Área: Audição Apresentador: Millena Nóbrega Campos de Sousa Autor(es): SOUSA, MNC; FIORINI, AC; BALIEIRO, CR; TABITH Jr, A; VILANOVA, LC; FÁVERO, ML. Título: Neuropatia Auditiva/ Dissincronia* Auditiva: estudo interdisciplinar de um caso pós-lingual em uma adolescente. Palavras – Chave: Audição,Transtornos da Audição, Reabilitação em Portadores de Deficiência Auditiva. Introdução: O termo Neuropatia Auditiva (NA) é utilizado desde 1995, embora os sinais e sintomas apresentados pelos portadores foram descritos há mais de 26 anos (1). Os pacientes portadores de neuropatia auditiva/dissincronia auditiva (NA/DA) apresentam perda auditiva pré ou pós-lingual de diferentes graus, inclusive surdez profunda (2). Clinicamente, caracteriza-se como uma perda auditiva uni ou bilateral e nestes casos, não necessariamente simétrica, discriminação vocal incompatível com os limiares audiométricos (3,4,5,6,7,2), presença de emissões otoacústicas, alteração ou ausência dos potenciais evocados do tronco encefálico e presença de microfonismo coclear (3,4,5,6). Pode fazer parte do quadro de NA/DA à audição flutuante sendo que (7,8), em alguns momentos, o indivíduo aparenta ter audição normal e, em outros, seu comportamento assemelha-se ao do indivíduo com deficiência auditiva. Anatomicamente, a NA/DA é determinada por um acometimento do nervo auditivo em decorrência, provavelmente, da alteração da mielinização das fibras (5) o que pode levar a uma perda de sincronia na condução nervosa do estímulo auditivo (3,5). A alteração pode estar localizada nas células ciliadas internas, no oitavo par propriamente dito, ou nas sinapses entre essas estruturas (9,10,6). Pacientes com NA/DA, mesmo com limiares audiométricos normais ou próximos da normalidade, apresentam dificuldade na percepção de fala em ambientes com ruído competitivo e, em alguns casos, também em locais silenciosos (11, 4,9,1). A NA/DA pode ocorrer sem qualquer outro comprometimento clínico, mas pode estar associada a uma grande variedade de sintomas e condições, ou seja, comprometimento em outros nervos, tais como: neuropatia óptica na síndrome de Leber (12) ou neuropatia do nervo peroneiro na síndrome de Charrot Marie – Tooth. Pode ainda estar relacionado a mutações gênicas (2). Atualmente, o diagnóstico da NA/DA é mais freqüente na clínica fonoaudiológica, o que favorece maior conhecimento em relação aos aspectos audiológicos periféricos, clínicos e fisiopatológicos. A intervenção de equipe interdisciplinar possibilita melhor compreensão da singularidade e heterogeneidade de *O termo dissincronia foi utilizado baseado na denotação do prefixo “dis” que significa: mau funcionamento, dificuldade, e é comumentemente utilizado na formação de termos médicos como: disfagia, discinesia etc. cada paciente o que contribui para efetividade do processo de reabilitação. Prioriza-se estratégias para aquisição de linguagem em casos pré-linguais e ênfase em habilidades comunicativas em casos pós-linguais, além da realização de ajustes específicos a cada caso para que ocorra um melhor desempenho acadêmico e social. Objetivo: Descrever os achados clínicos e audiológicos de um caso de neuropatia auditiva/dissincronia auditiva pós-lingual atendido em uma Instituição de São Paulo. Resultados: A.D.A.O, sexo feminino, 16 anos, solteira, natural e procedente de Araripina-PE, relatou quadro súbito de problema de visão com fotofobia, diagnosticado como simulação e perda de audição progressiva ocorridos em setembro de 2006. Em maio de 2007, compareceu ao Serviço de Audiologia da Instituição também com queixa de dificuldade de compreensão de fala e zumbido. Na avaliação otorrinolaringológica e foniátrica não foram identificadas intercorrências prévias que justificassem o quadro súbito, porém, foi observada grande dificuldade na compreensão de fala, a qual é facilitada pela leitura orofacial. Os exames audiométricos realizados no período de julho a novembro de 2007 apresentaram os seguintes resultados: configuração com curva ascendente, tipo neurossensorial bilateral, porém, com variabilidade no grau da perda. Primeiramente, a audiometria apresentou grau profundo, seguido de moderado para severo e, finalmente leve bilateralmente (Figura 1). A paciente apresentou muita dificuldade de compreensão e as audiometrias no período de agosto e novembro de 2007 foram realizadas com estímulo “Narrow-band” e com tempo prolongado (maior que 5 segundos). Os resultados apresentaram uma curva ascendente, porém de grau leve a moderada e, posteriormente leve bilateralmente. Quando realizada com estímulo “warble” a audiometria revelou perda auditiva de grau profundo bilateral. Em fevereiro de 2008, uma nova audiometria foi realizada e apresentou limiares audiométricos com perda de grau leve a moderado bilateral e configuração da curva ascendente. Nas logoaudiometrias, realizada no período de julho a novembro de 2007, quando o grau da perda era profundo, o limiar de reconhecimento de fala (SRT) apresentava-se em 85 dBNA, no entanto, na audiometria realizada com estímulo “Narrow Band” o SRT, com perguntas e/ou polissílabos com fala lentificada, identificou limiares de 25 e 55dBNA. Em fevereiro de 2008, o SRT foi realizado com trissílabos e foram encontrados limiares de 50dBNA. Entretanto, em nenhum dos exames realizados foi possível à realização do índice percentual de reconhecimento de fala (IPRF). Figura 1 – Audiometria tonal no período de julho de 2007 a fevereiro de 2008. Na imitância acústica foram encontrados os seguintes resultados: curva timpanométrica do tipo A com reflexos ipsilaterais e contralaterais ausentes bilateralmente. Após os achados da avaliação audiológica a equipe interdisciplinar, constituída por Otorrinolaringologista, Foniatra e Fonoaudiólogas, levantou as possibilidades diagnósticas de Esclerose Múltipla e Neuropatia Auditiva, sendo solicitada a avaliação neurológica. O exame clínico neurológico e a Ressonância Magnética de Crânio descartaram a Esclerose Múltipla confirmando o diagnóstico de NA/DA. Foi solicitada avaliação oftalmológica e os resultados estão sendo aguardados. O monitoramento com as emissões otoacústicas evocadas por estímulo transiente e por produto de distorção indicaram variabilidade nos resultados, porém sempre com respostas presentes (Figura 2a e 2b). Figura 2a. Emissões Otoacústicas evocadas por Estímulo Transiente. Figura 2b. Exame de Emissões Otoacústicas por produto de distorção. Os exames de potenciais evocados do tronco encefálico foram realizados no período de agosto de 2007 e março de 2008 com cliques rarefeitos e condensados, nas freqüências de 7.7 e 27.7 cliques por segundo, e mostraram: ausência de ondas reprodutíveis até 100 dBNA, sem melhora do traçado com a redução da freqüência do estímulo, e presença de microfonismo coclear bilateralmente. Após avaliação foi iniciado atendimento fonoaudiológico. Em função da curva audiométrica foi testado equipamento de freqüência modulada, no primeiro momento, e seqüencialmente apenas aparelhos de amplificação sonora. A paciente deu preferência aos aparelhos de amplificação sonora em relação ao FM, por considerá-los mais eficiente nas situações do dia-a-dia. Os parâmetros acústicos considerados para seleção das características da amplificação foram: baixa potência, multiprogramas e faixa dinâmica de compressão. Para ajustes dos aparelhos foram consideradas as informações da paciente sobre o ouvir. Inicialmente, a reação foi bastante satisfatória, principalmente, quanto ao ouvir em ambiente silencioso. A diferença mais significativa foi quando os limiares auditivos ainda encontravam-se rebaixados. A preferência foi dada aos aparelhos de amplificação sonora em relação ao FM, para o uso em situações do cotidiano. Diversos ajustes foram feitos conforme a flutuação de audição. De início foi protetizada bilateralmente e, atualmente, apenas na orelha direita. Apesar disso, em episódio recente compareceu à sessão com aparelho também na orelha esquerda, com a justificativa de estar com “ruído na orelha e quando está assim o aparelho ajuda”. Medidas de ganho funcional não ofereceram informações precisas e o foco do trabalho em habilidades auditivas também não foram efetivos, provocando confusão e cansaço, o que demandou trabalho com pista de leitura orofacial e estratégias de comunicação. A técnica speech-tracking no processo terapêutico está sendo utilizada para incrementar as habilidades de leitura orofacial. Tal habilidade melhorou com o treino, sendo que o score obtido, atualmente, encontra-se em torno de 32, 6 palavras por minuto. Ao comparar a condição sem e com pista visual, o reconhecimento de fala é sempre melhor com a leitura oro-facial, na razão de 1,5/1 palavras. Não há dados conclusivos quanto aos resultados com e sem amplificação para o reconhecimento de fala. No processo terapêutico A.D.A.O traz seus conflitos e angústias em relação à sua condição, chegando a apresentar características de transtorno obsessivo compulsivo. Conclusão: A participação de equipe interdisciplinar e a padronização dos procedimentos para o diagnóstico é de fundamental importância para o planejamento terapêutico em pacientes portadores de neuropatia auditiva/dissincronia auditiva. Referências Bibliográficas: 1. Botura EE. Aspectos da avaliação audiológica periférica e central na neuropatia auditiva/dessincronia auditiva: um estudo de caso [dissertação]. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - Departamento de Fonoaudiologia; 2005. 2. Fávero ML, Romanos J, Mingroni-Netto RC, Balieiro CR, Donini TS, Spinelli M. Neuropatia Auditiva decorrente de Mutação no Gene OTOF. Arq. Otorrinolaringol. 2005:9(4):325-30. 3. Sininger YS, Hood LJ, Starr A, Berlin CI, Picton TW. Hearing Loss due to Auditory Neuropathy. Audiol. Today. 1995:7:10-3. 4. Neto OM, Redondo MC, Carlos RC, Figueiredo MS, Lopes Filho OC. Neuropatia Auditiva: aspectos relevantes na investigação clínica. Rev Bras Otorrinolaringol. 2001:67(5):636-42. 5. Spinelli M, Fávero-Breuel ML, Silva CMS. Neuropatia auditiva: aspectos clínicos, diagnósticos e terapêuticos. Rev Bras Otorrinolaringol. 2001;67(6):863-7. 6. Colm Madden FRCSI, Michael Rutter FRCS, Lisa Hilbert MA, John H. Greinwald Jr MD, Daniel I. Choo, MD. Clinical and Audiological Features in Auditory Neurophaty. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2002;128: 1026-30. 7. Shallop JK, Jin SH, Driscoll CLW, Tibesar RJ. Characteristics of electrically evoked potentials in patients with auditory neurophaty/ auditory dys-synchrony. J Audiology. 2005;43:22-7. 8. Romanos J. Estudo de mutações do Gene OTOF em pacientes com deficiência auditiva e sua relação com a neuropatia auditiva [dissertação]. São Paulo: Universidade de São Paulo – Departamento de Genética e Biologia Evolutiva; 2006. 9. Starr A, Picton TW, Sininger Y, Hood LJ, Berlin CI. Auditory neuropathy. Brain. 1996;119(Pt 3):741-53. 10.Doyle KJ, Sininger Y, Starr A. Auditory neuropathy in childhood. Laryngoscope. 1998;108(9):1374-7. 11. Berlin CI. Auditory neuropathy. Using OEAs and ABR from screening to management. Semin Hear. 1999;20(4):307-15. 12. Ceranic B, Luxon LM. Progressive auditory neuropathy in patients with Leber’s hereditary optic neuropathy. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2004;75:626-30. Documentos Eletrônicos Consultados: Nossa Língua – Nossa Pátria: Palavras e expressões que apresentam mais dúvidas em nosso dia-a-dia. Acessado em: http://intervox.nce.ufrj.br/~edpaes/duv-d-f.htm.