destaque Nº Destaque
6 (**)
Nº 7 e 9 (**)
SIM NÃO
Rejeitado
PP
Titular
Benedito Dias X
de Carvalho
Nelson
X
-
-
X
Meurer
Suplente
Enivaldo
-
-
José Linhares -
-
Ribeiro
Ponte
PTB
Titular
Roberto
X
-
-
-
-
-
X
-
-
Jefferson
Monteiro
Francisco
Silas Câmara
-
Suplente
Arnaldo Faria
de Sá
Destaque
Nº8 (*)
Aprovado
Destaque
Nº10(*)
Aprovado
Destaque
Nº 12 (*)
Aprovado
Destaque Nº 15
(*)
Aprovado
158
Quadro 9: Resumo da Votação Final
(Cont.)
Deputados
Aprovação do
Relatório
Destaque Nº
1
Aprovado
Destaque Nº 6
(**)
SIM
Não
SIM
-
-
X
-
X
NÃO
Destaque Nº
7 e 9 (**)
Destaque Nº8
(*)
Destaque Nº10
(*)
Destaque
Nº 12 (*)
Destaque Nº 15
(*)
Rejeitado
Aprovado
Aprovado
Aprovado
Aprovado
PL
Titular
Vanderval Lima
dos Santos
José Maurício
X
Rabelo
Suplente
Almir Oliveira
-
-
-
-
Moura
Carlos Mota
PSB
Titular
José Ribamar
X
Alves
Suplente
Alexandre
-
-
-
-
145
-
-
-
-
Geraldo Resende
X
-
-
Cardoso
PPS
Titular
Colbert Martins
Suplente
145
Deputado ausente por se encontrar em missão oficial
159
Quadro 9: Resumo da Votação Final
Deputados
Aprovação
Relatório
SIM
NÃO
do Destaque
Nº 1
Aprovado
Destaque Nº
6
(**)
SIM
NÃO
PDT
Titular
Mário
Lúcio X
-
-
-
-
Heringer
Suplente
Ricardo
Wagner
de
Carvalho Lago
PC do B
Titular
Jandira
Feghali
146
Suplente
Jamil Murad
x
PRONA
Titular
Elimar Máximo X
X
Damasceno
Suplente
Vanderlei Assis
146
X
Ausente porque o filho estava hospitalizado
X
Destaque Destaque
Nº 7 e 9 Nº8 (*)
(**)
Rejeitado
Aprovado
Destaque
Nº10 (*)
(Cont.)
Destaque Nº Destaque
15
12 (*)
Aprovado
Aprovado
Aprovado
Nº
160
Quadro 10: Votação dos Destaques Supressivos
1. Destaque Nº 1 – assinado pelo Deputado Roberto Jefferson: “Requer, para votação, DVS supressivo do
Item A - XIV, onde propõe a supressão do Item A - XIV”. Que altera o Art. 35-G
Defesa a favor da supressão
Deputado Roberto Jefferson – Sr. Presidente, inicialmente, meus cumprimentos a V.Exa., ao Relator,
pela aprovação do relatório, comedido, de bom senso, sereno, num momento difícil, de crise, de conflito
contratual entre médicos, operadoras de saúde, hospitais, toda a crise que se viu instalada aqui, nesta
Comissão de Inquérito, não fala em relação ao usuário, fala em relação ao conflito contratual existente
entre a rede credenciada, entre os médicos credenciados, entre os laboratórios credenciados. E V.Exa.
conseguiu tangenciar essa crise econômica que tomava conta do debate da CPI e fazer um bom relatório.
O meu destaque, Sr. Presidente, Sr. Relator, é para que nós possamos impedir que a Justiça continue a
interferir, e agora se nós permitirmos que essa redação prevaleça, de maneira absurda, nas relações dos
planos de saúde, das operadoras de saúde e os usuários. Hoje, a Justiça, contra a lei, contra o contrato,
afoga as operadoras com decisões que têm causado um grave prejuízo e um desequilíbrio brutal ao cálculo
atuarial das operadoras, exigindo que se dê tudo numa contrapartida mínima. Nós entendemos que a lei
que nós votamos aqui, no Congresso Nacional, a lei que regulamenta os planos de saúde, é a lei
específica da matéria. O que se diz aqui do Código de Defesa do Consumidor não é verdade, porque não é
código, é uma Lei de Defesa do Consumidor que se aplica subsidiariamente, é que tem levado à constante
crise da relação dos planos de saúde com o usuário. Não é a lei que nós votamos, não é a regulamentação
da agência, é a Lei de Defesa do Consumidor, feita num tempo anterior, sem o debate que esta Comissão
travou, sem a especificidade do debate que esta Comissão travou, é que vem levando a uma crise enorme
ao setor, tanto no atendimento à saúde, como na relação usuário e empresa operadora. Sr. Presidente, eu
insisto, para que nós possamos manter o equilíbrio da relação, que esse destaque deve ser aprovado. E
pergunto ao Presidente novamente se é “sim” para acolher o destaque, é “sim” que eu devo encaminhar o
voto, Sr. Presidente?
Então, eu gostaria de encaminhar o voto “sim”, para que nós pudéssemos tirar desse texto mais um ponto
que agrava a relação do usuário com a empresa e dar força de novo àquelas pessoas que intervêm, numa
relação muito clara, muito equilibrada, de bom senso, que nós vimos aqui colocadas na CPI, 1% apenas a
crise, o conflito existindo entre os usuários e os planos de saúde. Mas há o Judiciário, que às vezes
caminha por essa visão da Lei de Defesa do Consumidor, provocado pelo Ministério Público, que caminha
pela defesa do consumidor, e tem levado a um grave conflito e a uma grave crise atuarial no sistema. Sr.
Presidente, em nome do equilíbrio, eu encaminho “sim”, a favor do destaque.
Defesa contra a supressão
Deputado Antonio Carlos Biscaia – Sr. Presidente, os óbices que são colocados à nova redação do art. 35 G estão relacionados com a falta de técnica legislativa e, além disso, ao mérito. Quanto à técnica
legislativa, não há nada que a afete, porque o art. 197 da Constituição Federal, ele é referido apenas em
sua parte inicial, e a repetição do dispositivo constitucional na legislação infraconstitucional não constitui
nenhuma forma de violação de uma boa técnica legislativa. Eu cito como exemplo aqui o novo Código Civil.
O novo Código Civil, em seu art. 1.596 — o eminente Deputado João Castelo foi Presidente da Comissão
—, reproduz um dispositivo constitucional do art. 227, § 6º, ao dispor: “Os filhos havidos ou não da relação
do casamento ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações proibidas, quaisquer designações
incriminatórias relativas à filiação”. A legislação infraconstitucional reproduz, é o que está sendo feito aqui,
de certa forma. Quanto ao mérito, eu também sustento a total pertinência do dispositivo, até porque ele se
coaduna com o próprio art. 2º da Lei nº 8.080, de 90, que dispõe sobre condições para promoção,
proteção, recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes, dando
outras providências. É inquestionável que o art. 197 consagra que todas as ações e serviços de saúde são
de relevância pública. E, afinal de contas, essas questões quando, de alguma forma, as cláusulas
contratuais provocam algum tipo de conflito, é o Poder Judiciário que vai, afinal de contas, dirimir esses
conflitos. Isso é um preceito básico de natureza constitucional. Nós apenas estamos, com essa regra,
explicitando que o serviço de saúde constitui um serviço de relevância pública e, como tal, legitima o
Ministério Público para questionar certas questões. Por isso, Sr. Presidente, a posição é no sentido da
manutenção da proposta do eminente Relator.
Destaque Nº 6 - O destaque propõe a supressão da letra “c”, onde sugere a urgência na tramitação do Projeto
de Lei nº 830, do Deputado Dr. Pinotti, que dispõe sobre o atendimento nos hospitais públicos da rede SUS. O
destaque é para suprimir todo item “c”.
Defesa a favor da supressão
Deputado Walter Feldman - Eu entendo a visão doutrinária do Deputado Dr. Pinotti, mas a aprovação de
um requerimento de urgência para esse projeto, com essas características, na nossa avaliação é contrário ao
texto que foi aprovado pelo Relator Dr. Ribamar Alves. Portanto, a nossa sugestão é pela aprovação desse
destaque.
Defesa contra a supressão
Deputado Pinotti - Bom, eu lamento, Sr. Presidente, porque estou vendo que a vontade da Casa é que
exista a segunda porta. Eu vou me manifestar contrariamente a isso sempre por uma questão de princípios,
por uma questão de defesa dos doentes pobres do SUS que são prejudicados por isso, por uma questão de
alternativas claras que podem existir para suprir os hospitais.
3. Destaque Nº 7 – Assinado pelo Deputado Pinotti recomenda a retirada integral do § 12, que se refere às
orientações no sentido de substituir o ressarcimento ao SUS por uma taxa por parte dos planos
Defesa a favor da supressão
Deputado Pinotti - É muito simples, não quero julgar essa questão, acho até que a intenção de substituir o
ressarcimento por uma taxa que vem da ineficiência da ANS de fazer o ressarcimento correto e completo,
que é absolutamente irreal, ou seja, a ANS se demonstrou absolutamente incompetente e no mínimo
incompetente para praticar o que está determinado na 9.656 e fazer o ressarcimento.
161
Substituir o ressarcimento por uma taxa tem um significado muito perigoso, que é dar aos planos de saúde
uma liberdade total para usarem o sistema público de saúde mediante o pagamento de uma taxa. E isso não
pode ser feito, é uma coisa extremamente perigosa, significa, no meu entender, o uso predatório do sistema
público de saúde.
Defesa contra a supressão
Deputado Dr. Ribamar Alves - O Item 12, que é motivo do DVS do Deputado Dr. Pinotti, ele, já no seu
início, ele é bem claro: “Desenvolver estudos para novo tratamento legal do disposto no Art. 32, que fala
sobre o ressarcimento ao SUS pelas operadoras de planos de saúde”. Todos nós que participamos desta
CPI fomos testemunhas de que existem milhões de reais cobrados e negados pelas operadoras, e a briga na
Justiça, que vai demandar 5, 10,15, 20 anos, pelos recursos que a própria lei dá a quem questiona. O que
nós propomos? Apenas o estudo. Aqui não tem nada concreto. Vai-se estudar. E aí se proporá, através de
projeto de lei, para ser discutido nesta Casa se muda ou não o que está aí. A sugestão que nós temos
encaminhado aqui é que haja uma cobrança, através de uma, não diria uma taxa, mas um percentual xis,
para que o SUS possa ter nos seus cofres milhões de reais por mês, que vai ajudar a manutenção de vários
e vários hospitais e atendimentos pelos postos espalhados pelo País. Mas como coibir, então, que as
operadoras, uma vez pagando essa taxa, se achem no direito de remeter para o SUS todos os seus
atendimentos? Hoje a ANS, juntamente com o Ministério da Saúde, fazem um cruzamento de dados das
AIHs que são remetidas para processamento DATASUS e o cadastramento dos usuários pelas prestadoras
pela ANS. Esse critério continuará a persistir, haverá vigilância, e as operadoras que estiverem exorbitando
serão chamadas para se explicar e poder — aí, sim — ser cobrada uma taxa. Poderia ser através de AIH
especial, como propôs o Dr. Pinotti, ou através dessa tabela TUNEP como é feita hoje. Mas, enquanto isso, o
SUS, está entrando no seu caixa milhões de reais por mês para suprir suas necessidades. E as outras
questões, com certeza, que virão para a Justiça, porque eles vão questionar, é um direito legal que todos
têm. Portanto, eu peço que mantenhamos este parágrafo, porque apenas sugere estudos, desenvolver
estudos. E, depois, quando a lei vier para cá, aí sim, nós vamos saber se vai ser mandado pelo Executivo ou
por algum Deputado. Eu quero adiantar que já estou, inclusive, fazendo um projeto de lei sobre isso. Já tive a
anuência da ANS. Já estive com o Ministro Humberto Costa. Já estive com o Dr. Fausto. Todos gostaram
muito do projeto. Eu tenho certeza de que será apreciado a contento por esta Casa.
4. Destaque Nº 8 - O destaque do Deputado Perondi propõe a supressão, nos termos do Regimento Interno, destaque
de votação em separado do parágrafo único do art. 15 do projeto de lei proposto pelo Relator, parágrafo único que fala
a respeito da variação de contraprestação pecuniária por idades. E que diz o seguinte: A variação das
contraprestações pecuniárias entre a primeira e a última faixa etária não poderá ser superior a 300% —
conforme acolheu o Relator durante a discussão — , observado o disposto no art. 15, § 3º, da lei tal, tal e tal.
Defesa a favor da supressão
Deputado Darcísio Perondi - Nós vamos votar uma lei — qualquer Deputado pode apresentar — obrigando
todos os jovens que participam dos planos de saúde — nem jovens, talvez recém-nascidos; nasceram hoje e
o pai quer fazer plano de saúde para o recém-nascido — a pagar um valor bem acima do que o pai desse
jovem ou o pai desse recém-nascido pode pagar. Reduzir as faixas, sem estudo atuarial, é temerário. Eu
desenvolvi essa tese na quinta-feira passada. Aqui, nesta sala, seguramente deve ter estudiosos de
equilíbrio atuarial, com absoluta certeza, mas arrisco dizer que nenhum de nós, Deputados e Deputadas,
conhece equilíbrio técnico atuarial. Eu estou vendo
que o inteligente e compreensivo Deputado Ribamar concordou com a cabeça. A Agência Nacional de Saúde
trabalhou e trouxe de 12 faixas para 6 faixas. E não foi fácil. Lá tem técnicos. Ouviu técnicos. Ouviu a câmara
técnica. E veio de 12 para 6 faixas. Aqui nós estamos correndo o perigo de desequilibrar os planos de
saúde das santas casas, e tem gente aqui que não gosta, e tem o perigo de nós desequilibrarmos os
planos da iniciativa privada, que tem lei em cima dela que ela tem que obedecer, mas não
desequilibrar o negócio. Se reduzir para o idoso — e já foi reduzido de 12 para 6, e se reduzir mais — e
aumentar para o jovem, os pais... pode ficar o pai e a mãe ou o pai e a mãe vão pagar para o vovô e para a
vovó, mas não vão pagar para os filhos. Ali estabelece um desequilíbrio. Aí não precisa ser entendido para
entender isso. Os jovens vão fugir. Os jovens vão fugir se aumentar muito, porque os pais não vão pagar. Os
recém-nascidos, os pais não vão pagar. Primeira infância, não vai pagar. E, do outro lado, desequilibra a
escala. Aí entra o fenômeno que chamam de anti-seleção. O idoso vai pagar menos. Já está menos. Está
caro para o idoso. .....nós vivemos numa economia de mercado livre. Ninguém pode obrigar. Então, nós não
podemos desequilibrar, e vamos confiar na Agência Nacional, que por sinal vai mudar de comando em
dezembro, e o Palácio do Planalto vai poder indicar. Os Deputados aqui poderão indicar até diretores e
presidentes, para até reduzir, mas não nós, sem conhecer.
Defesa contra a supressão
Deputado Arnaldo Faria De Sá - Sr. Presidente, para encaminhar, pela manutenção
Deputado Henrique Fontana - ......uma das questões fundamentais que a nossa CPI constituiu, percebeu,
verificou dentro do sistema é que hoje nós temos um problema concreto. Qual é o problema concreto que
nós temos hoje? Essa regra vigente está gerando uma distorção, que é a exclusão, por uma seleção
negativa, de muitos idosos, que não suportam a elevação das mensalidades, coincidindo com o período em
que, na sua faixa etária, está diminuindo a renda. Então, esse é o problema real que tem o sistema. Aliás, a
agência atuou no sentido de minimizar esse problema porque — é importante que se diga — antes também
se dizia que as 12 vezes de diferença de preço entre o jovem e o idoso eram determinadas por uma questão
atuarial. E na época se dizia: Se essa questão atuarial de 12 vezes for quebrada, quebra o sistema. E o
sistema não quebrou. Por que o sistema não quebrou? Em primeiríssimo lugar, porque, se nós votarmos
aqui... Eu estou pedindo o apoio dos Deputados porque eu acho que esse é um símbolo importante de um
sinal que esta CPI quer dar a esse mercado, no sentido de torná-lo mais equilibrado, no sentido de torná-lo
com a possibilidade de permanência, ao longo dos anos, de todos que entram jovens e que querem ficar nos
planos de saúde quando chegar aos 50, 60 ou 70 anos. O que nós votarmos aqui estará valendo para os
futuros planos de saúde.
162
Quadro 10: Votação dos Destaques Supressivos
(Cont.)
Ou seja, o mercado terá um tempo enorme de adaptação, porque os 36 milhões de usuários que hoje estão
dentro do sistema estarão cobertos por contratos antigos. Agora, se nós concordamos que o jovem de hoje é
o idoso de amanhã e que, mesmo que ele seja chamado, sim, a uma mensalidade um pouco mais alta, essa
mensalidade signifique para ele a segurança de que ele não vai ser empurrado para fora do plano quando ele
chegar aos 60 anos porque não consiga acompanhar o pagamento da mensalidade, isso é positivo para o
sistema, isso dá equilíbrio, dá um sentimento de segurança para as pessoas de que, ao entrarem no plano,
vão poder permanecer ao longo de toda a sua vida...... O que nós queremos é retirar do sistema isso que eu
chamo de uma deformação que traz perversidade ao sistema, que é a de que muitos idosos, exatamente no
momento em que mais vão precisar de atendimento por não suportar a elevação da mensalidade, são
colocados para fora do plano, muitas vezes depois de ter contribuído por 20, 30 ou mais anos. Parece-me
que esta mediação a que chegamos, com 300% em vez de 100, é um passo no sentido de procurar uma
solidariedade maior entre gerações, o que, sem dúvida, será positivo.
5. Destaque Nº 9 – Assinado pelo deputado Jamil Murad “Supressão de um parágrafo”, sobre ressarcimento ao SUS
Defesa a favor da supressão
Deputado Jamil Murad - .... a taxa de ressarcimento ao SUS vem como uma proposta para suprir uma
deficiência, uma incapacidade do Poder Público de fazer cumprir uma lei do ressarcimento, uma lei que já
existe. Agora, no meu entendimento, na minha interpretação, ela abre caminho para um convênio geral entre
os planos de saúde e os hospitais públicos. Os planos de saúde, ao pagar uma taxa, vão dizer: “Os meus
hospitais são: INCOR, Hospital das Clínicas, Hospital da UNICAMP, Hospital da UNESP, hospital...” Quer
dizer, vai liberar, porque exatamente eles estão pagando essa taxa, como ressarcimento ao SUS, para
utilizar esses hospitais.
E assim por diante: Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto etc. Bom, no meu entendimento, não atende
nem os hospitais universitários, porque o dinheiro, a taxa, ao ir para o Fundo Nacional de Saúde, ele não é
dirigido ao INCOR, ao Hospital das Clínicas, ao Hospital da UNICAMP etc. Portanto, ele fortalece a dupla
porta, ele fortalece o privilégio aos planos de saúde..... Eu constatei na CPI que os planos de saúde abusam
mais da sociedade brasileira do que eu imaginava no começo dos trabalhos desta CPI.
Defesa contra a supressão
Deputado Dr. Ribamar Alves - .... só quero enfatizar que essa taxa funciona como um adiantamento. Em
momento algum o SUS deixará de ser ressarcido pelo uso dos hospitais públicos; funcionaria apenas como
adiantamento. Haverá fiscalização para aqueles que estiverem exorbitando. Os que estiverem exorbitando,
eles o advertirão para constatação junto à ANS, junto ao Ministério da Saúde. Contra o destaque
6. Destaque Nº 10 - Assinado pela Deputada Laura Carneiro para a “manutenção da ANS no Estado do Rio de
Janeiro”
Defesa a favor do destaque
Deputada Laura Carneiro - Sr. Presidente, é simples, é a manutenção da ANS no Estado do Rio de Janeiro.
Isso foi um acordo feito por todas as Lideranças desta Casa quando da votação da matéria. Temos aqui
apoio do Deputado Biscaia e do Deputado Roberto Jefferson também do Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro
sofre o esvaziamento econômico histórico, temos sofrido isso ao longo do tempo com várias empresas. Da
mesma maneira que a gente pode ter outras empresas funcionando, não faz nenhum sentido que a ANS
nessa altura do campeonato saia do Rio de Janeiro. Essa é uma questão difícil em todas as Comissões, é
uma questão fechada pela bancada do Rio de Janeiro de 46 Deputados e 3 Senadores. Então, pediria apoio
dos meus colegas de partido e também de todos os Deputados nesta Comissão para aprovação do
destaque.
7. Destaque Nº 12 - Apresentado pelo Deputado José Linhares, “propõe a supressão do item “d” do relatório. Propõe
a supressão do pedido de urgência para um Projeto de Lei nº 1.603, de autoria do Deputado Mário Heringer”.
Defesa a favor da supressão
Deputado José Linhares - ......nossa objeção a este destaque. Nós sabemos que nós temos uma grande
polêmica atualmente entre os contratos antigos e os contratos novos. E nós sabemos que todos as vezes
que vai para a Justiça, os contratos antigos que têm várias restrições, então, nessa hora em que muitas
vezes as pessoas tem que descredenciar porque estão querendo a pessoa se louvar no contrato antigo,
então, imediatamente a própria Justiça dá ganho de causa, embora os valores não sejam compensatórios. É
essa a razão porque somos contrários.
Defesa contra a supressão
Deputado Mário Heringer - Entendo o seguinte, esse projeto de lei não tem nada a ver com o contrato novo e
com o contrato antigo. Isso é um equívoco que o nosso Deputado José Linhares está cometendo. Nesse
projeto ele contempla o plantão 24 horas para liberação de atendimentos fazendo contraponto à proibição do
cheque caução. Ele contempla a uniformização dos formulários onde a gente vai poder trabalhar a
epidemiologia desses 35 milhões de brasileiros que ninguém sabe por onde andam. Ele contempla o
descredenciamento indiscriminado, que é o mecanismo de pressão para submissão financeira que os planos
de saúde fazem sobre os seus credenciados. E além disso, ele cria o credenciamento universal criterioso que
abre espaço, aumenta a opção de escolha pelos usuários. E além disso, diminui a exclusão profissional de
médicos e outros profissionais liberais. Então, é por isso que estou colocando como muito importante a
rejeição desse DVS, porque esse DVS derruba grande parte do nosso trabalho executado nesse período
todo com muito carinho, com muito capricho, sem partidarismos e que vai modificar com certeza o
relacionamento entre operadoras e prestadores. Então, eu gostaria que os senhores tivessem atenção para o
que eu estou dizendo. O Padre José Linhares não está neste momento defendendo uma causa justa, e nós
precisamos de votar a favor disso.
163
Quadro 10: Votação dos Destaques Supressivos
(Cont.)
8. Destaque Nº 15 - Assinado pelo Deputado Darcísio Perondi: “Nos termos do Regimento Interno, requeiro destaque
para votação em separado de parte da letra “m” do Item II — da letra “m” do Item II —, das recomendações contidas no
relatório, cujo texto assim está disposto: Regulamentação do controle social em cada operadora, com instalação de
conselhos gestores paritários, assembléias anuais com participação dos usuários e telefone 0800 para prestar
informações e atendimentos aos usuários”. O destaque do Deputado Perondi é no sentido de suprimir esse parágrafo.
Defesa a favor da supressão
Deputado Darcísio Perondi - Sr. Presidente, vamos votar uma lei nesta Casa — qualquer Deputado pode
apresentar —, para ter controle social gestor em cima de um hotel, em cima de uma fábrica, da fábrica do
Ermírio de Morais. O que está sendo proposto aqui é conselho gestor dentro da iniciativa privada. Eu sempre
defendi, defendo — e até não tenho os votos muito dos médicos da minha cidade porque defendo o SUS e
defendo o controle social, sendo médico —, defendo o controle social. O cidadão pode opinar, pode
reclamar, pode decidir. Fui um dos ideólogos iniciais, na década de 80, dos Conselhos Municipais de Saúde,
Deputado Jamil. O senhor seguramente, lá em São Paulo
reconhecia. Nós estávamos na mesma trincheira, 20 anos atrás, defendendo o controle social através dos
Conselhos Municipais de Saúde. Agora, botar conselho gestor, isso é uma proposta ideológica, socialista, de
intervenção. Lá no meu Estado houve tentativa de conselho gestor nos hospitais privados, comunitários,
conveniados pelo SUS. Meu caro Deputado Arnaldo Faria, eu posso concordar pela instalação do telefone
0800...
Deputado Dr. Ribamar Alves – Durante a discussão anterior, estava num dos parágrafos anteriores a este o
controle social, que foi retirado de pronto, com a aquiescência do autor, que foi o Deputado Henrique
Fontana. E esse aqui passou despercebido. Então, vamos retirar, porque está prejudicado em relação a ter
retirado antes. Retirado.
Deputada Laura Carneiro – Só mantém então o 0800?
Deputado Dr. Ribamar Alves – Mantém o 0800
Defesa contra a supressão
Deputado Arnaldo Faria De Sá - .... encaminhar, pela manutenção.
Segundo comentário da deputada Laura Carneiro, esta foi a primeira votação unânime.
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