Poluição Sonora Wesley Pacheco Calixto1 Clóves Gonçalves Rodrigues2 Goiânia – GO, 2004 1 2 Graduado em Física e Especialista em Educação Ambiental - UCG Graduado e Mestrado em Física – UFG. Doutorado e Pós-Doutorando em Física - UNICAMP Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Sumário Sumário ..............................................................................................................................2 Resumo ...............................................................................................................................4 Abstract ..............................................................................................................................5 Capítulo 1 – Uma Breve História da Acústica ...................................................................6 Capítulo 2 – Movimento Ondulatório.................................................................................14 2.1 Definições................................................................................................................14 2.2 Ondas Transversais..................................................................................................16 2.3 Ondas Longitudinais................................................................................................18 2.4 Ondas Mecânicas e Ondas Eletromagnéticas ..........................................................18 2.5 Equação da Onda .....................................................................................................19 2.6 Velocidade de Ondas Longitudinais........................................................................21 2.6.1 Velocidade de Onda Longitudinal no Interior de um Líquido..........................21 2.6.2 Velocidade de Onda Longitudinal no Interior de um Gás ................................22 2.6.3 Velocidade de Onda Longitudinal em Hastes Sólidas......................................22 2.6.4 Velocidade de Onda em um Sólido Ilimitado...................................................23 2.7 Propriedades das Ondas.............................................................................................23 2.7.1 Reflexão ............................................................................................................23 2.7.2 Refração ............................................................................................................25 2.7.3 Índice de Refração Absoluto.............................................................................26 2.7.4 Reflexão Total...................................................................................................26 2.7.5 Difração.............................................................................................................27 2.7.6 Interferência ......................................................................................................28 2.8 A unidade padrão de medida do Som......................................................................31 Capítulo 3 – Som...................................................................................................................34 3.1 Introdução................................................................................................................34 3.2 Ondas Sonoras .........................................................................................................35 3.3 Velocidade de Propagação do Som .........................................................................35 3.4 Qualidades Fisiológicas do Som .............................................................................36 3.4.1 Altura do Som........................................................................................................36 3.4.2 Intensidade do Som ...............................................................................................37 3.4.3 Nível de Intensidade Sonora e Nível de Pressão Sonora.......................................38 3.4.4 Timbre ...................................................................................................................40 3.5 Velocidade de Mach ................................................................................................41 3.6 Efeito Doppler .........................................................................................................42 3.7 Análise dos Sons e Qualidades de um Tom ............................................................43 2 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 4 – Poluição Sonora ..............................................................................................46 4.1 Poluição Sonora.......................................................................................................46 4.2 Conceitos e Classificação dos Barulhos ..................................................................49 4.3 Medição e Controle de Barulho...............................................................................51 4.4 Sensibilidade do Ouvido Humano...........................................................................54 4.5 Redução e Prevenção da Poluição Sonora...............................................................58 4.6 Perda Auditiva .........................................................................................................60 4.6.1 Perda Condutiva ....................................................................................................61 4.6.2 Perda Neurossensorial ...........................................................................................62 4.7 Aparelhos Auditivos ................................................................................................64 4.8 Efeito do Ruído na Audição e no Organismo..........................................................65 4.9 Estudos que estão sendo feitos com o Som em Plantas e Animais .........................68 4.10 Medidas Preventivas................................................................................................68 4.10.1 Com Relação ao Meio .........................................................................................68 4.10.2 Com Relação ao Homem.....................................................................................69 4.10.3 Equipamento de Proteção Individual (EPI) .........................................................70 Capítulo 5 – Medidas da Poluição Sonora na Cidade de Goiânia ...................................72 5.1 Pesquisa ...................................................................................................................72 5.2 Objetivos que podem ser realizados para melhoria .................................................77 Capítulo 6 – Educação Ambiental e o Som ........................................................................80 6.1 Algumas Observações Sobre o Ensino de Acústica ...............................................80 Apêndice A – A Legislação Brasileira em Relação a Ruídos............................................82 A.1 Legislação Federal Brasileira ..................................................................................82 A.2 Comentário a Legislação Federal Sobre Poluição Sonora Urbana..........................84 A.3 Legislação Municipal ..............................................................................................87 Apêndice B – Psicoacústica..................................................................................................93 B.1 Introdução................................................................................................................93 B.2 Audição Humana .....................................................................................................94 B.2.1 Psicologia da Percepção Sonora ...........................................................................95 B.2.2 Principais Danos do Ruído ao Ser Humano..........................................................97 Apêndice C – História da Música........................................................................................99 Observação............................................................................................................................102 Bibliografia............................................................................................................................103 3 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Resumo Este trabalho tem como finalidade mostrar como os estudos sobre o som se desenvolveram na história; relacionar o funcionamento da propagação sonora e as características das ondas mecânicas; os movimentos ondulatórios e as definições de ondas, assim como, relacionar as velocidades do som em vários meios, através de vibrações. Estas vibrações são transferidas para as moléculas de ar a sua volta, e estas por sua vez transferem a vibração para as moléculas vizinhas, permitindo assim a propagação de energia. Normalmente achamos que a percepção que temos do nosso ambiente é perfeita, porém esquecemos que não somos capazes de ouvir sons acima de 20.000 Hz e nem abaixo de 20 Hz, como os morcegos e os cães. Devemos saber que nossos órgãos dos sentidos têm características comuns, possuem receptores que são células nervosas capazes de responder a estímulos específicos; recebem, transformam e transmitem para o restante do sistema nervoso. Estudamos aqui as propriedades das ondas e o que é o som. Trabalhamos a história da música, mitológica e a não mitológica. Nas grandes cidades, o ruído transmitido pelos automóveis, fábricas e pessoas, é cada dia mais intenso. As pesquisas e medidas feitas com seres humanos e animais ainda são poucas. As conseqüências provocadas pelos excessos de poluição sonora para a saúde física e mental do ser humano, conseguem ser responsáveis por distúrbios circulatórios, gástricos, perda da audição e outros. Estudamos os efeitos fisiológicos do som e algumas curiosidades como velocidade de Mach e o efeito Doppler do som. Discutimos medidas de prevenção e redução da poluição sonora. Conceituamos ruídos e descrevemos medidas suportáveis para determinado tempo de exposição a poluição sonora. Tratamos da forma com que a poluição degrada o ambiente, examinamos como a Psicoacústica se co-relaciona com as outras ciências; e o nosso maior objetivo é fornecer uma fonte complementar de estudos para estudantes e educadores. 4 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Abstract This work has the purpose to show the studies about the sound developed in the history; relate the operation of the resonant propagation and the characteristics of the mechanical waves; the movements vibratory and the definitions of waves, as well as, to relate the speeds of the sound in several means, through vibrations. These vibrations are transferred to the molecules of air which are around, and these last ones transfer the vibration to the neighbor molecules, allowing this way the propagation of energy. We usually think the perception that we have of our atmosphere is perfect, however we forget that we are not able to hear sounds above 20.000 Hz and nor below 20 Hz, like the bats and the dogs do. We should know that our senses have common characteristics, they have receivers that are nervous cells able to answer to specific incentives; they receive, transform and transmit for the remaining of the nervous system. We studied the properties of the waves here and what is the sound. We worked the history of the music, the mythological and the non mythological. In big cities, the noise transmitted by the automobiles, factories and people, it is more and more intense. The researches and measures done with human beings and animals are still few. The consequences provoked by the excess of resonant pollution for the human being's physical and mental health, manage to be responsible for circulatory and gastric disturbances, loss of the audition and other. We studied the physiologic effects of the sound and some curiosities as Mach speed of and the Doppler effect of the sound. We discussed prevention ways and reduction of the resonant pollution. We conceited noises and we described bearable measures for certain time of exhibition the resonant pollution. We treated the way in which the pollution degrades the environment, we examined like the way Psychoacoustic co-relates to other sciences; and our largest objective is to supply a complementary source of studies for students and educators. 5 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 1 Breve Histórico da Acústica Todo o conhecimento que temos do mundo material chegou até nós através de nossos sentidos, e um dos sentidos mais importante é sem sombra de dúvida a audição. Com o estudo de movimentos ondulatórios, impulsionamos uma grande discussão sobre mais um fenômeno físico, o som. Há muitos anos os chineses, para enlouquecer os prisioneiros, colocavam-nos em celas cujo completo silêncio somente era quebrado pelo incessante barulho de tiquetaque de um relógio. No folclore primitivo existia a crença de que o som causado pelo impacto da lança é que matava o atingido. Os Assírios acreditavam em divindades dos quais eram capazes de produzir ruídos responsáveis por terremotos e tempestades. Há séculos o som de grande intensidade vem sendo usado como arma de guerra, a exemplo do toque das trombetas e o rufar dos tambores, para incitar os soldados à luta. Os Romanos destacavam um grupo especial de soldados cuja missão era produzir ruídos assustadores, destinados a confundir os adversários. A invenção dos explosivos para fins bélicos reforçou o relacionamento entre estampido e ataque, razão pela qual não foram medidos esforços visando à descoberta de sons mortíferos durante as duas grandes guerras. A acústica3 estuda a geração, a transmissão e a recepção das vibrações mecânicas audíveis, ou não, que se propagam num meio elástico. Dá-se o nome de som às vibrações mecânicas que, por estarem dentro de uma determinada faixa de freqüências, podem ser ouvidas pelo homem. Historicamente, sabe-se que o estudo do som relacionava-se intrinsecamente com a música, arte exercida desde 4000 a.C., pelos hindus, egípcios, gregos, chineses e japoneses. Os sistemas musicais eram bastante diferentes do que aquele que nos chegou através do conhecimento dos gregos, especialmente no que diz respeito à divisão da escala musical. Pitágoras (569-500 a.C.), foi o principal responsável pelos estudos sobre os intervalos musicais e suas relações. A ele devemos a idéia exata do que significa um 3 Acústica e Psicoacústica 6 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] intervalo de oitava e suas subdivisões. Surgem, dessa maneira, os conceitos de consonância e dissonância e ainda o que significa uma escala harmônica. Pitágoras descobriu que, sob uma mesma tensão, a freqüência de um som é inversamente proporcional ao comprimento de uma corda. Portanto, sob a mesma tensão a relação entre os comprimentos da corda que produz o tom fundamental e da oitava mais próxima é exatamente 2:1. Em seus estudos, Pitágoras usou um instrumento musical muito elementar, conhecido como monocórdio, que consistia basicamente em uma corda mantida sob tensão uniforme fixada nos extremos. Um terceiro apoio móvel possibilitava que a corda tivesse outros pontos fixos além dos extremos. As divisões da corda em diferentes posições correspondiam às notas de uma escala. Com isso, ao tocar a corda, a vibração produzia diferentes comprimentos de ondas, de acordo com a posição do apoio móvel. A descoberta de Pitágoras abriu portas para especulações filosóficas e matemáticas, de tal modo que, durante muitos séculos, o som continuou a ser estudado apenas como uma “fusão mística” entre a aritmética e a música. Ptolomeu, cerca de 130 a.C., construiu um diagrama geométrico pretendendo estabelecer relações harmônicas entre as cores e os tons musicais. Mesmo Newton, no século XVII, procurou mostrar relações numéricas entre as cores do arco-íris e as notas de um acorde musical. Aristóteles (384-332 a.C.), portanto cerca de 200 anos depois de Pitágoras, entre suas experiências, também se ocupou do estudo do som relacionado à música. Deixou uma coletânea de artigos, cujo título foi traduzido para o inglês como “Sound and Hearing”, expondo modelos sobre a propagação das ondas sonoras no ar. A influência de Aristóteles prosseguiu até a idade média. Somente na segunda metade do século XVII surgi uma nova era de investigações científicas, inclusive da Acústica Experimental, com Galileu Galilei (1564-1642). Nessa ocasião, os experimentos com o som começaram a ser feitos, sem que, necessariamente, estivessem relacionados à música. Galileu descobriu o fenômeno da ressonância, tendo publicado uma obra sobre consonância, dissonância e ressonância. Verificou que uma corda pode vibrar pela excitação provocada por uma outra corda próxima que tenha as mesmas características físicas. Descobriu ainda que cada pêndulo tem seu próprio período de vibração definido e determinado, antecipando, assim a idéia de que cada corpo vibra preferentemente nas suas freqüências naturais. 7 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Em 1657 foi fundada em Florença a academia del Cimento, inspirada nos trabalhos de Torricelli (1608-1647). Essa academia, que durou 10 anos, constituiu um desafio aos princípios da geometria, astronomia, e música. Galileu deduziu as leis completas sobre as cordas vibrantes. Embora, seus achados não foram publicados até que Mersenne (1558-1648), independentemente, descobriu as mesmas leis. A descoberta foi atribuída a Mersenne, (segundo alguns autores, indevidamente), sendo hoje conhecidas como as leis de Mersenne sobre as cordas vibrantes. O padre Mersenne4 encontrou para a velocidade do som 1380 pés/s, a Academia del Cimento, obteve 1180 pés/s, a Academia de Paris 1090 pés/s. A discordância entre os resultados mostrava, por um lado, a imperfeição dos aparelhos de medidas e por outro, que muitas vezes eram desprezados certos elementos essenciais (ventos, temperatura, etc.). Atribuíram-se ainda a Mersenne as tentativas das primeiras medidas experimentais da velocidade do som. Mersenne utilizou as batidas do próprio coração para medir a diferença entre a detonação de um revólver e a chegada do som produzido pela explosão. Gassendi2 (1592-1665), mandou disparar um tiro de canhão a grande distância, mediu o tempo decorrido entre a chegada do clarão e o do som, (acreditava que a velocidade da luz era instantânea), e concluiu que este se propagava a velocidade de 1473 pés/s, e utilizando o disparo de um canhão e de uma espingarda, provou que a velocidade de um som independente da freqüência do mesmo, ou seja, que a velocidade de um som grave é a mesma de um som agudo, dentro das mesmas condições. Com isso, contrariou a afirmação de Aristóteles, de que um som agudo se propaga com maior velocidade do que um som grave. Gassendi afirmou ainda que a velocidade do som não seria afetada pela direção do vento, o que mais tarde não foi confirmado. Ainda nessa mesma época, Torricelli (1608-1647) construiu o primeiro aparelho a vácuo, que possibilitou a Kiercher demonstrar que o som não se propaga no vácuo. Os experimentos que determinaram a velocidade do som no ar floresceram no século XVIII. Foi também quando se determinou que as velocidades do som em sólidos, líquidos e gases são diferentes. 4 História da Física – Pierre Guaydier 8 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Newton2 (1642-1727), atirou-se ao problema, não através da experiência, mas pela teoria e pelo cálculo; para espanto de seus contemporâneos, chegou a um resultado de 906 pés/s, (aproximadamente 276 m/s). Este número era um tanto inferior aos propostos pelos estudiosos do assunto, mas estes estavam tão pouco de acordo entre si que a preferência foi para Newton, cujo prestígio era considerável. Mais tarde comprovaram a inexatidão desse resultado. Lagrange, 70 anos mais tarde, apontou que Newton, nos seus cálculos matemáticos, não havia considerado a variação de temperatura. Demonstrou assim que a velocidade de propagação do som não pode ser medida por um processo isotérmico. Considerando os argumentos de Lagrange, o matemático francês Laplace (17491827), cerca de 100 anos mais tarde, modificou as equações de Newton, conseguindo obter o valor de 320 m/s para a velocidade do som no ar, compatível com os resultados experimentais. Nessa mesma época, Hut, que era professor de música em Frankfurt, introduziu o uso da corneta acústica, para auxiliar a audição dos deficientes auditivos. A Hut também se deve o nome de acústica para o estudo do som. No início do século XIX, Chladni (1756-1827), com a publicação do seu livro “Die Akustik”, proporcionou novos avanços para o desenvolvimento da acústica como ciência. No estudo das vibrações torcionais, descreveu, pela primeira vez, diferentes “figuras tonais”, obtidas pela aplicação de areia ou outro pó pesado em chapas vibrantes. Nesse livro também são citados estudos sobre a velocidade do som em tubos e apitos. Entretanto, foi somente com Helmholtz (1821-1894) e Lord Rayleigh (18421919) que a acústica recebeu novos impulsos, começando a se apresentar nos moldes atuais. O livro de Lord Rayleigh representa um grande marco histórico, sendo ainda citado freqüentemente em trabalhos atuais. Helmholtz que foi versátil tanto como fisiologista, anatomista ou físico, contribuiu para o estudo da óptica e do som. No seu livro clássico “Sensations of Tones”, publicado em 1863, desenvolveu a teoria da soma e da diferença de tons e a teoria dos ressonadores de Helmholtz. Em 1867, publicou a “Teoria da Ressonância do Ouvido”, relacionada à discriminação dos sons na cóclea. Essa teoria, naquele momento resolvia uma polêmica sobre a sensibilidade do sistema auditivo entre Ohm e Seebeck. Helmholtz resolveu um problema acústico teorizado por Ohm (1789-1854), segundo o qual o sistema auditivo era somente sensível às vibrações senoidais, sendo todo o som 9 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] percebido, o resultado de um complexo de tons. O trabalho de Ohm gerou um problema acústico sobre análise harmônica, resolvido por Helmholtz com a publicação de sua teoria. Até o advento do ressonador de Helmholtz, a análise de tons complexos era baseada somente no sistema auditivo. Ainda no século XIX, Sir Charles Wheatstone (1802-1875) fez vários experimentos relacionados a audição. Utilizou algo semelhante a um estetoscópio, que ele adaptou a um instrumento inventado por ele, dando origem ao termo microfone. Lord Kelvin (1824-1907) produziu o primeiro analisador harmônico, que solucionava vários problemas de acústica, quando utilizado para aplicação do Teorema de Fourier. O Teorema de Fourier foi desenvolvido especialmente para o estudo do calor. Fourier (1768-1830) nunca se interessou pelos estudos relacionados ao som. Ohm foi o primeiro a indicar a aplicação do Teorema de Fourier nos problemas de acústica, formulando uma lei de Ohm para o som. Essa lei formula que todos os tipos de qualidades tonais são devidos a determinadas combinações de um maior ou menor número de tons, com freqüências mensuráveis, e ainda que os complexos tonais poderiam ser analisados dentro de uma soma de tons simples, separadamente, pelos sistemas auditivos. No final do século XIX e início do século XX, começa uma nova fase de progresso para a acústica. Nessa época, pessoas que trabalhavam em eletricidade e eletrônica passaram a se interessar por acústica. A força propulsora desse progresso foi a necessidade que se elaborassem sistemas de comunicação mais eficientes, rápidos e seguros, especialmente por causa da I Guerra Mundial. Certamente, motivos econômicos constituíram os fundamentos de todos esses acontecimentos. Como não havia pessoas que se dedicassem exclusivamente à acústica, os engenheiros passaram a utilizar cálculos matemáticos para construir os primeiros transdutores. O primeiro transdutor foi o utilizado por Reiss, em 1861, visando à construção do telefone. O receptor utilizado por Reiss tornava o invento impraticável. Por isso, quando Bell, em 1876, aplicou pela primeira vez o microfone magnético, foi considerado como sendo o inventor do telefone, por decisão judicial. Alexander Graham Bell5 (1847 – 1922) foi um fonoaudiólogo inglês, radicado nos Estados Unidos. Interessou-se pelo estudo das ondas sonoras e da mecânica da fala, foi professor de psicologia vocal em Boston no ano de 1873, realizou experimentos, em 5 Física – Alberto Gaspar 10 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] que estudava a conversão das ondas sonoras em impulsos elétricos e vice e versa. Bell criou a AT & T, uma das maiores empresa de telecomunicações do mundo. Em 1877, Thomas A. Edison, desenvolveu o seu fonógrafo, dando origem aos sistemas de gravação e reprodução. Em 1887, Berlinner iniciou a reprodução em rolos e, em 1931, a RCA iniciou a reprodução elétrica. Em 1899, Poulson fez seus primeiros estudos de gravação em fio magnético, com progresso muito lento, até o início da II Guerra Mundial e, em 1940, Braunmüehl e Weber inventaram o Magnetophon, um gravador em fita que foi sendo aperfeiçoado gradativamente. O naufrágio do navio Titanic, em 1912, levou os instigadores a fazer várias tentativas para a detecção de objetos submersos. Entretanto só em 1917, no final da I Guerra Mundial, Langevin conseguiu detectar um submarino, utilizando dois transdutores de cristal para a emissão e recepção de sinais. O cinema sonoro surgiu em 1921, com discos reproduzindo os sons. Podem-se imaginar os grandes problemas nos casos de falta de sincronização. Não era difícil que as falas gravadas antecipassem ou fossem reproduzidas posteriormente a cena exibida, criando situações embaraçosas e mesmo cômicas, por aparecerem descontextualizadas. Em 1927, Tobis lançou o primeiro filme com som sincronizado, processo que iniciou uma nova era para o cinema, com sofisticações cada vez mais evidentes e conhecidas de todos. Sabine, em 1925, iniciou a época da Acústica Arquitetônica. Em seus “Collected Papers on Acoustics” menciona as idéias de Vitrivius (20 d.C.), arquiteto e engenheiro romano da época de Augusto. Sabine mostrou que Vitrivius já se preocupava com as condições acústicas dos teatros, apontando a interferência dos ecos e reverberações como fatores de “reforço”. Vitrivius aconselhava o uso de vasos nos palcos, agindo como reforçadores da voz, assim como propunha que os atores usassem megafones adaptados às máscaras, para aumentar a intensidade da voz. Ignoravam-se as características da forma, dimensão e estruturas dos teatros, relacionadas à melhor qualidade do som. Entretanto, sabe-se que as catedrais eram construídas em estilo gótico, o que provocava um maior tempo de reverberação. Esse fato tornava o ambiente propício para os rituais cantados, mas tornava a fala ininteligível. 11 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Além disso bem antes de Vitrivius, aproximadamente no século IV a.C., na 6 Grécia antiga os arquitetos já se preocupavam com o som, existem textos que relatam um local exato onde os autores dos teatros de arena, deveriam ficar para que todo o público pudesse ouvi-los; sabe-se hoje que este local é o foco da elipse que formava o teatro. Fig. 1-1 Planta Baixa de um Teatro Grego (Epidauro), século IV a.C. No teatro de Epidauro, célebre pela sua perfeita acústica, ainda hoje o guia faz o turista constatar que o rumor de um peso de papel lançado na orquestra ou o tilintar de uma moeda que cai no chão chega até a última fila da cávea. Fig. 1-2 Teatro de Epidauro com 135 m de diametro di Daniela Asprea, Cinzia Battista e Carmela Perrone classe 3 sez. C a.s. 1991/92. Traduzido por J.C. Avelino da Silva. Fonte: www.pegacity.it/utopia/case/antico/magnagre/TEATRI.html 6 12 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] É importante notar que uma raça sem a habilidade de ouvir, teria uma maior dificuldade para se comunicar e portanto o acúmulo de conhecimento seria prejudicado. Através deste sentido podemos ter noção de espaço e distância e até mesmo notarmos objetos em movimento, pois este órgão de recepção é atingido por informações que vêm de lugares distantes onde os fenômenos estão ocorrendo e onde existe um lapso de tempo finito, conseqüentemente tudo que ouvimos é passado. 13 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 2 Movimento Ondulatório 2.1 Definições As vibrações dos corpos materiais são movimentos que freqüentemente encontramos na natureza. Essas vibrações produzem os movimentos ondulatórios; na natureza encontramos várias situações nas quais corpos produzem este tipo de movimento. Vamos considerar uma pessoa fazendo um único movimento de vai e vem vertical, na extremidade de uma corda estendida horizontalmente. Observa-se então que um pulso foi formado e se propaga ao longo da corda, Fig. 2-1 Fig. 2-1 Pulso se propagando em uma corda A região onde se origina a perturbação que será propagada recebe o nome de fonte de onda. Quando as fontes emitem perturbações não periódicas, temos ondas isoladas ou pulsos. A medida que o pulso se propaga a corda se deforma e volta à posição inicial. Trata-se portanto de uma deformação elástica, à qual esta associada uma energia potencial elástica. A propagação do pulso equivale, portanto, à propagação da energia potencial elástica fornecida à corda no pulso inicial. Pelo princípio da conservação da energia mecânica, essa energia potencial não pode desaparecer quando o pulso atinge a outra extremidade da corda; se não há mais corda para ser percorrida para frente, logo o pulso irá percorre-lá para trás. O pulso reflete; este fenômeno é característico de qualquer propagação ondulatória que por alguma razão encontra um obstáculo à sua propagação, (ver item 2.7.1). Quando as perturbações são periódicas teremos uma sucessão de ondas ou um trem de ondas. 14 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Consideremos um meio homogêneo e isótropo7 macroscopicamente contínuo. Podemos usar como exemplo o ar de uma sala; se por um motivo qualquer houver modificação das propriedades físicas de uma região ou de um ponto qualquer desse meio, podemos dizer então que houve uma perturbação. A energia gasta para formar a perturbação é transferida para as regiões vizinhas atingindo pontos adjacentes que se vêem obrigada a repetir o fenômeno. Assim a perturbação se propaga no meio dando origem a uma onda. Agora vamos considerar uma pessoa segurando uma extremidade de uma corda esticada, presa pela outra extremidade. Executando um movimento contínuo debaixo para cima e produzindo ondas na corda, o movimento vibratório executado é transmitido consecutivamente por todos os pontos da corda, que passam a executar também um movimento vibratório, assim, podemos dizer que há uma onda senoidal simples percorrendo uma corda. Observe uma representação no determinado instante t . Fig. 2-2. Neste instante t , a onda tem deslocamento máximo em: c, d , f , g , h e i . Os pontos c, f e h , são chamados de cristas enquanto os pontos d , g e i são chamados de vales. A distância A é chamada de amplitude da onda, que é a distância entre a posição de equilíbrio (eixo X ) e a posição extrema que ele alcança ao oscilar. A distância percorrida entre duas cristas ou dois vales é chamada de comprimento de onda, que é simbolizada pela letra grega λ , e também pode ser medida entre duas posições sucessivas, que tem o mesmo deslocamento e fase, ex.: a distância percorrida entre os pontos b e e . Pontos como c e f , b e e , são ditos em fase, porém o ponto d esta 180º ou π rad , fora de fase em relação aos pontos c ou f . Para cada posição x corresponde a diferentes deslocamentos y . 7 Que apresenta a mesma propriedade física em todas as direções. 15 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Y Wesley Pacheco Calixto [email protected] λ c 1,0 f sen(x) h 0,5 A y 0,0 e b x X -0,5 -1,0 Fig. 2-2 Ondas Transversais em uma corda A d5 0 λ 10 g i 15 20 Passado um pequeno intervalo de tempo, t + ∆t , a onda se desloca ao longo do eixo X para a direita, terá a nova posição indicada pela linha alaranjada Fig. 2-3. Y c 1,0 f c' f' h sen(x) sen(x+3/2) h' t 0,5 A t + ∆t 0,0 b e e' X Fig. 2-3 Ondas Transversais em uma corda, nos instante A -0,5 t + ∆t b' -1,0 0 d5 d' 10 g g' 15 i i' 20 2.2 Ondas Transversais Observe que as cristas e os vales deslocam-se para a direita enquanto cada elemento da corda se desloca verticalmente para baixo e para cima, ou melhor transversalmente a direção da onda. Esta onda recebe o nome de onda transversal. Cada ponto da onda realiza um movimento harmônico simples (MHS) entorno da posição de equilíbrio, o eixo X . No intervalo de tempo ∆t, o ponto c desloca-se para baixo enquanto a crista desloca-se para o ponto c ' , e assim sucessivamente. 16 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] O tempo que o ponto b leva para se deslocar da crista até o vale e voltar de novo à crista, é chamado de período, T , da onda (ou um ciclo), que indica o tempo gasto para uma oscilação (vibração) completa. T= 1 . f (2-1) O número de vibrações completas por segundo, é chamado de freqüência, f , que pode ser representada da seguinte forma: f = 1 . T (2-2) Cada partícula da onda esta realizando um MHS, enquanto o ponto c realiza uma vibração completa, a crista que antes estava no ponto c , desloca-se para o ponto f , a que estava em f desloca-se para h , que é um comprimento de onda ( λ ), e assim sucessivamente. A velocidade ( v ) da onda é o comprimento de onda ( λ ), dividido pelo período ( T ): v= ∆x , ∆t (2-3) sendo ∆x = λ , temos que λ = vT , logo; λ v = = f .λ . T (2-4) Para uma onda harmônica simples, esta é a única velocidade envolvida, ela é conhecida como velocidade de fase. A velocidade de uma onda em uma corda uniforme depende somente da tensão ou força ( F ), exercida sobre a corda e sua massa por unidade de comprimento, µ . A velocidade v é dada por8: v= F µ (2-5) Nas ondas harmônicas simples o deslocamento y , depende da posição x , de certo elemento da corda escolhido e do instante t que será considerado. Resumindo, o deslocamento y é uma função da posição x , e do tempo t : y = F ( x, t ) . 8 Matemática Superior – Erwin Kreyszig. 17 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 2.3 Ondas Longitudinais Para este tipo de onda o deslocamento é ao longo da direção de propagação. Consideremos uma série de planos eqüidistante em um meio contínuo, e uma onda plana se propagando ao longo do eixo X . Existe uma perturbação do lado esquerdo desse meio Fig. 2-4, onde (a) é a posição de equilíbrio; (b) as posições deslocadas em um instante t promovido pela perturbação do lado esquerdo; (c) posições deslocadas no instante t + ∆t e (d) são os deslocamentos horizontais vistos como verticais. Esta imagem é instantânea, mostrando as posições de compressão em C; rarefação em R e as regiões de densidade normal em N. Sabendo que λ é a distância entre duas posições sucessivas quaisquer, que tenham a mesma fase, logo a distância entre duas rarefações sucessivas é um comprimento de onda. O som se propaga por meio de ondas materiais, através do ar e ou qualquer meio material. sen(x) sen(x+3/2) Y 4 (a) 3 2 1 (b) R N C N R (c) R N C N 0 -1 C R N b' a' (d) X Fig. 2-4 Onda longitudinal em um meio 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1011121314151617181920 2.4 Ondas Mecânicas e Ondas Eletromagnéticas Quando promovemos a deformação de certa região de um meio elástico, provocamos uma perturbação que só se propaga em presença de um meio material, dando origem a chamada onda mecânica, que temos como exemplo as ondas sonoras, que necessitam de um meio material para se propagarem. 18 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Quando a perturbação decorre da variação de velocidade de uma partícula eletricamente carregada, que se propaga tanto na presença de um meio material ou não (vácuo), damos o nome de onda eletromagnética, um exemplo deste tipo de onda é a luz. 2.5 Equação da Onda Vamos considerar um fio homogêneo inicialmente tenso e em repouso Fig. 2-5. Agora vamos supor que a extremidade a seja obrigada a realizar um MHS, na direção vertical obedecendo à equação. y = Asen Y 2π x (2-6) λ y=2 5 4 Fig. 2-5 Fio homogêneo tenso e em repouso 3 P a 2 1 0 0 2 4 6 8 10 X A função é uma senoidal simples e a equação da curva é dada por um deslocamento y em qualquer posição x . Considere um ponto P qualquer do fio de abscissa x , este ponto será atingido pela perturbação depois de um tempo t , sendo obrigado a repetir o movimento da fonte de perturbação. Tudo aquilo que acontecer com o ponto P , no instante t , ocorreu segundo antes com a fonte. Assim sendo podemos descrever quantitativamente o movimento de P , a partir da equação que descreve o movimento da fonte, logo levando em conta o atraso do movimento de P em relação a a , na Fig. 2-5. 19 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Na Fig. 2-6, pode ser visualizado, que para x =0, y =0 e x = λ , y também é zero. No instante t posterior, a onda deslocou a distância vt para a direita, como é observado pela curva alaranjada. A curva que representa a onda no instante t é deslocada para trás da distância −vt , ela irá coincidir com a do instante zero. Logo, a equação da curva no instante t é y = Asen 2π λ ( x − vt ) (2-7) sen(x) Sen(x-5/2) dx Y 1,0 0,5 t=0 t=t 0,0 x x vt Fig. 2-6 Deslocamento y nos instante zero e t -0,5 -1,0 0 2 4 6 8 Portanto no intervalo de tempo igual a um período T , a onda deslocou uma distância, e haverá um deslocamento y em certo ponto x e tempo t que há em ( x + λ ) e ( t + T ) , assim. y = A sen 2π λ [( x + λ ) − v (t + T )] = A se n Como λ = vT , y = Asen 2π λ 2π λ [ x + λ − vt − vT ] ( x − vt ) ; no entanto, uma onda que se desloca para a esquerda ao longo do eixo x , terá esta equação. y = sen 2π λ ( x + vt ) (2-8) Deduzimos nas equações (2-7) e (2-8), que o deslocamento y é zero em x =0 e t =0, porém isto não é o caso geral, e a expressão completa para uma onda deslocandose para a direita é 2π y = Asen ( x − vt ) + α λ (2-9) 20 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] onde α é o ângulo de fase. Se α for igual a 90º ou π 2 rad, o deslocamento para x =0 e t =0, é y =A. 2.6 Velocidade de Ondas Longitudinais A velocidade das ondas longitudinais depende das propriedades do meio no qual elas estão se propagando, (elasticidade e a densidade do meio). • Elasticidade: fornece as forças restauradoras às regiões deslocadas; • Densidade: fornece a inércia do sistema. Podemos achar a velocidade por análise dimensional, onde a velocidade em um meio é dada por E ρ , onde |E| é o módulo da elasticidade, e é expresso em termos de força, dividida por uma área, ML−3 ,dividindo essas Força Area MLt −2 = 2 = ML−1t −2 , as dimensões de ρ são L quantidades, vemos que as dimensões de E ρ , ML−1t −2 = L2t −2 , portanto a velocidade v é dada por −3 ML v=D E ρ (2-10) onde D, é uma constante adimensional. A velocidade de ondas longitudinais no interior de um gás, líquido e ou sólido são diferentes entre si. 2.6.1 Velocidade de onda longitudinal no interior de um líquido9 O módulo de elasticidade |E|, se torna o módulo volumétrico K, enquanto a constante D é a unidade. Portanto esta velocidade é dada por 9 Para a água temos K=2x109 N/m2 e ρ=103Kg/m3 , portanto a velocidade de ondas sonoras na água é v=1.414 m/s a 0°C. 21 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] v= K ρ (2-11) 2.6.2 Velocidade de onda longitudinal no interior de um gás O módulo volumétrico para processos isotérmicos10 em um gás é igual à pressão do gás, enquanto para processos adiabáticos11, o módulo volumétrico é igual a γ P , onde γ é a razão entre os calores específico de um gás a pressão constante, e a volume constante. Se a temperatura de um gás permanece constante quando uma onda longitudinal passa através dele, então a velocidade v no gás é v= P ρ (2-12) Para o ar a 0ºC, esta velocidade é aproximadamente 280 m/s, enquanto a velocidade do som medida para este caso é de aproximadamente 332 m/s. Se considerarmos uma onda sonora com freqüência de 400 vibrações/segundos, passando através do ar, o tempo entre uma compressão e uma rarefação sucessiva é então 0,00125s, pois na compressão o ar é aquecido e na rarefação ele é resfriado; isto acontece com grande rapidez, e por ser tão rápido o gás não tem tempo de ganhar ou perder calor para o exterior, logo este processo é adiabático e na equação (2-11) o módulo volumétrico para a condição adiabática é K = γ P e γ , para o ar é aproximadamente 1,40. 2.6.3 Velocidade de onda longitudinal em Hastes Sólidas O módulo de elasticidade que se aplica ao caso de uma haste é o módulo de Young, Y , portanto da equação (2.10) a velocidade do som numa barra é v= 10 11 Y ρ (2.13) À mesma temperatura. Não ocorrem trocas térmicas com o exterior. 22 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Para a madeira de carvalho, Y=1,4x1010 N/m2 e sua densidade, aproxima-se de 750 kg/m3. Portanto a velocidade do som na haste de madeira de carvalho é 4.320 m/s, isto é aproximadamente 10 vezes a velocidade do som no ar e 3 vezes a do som na água. 2.6.4 Velocidade de onda em um sólido ilimitado. O módulo volumétrico é o K e o n , é o módulo de rigidez do meio. Considerando o planeta terra como um sólido ilimitado, temos para ondas de terremoto a velocidade igual a K +4 v= ρ n 3 (2-14) O módulo de elasticidade aplicado a uma onda transversal é o módulo da rigidez n do meio, n , e a velocidade é dada por uma análoga a equação (2-5) onde v = . ρ “Em um terremoto12 há um reajustamento das rochas a uma distância relativamente próxima à superfície da terra que dá origem a ondas longitudinais e transversais. Estas ondas são detectadas por sismógrafos, colocados em lugares estratégicos, a primeira onda a chegar até o sismógrafo é longitudinal e é chamada de onda primária, depois vem a onda transversal chamada de onda secundária. As duas velocidades variam com a profundidade abaixo da superfície e é pela análise destas ondas que se obtém algumas idéias das constantes elásticas, a grandes profundidades da terra. Existem algumas dúvidas sobre se a onda transversal pode se propagar através do centro da terra, já que não existe onda transversal em líquido.” 2.7 Propriedades das Ondas 2.7.1 Reflexão Assim como os pulsos as ondas se refletem ao atingir um obstáculo que impeça sua propagação. Os pulsos que se propagam em cordas refletem-se mantendo a mesma forma do pulso original, também chamado de pulso incidente, se essa corda tiver a 12 Curso de Física: Ondas (som e luz) – Machael Ference Jr. et. al. 23 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] extremidade final livre a reflexão ocorre sem inversão de fase, porém quando a extremidade final estiver fixa, o pulso refletido será invertido em relação ao pulso incidente, portanto, a reflexão ocorreu com inversão de fase ou pulso incidente com defasagem de π rad , Fig. 2-7. Portanto quando uma onda encontra uma superfície de propagação entre dois meios, a energia por ela transportada é conduzida de volta em sentido inverso ou formando um ângulo agudo13 com a direção de incidência do raio, dentro do seu próprio meio, através de um movimento ondulatório de mesmo período. Fig. 2-7 Onda refletida em uma corda, com defasagem de π rad Se houver reflexão total, toda a energia da onda original é transportada pela onda refletida, Fig. 2-8. As frentes de ondas representadas por F , estão separadas pela distância λ , que atingi um anteparo plano. Refletem-se e dão origem a novas frentes de ondas F ' , que é separada pelo mesmo λ . N 20 18 i 16 14 12 F F' F F' r Meio 1 F F' 10 8 λ λ 6 4 Fig. 2-8 Raio sendo totalmente refletido Meio 2 2 0 0 13 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 Ângulo menor que um ângulo reto. 24 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] O raio incidente i é perpendicular às frentes de ondas incidentes F , e o raio refletido r é perpendicular às frentes de ondas refletidas F ' . O ângulo formado entre o raio incidente e a normal N ao anteparo, é o ângulo de incidência θi , e entre a normal e o raio refletido é θ r . θi = θ r (2-15) 2.7.2 Refração Ocorre quando uma onda encontra uma superfície de separação entre dois meios, e a energia por ela transportada prossegue no segundo meio, com velocidade de propagação diferente. Embora a velocidade de propagação mude, sempre que a onda passa de um meio para outro, o desvio na direção da trajetória só ocorre quando a incidência é obliqua. Caso a onda incidente tenha um ângulo de 90º (normal) à superfície de separação dos meios, a direção de propagação não sofre desvio embora ainda ocorra variação na velocidade. Na Fig. 2-9 mostramos a refração de ondas bidimensional, as frentes de ondas planas F , separada pelo comprimento de onda λi , propagam no Meio 1 com velocidade vi . 20 N i 18 vi Meio 1 16 F 14 Fig. 2-9 Raio sendo totalmente refratado F 12 10 8 vr F' F' 6 4 Meio 2 r 2 0 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 A onda muda sua direção de propagação ao passar pela superfície do Meio 2, com novo comprimento de onda λ r , nova velocidade vr . O ângulo de incidência com a 25 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] normal é θi , e o ângulo de refração é θ r . As refrações das ondas obedecem a lei de Snell–Descartes, e podem ocorrer simultaneamente com a reflexão. senθi vi = senθ r vr (2-16) 2.7.3 Índice de Refração Absoluto Agora vamos definir o Índice de Refração Absoluto. Para isto vamos adotar um determinado meio como padrão e definir o índice de refração relativo em relação a este meio padrão. Seja v1 a velocidade de propagação no meio 1, e v , a velocidade de propagação da onda no meio padrão. Usando então a lei de Snell. n1, Padrao = v v1 (2-17) O índice de refração relativo do meio 1, em relação ao do meio adotado como padrão, é chamado índice de refração absoluto do meio 1, e é indicado por n1 ; n1 = v . v1 Da mesma forma define-se o índice de refração absoluto do meio 2, n2 = v . v2 Estabelecendo uma relação entre n1 e n2 , temos, mas por outro lado temos que equação forma, (2-16) temos n2 v v1 n v = . e isto é igual a 2 = 1 , n1 v2 v n1 v2 n2 v = n1,2 , da equação (2-17) temos, n1,2 = 2 e da n1 v1 senθi = n1,2 , senθ r logo podemos escrevê-la da seguinte senθi n2 = e temos. senθ r n1 n1senθi = n2 senθ r (2-18) 2.7.4 Índice Reflexão Total Quando o índice de refração absoluto, do meio 2 é maior que o índice de refração do meio 1, ( n2 > n1 ), dizemos que o meio 2 é mais refrativo que o meio 1, ou 26 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] melhor, mais refringente. Quando a onda passa do meio mais refringente para o menos refringente, podemos escrever da seguinte forma: n1 < n2 ; v v < ; v1 > v2 , notamos que a v1 v2 onda se propaga com menos velocidade no meio mais refringente. Se usarmos a lei de Snell pode-se mostrar que, quando uma onda passa de um meio menos refringente para um mais refringente, o raio de onda aproxima-se da normal, senθi n senθi = n1,2 = 2 , como n2 > n1 , temos > 1; senθ r < senθi ;θ r < θi . Caso senθ r n1 senθ r contrário o raio de onda afasta-se da normal. Existe um ângulo máximo de incidência, para qual o ângulo de emergência é igual a 90°, então pela equação (2-18) temos: senθi n n = 1 ; senθi = 1 . sen90° n2 n2 N -6 Meio 2 -4 n 2 > n1 i -2 0 Meio 1 2 4 6 0 2 4 6 8 10 12 Fig. 2-10 Caso o ângulo máximo de incidência seja maior que o ângulo limite, então a onda não sofre refração e passa a ter uma reflexão total. Este ângulo é chamado de ângulo limite, θ L , sendo senθ L = n1 , onde n1 é o n2 índice de refração absoluto do meio menos refringente e n2 do meio mais refringente. 2.7.5 Difração Existem certos fatos que contrariam a propagação retilínea das ondas. Este fenômeno é o que conceitua a difração. Portanto a difração é a capacidade que a onda tem de contornar um obstáculo, invadir regiões onde não deveria propagar-se, caso admitimos sua propagação retilínea nos meios homogêneos, deixando de existir assim o que seria a sombra geométrica projetada pelo obstáculo. 27 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] O fenômeno da difração é de caráter essencialmente ondulatório e é explicado pelo principio de Huyghens, Fig. 2-11, os pontos dos orifícios ou do contorno destes, ao serem atingidos pelas ondas originadas na fonte, passam a constituir focos emissores secundários, emitindo em todas as direções. Fonte Emissora Fig. 2-11 Principio de Huyghens, cada ponto passa a constituir focos emissores secundários “Cada ponto de uma superfície de onda (ou de uma linha de onda) comporta-se como se fosse origem de novo movimento ondulatório, com o mesmo período do original.” Huyghens Graças ao fenômeno da difração ouvimos uma pessoa que fala num recinto diferente daquele em que nós encontramos. É possível verificar que a difração depende do comprimento de onda λ , pois se o valor de λ for reduzido, a onda praticamente não contorna o obstáculo, porém se o valor de λ for aumentado, a difração irá se acentuando. 2.7.6 Interferência Quando dois ou mais movimentos ondulatórios se propagam no mesmo meio, eles não se modificam mutuamente. A perturbação que se observa em cada ponto desse meio e em qualquer instante é a soma das perturbações, devido a cada uma das ondas, 28 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] individualmente, no mesmo ponto e no mesmo instante14, chamamos de Superposição de Ondas Individuais. Quando os movimentos ondulatórios são de mesma freqüência, a superposição de ondas determina efeitos típicos e importantes, que chamamos de Interferência de ondas individuais, exemplo: quando movimentos ondulatórios de freqüência e amplitude iguais se propagam na mesma direção mas em sentido oposto, eles se interferem resultando em uma onda estacionária. Fig. 2-12 Interferência entre duas fontes fotografadas por iluminação estroboscópica. Existem várias formas de interferências; vamos analisar algumas destas formas que podem ocorrer quando duas ondas bidimensionais atingem simultaneamente o mesmo ponto. P S2 F2 S1 Fig. 2-13 Fonte de ondas bidimensional em concordância de fase F1 14 Este é o principio da Independência das Ondas, que nada mais é que uma extensão ao movimento ondulatório do princípio de Galileu ou da Independência dos Movimentos. 29 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] A Fig. 2-13, representa duas fontes, F1 e F2 , em concordância de fase, produzindo ondas bidimensionais que atingem o ponto P . Seja S1 o percurso da fonte F1 até o ponto P , e S 2 o percurso da fonte F2 até o ponto P . A diferença de percurso é ∆S = S1 − S 2 . Ao atingir o ponto P , as ondas podem provocar alguns tipos de superposições (interferências). 1. Interferência construtiva As ondas ao atingirem o ponto P , estão em concordância de fase. Sendo A1 , a amplitude da onda produzida pela fonte F1 , A2 a amplitude da onda produzida pela fonte F2 , e A , a amplitude da onda resultante. Efetuando-se a superposição, o ponto passa a oscilar com amplitude A = A1 + A2 . Normalmente sabemos a diferença de percurso e o comprimento de onda, portanto se o número obtido na divisão do percurso pelo comprimento de onda for um número natural a interferência será construtiva. ∆S λ =n com n = 0,1, 2,3, 4... (2-19) 2. Interferência destrutiva As ondas ao atingirem o ponto P , estão em oposição de fase. Pelo principio da superposição as ondas passam a oscilar com amplitude A = A1 − A2 . Neste caso a diferença de percurso deve ser a distância entre os pontos que oscilam em oposição de fase, efetuamos a divisão da diferença de percurso, ∆S , pelo comprimento de onda, obtendo um quociente de um número natural mais meio. ∆S λ = n+ 1 2 com n = 0,1, 2,3, 4... (2-20) 30 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Fig. 2-14 Duas fonte de ondas bidimensional representando pontos de interferência construtiva e destrutiva 3. Interferência parcial As ondas chegam ao ponto P , com uma diferença de fase que nem é nula e nem correspondente às fases opostas, são os pontos intermediários que se situam entre a superposição destrutiva e a construtiva. Esses pontos terão uma amplitude intermediária, A1 − A2 < A < A1 + A2 , neste caso a diferença de percurso não obedece a nenhuma das condições anteriores, n ≠ ∆S λ ≠ n+ 1 com n = 0,1, 2,3, 4... . 2 2.8 A unidade padrão de medida do Som Definida pelo Sistema Internacional como Unidade de uma escala numérica, cujos valores são dados pelo logaritmo decimal da relação entre o valor considerado de uma potência e um valor de potência tomado como referência. Na prática é usado única e exclusivamente o submúltiplo decibel (dB), com o qual se mede toda grandeza N que pode ser expressa por uma equação do tipo. A N = 10k log 1 A2 (2-21) na qual A1eA2 são duas grandezas da mesma espécie (pressões, tensões elétricas, correntes, etc) e k é um número determinado pela correlação matemática entre a grandeza A e a potência. Por exemplo, a atenuação e a amplificação de uma transmissão de energia eletromagnética, o nível de pressão sonora, etc. 31 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Pela definição, pode-se notar que o decibel sozinho não é uma grandeza física absoluta, mas uma transformação de uma relação linear entre duas grandezas da mesma espécie em uma relação logarítmica. Entretanto, o decibel pode ser usado para indicar uma grandeza absoluta. Basta considerar um valor de referência para A1. Se, por exemplo, A1 é igual a 1 miliwatt, o valor de A2 pode ser calculado a partir do valor em decibéis. Essa especificação de potência como o valor em decibéis em relação a uma referência de 1 mW é chamada dBm e é bastante usada em amplificadores de áudio. Voltando ao amplificador anterior, se, por exemplo, ele tem uma potência máxima de saída de 100 W, podemos especificá-la em dBm. Assim, 100 N = 10 log = 50dBm . Ou seja, no amplificador considerado, o ganho de 0, 001 potência é 20 dB e a potência máxima é 50 dBm. E o fator k da fórmula anterior, para que serve e como se determina. Notar que, por definição, decibel se refere a potências e, no uso de outras grandezas, deve ser usado um fator que as relacione com a potência. Conforme a fórmula da potência elétrica e a lei de Ohm, a relação entre a potência e a corrente que circula num resistor é dada por P = RI 2 (2-22) E a relação entre duas potências P1 e P2 , dissipadas por este resistor na presença das correntes I1 e I 2 , é dada por, P2 I 22 = P1 I12 (2-23) E a relação logarítmica é, I 2 P2 I log = log 2 = 2 log 2 I1 P1 I1 (2-24) Portanto, é lógico supor que k = 2 para corrente elétrica. Pode-se demonstrar que o mesmo número vale para tensão elétrica e pressão mecânica. A Fig. 2-15 mostra a curva da função y = log ( x ) . Note a pequena variação numérica de y em relação à variação de x que é de 0 a 3 para y contra 1 a 1000 para x . E se a variação de x fosse, por exemplo, 10 vezes, 1 a 10000, a variação de y seria apenas de 0 a 4. Assim, o logaritmo é uma forma conveniente de expressar variáveis 32 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] cujos valores numéricos se encontram em faixas bastante amplas. Note também, conforme figura, uma variação de x no início representa uma variação de y y1 , indicada em azul. Já a mesma variação de x num valor mais alto corresponde a y2 significativamente menor. Fig. 2-15 função y = log x 33 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 3 Som 3.1 Introdução O som que é produzido por uma fonte sonora, estabelece no meio material uma série de distúrbios mecânicos relacionados entre si. Estes distúrbios, a partir da fonte, espalham-se através do meio por razões físicas definidas e bem conhecidas. O estudo do som é pouco explorado pelos pesquisadores da física, um bom exemplo disso é a pequena parte voltada a este estudo nos currículos. As ondas sonoras consistem basicamente em movimentos regulares e sistemáticos das moléculas do meio transmissor, sobreposto ao movimento térmico dessas moléculas, que se afastam da fonte sonora produzindo em nossos ouvidos efeitos mecânicos e afetando os nervos sensoriais que são interpretados como som pelo nosso cérebro. Podemos definir o som de duas formas, uma pela causa, e a outra pelo efeito. • Pela causa: É um movimento vibratório organizado das moléculas em um meio elástico. • Pelo efeito: É a sensação auditiva produzida por uma fonte sonora, que chega até o ouvido por deslocamento de partículas. Portanto podemos dizer que o som é basicamente o efeito produzido por ondas mecânicas, longitudinais, tridimensionais capazes de impressionar o ouvido. Porém para que se produza uma sensação auditiva, a freqüência da onda que chega até o observador deve estar compreendida entre 20 Hz e 20.000 Hz - Hertz (Hz, significa ciclos por segundo). Estes limites não são fixo, eles podem variar de indivíduo para indivíduo. Quando uma onda possui freqüência maior que 20.000 Hz ela é denominada onda ultra-sônica, porém se menor que 20 Hz, onda infra-sônica, Fig. 3-1. O som não se propaga no vácuo, ele necessita de um meio material para se propagar. Infra-som Som Ultra-som Fig. 3-1 Representação esquemática dos limites audíveis. 34 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 3.2 Ondas Sonoras Ondas sonoras são vibrações longitudinais do meio material, que são transmitidas com uma velocidade determinada pela propriedade mecânica do próprio meio de propagação. Em geral, as ondas sonoras têm sua origem em alguma espécie de vibração mecânica causada por distúrbio no meio. Para um meio isotrópico15 extenso, as frentes de onda são superfícies esféricas que se expandem sujeitas as dificuldades que possam encontrar. As ondas sonoras também apresentam todos os fenômenos característicos de ondas, como: reflexão, refração, difração, interferência. 3.3 Velocidade de Propagação do Som Como onda mecânica longitudinal que é, o som necessita de um meio material para se propagar. Este meio pode ser sólido, líquido ou gasoso podendo se propagar com velocidades específicas para cada material, (veja item 2.6). A velocidade de propagação do som nos sólidos é maior que nos líquidos, que por sua vez é maior que nos gases. Quanto mais próximas as moléculas maior a velocidade do som no material (veja Tabela 3-1) Tabela 3-1 Velocidades do Som em Meios Diferentes Meio Ar Ar Hélio Hidrogênio Álcool Metílico Água Água Água do Mar* Mercúrio Velocidade (m/s) 332 343 972 1280 1140 1414 1480 1520 1450 Temperatura (ºC) 0 20 0 0 25 0 20 0 20 Meio Borracha Polietileno Chumbo Prata Cobre Alumínio Aço Granito Velocidade (m/s) 54 920 1300 2700 3560 5000 5940 6000 Temperatura (ºC) 0 0 0 0 0 0 0 0 *a 3,5% de salinidade Existem outros fatores que afetam a velocidade do som no ar. Um deles é a umidade. A umidade reduz a densidade do ar seco à mesma temperatura. Assim a 15 Que apresenta a mesma propriedade física em todas as direções. 35 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] velocidade do som aumenta à medida que a umidade aumenta. A altitude também altera a velocidade do som no ar, pois, em maiores altitudes o ar é menos denso (ar rarefeito). A velocidade do som dependerá também da intensidade do som. Se as intensidades forem muito grandes, como nas explosões, a propagação da energia será feita inicialmente na forma de uma onda de choque, que tem velocidade maior que aquela das ondas sonoras normais na mesma temperatura e pressão. Quanto mais violenta a explosão, mais intensa é a onda de choque que a acompanha e maior a sua velocidade de propagação. À medida que se propaga a onda de choque vai se dissipando e finalmente se transforma em uma onda sonora normal. 3.4 Qualidades Fisiológicas do Som A emissão de ondas sonoras por uma fonte sonora pode ocorrer de várias maneiras. A fonte sonora pode emitir um abalo audível isolado como um tiro de uma arma de fogo, som conhecido como estampido, ou quando uma fonte sonora vibra periodicamente, que são conhecidos como sons musicais. Quando a fonte emissora de som não vibra periodicamente, os sons recebidos pelo observador são considerados ruído. A forma como é percebido o som é um critério bastante subjetivo, pois varia de indivíduo para indivíduo. As qualidades fisiológicas do som são: 3.4.1 Altura do Som É a qualidade que nos leva a considerar um som como “grave” ou “agudo”. A propriedade física que nos permite classificar ou separar um som grave de um agudo é a freqüência de vibração da fonte sonora. Um som será considerado tanto mais agudo, quanto maior for sua freqüência, e será considerado tanto mais grave quanto menor for sua freqüência. Denomina-se intervalo entre dois sons de freqüências f 2 e f1 , sendo f 2 > f1 , a relação 36 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] i= f2 f1 (3-1) Em decorrência da definição, teremos sempre i ≥ 1 , o intervalo sendo uma razão entre grandezas da mesma espécie, é uma grandeza adimensional. Quando o intervalo for igual a 1, ou seja, quando f 2 = f1 , o intervalo recebe o nome de Uníssono. Quando o intervalo for igual a 2, ou seja, quando f 2 = 2 f1 , ele recebe o nome de intervalo de oitava, ou seja, um dos sons tem o dobro da freqüência do outro. 3.4.2 Intensidade do Som A intensidade das ondas foi definida como sendo a potência transmitida por unidade de área disposta perpendicularmente à direção de propagação, esta definição é física e não subjetiva. A intensidade subjetiva ou percebida é chamada de sonoridade, que é a qualidade que nos leva a considerar um som “forte” ou “fraco”. Para cada freqüência, existe uma intensidade mínima abaixo da qual o observador não percebe o som. Esta intensidade mínima é chamada de limiar da sensação auditiva para a freqüência considerada. Por outro lado, existe uma intensidade na qual a sensação auditiva é acompanhada de uma sensação dolorosa, esta intensidade é chamada de limiar da sensação dolorosa. O intervalo entre estas duas sensações é chamado de intervalo de audibilidade. Podemos perceber que o ouvido humano caracteriza-se como um medidor acurado. Enquanto os medidores produzidos pelo homem podem medir com boa sensibilidade, faixas de 103 unidades, o ouvido humano pode detectar sons de intensidade que diferem por um fator de até 1012. A intensidade I de uma onda é o quociente entre a energia ∆E que atravessa uma superfície perpendicular à direção de propagação pela área A da superfície na unidade de tempo. I= ∆E A.∆t (3-2) Sendo ∆E , medido em joule, A , medido em m2 e ∆t em segundos, ficando assim a unidade de I . I= J W = 2 2 m .s m (3-3) 37 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] A mínima intensidade física que uma onda sonora deve ter para que seja audível é aproximadamente 10-12 W/m2. Mas por outro lado se a intensidade exceder 1W/m2 ela provocara efeitos dolorosos. O ouvido humano não é excitado linearmente pela intensidade física do som, assim ao se dobrar a intensidade física de um determinado som, o ouvido distingue um som mais forte, porém não duas vezes mais intenso. Para se medir a intensidade auditiva também denominada nível sonoro do som, deve-se utilizar uma escala logarítmica. Considerando I 0 a menor intensidade física do som audível (limiar da sensação auditiva), e I , a intensidade do som que se quer medir. Define-se intensidade auditiva β de um som o expoente a que se deve elevar o número 10, 10 β = I . Portanto I0 podemos escrever. β = log I I0 (3-4) Onde β é medida em bel, nome dado em homenagem a Alexander Graham Bell (ver capítulo 1). Geralmente, medimos β em unidade menor, o decibel (dB), sendo 1dB = 1 B. 10 3.4.3 Nível de Intensidade Sonora e Nível de Pressão Sonora • Nível de Intensidade Sonora Cientistas ao estudarem os fenômenos relacionados com a intensidade do som, perceberam que a “sensação” produzida em nosso ouvido, pelo som de uma certa intensidade I, não varia proporcionalmente a esta intensidade. Um som de intensidade I 2 = 2 I1 não produz, em nosso ouvido, uma “sensação” duas vezes mais intensa do que aquela produzida por I1 . Os cientistas verificaram que esta sensação variava com o logaritmo da intensidade sonora16. 16 Nepomuceno, L. A. e Russo, I. C. P. 38 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Por esta razão, para medir esta característica do nosso ouvido, foi definida uma grandeza NIS. A unidade mais usada, porém, para a medida de β é o “decibel”, 1dB=0,1B. Assim podemos reescrever a Eq. (3-4) como: I NIS = 10 log I0 (3-5) onde I é a intensidade da onda sonora e I0 é uma intensidade de referência: I0 = 10-12 W/m2 (veja item 3.4.2), e NIS é o nível de intensidade sonora cuja unidade é o dB (ver item 2.8). Observe, então, que: I Se I = I 0 , temos NIS = 10 log 0 = 10 log1 ⇒ NIS = 0 dB I 0 10I Se I = 10I 0 , temos NIS = 10 log 0 = 10 log10 ⇒ NIS = 10 dB I 0 100I 0 Se I = 100I 0 , temos NIS = 10 log = 10 log100 ⇒ NIS = 2 0 dB I 0 1000I 0 Se I = 1000I 0 , temos NIS = 10 log = 10 log1000 ⇒ NIS = 3 0 dB e assim, I 0 sucessivamente. Observe que quando multiplicamos a intensidade de uma onda sonora por 10, adicionamos 10 dB ao nível de som. Logo, o som, cujo nível sonoro é de 1B possui intensidade ( I ) 10 vezes maior do que o som de intensidade I 0 , o de nível sonoro 2B, possui intensidade ( I ) 100 vezes maior do que I 0 etc. Tabela 3-2 Níveis sonoros de alguns sons típicos Tipo de Som Limiar da audição Sussurro das folhas Murmúrio (a 1m) Rua sem tráfego Conversação normal (a 1m) Tráfego pesado Metrô (a 2 m) Limiar doloroso Decolagem de jato (a 50 m) NIS (dB) 0 10 20 40 60 80 90 120 140 Na Tabela 3-2 apresentamos o nível de intensidade sonora de alguns sons. Os sons de grande intensidade, de maneira geral, são desagradáveis ao ouvido humano e, como mostra a Tabela 3-2, quando atingem uma intensidade próxima de 120 dB, começam a produzir sensações dolorosas. 39 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] • Nível de pressão sonora Os fenômenos relacionados com a sensação auditiva podem também ser definidos alternativamente em termos do Nível de Pressão Sonora, dado por P NPS = 20 log P0 (3-6) onde NPS é o nível de pressão sonora e P0 é o padrão de referência que equivale à menor diferença de pressão sonora audível e cujo valor é P0 = 20x10-6 Pa. A unidade de NPS é também dada em dB (ver item 2.8). Os sons de grande intensidade, de uma maneira geral, são desagradáveis ao ouvido humano e quando atingem uma intensidade próxima de 120 dB, começam a produzir sensações dolorosas (veja Tabela 4-1). A intensidade de energia sonora é também equivalente a: P2 I= Z (3-7) ou seja, o quadrado da pressão sonora dividido pela impedância característica Z do meio no qual o som se propaga, que é definida como: Z = ρ v , onde ρ é a densidade do meio e v a velocidade de propagação do som no meio. Se tomarmos uma pressão sonora de referência P0 equivalente a I0 teremos: I0 = P02 Z (3-8) P2 / Z Substituindo as Eqs. (3-7) e (3-8) na Eq. (3-6) obtemos: NPS = 10 log P0 / Z P 2 P ou seja: NPS = 10 log e finalmente: NPS = 20 log P0 P0 3.4.4 Timbre É a qualidade que permite ao ouvido diferenciar sons de mesma altura e intensidade, emitidos por fontes diferentes. Uma mesma nota musical tocada por um violão e por um piano produz sensações diferentes. Isto é devido à forma da onda que é emitida pelo instrumento. Em geral o som emitido por instrumentos é complexo. Ao dedilhar as cordas de um violão produz vibrações nestas cordas; porém ela esta presa ao corpo do 40 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] instrumento, que se põem a vibrar juntamente com a corda, resultando na superposição do som fundamental com sons secundários emitidos pelos instrumentos, (ver item 2.7.6). Quando as freqüências dos sons secundários são múltiplos da freqüência do som fundamental, os sons secundários são chamados de harmônicos do som fundamental. O timbre de um som depende do número e da intensidade dos harmônicos que acompanham o som fundamental, mas não depende da defasagem entre os harmônicos e o som fundamental. 3.5 Velocidade de Mach Quando um objeto se move na atmosfera, ele gera ondas de pressão esféricas, ondas essas que se propagam com a velocidade das ondas sonoras. Em particular, as cristas das ondas geradas pelo objeto ficam tão mais próximas umas das outras à frente do objeto e tão mais afastadas atrás dele quanto maior for a velocidade do objeto em relação à atmosfera. Se a velocidade do objeto estiver próxima da velocidade das ondas sonoras, as cristas à frente se sobrepõem, formando uma crista única, de amplitude maior do que a amplitude das ondas originais. Assim, à frente do objeto, a pressão atmosférica fica bem maior do que o seu valor normal. Fig. 3-2 Ondas sonoras nas quais cristas à frente se sobrepõem formando uma crista única de amplitude maior do que a amplitude das ondas originais, quanto maior a velocidade mais fácil torna romper a barreira do som Quando o objeto se move à velocidade das ondas sonoras, a crista única passa a ter uma amplitude muito grande e recebe o nome de onda de choque. No caso de um avião, cada ponto de sua superfície externa se comporta como uma fonte de ondas de pressão e quando a velocidade do avião se aproxima da velocidade das ondas sonoras, 41 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] começam a se formar ondas de choque sobre as asas e perto do nariz. Isso representa um grande obstáculo ao vôo já que aparecem problemas estruturais e de pilotagem, além de uma grande resistência ao avanço do avião devido a grande pressão do ar a sua frente. Todas essas dificuldades constituem o que se costuma chamar de barreira do som. A razão entre a velocidade de um objeto e a velocidade das ondas sonoras é o número de Mach (M), nome dado em homenagem a Ernest Mach, cientista e filósofo Austríaco, estudioso de balística. As velocidades para as quais M < 1 são chamadas subsônicas e velocidades para as quais M > 1 são chamadas supersônicas. As dificuldades ao vôo apontadas acima ficam bastante reduzidas para velocidades tais que M > 1, 2 porque, nessas velocidades, as ondas de choque aparecem destacadas do avião, um pouco a sua frente. 3.6 Efeito Doppler Quando uma fonte sonora ou seu receptor estão se movendo ocorre uma alteração aparente na freqüência percebida do som que é denominada Efeito Doppler. Suponhamos que uma fonte A emite 100 frentes de ondas por segundo. Um observador B perceberá a passagem de 100 frentes de ondas a cada segundo. Entretanto, se o observador se move na direção da fonte, o número de ondas que ele encontra a cada segundo aumenta proporcionalmente à sua velocidade e a freqüência aparente será dada por: f = fA v + v0 v (3-9) onde f A é a freqüência da fonte, v0 a velocidade do observador, e v a velocidade do som. Assim a freqüência aparentemente aumenta enquanto o observador se move em direção à fonte. Quando o observador passa pela fonte, a freqüência cai abruptamente, já que ele passa a se afastar da fonte, nesse caso, v0 deve ser subtraída de v . 42 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Fig. 3-3 Ondas sonoras sendo produzidas em f A enquanto o fA B observador, B , se movimenta em direção a fonte O mesmo efeito ocorre se a fonte estiver em movimento, como no caso de uma ambulância que passa com a sirene ligada por um observador. A Fig. 3-4 mostra que as ondas produzidas se assemelham a esfera cujos centros se deslocam na direção do movimento da fonte. fA B Fig. 3-4 Ondas sonoras sendo produzidas em f A enquanto a própria fonte se movimenta em direção ao Observador, B Neste caso a freqüência aparente será: f = fA v v − vA (3-10) 3.7 Análise dos Sons e Qualidades de um Tom Se vibramos uma corda no ponto médio, este ponto será um ventre de deslocamento e portanto não existirão os segundo, quarto, sexto, etc., harmônicos de frequências 2 f1 , 4 f1 , 6 f1 etc. Suponhamos que o ponto médio de uma corda de comprimento l é erguido de uma distância h e depois solto. O deslocamento y de qualquer ponto x da corda no instante t , pela "análise de Fourier", é igual a: 43 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] y= 8h π 2 sen πx l cos Wesley Pacheco Calixto [email protected] π vt 1 l0 3π x 3π vt 1 5π x 5π vt 1 7π x 7π vt − sen + sen − sen + ... (3-11) cos cos cos 9 l l 25 l l 49 l l onde v é a velocidade da onda na corda. O período T1 do som fundamental é dado pela equação: 2π = π vT1 l ou T1 = 2l v (3-12) e sua frequência, f1 é: f1 = 1 v = T1 2l (3-13) Vemos, assim que as frequências dos harmónicos pares 2 f1 , 4 f1 , 6 f1 etc., estão ausentes e que as amplitudes dos harmónicos ímpares decrescem na razão do quadrado dos números ímpares, isto é, 1 1 1 1 , , , etc. 9 25 49 81 Fourier mostrou, em 1807, que qualquer função periódica pode ser expressa como a soma de certo número de funções seno e coseno com amplitudes apropriadas. Por esta análise de Fourier é possível decompor uma forma da onda complexa em seus componentes harmônicos. Este modo de analisar é de grande importância em quase todos os ramos da física. O primeiro trabalho de Fourier foi na análise da propagação de ondas de calor em várias substâncias. Como outro exemplo do uso da análise de Fourier, consideremos a forma real da onda, de uma nota produzida por um violino, sob certa condição. A forma da onda resultante, do tom produzido, pode ser registrada por meios mecânicos, usado por Miller17, ou por meios elétricos, usando um microfone, amplificador e osciloscópio. Esta forma de onda composta pode, pois, ser analisada em suas ondas componentes, por uma máquina conhecida como “analisador harmônico”. Se é conhecida a equação da forma da onda composta, pode-se fazer uma análise matemática; senão, faz-se por tentativas, um processo de adivinhação com um analisador harmônico. Analiticamente, esperamos que um tom musical possa ser representado pela soma de um certo número de tons simples e que estes tenham frequências que são múltiplos de um tom fundamental. Este fato é verificado fisicamente pelo uso de registradores mecânicos ou osciloscópios e, até certo ponto, mesmo por ouvidos treinados. 17 Miller, D.C. 44 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Bata violentamente a tecla vizinha ao C mais grave do piano, ponha o pé no pedal de sustentação e ouça com cuidado à medida que o som vai morrendo. Você poderá ouvir o C próximo mais agudo, G acima daquele e depois C, E, G, B, . . . estes tons fracos de múltiplos de freqüências bem definidos são chamados harmônicos ou tons parciais do tom fundamental que foi tocado. É a presença de harmônicos que nos permite distinguir um C agudo da flauta do de um violino ou outro instrumento musical produzindo o mesmo tom agudo C. A distinção entre sons musicais que nos possibilitam identificar sua origem chama-se qualidade da nota. Assim, podemos dizer que a qualidade de uma nota musical é determinada pelas amplitudes relativas e freqüências de seus tons parciais harmônicos. 45 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 4 Poluição Sonora 4.1 Poluição Sonora É bem sabido que as ondas eletromagnéticas (como os raios X, raios gama, raios ultravioleta, etc.) sob certas condições podem causar danos à saúde do homem. Além das ondas eletromagnéticas as ondas sonoras também podem causar mal-estar ou afetar a saúde do homem de forma física ou psicológica (Apêndice B.2). O som é transmitido por ondas de pressão através do ar ao viajar de um objeto em vibração até a orelha de um ouvinte como já vimos no Capítulo 3. As ondas de pressão podem ser produzidas em qualquer material que tenha elasticidade. O som consiste, portanto, em ondas de pressão em um meio elástico. Quanto maior a pressão mais intenso é o som. O som ao atingir o ouvido de uma pessoa causa uma variação de pressão no ouvido desta pessoa. Quando o som se torna indesejável ele é classificado como barulho. Essa definição de barulho, como “som indesejável”, incorpora dois elementos inseparáveis do barulho: preferência opinativa (indesejável) e o fenômeno físico (som). A diferença fundamental entre barulho e som é o aspecto “indesejado”. A classificação do barulho é, portanto, subjetiva. O que é música para uma pessoa pode ser barulho para outra. O barulho é citado como um dos principais condicionantes que afetam o rendimento no trabalho. Considera-se o barulho um estímulo auditivo que não contém informações úteis para a tarefa em execução e que tem incomodado os humanos há muitos anos18. A primeira referência escrita sobre o efeito do barulho foi feita por Plínio, o Velho, cerca de 600 a.C, deixando em sua obra Naturalis historia referências ao ensurdecimento 18 Alguns livros textos utilizam a palavra “ruído” para definir “som indesejável”. No entanto a definição de ruído é: “ruído é uma oscilação acústica aperiódica originada da soma de várias oscilações audíveis com diferentes freqüências”, logo, não é necessariamente um som indesejável. Tal confusão surge pelo fato que no inglês a palavra noise é a única disponível, significando tanto ruído quanto barulho conforme a sua contextualização. Existem, no entanto, várias línguas que permitem diferenciar as terminologias ruído e barulho. Na língua francesa, por exemplo, a palavra barulho é traduzida por bruit e ruído por rumeur, enquanto que no alemão barulho é lärm e ruído geräusch. Já que na língua portuguesa também existem duas palavras para designar conceitos diferentes não há porque utilizar uma única palavra para duas significações diferentes. 46 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] de pessoas que viviam perto da catarata do Nilo, relacionando exposição a barulho e surdez. No final do século XVII, Bernardino Ramazzini, descreve em seu livro sobre as doenças dos trabalhadores um capítulo das enfermidades dos trabalhadores em bronze, descrevendo a surdez nos bronzistas. No século XX, com o avanço tecnológico, a introdução do rádio, do amplificador, aparecimento do automóvel e desenvolvimento da aviação militar, houve um aumento do barulho na zona urbana. A partir dos anos 50, aconteceu o crescimento descontrolado da industrialização. Algumas pesquisas indicam que o barulho que nos rodeia duplica a cada dez anos. No Brasil o primeiro trabalho sobre perda auditiva induzida por barulho foi publicado em 1938 pelo médico otorrinolaringologista Waldemir Salem observando a audição de pilotos da aviação militar ou civil, não chegando ao parecer de surdez profissional nestes trabalhadores. O barulho é um dos agentes ocupacionais mais encontrados nos ambientes de trabalho e a perda auditiva é uma das doenças mais freqüentes entre os trabalhadores, decorrente de uma exposição repetida durante anos de um barulho de intensidade excessiva. Na sociedade moderna o barulho intenso está presente em vários setores de trabalho e mesmo em locais de lazer. A literatura mostra a existência de graus variáveis de perda auditiva em trabalhadores da indústria, não referindo o mesmo para os trabalhadores que atuam em ambientes de lazer. O barulho age sobre o organismo humano de várias maneiras, prejudicando não só o funcionamento do aparelho auditivo como comprometendo a atividade física, fisiológica e mental do indivíduo a ele exposto. Graves prejuízos podem advir para a audição e a saúde em geral de milhares de pessoas, em conseqüência da poluição acústica pêlos ruídos excessivos dos grandes centros urbanos. Um indivíduo é exposto ao risco de uma perda auditiva quando o tempo de exposição diário na jornada de 8 horas ultrapassar o limite de barulho proposto com a NR-15 da Portaria 3.214/78 do Ministério do Trabalho, (ver Tabela 4-2). Foi comprovado que os barulhos podem provocar distúrbios nervosos, neurose, insônia, perda da audição, ansiedade e desvio da atenção. O sono pode ser afetado pelo barulho mesmo quando a pessoa não acorda, ficando o indivíduo com uma sensação de uma “noite mal dormida”. O barulho também diminui a eficiência de um indivíduo no trabalho. Inúmeros testes realizados mostraram que as taxas de acidentes e a 47 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] produtividade geralmente podem melhorar quando se diminuem os níveis de barulho. Outros testes demonstraram que os habitantes rurais têm audição mais apurada que os habitantes urbanos, o que leva a crer que o excessivo barulho urbano realmente prejudica a audição. Sabe-se ainda que os efeitos dos barulhos podem ser acumulativos. Deve ser enfatizado, no entanto, que os barulhos afetam cada pessoa de uma forma: diferentes indivíduos expostos aos mesmos barulhos podem não mostrar as mesmas reações. Devido aos vários efeitos nocivos que os barulhos podem trazer ao ser humano, sejam fisiológicos ou psicológicos, torna-se, então, muito importante o seu monitoramento e controle. A perda da audição é uma das maiores justificativas para controlar o barulho. Um padrão de avaliação do barulho (no nível de fenômeno físico – som) é a determinação do nível de intensidade sonora. Através do levantamento do nível sonoro é possível identificar as fontes primárias de barulho. Apesar do barulho possuir um caráter subjetivo, existe um limite fisiológico máximo, em torno de 120 dB, acima do qual a onda sonora provoca sensação de dor (veja Tabela 4-2). Devemos ressaltar, porém, que variando a freqüência, a intensidade do som é suportada de maneira variável, visto que a sensibilidade do ouvido varia com a freqüência do som (veja o item 4-4). Em função disto, o limite de sensação de dor depende não só da intensidade do som, mas também de sua freqüência. Com freqüências baixas (0 a 350 Hz), sons de até 120 dB são suportados relativamente bem, e na faixa de 1.500 a 4.000 Hz, as emissões sonoras não devem ultrapassar 80 dB. Exposições prolongadas acima de 120 dB (na faixa de 1.500 a 4.000 Hz) podem provocar distúrbios nervosos, insônia e até mesmo a perda auditiva. O nível de pressão sonora recomendável depende do tipo de atividade que será realizada (veja Tabela 4-1). Ambientes em que se desenvolverão tarefas que exigem grande concentração mental devem ser mais silenciosos que aqueles em que irão se desenvolver atividades de concentração menor. 48 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Tabela 4-1 Níveis de Pressão Sonora Recomendáveis Tipo de Atividade Quartos para dormir Trabalho que exige concentração permanente Clínicas de repouso NPS (dB) 25-30 25-45 45-55 Trabalho que envolve baixa concentração Salas de estar 50-60 45-65 Deve ser notado que como o barulho é em parte devido à preferência opinativa, som com níveis de intensidades sonoras menores que 80 dB podem ser classificados como barulhos se forem desagradáveis ao ouvinte. Um fator agravante ao barulho é quando a fonte sonora não pode ser eliminada. Neste caso o indivíduo se sente indefeso em relação ao barulho e o som se torna extremamente irritante. Exemplos seriam o rádio ou os latidos do cachorro do vizinho, gritos de crianças na rua, o barulho do trânsito. Levantamentos de perturbação para a avaliação do barulho (quanto à preferência opinativa – indesejável) consistem em entrevistas com os habitantes da comunidade para determinar os barulhos que eles consideram perturbadores e, se possível, estabelecer os graus de aborrecimento. Uma forma de se estabelecer padrões de barulho seria, por exemplo, verificar a interferência funcional do barulho nas atividades de uma pessoa. Sabe-se que os barulhos associados a situações desagradáveis perturbam mais que os barulhos sem associações, como por exemplo, a broca de um dentista, o som de uma sirene de ambulância. Verifica-se também que um barulho inesperado quando um indivíduo realiza uma determinada atividade é mais perturbador que um barulho esperado, como por exemplo, um indivíduo que tenta dormir e é acordado à noite por um caminhão de coleta de lixo. 4.2 Conceitos e Classificação dos Barulhos Todos os sons têm o potencial de serem descritos como barulhos. Basicamente, a classificação do ruído é subjetiva e sua distinção se refere ao fato deste ser ou não desejável. Para um jovem, a música proveniente de um conjunto de rock, associada 49 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] freqüentemente à excessiva intensidade, é sinônima de prazer, vibração, enquanto que para outro pode não passar de barulho. O barulho afeta adversamente o bem estar físico e mental das pessoas, sendo que, diariamente, milhares de trabalhadores são expostos a ele, como é o caso de aeronautas, aeroviários, ferroviários, dentistas, gráficos, ferramenteiros, marceneiros, mecânicos, metalúrgicos, militares, motoristas, metroviários, operadores de perfuratrizes, serralheiros, tecelões, operários da construção civil, telefonistas, etc. Entretanto, o habitante das grandes cidades vive imerso numa atmosfera de barulhos, mesmo durante o sono, com os quais parece estar acostumado: tráfego, buzinas, alarmes contra roubos, escapamentos, motores envenenados, algazarras, etc. Por mais estranho que possa parecer, este verdadeiro “bombardeio sonoro” não o abandona, nem quando procuram distraírem-se em festas, discotecas, cinemas, teatros, espetáculos musicais, uma vez que a sociedade moderna se esqueceu do controle de volume dos sistemas de amplificação, tanto individuais como fones de ouvido, brinquedos sonoros infantis, quanto coletivos. De acordo com a norma ISO 2204/1973 (“International Standard Organization”), os barulhos podem ser classificados, segundo o seu nível de intensidade, em: • Contínuo estacionário - Barulho com variações de níveis desprezíveis durante o período de observação. • Contínuo não estacionário - Barulho cujo nível varia significativamente durante o período de observação. • Contínuo flutuante - Barulho cujo nível varia continuamente de um valor apreciável durante o período de observação. • Barulho intermitente - Barulho cujo nível cai ao valor de fundo (barulho de fundo) várias vezes durante o período de observação, sendo o tempo em que permanece em valor constante acima do valor da ordem de segundos ou mais, podendo, para fins desta norma, ser assumido como contínuo, tendo-se em vista a sua avaliação. • Barulho de impacto - O barulho de impacto é um fenômeno acústico associado a explosões e é considerado um dos tipos de barulhos mais nocivos à audição, com intensidades que variam de 100 dB a 140 dB. Acima de 140 dB é denominado de barulho impulsivo. 50 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 4.3 Medição e Controle de Barulho As medições sonoras permitem análises precisas dos componentes de freqüência, intensidade e duração, atributos físicos indispensáveis para o processo de determinação da nocividade de um barulho. Além disso, é importante saber qual a dosagem de pressão sonora que um indivíduo acumula durante sua jornada de trabalho em ambientes adversos. Na medição do barulho são empregados, basicamente, dois tipos de medidores de nível de pressão sonora, conhecidos como decibelímetros e dosímetros. Tais medidores são constituídos por um sistema onde o microfone é a peça vital, aliado a um amplificador e um indicador de nível. O circuito de medição desses instrumentos pode ter respostas lentas ou rápidas. As lentas são empregadas em medições de barulhos cujo nível varia excessivamente, obtendo-se, então, um valor médio. Os limites de tolerância para barulhos contínuos e intermitentes são determinados com o uso deste tipo de medidor. A resposta rápida é empregada para barulho contínuo de nível constante ou para determinar valores externos de barulho intermitente. Quando o barulho é de impacto ou impulsivo o circuito de medição deve ser específico, não devendo ser usados circuitos comuns para respostas lentas e rápidas. Os dosímetros são recomendáveis quando é necessário avaliar a exposição individual do trabalhador a níveis elevados de barulho, durante sua jornada trabalho, veja Fig. 4-1. Fig. 4-1 Dosímetro Dosímetro, mede e armazena a energia sonora com o passar do tempo. Pode ser usado no bolso, como mostrado na Fig. 4-1, ou no cinto com o microfone posicionado no ombro do funcionário. 51 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Na medição do barulho existem várias escalas padronizadas internacionalmente, denominadas de circuitos de compensação A, B e C, designadas para reproduzirem a audibilidade em função da freqüência sonora. Pelo fato do ouvido não responder linearmente ao espectro de freqüências, o medidor de nível sonoro procura, através desses circuitos, reproduzirem o comportamento auditivo humano em relação a níveis de intensidade, respectivamente, de 40, 70 e 100 dB a 1.000 Hz. O Circuito A é o mais utilizado na medição de ruídos contínuos e intermitentes em ambientes de trabalho, pois mede o volume percebido pelo ouvido humano, com ênfase nas freqüências altas. Já o circuito C é empregado nas medidas de ruído de impacto, por ser um circuito de resposta mais linear. Fig. 4-1a Dosímetro Fig. 4-1b decibelímetro Uma exposição contínua a ruídos superiores a 85 dBA, (dBA quando a medida e feita no circuito A), pode causar perdas permanentes de audição e, acima deste nível, um aumento de apenas 5 dB implica na redução do tempo de exposição ao ruído pela metade, conforme mostra a Tabela 4-2. 52 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Tabela 4-2 Limites de tolerância para barulho contínuo ou intermitente NPS (dB) 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 98 100 102 104 105 106 108 110 112 114 115 Máxima Exposição Diária Permissível 8h 7h 6h 5h 4 h 30 min 4h 3 h 30 min 3h 2 h 40 min 2 h 15 min 2h 1 h 45 min 1 h 15 min 1h 45 min 35 min 30 min 25 min 20 min 15 min 10 min 8 min 7 min Na Tabela 4-3 mostramos os principais barulhos a que estamos expostos e seus respectivos níveis médios de intensidade em dBA. Estes valores são apenas aproximados, podendo ser mais ou menos elevados. Além disso, não constam somente os barulhos ocupacionais, mas alguns que fazem parte de atividades de lazer: uso de fones de ouvido, danceterias, motos, carros de corrida, rock, orquestra, sem mencionar alguns brinquedos infantis, cujos níveis de intensidade podem atingir 128 dBA, como o do revólver (chaveiro), corneta de futebol (123 dBA), bombinhas (121 dBA). 53 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Tabela 4-3 - Barulhos e seus valores médios de intensidade em dBA Nível subjetivo Descrição Nível de intensidade Pressão Energia Pascal W/cm2 dBA Muito Silencioso Silencioso Tranqüilo Moderado Barulhento Câmara anecoica Limiar de Audibilidade normal. Respiração normal, deserto, Região polar sem ventos. Movimento de folhas nas árvores, estúdio de gravação, sussurro. 20 Noite no campo, quarto de dormir. 30 Sala de aula ideal, escritório ideal, ruídos caseiros, conversa telefônica, torneira gotejante. 40 Escritório calmo, restaurante calmo. 50 10-11 Conversação entre vários indivíduos, escritório movimentado, canto de pássaros. 60 10-10 Rádio, TV em volume médio, máquina de escrever, choro de criança rua de médio movimento. Auto-estrada, grito, escritório muito barulhento, dentro de automóvel em alta velocidade, caminhão diesel. 0 20µ 10 200µ 0,002 10-16 10-15 10-14 10-13 10-12 0,02 10-9 70 80 0,2 10-8 Zona de Perigo - Nocividade Auditiva. Barulhento Muito Barulhento Estrondo Fábricas, orquestra sinfônica, Aspirador de pó, liquidificador. Indústria mecânica, cortador de grama, fundição, tecelagem, marcenaria, discoteca fones de ouvido em volume máximo. 10-7 90 100 Trem de metrô, sirene, buzina de carro, conjunto de rock. 110 Motocicleta, carro de corrida, limiar de desconforto. 120 Perfuratriz, martelo pneumático. limiar da dor auditiva 130 140 Decolagem de avião a jato, Tiro de revolver. 150 2 10-6 10-5 20 200 10-4 10-3 10-2 10-1 4.4 Sensibilidade do Ouvido Humano Existe um valor mínimo do nível de pressão sonora capaz de sensibilizar o aparelho auditivo. Este valor mínimo depende da freqüência do som, como mostra a Fig. 4-2, variando levemente também de uma pessoa para outra. Para uma freqüência aproximada de 1.000 Hz e para um ouvido normal, este limite mínimo foi definido 54 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] como 0 dB. Verificou-se também que as freqüências audíveis estão aproximadamente entre 16 e 20.000 Hz. 140 120 LIMIAR DA DOR NPS (dB) 100 80 Fig. 4-2 NPS mínimo LIMIAR DA AUDIÇÃO 60 REGIÃO DA FALA 40 20 0 31,25 62,5 125 250 500 1k 2k 4k 8k 16 k FREQÜÊNCIA (Hz) A curva inferior na Fig. 4-2 indica o nível de pressão sonora mínimo com que um som pode ser sentido para uma pessoa com audição normal. Abaixo desta curva encontra-se a região não audível. Nota-se pela figura que a sensibilidade do ouvido humano é maior para freqüências compreendidas entre 1.000 e 5.000 Hz. A curva superior indica o limiar de dor. Níveis de pressão sonora acima desta curva podem trazer sérios problemas à audição (ver Apêndice B.2). A figura mostra também a região principal da fala compreendida entre 300 e 4.000 Hz, com níveis de pressão sonora variando de 40 a 70 dB. Para a obtenção da curva do limiar da audição mostrada na Fig. 4-2, devem ser feitos testes com várias pessoas jovens (entre 18 e 25 anos) com audição normal fazendo uma média dos valores obtidos do NPS mínimo capaz de sensibilizar o ouvido para cada freqüência respectiva. Deve ser feita uma média porque os valores variam levemente de um indivíduo para outro. A Fig. 4-2 representa, portanto, a média da população17. Um audiograma é a representação gráfica do limiar auditivo em função da freqüência, em intervalos de oitavas ou meias-oitavas, de freqüências entre 125 Hz e 17 . Sivian, I. J. Santos,T. M. M. e Russo, I. C. P. Davis, H. Davis e Silverman, S. R. 55 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 8.000 Hz. O audiograma é obtido através de procedimentos realizados por um profissional habilitado da área de audição. O limiar auditivo deverá ser medido individualmente para cada orelha apresentando ao paciente uma série de tons puros, verificando o som mais fraco que o paciente pode ouvir. Podem ser constatados três níveis principais: o limiar auditivo (que se refere aos sons mais fracos que podem ser ouvidos), o nível mais confortável (que se refere à melhor percepção da fala pelo indivíduo em teste) e o limiar do desconforto (que se refere aos níveis em que o som trás incômodo ao indivíduo em teste). (b) perda auditiva (a) audição normal FREQÜÊNCIA (Hz) FREQÜÊNCIA (Hz) 125 250 500 1k 2k 4k 8k -10 0 0 10 10 20 20 30 30 40 40 50 50 dB dB -10 60 125 250 500 1k 2k 4k 8k 60 70 70 80 80 90 90 100 100 110 110 120 120 ORELHA DIREITA ORELHA ESQUERDA ORELHA DIREITA ORELHA ESQUERDA Fig. 4-3 Audiograma de dois indivíduos: (a) um com audição considerada normal e (b) outro com perda auditiva considerável. Para representar a redução na sensibilidade auditiva o audiograma apresenta apenas o nível de pressão sonora adicional, em relação à média da população, necessário para sensibilizar o ouvido de um paciente. Contudo, a audição de um paciente será considerada normal quando o seu limiar de audição estiver até 20 dB 56 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] acima da curva do limiar da audição mostrada na Fig. 4-2. Dois exemplos de audiogramas são mostrados na Fig. 4-3: (a) um paciente com audição normal e (b) um paciente com perda auditiva. Existem duas definições de grande importância no estudo da percepção auditiva. São elas: - Loudness: é a sensação subjetiva de intensidade. - Pitch: é sensação subjetiva de freqüência. Tanto o loudness quanto o pitch são aspectos psicológicos do som, pois tratam da avaliação que um indivíduo faz de um som, referindo-se à escuta direta da intensidade e da freqüência avaliadas por respostas discriminatórias de um indivíduo com audição normal. A fim de tornar quantitativa a medida do loudness foi criada uma unidade conhecida como fone (ou fon), que é a sensação de intensidade (medida em decibéis) produzida por um tom de 1.000 Hz a partir de curvas isofônicas, ou seja, curvas de igual audiabilidade, determinadas através de experimentos18 , veja Fig. 4-4. Note pela figura que quanto mais se aumenta a intensidade, as curvas isofônicas tendem a se achatarem. Fig. 4-4 Curvas isofônicas Através de testes com pacientes, verificou-se que um aumento de 10 dB no nível de pressão sonora de um som correspondia aproximadamente a dobrar o loudness. Com isto criou-se uma nova unidade, o sone. Por definição 1 sone equivale a 40 fones. O sone é uma forma prática para se medir proporções de loudness. 18 Fletcher , H. e Munson, W. A. Fletcher , H. 57 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 4.5 Redução e Prevenção da Poluição Sonora Podemos mencionar quatro medidas principais para a redução do barulho: 1. Eliminação da fonte sonora causadora do barulho; 2. Isolamento da fonte sonora; 3. Construção de fontes sonoras que produzam menos barulhos; 4. Proteção contra os barulhos. É óbvio que a medida 1 é a mais eficaz, porém, nem sempre é possível eliminar a fonte causadora do barulho. Neste caso devemos adotar uma ou mais de uma das formas alternativas de 2 a 4. A isolação do barulho pode ser feita de duas formas: temporal e espacial. Como medidas de caráter temporal podemos citar: desvio do trânsito somente à noite, diminuição de entregas noturnas, proibição do uso à noite de aparelhos na construção civil, reescalonamento das coletas de lixo de madrugada. Quanto às medidas espaciais um determinado aparelho que produz barulho em um ambiente pode ser colocado longe do ouvinte, os aeroportos poderiam ser construídos em locais distantes do centro urbano, e o tráfego aéreo em direções pré-determinadas reduziria a poluição sonora nas localidades próximas ao aeroporto. A modificação na estrutura de aparelhos barulhentos também pode reduzir o barulho produzido por eles. Correias de transmissão causam menos barulho que engrenagens, e mancais causam menos barulho que rolamentos. Máquinas de rotação geralmente são mais silenciosas que máquinas a pistão. Painéis trepidantes podem ser fixados em estruturas com enchimentos macios de forma a eliminar ou pelo menos aliviar a trepidação. O barulho produzido pelo atrito de veículos em movimento com o ar pode ser reduzido através de uma mudança na aerodinâmica dos veículos e a inclusão de silenciadores nos escapamentos também diminuiria em muito o barulho produzido pelos veículos. Os veículos movidos por energia elétrica são bem mais silenciosos que os tradicionais veículos a combustão. Vias em traçado elevado ou rebaixado também ajudariam em muito o barulho de ruas movimentadas Se, apesar de tudo, não for possível modificar o equipamento barulhento, podemos utilizar blindagens acústicas. A blindagem acústica pode ser colocada diretamente na máquina ou como uma proteção entre o aparelho e o ouvinte. Caso isto não possa ser feito, o ouvinte deve ser colocado em um recinto fechado. Um bom 58 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] exemplo de blindagem é a utilização de vegetações densas como fileiras de árvores ao longo de uma rodovia eliminando boa parte dos barulhos. Em casas ou edifícios, o fechamento de portas e janelas reduz em até 10 dB a intensidade sonora dos barulhos. A utilização de janelas com vidro grosso ou vidro duplo e paredes mais espessas aumentam significativamente a proteção contra barulhos externos. Em ambientes em que são necessárias divisões de salas, deve-se usar técnicas de construção que não permitam que as paredes entrem em ressonância com o som, contribuindo, por conseguinte para a diminuição de barulhos internos. Uma técnica que também pode ser usada em algumas circunstâncias para a diminuição de barulho interno é o mascaramento do som. Esta técnica é utilizada em fábricas e mercados onde os barulhos operacionais são “disfarçados” com uma música de fundo. Em ambientes de trabalho deverá ser observado o “Limite de Tolerância Sonora”, que é o nível de pressão sonora máxima relacionada com o tempo de exposição do trabalhador que não causará dano à sua saúde, durante a sua vida laboral. A Tabela 4-2 mostra os limites impostos pelo Ministério do Trabalho (Norma Regulamentadora 15). As leituras deverão ser feitas próximas ao ouvido do trabalhador com um decibelímetro, um aparelho que mede o nível de pressão sonora em decibéis. Entende-se por Barulho Contínuo ou Intermitente, para os fins de aplicação de Limites de Tolerância, o barulho que não seja barulho de impacto (barulho de impacto é aquele que apresenta picos de energia acústica de duração inferior a um segundo, a intervalos superiores a um segundo). As atividades ou operações que exponham os trabalhadores a níveis de barulho, contínuo ou intermitente, superiores a 115 dB, sem proteção adequada, oferecerão risco grave e iminente. Os índices de poluição sonora aceitáveis estão determinados de acordo com a zona e horário segundo as normas da ABNT, nº.151 conforme as zonas os níveis de decibéis máximos estabelecidos e permitidos nos períodos diurnos e noturnos. 59 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Tabela 4-4 Índices de Poluição Sonora Aceitáveis pela ABNT Nº 151 Área Zona de hospitais Zona residencial urbana Centro da cidade (negócios, comércio, administração). Área predominantemente industrial Período Decibéis (dB) Diurno Noturno Diurno Noturno 45 40 55 50 Diurno 65 Noturno 60 Diurno 70 Noturno 65 Em ambientes de trabalho, onde existem excessos de barulho, deve ser elaborado um programa de diminuição do barulho. Para avaliar a exposição individual do trabalhador a níveis elevados de barulho, durante sua jornada de trabalho, deve-se utilizar o dosímetro o qual é um aparelho que registra os níveis de intensidade sonora com o transcorrer do tempo. Caso a eliminação dos barulhos seja impossível os empregados devem utilizar EPI. e realizar testes regulares de audição e avaliação audiométrica. Considera-se EPI, todo dispositivo ou produto, (ver item 4.9.3), de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a sua segurança e saúde no trabalho. Uma eficiente proteção do indivíduo contra a poluição sonora só será possível adaptando-se o limite superior de intensidade de som à sua exposição diária durante toda sua vida. 4.6 Perda Auditiva A perda da audição pode ter muitas causas. Entre elas, o sistema mecânico que transmite as pressões do tímpano para os centros nervosos pode estar com defeito. Uma segunda categoria é a perda perceptiva (neural), o que significa que células nervosas não conseguem mais transmitir a sensação de pressão do ouvido interno para o cérebro. A terceira categoria é a perda funcional: um indivíduo não tem deficiência física, mas, por motivos psicológicos, não consegue fazer com que o cérebro perceba os sinais. Em linguagem vulgar, ele está “fora de sintonia”. Destas três categorias, o barulho 60 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] excessivo afeta somente a segunda categoria, a perda perceptiva ou neural, causando atrofia nas células nervosas. A perda auditiva acarreta uma deficiência na inteligibilidade da fala. Uma especial atenção deve ser dada às crianças, pois a deficiência auditiva pode acarretar dificuldade ou até mesmo a impossibilidade do aprendizado da linguagem e dificuldades escolares. É bem sabido que a quase totalidade dos indivíduos mudos não possuem problema no aparelho fonador, mas sim no aparelho auditivo. A perda auditiva pode ocorrer em qualquer região do ouvido, podendo ser dividida em duas classes: perda condutiva e perda neurossensorial. Quando a perda auditiva ocorre na orelha externa ou média ela é denominada perda condutiva e quando a perda auditiva ocorre na orelha interna ela é denominada perda neurossensorial. 4.6.1 Perda Condutiva A perda condutiva é uma denominação genérica para designar a diminuição da audição devida a uma patologia no ouvido externo ou médio. Pode ser uma infecção na orelha média, uma lesão no meato acústico, na membrana timpânica, nos três ossículos, na tuba auditiva, ou lesões múltiplas em mais de uma destas áreas. Uma lesão em uma destas regiões causa um mau funcionamento do órgão dificultando a transmissão do som para o ouvido interno. Entre as patologias condutivas mais comuns podemos citar: obstrução por cera, disfunção da tuba auditiva, (ver Apêndice B.2), otites médias e otosclerose. As perdas condutivas podem atingir todas as freqüências. A superfície interna do meato acústico contém glândulas que secretam cera. A cera é uma secreção de cor amarela ou marrom. Esta secreção mantém a umidade do meato acústico dificultando a entrada de objetos estranhos. A cera tende a migrar para o exterior do meato acústico e quando tomados os devidos cuidados com a higiene ela não irá interferir na audição. O acúmulo excessivo de cera pode bloquear o meato acústico ocasionando perda auditiva leve, zumbido e até mesmo tonturas. Neste caso a pessoa deve procurar um especialista (um otorrino) para a remoção da cera. Uma das causas mais comuns de problemas no ouvido médio é a disfunção da tuba auditiva (ou trompa de Eustáquio) que tem como função ventilar o ouvido médio e igualar a pressão em ambos os lados da membrana timpânica. A otosclerose é um crescimento ósseo excessivo ao redor da janela oval e do estribo. Progressivamente, o 61 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] estribo se fixa na janela oval, ocasionando uma perda condutiva. A otosclerose é hereditária e atinge em 80% dos casos as duas orelhas. A correção pode ser feita utilizando aparelho auditivo ou através de cirurgia. A Fig. 4-5 mostra o audiograma de um paciente com otosclerose na orelha esquerda. F R E Q Ü Ê N C IA (H z) 250 500 1 K 2 K 4 K 8 K 0 10 Fig. 4-5 mostra o audiograma de um paciente com otosclerose na orelha esquerda 20 dB 30 40 50 60 70 80 O R E LH A D IR E ITA O R E LH A E S Q U E R D A 4.6.2 Perda Neurossensorial A perda neurossensorial é devida a lesões nas células sensoriais da cóclea ou nas fibras dos nervos auditivos, ou em ambos. A perda neurossensorial pode ser devida a um trauma acústico, presbiacusia, seqüela de outras doenças, uso de drogas, ou de origem congênita hereditária ou genética. O principal motivo de perda neurossensorial é a redução da sensibilidade das células receptoras da cóclea. Entre as principais conseqüências da perda neurossensorial podemos citar: perda do discernimento de freqüências, sensação anormal do aumento da intensidade sonora, redução da faixa dinâmica19. A redução da faixa dinâmica e do discernimento de freqüências afeta diretamente na percepção da fala. Um tipo de perda que ocorre na orelha interna devido principalmente a exposições prolongadas a barulhos intensos ou por exposições rápidas e abruptas é a 19 Faixa dinâmica é a região entre o limiar auditivo e o limiar de desconforto. 62 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] rampa em ski. Este tipo de perda recebe este nome porque o seu audiograma tem o formato que lembra uma rampa de ski como mostrado na Fig. 4-6. Neste tipo de perda auditiva existe uma grande perda em freqüências mais altas, enquanto que em freqüências mais baixas praticamente não há perda apreciável. A sensibilidade auditiva sofre uma diminuição gradativa após os 18 anos, tornando-se bem perceptível ao redor dos 60 anos. O tipo de perda auditiva mais comum é a presbiacusia que é a perda auditiva induzida pela idade causada pelo desgaste natural das células ciliadas. FREQÜÊNCIA (Hz) 250 500 1k 2k 4k 6k 0 10 20 30 40 dB 50 60 Fig. 4-6 Uma rampa de ski 70 80 90 100 110 120 A presbiacusia é mais comum nos homens que nas mulheres dependendo muito em particular do indivíduo: alguns apresentam os sintomas com 50 anos, outros com 60 anos e existem ainda aqueles que nunca chegam a ter este tipo de problema auditivo. Na Fig. 4-7 é mostrada separadamente para homens e mulheres a perda de sensibilidade auditiva com a idade para grupos de pacientes de três idades: 40, 60 e 80 anos. Note pelos audiogramas da Fig. 4-7 que em freqüências altas a presbiacusia assume uma configuração de rampa nos homens e configurações mais planas nas mulheres. Ainda quanto à perda neurossensorial devemos destacar a Síndrome de Ménière, uma doença de origem desconhecida e que afeta a fisiologia dos líquidos da orelha interna, mais especificamente a endolinfa. A Síndrome de Ménière se caracteriza por 63 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] crises periódicas que se iniciam com o aumento da pressão intra-auricular seguidas de zumbido e vertigem. (b) 60 anos (a) 40 anos (c) 80 anos FREQÜÊNCIA(Hz) dB 250 500 1k 2k 4k 8k 250 500 1k 2k 4k 250 8k 0 0 0 10 10 10 20 20 20 30 30 30 40 40 40 50 50 50 60 60 60 70 70 70 80 80 80 500 1k 2k 4k 8k MULHERES HOMENS Fig. 4-7 Audiogramas para grupos de pessoas de três idades: (a) 40 anos, (b) 60 anos, (c) 80 anos. 4.7 Aparelhos Auditivos Na maioria dos casos a perda auditiva não é reversível. A utilização de aparelhos auditivos pode ser, então, uma solução. Os aparelhos auditivos são dispositivos que amplificam os sons na faixa de freqüência em que houve a perda auditiva. Os aparelhos auditivos são mais utilizados em perdas neurossensoriais. No entanto ele é também utilizado em perdas condutivas quando uma cirurgia corretiva não é recomendável. Os aparelhos auditivos são compostos basicamente dos seguintes componentes: bateria, bobina de indução, microfone, amplificador e receptor. Os modelos de aparelhos auditivos mais comuns disponíveis são: • Aparelho de bolso: com o formato e o tamanho aproximado de um maço de cigarros pode ser usado no bolso de uma camisa com os fones conectando o aparelho à orelha do indivíduo. Atualmente este tipo de aparelho só é usado por pacientes com perda auditiva extremamente elevada. 64 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] • Wesley Pacheco Calixto [email protected] BAHA: significa aparelho auditivo embutido no osso (da acrossemia do inglês: Bone Anchored Hearing Aids). Este tipo de aparelho é utilizado no caso de perdas auditivas severas, sendo inserido por cirurgia na mastóide do paciente. Constitui-se de um anel de titânio (material facilmente assimilado pelo organismo) com um pequeno vibrador, conduzindo sons para a orelha interna através do osso. • Aparelho retroauricular: este tipo de aparelho é o mais utilizado atualmente, sendo encaixado atrás do pavilhão auricular do usuário. O microfone se situa no lado de trás ou no topo do aparelho, sendo o som direcionado ao meato acústico por um tubo e um molde que se encaixa anatomicamente na orelha do usuário. • Aparelho intra-canal: neste aparelho todos os componentes necessários estão em um molde que é adaptável à concha do pavilhão auricular. • Aparelho micro canal: este tipo de aparelho é colocado de um a dois milímetros dentro do meato acústico do paciente, existindo um fio conectado ao aparelho para a sua retirada. A vantagem do aparelho micro canal e do intra-canal é que o som é captado na posição natural do pavilhão auricular.A impressão do meato acústico deve ser tomada para a fabricação da concha dos aparelhos micro canais e intracanais e do molde dos aparelhos retroauriculares. Para se tirar a impressão do meato acústico o médico injeta silicone no ouvido do paciente. 4.8 Efeitos do Ruído na Audição e no Organismo Nossos ouvidos são dotados de mecanismos protetores que alteram a sensibilidade auditiva durante e após a estimulação acústica. Sofremos a ação de um fenômeno descrito como mascaramento, (ver item 4.5), toda vez que a percepção de um som é diminuída em presença de um barulho de maior intensidade que encubra este som. Se nossa sensibilidade auditiva é reduzida durante a apresentação de um estímulo sonoro intenso e duradouro (ver Apêndice B.2), dizemos que houve adaptação auditiva. 65 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Quando, porém, isto ocorre após a cessação do estímulo, entramos em fadiga auditiva, também chamada de mudança temporária no limiar. Os efeitos do ruído na audição podem ser divididos entre três categorias, segundo Melnick (1985): • Mudança temporária no limiar (TTS - “Temporary Threshold Shift”); • Trauma acústico; • Mudança permanente no limiar (PTS - “Permanent Threshold Shift”) também chamada Perda auditiva Induzida pelo Ruído (PAIR). A mudança temporária no limiar (TTS) ou fadiga auditiva é uma diminuição gradual da sensibilidade auditiva com o tempo de exposição a um barulho contínuo e intenso. Tal redução no limiar auditivo é um fenômeno temporário, já que este volta ao normal após um período de repouso auditivo. Ruídos de baixa freqüência não produzem tanta fadiga auditiva quando os de alta freqüência, principalmente na faixa de 2.000 a 6.000Hz em intensidades entre 60 a 80 dBA. A maior parte do TTS tende a ser recuperada nas primeiras duas a três horas após cessada a estimulação sonora. A expressão trauma acústico deve estar restrita somente aos efeitos da exposição única a um barulho de grande intensidade, proveniente de uma explosão, isto é, ruídos de impacto ou impulsivos, considerados os mais nocivos ao ouvido humano, por produzirem lesões mecânicas irreversíveis na cóclea. Caracteriza-se por uma perda auditiva súbita neuro-sensorial, podendo ser uni ou bilateral, com queda audiométrica acentuada, na faixa de freqüências entre 3.000 a 6.000 Hz . A mudança permanente no limiar (PTS) ou perda auditiva induzida pelo ruído (PAIR) ou perda auditiva ocupacional é decorrente de um acúmulo de exposições a barulho, normalmente diárias, que são repetidas constantemente, por um período de muitos anos. Em geral, a PAIR desenvolve-se lenta e gradualmente, em decorrência de exposição a ruídos contínuos ou intermitentes. Em sua fase inicial, a perda auditiva pode ser temporária, acompanhada de sensação de ouvido tampado, abafamento auditivo e zumbidos, isto é, barulhos subjetivos no ouvido. Posteriormente, o limiar auditivo não se recupera mais, dando lugar a uma perda auditiva neuro-sensorial bilateral mais acentuada para as altas freqüências (acima de 66 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 3.000 Hz), o que leva a dificuldades de compreensão de fala, principalmente em presença de ruído ambiental e intolerância a sons intensos (recrutamento), já que lesa as células ciliadas do ouvido interno. É importante lembrar que os efeitos do ruído na audição sofrem influência direta de alguns fatores, tais como intensidade e freqüência do barulho, tempo e local de exposição, além da susceptibilidade individual. Tabela 4-5 Impacto de Barulhos na Saúde Volume Até 50 dB Acima de 50 dB De 55 a 65 dB De 65 a 70 dB (início das epidemias de ruído) Acima de 70 Reação Efeitos Negativos Exemplos de Locais Confortável (limite da Nenhum Rua sem tráfego. OMS) O organismo humano começa a sofrer impactos do ruído. Diminui o poder de concentração e A pessoa fica em estado Agência bancária prejudica a de alerta, não relaxa produtividade no trabalho intelectual. Aumenta o nível de cortisona no sangue, diminuindo a resistência imunológica. Induz a liberação de endorfina, O organismo reage para tornando o organismo Bar ou restaurante tentar se adequar ao dependente. É por isso ambiente, minando as lotado que muitas pessoas só defesas conseguem dormir em locais silenciosos com o rádio ou TV ligada. Aumenta a concentração de colesterol no sangue. O organismo fica sujeito Aumentam os riscos de Praça de alimentação a estresse degenerativo enfarte, infecções, entre em shopping centers além de abalar a saúde outras doenças sérias Ruas de tráfego intenso. mental Obs.: O quadro mostra barulhos inseridos no cotidiano das pessoas. Ruídos eventuais alcançam volumes mais alto. Um trio elétrico, por exemplo, chega facilmente a 130 dB(A), o que pode provocar perda auditiva induzida, temporária ou permanente. Os efeitos não auditivos do barulho também merecem destaque, pois alterações no organismo como um todo já foram observadas, indo desde ações sobre os aparelhos circulatório, digestivo, muscular, sobre o metabolismo, sistema nervoso, até interferência no sono, diminuição do rendimento no trabalho, distúrbios de equilíbrio, problemas psicológicos, dores de cabeça; mudanças repentinas de humor e ansiedade. 67 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 4.9 Estudos que estão sendo feitos com o Som em Plantas e Animais Segundo os Estudiosos do assunto, as maiores dificuldades de adaptação dos animais ao cativeiro, decorrem principalmente do barulho artificial das grandes cidades já que quase todo zoológico fica na zona urbana. Por outro lado, comprova-se que nos locais de muito barulho é mais acentuada a presença de ratos e baratas, agentes potenciais de transmissão de doenças. As vibrações sonoras produzidas por motores de avião provocam a mudança de postura das aves e diminuição de sua produtividade. Pesquisadores dos EUA, estudando os efeitos do barulho sobre as plantas, fizeram uma experiência com as do gênero Coleus, possuidoras de grandes folhas coloridas e flores azuis. Doze dessas plantas, submetidas continuamente ao barulho de 100 dB, após seis dias apresentaram a redução de 47% em seu crescimento por causa, segundo os cientistas, da estridência persistente, que as fez perder grande quantidade de água através das folhas. 4.10 Medidas Preventivas 4.10.1 Com relação ao Meio Algumas empresas, conscientes de sua responsabilidade para com a saúde de seus funcionários, já desenvolvem, com sucesso, os chamados Programas de Conservação Auditiva, os quais incluem, desde a monitorização da exposição ao barulho, controles administrativos e de engenharia, isto é, controle do ruído na fonte, até a realização de exames audiométricos periódicos, indicação de equipamentos de proteção individual (EPI), educação, treinamento e motivação do pessoal envolvido no programa. Os objetivos de um programa desta natureza visam beneficiar tanto a empresa quanto o trabalhador, através da prevenção da PAIR e conseqüente redução do custo com despesas médicas e ações trabalhistas. As medidas preventivas com relação ao meio, isto é, o controle de barulho na fonte, são fundamentalmente medidas de engenharia, as quais são definidas como qualquer modificação ou substituição de equipamentos ou relativas à alteração da fonte 68 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] sonora ou no caminho de transmissão do barulho, que reduzam os níveis deste para proteção do trabalhador. Os controles de engenharia mais freqüentes envolvem: • Redução ou eliminação do barulho na fonte - Instalando abafadores. • Interrupção do caminho de transmissão do barulho - Construindo barreiras. • Redução da reverberação - Usando materiais absorventes. • Redução da vibração estrutural - Substituindo engrenagens por correias ou borrachas e lubrificando adequadamente o maquinário. • Redução por distanciamento - Levando a fonte produtora para local distante do ponto onde o barulho é desejável. Além das medidas de engenharia, controles administrativos são necessários a fim de alterar as escalas de trabalho dos funcionários, realizando operações ruidosas em horários nos quais poucas pessoas se encontram no local, desde que estas sejam protegidas com o uso de equipamento de proteção individual. Este tipo de medida preventiva constitui o isolamento da fonte protetora de barulho no tempo. 4.10.2 Com Relação ao Homem Dentro do programa de conservação auditiva, as medidas preventivas com relação ao homem desempenham, juntamente com as de engenharia e administrativas, um papel decisivo para o sucesso deste. Tais medidas devem envolver os vários profissionais que trabalham na empresa, isto é, diretores, gerentes, funcionários de todos os níveis, engenheiros de segurança, médicos do trabalho, fonoaudiólogos, auxiliares de enfermagem e constam, basicamente, de: • Avaliações audiométricas periódicas: avaliações audiométricas pré- admissionais, revisões periódicas anuais e pós-demissionais, a fim de avaliar a audição dos funcionários, preferencialmente em condições ideais, isto é, em cabines acústicas, com o uso de audiômetro calibrado e realizado por fonoaudiólogos, no próprio local de trabalho ou em clínicas especializadas. • Fornecimento de equipamento de proteção individual (EPI): a proteção do ouvido é indispensável para todos aqueles que se expõem a barulhos superiores a 85 dBA, conforme a legislação trabalhista vigente no país. Assim sendo devem ser oferecidos protetores auriculares, que podem ser; desde circum-aurais (fones), capacetes 69 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] com fones protetores, até intra-aurais (plugs de inserção de vários materiais). O tipo mais adequado de protetor a ser empregado irá variar de acordo com as características do barulho e do ambiente de trabalho do indivíduo. O importante é que ele seja efetivamente utilizado pelo funcionário, como mostram as Fig. 4-8 e 4-9. • Educação e treinamento do funcionário: não basta controlar a audição e fornecer EPI para os funcionários; é necessário educá-los e motivá-los a fim de que compreendam a importância de sua participação ativa no programa, para que o objetivo primordial possa ser alcançado, ou seja, proteger a audição do indivíduo exposto ao barulho. Muitas vezes, quando não é dada a importância a esta etapa, o programa não é bem sucedido. 4.10.3 Equipamentos de proteção individual (EPI) Protetores auriculares Fig. 4-8 Fones circum-aurais, Elmo ou capacete com fones Todos aqueles envolvidos no programa de conservação devem conhecer a importância da audição e as implicações psico-sociais e de trabalho das perdas auditivas induzidas pelo ruído; devem ser instruídos com relação ao uso do EPI, principalmente quanto à higiene na manipulação de protetores de inserção auricular; a fim de evitarem afecções de ouvido externo; devem conscientizar-se da participação de cada elemento da empresa no cumprimento das normas exigidas para seu perfeito funcionamento. 70 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Fig. 4-9 Plugs de inserção intra-aurais O controle do ruído não ocupacional, contudo, depende de todos nós nos engajarmos numa campanha de redução do controle de volume dos equipamentos sonoros coletivos ou individuais, a fim de que o ouvido possa ser respeitado em sua excelência, além de estarmos, assim, contribuindo para melhorar nossa própria qualidade de vida, tão ameaçada pelos vários tipos de poluição ambiental e sonora. 71 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 5 Medidas da Poluição Sonora na Cidade de Goiânia 5.1 Pesquisa A Fig. 5-1 mostra o NPS médio medido em seis pontos da região central da cidade de Goiânia em diferentes horários. As medidas foram coletadas com medidores de nível sonoro situados na calçada, mantendo-se uma distância de 20 metros de esquinas e cruzamentos de avenidas e colocadas a uma altura de aproximadamente 1,70 metros do solo. Foram realizadas medidas de 10 em 10 minutos das 06 h até às 19 h e 30 min, em seis diferentes locais da região central da cidade, sendo representados os resultados médios para cada instante na Fig. 5-1. 96 94 MEDIDO MÉDIA 92 90 88 86 NPS (dB) 84 Fig. 5-1 mostra o NPS medido em seis pontos da região central da cidade de Goiânia em diferentes horários. 82 80 78 76 74 72 70 68 66 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 HORÁRIO Estes valores médios foram obtidos da seguinte forma: para um determinado horário somamos os níveis de pressão sonora de cada diferente local e dividimos pelo número de locais. Foram escolhidos seis locais da região central com as mesmas características: comércios intensos com grande trânsito de veículos e de pedestres. As medições foram feitas de segunda a sexta-feira evitando-se dias anormais como feriados, vésperas de feriados, eventos, convenções, passeatas, carreatas etc. O valor médio diário é encontrado em aproximadamente 82.5 dB. 72 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] A Fig. 5-2 mostra o NPS medido em um bairro estritamente residencial com pouco trânsito de veículos, em diferentes períodos do dia. Observamos da Fig. 5-2 que, diferentemente da região central, não encontramos valores de nível de pressão sonora acima de 86 dB. 88 86 MEDIDO MÉDIA 84 82 80 Fig. 5-2 mostra o NPS medido em um bairro residencial da cidade de Goiânia em diferentes horários. NPS (dB) 78 76 74 72 70 68 66 64 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 HORÁRIO O valor médio diário encontrado para este bairro residencial: 76.3 dB. Este valor é cerca de 11% menor que o valor médio encontrado na região central, onde o movimento do trânsito é bem mais intenso. A curva cheia da Fig. 5-3 é uma curva ajustada aos pontos medidos e apresentados na Fig. 5-1. Notamos claramente que existem pontos de máximo e mínimo intercalados. São três pontos de máximo e três pontos de mínimo. Os pontos de máximo estão situados entre as seguintes faixas horárias: • 1º ponto: entre 8 h e 8 h e 30 min; • 2º ponto: entre 12 h e 30 min e 13 h e 30 min; • 3º ponto: entre 18 h e 19 h. Os pontos de mínimo localizam-se nas faixas: • 1º ponto: entre 6 h e 6 h 30 min; • 2º ponto: entre 10 h e 10 h 45 min; • 3º ponto: entre 14 h 30 min e 15 h 30 min. 73 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Os pontos de máximo estão relacionados ao maior movimento no trânsito constituindo no horário em que as pessoas estão indo para o trabalho, entre 8 h e 8 h 30 min, voltando do trabalho entre 18 h e 19h e o horário de almoço, entre 12 h 30 min e 13 h 30 min. Os pontos de mínimo nas curvas referem-se aos horários de maior NPS (dB) “calmaria” no trânsito. 94 92 90 88 86 84 82 80 78 76 74 72 70 68 66 94 92 90 88 86 84 82 80 82.5 dB 78 76 74 76.3 dB 72 70 68 66 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Fig. 5-3 curva ajustada aos pontos medidos e apresentados na Fig. 5-1 HORÁRIO Estes resultados nos mostram que o movimento no trânsito é um fator dominante no nível de pressão sonora medido, visto que estes pontos de máximo/mínimo coincidem com os horários de maior/menor movimento do trânsito de veículos. Apesar de não mostrarmos aqui os resultados individuais de todos os seis locais escolhidos da região central da cidade de Goiânia, observamos que todos eles apresentaram individualmente o mesmo comportamento da curva cheia mostrada na Fig. 5-3, com praticamente os mesmos níveis de pressão sonora. As Fig. 5-1 e 5-2 indicam os valores médios diários obtidos de 82.5 dB para a região central e de 76.3 dB para o bairro residencial. Foi medido também o nível de pressão sonora em onze das principais bibliotecas da cidade de Goiânia: Universidade Salgado Oliveira – UNIVERSO, Universidade Federal de Goiás – UFG, Universidade Católica de Goiás – UCG, Universidade Paulista – UNIP, Universidade Estadual de Goiás - UEG-Goiânia, Faculdade Anhanguera, Faculdade ALFA, Faculdade Padrão, Biblioteca Municipal Marieta Teles Machado, Biblioteca Municipal Cora Coralina, e Biblioteca do SESC. 74 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Os valores médios encontrados são apresentados na Tabela 5-1. Estas medidas foram realizadas durante o período matutino e vespertino, e tomando como resultado final o valor médio delas. Salientamos que infelizmente algumas faculdades particulares não permitiram a entrada em sua biblioteca para a medição do nível de pressão sonora. Tabela 5-1 Níveis de Pressão Sonoras medidos em Bibliotecas Bibliotecas NPS (dBA) Bibl. (1) 63,1 Bibl. (2) 66,0 Bibl. (3) 64,0 Bibl. (4) 79,2 Bibl. (5) 75,4 Bibl. (6) 78,4 Bibl. (7) 81,8 Bibl. (8) 76,3 Bibl. (9) 78,7 Bibl. (10) 68,8 Bibl. (11) 65,5 Os resultados médios do nível de pressão sonora encontrados nas bibliotecas foram menores que os medidos na rua, porém, as bibliotecas deveriam apresentar valores ainda mais baixos que os obtidos, visto que, nestes ambientes, que exigem um maior grau de concentração, não é recomendável encontrar valores acima de 60 dB. Verificou-se ainda que os maiores índices do nível de pressão sonora foram obtidos nas bibliotecas situadas nas universidades próximas a rodovias de grande movimento. Acreditamos que o motivo disto é que praticamente todo o som procedente do trânsito da rodovia penetra no ambiente devido à falta de obstáculos entre a fonte sonora e a biblioteca. A fim de se verificar a subjetividade do barulho, foi realizada também uma entrevista com 500 pessoas, distribuídas igualmente entre as classes sociais A, B, C e D, a fim de se descobrir qual o barulho que mais a incomodava. O resultado da entrevista é mostrado na Tabela 5-2. 75 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] A primeira coluna mostra o causador do barulho e a segunda coluna a percentagem de pessoas que deram esta resposta. A Fig. 5-4, em consonância com a Tabela 5-2, mostra graficamente esta distribuição. Tabela 5-2 – Barulhos mais perturbadores Barulho Percentagem Trânsito urbanos(a) 26% Volume intenso de som(b) 22% Telefone(c) 13% (d) Conversa em voz intensa 10% Eletrodomésticos (e) 10% Máquinas(f) 6% Animais domésticos(g) 5% Avião(h) 3% Outros(i) 5% (b) Rádio e TV; (e)liquidificador, ar condicionado, panela de pressão, geladeira despertador, espremedor de frutas; (f) máquina de costura, britadeira, betoneira, bomba de cisterna, furadeira, lixadeira, outros; (g)cachorro, passarinho, insetos; (i)estouro de foguete, bater de porta, campainha, sirene de escola, martelo apito, alarme de carro. 10% (d) 10% (e) 6% (f) 5% (g) 3% (h) 13% (c) (i) (b) 22% 5% Fig. 5-4 Gráfico da pesquisa de qual barulho é o que mais incomoda (a) 26% 76 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 5.2 Objetivos que podem ser realizados para a melhoria A medida mais drástica para a redução do barulho seria a eliminação da fonte sonora causadora dele. Mas isto nem sempre é possível. Formas alternativas seriam: a construção de fontes sonoras que produzissem menos barulhos, o isolamento da fonte sonora e proteger-nos melhor contra os barulhos20. A isolação pode ocorrer de forma temporal e geográfica. O trânsito pode ser desviado somente à noite, diminuição de entregas noturnas, proibição do uso de aparelhos na construção à noite, reescalonamento das coletas de lixo de madrugada. Um determinado aparelho que produz um barulho em um ambiente de trabalho ou residencial pode ser colocado longe do ouvinte. Os aeroportos deveriam ser construídos somente em locais longe do centro urbano, e o tráfego aéreo em direções prédeterminadas reduziria a poluição sonora nas localidades próximas ao aeroporto. O barulho de ruas movimentadas pode ser reduzido por meio de vias em traçado elevado ou rebaixado. Uma vegetação densa destinada à proteção acústica eliminaria também boa parte dos barulhos. Fileiras de árvores ao longo de uma rodovia poderiam desempenhar essa função. No transporte urbano, o uso mais intenso de veículos com tração elétrica, reduziria sensivelmente o nível de poluição sonora. Modificações nos aparelhos barulhentos também trazem uma redução do barulho por eles produzido. Correias de transmissão causam menos barulhos que engrenagens, e mancais causam menos barulho que rolamentos. Máquinas de rotação geralmente são mais silenciosas que máquinas a pistão. Painéis trepidantes podem ser fixados em estruturas com enchimentos de espuma de forma a aliviar a trepidação. A estrutura aerodinâmica dos veículos poderia ser reprojetada de forma a eliminar o barulho produzido pelo atrito do veículo em movimento com o ar (é bem sabido que a maior parte do barulho produzido por um veículo em alta velocidade não é procedente do motor, mas sim, da produção de ondas sonoras devido a seu atrito com o ar). A inclusão obrigatória de silenciadores nos escapamentos seria, também, uma outra medida de grande validade, apesar de já existir lei para isto. 20 Günter, F. e Dowling, A. P. 77 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Se não for possível modificar o equipamento barulhento, pode-se colocar uma blindagem acústica na máquina ou uma proteção entre o aparelho e o ouvinte. Como último recurso o ouvinte poderia ser colocado num recinto fechado. Nos ambientes residenciais, casas ou edifícios, os barulhos podem ser reduzidos em até 10 dB simplesmente fechando as portas e janelas. A utilização de janelas com vidro grosso ou vidro duplo, paredes mais espessas de concreto ou de alvenaria aumentam ainda mais a proteção contra barulhos externos. Para divisões internas de ambiente, o uso de técnicas de construção que não permitam que as paredes entrem em ressonância com o som, vibrando como unidade única, contribui para diminuir os barulhos internos. Uma técnica que também pode ser usada em algumas circunstâncias é o “mascaramento do som” (ver item 4.5). Por exemplo, em fábricas e mercados os barulhos operacionais são “disfarçados” com uma música de fundo. Em ambientes de trabalho onde existe excesso de barulho, deve ser elaborado um programa de diminuição do mesmo. Para avaliar a exposição individual do trabalhador a níveis elevados de barulho, durante sua jornada de trabalho, deve-se utilizar o dosímetro (ver item 4.3), o qual é um aparelho que registra os níveis de intensidade sonora com o transcorrer do tempo. Caso a eliminação dos barulhos seja impossível os empregados devem realizar testes regulares de audição, avaliação audiométrica e durante o trabalho utilizar EPI, (ver item 4.10.3). De forma geral uma eficiente proteção do indivíduo contra a poluição sonora só será possível adaptando-se o limite superior de intensidade de som às diferentes etapas de sua vida diária. Com relação ao levantamento sonoro um dos objetivos principais é a identificação das fontes primárias de barulho. No caso da cidade de Goiânia fica claro que a principal fonte primária de barulho é o trânsito de veículos automotores. Destacamos que o som pode ser um estímulo enganador. Ele é invisível e envolve forças físicas triviais, fisicamente, porém, as suas conseqüências completas são ainda desconhecidas. Em nosso mundo atual, agitado e dominado pela correria do dia a dia, a preservação de um pouco de silêncio torna-se preciosa, e o controle rigoroso da produção de barulho transforma-se num ingrediente necessário para uma melhor qualidade de vida. 78 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] O levantamento sonoro além de servir como oportunidade de treinamento para o pessoal que mais tarde estará trabalhando na fiscalização, fornece uma base factual para decisões futuras. Que fique claro que os resultados dependerão dos hábitos dos moradores e das características e peculiaridades de cada cidade. 79 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Capítulo 6 Educação Ambiental 6.1 Algumas Observações sobre o Ensino de Acústica Estaria fora da realidade fazer recomendações sobre como organizar um curso interdisciplinar sobre o ensino de acústica e educação ambiental com ênfase em poluição sonora. A principal razão está na constituição quase imprevisível de uma turma formada por estudantes interessados e que se habilitassem a fazer esse curso com as suas formações bem diferentes e o amplo interesse. Supondo que esse curso seja aberto a todo o corpo discente da universidade, e de preferência as áreas de Música, Psicologia, Ciências humanas em geral, Comunicações de massa e engenharia, Física e Matemática. A dificuldade mais geral é tornar o curso igualmente interessante, útil e facilmente compreensível para todos. Isso impõe três exigências gerais: • Minimizar o uso da matemática e fazer de modo a não ridicularizar a apresentação do assunto aos olhos dos estudantes de engenharia e ciências exatas, usando o curso para mostrar a esses estudantes explicitamente como ensinar ciência sem matemática. • Explicar tudo desde o princípio, tanto um assunto de física, psicofísica quanto de música, educação ambiental, poluição sonora, ondulatória etc, mas fazê-lo de modo a não parecer condescendente com os respectivos especialistas. Usar o curso para mostrar explicitamente aos especialistas como apresentar resumos abrangentes e concisos de tópicos de suas próprias áreas. • Realizar experimentos e demonstrações em aula e promover testes, ensaios e problemas que sejam significativos a educação ambiental, conduzidos de tal modo que o estudante possa responder o seguinte questionário sem hesitar: o que eu aprendi presenciando essas demonstrações, realizando esses experimentos, ou resolvendo esses problemas. Nos experimentos não permitir que os estudantes assistam a medições bobas ou as façam apenas por fazê-las, mostrar a eles como as magnitudes se relacionam umas com as outras na natureza, como elas se modificam umas em relação às outras e como estão conectadas por meio de relações físicas de causa-e-efeito. Nos problemas, não deixe que eles apenas resolvam equações, mais uma vez, mostre como uma determinada relação liga uma ou mais quantidades dinamicamente em toda uma gama de variabilidade, 80 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] induza-os a um sentimento intuitivo das relações quantitativas entre as magnitudes, mostre a eles como as relações matemáticas podem ser usadas para prever o comportamento de um sistema. Nos testes, leve-os a pensarem intuitivamente, mas respondendo com precisão científica. Uma séria dificuldade é que muitos estudantes têm um pavor inerente ao rigor científico, uma vez que assumem a priori que não compreenderão. Isso é simplesmente um bloqueio mental que pode ser dissipado com sucesso por meio da persuasão, paciência e dedicação à pessoa por parte do professor. Convence-los de que, também são capazes de controlar suas despesas mensais, serão também capazes de compreender o pouco de matemática necessário neste curso. A inclusão da psicoacústica num curso introdutório de acústica apresenta diversos outros desafios ao professor. Primeiro, há o mais óbvio, como encaixar tudo no tempo disponível. Não importando se o tempo é suficiente ou não, será necessário tomar decisões difíceis sobre quais tópicos deixar de lado e quais incluir. Segundo, a psicoacústica e os tópicos da neuropsicologia que lhe são relativos são assuntos talvez ainda menos familiares do que a física para os estudantes de acústica. Isso torna necessário restringir esses tópicos apenas aos mais relevantes e interessantes como feito neste trabalho. Será útil apresentar, logo no início do curso, alguns aspectos relevantes da psicoacústica. Por exemplo, alerte os estudantes que as recentes investigações no campo da percepção sonora podem ser incorporadas na criação de novas fronteiras para a composição musical. Ressalte que muitas das falácias existentes sobre a performance musical têm origem em modos particulares de processamento de informação acústica no ouvido e no cérebro. Mostre que muitos dos requisitos técnicos de equipamentos eletroacústicos de alta qualidade estão diretamente relacionados a aspectos particulares do processamento de sinais no sistema nervoso. Ressalte que a compreensão da percepção sonora deve ser interesse não somente de músicos e fonoaudiólogos, mas também de neuropsicólogos, que podem se beneficiar do conhecimento sobre certas funções cerebrais, e dos psicólogos, que podem obter informações quantitativas de relevância para a terapia musical. Uma dificuldade geral é o fato de que as demonstrações experimentais sofisticadas relativas a esse assunto requerem um equipamento muito caro. Contudo, é possível sair-se bem com um mínimo básico de equipamentos, que provavelmente poderão ser tomados de empréstimo de outros cursos ou departamentos. 81 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Apêndice A A Legislação Brasileira em Relação a Barulhos A legislação ambiental brasileira, que começou a tomar forma na década de 80, está entre as melhores do mundo. Porém, em alguns casos, o problema se materializa na falta de compromisso de Governos Estaduais e Municipais, que não se alinham à legislação federal. A.1 Legislação Federal Brasileira No âmbito Federal o Brasil conta com vasta legislação no que diz respeito à poluição sonora. A saber, dentro do atual contexto: Resolução CONAMA 1/90 - estabelece critérios, padrões, diretrizes e normas regulamentadoras da poluição sonora; Resolução CONAMA 2/90 - estabelece normas, métodos e ações para controlar o ruído excessivo, que possa vir a interferir na saúde e bem-estar da população; Resolução CONAMA 1/92 - estabelece, para veículos automotores nacionais e importados, exceto motocicletas, motonetas ciclomotores, bicicletas com motor auxiliar e veículos assemelhados, limites máximos de ruído com veículos em aceleração e na condição estática; Resolução CONAMA 1/93 - estabelece para os veículos automotores nacionais e importados, exceto motocicletas, motonetas ciclomotores, bicicletas com motor auxiliareveí culos assemelhados, limites máximos de ruído com veículos em aceleração e na condição parado. Resolução CONAMA 2/93 - estabelece para motocicletas, motonetas, triciclos, ciclomotores, bicicletas com motor auxiliar e veículos assemelhados, nacionais ou importados, limites máximos de ruído com o veículo em aceleração e na condição parado. 82 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Resolução CONAMA 8/93 - estabelece a compatibilidade dos cronogramas de implantação dos limites de emissão dos gases de escapamentos com os de ruído dos veículos pesados no ciclo Diesel, estabelecidos na Resolução CONAMA 1/93; Resolução CONAMA 20/94 - institui o Selo Ruído como forma de indicação do nível de potência sonora medido em decibel, dB(A), de uso obrigatório a partir deste Resolução para aparelhos eletrodomésticos, que venham a ser produzidos, importados e que gerem ruído no seu funcionamento. Resolução CONAMA 17/95 - ratifica os limites máximos de ruído e o cronograma para seu atendimento determinados no artigo 2º da Resolução CONAMA nº 08/93, excetuada a exigência estabelecida para a data de 1º de janeiro de 1996 Resolução CONAMA 230/97 - proíbe itens de ação indesejada que possam reduzir a eficácia do controle da emissão de ruídos e de poluentes atmosféricos de veículos automotores; Resolução CONAMA 252/99 - estabelece novos limites máximos de ruído nas proximidades do escapamento, para fins de inspeção obrigatória e fiscalização de veículos em uso. Resolução CONAMA 256/99 - estabelece a inspeção de emissões de poluentes e ruídos, prevista no artigo 104 da lei nº 9.503/97 por veículos automotores, PCPV - Plano de Controle da Poluição por Veículos por Estados e Municípios; 83 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] A.2 Comentário a Legislação Federal Sobre Poluição Sonora Urbana21 Legislação Federal Sobre Poluição Sonora Urbana Nota Técnica como parte essencial da faculdade da União de legislar sobre o tema em pauta está a definição do que é poluição, definição esta expressa pelo inciso III do art. 3º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981: “Art. 3º Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por....” “III - poluição, a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) “lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos;” Cabe destacar que a Lei nº 6.938/81, que “dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências” tem sido acatada como regulamento da Constituição Federal no campo do meio ambiente, detalhando a distribuição de competências entre os entes da Federação. A emissão de sons e ruídos em níveis que causam incômodos às pessoas e animais e que prejudica, assim, a saúde e as atividades humanas, enquadra-se perfeitamente no conceito de poluição legalmente aceito no Brasil, o qual é, também, de consenso do meio técnico. Está entre as competências da União, portanto, a de estabelecer normas gerais sobre o controle da poluição, entendida esta de forma ampla. Esta competência vem sendo cumprida particularmente nos campo da legislação ambiental e penal, como mostramos a seguir. A legislação ambiental disciplina o controle da poluição de um modo geral, por exemplo obrigando o licenciamento ambiental de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, entre elas as que emitem elevados níveis de sons, ruídos e vibrações. 21 Pereira Jr, José de Sena. Legislação Federal Sobre Poluição Sonora Urbana. 84 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Relacionamos entre a legislação ambiental federal que trata da matéria a já citada Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 e a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 que “dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”, cujo artigo 54 considera crime “causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora”. Como a poluição sonora pode causar danos à saúde humana, afetando os sistemas auditivo e nervoso das pessoas, pode aquele que a provocar ser enquadrado no disposto nesse artigo da lei, sujeitando-se a penas de reclusão de um a quatro anos, além de multa. Lembramos que na discussão do projeto que resultou na Lei nº 9.605/98, a poluição sonora chegou a ser explicitada entre os crimes ambientais e foi retirada por pressão da bancada evangélica, a qual via no dispositivo a possibilidade de cerceamento da liberdade de culto. Também o Código de Trânsito Brasileiro, instituído pela Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 trata do controle da poluição sonora em seu art. 104: “Art. 104. Os veículos em circulação terão suas condições de segurança, de controle de emissão de gases poluentes e de barulho avaliadas mediante inspeção, que será obrigatória, na forma e periodicidade estabelecidas pelo CONTRAN para os itens de segurança e pelo CONAMA para emissão de gases e ruído.” § 5º Será aplicada a medida administrativa de retenção aos veículos reprovados na inspeção de segurança e na emissão de gases poluentes e ruído.”5 A poluição sonora é tratada também na Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 – Lei das Contravenções Penais -, cujo art. 42 considera a poluição sonora uma contravenção referente à paz pública: “Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou sossego alheios: I - com gritaria ou algazarra; II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais; III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos; IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda: “Pena – Prisão simples de quinze dias a três meses, ou multa.” 85 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Vê-se, portanto, que desde 1941 a Lei já protege o cidadão brasileiro dos incômodos da poluição sonora, isto muito antes de se pensar na questão ambiental da forma ampla como hoje é tratada. Há que diferenciar, no entanto, o controle da poluição sonora dentro da abordagem dada pelas legislações ambiental, de trânsito e penal, do controle da localização, nas áreas urbanas, das atividades que a causam, este último intrinsecamente ligado ao planejamento e controle do uso do solo e das funções urbanas e, portanto, de competência exclusiva do poder municipal. Isto porque, como já mostramos, o inciso VIII do art. 30 da Constituição Federal incumbe ao Município “promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano”. A ocorrência de poluição sonora nas áreas urbanas só ocorre, portanto, ou com o consentimento do poder público municipal, ou pela ineficiência ou negligência dele. Nos planos urbanísticos municipais, as atividades urbanas devem ser distribuídas de modo a não haver incompatibilidades, tais como a localização de uma grande metalúrgica no meio de uma área residencial ou, pior ainda, ao lado de um hospital. São também decisões municipais que determinam outras medidas mitigadoras da poluição sonora, como as restrições ao uso de buzinas em determinadas áreas e os horários e locais em que podem funcionar atividades naturalmente barulhentas, como espetáculos musicais e esportivos, bares, boates, obras civis, etc. O disciplinamento do uso do solo e das atividades urbanas é estabelecido por meio das leis municipais de ordenamento urbano e pelos códigos municipais de obras e de posturas, (ver Apêndice C.3). Se, em determinado Município, essas leis, ou a ausência delas, permitem a poluição sonora, nada pode ser feito em termos de legislação federal ou estadual, pois o “Pacto Federativo” garante a autonomia administrativa dos entes federados, respeitando-se as competências constitucionais de cada um deles (caput do art. 18 da Constituição Federal). Para controlar a poluição sonora, os Municípios e os órgãos ambientais e de trânsito valem-se de normas técnicas editadas pela Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT e pelo Instituto Brasileiro de Normatização e Metrologia – INMETRO, as quais definem os limites de barulho acima dos quais se caracteriza poluição. Como normas técnicas, esses instrumentos são periodicamente atualizados de acordo com a evolução tecnológica, o que não poderia ocorrer – ou seria muito mais 86 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] difícil de ocorrer – se fossem leis. Isto sem se levar em conta que as normas técnicas tratam de assuntos altamente complexos, de natureza especializada e, portanto, impossíveis de serem tratados pelos poderes legislativos. Outro argumento para que o poder legiferante sobre a poluição sonora urbana caiba ao Município é a capacidade ou poder de fazer cumprir efetivamente uma lei que a discipline. Só o Município tem condições operacionais de fiscalizar a ocupação do solo urbano, bastando, para compreender a dimensão dessa afirmativa, imaginar o custo e a complexidade da atuação federal, nesse campo, nos quase seis mil Municípios brasileiros. Como um nível de poder não pode impor, mediante lei, tarefas, competências e custos a outro nível, a competência de legislar sobre esse tema é, naturalmente, do Município. A possibilidade de efetivo exercício do poder de polícia determina, assim, a competência para legislar. A.3 Legislação Municipal O município de Goiânia não possui legislação específica que trate da poluição sonora, sendo que apenas o Código de postura do Município trás algumas considerações gerais sobre barulho neste contexto. Partes do Código de Postura do Município que tratam ou fazem referência ao assunto são mostradas a seguir. A Lei Complementar n° 014, de 29 de dezembro de 1992: "Institui o Código de Postura do Município de Goiânia e dá outras providências". A Câmara Municipal de Goiânia aprova e sanciona a seguinte Lei Complementar: Art. 1° - Este Código institui as normas disciplinadoras da higiene pública, do bem-estar público, da localização e do funcionamento de estabelecimentos comerciais, industriais e prestadores de serviços, bem como as correspondentes relações juridicas entre o Poder Público Municipal e os munícipios. Art. 2° - Todas as pessoas físicas e jurídicas são obrigadas a cumprir as prescrições desta Lei, a colaborar para o alcance de suas finalidades e a facilitar a fiscalização pertinente dos órgãos municipais. 87 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Art. 46 - É proibido perturbar o sossego e o bem-estar público ou da vizinhança com barulhos, algazarras barulhos ou sons de qualquer natureza, excessivos e evitáveis, produzidos por qualquer forma. Art. 47 - A instalação e o funcionamento de qualquer tipo de aparelho sonoro, engenho que produza ruídos, instrumento de alerta, propaganda para o exterior dos estabelecimentos comerciais, industriais, prestadores de serviços e similares dependem de licença prévia da Prefeitura. (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996) § 1° - A falta de licença a que se refere este artigo, bem como a produção de intensidade sonora superior à estabelecida nesta lei, implicará na apreensão dos aparelhos, ressalvado o instrumento de trabalho do músico, sem prejuízo de outras sanções. (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996) § 2° - A produção de música ao vivo nos bares, choperias, casas notumas e estabelecimentos similares será precedida de licença da Prefeitura e atenderá as seguintes exigências: I- O estabelecimento deverá ter competente adaptação técnica de acústica, de modo a evitar a propagação de som ao exterior em índices acima dos definidos nesta lei, bem como a perturbação do sossego público; II - O horário de funcionamento do som ao vivo será das 21:00 as 2:00 horas, de acordo com as condições e características do estabelecimento; III - É vedado a realização de som ao vivo em local totalmente aberto que cause transtorno e perturbação, ou que não tenha vedação acústica necessária; IV - O estabelecimento será previamente vistoriado por técnicos da Secretaria Municipal de Meio ambiente, que emitirão Relatórios de Inspeção sobre o mesmo. Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996). § 3° - A autorização para a produção de Som ao Vivo terá validade de 01 (um) ano, cuja renovação dependerá de competente inspeção para a verificação das condições de funcionamento; (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996). § 4° - A qualquer momento, em razão da comprovação de perturbação do sossego público, a autorização poderá ser suspensa ou revogada, sem prejuízo de outras sanções, em processo administrativo contencioso a que se permitirá ampla defesa. (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996). 88 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Art. 48 - Em circunstâncias que possam comprometer o sossego público, não será permitida a produção de música ao vivo nos bares, choparias, casas noturnas e estabelecimentos similares que não estejam dotados de isolamento acústicos de forma a impedir a propagação do som para o exterior. Art. 49 - A intensidade de som ou ruído, medida em decibéis, não poderá ser superior à estabelecida as normas técnicas. § 1° - O nível máximo de som ou ruído permitido para veículos é de 85 db (oitenta e cinco decibéis), medidos na curva "B" do respectivo aparelho, à distância de 7m (sete metros) do veículo, ao ar livre, engatado na primeira macha, no momento da saída. (Alterado pela Lei Complementar n.° 047 de 14 de maio de -1996). § 2° - O nível máximo de som ou ruído permitido para a produção por pessoas ou por qualquer tipo de aparelho sonoro, orquestras, instrumentos, utensílios ou engenhos, máquinas, compressores, geradores estacionários ou equipamentos de qualquer natureza, é de 55 db (cinquenta e cinco decibéis), das 7:00 (sete) às 19:00 (dezenove) horas, medidos na curva "B", e de 45 db (quarenta e cinco decibéis), das 19:00 (dezenove) às 7:00 (sete) horas, medidos na curva "A" do respectivo aparelho, ambos a distância a partir de 5m (cinco) metros de qualquer ponto das divisas do imóvel onde aquelas instalações estejam localizadas ou do ponto de maior intensidade de ruídos produzidos no local de sua geração. (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio 1996). § 3° - O nível máximo de som ou ruído permitido para a produção por pessoas ou qualquer tipo de aparelhos sonoros, orquestra, instrumentos, em especial para a realização de som ao vivo, é de 70 db (setenta decibéis) das 7:00 (sete) as 19:00 (dezenove) horas, medido na curva "B" e de 60 (sessenta decibéis) das 19:00 (dezenove) as 7:00 (sete) horas, medidos na curva "A" do respectivo aparelho, ambos a distância a partir de 5m (cinco) metros de qualquer ponto das divisas do imóvel onde aquelas instalações estejam localizadas ou do ponto de maior intensidade de ruídos produzidos no local de sua geração. (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996) § 4° - Não se aplica a norma do parágrafo anterior aos sons produzidos por: I - sinos de igrejas, conventos e capelas, desde que sirvam, exclusivamente, para indicar horas ou para anunciar a realização de atos ou cultos religiosos, devendo ser 89 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] evitados os toques antes de 5:00 (cinco) horas e depois das 22:00 (vinte e duas) horas; II - fanfarras ou bandas de música, durante a realização de procissões, cortejos ou desfiles públicos, nas datas religiosas e cívicas, ou mediante autorização especial do órgão competente da Prefeitura; III - aparelhos de sinalização de ambulância ou de carros de bombeiros e da polícia; IV - apitos de rondas e guardas policiais; V - máquinas ou aparelhos utilizados em construções ou obras em geral, devidamente licenciadas pela Prefeitura, desde que funcionem entre 7:00 (sete) e 19:00 (dezenove) horas, exceto nos domingos e feriados e desde que não ultrapassem o nível máximo de 90 de (noventa decibéis), medidos na curva "C" do aparelho medidor de intensidade do som, à distância de 5m (cinco) metros de qualquer ponto de divisa, onde aqueles equipamentos estejam localizados; (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996) VI - sirenes ou outros aparelhos sonoros, quando funcionarem exclusivamente para assinalar horas, entradas ou saídas de locais de trabalho, desde que os sinais não se prolonguem por mais de trinta segundos e não se verifiquem depois das 20:00 (vinte) horas e antes das 6:00 (seis) horas; VII - explosivos empregados no arrebatamento de pedreiras, rochas e demolições, desde que as detonações ocorram entre 7:00 (sete) e 18:00 (dezoito) horas e sejam autorizadas previamente pela Prefeitura. (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996) § 5° - vetado (Alterado pela Lei Complementar n° 047 de 14 de maio de 1996). Art. 50 - Nos estabelecimentos que comercializem ou consertem aparelhos sonoros, será obrigatória a instalação de isolamento acústico quando se pretender a geração de sons de intensidade superior à estabelecida no artigo anterior. Parágrafo único - As cabines instaladas deverão ser dotadas de aparelhos de renovação de ar. Art. 51 - Ficam proibidos, no perímetro urbano, a instalação e o funcionamento de alto-falantes e de aparelhos ou equipamentos similares, fixos ou móveis, ressalvados os casos previstos na legislação eleitoral e neste Código. 90 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] § 1° - Nos logradouros públicos, é proibida a produção de anúncios, pregões ou propaganda comercial por meio de aparelhos ou instrumentos de qualquer natureza, que produzam ou amplifiquem sons ou ruídos, individuais e coletivos. § 2° - Em oportunidades excepcionais e a critério da autoridade municipal competente, excluídos os casos de propaganda comercial de qualquer natureza, poderá ser concedida licença especial para o uso de alto-falantes e aparelhos ou equipamentos similares, em caráter provisório e para atos expressamente especificados. § 3° - Ficam excluídos da proibição estabelecida neste artigo, desde que licenciados, a instalação e o funcionamento de alto-falantes e aparelhos ou equipamentos similares, observados os limites de intensidade de som, quando utilizados: a) - no interior dos estádios, centros esportivos, circos, clubes e parques recreativos e educativos; b) em propaganda em geral, por cegos e incapacitados permanentemente para as ocupações habituais (propagandistas autónomos), mediante autorização especial e temporária, individual e intransferível; c) para divulgação de campanhas de vacinação educativas, bem como avisos de interesse geral da comunidade, definidos por norma específica." § 4° - Os infratores deste artigo terão seus alto-falantes e aparelhos ou equipamentos similares apreendidos e removidos, sem prejuízo da aplicação de outras penalidades. Art. 52 - Nos veículos de transporte coletivos, não será permitida a instalação de aparelhos que gerem sons de intensidade superior a 45 de (quarenta e cinco decibéis), medidos na curva "A", a uma distância de 2,00 m (dois) metros dos alto-alantes. Art. 53 - É proibido: I - queimar fogos de artifício, bombas, morteiros, busca-pés e demais fogos ruidosos, nos logradouros públicos, nos prédios de apartamentos e de uso coletivo, e nas portas ou janelas de residências fronteiriças aos logradouros públicos, assim como a uma distância inferior a 500m (quinhentos) metros de estabelecimentos de saúde, templos religiosos, escolas e repartições públicas, quando em funcionamento; II - soltar balões impulsionados por material incandescente; 91 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] III - fazer fogueiras nos logradouros públicos, sem prévia autorização do órgão competente da Prefeitura. Parágrafo único - O órgão municipal competente, somente concederá licença de funcionamento às indústrias e estabelecimentos comerciais que fabriquem ou comercializem fogos, em geral, com estampidos normais não superiores a 90 db (noventa decibéis), medidos ao ar livre, na curva "C" do aparelho medidor de intensidade de som, à distância de 7,00 (sete) metros da sua origem. Art. 54 - Nas proximidades de estabelecimentos de saúde asilos, escolas e habitações individuais ou coletivas, é proibido executar, antes das 7:00 (sete) horas e depois das 19:00 (dezenove) horas, qualquer atividade que produza ruído em nível que comprometa o sossego público. 92 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Apêndice B Psicoacústica B.1 Introdução Psicoacústica pode ser definida como o estudo fisiológico da audição. O propósito da pesquisa psicoacústica é entender como se dá este processo auditivo, ou melhor, como os sons chegam ao ouvido e são processados pelo ouvido e pelo cérebro de modo a dar ao ouvinte informações úteis sobre o mundo à sua volta. À psicoacústica não cabe investigar como os sons produzem um determinado estado emocional ou resposta cognitiva, isto é tarefa para a psicologia. O fato de a psicoacústica trabalhar com a medição das respostas auditivas do ser humano em um meio ambiente determinado sob certas condições é o motivo principal que faz com que a Psicoacústica seja considerado um braço da psicologia. Algumas áreas importantes da pesquisa psicoacústica são: • Como conseguimos ouvir separadamente sons que ocorrem simultaneamente; • Como conseguimos localizar sons no espaço; • Como conseguimos determinar o Tom de um som. A Psicoacústica Determina as habilidades e limitações da audição humana, que são de um valor incalculável na ajuda de como usar os sons no nosso meio ambiente. Qualquer ambiente onde o som seja produzido com o fim de ser ouvido por um público, deve considerar o processo de como esse som chega a esse público. Também na pesquisa e construção de aparelhos auditivos a ajuda da psicoacústica é fundamental, uma vez que, um problema que se coloca com muita freqüência nesta área, se amplifica os sons que são importantes para a pessoa, como solucionar o problema de que esses sons vêm junto com vários outros que podem ser classificados como barulhos, que seriam também amplificados. 93 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] B.2 Audição Humana A audição humana compreende vários níveis que, em conjunto, permitem a percepção de vibrações sonoras ambientais. Podemos dizer que o sistema de audição humano é um dos mais complexos e sofisticados mecanismos de tradução existentes na natureza. Sua gama dinâmica é enorme, sua capacidade de extrair informação do meio ambiente é muito apurada e sua capacidade de síntese da informação terminou permitindo que fosse usado para fins muito alheios e distantes daqueles a que estava destinado, como, por exemplo, ouvir música. Na realidade, ainda desconhecemos ou compreendemos parcialmente a maior parte do mecanismo auditivo, em especial no que se refere aos mecanismos internos do cérebro. Fig. B-1 Ouvido, visão anatômica geral O primeiro nível é o do ouvido, Fig. B-1, cuja função principal é a de converter as ondas sonoras de pressão propagadas pelo ar em impulsos nervosos que contém a informação que será decodificada e reintegrada pelos distintos níveis associativos cerebrais. Em relação ao mecanismo de audição, é importante perceber que: 1. Nem todo som que atinge o tímpano chega ao nervo auditivo como impulso neuronal; 2. Nem todo impulso neuronal causado por som existente no nervo auditivo é processado ou percebido pelo córtex; 94 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] 3. Nem toda atividade neuronal cortical portadora ou processadora de informação sonora é percebida pela nossa consciência; 4. O mais interessante: nem tudo o que ouvimos existe no mundo real, externo aos nossos ouvidos. A sensação auditiva é sintetizada no cérebro humano a partir de diversos elementos, um dos quais é o conjunto de vibrações que atingem o ouvido externo. B.2.1 Psicologia da Percepção Sonora A percepção é um dos principais temas da psicologia científica. A psicologia é definida como a ciência que estuda o comportamento e os processos mentais, e o estudo da percepção talvez seja seu ramo mais antigo. A análise experimental cabe compreender as bases sensoriais da percepção, a fim de desvendar o mistério de como é possível perceber o mundo que nos cerca através dos órgãos sensoriais, porém neste momento retrataremos apenas da percepção do som. Normalmente achamos que a percepção que temos do nosso ambiente é perfeita, porém esquecemos que não somos capazes de ouvir sons acima de 20.000 Hz e nem abaixo de 20 Hz, como os morcegos e os cães, devemos saber que nossos órgãos dos sentidos têm características comuns, possuem receptores que são células nervosas capazes de responder a estímulos específicos. Recebem, transformam e transmitem, para o restante do sistema nervoso um grande número de informações, que coexistem no ambiente. Quando ligamos um rádio, a membrana do alto falante começa a vibrar. Esta vibração é transferida para as moléculas de ar a sua volta, e estas por sua vez transferem a vibração para as moléculas vizinhas, permitindo assim a propagação de energia. Diferentes tipos de fontes sonoras desencadeiam vibrações do ar e das estruturas do ouvido, os quais terminam por deformar as células receptoras, e estas por sua vez, transformam a energia mecânica sobre elas exercida em energia eletroquímica, efetuando assim a tradução dos estímulos ambientais. Nas grandes cidades, o barulho transmitido pelos automóveis, fábricas e pessoas, é cada dia mais intenso. As pesquisas e medidas feitas com seres humanos e animais ainda são poucas. As conseqüências provocadas pelos excessos de poluição sonora para 95 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] a saúde física e mental, do ser humano, responsável por distúrbios circulatórios, gástricos e perda da audição (veja capítulo 4). A saúde mental pode ser afetada quando o indivíduo não consegue dormir o número mínimo de horas necessárias para um repouso adequado, ou quando a poluição sonora o impede de raciocinar, dificultando a execução de tarefas que exigem concentração. Disto pode resultar um elevado grau de ansiedade que irá dificulta a recuperação do paciente. Por meio do sistema auditivo, muitos objetos e elementos do ambiente podem ser detectados, localizados e identificados permitindo que sua natureza e trajetória no espaço sejam prontamente percebidas. Possuímos dois ouvidos, e as diferenças temporais na estimulação de suas respectivas células receptoras fornecem informações sobre a localização da fonte sonora. Nem sempre as fontes sonoras em nosso meio encontram-se a nossa frente, e quase sempre nós estamos em movimento, ou até mesmo as próprias fontes, encontra-se em movimento pelo espaço, (ver item 3.6), portanto o som atinge um ouvido depois o outro. Se uma fonte sonora for encostada em um ouvido, só depois de 5.29 x 10-4 s, que irá ouvir também com o outro ouvido. O som que irá atingir o segundo ouvido é de menor intensidade, e destas diferenças de intensidade e tempo, o cérebro extrai informações de localização da fonte sonora. Estes órgãos sensoriais estão simetricamente localizados na cabeça. Os impulsos nervosos oriundos de um ouvido diferem ligeiramente do outro, desta diferença não resulta nenhuma confusão na percepção. Esta discordância fornece ao cérebro elementos para uma correta percepção do espaço – localização. A intensidade do som também nos fornece informações sobre a distância em que se encontra uma fonte sonora conhecida. A experiência nos ensina que os sons diminuem de intensidade a medida que se distanciam as suas fontes sonoras. Há situações em que o eco é propositalmente criado e empregado para a percepção de objetos no espaço. Este procedimento é freqüentemente usado por arte de pessoas portadoras de deficiências visuais, elas se utilizam do eco de seus passos e do toque de suas bengalas para obter informação sobre a presença de objetos próximos. Neste caso, os ecos desempenham um importante papel na locomoção destes indivíduos. Um mecanismo de orientação espacial semelhante é o utilizado pelos morcegos enquanto voam. 96 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Ultimamente tem havido grande investimentos na Acústica Arquitetônica, e a Econografia hoje oferece uma boa aplicação na medicina. A percepção auditiva é apenas um aspecto da complexa percepção do ser humano. B.2.2 Principais Danos do Barulho ao Ser Humano Cada indivíduo possui características psicofisiológicas próprias que o distingue, completamente, de todos os demais. Estas características o faz reagir de forma diferente em situações aparentemente iguais, características que determinam maior ou menor susceptibilidade a determinadas situações do que outros e assim por diante. Entretanto, mesmo diante desta característica única do ser humano, existem limites que devem ser respeitados, sob pena de efeitos irreversíveis. Neste contexto se mostrará algumas situações possíveis. O barulho que chega ao cérebro em sobrecarga descontrola o ritmo biológico que leva a uma espécie de esquizofrenia, reduzindo a sua capacidade de interpretar. O estresse elevado provoca liberação de endorfinas pelo cérebro, com efeito anestésico, criando barulhos-dependentes além de ansiedade, irritação, excitação maníaco-depressiva, medo etc. O excesso de ruído causa disfunção e distúrbios dos nervos periféricos do corpo causando tremores das mãos, redução da reação a estímulos visuais e auditivos, zumbido no ouvido ocasionado pela lesão do nervo auditivo. Os efeitos do ruído sobre a pessoa dependem do tempo de exposição, (ver Tabela 42), idade, tempo de serviço e intensidade do ruído. A maioria das pessoas apresenta alterações na tensão, irritação, maior susceptibilidade ao desagrado, níveis rescentes de surdez e alterações no aparelho circulatório. O Vestíbulo, órgão situado no ouvido relacionado com a cóclea, (ver Fig. B-1), é responsável pelo nosso equilíbrio. A exposição a ruídos intensos e por tempo prolongado causa disfunções neste órgão provocando náuseas, vómitos, tonturas, labirintite, sendo uma das causas de muitos acidentes de trabalho. O ruído acima de 55 dB(A) reduz o desempenho e a produtividade, a concentração e a velocidade no trabalho, a capacidade de planejamento, a memorização, retardamento nas respostas e conclusões, perda de desempenho em tarefas de cálculo, de raciocínio e aumento de erros. O excesso de barulho provoca disfunções na produção de hormônios com adrenalina, noradrenalina, glicocorticóides, catecolaminas, corticosteróides, aumento na liberação de 97 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] colesterol livre e cortisol entre outros, causando medo, violência, depressão psicológica, deficiência imunológica, disfunções orgânicas, ósseas, musculares, inibição das gonadotrofinas e oxitocinas, causando mal desempenho sexual etc. O barulho causa alteração do cortisol, GH, enzimas, leucócitos, aumento do nível de hormônios em geral, de glicemia, ocasiona úlceras gástricas e duodenais, cerplasias de células do córtex adrenal, influenciando, enfim, todas as funções. A alteração do funcionamento normal do metabolismo humano reduz a capacidade do sistema imunológico de se defender dos ataques de bactérias, vírus, células cancerígenas, oferecendo maiores dificuldades na cura das doenças. 98 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Apêndice C História da Música Se estudarmos com cuidado a mitologia dos povos, perceberemos que todo o povo tem um deus ou algum tipo de representação mitológica ligado à música, dividiremos a história da música em duas partes, uma sendo a história mitológica e a outra que é a que chegou até nossos dias. A história mitológica da música, começa com a morte dos Titãs. Conta-se que depois da vitória dos deuses do Olímpo sobre os seis filhos de Urano: Oceano, Ceos, Cria, Hiperião, Jápeto e Crono, que era os Titãs, foi solicitado a Zeus que se criassem divindades capazes de cantar as vitórias dos Olímpicos. Zeus então partilhou o leito com Mnemosina, a deusa da memória, durante nove noites consecutivas e, no devido tempo, nasceram as nove Musas. Entre as nove Musas estava Euterpe, a música, e Aede ou Arché, o canto. As nove deusas gostavam de freqüentar o monte Parnaso, na Fócida, onde fazia parte do cortejo de Apolo, deus da Música. Há também, na mitologia, outros deuses ligados à história da música como Museo, filho de Eumolpo, que era tão grande musicista que quando tocava chegava a curar doenças. Orfeu, filho da musa Calíope, musa da poesia lírica é considerada a mais alta dignidade das nove musas, que era cantor, músico e poeta, de Anfião, filho de Zeus, que após ganhar uma lira de Hermes, o mais ocupado de todos os deuses, passou a dedicar-se inteiramente à música. Para os egípcios, por exemplo, a música teria sido inventada por Tot ou por Osíris, para os hindus, por Brama, para os judeus, por Jubal e assim por diante, o que prova que a música é algo intrínseco a historia do ser humano sobre a Terra e uma de suas manifestações mais antigas e importantes. Porém também temos a história não mitológica, que por sua vez divide em duas partes, a primeira, na expressão de sentimentos através da voz humana, a segunda, no fenômeno natural de soar em conjunto de duas ou mais vozes a primeira, seria a raiz da música vocal; a segunda, a raiz da música instrumental. Na história da música são importantes os nomes de Pitágoras, inventor do monocórdio para determinar matematicamente as relações dos sons, e o de Lassus, o mestre de Píndaro, que, perto do ano 540 aC., foi o primeiro pensador a escrever sobre a teoria da música. 99 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Outro nome é o do chinês Lin-Len, que escreveu também um dos primeiros documentos a respeito de música, em 234 aC., época do imperador chinês Haung-Ti. No tempo desse soberano, Lin-Len, que era um de seus ministros, estabeleceu a oitava em doze semitons, aos quais chamou de doze lius. Esses doze lius foram divididos em liu Yang e liu Yin, que correspondiam, entre outras coisas, aos doze meses do ano. A música, segundo a teoria musical, é formada de três elementos principais. São eles o ritmo, a harmonia e a melodia. Entre esses três elementos podemos afirmar que o ritmo é a base e o fundamento de toda expressão musical. Sem ritmo não há música. Acredita-se que os movimentos rítmicos do corpo humano tenham originado a música. O ritmo é de tal maneira mais importante, sendo o único elemento que pode existir independente dos outros dois. A harmonia, segundo elemento importante, é responsável pelo desenvolvimento da arte musical. Foi da harmonia de vozes humanas que surgiu a música instrumental. A melodia, por sua vez, é a primeira e imediata expressão de capacidades musicais, pois se desenvolve a partir da língua, da acentuação das palavras, e forma uma sucessão de notas característica que, por vezes, resulta num padrão rítmico e harmônico reconhecível. O que resulta da junção da melodia, harmonia e ritmo são as consonâncias e as dissonâncias. Acontece porém, que as definições de dissonâncias e consonâncias variam de cultura para cultura. Na idade média, eram considerados dissonantes certos acordes que parecem perfeitamente consonantes aos ouvidos atuais, principalmente aos ouvidos roqueiros de hoje. Essas diferenças são ainda maiores quando se compara a música ocidental com a indiana ou a chinesa, podendo se chegar até à incompreensão mútua. Para melhor entender essas diferenças entre consonância e dissonância é sempre bom recorrer ao latim: Consonância, em latim consonantia, significa acordo, concordância, ou seja, consonante é todo o som que nos parece agradável, que concorda com nosso gosto musical e com os outros sons que o seguem. Dissonância, em latim dissonantia, significa desarmonia, discordância, ou seja, é todo som que nos parece desagradável, ou, no sentido mais de teoria musical, todo intervalo que não satisfaz a idéia de repouso e pede resolução em uma consonância. Logo a dissonância seria todo som que parece exigir um outro som logo em seguida. Já a incompreensão se dá porque as concordâncias e discordâncias mudam de cultura para cultura, pois quando nós, ocidentais, ouvimos uma música oriental típica, 100 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] chegamos, às vezes, a ter impressão de que ela está em total desacordo com nossos ouvidos ocidentais. Portanto o que se pode dizer é que os povos, na realidade, têm consonâncias e dissonâncias próprias, pois elas representam as suas subjetividades, as suas maneira de ver, sentir, reagir, própria de cada pessoa., o gosto e o costume de cada povo e de cada cultura. A música seria, nesse caso, a capacidade que consiste em saber expressar sentimentos através de sons artisticamente combinados ou a ciência que pertence aos domínios da acústica, modificando-se esteticamente de cultura para cultura. 101 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Observações Os dados do Capitulo 5 foram coletados pelas alunas do curso de fonoaudiologia: • Meima Graciella Silva Pires • Paloma Henandez Rodrigues • Carmen Cynira Cardoso • Adriane Pitaluga • Lorena Pereira Araújo 102 Clóves Gonçalves Rodrigues [email protected] Wesley Pacheco Calixto [email protected] Bibliografia Ramalho Junior, Francisco. et. al.. Fundamentos da Física: Termologia, Óptica Geométrica e Ondas. (1982). São Paulo, SP: Moderna. 3ª ed. v.2. Weber, Robert L., White, Marsh W., Manning, Kenneth V. College Physics. (1959). New York, EUA: McGraw-Hill Book Company. 3ª ed. Pauli, Ronald Ulisses. et.al. Física: Ondas, Acústica e Óptica. (1980). 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