1 DAIANE GOMES DE LIMA ALÔ QUERIDA! UMA LIGAÇÃO HOLLYWOOD – ANÁPOLIS Anápolis - Goiás 2009 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIAS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS CURSO DE HISTÓRIA ALÔ QUERIDA! UMA LIGAÇÃO HOLLYWOOD – ANÁPOLIS Trabalho de Conclusão de Curso entregue a Coordenação do Curso de História da Unidade de Ciências Sócio-Econômicas e Humanas de Anápolis, Universidade Estadual de Goiás, para obtenção de grau de Licenciatura em História. Orientador: Prof. Dr. Robson Pereira Mendonça Anápolis/GO 2009 3 DEDICATÓRIA À minha amada mãe, Sebastiana; para as minhas queridas irmãs: Márcia, Marisa e Lila; e à Jade, de quem sinto muita saudade. Amo vocês! 4 AGRADECIMENTO Ao meu orientador Prof. Dr. Robson Mendonça por sua confiança em meu projeto de pesquisa, por seus preciosos ensinamentos e pela compreensão nos momentos em que tive dificuldade. À minha família pela paciência, carinho, e amor em todos os momentos da minha vida. Por me guiarem pelos caminhos corretos, me ensinarem a fazer as melhores escolhas, me mostrando que a honestidade e o respeito são primordiais à vida. È a elas que devo a pessoa que me tornei, sou extremamente feliz e tenho muito orgulho por pertencer a está família Aos amigos Robertson Abdalla; Luiz Flores; Marco Aurélio, Marília e Felipe Moura; e às queridas amigas Letícia Sousa e Vera pelo apoio incondicional que tornaram minha caminhada para a realização deste trabalho mais agradável. Obrigada pelo amor e amizade! À Tiziano Chiarotti e ao Museu Histórico de Anápolis pela valiosa colaboração sem a qual este trabalho não seria possível. À Irmã Verônica pela grande contribuição do seu depoimento. Aos professores do curso de História da UEG e aos meus colegas de turma, em especial à Graziano Magalhães, pelos incentivos e gestos de amizade ao longo de todos estes anos de formação. Especialmente ao meu grande amigo Cristiano Oliveira por me ajudar com as traduções, e me dar uma força mesmo nos momentos em que estava ocupado; pelo companheirismo durante as longas madrugadas de trabalho, sempre ao meu lado mesmo estando tão longe; pelo apoio emocional, e por ser sempre a voz sensata que me confortava nos momentos difíceis; pela infindável paciência e pelos maravilhosos momentos em que passamos juntos! Você é inesquecível... A Deus, meu refúgio e minha força! 5 “Eu não podia saber naquele tempo que o caboclo tem fé num Deus misericordioso e onipotente. Um Deus que não somente nota a queda de um pardal, como põe na terra tudo aquilo que o homem precisa, no lugar e na ocasião propícia, um Deus que não se esquece dos humildes.” ]ÉtÇ _ÉãxÄÄ 6 RESUMO Joan Lowell, atriz/escritora, e Leek Bowen, capitão de navio, vieram para a região de Anápolis no final da década de 1930, por que naquela época esta cidade era a que mais se destacava em Goiás. Estes norte-americanos se aventuraram no interior de Goiás numa época em que estímulos federais, como a Marcha Para o Oeste, buscavam povoar e desenvolver economicamente os vazios demográficos do interior do país. Outros norte-americanos por influencia de Joan Lowell, que lançou em 1952 no seu país um livro sobre sua vida no interior do Brasil, adquiriram terras em Anápolis, entre eles a atriz Janet Gaynor e seu marido Gilbert Adrian. Outra atriz, Mary Martin veio para a cidade por causa da amiga Janet Gaynor. Ela e seu marido, Richard Halliday se encantavam com as características naturais da localidade, bem como por sua paisagem urbana onde conviviam harmonicamente o moderno e o arcaico. Palavras-chave: Anápolis, Joan Lowell, Terra Prometida, Janet Gaynor e Mary Martin. 7 RESUME Joan Lowell, actress / writer, and Leek Bowen, ships captain, came to the region of Anápolis in the late 1930s, because in this time this city was the most important in Goiás. These North Americans if had ventured into Goiás at a time when federal incentives, such as the Marcha Para o Oeste, had the purpose in the populate and to develop economically the empty demographic in the interior of the country. Others North Americans for influences of the Joan Lowell, which launched in 1952 in his country a book about his life in the interior of Brazil, they had acquired land in Anápolis, including the actress Janet Gaynor and her husband Gilbert Adrian. Another actress, Mary Martin came to town for the sake of her friend Janet Gaynor. She and her husband, the Richard Halliday were enchanted with the natural features of the site, as well as for its urban landscape where lived together and harmonically the modern and the archaic. Key-words: Anápolis, Joan Lowell, Promisse Land, Janet Gaynor e Mary Martin. 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO...........................................................................................................09 1. FAR-WAST – O BRASIL É NOVA FRONTEIRA................................................15 1.1. A incrível Joan Lowell.....................................................................................15 1.2. EUA e America Latina....................................................................................22 1.2.1. Instrumentos de Dominação dos EUA na América Latina....................24 1.2.2. EUA e Brasil: Os Bons Vizinhos...........................................................28 2. A TERRA PROMETIDA........................................................................................35 2.1. Rumo ao Desconhecido.................................................................................38 2.2. O Casal Bowen Chega a Goiás......................................................................40 2.2.1. A Manchester do Cerrado.....................................................................42 2.3. Os Pioneiros...................................................................................................45 2.3.1. As Concepções de Fronteira.................................................................48 2.4. Como Prender um Homem Sem Ser Útil?.....................................................51 2.5. A Mais Corajosa das Mulheres.......................................................................55 2.6. Quem Conta Um Conto Aumenta um Ponto..................................................58 2.7. No Caminho de Bernardo Sayão....................................................................62 2.7.1. James Fanstone....................................................................................65 2.8. A Marcha Para o Oeste e a CANG.................................................................67 2.8.1. Joan Lowell e Léa Sayão......................................................................69 2.9. “Cobra-Sêca” Está Chegando!.......................................................................71 2.10. A Frente de Expansão e a Frente Pioneira.................................................72 2.11. Em Anápolis................................................................................................75 3. THE END?............................................................................................................78 3.1. Hollywood Vem Para o Cerrado.....................................................................81 3.2. Joan Lowell e os Conflitos de Terras.............................................................85 3.3. A Fraternidade Eclética Espiritualista Universal.............................................92 3.4. Bye-Bye Anápolis...........................................................................................97 3.5. Porque Mary Martin Amava a Selva.............................................................101 3.6. Visitas Ilustres..............................................................................................104 3.7. A Volta..........................................................................................................107 CONCLUSÃO...........................................................................................................110 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................116 9 INTRODUÇÃO Em meados de 1930, começaram a chegar a Anápolis, uma cidade do interior de Goiás, um grupo de imigrantes diferentes daqueles que já haviam chegado à cidade. Anápolis já havia recebido levas de imigrantes de muitos lugares do mundo, havia na cidade: árabes (sírio-libaneses), norte-americanos e ingleses ligados a Igreja Presbiteriana, uma das primeiras igrejas protestantes a se instalarem na cidade a partir de 1920 (ROCHA, 2007). Além disso, houve enorme migração de outras localidades para a cidade de Anápolis, que nesta época se despontava por seu desenvolvimento econômico. Nesta mesma época chegou à cidade um casal bem diferente das pessoas da região, eram elas, a atriz e escritora americana Joan Lowell e seu marido o comandante naval Leek Bowen. Estes foram as primeiras de muitas outras celebridades ligadas ao cinema e ao teatro norte-americano que viriam para Goiás a passeio, e em alguns casos para fixar moradia. Entre os artistas americanos que vieram para Anápolis entre o final da década de 1930 e meados de 1950, permanecendo por aqui até o final dos anos 1980, merecem destaque figuras importantes como Janet Gaynor, primeira mulher a receber um Oscar, o prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos da América; Mary Martin, atriz e cantora do teatro e do cinema, famosas por peças como “Peter Pan” e “South Pacific”, e seu filho, o também ator Larry Hagman, o J.R. da série televisiva “Dallas”; Janet Gaynor a primeira mulher a ganhar um Oscar; Joan Lowell, escritora e atriz do cinema mudo que realizou um 10 filme com Charles Chaplin, “Em Busca do Ouro” de 1925. Estiveram em Anápolis também vários outros atores e atrizes e pessoas ligadas ao cinema norte-americano, para visitá-los ocasionalmente. O objetivo deste trabalho era relatar quais foram os motivos que trouxeram estes famosos norte-americanos para Anápolis, e quais as conseqüências da estadia deles no município, levantando fatos que ocorreram com eles enquanto viviam na cidade e relacionando-os com a história local. O estudo deste acontecimento se insere na chamada história regional, e sua relevância está na contribuição que a realização do mesmo significará também para a história geral, pois como citou Barbosa (1998) pode-se construir uma história nacional a partir da contribuição de trabalhos de caráter regional. A história regional é um método que é explicado de várias maneiras, destacamos a contribuição de Neves (2002), que afirma que esta forma de escrever a história é uma proposta de estudo da história de algum grupo social que tem por característica uma base territorial com práticas econômicas, manifestações culturais e organização social em comum. No presente estudo, o aspecto em comum a todos os atores que participaram dos acontecimentos, é a localidade em que eles residiam: Anápolis, e regiões circunvizinhas. No decorrer deste texto as referências que foram feitas da história de outros lugares, nesse caso dos Estados Unidos da América e também da história do Brasil durante o período que foi estudado, que tiveram o objetivo de comprovar ou refutar as hipóteses levantadas contextualizando nossa discussão e análise dos fatos. Procuramos relacionar o contexto brasileiro e mundial com a realidade goiana e principalmente da cidade de Anápolis, pois segundo Biavaschi (2003) o historiador 11 deve ter cuidado para não tomar uma parte pelo todo, e elaborar sua pesquisa a partir da análise de vestígios de um contexto específico que depois é aplicado indiscriminadamente à totalidade de uma formação social. Barbosa (1998) ressalta que existe a necessidade do historiador que trabalha com História Regional de relacionar a dinâmica da história geral com espaço que ele se propôs a estudar, para não criar uma história artificial descolada do contexto geral. Assim no primeiro capítulo falamos sobre a vida de Joan Lowell antes de ela vir para a região de Anápolis, e sobre as relações entre o país natal da atriz/escritora e o Brasil, destacando elementos que interligavam Anápolis aos EUA. Enfatizamos que a presença dela e de outros norte-americanos no interior de Goiás aconteceu em uma época em que os Estados Unidos interferiam em todos os países da América, através instrumentos como a conhecida Política da Boa Vizinhança. E mesmo estas pessoas não estando ligadas oficialmente a nenhum programa do governo estadunidense que fomentasse as relações entre Brasil e EUA, e tão pouco a serviço do governo norte-americano no país, percebemos que a chegada delas a Anápolis não deixa de relacionar-se com a vinda de tantos outros americanos ao Brasil, bem como a ida de muitos brasileiros para os Estados Unidos. O segundo capítulo analisa o livro “Terra Prometida” de autoria de Joan Lowell, onde ela afirma ter vindo abrir uma estrada no interior de Goiás, numa região onde posteriormente foi construída a colônia agrícola, antes mesmo da chegada de Bernardo Sayão à região goiana do Vale do São Patrício. A vinda destes norte americanos para o interior do Brasil acontece exatamente no momento em que o governo brasileiro implementava um programa que incentivava o povoamento e exploração dos chamados vazios demográficos, as regiões do interior do país que 12 não estavam inseridas na economia nacional. Este programa foi a Marcha para ao Oeste do governo de Getúlio Vargas, em vigor desde 1937, e cujas medidas propiciaram a expansão da fronteira agrícola e o aumento da produção de mantimentos para o abastecimento do mercado interno (BORGES, 2008). A política varguista para o povoamento do interior brasileiro previa a criação de colônias agrícolas, que grandes extensões de terras que eram doados para os cidadãos brasileiros (e com algumas restrições também para estrangeiros) tinham um núcleo onde ficavam concentrados todos os serviços essenciais para os moradores locais, como escolas, postos de saúde, comércios e a administração da colônia (LENHARO, 1986). Dentre estas colônias a mais conhecida foi a CANG, a Colônia Agrícola Nacional de Goiás, comandada por Bernardo Sayão. Joan Lowell conhecera Bernardo Sayão na região da colônia e tornou-se sua grande amiga. Além de tratar sobre a Marcha para o Oeste, o capítulo relaciona a história de Joan Lowell com os fatos que ocorriam em Goiás, em especial Anápolis, a cidade que era referência para boa parte do interior goiano daquela época. Desde antes de eles virem morar no interior do Brasil, Anápolis era uma importante cidade goiana. A cidade já no segundo decênio deste século tornou-se ponto de atração para os comerciantes tropeiros, nela fixando-se e instalando estabelecimentos comerciais. Asseguravam com tais iniciativas, oportunidades de expansão dos negócios não só porque a cidade estava no projeto do percurso da via férrea, mas também pela grande afluência de pessoas, que já estava se processando, atraídas para o município (FRANÇA, s/d) O terceiro capítulo trata da vida de Joan Lowell e de seu marido, o capitão de navio Leek Bowen, após terem saído da região do Vale São Patrício e vindo morar em Anápolis, cidade em que o casal residiu a maior parte do tempo em que estiveram no Brasil, apesar de quase nada se ter documentado sobre este período. 13 Devido à falta publicações sobre muitos aspectos deste período, foi necessário recorrer a fontes como: as biografias dos norte-americanos, bem como a jornais nacionais e internacionais que fizessem alguma referência à vinda destas pessoas a Anápolis. Ressalta-se que a maioria dos jornais, foram consultados em ambiente virtual (exceto os publicados no próprio município e em cidade vizinhas). São muitas as histórias ligadas à estadia destas “estrelas” em Anápolis, porém quando livros, revistas, jornais, biografias, páginas eletrônicas, entre outras fontes grafadas ou iconográficas, não cobrem suficientemente todos os aspectos da história, a falta de documentação pôde ser resolvida com a realização de entrevista. Caprini (2007) reconhece a importância das fontes orais para a história regional, pois quando as fontes primárias e secundárias são escassas, devido ao fato da pesquisa ser a primeira sobre o assunto, os testemunhos são as únicas fontes que se tem disponível. É preciso então que o pesquisador esteja metodologicamente bem preparado para que não se cometa equívocos, ficando sua pesquisa comprometida com os interesses dos entrevistados. Entre os outros artistas norte americanos que vieram para Anápolis por influência de Joan Lowell, merece destaque Janet Gaynor e Mary Martin, que chegaram à cidade em meados da década de 1950, e adotaram a cidade como refúgio, e recebiam em suas fazendas vários amigos, igualmente famosos. Nesta década, a cidade não passava mais por um momento tão próspero, este foi um período de decadência para o município, se comparado aos anos de 1930, quando a ferrovia havia finalmente chegado. A proximidade das duas capitais, Goiânia e Brasília, acabou por ofuscar em muito o brilho da cidade. Ao concorrer com a capital federal Anápolis perdeu Joan Lowell e Leek Bowen, que se mudaram para lá mesmo 14 antes de sua inauguração oficial em 1960. Mary Martin e seu marido Richard Halliday, permaneceram em Anápolis ainda por muitos anos, pois não procuravam um lugar de prosperidade econômica. A cidade conquistou este casal pela possibilidade de uma vida pacata, ainda assim gozando de um relativo conforto. 15 CAPÍTULO 1. FAR-WEST: O BRASIL É A NOVA FRONTEIRA 1.1. A Incrível Joan Lowell A atriz e escritora norte americana Joan Lowell foi a primeira a chegar a Goiás. Seu nome verdadeiro era Hellen Joan Wagner1, quanto aos nomes de seus pais segundo uma revista norte-americana eram Lazzarrevich e Emmaline Trask Lowell2; mas de acordo as informações de um documento da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal, igreja de Anápolis que a atriz/escritora freqüentou, os nomes de seus pais seriam Nicolas Lowell e Emmaline Trask; já para um jornal norte americano o pai de Joan chamava-se Nicholas Wagner.3 Se os nomes de seus pais aparecem diferentes em algumas das fontes consultadas, quanto à profissão de seu pai são todas unânimes, ele era um capitão de navio. A atriz/escritora nasceu em 23 de novembro de 1902 em Berkeley, uma cidade do estado norte americano da Califórnia. Ela foi atriz do teatro e do cinema, estrelando um de seus filmes ao lado de Charles Chaplin, o “Em Busca do Ouro” (1925) e participou ainda, de mais seis filmes nas décadas de 1920 e de 1930.4 Joan foi ainda jornalista e escritora, escreveu livros autobiográficos, “The Cradle of the Deep” em 1929, “Gal Report” em 1933,5 e “Promisse Land” em 1952, ou “Terra Prometida” na versão brasileira. O primeiro de seus livros descreve sua infância e adolescência onde ela teria vivido a bordo do navio Minnie A. Caine, o livro narra a história emocionante de sua vida no mar, desde o convívio com os 1 Jornal The Milwaukee Journal Sentinel, Milwaukee, 7-abril-1929, p 01-02. Revista Time, New York, 18-mar-1929 3 Idem 1. 4 Sítio eletrônico especializado em cinema, o IMDb. 5 Revista Time, New York, 24-Jul-1933. 2 16 marinheiros, passando pelas adversidades da vida em um navio, às explorações de florestas na América Central.6 O livro foi um grande sucesso editorial, um best seller para a década de 1920. Joan Lowell se transformou em uma celebridade, a mídia a elogiou, outros escritores também defenderam a qualidade da obra da jovem escritora. Readers took the bait. Lowell's memoir, a Book-of-the-Month Club selection, sold more than 100,000 copies. Lowell was profiled in newspapers, photographed on ships and wrote a Saturday Evening Post essay about lessons learned from a life on the sea (Los Angeles Times, 14-março7 2008). Mas a decepção veio pouco tempo depois, quando descobriram que Joan Lowell tinha mesmo vivido em um navio, mas apenas em algumas ocasiões e por pouco tempo, sua infância e adolescência fora como de qualquer outra criança, pelas ruas de Berkeley, na Califórnia. E o navio de seu pai, que segundo seu relato havia naufragado na costa da Austrália após um incêndio, o que teria obrigado a escritora a nadar até a praia com seus animais de estimação agarrados às suas costas, descobriu-se posteriormente estar “repousando placidamente” no Porto de Oakland, na Califórnia.8 A descoberta da mentira de Joan Lowell aconteceu logo após a publicação de seu livro no ano de 1929.9 Em 18 de março do mesmo ano a Revista Time publicava um artigo falando sobre a história de “The Cradle of The Deep” em tom 6 Idem 2. “Os Leitores morderam a isca. As memórias de Lowell, selecionado como o livro do mês do Clube do Livro do Mês, vendeu mais de 100.000 cópias. Lowell foi retratada em jornais, fotografou a bordo de navios e escreveu um ensaio para a revista Saturday Evening Post sobre as lições aprendidas com a vida no mar” (Tradução Livre). 8 Revista Time, New York, 15-abril-1929. 9 Todas as fontes consultadas afirmam que o livro foi lançado em 1929, entretanto o jornal The Evening Independence (St. Petersburg, 08-jun-1923: p.13) em uma matéria sobre Joan Lowell falava a respeito se seu livro. Este fato evidencia que a edição de 1929 não era a 1ª edição de “The Cradle of the Deep”. 7 17 elogioso. No mês seguinte a farsa foi descoberta, e um jornal norte americano fez uma análise dos diários de Bordo do Minnie A. Caine e atestou que o pai de Joan realmente foi comandante deste navio, mas por apenas 15 meses e não 17 anos, e nesta época a atriz/escritora já era adolescente e não um bebê, como ela havia afirmado. A mesma matéria ainda revelou outros fatos:10 That the actually was a fire, the log of the ship shows. But this fire occurred at an Adelaide, Australia, wharf, and instead of swimming to shore Joan Lowell walked down the gangplank to the dock. The ship was scuttled, but salvaged, repaired and taken back to San Francisco. The ship's log further shows that Joan was not the only "woman thing" aboard the vessel. Her book says that Joan's mother "hated the sea", and never sailed with her husband, but the records show that Mrs. Wagner made the voyage to Australia. The log also refers to "the two children”, indicating that Joan's 11 memoir was faulty when she wrote that never played with another child. Depois do escândalo da descoberta de que sua autobiografia era composta por várias partes fantasiosas e não verídica Joan Lowell ficou desacreditada, os elogios deram lugar ao sarcasmo, ela foi criticada por diversos meios de comunicação dos Estados Unidos que antes não haviam economizado glórias para ela e para com o seu livro. Segundo o jornal The Evening Independence do dia 29 de abril de 1929 (p. 05), após a descoberta das mentiras contidas em seu relato, Joan passou por diversos problemas, entretanto, (...) “the book, with all the yelping, continues to sell hot cakes and to the tune of many, many thousands of dollars for Miss Lowell”. 12 10 Idem 1.. “Que realmente havia um incêndio, o registro do navio mostra. Mas o fogo como ocorreu em Adelaide, na Austrália, com o navio atracado, o que fez Joan Lowell em vez de nadar para a costa, descer de prancha de desembarque para a doca. O navio foi rapidamente salvo, reparado e levado de volta para San Francisco. O diário de bordo mostra ainda que Joan não era a única mulher , a bordo do navio. O livro diz que a mãe de Joan "odiava o mar" e nunca viajou com o marido, mas os registros mostram que a Sra. Wagner fez a viagem para a Austrália. O registro também se referia a "duas crianças", indicando que a memória de Joana foi falha quando escreveu que ela nunca brincava com outra criança (Tradução livre).” 12 “(...) o livro, com todo este alvoroço continua a vender como pão quente e ao som de muitos, muitos milhares de dólares para Lowell (Tradução livre)”. 11 18 No ano de 1929 após a quebra da Bolsa de Nova York, a crise econômica assolou todo o mundo capitalista. Também para Joan Lowell este ano não foi bom, pois depois de ter tido seu livro desmentido e de ter ficado conhecida como mentirosa, seu casamento com o jornalista e dramaturgo Thompson Buchanan passou por uma grave crise.13 E mesmo com as tentativas de reconciliação, tempos depois a relação terminou. Joan posteriormente passou a viver em Nova York, onde escrevia para um jornal de Boston, Daily Recorde, em 1933 publicou outro livro autobiográfico, “Gal Reporter”, sobre sua experiência como repórter do jornal em uma viagem a bordo de um navio da Guarda Costeira americana em expedição ao deserto do Mojave, no estado da Califórnia.14 O navio partiu de Boston, cidade localizada às margens do oceano Atlântico, e levou a tripulação até o deserto que fica no estado da Califórnia, na costa do Pacífico. Em 1934 Joan Lowell protagonizou e roteirizou a película “Adventure Girl”, que foi uma tentativa de da atriz/escritora de se desculpar com seus leitores pela farsa contida no seu primeiro livro. Now she steps out again, this time as skipper of the black Hawk, a 48 foot schooner on which she made an adventurous voyage to Central America. For the sake of a graphic record, she took a movie camerman (sic) along on this latter trip, and now the party has returned, Bring back a full-length feature picture. It is titled Joan Lowell - "Adventure Girl", and will be shown at 15 the Princess Theatre Sunday (Kentucky New Era, 25-ago-1934: p. 03). Este filme é uma espécie de documentário autobiográfico em que ela tentou 13 Jornal Pittsburgh Post- Gazette, Pittsburgh, 26-dez-1929, p.02. Idem 5. 15 “Agora ela saiu novamente, desta vez como capitã do Black Hawks, uma escuna de 48 pés em que ela fez uma viagem de aventura à América Central. Para fazer o registro gráfico, ela levou um cinegrafista junto nesta última viagem, e agora o grupo voltou, trazendo de volta as imagens do longa-metragem. É intitulado por Joan Lowell como “Adventure Girl”, e será apresentado no Teatro Princess domingo “(Tradução livre). 14 19 justificar as façanhas descritas no seu primeiro livro, mostrando na película as aventuras que dizia ter vivido em alto mar, a bordo do Minnie A. Caine. Ela filmou na Guatemala, e de lá trouxe uma criança mestiça de 6 anos, chamado Marino Valdéz, encontrada abandonada nas selvas durante a gravação do filme.16 Joan pretendia adotar esta criança e educá-la, mas provavelmente não conseguiu, pois não há registro de nenhum herdeiro seu. É interessante notar o quando a história de vida de Joan Lowell está intimamente ligada ao mar, e a navios. Filha do capitão de um navio chamado Minnie A. Caine, Joan narrou no livro “Cradle of the Deep” as façanhas que ela teria vivido no mar ao lado de seu pai, posteriormente descobriu-se que isto não teria passado de uma estratégica literária (como justificou seu primeiro marido, o escritor Thompson Buchanan) onde ela juntou várias experiências que ela teria vivido em navios em um mesmo relato.17 Com o ator Basil Rathbone ela estrelou a peça teatral “Port o’London” na qual interpretava a filha de um capitão do mar.18 A escritora ainda participou de uma expedição a um deserto californiano a bordo de um navio com a Guarda Costeira americana; tempos depois ela foi a bordo do navio Black Hawk filmar “The Adventure Girl” e finalmente conheceu seu marido, com o qual se aventurou em terras brasileiras justamente em um navio, do qual ele era capitão. Joan Lowell era de fato uma mulher muito aventureira (o que se comprova pelo fato dela largar todo o conforto do seu apartamento em Nova York para viver uma aventura no Brasil), a escritora é descrita por muitas pessoas como uma mulher corajosa, Léa Sayão, filha de Bernardo Sayão e sua amiga, descreveu-a certa vez como sonhadora (FREITAS, 2002). 16 Revista Time, New York, 19-fev-1934. Idem 8. 18 Idem 2. 17 20 No entanto a maior aventura que Joan Lowell viveria seria muito longe de onde ela se encontrava nesta época. Ela começa a se delinear durante um cruzeiro pelas costa das Américas, num Transatlântico de luxo, quando a escritora conheceu Leek Bowen, o capitão do navio e seu futuro marido. O capitão revelou a atriz seu sonho de vir viver uma aventura desbravando o interior do Brasil, e numa história digna de um roteiro cinematográfico, Joan e Bowen se apaixonaram e resolveram viver na América do Sul (LOWELL, s/d). Segundo Joan Lowell, Leek Bowen disse a ela as seguintes palavras, como que a convidando para vir com ele: “Existem, lá, muitas terras desabitadas (...). O Brasil ainda tem regiões inexploradas, que se oferecem aos colonizadores (...). Sabe, desde menino, desejei descobrir um rincão, o mais longe possível da civilização (LOWELL, s/d: p.13)”. Joan Lowell (s/d) relata que primeiro ela veio sozinha, morando em uma praia deserta na costa paulista, perto do porto de Santos a espera do amado, posteriormente Leek Bowen veio, após ter conseguido se desfazer de suas posses nos Estados Unidos e de pedir demissão do emprego. Ao chegar aqui eles ainda não sabiam por onde começar a empreitada pelo interior do país. Novamente a história toma um rumo inesperado, bem ao estilo “Joan Lowell”. Mesmo morando em uma praia deserta e longe dos aglomerados urbanos Joan (s/d) conta que algumas pessoas sabiam da existência naquelas redondezas de um casal americano, sabiam também da vontade de ambos de desbravar o interior do país. Então em uma manhã bateu a porta do casal dois homens que ofereceram a eles a proposta de vir para o interior de Goiás abrir uma estrada em terras selvagens que necessitavam de uma via de acesso, ainda que precária, para 21 que pudessem valorizar as terras para eles posteriormente vendê-las. O casal aceitou o acordo que previa ainda que Joan viesse com o marido para que outras esposas não temessem vir morar na localidade caso algum homem resolvesse se mudar para lá. Assim começou a aventura de Joan Lowell e Leek Bowen pelo Planalto central, o capitão partiu primeiro e combinou que sua esposa o esperaria voltar para buscá-la depois de sondar o local onde deveria ser aberta a estrada. Joan Lowell não ficou à espera de seu marido sabendo que ele estava embrenhado no meio do mato num local desconhecido, e sem ao menos saber comunicar-se em português. Ela juntou seus pertences e rumou com destino ao interior do país um dia após seu marido ter saído. Foi assim, segundo seu próprio relato, que Joan Lowell e seu marido vieram parar em Goiás para descobrir o que eles chamavam de “terra livre aos colonizadores” (LOWELL, s/d). Estando ela naquele momento no sertão de Goiás não haveria mais mar, mas Joan Lowell não precisava dele para conseguir vivenciar as mais inusitadas aventuras. Em seu livro sobre sua vida no Brasil Joan Lowell não cita muitas datas, sabemos que ela chegou ao Brasil no final do ano de 1935 pelo seu relato no começo do primeiro capítulo de seu livro: Talves (sic) a política da boa vizinhança ainda não fosse oficial entre o Brasil e os Estados Unidos, em novembro de 1935, mas tive uma recepção 19 amistosa, cordial, quando voltei dos Estados Unidos, dali a dois meses, desembarcando em Santos. E não trazia passagem de ida e volta (LOWELL, s/d: p.17). 19 Joan fala que foi bem recebida quando “voltou” ao Brasil por que no cruzeiro em que ela conheceu o marido, Leek Bowen, ela já havia passado pelo país em uma das paradas do navio e desembarcado no Rio de Janeiro (LOWELL, s/d: p.14). 22 Joan Lowell neste trecho cita uma das formas que os norte-americanos usaram para intervir nos países latino americanos, a conhecida Política da Boa Vizinhança, uma postura aparentemente solidária para com o restante dos países da América, que estavam desabando perante as conseqüências da crise de 1929 e pela instabilidade política. É muito difícil estabelecer quais foram os motivos para a escolha deste casal de vir viver aqui no Brasil, alem é claro do que já está relatado no seu livro autobiográfico, sobre a vontade de Leek Bowen de desbravar terras selvagens. Mas a vinda deste casal para este país aconteceu em um momento da história mundial em que os Estados Unidos impunham sua presença em quase todos os países da América Latina, e mesmo em outras partes do mundo, de várias formas. A prática de interferência nas questões nacionais de outros países é um traço sempre presente na política internacional norte-americana, basta lembrarmo-nos da entrada dos EUA na guerra do povo grego contra a dominação britânica, em 1947; no apoio ao golpe de 1954 na Guatemala; no Japão em 1947, cujas ações americanas reverteram uma quadro que iria levar o país a democratização; na Coréia durante a Guerra do Vietnã,em 1959, entre tantas outras intervenções (CHOMSKY, 1999). (...) os Estados Unidos nunca tiveram uma “política para a América Latina”, mas sim uma só grande doutrina, uma Estratégia Global voltada para sustentar a posição norte americana no mundo a longo prazo. Por conseguinte, as relações para com o restante do continente americano derivam dessa doutrina maior; são elas um ramo menor de todos – por vezes o menos significativo deles” (SCHILLING, 2002:15). 23 1.2. EUA e a América Latina Por volta de 1935 quando Joan Lowell saiu do seu país natal, os Estados Unidos da América, para viver no Brasil o mundo vivia um período conturbado. Ainda abalados pela Primeira Guerra Mundial e se recuperando dos estragos causados pela Crise da Bolsa de 1929, o mundo caminhava para a ocorrência do segundo grande embate entre as nações do globo. Por ter saído das duas grandes guerras mundiais fortalecidos economicamente (embora tenha enfrentado uma recessão no período imediato pós 1ª Guerra), principalmente logo após a 2ª Guerra mundial Os Estados Unidos se consolidaram “como o líder militar e econômico do Mundo” (FERNANDES et al., 2007) No período correspondente ao recorte temporal que escolhemos, que é de 1900 á 1990, aconteceram as duas grandes guerras mundiais, além da Guerra Fria, conflitos que foram decisivos para a consolidação do mundo tal como conhecemos hoje. Politicamente assistimos a ascensão de regimes fascista, que dividiram a Europa, promoveram a guerra que afetou todo o planeta, mas principalmente o velho continente (FERNANDES et al., 2007). No setor econômico presenciamos a consolidação do sistema capitalista, e neste sistema nenhum país foi tão bem adaptado e obteve tão rápido sucesso como os EUA, com seu “American Way of Life”. Avanços tecnológicos nos processos de produção na indústria automobilística (linha de montagem e mecanização, de comunicações (rádio e telefone), eletrônicos e plásticos (eletrodomésticos e outros bens de consumo) criaram produtos inovadores e preços cada vez mais acessíveis, Circulavam entre as massas produtos antes restritos aos ricos - carro, luz elétrica, gramofone, rádio, cinema, aspirador de pó, geladeira e telefone -, o “jeito de viver americano” (american way of life) tornou-se o slogan do período (FERNADES et al., 2007; p.198). 24 O crescimento desta nova potência econômica só foi freado com uma crise gerada em sua própria economia, o crack da Bolsa de Nova York, em 1929 (SCHILLING, 2002). Porém, após um período de grande depressão vemos o país retomar o caminho do crescimento econômico a partir da criação do programa econômico conhecido como New Deal, pelo presidente Franklin Roosevelt, quando o EUA consolidou-se como uma das nações mais poderosas da América (FERNANDES et al., 2007). Após a 2ª Guerra os Estados Unidos saíram ainda mais fortalecidos do embate entre as potências Européias. O Mundo dividiu-se entre superpotências, União Soviética e Estados Unidos, sendo que duas primeiro representava o capitalismo, e o outro o socialismo real, um dualismo que dividiria o mundo através da Guerra Fria (FERNANDES et al., 2007). Para Fernandes et al (2007) o Comunismo era visto pelas sociedades capitalistas, principalmente os EUA, como uma ameaça a propriedade privada, a democracia liberal e a sua soberania, e foi usado como justificativa para a intervenção dos norte-americano nas economias da América Latina. O avanço do Comunismo revigorou uma praticada da política internacional norte-americana, a criação de diversos tratados, doutrinas e outros tipos de acordos visando a proteção do território e da hegemonia dos países americanos. 1.2.1. Instrumentos de Dominação dos EUA na América Latina Desde o Plano Hamilton, de 1820, até a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) uma instituição contemporânea, muitas seriam as estratégias dos norteamericanos para (SCHILLING, 2002). subordinar a América aos seus interesses econômicos 25 A Doutrina Monroe, ou “A América para os americanos”, de 1823, foi a noção que guiou toda a relação entre Estados Unidos e América Latina ao longo do século XIX e XX, e que se mantém até os dias de atuais apesar da significativa falta de preocupação dos EUA com a situação da A. L. nos últimos anos. Esta doutrina partia da idéia de que não poderia haver intervenção estrangeira (especificamente européia) nos conflitos internos dos países da América, cabendo somente aos Estados Unidos o direito de intervir no continente americano por sua condição política e econômica relativamente estável, sendo o primeiro país independente do continente americano, e com uma próspera economia. Porém, no fim da Guerra de Secessão, a doutrina mudou sua natureza progressista para assumir a característica de simples imposição da hegemonia norte-americana no restante da América. Esta concepção também se fez presente no mito do Destino Manifesto (a crença de que a incorporação de outras regiões vizinhas era parte dos desígnios divinos para a nação norte-americana). O presidente estadunidense Theodore Roosevelt20 no início do século XX implementou uma política externa mais agressiva, conhecida pelo termo big stick e lançou o Corolário21 Roosevelt, as intenções destas medidas diplomáticas eram proteger os interesses econômicos dos Estados Unidos na América Latina. Posteriormente estas práticas foram reformuladas e o Corolário Roosevelt foi substituído em 1917 pelo Corolário Wilson, do presidente Woodrow Wilson. O Corolário Wilson além de reafirmar a posição defendida por Roosevelt dava respaldo a qualquer governo latino americano que chegasse ao poder mediante eleições, dando segurança aos investidores norte-americanos. Os Estados 20 O período dos mandatos do presidente Theodore “Teddy” Roosevelt (1858-1919) foi de 1901 à 1909 ,chegou a tentar um terceiro mandato em 1912, mas foi derrotado pelo democrata Woodrow Wilson, cujo mandato se estendeu de 1913 até 1921.. 21 Para Schilling os corolários “são medidas cuja função é interpretar a doutrina segundo a conjuntura histórica, adequando-se as realidades de interesses táticos da política externa norte americana. Trata-se da jurisprudência do intervencionismo” (2002: p.15). 26 Unidos se colocou assim, contra qualquer transformação revolucionária que pudesse ocorrer no continente americano (SCHILLING, 2002). Segundo Schilling (2002) ainda viriam a Política da Boa Vizinhança, em 1933; o Pacto da Não-Intervenção e Inviolabilidade de Territórios na década de 1930; o TIAR (Tratado Interamericano de Assistência Recíproca) em 1947; e a OEA (Organização dos Estados Americanos), lançado durante a Guerra Fria; a Aliança pra o Progresso, em 1960, e a mais recentemente a ALCA. Todas estas ações evidenciam quase 200 anos de interferência norte-americana institucionalizada nos países latinos americanos. O combate ao Comunismo foi somente uma justificativa ideológica para a manutenção das práticas intervencionistas após a 2ª Guerra Mundial. Os Estados Unidos sempre mantiveram uma postura expansionista e para isto o governo norteamericano usou por várias vezes a intervenção direta ou indireta, como uma forma de garantir que seus interesses econômicos com relação a um país não fossem prejudicados por problemas internos desta nação (SCHILLING, 2002). A Guerra Fria na América Latina começou no fim de 1940, quando os movimentos favoráveis à mudança política e econômica surgiram em muitos países do continente e acabaram refreados ou esmagados pelas elites locais com a ajuda dos Estados Unidos. Manipulando a retórica do anticomunismo, os Estados Unidos mantiveram os países latino americanos na esfera da influência ocidental por meio de invasão, orquestração de golpes, obstáculos à reforma social e apoio técnico e político a regimes militares repressivos (FERNANDES et al, 2007: p. 229). As ações de expansão da influência norte-americana para além das fronteiras dos Estados Unidos eram justificadas pelo chamado “Destino Manifesto”, a crença numa predestinação natural, quase divina para a liderança do continente americano. De fato uma espécie de “recolonização” da América que há pouco tempo havia se libertado dos europeus e passavam assim, ao julgo dos norte-americanos. 27 O destino manifesto foi a filosofia nacional dos Estados Unidos, aquela que modelou o coração e a mente dos cidadãos, fazendo com que apoiassem, quase que por unanimidade, o expansionismo permanente, a idéia de uma fronteira móvel, insaciável, sem descanso, sempre em movimento (SCHILLING, 2002: p.21-22). O casal Joan Lowell e Leek Bowen pareciam também compartilhar esta ideologia do povo norte-americano da procura de terras desabitadas. Ao se referir ao Brasil, Bowen afirma que existiam aqui terras “inexploradas, que se oferecem aos colonizadores” (LOWELL, 1984: p.13). Joan por sua vez concordava com ele, é o que podemos perceber em sua reação após o capitão ter-lhe confessado que ainda não havia tentado sua empreitada na América do sul por não ter uma companheira para ir com ele. Para ela: “Uma nova fronteira... Pensamento que me obcecava, a todos os momentos. Também eu estava desiludida e detestava-me pelo verniz sofisticado que voluntariamente adquirira, como defesa contra a vida agitada da cidade (LOWELL, s/d: p.14). Segundo Schilling (2002) uma estratégia política norte-americana para a intervenção na América que foi amplamente divulgada e aceita pela população daquele país era a chamada Política da Boa Vizinhança, pregada pelo presidente Franklin Delano Roosevelt a partir de 1933. Está nova tática adotada após a crise de 1929, quando os EUA ainda estavam economicamente fragilizados, dispensava o uso do big stick (usado largamente no início do século XX por outro presidente, seu tio Theodor Roosevelt) cessando assim as intervenções militares, pois naquele momento eles acreditavam que o uso da força atrapalhava a liderança de fato de todo o continente, substituindo pó uma estratégia mais suave diante da expansão do nazi-facismo. Esta se faria por meio da propaganda e divulgação cultural dos valores da sociedade liberal norte-americana através do cinema, da publicidade, etc. 28 Segundo Mesquita (2002) foi criado em 1940 pelo Conselho de Segurança Nacional uma agência responsável por fiscalizar os países da America Latina, vinculada ao OCIAA (Office of Coordinator Inter-American Affairs), que fazia parte do Programa de Defesa Nacional dos Estados Unidos. Em um relatório chamado “The Founding of the CIAA” os norte-americanos afirmavam existir no Brasil vários investimentos no ramo cultural que visavam desprestigiar os Estados Unidos na América Latina. Neste sentido, a criação do OCIAA se insere numa ‘estratégia’ política mais ampla do governo norte-americano ao conectar relações culturais na defesa e promoção dos ‘interesses nacionais’. Assim, no âmbito da formulação e implementação da política externa, a instrumentalização das relações culturais aos objetivos emergenciais dimensiona o poder de ‘ação’ do Estado. A partir da cooptação de setores da elite norte-americana estritamente ligados ao campo da difusão cultural, o Estado alcança, ao mesmo tempo, dois objetivos: um elemento diferenciador com relação as européias para não descortinar interesses mais amplos então em jogo e ao mesmo tempo, viabiliza a política interna no sentido de incrementar a indústria cultural norte-americana (MESQUITA 2002: p.38-39). A influência alemã na América era grande após o termino da Primeira Guerra, e se manifestava de várias formas. A grande quantidade de imigrantes vindos da Europa depois do fim da guerra fortalecia ainda mais este vínculo, além das relações econômicas entre Alemanha e Brasil. O OCIAA, ou Birô, recebia capital de empresas norte-americanas com sede no Brasil, e foi durante está época que vieram a América do Sul vários artistas e pessoas ligadas ao cinema, cientistas, estudiosos, professores norte-americanos, a fim de fortalecer as relações entre os povos da América (SILVA, 2006). 1.2.2. EUA e Brasil: Os Bons Vizinhos As relações entre EUA e Brasil se intensificaram no início do século XX quando os Estados Unidos se tornaram a maior potência das Américas. É certo que 29 esta influencia já se esboçava há mais tempo, pois desde sua independência o Brasil tinha como modelo algumas características do sistema político estadunidense, e a partir do século XX os norte-americanos eram os maiores compradores do café Brasileiro, e a participação dos brasileiros na 2ª Guerra Mundial contribuiu para que no pós-guerra o Brasil ficasse sob hegemonia norte-americana, tanto sob o ponto de vista político, como no econômico e cultural (MASKE, 2000). As relações entre Brasil e EUA pareciam ser vistas como desejáveis. Um jornal de Anápolis chegou a reproduzir no início da década de 1940 uma matéria de um jornalista americano chamado Edward O’Neil sobre as relações entre este dois países com o seguinte título: “Os Estados Unidos estão com mania do Brasil” 22 . No artigo ele falava sobre a grande curiosidade que o Brasil despertava nos norteamericanos, bem como da necessidade de que os países da América se mantivessem unidos contra qualquer tipo de intervenção exterior, isto é, das potências do Eixo, pois o governo de Getúlio Vargas manteve com a Alemanha alguns acordos econômicos e mesmo certa afinidade político-ideológica. A virada em favor dos Aliados se explica pela intensa pressão por parte dos norte americanos que entraram efetivamente na guerra após o ataque a Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941. Segundo a reportagem: As coisas vindas do Brasil estão tendo tamanha aceitação nos meio americanos que todos nós ficamos curiosos de conhecer pormenores desse país, do qual se contam maravilhas. Os sucessos alcançados pelas narrativas referentes à grande nação sul-americana em breve farão com que ela seja alvo de todos os assuntos. (...) Pode se dizer que os americanos estão com mania do Brasil e sentimos mesmo esboçar-se um futuro de importante colaboração entre os dois países. Agora cada vez se torna mais valiosa a colaboração entre os dois países. Agora se torna valiosa a cooperação que a Conferência do Panamá proclamou. As três Américas devem unir-se para fazer uma barreira contra os estranhos que quizerem (sic) desembarcar com objetivos que não sejam pacíficos (ANÁPOLIS, 08-jun-1941: p.01). 22 Jornal Anápolis, Anápolis, 8-Jun-1941: p. 01. 30 Nesta época os planos para a Integração das Américas eram tão audaciosos que previam até uma rodovia que ligaria quase que todos os países americanos. A estrada sairia do Rio de Janeiro e iria até o Alasca. O empreendimento qualificado como “fabuloso” custaria 5 milhões de réis, que seriam dividido entre todos as nações beneficiadas com a construção da rodovia.23 Fatos relativamente sem importância alimentavam ainda mais os ânimos em prol do pan-americanismo, e a América não é apresentada em sua clássica divisão em três partes, mas como o uma só, “o Continente da Paz”: Naturalmente todos sabem que nos Estados Unidos há numerosas cidades com nomes romanos gregos e troianos, franceses, espanhóis, alemães, etc. Mas decididamente será uma surpresa para os brasileiros saberem que nos Estados Unidos no Estado de Indiana de onde estamos escrevendo esta correspondência, existe uma cidade chamada ‘Brasil’. Sim, Brasil, com todas as letras. E na estrada da cidade, o Rotary Clube do Brasil, isto é, da cidadezinha americana chamada Brasil, erigiu duas pilastras entre as quais se estende um painel com estes dísticos: ‘Seja benvindo a Brasil’. E’ curioso assinalar segundo nos declarou um membro do Rotary Clube desta cidade, que secções deste Clube, em duas cidades do mundo tiveram idêntica iniciativa: uma, a de Brasil, no Estado norte-americano de Indiana; outra, a de Uberlandia (sic) no Estado brasileiro de Minas Gerais. E assim , através da distancia, unem-se os homens, unem-se os nomes, numa típica demonstração da cordialidade do Continente da paz (ANÁPOLIS, 9-fev1941: p. 02) Após o fim da guerra, em Agosto de 1947, foi realizada na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência Pan-Americana, na qual se aguardava a presença de representantes de todos os países da América.24 Em 1950 na Conferência das Nações Unidas o Brasil representado pelo embaixador Cyro de Freitas que foi o primeiro a falar, e advogou pela criação de uma força militar permanente, bem como de um sistema de assistência econômica e financeira para as nações membros da Organização das Nações Unidas (ONU).25 23 24 25 Jornal Annápolis, Anápolis, 11-Maio-1941, p. 01. Jornal O Anápolis, Anápolis, 3-jun-1947, p. 01. Jornal O Anápolis, Anápolis, 15-out-1950, p. 01. 31 Esta aproximação entre Brasil e Estados Unidos foi bastante fecunda principalmente no campo cultural, possibilitando assim a penetração dos valores norte-americanos na cultura nacional, e facilitando a assimilação e adoção do “American Way of Life”. Durante a Segunda Guerra Mundial, o governo norte-americano engajou vários artistas (os cineastas Orson Welles e John Ford, por exemplo) no esforço de angariar a adesão dos países latino-americanos à luta contra o nazi-fascismo. Os interesses políticos (e, depois, econômicos) dos Estados Unidos trouxeram à América Latina o produtor de desenhos animados Walt Disney (que, na época, enfrentava uma greve em seu estúdio) e alguns cartunistas de sua equipe. Em sua estadia, criaram diversos personagens ligados aos países latino-americanos para o cinema de animação, entre eles o papagaio brasileiro Zé Carioca (SANTOS, 2002 p. 02). Neste intercâmbio cultural Carmem Miranda, atriz e cantora portuguesa naturalizada brasileira, representava o Brasil nos EUA, ela é considerada um figura contraditória, pois caracterizava a realidade brasileira de forma caricata para o consumo de massa da sociedade norte-americana, ávida pelo exotismo dos países latino-americanos. Contratada pela 20th Century Fox, a atriz com seu gingado característico, participava de muitos filmes em Hollywood, como Serenata tropical (1940), A Noite no Rio (1941), Aconteceu em Havana (1971) e Alegria Rapazes (1944), entre outros.26 Goiás e Anápolis apesar de estarem localizados tão distantes dos EUA e mesmo dos principais centros econômicos do Brasil na época, não deixavam de estar inseridos na Política da Boa Vizinhança norte-americana. Os jornais através de manchetes como “Goiás em evidência nos EE.UU”27; “Policiais Goianos Farão Estágio de Tres (sic) Meses nos E.E.U.U.”28; “ Bolsa de Estudo nos Estados Unidos” 26 27 28 Jornal O Anápolis, Anápolis, 07-ago-1955, p. 01. Jornal O Anápolis, Anápolis, 21-fev-1957, p. 01. Jornal O Anápolis, Anápolis, 05-jun-1956, p. 03. 32 (destinadas a funcionários administrativos do municípios goianos)29; “Expedição Científica ao interior de Goiás” (pesquisa biológica no norte de Goiás, organizada pelo Museu de Los Angeles)30, dão indícios de quão estreita era a relação entre estas duas localidades, firmadas graças as políticas de intercâmbio cultural oferecido pelo governo norte americano durante os anos de 1950. Anápolis com a 2ª cidade mais importante do estado de Goiás também estava em evidência no cenário internacional e mantinha relações com os norteamericanos, como podemos confirmar pelas as matérias do jornal O Anápolis que noticiavam o fato de um médico anapolino ter sido convidado para exercer suas funções como “assistente estrangeiro” em hospitais de Baltimore e Nova York31, outra matéria falava sobre a visita do embaixador americano à cidade um pouco depois do final da guerra, deste acontecimento merece destaque o trecho: “O embaixador dos Estados Unidos que se hospedou na casa de dª Joan Lowell Bowen, já estava palestrando com alguns elementos locais. Assim que perguntado a excia qual o objetivo de sua visita a Goiás nos respondeu: (...) venho a Anápolis também para estudar os meios de melhorar os transportes para o escoamento de um milhão de sacos de arroz, exportável por esta cidade, conforme estou informado existir aqui”(O Anápolis, 24junho-1945: p.01, grifo nosso). O embaixador prometeu, segundo a mesma matéria, a doação de caminhões e combustível para dinamizar o transporte dos produtos anapolinos para a exportação. Assim como Joan Lowell e Leek Bowen, outros estrangeiros se encantaram pelas qualidades do solo do mato grosso goiano, e compraram propriedades rurais na região de Anápolis. Isto se deve ao fato de que as terras realmente eram muito 29 30 31 Jornal O Anápolis, Anápolis, 17-fev-1963, p. 01. Jornal O Anápolis, Anápolis, 13-mar-1956, p. 01. Jornal O Anápolis, Anápolis, 29-set-1956, p. 04. 33 boas para o cultivo, mas também foi graças a uma intensa política governamental que tinha o propósito de integrar o interior do Brasil aos centros industriais, desenvolvendo para isso uma espécie de colonização de áreas improdutivas e devolutas nos moldes da Marcha para o Oeste norte-americana. Num jornal da cidade de Anápolis, e com o seguinte título: “Do Texas diretamente para Anápolis” foi publicada uma matéria falando sobre a presença de norte-americanos na cidade, cujo texto destacamos abaixo: O Estado de Goiás, e principalmente Anápolis, vem atraindo grande numero de norte-americanos, E todos ou quase todos inclusive artistas de Hollywood, se localizam na zona rural. Dona Joana Lowell foi a pioneira. O Livro Terra prometida fez sucesso nos Estados Unidos, e Goiás se tornou muito conhecido no grande país. Disse-nos Dona Joana que, aproximadamente, quarenta famílias norte-americanas já estão residindo nesta região. (...) Dia 20 do corrente, viajando em avião de Real, chegaram a esta cidade14 texanos, chefiados por Sr. Lloyd Willians, que aqui estivera em 1955, adquirindo terras neste e no município de Pirenópolis. E ele fazendeiro e agricultor, no Texas, pretende trazer sessenta pessoas, sendo as que com ele vieram, o primeiro grupo. O Sr. Lloyd Willian não esconde seu entusiasmo pelo nosso município, chegando a dizer: Os texanos consideram o Texas a melhor região do Estados Unidos, e Anápolis ainda é melhor do que o Texas ( O ANÁPOLIS, 20-fevereiro-1956: p.1, grifo nosso). Nesta matéria Joan aparece com o nome de Joana Lowell, pois era assim que ela era conhecida na cidade. O seu nome, como alguns nomes de outros norteamericanos que vieram para Anápolis passaram por uma espécie de tradução para o português, certamente a fim de facilitar a pronuncia pelos habitantes locais. Outro aspecto interessante destas duas reportagens e o fato de que Joan Lowell foi citada em ambas e parece estar inserida na dinâmica da sociedade anapolina ao ponto do jornal da cidade procurá-la para comentar o a presença de outros norte-americanos que assim como ela estavam vindo viver no município de Anápolis. A escritora também serviu de cicerone durante a visita do embaixador, seu compatriota, à cidade o que evidencia que Joan já estava bem estabelecida na 34 cidade no ano de 1945. Mas antes disto Joan narrou em seu livro, A Terra Prometida, que teria vivido em um acampamento perto da cidade de Jaraguá (perto do local onde foi construída posteriormente a Colônia Agrícola Nacional Goiás) assim que chegou a Goiás. Desde o Destino Manifesto (1823), passando pela Doutrina Monroe (1835) até o período em que se vigorava a Política da Boa Vizinhança (em meados do século XX), foi se construindo na mentalidade dos cidadãos norte-americanos a idéia de que eles poderiam interferir, colonizar ou levar o progresso para todos os locais do continente americano, sendo estes atos considerados como uma predestinação divina, e uma obrigação que cabia a eles por serem a parte mais desenvolvida da América. E juntando a isso a o desejo norte-americano de descobrir novas terras a serem colonizadas (resquícios ideológicos do movimento de Marcha para o Oeste, que rompendo as fronteiras naturais da cordilheira dos Apalaches, levaram os cidadãos norte-americanos para o interior do seu país) tem se formada toda uma ideologia que permeou a mentalidade da população norte-americana. Isto elucida o fato de que enquanto o governo implementava sua política intervencionista e imperialista, simples cidadãos norte-americanos, como o casal Bowen, realizavam paralelamente seus pequenos projetos de colonização e exploração comercial da América. 35 CAPÍTULO 2. A TERRA PROMETIDA É difícil saber a data exata de quando o casal Bowen chegou a Goiás, pois Joan Lowell em “Terra Prometida”, seu livro sobre sua vinda para este estado, é extremamente vaga em se tratando de datas, em algumas passagens ela menciona alguns acontecimentos históricos que ocorreram durante o período no qual morou no Brasil, ou cita algum mês e assim podemos ter uma breve noção do tempo no qual se desenrola os acontecimentos que está narrando. Mesmo antes de vir morar no Brasil Joan Lowell já conhecia o país, segundo o relato feito em “Terra Prometida”, comentou sobre a passagem por algumas cidades do Brasil no cruzeiro em que conheceu o seu segundo marido, o capitão do navio Leek Bowen. Durante esta viagem o navio parou no Brasil no Rio de Janeiro e em Santos (LOWELL, s/d: 14-15). E em uma matéria de 24 de julho de 1933 a revista norte americana Time escreveu no final de um texto sobre Joan a seguinte frase: “With $1,000 and Count Ilya Tolstoy as a deckhand, undaunted Adventures Lowell set off again. Said she: "Hell, yes, we're going on—rHit (sic) on around Cape Horn".32E neste texto Joan afirma que iria contornar o Cabo Horn, o ponto mais meridional da América localizado no território do Chile; aparentemente a América do Sul já fazia parte dos planos da escritora, antes dela vir morar aqui. Como já citado anteriormente Joan chega ao Brasil em janeiro de 1936. Ao desembarcar no Porto de Santos, foi morar em uma praia deserta “na costa ao sul mais ou menos na latitude 35”. Lá ela comprou um pedaço de terra de mil metros 32 “Com US $ 1.000 e Conde Ilya Tolstoy como um marinheiro, a destemida aventureira Lowell, partiu novamente. Disse ela: "Claro que sim, estamos indo - atingir o entorno do Cabo Horn” (Time, 24-jul1933, tradução livre). 36 quadrados pela quantia de trinta dólares, e conheceu um pescador que ela descreveu como sendo do tipo “viking”, chamado Roberto e sua mulher Maria, o casal a acolheu em sua casa e depois foram eles que organizaram o mutirão que construiu a cabana onde ela morou até sua vinda para o interior do país (LOWELL, s/d: passim). As mulheres ficaram na cabana, com Maria. Dali a duas horas, os voluntários tinham já o terreno limpo. As picaretas batiam na madeira para as futuras vigas eles cantavam enquanto trabalhavam e riam. Sentada embaixo de uma árvore, não pude deixar de admirar-me. Aquêles (sic) homens nada sabiam de mim, nem mesmo o meu nome e, no entanto, a um chamado de Roberto, tinham vindo alegremente ajudar-me. Não aceitaram dinheiro, mas eu encontraria outro meio de recompensá-los. Na minha bagagem havia artigos de que êles (sic) precisariam e eu ia dividi-los entre todos (LOWELL, s/d: p.29-30). Foi neste lugar que Joan diz ter começado a conhecer os vários aspectos cultura brasileira, as comidas típicas, os modos de falar e de se comportar, as artimanhas para aproveitar o que a natureza oferecia, e o uso de remédios naturais para se tratar doenças. Joan aprendeu e também ofereceu o que sabia e tinha, doava aos habitantes locais remédios que seu marido ganhava de indústrias farmacêuticas norte americanas, e mandava a ela por navio para que ela distribuísse aos habitantes locais. Desejei contribuir de algum modo para o bem da comunidade. A única coisa que eu tinha a oferecer eram remédios. Quando disse a Josefa que avisasse (sic) os outros que eu daria remédios aos que estivessem doentes, longe estava de imaginar que ela iria chamar ao habitantes de uma érea de cinqüenta milhas quadradas. Nem por sombras estava sabendo que iria ser 33 considerada uma nova Florence Nightingale . Quando fiz o oferecimento, foi um desesperado esforço de retribuir o que êles (sic) tinham feito por mim e contribuir com algo construtivo (LOWELL, s/d: p. 34). 33 Enfermeira britânica que ficou famosa por ter sido pioneira no tratamento de feridos de guerra. 37 Nesta praia ela conheceu sua primeira amiga em terras brasileiras, Josefa, que segundo Joan “não sabia ler nem escrever, mas tinha conhecimento, para sobreviver, que nunca se encontrariam em livros” (s/d: p.31). Permaneceu neste local por muitos meses suscitando a curiosidade da colônia norte-americana e inglesa das cidades de Santos e São Paulo, sobre o que teria levado uma ex-atriz de Hollywood a largar seu país e todo o conforto que dispunha lá para viver sozinha no meio da “selva” no Brasil. O capitão Bowen, havia pedido a Joan que viesse sozinha e o esperasse por três meses até que ele conseguisse resolver todos os seus problemas para depois vir se encontrar com ela. Este período acabou se estendendo e Joan teve que esperar muito mais tempo até que o marido viesse, chegou até a pensar que ele não viria quando foi informada por funcionários do porto da cidade de Santos que Leek Bowen havia sido promovido capitão do porto de Nova York (LOWELL, s/d). Poucos dias depois Joan Lowell recebeu uma correspondência do marido, e foi ao seu encontro, casaram-se em Nova York e vieram em definitivo para o Brasil, trazendo consigo alguns animais domésticos, cachorros de caça, patos e perus. Depois de aproximadamente um mês instalados na cabana a beira da praia receberam a visita de três homens que propuseram a eles vir para Goiás abrir uma estrada numa “área de duzentas milhas quadradas no centro do Estado de Goiás em troca de cento e vinte mil acres como pagamento “(p. 50). Segundo Silva (2002) o casal foi contratado pelo grupo paulista Monteiro de Barros para abrir a estrada que partia de Jaraguá em direção a fazenda Lavrinhas34, de propriedade deste mesmo grupo. O casal aceitou a proposta, mas Leek Bowen planejou vir primeiro para depois mandar buscar Joan. De fato ele veio primeiro, mas sua esposa 34 A Fazenda Lavrinhas de São Sebastião é onde se localiza atualmente o distrito de Natinópolis, pertencente ao município de Goianésia. 38 desobedecendo às recomendações do marido alugou um carro com motorista e partiu em seguida para junto dele, trazendo com ela todos os pertences do casal, inclusive os animais (LOWELL, s/d). Sabe-se que desde 1926 os Monteiros de Barros haviam adquirido as terras das chamadas “Lavrinhas de São Sebastião”, numa região onde foi criada, tempo depois, a cidade de Goianésia.35 Nesta região também foi criada a cidade de Ceres, a partir da Colônia Agrícola Nacional de Goiás (SILVA, 2002). 2.1. Rumo ao Desconhecido Esta é a versão de Joan Lowell em seu livro “Terra Prometida” para a sua vinda para o Brasil, porém segundo Mendes (1995) o motivo da escritora ter vindo para o Brasil não teria sido o desejo de descobrir novas terras, pois Joan Lowell desde a descoberta das mentiras contidas em seu primeiro livro recebia duras críticas. “Dizia-se que ali aportara fugida dos Estados Unidos, em virtude da publicação de um livro Cradle of the deep, em que narrava a história de sua mãe, deserdada ao casar com um capitão de navio-rebocador e que morrera de parto, justamente ao dar a luz a sua filha Joana. Órfã de mãe, teria sido criada pelo pai, no velho navio. O livro auto-biográfico fez sucesso e chegou a ser escolhido o “Livro do Mês”, nos Estados Unidos, em março de 1929. Descobriu-se, depois, que a obra era uma farsa e a autora passou a ser alvo de muitas críticas decidindo então mudar para o Brasil, instalando-se, sozinha, em Anápolis, onde ficou aguardando a vinda de seu namorado, Lee (sic) Bowen, coincidentemente, como na história de seu livro um capitão de navio mercante. Algum tempo depois, Bowen aposentou-se e veio viver com a amada nas terras goianas “(MENDES, 1995: p. 414). 35 Página eletrônica oficial da Prefeitura do município de Goianésia. 39 A atriz/escritora afirmou no livro que estava cansada da vida que levava nos Estados Unidos, então Joan Lowell teria decidido vir para o Brasil, mas segundo Mendes (1995) ela veio esperar o marido na cidade de Anápolis, e não em uma praia deserta no litoral de Santos como ela afirmou. No livro Joan citou que ela voltou para Nova York para casar com o capitão (s/d), e segundo a matéria de uma revista ela realmente esteve morando em uma espécie de “bangalô” em uma praia da cidade de Santos, mas a própria autora relatou na reportagem que esteve também no Rio de Janeiro. Famed Literary Hoaxer Joan Lowell (Cradle of the Deep) started back to Manhattan after spending 20 months in a jungle hideout 30 miles from Santos, Brazil. When Miss Lowell sailed for Brazil she said she intended to become a Brazilian citizen. She built herself a brick house on a beach clearing backed by jungle, had herself appointed district nurse. One of her accomplishments was installing, as a sanitary measure, cement floors in the thatched-roof huts of the natives. In Rio de Janeiro, Hoaxmistress (sic) Lowell said she ministered so well to the natives they named her "Donna 36 Joan, the Miracle Woman (Time, 06-set-1937, grifo nosso). Cabe ressaltar que o fato de ter ido para o Rio de janeiro Joan Lowell omite completamente no livro “Terra Prometida”. A imprensa norte-americana mesmo após ter passado muito tempo desde a descoberta da farsa de seu primeiro livro não foi tão compreensiva e não perdoou a atriz/escritora, pois sempre se referiam a ela como uma farsante ou mentirosa (cf. supra). Mas mesmo após o escândalo causado pela descoberta de que muitas 36 “Famosa fraudadora literária Joan Lowell (Cradle of the Deep) voltou para Manhattan depois de passar 20 meses em um esconderijo na selva a 30 milhas de Santos, no Brasil. Quando a senhora Lowell partiu para o Brasil, ela disse que pretendia se tornar-se uma cidadã brasileira. Ela construiu uma casa de tijolos em uma clareira na praia ao lado da selva, e se designou enfermeira distrital. Uma de suas realizações foi a instalação, como uma medida sanitária, de pisos de cimento nas cabanas de telhado de palha dos nativos. No Rio de Janeiro, a fraudulenta Lowell disse que atendeu tão bem os nativos que a nomearam de "Dona Joan, a Mulher Milagrosa". (Tradução livre) 40 partes do seu livro autobiográfico “The Cradle of the Deep” eram histórias inverídicas, Joan Lowell não era uma celebridade totalmente esquecida pela mídia, visto que se uma revista de variedade de circulação nacional como a Time publicava freqüentemente matérias inteira ou notas sobre ela, era por que o que acontecia na vida desta atriz/escritora ainda era do interesse de alguém. Este fato torna ainda mais interessante a vinda deste casal para o interior de Goiás. 2.2. O Casal Bowen Chega a Goiás Se Joan Lowell chegou ao Brasil em novembro de 1935, viveu aproximadamente um ano, ou um pouco mais, na cabana da praia, foi e voltou para os Estados Unidos (cuja viagem ela mesmo afirmou durar certa de 15 dias, totalizando um mês para a ida e a volta), e o casal teria passado ainda mais um mês na cabana a beira da praia, sem saber por onde começar seu empreendimento. (LOWELL, s/d). Levando em consideração estas informações podemos perceber que este primeiro período durou cerca de 15 meses, e então ela provavelmente teria chegado ao estado de Goiás no início de 1937. Esta seria uma data aproximada, pois foi baseada nos relatos de Joan, e ainda por não se saber precisamente quanto tempo ela passou nos Estados Unidos. Entretanto segundo a Revista Time (06-set-1937) a atriz/escritora teria passado muito mais de um ano no Brasil antes de voltar para os Estados Unidos, regressando para Manhattan por volta de setembro de 1937. E se considerarmos que ela tenha passado inicialmente 20 meses aqui, como afirmou a revista, somando mais o tempo que ela gastou na ida e na volta para os EUA, e o tempo que ela e o marido ficaram sem saber o que fazer na cabana do litoral paulista, ela teria 41 chegado à cidade de Anápolis entre o final de 1937 e o início de 1938. Esta parece ser a data mais coerente com os próprios relatos da atriz/escritora e com a matéria da revista citada, pois segundo a própria Joan Lowell ela somente regressou para os Estados Unidos, muitos anos depois de sua chegada a Goiás, e na primeira suposição da provável data de sua chegada ao interior do Brasil, ela teria voltado ao seu país de origem após ter vindo para este estado. No estado de Goiás ela passou por Anápolis, que nesta época era o limite das terras cobertas de mata, esta era a cidade mais próspera do estado. Apesar de Goiânia naquela época já ter sido fundada, esta cidade era capital do estado do ponto de vista jurídico, mas não do ponto de vista econômico. Depois de passar por Anápolis Joan Lowell e Leek Bowen foram se estabelecer em Jaraguá, nas terras onde eles iriam construir a estrada. (LOWELL, s/d). Joan Lowell disse em seu livro que chegou “à estaçãozinha de Anápolis, que fica exatamente no centro do Brasil, no vasto planalto da vertente oeste” (s/d: 55). Para a atriz/escritora que vivia em “num apartamento em Nova York com todo conforto material – telefones, lojas comidas entregue em casa, elevador e até mesmo um porteiro, para abrir e fechar portas” (s/d: 13), Anápolis poderia ser descrita assim mesmo no diminutivo, mas um cidadão brasileiro que viajasse pelo Brasil na época e conhecesse bem a realidade nacional talvez descrevesse a cidade de outra forma, um bom exemplo e o relato de Léa Sayão (1976) da sua primeira viagem a Goiás em 1939, em companhia do pai, Bernardo Sayão. Ao visitar Anápolis são estas as suas impressões: “Comércio forte, máquinas agrícolas, enorme movimento de cereais exportador”. Veja que Léa ressalta os aspectos positivos da cidade, sua prosperidade econômica, e Joan vê a estação do trem de 42 ferro, que de tão importante e aguardada pelos habitantes da cidade foi inaugurada com festa, como uma “estaçãozinha”, ela não poderia imaginar o quando aquela estação significou para a economia de Anápolis e para dezenas de outras cidades goianas. Para uma pessoa estrangeira que visitasse a cidade ela poderia até ser considerada atrasada, mas para os padrões brasileiros a cidade era considerada desenvolvida e no estado, como a capital goiana ainda não estava bem estabelecida e Brasília não existia, Anápolis era considerada a cidade mais importante de Goiás. 2.2.1. A Manchester do Cerrado Por suas possibilidades econômicas Anápolis foi um centro atrativo de investimentos, e a acumulação de riquezas advinda das atividades agrícolas e do comércio de foi determinante para a vinda dos trilhos da ferrovia até a cidade. A cidade era nesta época chamada de “Ribeirão Preto goiana” ou de a “Manchester goiana”, numa possível comparação entre o município e as cidades paulista e inglesa, ambas famosas por seu desenvolvimento econômico. À princípio a prosperidade econômica do município se deveu muito a suas características geográficas: “Devido a sua posição de entroncamento, que a coloca como um ponto de contato entre o norte e o sul do país a cidade intensifica a sua atividade comercial, abrindo inúmeras lojas e armazéns que vendiam, gêneros alimentícios, armarinhos, tecidos, calçados, ferragens, agro-industriais e outros.”(SILVA, 1997: p. 32). A produção agrícola impulsionou a economia local, sendo que a cidade de Anápolis chegou a ser a maior produtora de café de todo o estado de Goiás. No 43 município devido à produção destes de café e de arroz se desenvolveram várias empresas para o beneficiamento destes itens (SILVA, 1997). Foi a partir dos anos de 1920 que a economia Anapolina floresceu devido à agricultura e também por causa do comércio urbano que começava a se desenvolver. Outro fator que dinamizou a economia da cidade ainda nesta época foi a construção da estrada de rodagem que ligava Anápolis a estação ferroviária de Roncador (FREITAS, 2007). A agricultura teve papel muito importante para o desenvolvimento econômico de Anápolis, pois foi o primeiro fator de inserção da cidade nos moldes do sistema capitalista. Posteriormente o agronegócio foi sendo paulatinamente substituído pelo comércio, mas vemos que a agricultura desempenhou uma função primordial ao dinamizar o comércio do município (SILVA, 1997). Outro fator que acabou por firmar Anápolis como importante pólo de comercio varejista foi a chegada da ferrovia à cidade no ano de 1935. Mesmo antes da chegada dos trilhos Anápolis já era conhecida pela sua posição estratégica, o município se localizava na rota dos comerciantes e tropeiros goianos e mineiros. A região da antiga Freguesia de Santana começou a se destacar como centro comercial ainda na década de 1920, posição que manteve até meados da década de 1950 (POLONIAL, 2007). Mas o desenvolvimento econômico (quando a compra e venda de mercadorias passou a ser uma das atividades que mais geravam riquezas para o município) exigiu que a ferrovia chegasse até a cidade. Nos anos anteriores à vinda 44 da estrada de ferro, Anápolis já havia passado por várias transformações significativas que a modernizaram. Conforme afirma Polonial: Para receber a estrada de ferro a cidade experimentou mudanças significativas na sua fisionomia urbana, com a reforma de antigos prédios, públicos ou privados, residenciais ou comerciais, além de novas construções (2000: p. 67). A estrada de ferro tinha como principal objetivo a inserção do estado de Goiás na economia nacional, a expansão dos trilhos no território goiano desenvolveu toda a economia do estado através das transações comerciais regionais e interregionais que a ferrovia possibilitava (BORGES, 1990). Mas não podemos negar que a proximidade da vinda da ferrovia propiciou à cidade grande desenvolvimento na área de infraestrutura urbana, como o saneamento básico, reconstrução de casas velhas, melhoria nas ruas e estradas, além da inauguração na cidade de vários estabelecimentos comerciais, como bares, sorveterias, fábricas de gelo, cervejaria e emissoras de rádio. Surge na cidade uma animada “vida noturna”. Nesta época vários imigrantes (como foi o caso do casal Bowen) atraídos pelas potencialidades agrícolas e mercantis do local vieram para a cidade. Surgem também problemas urbanos relacionados ao aumento da criminalidade urbana. Economicamente além de facilitar o transporte de mercadorias e assim dinamizar o comércio, a ferrovia trouxe consigo a valorização das terras do município (POLONIAL, 2000). A partir da chegada da ferrovia a Anápolis, a cidade se torna o maior centro comercial do estado. Cresceu o numero de máquinas de beneficiar arroz, e em 1937 a produção deste produto já havia superado em volume de sacas da produção de café. Em seguida a cidade tornou-se exportadora de arroz (SILVA, 1997). 45 Mesmo tendo existido vários projeto para o prolongamento da ferrovia em Goiás, a estrada de ferro parou em Anápolis (POLONIAL, 1995). Enquanto a cidade era o ponto final de ferrovia aconteceu aqui um fato semelhante ao ocorrido em Roncador anteriormente, e também durante o processo de expansão ferroviária paulista. Para o município se deslocava grande parte da produção agrícola do estado, gerando riquezas e modernidade em todos os níveis da sociedade, por onde a ferrovia passava deixava o seu rastro do novo. O ponto final representava a fronteira econômica, isto é, o limite entre o moderno e o arcaico. A cidade era também a via de acesso para a CANG (Colônia Agrícola Nacional de Goiás) e para todo o Vale do São Patrício. 2.3. Os Pioneiros De acordo com Joan (s/d) ela e seu marido chegam à cidade de Anápolis pouco depois da inauguração da estação da ferrovia. Mas eles não permaneceram na cidade, pois fixaram moradia perto de Jaraguá, distante aproximadamente 90 Km de Anápolis, próximo a região onde foi construída posteriormente a CANG que foi o ponto de partida para a cidade de Ceres. Jaraguá era uma antiga cidade dos tempos da mineração, e segundo Silva (2002) este um município que representava a zona intermediária entre a fronteira econômica, representada por Anápolis, e a fronteira demográfica. A partir daquela cidade se estendia uma “terra de ninguém” (p.19), o sertão goiano. E naquela época já se pensava na expansão das fronteiras para o oeste do Brasil. A concepção do “Eldorado” guiou muitos colonizadores que vieram para o território goiano, e está 46 presente no título do livro de Joan, “Terra Prometida”, uma “compreensão quase mítica da colonização do Oeste” (p. 19). Leek Bowen após uma passada rápida por Jaraguá se deslocou para as glebas onde ele deveria abrir a estrada, e Joan, no seu encalço, também passou pela cidade, onde causou espanto por vestir calças, hábito que ainda não existia no interior de Goiás. Ela fez observações sobre a localidade, destacando que a cidade estava quase abandonada, e tinha casas rústicas com janelas que na falta de vidro estavam cobertas com “folhas de mica”. Nesta cidade ela ficou sabendo notícias do marido, e juntamente com um grupo formado por habitantes locais ela foi ao encontro dele. No caminho ela conheceu algumas das riquezas do sertão goiano, como a ametista, que brotava do chão, e que para os habitantes locais não tinha valor algum; o minério pechblenda, do qual se extrai o urânio; o gengibre do mato, que segundo o seu guia, Filogônio, servia como “restaurador”; o níquel; e as peles de porco do mato que eram exportadas para a Alemanha e Estados Unidos, sendo usadas para fabricar “máscaras contra gás venenoso, num período próximo ao início da Segunda Grande Guerra” (LOWELL, s/d: passim). Se os moradores de Jaraguá estranharam ao ver uma mulher estrangeira e vestindo calça circulando pela cidade, a atriz/escritora demonstrou, em algumas partes do seu livro todo o estranhamento que ela também sentiu em relação aos hábitos, costumes e mentalidade dos moradores locais, alguns costumes eram no mínimo exóticos com relação ao comportamento que ela estava acostumada. Que o viandante se acautele quando um caboclo falar em distância! Com o tempo aprendi a entender a cheguei a catalogar as várias distâncias. Falam em quilômetros e léguas, em vez de milhas, e a classificação é a seguinte. Uma pequena distância é chamada de ‘ao alcance de um grito’; a distancia média é aquela em que se pode ouvir um tiro; uma légua pequena significa quatro milhas; a légua regular quer dizer cinco milhas ou a distancia que um 47 homem pode vencer, caminhando devagar, em uma hora; uma légua grande, mais ou menos oito milhas; e agora, chegamos ao mais interessante... O caboclo espicha o lábio inferior na direção desejada e diz: ‘ali’. ‘Ali’ é tão longe, que elês (sic) não sabem calcular a distância (LOWELL, s/d: p. 63). Outros fatos comuns na dinâmica da vida do interior do país naquela época também chamaram a atenção de Joan Lowell (s/d), e foi o que ela descreveu como o “assassínio assalariado”, ou capanga, que serviam aos fazendeiros “ para liquidar os invasores de suas terras ou para matar membros de família que não quisessem vender, por ninharia, os direitos sobre as próprias terras” (p. 65). O uso da violência, física ou psicológica para se apropriar das terras de pequenos produtores e posseiros, ficou conhecida como grilagem de terras, prática da qual a própria Joan Lowell foi vítima pouco tempo depois. Depois de ter encontrado seu marido, o casal montou o primeiro acampamento, a 24 milhas de Jaraguá, contratando como funcionários os homens que serviram de guias para eles. Eles começaram a abrir a “picada”, como eram chamados os caminhos no meio do sertão, apesar de muitos moradores da localidade não virem com bons olhos a abertura de uma estrada nas redondezas, pois ela iria “trazer a lei” para o local (LOWELL, s/d: p. 65). 2.3.1. As Concepções de Fronteira O Centro Oeste foi uma região de fronteira que se consolidou como área de moderna produção agroindustrial após transformações nos seus meios de produção. A região foi considerada por muito tempo um vazio demográfico cuja vocação seria as atividades agrícolas de subsistência, extrativismo e a mineração 48 rudimentar. A partir da década de 1930 o Centro Oeste se consolidou como região de fronteira agrícola, e o local para onde se deviam dirigir os excedentes populacionais (BUAINAIN, VIEIRA e VIEIRA JUNIOR, s/d). Durante o processo de expansão da fronteira no Brasil, houve a adoção da concepção de fronteira norte americana formulada por Turner, que não se adapta muito bem a análise da realidade brasileira, onde temos os sertões do país como sendo o lugar do encontro do primitivo com o civilizado, e onde haveria a possibilidade de um novo futuro naquelas terras livres (FERNANDES, s/d). A concepção de fronteira de Turner era a concepção de uma região de contorno sinuoso; uma área selvagem que vai sendo desbravada e organizada pelo homem, um local onde se distingue a natureza da cultura, mas que também era uma terra de oportunidades (MIZIARA E SAMPAIO, 2008). Segundo Turner (1921) a fronteira era onde e civilização se encontrava com a barbárie, e este encontro era necessário, pois o desenvolvimento norte-americano devia muito ao avanço da fronteira Thus American development has exhibited not merely advance along a single line, but a return to primitive conditions on a continually advancing frontier line, and a new development for that area. American social development has been continually beginning over again on the frontier. This perennial rebirth, this fluidity of American life, this expansion westward with its new opportunities, its continuous touch with the simplicity of primitive society, furnish the forces dominating American character (TURNER, 1921: 37 s/p). 37 Assim o desenvolvimento americano exibiu não apenas como o avançar em uma única linha, mas um retorno às condições primitivas em uma linha de fronteira que continuamente avançava, um novo desenvolvimento para essa área. O desenvolvimento social norte-americano tem sido continuamente o recomeço na fronteira. Este perene renascimento, esta fluidez da vida americana, esta expansão para o oeste com as suas novas oportunidades, seu permanente contato com a simplicidade da sociedade primitiva, fornecem as forças dominantes do caráter americano (tradução livre). 49 Martins (1997) em uma análise mais coerente com a realidade brasileira estudou a dinâmica de locais considerados como zona de fronteira, e segundo ele este era o lugar do encontro e do desencontro de culturas diferentes, da indefinição e do conflito, onde a violência da sociedade se agravava. A fronteira se caracterizava como o lugar da busca desenfreada por oportunidades, mas ao mesmo tempo era o local da espoliação dos agricultores, que foram paulatinamente expulsos das áreas rurais, quando estes locais passaram a ser incorporadas ao processo capitalista. Longe de ser a terra de oportunidades de Turner, a fronteira é para Martins (1997) o local onde ocorrem disputas de poder, onde precisa haver o degradado para poder existir aquele que domina. Para Silva e Silva (2008) a fronteira é também local da convivência de grupos sociais com tempos históricos distintos. Assim como Joan Lowell e seu marido que vindos de uma grande metrópole, conviviam no interior de Goiás com pessoas que pareciam estar estacionadas no tempo, vivendo como os norteamericanos viviam à séculos atrás. A concepção de fronteira de Martins (1997) se parece muito com a idéia que Amado (1995) faz sobre o sertão, que para ela seria a mais importante categoria espacial usada desde o início da colonização por portugueses para designar uma localização (geralmente no interior do país), e por outro lado seria também é uma categoria que carregada de sentidos depreciativos, era usada para designar “espaços amplos, longínquos, desconhecidos, desabitados ou pouco habitados”, “terras sem fé, lei ou rei” (p. 6). Por outro lado para muitas pessoas significava a esperança de uma vida melhor, e a libertação de uma vida de opressão, e foi a partir desta dualidade que se constituiu a idéia de sertão no Brasil. 50 Vemos no relato de Joan Lowell que ela via naquela região um pouco de cada uma destas concepções citadas (cf. supra), o sertão de Goiás era para ela um lugar de inúmeras potencialidades, mas também era estranho e selvagem. E para piorar ainda mais a situação do casal os contratantes, donos das terras, não mandaram mais dinheiro além da quantia que eles deram inicialmente para Leek Bowen. O fato do dinheiro não chegar pelo correio, preocupava cada vez mais Bowen, pois seus homens mal alimentados trabalhavam sem ânimo algum. Conta Joan que chegaram a quase passar fome, se não fosse pela caça de animais selvagens e pelos alimentos que cresciam nativos pela região. Joan na falta de ter muitas vezes até o que comer, teve que aprender a aproveitar tudo que a natureza oferecia; tentou caçar, mas sem sucesso, conseguiu trazer somente uma arara. Por ainda não saber cozinhar, suas funções eram pequenos serviços, como “bicho medidor”, como a própria atriz/escritora nomeou. “Estenda a trena e fique firme! Meça e marque. Ser ‘bicho medidor’ era, na minha opinião, muito mais interessante do que ser relegada a cozinha do acampamento, pois eu era a única mulher presente e sempre havia a possibilidade de ser mandada para lá.(...) Eu fora (sic) transferida – de Bicho-medidor, passava a Carregadora de Água. Meu serviço era levar uma lata de água, de cinco galões, do riacho até a turma que trabalhava milha adiante. Os nativos podem carregar pesos equilibrados na cabeça, mas até hoje eu não consegui aprender essa arte.Tinha que levar a pesada vasilha no ombro, e , mesmo assim apenas pela metade.(...) Quando eu achava uma coisa pesada demais para mim, mudava de trabalho, valendo-me disso como de um espécie de antídoto”(LOWELL, s/d: p. 75). E quando o dinheiro tinha praticamente acabado o casal passou a viver das doações que recebiam dos habitantes da região que estavam animados com o desenvolvimento que a abertura da estrada possibilitaria. Contudo esta colaboração não era suficiente para sanar todas as dívidas feitas por Leek Bowen e custear o término da estrada, que neste momento mais por honra do que por qualquer outro 51 motivo, foi a razão pela qual o casal não abandonou o projeto. Apesar dos pesares a estrada começou a ser conhecida. Certa manhã se aproximou do acampamento de Joan uma comitiva formada por uma grande família, vindos em carros de boi, com homens mulheres e crianças. A atriz/escritora ficou emocionada pela chegada de colonizadores pela sua estrada, “estrada que era, alternadamente, um pesadelo e um sonho” (LOWELL, s/d: p. 85). 2.4. Como Prender um Homem Sem Ser Útil? Talvez tenha sido durante o convívio com estas pessoas que Joan Lowell tenha sentido mais duramente o quanto o seu mundo, onde ela nasceu e fora criada, era diferente daquele que ela vivia agora. A comitiva que chegou ao seu acampamento era formada por uma família inteira que viera do sul do estado de Minas Gerais, de uma região e souberam da história de um casal americano que estavam abrindo uma estrada e que as terras á beira da estrada podiam ser tomadas posse eu poderiam ser compradas por preços baixos (LOWELL, s/d). O primeiro diálogo entre Joan e o grupo já evidenciou o estranhamento mútuo. Disse o líder dos visitantes ao ver a atriz/escritora vestindo calças, como as usadas no interior do Brasil apenas por homens: “Do lugar de onde eu venho, não queremos saber de mulheres que usem calças”( p.85-86), Joan por sua vez achou que aquele grupo eram muito parecido com os okies americanos38: O grupo lembrava uma litografia americana dos tempos dos pioneiros. As mulheres usavam uma saia comprida, em cima de várias anáguas. No carro, sobre os utensílios domésticos, estavam teares. Havia um primitivo 38 O termo se refere ao imigrante norte-americano do início do século XX, que saia de sua terra natal a procura de trabalho na agricultura. 52 descaroçador de algodão, feito de madeira. Duas das mulheres estavam grávidas, outras carregavam crianças que ainda mamavam. Vi um bando de cães de dúbio pedigree, ofegantes, à sombra dos carros. Uma vaca magra estava tristemente de cabeça caída, o bezerrinho chupando-lhe o úbere quase seco (LOWELL, s/d: p.86). Pés sujos e rachados, crianças com galinhas atadas aos seus pés, supersticiosa dieta composta somente de carne de fêmea para a mãe de recém nascido, Joan Lowell foi apresentada à uma realidade que ela jamais havia conhecido, e se defendia em pensamento: “Pois bem, não é assim que se pensa nos Estados Unidos”. Quando questionada sobre o fato de não ter filhos o episódio foi ainda mais constrangedor, pois uma delas disse: “Tenho pena do seu marido. Quando uma vaca é estéril, o remédio é mata-lá. Todo ser vivo precisa ter utilidade” (LOWELL, s/d: p.88). Joan reparou que somente as calças dos homens tinham botões, as roupas das mulheres eram presas com fitas amarradas. As mulheres eram “prendadas” cozinheiras, e ainda teciam e coloriam o tecido para as roupas dos maridos, e Joan foi então questionada sobre que material usava para colorir o tecido das calças de Leek Bowen, e ela respondeu: “ Não sei tecer. Nunca teci coisa alguma, em minha vida” (p.91). Se sentindo culpada Joan lamentou o fato de ter em um curto espaço de tempo, caído duas vezes no conceito daquelas mulheres, ela ainda tentou amenizar dizendo que ela tinha comprado muitas calças para ele. E que de onde ela vinha as mulheres aprendiam coisas diferentes, “sei guiar automóvel”; “ ler e escrever mais ou menos” (comentário muito modesto para um escritora de best seller); “já fui artista de rádio”; “sei fazer geléia”; de onde ela vinha “ensinam a cuidar do cabelo, da pele, das mãos“ (p. 92-93). Mas a temporada no sertão goiano 53 havia deixado-a em estado tão lastimável que nem o fato de saber cuidar de sua aparência e estar bem cuidada ela pôde contar como vantagem. Nunca eu compreendera a dificuldade em justificar minha existência e utilidade, até tentar fazê-lo aquela noite, no meio de verdadeiras pioneiras que com tanta bondade, procuravam descobrir qualidades que pudessem fazer com que meu marido me prezasse. (...) evidente mente as mulheres esperavam que eu citasse as minhas qualidades. – Sempre ganhei a vida. Ninguém teve que me sustentar. (...) De muitas maneiras. Sempre tive bons empregos e ganhei muito dinheiro. (...)... lá, onde eu nasci, as mulheres têm orgulho de ser independente (LOWELL, s/d: p. 94). E mesmo após todas as suas tentativas de mostrar suas qualidades, a frase que encerrou a conversa q que foi pronunciada por uma das mulheres foi: “Que tristeza!” (p. 94). No entanto Joan não guardou nenhuma mágoa destas pessoas, e no seu livro mesmo ela disse que não havia nada de mesquinho, se tratava apenas de espanto e curiosidade diante do estranho e inusitado, isto foi o que eles puderam sentir com relação à atriz/escritora e a Leek Bowen (LOWELL, s/d). Analisando o seu relato percebemos que ela foi extremamente generosa e modesta ao não se gabar de tudo que já havia feito, e vivido antes de chegar à aquele lugar. Está é uma característica que permeia todo o seu livro, a simpatia que ela mostras ter com o Brasil e para com os habitantes deste país, independente da classe social a que eles pertenciam. Mas talvez Joan sabiamente tenha percebido que aquelas pessoas não valorizavam o fato dela ter sido uma escritora de sucesso, apesar dos pesares; e atriz de cinema; certamente aquelas pessoas jamais compreenderiam Joan Lowell por se tratar de condições de vida materialmente distintas. Era outro estilo de vida cujas glórias efêmeras do mundo do entretenimento não valeriam mais do que a “vaquinha” que traziam para fornecer leite para as crianças da comitiva. 54 Simmel (1983) realizou uma análise sobre a condição do estrangeiro que parece adequar-se muito bem a condição em que se encontrava o casal Bowen no sertão de Goiás no final da década de 1930. Para este autor o estrangeiro é: “(...) por assim dizer, o viajante potencial: embora não tenha partido, ainda não superou completamente a liberdade de ir e vir. Fixou-se em um grupo espacial particular, ou em um grupo cujos limites são semelhantes aos limites espaciais. Mas sua posição no grupo é determinada, essencialmente, pelo fato de não ter pertencido a ele desde o começo, pelo fato de ter introduzido qualidades que não se originaram nem poderiam se originar no próprio grupo” (p.1). Assim é nesta condição de “estrangeiros” que Joan Lowell e Leek Bowen se encontram no primeiro momento em que viveram em Goiás, e foi a partir desta condição que eles foram se adaptando a sociedade goiana. O estrangeiro é um elemento do próprio grupo, mas está fora dele; ao mesmo tempo em que ele está próximo, ele está distante. Nas relações do estrangeiro e nas relações com ele, os mesmo elementos que aumentam a distância e que os separam, também fazem com que se crie uma rede de interação (SIMELL, 1983). O casal Bowen estava naquela região para abrir uma estrada para que se pudessem colonizar as terras daquela região, eram, portanto uma espécie de colonizadores como tantos outros que partilhavam da mesma situação, no entanto eles eram estrangeiros e sobre os hábitos e modos de vida de quem vivia naquele lugar eles pouco sabiam. E então estavam perto e longe ao mesmo tempo daquela realidade. A comitiva dos mineiros ainda permaneceu algum tempo junto com Joan e seu marido, esperando que Bowen abrisse uma picada na mata o suficiente para eles passarem rumo ao oeste. Nos outros dias Joan Lowell conseguiu trocar dois filhotes dos seus cachorros de caça que trouxera de Nova York, por uma vaca; e aprendeu com uma destas mulheres como fazer uma argamassa composta de 55 estrume de vaca, argila e terra de cupim para a construção de sua casa. A idéia que não agradou em nada a Bowen, mas Joan acabou construindo o que ela chamou de Mansão Bowen. A primeira caravana partiu, mas havia chegado outra, que logo foram contratados para ajudar na estrada apesar do casal não ter dinheiro, eles julgavam receber uma grande parcela de terras para as quais estavam abrindo a estrada, e com elas pagariam suas dívidas (LOWELL, s/d: passim). 2.5. A mais Corajosa das Mulheres O capitão Bowen armou acampamento mais adiante para acelerar o feitio da estrada, e Joan passou a ficar sem o marido, somente com a companhia de dois outros homens, durante a semana. Dizia ela não ter medo, pois tinha os seus cachorros e, também por que passava boa parte do seu tempo misturando os ingredientes da tal argamassa e revestindo as paredes de sua casa. Eis que um dia chega acompanhado de Acidino, um de seus funcionários, um garimpeiro montado em um burro, quede tão cansado precisava de ajuda. Depois que Joan o ajudou ele a ofereceu o resultado de seus trabalhos, grandes pedaços de quartzo de ametista violeta, e segundo o garimpeiro, que se chamava João batista: “O cristal dá mais! Vai haver guerra e o seu país vai comprar muito cristal” (LOWELL, s/d: p. 115). Mas como Joan não tinha dinheiro o mineiro aceitou trocar alguns cristais por uns “sete quilos de café”, e ela então mandou cortar alguns velhos pés de café selvagens para colher esta quantidade deste grão. Joan tinha uma mentalidade muito diferente da mentalidade do povo do sertão que retirava da natureza quase tudo que precisava para sobreviver, e cuja simplicidade e não permitiria “Cortar uma 56 coisa viva, para trocá-la por uma que não tem vida, nem sangue, nem sentimento” (LOWELL, s/d: p.116). Novamente Joan Lowell passa por uma situação em que há um choque de mentalidades, a atriz/escritora representava a mentalidade capitalista e João Batista traduzia a maneira de pensar tradicional do homem do sertão. “A senhora pensa errado. Assim como quando me perguntou se eu sabia onde havia ouro e por que não apanhara uma sacola cheia. Só procuro ouro quando preciso de dinheiro para comprar uma picareta ou uma enxada, ou balas. O dinheiro me serve, não sou eu que sirvo o dinheiro” (LOWELL, s/d: p.116). Mesmo assim João Batista manteve a sua palavra e trocou os cristais com a atriz/escritora. Quando seu marido voltou para o acampamento ela contou-lhe sobre os cristais que o mineiro possuía e que queria vender para eles por vinte dólares, e que quando vendidos no armazém de Diony, um comerciante de Jaraguá, renderiam um total de dois mil dólares, dinheiro suficiente pra sanar todas as dívidas do casal e garantir a continuidade da estrada. Eles tentaram alcançar João Batista, mas não conseguiram (LOWELL, s/d). Nesta época a situação do casal e de seus funcionários estava insuportável, e ainda se depararam com uma pedreira no caminho da estrada. Leek Bowen estava muito desanimado e lamentava ter colocado Joan naquela situação. Para piorar ainda mais a situação, um capanga, temendo que a estrada viesse a viabilizar a diligências da polícia em busca de contraventores, começou a sabotar o pedaço da estrada que já tinha sido aberto (LOWELL, s/d). Sem dinheiro, acumulando dívidas com os funcionários e com a estrada sendo sabotada, o casal Bowen vivia seu pior momento. O citado Diony, o dono do armazém de Jaraguá, e outros homens ali reunidos, inclusive um grupo que queria 57 fundar a cidade de Castinópolis nas proximidades daquela região e que esperava apenas que Leek Bowen avançasse mais a estrada para que eles pudessem chegar ao local escolhido com um caminhão, doaram mantimentos e ferramentas para que o casal continuasse a abrir a estrada. Pois segundo Diony “o país precisa somente de estrada para progredir”, e muitas pessoas já depositavam confiança nas possibilidades que a estrada que estes norte-americanos estavam abrindo, e Leek Bowen iria ser conhecido como o “benfeitor do Estado de Goiás” (LOWELL, s/d: passim). A atriz/escritora mencionou sobre um grupo que planejava a fundação de Castinópolis, mas está cidade nunca existiu, então certamente ela falava sobre Castrinópolis, um distrito de Jaraguá que localizava-se na mesma região de Goiás em que ela se encontrava naquela época, mas desde 10 de junho de 1980 a lei estadual n° 8.845 a localidade pertence a cidade de Rialma. O hábito de ajudar os sertanejos fazia com que centenas de famílias que vieram por causa da estrada e se acampavam ao longo dela, depositassem suas expectativas sobre o casal Bowen, segundo Joan eles acreditavam que os dois podiam tudo por serem norte-americanos. Com conhecimento, até considerável para leigos, sobre primeiros socorros e sobre medicamentos, Joan e o marido atendiam os mais variados casos, de inflamações, febre tifóide, e ferimento até partos. Os atos de solidariedade para com o povo do sertão renderam pelo menos uma situação bastante complicada para Leek Bowen e Joan Lowell. 2.6. Quem Conta um Conto Aumenta um Ponto 58 Certo dia o carteiro Adriano chegou ao acampamento do casal, ele não trazia a correspondência do grupo paulista com dinheiro para a continuação da estrada, mas trazia o recado de uma família que tinha em casa três crianças doentes. Leek e Joan mesmo debaixo de chuva foram ao encontro delas, e as encontraram bastante doentes, e o diagnóstico foi de que elas estavam com febre tifóide. Eles então começaram a cuidar delas, a primeira medida foi pedir que as pessoas que estavam na casa, não os moradores, mas vizinhos das redondezas, fossem embora, pois se tratava de uma doença contagiosa. Com os parcos recursos que dispunham trataram as meninas, impondo a elas uma dieta composta somente por alimentos líquidos, o que incomodava os pais que pensavam estarem as crianças morrendo de fome. O casal permaneceu com as crianças por três semanas, e na véspera de natal quando acreditavam que elas já estavam melhores e que eles poderiam ir embora, recomendaram a mãe que mantivesse a dieta líquida. Depois de vários dias de vigília ao lado das meninas, Leek e Joan foram dormir em redes no curral para ir embora logo de madrugada. Infelizmente durante a noite duas das crianças morreram e os pais acusaram o casal de terem matado-as, os dois foram então presos na casa só puderam sair quando foi explicado o motivo da morte (LOWELL, s/d). Esta é uma das poucas histórias contadas por Joan Lowell que encontramos referências em outro livro que não fosse o seu. Segundo o Godinho (2005) foi um médico franzino e recém chegado à Jaraguá, de nome Peixoto de Silveira, que salvou a vida do casal, quando em um dia durante uma noite de chuva foi chamado a uma fazenda a mais de 40 quilômetros da cidade, onde só poderia ir de carro até uma parte da estrada, sendo que o resto deveria ser percorrido à cavalo, o que certamente fez com que o médico demorasse muito tempo para chegar ao local. 59 “Quando chegou, ainda estava escuro, Peixoto de Silveira encontrou um cenário de inferno de Dante em uma família de descendentes de alemães em plena época da Segunda Guerra Mundial. Dois irmãos, sete e 10 anos mortos num quarto, um deles começando a feder. Moscas no lençol. A irmã mais nova, de quatro anos, com paratifo, para a qual não existia medicação eficiente a mão. O médico examinou e também aos cadáveres, que tinham todos os sinais de terem sofrido da doença. Quando pensou que havia visto de tudo de ruim naquela noite tenebrosa foi chamado ao curral. De lá desceu para um paiol onde encontrou presos Joan Lowell, a artista de Hollywood que na cidade todos já tinham abrasileirado para Dona Joana, e o marido. Amarrados, famintos, fracos e cercados por homens armados de carabina. Proibiram Peixoto de se aproximar. Entre Grunhidos e palavrões os homens explicaram que Dona Joana fora chamada há uma semana, ela que sempre carregava uma malinha com remédios e cedia gratuitamente aos fazendeiros da região. A atriz de cinema falava em uma língua estranha, absolutamente não confiável nos rincões de Goiás e veio dos Estados Unidos, que estava em guerra contra a Alemanha, país de onde as crianças mortas descendiam. Peixoto explicou aos familiares irredutíveis que as crianças morreram de paratifo e não por causa da gringa que , por única e exclusiva culpa do destino, nascera nos Estados Unidos. Sabe-se lá que argumentos mais usou, o fato é que salvou a vida de Dona Joana e do marido “(GODINHO, 2005: p. 93). A história ainda não terminaria aí, mas é Joan, no seu livro que nos relatou como acabou este acontecimento. Após ter sido salva pelo médico, atriz/ escritora voltou rápido para seu acampamento, mas não conseguira ser mais rápida que as notícias. Joan conta que quando chegou lá já havia se espalhado a notícia que o casal havia assassinado as crianças por dois motivos: por raiva, pois o pai delas, Henrique, era alemão e eles norte-americanos, e a Alemanha e os EUA estavam e guerra; e também por inveja, pois o casal Bowen não tinha filhos. Joan passou a ficar mais isolada, e temia, pois ouvira dizer que o pai das crianças havia denunciado ela o marido, e sempre que ouvia algum barulho, que agora devido ao trânsito de caminhões na estrada era constante, ela pensava ser as autoridades que viriam atrás dela o do marido. Até que um dia Henrique foi encontrá-la para se desculpar e perguntar a ela onde havia colocado as unhas de tatu que estava na cozinha dele. Joan mal podia acreditar no que ouviu. N noite da morte das meninas, durante a noite o pai, sob orientação de duas feiticeiras havia 60 caçado um tatu e com as garras do animal havia feito um chá e dado às crianças, e ainda confessou que deu à elas, depois de dias de dieta líquida, o que comer. E foi uma comida nada recomendada para pessoas convalescentes: “Carne de porco frita, feijão e arroz” (p.130). Então Joan, no mesmo momento ficou mais convencida ainda de ela não havia sido a causadora da morte das crianças (LOWELL, s/d). Observem que segundo Godinho (2005) os nortes-americanos passaram uma semana com as crianças, segundo Joan (s/d) teriam sido três semanas ao lado das crianças, sem trocar de roupa, certamente sem Leek Bowen para orientar a construção da estrada deveria estar parada. E da morte das meninas até o médico chegar mais quatro dias, muitos dias para se chegar a um local que ficava a apenas 40 quilômetros de onde o médico partiu. Mas seria a melhora destas meninas mais importante que a construção da estrada a ponto de mobilizar a atenção de Joan e do marido, fazendo os desviar do propósito de construir a estrada? O período de chuva talvez estivesse dificultado o trabalho, mas mesmo assim é pouco provável que eles pudessem se ausentar por tantos dias. O relato de Joan parece exagerar no tempo decorrido. Após este incidente a vida continuou no ritmo normal para Joan Lowell e Leek Bowen, com a estrada seguindo em frente e atraindo cada vez mais gente, com as quais Joan aprendia a fazer todo tipo de coisa, de capa de chuva impermeável, à potes de barro. A atriz/escritora estava cada vez mais adaptada a vida no sertão goiano, e se gabava de saber fazer geléia de frutas, devido ao fato de que isto as “pioneiras” não sabiam fazer. A construção da estrada, graças às doações dos habitantes de Jaraguá, estava indo bem, a casa de Joan já era uma realidade e eles também já haviam 61 plantado vários tipos de alimentos, e para completar chegou pelo correio um cheque de São Paulo referente a uma quantia de mil e duzentos dólares. Leek Bowen pagou suas dívidas com Diony e com seus funcionários, os demais ajudantes da estrada, pessoa que haviam vindo por causa das terras, aceitaram receber o pagamento em lotes de terras; Joan disse ter pagado suas dívidas com os filhotes dos seus cachorros de caça, ela ainda alugava o pasto perto de sua casa para caravanas que passavam com animais e que iriam pernoitar por ali. Com o conhecimento aprendido no sertão ela desenvolvera uma espécie de farmácia homeopática em sua casa, composta de todo tipo de ervas e raízes que possuíam valor terapêutico (LOWELL, s/d). O casal estava cada dia mais habituado a vida no interior de Goiás e tudo parecia estar dando certo. O sertão goiano que outrora tinha sido um pesadelo, onde haviam passado todo tipo de dificuldade, até fome e acusação de assassinato, agora era um lugar bucólico, segundo a descrição da própria escritora: Eu passava horas na clareira, admirando os milagres da natureza. No milharal, as fôlhas (sic) balançavam-se, graciosamente. As flores do feijão pareciam salpicos, numa peça desdobrada de organdi. As árvores perto da clareira cantavam, à carícia da brisa, ou gemiam, ao castigo do vento. Uma nuvem dominadora chocou-se com outra e desmanchou-se em chuva, que veio refrescar nossas plantações. O arco-íris apareceu e retirou-se, modestamente. Um veado começou a pular, no meio das flores de feijão, mordiscando uma ou outra. De nossa porta, víamos aquelas maravilhas da Natureza, tais como não existiam nem mesmo na terra da promissão (LOWELL, s/d: p. 140-141). Seria um final feliz para a história de Leek Bowen e Joan Lowell e a sua saga para a construção da estrada no interior do Brasil, assim como nos filmes de Hollywood, mas infelizmente a história toma um rumo inesperado neste momento. Diony, o dono do armazém de Jaraguá procurou o casal para lhes dizer que o cheque que receberam não tinha fundos. O comerciante compreendeu a situação 62 dos dois e não os acusou, Bowen tentou entregar a ele as duas notas de cem dólares que ele levava na bota, um dinheiro que deixava reservado para a passagem de volta aos Estados Unidos caso seus planos dessem errado e eles tivessem que desistir. Diony não aceitou o dinheiro, pois acreditava que o Bowen pagaria a dívida assim que pudesse. A notícia de que a estrada não iria continuar foi dada aos outros funcionários, e Bowen decidiu que iria voltar para o mar, voltar a trabalhar como capitão até juntar o dinheiro para pagar a conta, e enquanto isso Joan esperaria por ele no acampamento para que os credores não pensassem que eles haviam fugido sem pagar as contas. Joan ainda tentou animar o marido dizendo que poderia pagar a dívida com o dinheiro da venda dos cento e vinte mil acres de terras que o grupo que os contratou prometeram dar a eles, mas Leek Bowen sabia que não poderiam contar com estas terras pois se mesmo o dinheiro que enviaram para o custeio da abertura da estrada era um cheque sem fundos, certamente não deveriam acreditar que receberiam sua parte nas terras( LOWELL, s/d). 2.7. No Caminho de Bernardo Sayão Foi neste momento que o casal Bowen conheceu um personagem muito importante para o historia da ocupação do interior do Brasil, Bernardo Sayão, o homem que tornou real a Colônia Agrícola Nacional de Goiás (CANG), que participaria da construção da capital da nação e que daria sua vida, literalmente, para a construção da rodovia que cortaria o país de Brasília à Belém, e que já teria muitas denominações: Transbrasiliana, Rodovia Bernardo Sayão, Rodovia BelémBrasília ou simplesmente BR 153. 63 Bernardo Sayão de Araújo nasceu em 1901 na cidade do Rio de Janeiro, era funcionário público formado como engenheiro agrônomo. No ano de 1939 veio a passeio para Goiás, para conhecer a nova capital, Goiânia, e se maravilhou com tudo que viu, ele afirmou que somente faltava estradas para que a cidade se desenvolvesse. Esta viagem é descrita como uma viagem à passeio, veio ele com a família em seu próprio carro, e após passar por Anápolis, foi para Jaraguá onde “sondando o terreno” ele foi encontrar com Dr. Augusto Rios, que o levou para conhecer os campos e fazendas antigas do tempo dos escravos, e segundo Léa Sayão (1976), e “ lá encontrou o que queria”. A autora não fala o que ele encontrou, mas é provável que Bernardo Sayão já tivesse algum interesse com relação aquela localidade. Certamente o engenheiro estava na verdade em uma viagem de sondagem ao território goiano. De volta ao Rio de Janeiro, obteve em 1941 para ter uma audiência com o presidente Getúlio Vargas, para apresentar-lhe suas idéias já chegou à entrevista com os “seus mapas, minuciosamente assinalados, seus planos, fortemente traçados”. E saiu de lá como o administrador da Colônia Agrícola Nacional de Goiás. Voltando a Anápolis se encontrou com Eduardo Cláudio, Luiz Honório Ferreira, Oliveira Marques e Luiz Caiado de Godoy39 e juntos foram escolher o local da futura colônia. Em Jaraguá, como se tratava de uma missão oficial do governo federal o prefeito Antônio de Castro disponibilizou um carro modelo Ford-29, e a bordo deste veículo eles foram com destino a Castrinópolis (SAYÃO, 1976). 39 Luis Caiado de Godoy era um engenheiro agrônomo (ROCHA, 2007), sendo provavelmente parente de Albatênio Caiado de Godoy que segundo a página eletrônica da Prefeitura de Goianésia possuía registradas deste os anos de 1930 no cartório de Jaraguá, a posse as terras leiloadas da fazenda Calção de Couro. Estas terras ficavam próximas ao local que segundo Léa Sayão (1976) Luis Caiado de Godoy ajudou a escolher junto com Bernardo Sayão para ser fundada a CANG. 64 Esta localidade foi instalada na rota da estrada construída por Leek e Joan. Léa Sayão (1976) comenta que essa estrada, por causa das chuvas, havia se tornado tão precária que fazia o precário trecho Jaraguá-Anápolis, parecer uma rodovia asfaltada. Bernardo Sayão e a comitiva tiveram que seguir a pé depois que o carro estragou, até chegar à casa de Dr. Antônio Carlos de Araújo, onde se hospedaram. O local designado nos planos oficiais para iniciar a colonização do Planalto do Brasil Central seria a oeste de Jaraguá. Joan (s/d) descreve longamente seu encontro com Bernardo Sayão. Este teria ouvido falar de um casal norte-americano que tinha se aventurado a abrir uma estrada no interior de Goiás, rumo às florestas do Vale do São Patrício. O engenheiro chegou à casa dos norte-americanos e se apresentou a Joan e ao marido, e falou sobre sua missão de abrir uma estrada e colonizar terras que seriam dadas gratuitamente a pequenos produtores. Como o casal Bowen já estava indo para o leste do Rio das Almas, Bernardo Sayão explicou a eles que havia percebido, após uma análise feita do alto, a bordo de um avião, que a estrada contruída pelo casal Bowen poderia ser usada para se chegar ao local que havia escolhido para fundar a CANG. Joan afirmou que nem mesmo eles poderiam prever o quão importante era aquele encontro para o futuro daquela região: Mal sabíamos, naquele momento, que estávamos recebendo em nossa casa um homem que ficaria na história como o fundador do “Império do Brasil” central. Nem podíamos imaginar que êle (sic) iria facilitar o transporte, no interior, por estradas e pelo rio, criando aquilo que iria servir 40 ao Brasil, como St. Louis serviu aos Estados Unidos, na marcha para o Oeste. Saião (sic) iria permitir que o misterioso Rio Tocantins, cujos 40 Cidade americana que foi adquirida da França pelos Estados Unidos como parte da compra da Lousiana. O local se transformou mais tarde no ponto de partida dos exploradores do oeste americano, dos garimpeiros e colonizadores e todo tipo de aventureiro que emigraram para o oeste. 65 41 afluentes nascem no famoso Rio da Dúvida, de Teddy Roosevelt , pudesse 42 ser navegado como o Mississípi . Sôbre (sic) os trechos de nossa modesta estrada, feita com picaretas, enxada e facões, um dia passariam frotas de máquinas americanas, tratores e raspadeiras, que fariam de Goiás o centro o celeiro do Brasil – o que tornaria tão importante que seria aprovada uma lei, no sentido de ser mudada a capital da República para o planalto de Goiás (LOWELL, s/d, p.151-152). Além de usar a estrada feita por Leek Bowen, Bernardo Sayão ainda o convidou para ajudá-lo a estabelecer a rota que deveria tomar a estrada que ele iria abrir. Em uma viagem de avião dias depois Leek Bowen mostrou para Bernardo Sayão os limites das terras em que eles estavam abrindo a estrada (LOWELL, s/d). O engenheiro começou a tomar as primeiras providências para a instalação da Colônia, era preciso abrir uma estrada e ele “aproveitou o traçado da estrada existente” (da estrada do casal Bowen). E numa de suas passagens por Anápolis Bernardo Sayão conheceu o Dr. James Fanstone que se tornaria posteriormente o médico da Colônia (SAYÃO, 1976: p.52). 2.7.1. James Fanstone Embora tivesse nascido na cidade de Recife em 1879, o médico e missionário evangélico James Fanstone foi criado na Inglaterra, onde realizou seus estudos em medicina. Casou-se com Ethel Marguerite Peatfield, conhecida como Dona Dayse, e vieram para o Brasil. Enquanto preparava uma tese para ser apresentada na Universidade de Minas Gerais, para poder ter reconhecido seu diploma de bacharel no Brasil, ele visitou Goiás com alguns missionários 41 Theodore Roosevelt foi convidado pelo Marechal Rondon para uma expedição que iria determinar a rota de um curso d'água, conhecido como rio da Dúvida, o rio acabou sendo batizado de rio Roosevelt. Porém a Joan Lowell se enganou em seu comentário, pois o rio Roosevelt é afluente do rio Madeira e não do rio Tocantins, que tem seus afluentes no interior de Goiás. 42 O segundo maior rio dos Estados Unidos. 66 presbiterianos. Ao visitar Anápolis, por volta de 1924, resolveu fundar um nosocômio. Construído depois de algum tempo com recursos próprios, o Hospital Evangélico Goiano foi inaugurado em 1927. Era um prédio de seis andares, equipado com elevador e com aparelho de Raio X. Fanstone participaria ainda em Anápolis da fundação da terceira escola de enfermagem do país, a Florence Nigthingale, em 1934 e do colégio Couto Magalhães, em 1932 (GODINHO, 2005). Na década de 1920 ele se estabeleceu nesta cidade goiana “(...) because it just couldn't go any place but forward”43, e se tornou um personagem lendário da história de Anápolis, mas sua fama se espalhou muito além, por vários lugares do mundo devido ao seu trabalho de atendimento dos moradores da cidade e da região. Fanstone recebeu vários títulos e medalhas nacionais e internacionais (GODINHO, 2005). Além disso, este médico foi uma pessoa muito importante para a história de Leek Bowen e Joan Lowell, e principalmente para Bernardo Sayão. 2.8. A Marcha Para o Oeste e a CANG Após a visita de Bernardo Sayão ao acampamento do casal Bowen, todos se encheram de esperança. A abertura da estrada e a fundação da Colônia acarretariam a valorização da das terras e com o dinheiro de sua venda, Joan e Bowen conseguiriam sanar todas as dívidas e pagar seus funcionários (LOWELL, s/d). No inicio do governo de Getúlio Vargas o clima era de muitas promessas para a solução dos problemas do campo, o governo se mostrava sensível aos 43 “(...) porque simplesmente não podia ir para qualquer lugar, mas a frente.” (TIME, 17-junho-1948, tradução livre). 67 apelos daqueles “que trabalhavam, mas ficavam sem o fruto do seu trabalho”. Aparentemente as medidas tomadas pelo governo Vargas democratizavam e possibilitavam o acesso as terras pelos colonos (LENHARO, 1986). Foi também com a chamada Marcha para o Oeste, do governo de Getúlio Vargas, que a partir dos anos de 1930 começou “a aceleração das atividades econômicas em direção ao marasmo que é o sertão”, buscando a “ eliminação do fosso cultural que ora divide sertão e litoral”. O projeto governamental de desenvolvimento do interior buscava a modificação da mentalidade e dos modos de vida do sertanejo, domesticando a aspereza do território e disciplinando o sertão pelo uso econômico da terra e pela subordinação das pessoas ao governo (SOUSA, 1997, passim). E Joan e Leek Bowen como tantas outras pessoas também passaram a depositar confiança nas melhorias vislumbradas a partir da instalação da CANG em Goiás. Para Borges (2008) durante o governo Vargas o campo representava uma parte vital na vida econômico da nação, e a necessidades de abastecimento do setor industrial e do mercado urbano foi um poderoso incentivo para a diversificação da produção agrária no país. Nesta conjuntura política o governo desenvolveu a “Marcha para o Oeste”, com o intuito de integrar, ocupar e modernizar o oeste brasileiro, equiparando-as com as áreas mais desenvolvidas do país. As colônias agrícolas são, portanto a tentativa oficial de ocupação do território (SILVA, 2002). A política de interiorização do governo federal preconizava a criação de colônias agrícolas nas regiões consideradas mais frágeis do país. No Estado de Goiás foram fundadas a Colônia Agrícola de Goiás (CANG), em 1941 e a Fundação Brasil Central, em 1943 (LISITA, 1996: p.33). 68 Assim, Bernardo Sayão juntamente com sua esposa fixou moradia em Anápolis, no interior de Goiás, e na região do Vale do São Patrício instalou a Colônia Agrícola de Goiás. Os materiais e os maquinários foram mandados pelo Governo Federal, e o administrador orientou a construção do acampamento, nas proximidades do rio Padre de Sousa, a colônia teve como primeiro médico e amigo de Bernardo Sayão, o Dr. James Fanstone.44 Entre Anápolis e Jaraguá Bernardo Sayão começou a construção de uma rodovia com a colaboração da prefeitura das duas cidades, o objetivo era seguir sempre ao norte para se vencer os 142 quilômetros que separavam Anápolis do local onde estava sendo construída a CANG (SAYÃO, 1976). A Colônia Agrícola em 1941 já era uma realidade, e foi lá que Bernardo Sayão construiu sua casa onde morava com a família: sua segunda mulher, as filhas do primeiro casamento e os seus outros filhos. A colônia contava com escolas, um hospital provisório, oficina para reparos e almoxarifado. Cada família tinha direito a uma casa “popular”, ou seja, modesta, e a um lote de terras de 30 hectares para produzir, a produção era do próprio produtor. Um enorme contingente de gente veio de vários lugares do país atraídos pela fama da CANG. Mas apesar da popularidade e do financiamento federal na Colônia Agrícola tudo era construído com muito esforço, pois: A verba era curtíssima para tantos trabalhos e quase sempre chegava atrasada. A Colônia Agrícola torna-se um pequeno povoado. Dr. Fanstone continua dando assistência médica, e papai cada vez mais aumentando os serviços e planos, e a verba não era suficiente. Aos poucos, aparece o pequeno comercio: armazém, farmácia, cinema, sorveteria e armarinhos, etc (SAYÃO, 1976, p. 66). 44 A amizade entre Bernardo Sayão e James Fanstone provavelmente influenciou esse último na escolha do nome que daria a Faculdade de Filosofia Bernardo Sayão, instituição de ensino superior de Anápolis “criada pelo CCM”, o Colégio Couto Magalhães (dirigido durante muitos anos pelo próprio Fanstone) na década de 1960 em Anápolis (ABREU, 1997: p. 119). 69 Segundo Dayrell (1974) a Colônia Agrícola de Goiás tinha uma estrutura muito frágil, a situação dos agricultores era, no geral, precária mesmo com as benfeitorias que ali haviam sido construídas. A CANG foi um exemplo de experiência colonizadora que não funcionou, em grande parte também por que os agricultores não tiveram auxilio adequado, e desconhecendo o trato adequado para o solo, utilizaram técnicas de cultivos impróprias para aquele tipo de terra causando enorme devastação ambiental na região. O município de Ceres, criado a partir da colônia é um dos maiores legados da antiga colônia, pois a colonização da Marcha para o Oeste fracassou enquanto projeto que possibilitasse a democratização do acesso a terra. Entretanto, para o governo ela criou as condições para a ocupação, e conseqüentemente, expansão do sistema capitalista e desenvolvimento econômico no interior do país. 2.8.1. Joan Lowell e Léa Sayão Quando as primeiras construções foram erguidas na colônia, Bernardo Sayão levou sua família de Jaraguá para morar lá. Vieram até suas filhas do primeiro casamento Laís e Léa que moravam no Rio de Janeiro, esta última se tornaria uma grande amiga de Joan Lowell. No entanto, Joan sequer chega a citar o nome de Léa em seu livro, e esta também quando escreveu uma espécie de biografia sobre seu pai escreveu muito pouco sobre a atriz/escritora com quem manteve contato durante vários anos. Outro dado curioso é que Joan apesar de estar morando com seu marido na região onde foi construída a CANG e de afirmar em seu livro que Leek Bowen 70 ajudou Bernardo Sayão no inicio da construção da colônia, ela nada escreveu sobre a CANG, e parte logo para outro assunto deixando a entender que não teria se envolvido com o projeto colonizador orientado por Bernardo Sayão. No entanto no verso da capa da biografia redigida por Léa Sayão, encontramos um texto escrito por Joan Lowell que evidencia no mínimo duas coisas: Léa e Joan ainda tinham algum tipo de contato mesmo depois que ambas se afastaram da região da colônia agrícola, pois a atriz/escritora escreveu uma espécie de apresentação para a biografia sobre Bernardo Sayão, que sua filha lançou anos depois de sua morte; Joan manteve uma relação próxima a família Sayão, pois neste texto Joan descreve cenas da vida cotidiana de Léa da época que ela viveu na Colônia com seu pai com bastante intimidade, deixando entender que ela presenciou algumas destas cenas. Os brinquedos de Léa eram animais os quais ela colecionava freqüentemente, tais como: uma avestruz, um veado, um potro, uma malta de cachorros viralatas(sic) e um tamanduá. A avestruz consumia a escassa ceia, o veado debaixo da mesa escoiceava pedindo mais atenção e o potro crescia como um garanhão acostumado a estragar latas na dispensa em busca de rapadura; os viralatas (sic) produziam cachorrinhos sobre as camas e Léa nunca escondia o seu amor pelos seus mimalhos, não obstante isso enfadar sua irmã e sua simpática madrasta. Enquanto moças da idade de Léa debutavam no Rio, ela estava nas selvas, banhando nas frias águas dos rios das Almas, indo a alguma roça para buscar mamão e algumas vezes uma abóbora, para a refeição da família. Eu me lembro muito bem de Léa (grifo nosso) sentada num toco seco debaixo de uma barraca coberta de capim, ensinando os cansados trabalhadores a ler e a escrever, sob a luz de uma lamparina de querosene. (...) Dezoito anos atrás Bernardo Sayão disse-me: “Se alguma coisa me acontecer, Joana, proteja Léa, ela sentirá muito a minha falta”. Dois anos depois eu vi o brilho dos risonhos olhos de Léa obscurecerem pela brutal morte de seu pai. (...) muitos de nós, que viveram e sofreram ao lado de Sayão (grifo nosso), marcando para o Oeste, poderiam ter escrito este livro, mas deixamos para Léa fazê-lo para a posteridade. Este é um livro que viverá. JOAN LOWELL (LOWELL, 1976 apud SAYÃO, 1976: verso da capa, grifo nosso). Isto mostra que apesar de não ter comentado em seu livro Joan aparentemente deve ter convivido ao menos por algum tempo em companhia da família Sayão quando eles viviam na colônia. Percebe-se também que ela mantinha certa intimidade com a família e que era uma pessoa em que Bernardo Sayão 71 confiava a ponto de recomendar que ela cuidasse de sua filha caso algo ocorresse com ele. No seu livro Léa afirma que Joan era a “velha amiga, ‘Joana’ como papai a chamava” (SAYÃO, 1976: p. 300). O casal Bowen pode também ter somente visitado a colônia: “As vistas que recebíamos eram inúmeras, estrangeiros vinham de longe, escritores ficavam estupefatos com esta região tão rica”. Em outra passagem do livro quando Léa relata que seu pai trouxera do Rio de Janeiro, um comboio de maquinários para a colônia, em uma das paradas ela afirma terem recebido “várias visitas, inclusive amigos americanos, a família Platt, de Chicago, acompanhada do casal Capitão Bowen” (SAYÃO, 1976: passin, grifo nosso). 2.9. “Cobra-Sêca” está chegando! A despeito de todas estas evidencias Joan Lowell não relatou nada em relação a colônia além daquele contato com Bernardo Sayão do qual já falamos. Talvez por que ela e o marido tenham sido vítimas de um golpe de acabou por fazêlos perder a terra que haviam obtido a partir da abertura da estrada. Este golpe que também foi aplicado em muitos pequenos agricultores é uma espécie de antecedente dos conflitos no campo em Goiás, que embora datados a partir dos governos militares de 1964, começaram a serem gerados na década de 1940 devido ao fato da CANG não ter podido absorver todos contingente migratório que para lá se dirigiu, e que não encontrando terras disponíveis na colônia tiveram que procurá-las em outras regiões (MIZIARA E SAMPAIO, 2008). 72 Apesar das dificuldades devido ao atraso no pagamento pelos seus serviços, Joan e seu marido se acostumaram com a vida no acampamento. Joan havia construído a sua casa, possuindo uma plantação destinada ao consumo próprio nos arredores, mas esta felicidade teve curta duração. Certo um dia chega um advogado dando-lhe a noticia de que a as terras que estavam desbravando tinham sido vendidas para uma empresa do Rio de janeiro, que oferecia ao casal Bowen uma quantia irrisória pelas benfeitorias que havia construído. Estes não aceitaram negociar com o advogado, que avisou-lhes que teriam quinze dias para mudar-se dali. Este homem era conhecido como “Cobra-sêca”, um tipo de advogado desonesto que se especializava em grilar terras. Segundo Miziara e Sampaio (2008) o grileiro é o personagem central no processo de transformações das relações sociais no campo, quando houve a passagem da frente de expansão para a frente pioneira. Ele geralmente agia e revelia das regras legais usando todo tipo de violência e falcatruas para expropriar a terra de pequenos proprietários que não queriam vender sua terra, ou posseiros que apesar de trabalharem na terra não tinham a posse legal dela. Nas regiões da chamada “fronteira agrícola”, foram muitos os conflitos, opondo posseiros a grileiros que, com base em títulos por muitas vezes falsificados, procuravam dar novo destino às terras, um destino que excluía a presença dos ocupantes como produtores autônomos. Essas tensões normalmente vieram na esteira da valorização (ou muitas vezes, na perspectiva de valorização) das áreas e da transformação da terra em mercadoria (MEDEIROS, 1989, p. 35). Posseiros e grileiros são personagem muito diferentes, pois enquanto o primeiro usava a terra para trabalhar e tirar o seu sustento dela, os grileiros usavam a terra como reserva de valor. Ele obtinha títulos de propriedade de terras, muitas 73 vezes forjados, e exigiam a retirada do agricultor, e se este não saíssem eles empregavam a força necessária (MIZIARA e SAMPAIO, 2008). O tal Cobra-Sêca usou de uma estratégia criminosa para expulsar o casal Bowen de suas terras: envenenou os animais e posteriormente espalhou o boato de que o acampamento estava sob “mau-olhado”. O casal acabou ficando isolado por que as pessoas tinham medo de que qualquer contato com eles os fizesse ficar com má sorte. Joan Lowell conta que ficou tão atordoada com a notícia e com os acontecimentos posteriores que entrou em um quadro depressivo e teve que ser internada no Hospital Evangélico Goiano em Anápolis, e depois disso nunca mais voltaram para sua casa. 2.10. A Frente de Expansão e a Frente Pioneira Joan Lowell e Leek Bowen poderiam ser considerados um dos pioneiros na colonização do interior do Planalto Central, pelo menos se considerarmos a região do Vale do São Patrício. Entretanto, como demonstramos anteriormente ambos chegam a este local num momento anterior ao desenvolvimento do programa governamental que instituiu a CANG. A autora faz observações sobre a grande imigração que chegava a cada dia pela estrada por eles aberta. Essas pessoas iniciaram o povoamento da região das Matas do São Patrício no final dos anos 30 e início dos anos 40, anterior, inclusive à política da Marcha para o Oeste (Silva, 2002: p. 19). O casal Bowen chega à região do Vale do São Patrício antes mesmo da chegada de Bernardo Sayão, que é tradicionalmente lembrado como o desbravador e pioneiro na colonização daquele território, no entanto: 74 A partir dessas observações pode-se perceber que o processo de ocupação antecede ao discurso da Marcha para o Oeste. A construção da estrada para a fazenda Lavrinhas pelos norte-americanos, a vinda da família do Sr. José Alves Todedo (sic) são experiências de ocupação do espaço que não estariam inseridas na política da Marcha para o Oeste. Todavia essas experiências se enquadram no contexto das chamadas frentes de expansão, ainda aventureiras. A ocupação que se processava nessa região tinha como elemento motivador a construção da ferrovia anapolina, que se apresentava como ponto de partida para a ocupação do Mato Grosso Goiano (SILVA, 2002: p. 21). Para entendermos por que estes norte-americanos não são considerados os pioneiros no desbravamento daquela região temos que recorrer a diferenciação que Martins (1997) fez dos dois momentos da ocupação das terras brasileiras. Estes primeiros indivíduos que vieram explorar o território de Goiás eram em grande parte pequenos agricultores que não possuíam terras e estavam à procura de novas áreas. Era uma frente de expansão, quando a ocupação do espaço se dava ainda sem a mediação do capital, predominando em geral relações nãocapitalistas. Num segundo momento, temos em Goiás o desenvolvimento de relações plenamente capitalistas, que se acentuaram com a chegada da ferrovia, com a política varguista da Marcha para o Oeste e com a construção da Colônia Agrícola de Goiás, e principalmente após a transferência da capital para Goiânia em 1937. Estes fatos fazem parte de um período em que muitos colonos foram expulsos das terras, sendo substituída pela frente pioneira que modernizou a agricultura brasileira em bases capitalistas. Na substituição da frente de expansão pela frente pioneira tem se a passagem da produção de excedentes para a produção de produtos para o mercado consumidor (MARTINS, 1997). A ocupação das terras goianas foi um processo que se realizou de duas formas, pelo apossamento e pela compra, e enquanto a frente de expansão ocorria, a frente pioneira também se efetivava (CHAUL, 1999). 75 No caso do casal Bowen, eles representavam a frente de expansão, pois chegaram para desbravar o território goiano e mesmo tendo vindo contratados por uma empresa, naquela região eles desenvolveram relações não capitalistas com os habitantes locais, mas quando Bernardo Sayão, o representante da frente pioneira, vem para a região tem se o desenvolvimento de uma agricultura voltada para o mercado, a colônia e os seu habitantes eram produtores que produziam não somente para o seu sustento, mas para o mercado externo. 2.11. Em Anápolis Quando ficou doente Joan foi trazida para o hospital dos missionários ingleses. Não tinha terra, nem dinheiro, seus únicos bens eram nove filhotes de cachorro de caça filhos daqueles cães que ela trouxera de Nova York, e que ela esperava vender para conseguir algum dinheiro. E como não tinham nem onde morar Dona Dayse Fanstone e seu marido, o médico James Fanstone, ofereceulhes uma fazenda que a família usava para passar o fim de semana. Para alimentar os cachorros Joan conta que varria as cascas em busca de arroz que as cerealistas da cidade beneficiavam, o casal cuidava da fazenda da família Fanstone para pagar a conta do hospital e a estadia na propriedade deles (LOWELL, s/d). Joan mandou uma carta oferecendo seus cachorros para um fazendeiro milionário que se interessava por cães de caça. Esta relata que o tal fazendeiro chegou sem se identificar, falou somente que se chamava José Martim e vestia-se como um peão. Fez uma boa oferta pelos filhotes e pelos dois cachorros maiores, e disse que buscaria os animais mais tarde. Quando chegou para buscar os cães ao 76 entregar o cheque o casal Bowen percebeu que o nome do comprador não era José Martim como havia dito, pois o cheque estava assinado em nome de Quincas Borges, um fazendeiro milionário que lidava com gado perto de Anápolis. Joan acrescenta ainda que empresário pagou a ela mais dinheiro que o combinado pelos cachorros e ainda ofereceu um touro Zebu puro sangue para o casal (LOWELL, s/d). A autora falava neste trecho de um grande fazendeiro que criava gado numa fazenda no interior de Goiás. Foram alguns membros da família Borges que em meados do século XX viajaram para a Índia para comprar outras raças gado, e trouxeram novas raças zebuínas para o Brasil, inclusive o gado da raça Gir.45 Apesar do casal Bowen não estar mais nas proximidades da colônia, Bernardo Sayão nunca deixou de visitá-los, foi ele inclusive quem lhes trouxe a notícia de que a empresa do Rio de Janeiro que havia comprado as terras onde o casal Bowen tinham vivido queria dar uma compensação pela estrada que abriram. Ele trouxe também um mapa para que o casal Bowen escolhesse o local da sua gleba de terras, mas no dia em que eles foram assinar os papeis no cartório de Jaraguá descobriram que tinham que pagar o equivalente mais de dois mil dólares de impostos para poderem registrar as terras em seus nomes, e como não possuíam está quantia acabaram voltando para casa sem a posse das terras. Joan resolveu então apelar para o governador-interventor do estado de Goiás Pedro Ludovico Teixeira46. Joan foi de carona à capital, e ao chegar na sede do governo, o Palácio das Esmeraldas diz que não teve problema algum para ser recebida em audiência pelo governador, que afirmou inclusive que tinha ouvido falar sobre o casal Bowen e 45 Jornal Opção On Line, Goiânia, 07 a 10-Jun-2004. Pedro Ludovico Teixeira foi interventor federal no estado de 1930 a 1933, e governador de 1935 a 1937, novamente interventor durante o Estado Novo (1937-1945), e governador eleito de 1951 a 1955. 46 77 que possuía um dossiê sobre eles. Pedro Ludovico isentou-os do imposto de transferência por meio de decreto, e assim o casal finalmente pode tomar posse da fazenda que era seu grande sonho (LOWELL, s/d). 78 CAPÍTULO 3. THE END? O final de seu livro descreve como ficou a situação da atriz/escritora e seu marido após a posse da fazenda. Dizia ela ter uma casa confortável com piscina, e produzir café na sua propriedade, e ainda deixou claro que Leek Bowen não se acostumou com aquela vida pacata e planejava ir em busca de novos rincões em outras regiões do Brasil (LOWELL, s/d) . No entanto a história do casal Bowen em Goiás não está no fim, foi neste momento que começou uma nova fase em suas vidas, agora em Anápolis a partir da década de 1940. Nesta cidade onde viveram por muitos anos, Joan destacou-se na sociedade, ela somente deixou este município quando começaram a construção de Brasília quando foi morar na região da capital federal, onde viveu outras aventuras, mas esta é uma outra fase da história desta pioneira. Joan após sair da região do Vale do São Patrício afirma que nunca mais voltou para a aquele acampamento, a fazenda que segundo ela a tornaria “a rainha da mais bela fazenda de café, do Estado” era em Anápolis, produzia café, e foi batizada com o nome de Ancoradouro, ou Anchorage47, sinônimos em inglês e português para denominar lugar onde os navios ancoram (palavra que remetia a certo passado ligado ao mar e a navios comum a Joan e ao marido). A atriz/escritora era figura conhecida na cidade pelo nome de Dona Joana e fazia parte da sociedade Anapolina. Em sua casa recebeu certa vez o embaixador norte-americano que 47 No seu livro o nome da fazenda aparece grafado como Ancoradouro, mas em um documento da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal registra a denominação em inglês Anchorage. 79 visitava a cidade48. Causava espanto entre os moradores ao dirigir seu jipe pelas ruas da cidade, armada e vestida de calça Jeans,49 hábito nada comum para as mulheres do interior do país. Apesar de ser considerada uma cidade moderna a Anápolis nas décadas de 1940 e 1950 era uma localidade provinciana, imperando um resoluto machismo patriarcal, próprio de uma região cujo código de conduta ainda se guiava pela lógica da rusticidade e da valentia. Ainda na década de 1970, um jornal anapolino publicou uma matéria com o seguinte título: “Igualdade dos Sexos, Triste balela da Utopia Marxista”, na qual o autor criticava a política de igualdade dos sexos empreendida na Rússia que segundo o mesmo “obrigava” a mulher a trabalhar fora do lar nas mesmas atividades que os homens, o que causava prejuízo para a saúde da própria mulher e para a educação dos filhos, e um profundo um desequilíbrio social.50 Desde que chegou a Anápolis Joan carregava consigo uma arma de fogo (da marca Smith and Wilson), trazida dos EUA. Quando da abertura da estrada rumo a oeste do estado partindo da região de Jaraguá portava esta arma, mas aparentemente a atriz/escritora nunca a usou, exceto quando saia à caça de animais, hábito que felizmente, como a própria afirmou, não levou a adiante (LOWELL, s/d). Quando Joan veio morar em Anápolis, a cidade que quando ela chegou era o município mais moderno do estado, continuava a ser uma cidade muito importante. Tanto que uma reportagem do da revista norte-americana Time descreve assim a cidade: 48 Jornal O Anápolis, Anápolis, 24-junho-1945: p.01. Segundo depoimento de Armando Bulcão, cineasta que está produzindo um filme sobre as celebridades de Hollywood que viveram no interior de Goiás, em entrevista ao jornal Contexto (Anápolis, 22 a 28-jun-2005, p.07). 50 Jornal Folha de Anápolis, Anápolis, 13-dezembro-1971, p. 04. 49 80 It takes four days & nights by rail to reach Annapolis, gateway to the rich backlands, and longer if the trip is made by road. But from the lush lowlands of the north and the coffee fazendas to the south, 50,000 Brazilians a year are passing through muddy, roughhewn Anapolis in search of new homes and new times, just as U.S. pioneers a century ago left the Atlantic coast and headed west. Many who come to Anapolis are on their way to the new Government Colonia Agricola Nacional and its embryonic town of Ceres. The Colonia, one of seven set up by Dictator Vargas in 1941, and the most successful, is an experiment in agrarian socialism. To poor men it holds out 51 the promise of free land, home, security (Time, 07-abril-1947). Durante o desbravamento das terras do Planalto Central, Anápolis era a referência, a fronteira econômica. Uma cidade contrastante na década de 1940, onde salas de cinemas, bandas de jazz, vôos internacionais diários e um vigoroso comércio conviviam com todos os problemas urbanos e a precariedade de uma cidade do interior do Brasil na primeira metade do século XXI. Parece muito contrastante que estas realidades pudessem conviver tão próximas, mas era na relação entre o moderno e o arcaico, entre o tradicional e o inovador que consistia singularidade da essência urbana e social da cidade. A cidade de ruas de terra era escala de vôos diários internacionais para Chicago52 ou para Miami nos EUA; passando por Port of Spain, capital de Trinidad e Tobago; e por Trujillo no Peru; além de vôos para cidades brasileiras como Belém, Rio de Janeiro, Poços de Caldas, Porto Alegre e São Paulo, com viagem realizadas em “ aviões Douglas confortáveis, rápidos e seguros”.53 Mas na década de 1950 a situação de Anápolis devido ao aumento populacional e a expansão urbana, 51 Demora quatro dias e noites de comboio para chegar a Anápolis, porta de entrada para o rico sertão, ou mais, se a viagem for feita por via rodoviária. Mas, desde as planícies verdejantes do norte e das fazendas de café do sul, 50.000 brasileiros por ano, estão passando pela lamacenta e grosseira Anápolis em busca de novas casas e novos tempos, como os pioneiros norte americanos um século atrás deixaram a costa atlântica para ir para o oeste. Muitos que vêm para Anápolis estão a caminho da nova Colônia Agrícola Nacional do Governo, e sua embrionária cidade de Ceres. A Colônia, um das sete criadas pelo ditador Getúlio Vargas em 1941, é a mais bem-sucedida de um experimento de socialismo agrário. Para os homens pobres que acreditam na promessa de terra livre, casa e segurança (tradução livre). 52 Jornal O Anápolis, Anápolis, p.03, 14-set-1950. 53 Jornal O Anápolis, Anápolis, p.03, 6-jan-1946. 81 apresentava muitos problemas infraestruturais. Mesmo já contando com uma rede de abastecimento de água e recolhimento de esgoto, e com rede de distribuição de energia elétrica estes serviços funcionavam precariamente, as vias publicas serviam de caminho para as pessoas, veículos automotores e animais, em especial o gado rumo ao matadouro municipal. O município carecia de obras que o adequassem aos novos tempos (FREITAS, 2007). Mesmo com tantos problemas segundo alguns cinegrafistas que estavam fazendo um vasto documentário das riquezas de Goiás na década da de 1950, a cidade “é, como dizem, para onde se afluem todas as atenções do Brasil e do estrangeiro”, e o jornal completa falando sobre o clima que “é como já afirmaram muitos, inclusive uma ex-estrela do cinema americano, o melhor do mundo” (grifo do nosso), e ainda vaticinaram as perspectivas do “centro cosmopolita de extraordinário futuro”.54 3.1. Hollywood vem para o Cerrado Após serem expulsos das terras da fazenda Lavrinhas Joan e seu marido não voltam para aquela região, passando a viver próximo ao município de Anápolis, na sua fazenda Anchorage. Joan logo se adaptou aquela nova vida. Recebia diversas personalidades importantes em sua propriedade, como a do embaixador dos EUA, astros de Hollywood e do show business norte-americano, autoridades brasileiras, mantendo intenso contato também com cidadãos norte-americanos radicados em Anápolis. 54 Jornal O Anápolis, Anápolis, p. 01, 2-mar-1954. 82 Em 1952 lança simultaneamente nos Estados Unidos e no Brasil seu livro sobre as aventuras no interior de Goiás, “Promisse Land” ou “Terra Prometida”. Na sua volta para os Estados Unidos, Joan percebeu a boa receptividade do livro. Joan Crawford, uma importante atriz de cinema estadunidense chegou a comprar os direitos de filmagem do livro (projeto que não foi adiante). A despeito disto, a ao mencionar a obra a imprensa ainda lembrava-se do passado nada recomendável da autora: “Promisse Land, by Joan Lowell: Author of the fabulous fib “The Cradle of the Deep” tells how she and a tired-of-it-all freighter skipper are farming 120.000 acres in Brasil”.55 Sua história fez tanto sucesso nos Estados Unidos que atraiu a atenção de outras personalidades norte-americanas que como elas estavam cansadas do ritmo frenético da vida de celebridade. Por sua influência veio para Anápolis a atriz Janet Gaynor, que por sua vez acabou por atrair a vinda de outra atriz e também cantora, Mary Martin, que até dedicou um capítulo de sua biografia para relatar como era a sua vida e de seu marido na cidade de Anápolis. Janet Gaynor (Laura Augusta Gaynor) era atriz de cinema, nascida em 1906 na Filadélfia, cidade norte-americana do estado da Pensilvânia. Foi a primeira mulher a ganhar um Oscar, categoria de melhor atriz. A cerimônia de entrega do prêmio oferecido pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood oferecido a Janet Gaynor foi realizada em 1928, e a laureou por dois filmes realizados no ano anterior: “Aurora (Sunrise - A Song of Two Humans)” do diretor alemão F.W Murnau, e “Sétimo Céu (Seventh Heaven)”, de Frank Borzage. Esta atriz talentosa transitou muito bem do cinema mudo ao falado. Porém no final da 55 “Terra Prometida” de Joan Lowell: A autora da fabulosa mentira “The Cradle of the Deep” fala como ela e um capitão de navio cansado de tudo, estão cultivando 120.000 hectares no Brasil”. In: Jornal Toledo Blade, Toledo, 29-jun-1952, p.5 (tradução livre). 83 década de 1930 casou-se com o estilista Gilbert Adrian, vindo alguns anos depois a anunciar sua precoce aposentadoria (LOPEZ, 2006). Janet Gaynor atuou no cinema norte-americano no momento em que ele se consolidava mundialmente. Após a Primeira Guerra com a Europa enfraquecida a indústria cinematográfica americana floresceu afirmando a supremacia dos filmes de Hollywood no cinema mundial. A partir de 1920 sua produção baseou-se em dois fatores, o studio system e o star-system. O studio system foi um método de racionalizar e integrar todos os setores da indústria cinematográfica com o objetivo de potencializar os lucros. E o star-system, também conhecido como estrelismo, era a criação das conhecidas “estrelas do cinema”, atores que quase sempre representavam o mesmo tipo de papel, se este tipo de personagem tivesse agradado o público. (BETTON, 1984). Foi este sistema que criou “estrelas” como Mary Martin e Janet Gaynor, e também possibilitou a ascensão de outras pessoas envolvidas no processo de criação cinematográfica ao “estrelato”, como Gilbert Adrian, o criador dos figurinos do musical “O Mágico de Oz” (1939), e de outros filmes hollywoodianos famosos. Gilbert Adrian, cujo nome no registro de nascimento era Adrian Adolph Greenberg, nasceu em 3 de março de 1903 na cidade de Naugatuck, estado de Connecticut. Estudou moda em Paris, e de volta a América trabalhou em Nova York, na fantástica indústria teatral da Broadway, até que a esposa de Rodolfo Valentino56, Natacha Rambova o levou para a Hollywood para desenhar as roupas de seu marido. Em Los Angeles Adrian tornou-se um estilista consagrado considerado por 56 Um famoso ator italiano radicado nos Estados Unidos. Além de ser uma das estrelas mais populares dos anos 20 (e do cinema mudo conseqüentemente), foi o primeiro símbolo sexual do cinema e protótipo do "amante latino" fabricado por Hollywood de cinema estadunidense da década de 1920. 84 muitas pessoas o mais influente estilista norte-americano dos anos de 1940, pois vestiu atrizes como Greta Garbo, Loretta Young, Joan Crawford, Norma Shearer, Greer Garson, Katharine Hepburn, Rosalind Russell, Claudette Colbert, e é claro sua mulher, Janet Gaynor. Além disso ele teve seu próprio ateliê de alta costura. Adrian reigned for 20 years during a time when Hollywood was a storybook of fantasy, illusion and extravagance. In those days, top box office stars were extraordinary valuable properties. No expense was spared to enhance the magic of their images. His brilliant designs often transformed leadings ladies into star of incomparable magnitude. In the process, he creates an aura of fashion splendor previously unknown for an American designer (The 57 Sposkesman, 12-nov-1983: p. 14) Depois de abandonar a carreira de atriz Janet Gaynor se dedicou a família, e se sentia muito bem sendo somente esposa de um famoso estilista do cinema (PARSONS, 1951) 58 . Mas toda esta felicidade foi interrompida quando Adrian foi diagnosticado com um sério problema cardíaco de origem nervosa. Ele então resolveu se aposentar em 1952, justamente no mesmo ano em que Joan Lowell promovia seu novo livro, “Terra Prometida” nos Estados Unidos. Joan Lowell não influenciou a vinda do casal Adrian para o Brasil, mas foi por sua influência que o casal veio para Goiás, pois segundo Mary Martim (1976) Janet e Adrian de passagem pelo país teriam gostado muito e resolveram se estabelecer ali. Estavam na cidade de São Paulo quando alguém teria indicado que viessem para o interior de Goiás e procurassem uma conterrânea que por causa do seu pioneirismo na região e também por sua personalidade extravagante era uma espécie de celebridade regional. Se até em São Paulo já se podiam dar notícias 57 Adrian reinou por 20 anos durante uma época em que Hollywood era um livro de histórias de fantasia, ilusão e extravagância. Naqueles dias, as estrelas superiores foram extraordinárias propriedades valiosas. Nenhuma despesa foi poupada para aumentar a magia de suas imagens. Seus desenhos brilhantes muitas vezes transformavam mulheres em estrelas de grandeza incomparável. Neste processo, ele criou uma aura de esplendor da forma até então desconhecida por um designer norte americano (tradução livre). 58 Jornal The Milwaukee Sentinel, Milwaukee, p. 46, 25-mar-1951. 85 sobre Joan Lowell certamente era porque ela estava de fato se destacando na sociedade goiana. A versão de Mary Martin (1976) para explicar as circunstâncias da vinda de Janet e Adrian para o Brasil estariam relacionadas à participação em um suposto Festival de Cinema realizado no Rio de Janeiro. Mas não se tem notícia da realização de um festival de cinema no Brasil até a realização em 1954, na cidade de São Paulo do 1° Festival Internacional de Cinema do Brasil (BRESSERPEREIRA, 2004). Freitas (2008) confirma que o casal veio para o Brasil para um festival de cinema em São Paulo neste mesmo ano. Outro fato que parece confirmar esta última colocação é dada pela própria Mary Martin em uma visita feita a Janet Gaynor em Anápolis, em 1955, quando observou que Gaynor ainda não havia desembalado toda a sua mudança, e se o casal chegou em 1954 e tiveram que construir sua casa, e trazer sua mudança dos Estados Unidos, é provável que num período em torno de um ano a casa deles ainda não estivessem totalmente organizada. 3. 2. Joan Lowell e os Conflitos de Terras A fama de Joan Lowell havia se espalhado e muitos norte-americanos tiveram que recorrer a ela quando se quisessem comprar terras no interior do Brasil. Com Janet Gaynor e Gilbert Adrian e depois com Mary Martin e Richard Halliday não foi diferente, mas outros atores também confiaram a Joan Lowell dinheiro e procurações para a intermediação da compra de terras, no entanto atriz/escritora não realizou as negociações. Mary Martin (1976) relatou que ao encontrar Cary 86 Grant, outro famoso ator Hollywoodiano, ela teria perguntado sobre sua propriedade no Brasil e a resposta foi de que ele jamais tinha ouvido falar das terras desde que havia mandado o dinheiro para comprá-las. Segundo Mary Martin (1976) Joan Lowell ainda teria vendido terras para outras celebridades como Claudette Colbert ganhadora do Oscar de melhor atriz por “Aconteceu Naquela noite” (1938). Joan Lowell acabou se envolvendo em grandes confusões por causa disso; inclusive Martin (1976) conta que Lowell teria pedido para ser presa, pois estava com medo de retaliação por causas seus atos. Ela provavelmente não vendeu terras somente a seus colegas norte-americanos, pois estes não viriam a Anápolis apenas para reclamar este dinheiro, afinal não compensaria deslocar-se de tão longe para recuperar este investimento. Em “Terra Prometida” a atriz/escritora relata apenas que acabou se endividando ao negociar partes do lote de terra que ela acreditava receber como pagamento pelos seus serviços. Mas no período em que Joan afirma ter ficado nestas terras, que foi entre 1937 e 1945, ela certamente não conseguiria vender terras a nenhum norte americano, pois segundo seu próprio relato ela estava acampada no meio do mato, praticamente isolada, e não tinha nenhum veículo de transporte, muito menos meio de comunicação. É pouco possível então que ela tenha conseguido negociar por carta ou por meio de chamadas telefônicas as terras do interior do Brasil. É mais coerente acreditar que durante sua visita aos Estados Unidos em 1952 para lançar seu livro sobre o Brasil, ela tenha influenciado muitos dos seus compatriotas a adquirir propriedades no interior do Brasil, e que tenha ela mesmo se responsabilizado de comprá-las para eles. 87 Uma nota do jornal O Globo (2007) afirma que o juiz da comarca de Anápolis havia autorizado a prisão de Joan Lowell, mas não foi por causa de irregularidades na vendas de terras, e sim pela emissão de cheques sem fundo. A reportagem seria a republicação de uma matéria que originalmente o próprio jornal publicara cinqüenta anos atrás, portanto em 1957. Esta é uma data muito distante do período em que Lowell viveu acampada nas terras da fazenda Lavrinhas, que foi durante o final da década de 1930 e inicio de 1940, então os conflitos que teriam levado a sua prisão dificilmente teriam origem a tantos anos atrás. Isto evidencia que mesmo após sua saída das terras que ela e o marido estavam desbravando, teria continuado envolvida com a venda de terras e continuou também se endividando e emitindo cheques sem fundos, e este hábito perdurou até a década de 1950, pois é neste período que chegam à cidade de Anápolis as outras atrizes norte-americanas que também teriam enviado a Joan Lowell a procuração e o dinheiro pra a aquisição das propriedades rurais. Mary Martin e seu marido foram uma das pessoas que Joan Lowell enganou. Esta atriz e cantora nasceu em 11 de dezembro de 1913 em Weatherford, no Texas. Casou-se primeiramente com Benjamin Hagman, pai de seu primeiro filho, Larry Hagman, que como a mãe também se tornou ator. Com seu segundo marido Richard Halliday, um produtor de cinema que foi diretor dos estúdios cinematográficos Paramount, uma das indústrias do cinema norte-americano e com ele teve uma filha, Heller Halliday. Mary Martin fez cinema, mas era principalmente, atriz de musicais e costumava passar longas temporadas apresentando espetáculos como: “The South Pacific”, “My Heart belong to Daddy” e “Peter Pan”, este último obteve tanto sucesso que foi produzida uma versão para ser apresentada na televisão. No final da temporada desta peça teatral, em 1955, que ela, o marido e 88 filha partiram para uma viagem de descanso num navio rumo a Grécia (MARTIN, 1976). Mas sua bagagem por engano não foi embarcada no mesmo navio, e para recuperá-la a atriz e sua família tiveram que mudar um pouco a rota de seu passeio passando por vários portos. Quando chegou ao Porto de Santos, ela recebeu uma carta do casal Janet Gaynor e Gilbert Adrian que já estavam residindo no Brasil. A mãe de Janet tinha visto em uma coluna social que Mary Martin e sua família passariam pelo Brasil, e enviou para a filha a notícia. Janet então escreveu uma carta e confiou a uma americana chamada Janet Homer missão de entregá-la. Por vários dias esta se dirigiu ao porto para esperar pelo casal Hagman, até que um dia conseguiu entregar a correspondência que os convidava para irem conhecer sua casa no interior do Brasil. Mary Martin e Richard Halliday aceitaram o convite e vieram para Anápolis. Quando chegaram aqui eles se encantaram com a maravilhosa casa que Janet e Adrian haviam construído e com as belezas naturais do lugar. Richard Halliday manifestou o desejo de comprar uma gleba de terra que ficava próxima a casa de Janet Gaynor, e avisou que se soubessem que ela estaria a venda era para avisá-lo (MARTIN, 2006) Joan Lowell foi a intermediadora da negociação, e após Mary Martin e Richard Halliday mandarem o dinheiro e a procuração, receberam de volta os documentos das compras das terras, todos devidamente carimbados e aparentando serem legais. O casal foi então conhecer seu pedaço de terra no Brasil. O local escolhido por Richard era alto e de lá podia se ter uma vista muito bonita. Certo dia o casal foi para suas terras para planejar as futuras construções, estavam passeando quando escutaram rajadas de balas. Os tiros foram dados pelo 89 verdadeiro dono das terras que deu somente o aviso para que não adentrassem mais em sua propriedade. Joan inventou para Mary Martin e Richard Halliday diversas histórias, a cada dia ela aparecia com uma história diferente. Até que o casal Halliday percebeu que haviam sido enganados, à eles não pertenciam terra alguma no Brasil. Mary Martin afirmou que foi neste momento que reconheceu naquela senhora conhecida como Dona Joanna, a Joan Lowell do escândalo literário do final da década de 1920 (MARTIN, 1976). Joan Lowell ofereceu ao casal Halliday um cheque de um banco de Anápolis como pagamente pelo dinheiro enviado para a compra das terras, mas quando tentou descontá-lo souberam que o mesmo não tinha fundo. Todos ficaram muito chateados, Gilbert Adrian que já tinha a saúde abalada, contraiu leve febre, os habitantes da cidade também se solidarizaram com a situação do casal, segundo Mary Martin eles ficaram envergonhados. O sonho tropical de Richard Halliday e Mary Martin quase acabou neste momento, pois apesar de Joan possuir bens na cidade levariam-se anos para que eles pudessem recuperar seu dinheiro. Eis que entra em cena Gibran El-Hadj, um comerciante descendente de uma das inúmeras famílias árabes que se fixaram em Anápolis. Ele ajudou o casal Halliday a comprar sua fazenda na região de Anápolis emprestando o dinheiro, e assim tornou-se grande amigo e, posteriormente, representante do casal no Brasil (MARTIN, 1976). Apesar de ter colocado-a nesta situação constrangedora, Mary Martin disse em seu livro que não guardou rancor de Joan Lowell. E assim começou a historia de amor verdadeiro entre o casal Halliday e Anápolis. A atriz descreve o lugar com tanto carinho que fica evidente o quanto ela e o marido gostavam daqui, e mesmo após Janet Gaynor e Gilbert Adrian voltarem para os estados Unidos em 1957, 90 permaneceu aqui até que seu Richard Halliday veio a falecer, então como não tinha família na cidade ficou inviável para a ela viver sozinha em um local que evocava tantas lembranças (MENDES, 1995). Toda história que envolve o casal Halliday e a suposta compra da fazenda e os acontecimento que se desenrolaram após a descoberta da fraude cometida por Joan Lowell aconteceram em pouco tempo, pois se em 1955 ela veio a passeio para o interior de Goiás, em 1956 ela já possuía casa na cidade como afirmou uma reportagem de um jornal local que dissertava sobre as qualidades do município. Celebridades do mundo artístico internacional como, Gilbert Adrian, Janet Gaynor, Richard Halliday e Mary Martin fixam residência em Anápolis. (...) estrangeiros de todas as partes aportam quase que diariamente nesta cidade. Nas ruas de Anápolis, texanos são vistos freqüentemente em suas vestimentas características: Botas de salto alto, calças “far west”, camisas espalhafatosas, e chapéus típicos daquele Estado do Tio Sam (O ANÁPOLIS, 07-dez-1956: p 01). Em 1956 viviam na cidade as três atrizes e seus maridos, Mary Martin tinha sua filha, Heller Halliday com 15 anos de idade, e Robbin Gaynor, era o filho do casal Gaynor e Adrian e tinha 16 anos, mas os filhos continuaram estudando nos Estados Unidos. O filho mais velho de Mary Martin, de seu primeiro casamento, Larry Hagman, em sua biografia afirmou que visitava ocasionalmente a mãe em sua fazenda brasileira, mas que preferia ficar morando em sua casa nos Estados Unidos (HAGMAN, 2001). Janet e Adrian que haviam se aposentado moravam quase todo tempo59 na cidade, mas Mary Martin e Richard Halliday conciliavam os períodos na cidade com as temporadas de trabalho nos EUA. Mendes (1995) afirma que certa vez encontrou 59 Quase todo o tempo, pois algumas notas do jornal o Globo (2007) falam sobre a passagem do casal na cidade quando estavam vindo dos Estados Unidos rumo a Anápolis. 91 Mary Martin no aeroporto de Brasília e observou que andando mancando, fato que a própria atriz atribuía a longa temporada na fazenda, onde ela usava botas ao invés de sandálias, algo que deixou-a desacostumada ao uso de sapato de salto alto. A vida simples do interior o clima e as belezas naturais do Brasil encantavam estas pessoas acostumadas com temperaturas não tão amenas. Janet Gaynor numa vida pacata se dedicava a jardinagem, e sua casa possuía uma aparência tão rebuscada (diziam ter a arquitetura mourisca, estilo relacionado aos mulçumanos do norte da África e da Península Ibérica), que ficou conhecida na cidade como Palácio da Branca de Neve, a princesa do desenho animado dos estúdios Disney. Richard Halliday por sua vez plantou 300 pés de rosas para Mary Martin, e presenteou a esposa com uma ponte em estilo japonês que foi colocada em um lago da propriedade do casal (MARTIN, 1976). Estes norte-americanos tentavam transferir um pouco do conforto e do glamour dos locais onde viviam nos EUA, para as suas fazendas em Anápolis, criando nas suas propriedades ambientes extravagantes para os padrões locais. Segundo Martin (1976) no ano de 1957, Janet Gaynor e Gilbert Adrian voltaram definitivamente embora para o seu país natal, e retomaram suas carreiras, mas em setembro 1959 o estilista sofreu um derrame vindo a falecer nos Estados Unidos.60 As duas outras atriz, Joan e Mary, e seus companheiros continuaram morando em Anápolis. 3.3. A Fraternidade Eclética Espiritualista Universal 60 Revista Time, Nova York, 21-setembro1959. 92 Mesmo tendo sido considerada na década de 1930 e início de 1940 uma cidade moderna, Anápolis nos anos 1950 ainda carecia de muitas reformas estruturais. Um depoimento desta época evidencia alguns dos problemas da cidade, onde o velho e o novo pareciam conviver pelas ruas: No dia seguinte rumamos para Anápolis. Uma estrada mais ou menos regular, porém com uma poeira vermelha de sufocar pelo trânsito permanente de carga e passageiros... Anápolis parece bem uma cidade de fronteira. No ano que vem vai comemorar o seu cinqüentenário. É uma cidade cosmopolita; dá-nos impressão de uma cidade americana, onde os homens andam de revólver na cinta, e uma “lambedeira” do lado! Pouca água, a maioria das casas com cisterna (na minha terra chama-se poço ou cacimba); luz deficiente, todas as casas tem transformador e quando funciona sem interrupções é dia de alegria, pois a mesma vive agora a fazer jogo de esconder em fase de melhorias. O cinema só funciona porque tem luz própria. Predomina entre a população a colônia Síria, que dizem ter muito dinheiro; é um centro de cereais, de compra e venda. A vida não é cara nem barata, mas as casas são de preços assustadores e a grande 61 maioria não possui instalações sanitárias completas. Este é o relato sobre Anápolis feito por um dos membros fundadores da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal que visitou a Anápolis durante os preparativos para a fundação da primeira sucursal desta instituição que foi instalada nesta cidade em 1956, e este é um dos fatos que também fazem parte da odisséia de Joan Lowell pelo Planalto Central. Segundo Mello (2008) a Fraternidade Eclética foi fundada por Mestre Yokaanam, cujo nome em registro de nascimento era Oceano Araújo de Sá, no Rio de Janeiro, em 1956. Este movimento religioso tinha caráter missionário e messiânico o que causou muita oposição contra os fraternários, como eram chamados os seguidores de Mestre Yokaanam. Conforme Yokaanam já esperava, árdua foi a sua tarefa, sobretudo nos primeiros tempos de fundação da fraternidade e da Cidade Eclética (do final 61 Página eletrônica da sucursal de Anápolis da Igreja Fraternidade Eclética Espiritualista Universal. 93 da década de quarenta ao início da década de setenta), quando ele e sua obra foram alvo de difamações, escândalos e graves denúncias, divulgadas publicamente. A imprensa sensacionalista foi-lhes implacável, cedendo espaço considerável às acusações de insanidade mental, charlatanismo e exercício ilegal da medicina, abandono da família e não-pagamento de pensão, desvio de verbas da fraternidade para outros fins e ocupação indevida de terras (MELLO, 2008: p. 35). Em 1956 mestre Yokaanam veio para Goiás em viagem secreta a fim de encontrar as terras onde deveria ser fundada a Cidade Eclética, uma cidade que foi criada “para ser o embrião e exemplo da prática do cristianismo primitivo restaurado, sempre em acordo com orientações espirituais e princípios cristãos ancorados na prática da humildade e da caridade fraterna, contando sempre com cooperação” (MELLO, 2008: p.28). Mas antes de chegar ao local em que deveria ser construída a tal cidade Mestre Yokaanam passou por Anápolis, onde devido ao seu carisma conquistou vários adeptos que aqui fundaram uma primeira sucursal da Fraternidade Eclética. Segundo fontes oficiais, a Regional da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal sediada em Anápolis-GO, foi fundada em 13 de outubro de 1956, portanto pouco antes da chegada da caravana dos Peregrinos da caridade que se instalaram no Planalto Central do Brasil. Anápolis já podia ser considerada, àquela época, talvez por sua proximidade com Goiânia, como a segunda Cidade mais importante do estado de Goiás. Essa importância cresceria pelo seu natural desenvolvimento e também pela futura 62 construção e consolidação de Brasília como capital do País. Para a abertura da primeira sucursal, a transferência da matriz e sua fundação no Planalto central, e ainda para a manutenção dos trabalhos filantrópicos a instituição dependia da doação de seus sócios-contribuintes, como eram chamados os seus membros. Difíceis foram os primeiros tempos de instalação da 62 Este relato foi publicado no Clarim da Juventude (Jornal de circulação interna para a Juventude Eclética Universal), e pertence a irmão Elpídio, atualmente ele está disponível na página eletrônica da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal. 94 igreja no Planalto Central por causa da falta de verbas, e também pela oposição da Igreja. Contudo, Uma freqüência de mais de uma centena de pessoas atesta o prestígio de que a Instituição já goza naquele Estado, apesar da campanha difamatória desencadeada pelo solerte Padre Pitaluga. Mestre Yokaanam:.(sic) tem que se virar de manhã à noite para atender a milhares de solicitações, consultas, conselhos, etc., a todos atendendo de modo já bastante conhecido dos Fraternários. Irmão Aristóteles:. (sic) está residindo já em Anápolis com sua família. Só no dia 07 de setembro partimos rumo a Campo Limpo, local escolhido para a construção da Cidade Eclética 63 Fraternidade Universal. Joan Lowell foi uma destas pessoas que simpatizaram com as doutrina pregada por mestre Yokaanam, tendo participado ativamente da fundação da Fraternidade Eclética em Anápolis desde o princípio, em 1956. Neste mesmo ano foi empossada na primeira Diretoria Social da Sucursal da Anápolis, que assim foi constituída: Agenor Santos – Presidente; Joana Lowell Bowen – Vice-Presidente; Dr. Mário Evaristo de Oliveira – Procurador Geral; Isaac Abrão José – 1º Secretário; José Bosco Isaac – 2º Secretário; Edwirges Soares – 1º Tesoureiro; Antônio Afonso de Almeida – 2º Tesoureiro; 64 Dr. Mário Evaristo de Oliveira – Orador. A atriz/escritora por causa da sua intensa participação nos preparativos para a fundação da filial de Anápolis desta instituição recebeu no dia 26 de setembro do ano de 1956 um cargo muito importante, o de vice presidente. Posteriormente após terem alugado um prédio onde funcionaria a Fraternidade Eclética ouve uma reformulação desta primeira diretoria, em janeiro de 1957, e Joan Lowell continuou como a vice-presidente. Em 21 de fevereiro do mesmo ano os trabalhos para a estruturação desta sucursal continuavam, foi realizada então uma cerimônia que 63 64 Idem 62. Idem 62. 95 preparou os primeiros obreiros que integrariam o primeiro quadro de adeptos da Fraternidade Eclética em Anápolis.65 Nesta ocasião os obreiros receberam o Santo Balandrau, que é uma “veste comprida, à maneira daquelas que usavam Jesus Cristo e seus apóstolos” (MELLO, 2008: p.28), e que para os adeptos da Fraternidade Eclética tem um valor simbólico, pois somente os membros que participam ativamente de todas as atividades desta instituição podem usá-lo. Entre os pioneiros, os primeiros adeptos, que no total foram apenas 15 pessoas, que receberam o Balandrau estava “5. Joan Lowell Bowen”.66 No mesmo mês, finalizados todos os preparativos, tinha chegado o grande dia da inauguração solene da sucursal, que ficou assim registrado na edição do jornal interno da instituição. O Povo recebe de braços abertos a Fraternidade Eclética Espiritualista Universal. – Inaugurada, solenemente, a Sucursal nº 1 em Anápolis, Estado de Goiás. – Cerimônia tocante. – Sócia benfeitora da Fraternidade, a Sra. Joan Lowell Bowen, esposa do Capitão Bowen– Os oradores. – Autoridades presentes. (...) Em seguida, o Irmão Polycarpo:. Fez uso da palavra, conferindo à Irmão (sic) Joan Lowell Bowen, de nacionalidade americana, o diploma de Sócia Benfeitora da Fraternidade, conforme a Constituição Estatutária da Casa, a qual recebeu o referido Diploma com grande emoção, recebendo cumprimentos dos Irmãos presentes, pelo merecimento tão oportuno. Logo após a entrega do Diploma a Irmã Joan Lowell, ocupou o microfone o Mestre Yokaanam:.(sic), que fez magnífica oração, que foi gravada e guardada carinhosamente na Divisão de Imprensa para os anais 67 da Casa e como mensagem ao porvir (grifo nosso). A cerimônia foi um ato público em que estiveram presentes muitas pessoas importantes da cidade, como o prefeito da Cidade de Anápolis, Carlos de Pina; Jarbas de Oliveira repórter da Rádio Imprensa; Francisco Garcês, repórter da Rádio 65 66 67 Idem 62. Idem 62. Jornal O Nosso, maio-1957, apud página eletrônica da Fraternidade Eclética. 96 Carajá, todas de Anápolis. O marido de Joan Lowell, Leek Bowen, também esteve presente assistindo a solenidade.68 Pelos cargos que Joan ocupou, mas principalmente por ter recebido o Balandrau vemos que ela gozava de um grande prestígio dentro da Fraternidade Eclética. Mas segundo seu registro na instituição em novembro, do mesmo ano em que havia solenemente se tornado membro da Fraternidade Eclética, ela foi “desligada” da sucursal de Anápolis. Nesta época atriz/escritora havia se mudado para a região onde estava se construindo a futura capital do Brasil, mesmo local em que se encontrava também o velho amigo, Bernardo Sayão, então diretor da NOVACAP (Companhia Urbanizadora da Nova Capital), empresa federal criada para realizar as obras para a fundação de Brasília e presidida por Israel Pinheiro. Nesta época também estava sendo construída na região de Brasília, no entorno, a Cidade Eclética por mestre Yokaanam, que contou evidentemente com a ajuda de Joan Lowell. Aparentemente podemos pensar que o vinculo entre Joan Lowell e a Fraternidade Eclética não foi muito forte, nem duradouro, mas quando indagamos irmã Verônica69, filha de um dos fundadores da instituição de Anápolis e que chegou a conhecer a atriz/escritora, sobre a importância e sobre se seu vínculo com a sucursal anapolina esta deu o seguinte depoimento: (...) não é que não foi forte. Foi um vinculo muito forte e muito importante naquela... naquela ocasião, anos atrás. Muitos anos atrás. Porque a Fraternidade estava recém chegada aqui à Goiás, vinda do Rio de Janeiro. Então no primeiro momento, aquele entusiasmo, aquela coisa... mas a Dona Joana, ela era um pessoa envolvida com muitas coisas. Ela não era uma pessoa que cuidava só de uma coisa, ela tinha várias coisas que ela cuidava. Tinha inclusive uma fazenda, uma coisa assim, mas ela sempre foi muito e ligada a Fraternidade, e foi enquanto...enquanto existiu uma 68 69 Idem 62. Irmã verônica é o pseudônimo de Maria Helena dos Santos. 97 colaboradora muito importante, ajudou muito, muito mesmo a Fraternidade, tanto aqui em Anápolis, quanto lá no Planalto central, que é onde fica a matriz da nossa instituição, a Cidade Eclética, né (sic)? Ela ajudou muito, muito mesmo naquela época (...) no começo ainda de querer construir, de fazer a fundação de Brasília, ela foi um membro muito importante dentro da instituição como colaboradora, e por isso que ela recebeu este título de Benfeitora. Porque uma pessoa pra ser considerada Benfeitora na Fraternidade ela não necessariamente tem que ser obreiro de Balandrau. Qualquer um pode ser considerado benfeitor na obra, desde que, de acordo com aquilo que ele faça, com aquilo que ele doe, com aquilo que ele faça espontaneamente sem que a casa tenha que ficar pedindo. Ele tem que abraçar o movimento criado pela Fraternidade e... e aceitar os nossos princípios, e ela foi uma pessoa que deu muito bem com muita gente lá na 70 cidade Eclética, ela ajudou muito, muito mesmo (16- out-2009, Anápolis) 3.4. Bye-bye Anápolis! No final da década de 1950 todas as atenções se voltavam para o Planalto Central por causa da construção da nova capital no interior de Goiás, e muitas pessoas se dirigiram para lá. Entre estas pessoas que foram as pioneiras na formação de Brasília estava o casal Bowen, como citado acima, Joan Lowell mudouse para a região de Brasília no final de 1957. Num primeiro momento podemos pensar que Joan e seu marido tenham deixado Anápolis para morar em Brasília por influência de Bernardo Sayão, que era o chefe da NOVACAP (o órgão federal criado exclusivamente para cuidar da construção da nova capital), e segundo Sayão (1976) muito amigo de Joan Lowell. Seria compreensível que eles mudassem para a região de Brasília seguindo o grande amigo. Outros acontecimentos também podem ter influenciado o casal a mudar para aquela região, como o fato de Joan ter sido presa em 1957 devido as confusões que ela havia criado por causa da venda fraudulenta de terras e pelos cheques sem fundos que emitia, como também devido a construção da Cidade Eclética, criada por Mestre Yokaanam fundador Fraternidade Eclética Espiritualista 70 Depoimento de Irmã Verônica. 98 Universal, igreja da qual Joan fez parte e contribuiu ativamente enquanto vivia em Anápolis. Joan Lowell tornou-se amiga de mestre Yokaanam e contribuiu substancialmente para a fundação da Cidade Eclética,71 que se localiza nas proximidades da cidade de Santo Antônio do Descoberto, em Goiás, na região do entorno da capital, distante apenas 60 quilômetros de Brasília. Foi a partir de 1956 que um grupo de fraternários liderados por Mestre Yokaanam se dirigiu ao planalto goiano e criaram uma comunidade fraterna, onde prevalecem os princípios morais cristão e um estilo de vida que pode ser definido como um socialismo religioso. Lá construíram casas e plantações que poderiam ser utilizadas por todos e onde não aceitam as relações capitalistas entre os habitantes (MELLO, 2008). Como colaboradora da sucursal de Anápolis da Fraternidade Eclética, e da Cidade Eclética no entorno de Brasília, Joan Lowell tornou-se muito amiga de Mestre Yokaanam, eles costumavam ficar por muitas horas conversando, entretanto ela não residia na nesta comunidade.72 Segundo Mendes (1995) o casal Bowen saiu de Anápolis e foi morar em uma chácara em Planaltina no Distrito Federal, e lá deste os primórdios da capital Joan se destacava por sua espontaneidade, extravagância e carisma. (...) ostentando seu passado de ex-estrela do Hollywood, em pouco tempo Joana tornou-se figura conhecida e presença constante em qualquer festa ou comemoração da nova capital. Seu marido quase nunca aparecia, Joana tomava conta da cena, como se a vida fosse um filme, e ela atriz principal. Vivia com poucos recursos e muitas vezes se metia em confusões por dificuldades financeiras e emissão de cheques sem cobertura, mas não perdia uma festa, onde aparecia sempre alegre, e procurando ser o centro das atenções (MENDES, 1995: p. 415). 71 72 Idem 70. Idem 70. 99 Na missa que inaugurou o inicio das obras de construção de Brasília Joan Lowell, no meio da cerimônia, saiu de seu lugar e foi ajoelhar-se ao lado do presidente Juscelino Kubistchek e de seu vice. Nas festas da jovem capital Joan Lowell era figura de destaque, no primeiro Baile de Carnaval de cidade lá estava a atriz/escritora ao lado de Rita Hayworth, uma famosa atriz norte-americana que havia sido convidada para o baile; na festa do ano seguinte ela encontrou outro compatriota, o ator Kirk Douglas. Nestas festas Joan ganhou alguns concursos de fantasias de carnaval, certa vez ela fantasiou-se de Congresso Nacional com a cabeça entre as duas torres a as cúpulas sobre os ombros, em outra foi de noiva e chegando à cavalo. Ostentando seu passado de ex-estrela do Hollywood Joan, agora passava a destacar-se na restrita e elitista sociedade brasiliense. Sua vida nem por isso passou ser fácil, pois continuava a passar por dificuldades financeiras (MENDES, 1995). Atuou nesta época como jornalista escrevendo crônicas para o jornal Diário Carioca, que tinha uma edição diária destinada a Brasília (FREITAS, 2002). Aventureira Joan propôs, em 1962, a Léa Sayão que percorressem juntamente com duas outras mulheres o trajeto da Belém-Brasília, estrada que Bernardo Sayão havia construído e que em poucos anos estava em um estado lastimável devido ao abandono e a falta de manutenção e melhorias. Viajaram pela precária rodovia em uma Kombi, um carro da montadora de automóveis Wolkswagen, e voltaram em um avião da Força Aérea Brasileira, a FAB (MENDES, 1995 e SAYÃO, 1976). Nesta aventura estas corajosas mulheres atravessaram o país por uma estrada sem asfalto, cheia de lama e que estava sendo engolida pela selva antes mesmo de ser concluída, registrando todos os detalhes para revista O 100 Cruzeiro, que publicou a matéria narrando a aventura em 9 de junho daquele mesmo ano (FREITAS, 2002). Segundo Mendes (1995) Joan já havia realizado sozinha à alguns anos antes, quando a rodovia ainda estava sendo construída, todo o percurso em um carro da Wolkswagen. Logo após a morte de Bernardo Sayão, em acidente ocorrido durante a construção da mesma estrada em janeiro de 1959, Léa conta que a atriz/escritora esteve presente na primeira viagem inaugural de uma linha de ônibus do Expresso Braga que percorria a Belém-Brasília (SAYÃO, 1976). Na ocasião da viagem pela BR-153 com Léa Sayão, Joan já tinha se tornado viúva, pois Leek Bowen falecera após ter sido atropelado na Estação Rodoviária de Brasília. Porém não perdeu sua alegria de viver, continuando a frequentar os bailes de carnaval realizados na cidade e continuou incrivelmente ativa. Em novembro de 1967 Joan Lowell faleceu vitimada por uma hemorragia pulmonar73 em sua chácara em Planaltina, no Distrito Federal, e foi sepultada no cemitério da Boa Esperança, onde já estava enterrado seu marido (MENDES, 1995). 3.5. Porque Mary Martin Amava a “Selva” Mesmo após a volta de Janet Gaynor para os Estados Unidos, e da ida de Joan Lowell para Brasília, Mary Martin e Richard Halliday continuaram a viver em Anápolis. Mesmo tendo se adaptado a cidade, sua presença não chegou a alterar a dinâmica da cidade se comparada a Joan. Mesmo assim Mary Martin diziam ser 73 Revista Time, New York, 24-nov-1967. 101 uma espécie de embaixatriz de Anápolis nos EUA,74 embora na prática pouco ou nada tivesse feito de efetivo pela cidade, apesar de amar o lugar. O casal vinha para Anápolis sempre que podia, tentavam conciliar o trabalho nos Estados Unidos com as temporadas restauradoras que passavam no interior de Goiás. No período em que morou em Anápolis Mary Martin protagonizou musicais como, “Peter Pan”, durante a década de1950 (este espetáculo fez tanto sucesso que chegou a ter uma versão televisiva e fez com que a atriz ganhasse a maior premiação do teatro norte-americano, o premio Tony; “The Sound Of The Music”, entre 1959 e 1951; “Hello Dolly”, musical que ela estrelou nos anos de 1965 e 1966 e “I Do! I Do!” que ficou em cartaz durante os anos de 1968 e 1969. Mas na década de 1970 o casal Halliday se dedicou mais ao seu rancho no interior de Goiás (MARTIN, 1976). Sua fazenda tinha o nome de Nossa Fazenda Halliday, existindo até hoje na entrada do caminho que conduz à sua fazenda uma coluna de concreto com o nome da propriedade já quase apagado escrito em azulejos. Localizada nas proximidades da BR153, logo após o povoado de Interlândia, “Nossa Fazenda”75 tinha sede em uma colina de onde é possível avistar o horizonte. Nesta propriedade Mary Martin e Richard Halliday criavam galinhas para a produção de ovos, plantavam café e cultivavam um pomar, Construíram uma grande casa com o apoio de inúmeros operários (cerca de trinta pessoas contando com as mulheres de alguns deles). Num primeiro momento a casa tinha apenas um quarto, 74 75 Jornal Correio do Planalto, Anápolis, 18 a 24-ago-1975: p. 01 e 03. A casa da atriz ainda existe, a antiga proprietária a mantinha conservada, inclusive a decoração feita pelo casal Halliday, mas quem comprou a propriedade não teve tanto zelo e atualmente a casa está em péssimo estado de conservação. 102 mas em compensação a atriz tinha um estúdio enorme no segundo andar e seu marido tinha um escritório, a casa não possuía energia elétrica, pois apesar de Anápolis possuir abastecimento de energia este benefício não havia se estendido a zona rural da cidade. Depois foram construindo os outros cômodos, e cada um tinha uma decoração diferente. Havia também as casas dos agricultores, que também se multiplicaram. Martin afirma que ao final da construção sua casa parecia uma pequena vila. Com o passar do tempo eles se adaptaram a vida no campo, e a fazenda produzia tudo que eles precisavam, exceto eletricidade, sal e linha telefônica, objeto que atriz não sentia falta, pois Richard acreditava que poderia quebrar o encanto do local que eles denominavam como “ selva” (MARTIN, 1976). Causa estranhamento ver Mary Martin se referir a região rural do entorno de Anápolis como sendo uma “selva”, mesmo isto tendo ocorrido há quase quarenta anos atrás. Pois para os brasileiros quando se fala em selva pensa-se no mínino em um lugar selvagem, de mata fechada e natureza bravia assim como é a selva Amazônica, mas para aqueles estrangeiros que estavam acostumados às grandes metrópoles as terras da Anápolis, que já estavam até mesmo parcialmente povoadas eram consideradas como “selva”. Como já foi discutido Anápolis era uma cidade onde o novo convivia com o velho, onde veículos automotores e de tração animal dividiam as ruas, para alguns lembrava a paisagem do velho oeste americano.76 E assim o casal se ocupava com a administração da fazenda, e segundo Mary Martin (1976) todos os dias havia algo diferente para se fazer, não era apenas 76 Rever depoimento na p.92. 103 um local de descanso, ou um lugar para se “(...) getting away from it all”.77 A fazenda tinha a sua dinâmica e era o suficiente para ocupar Richard e Mary. Mary Martin, no entanto arrumou algo para ela cuidar e passar o seu tempo. Em 1970 ela inaugurou “uma das mais luxuosas boutiques do Brasil Central” 78 que tinha em anexo um salão de beleza sob responsabilidade das Cáritas, uma instituição da Igreja Católica de atuação social. A loja de produtos importados realmente era muito sofisticada, até mesmo a filha do general Emílio Garrastazu Médici, presidente do Brasil de 1969 a 1974, vinha à Anápolis exclusivamente para comprar na Nossa Loja Mary Martin’s. Muitos turistas também se deslocavam para a cidade com o único objetivo de fazer comprar na loja da atriz de Hollywood.79 A loja era bastante conhecida e prestigiada, entretanto os jornais da cidade não davam muita importância para ela. Naquela época era comum as boutiques da cidade realizarem desfiles para mostrar a coleção de roupas para a sociedade anapolina, haviam vários desfiles e outros eventos, mas somente em um evento Nossa Loja esteve presente, isto foi durante a Convenção do Rotary Club, distrito 453 em 1971.80 Também não foram encontradas muitas referencias nas colunas sociais sobres Mary Martin, Joan Lowell, e Janet Gaynor, seus respectivos maridos e qualquer outra pessoa que tenham vindo visitá-los. Isto pode nos levar a crer que elas não se integraram ao círculo social anapolino. O interessante é que Joan Lowell não é citada em nenhuma coluna social, somente em outras matérias do jornal. Mendes (1995), porém, afirma que após ir morar em Brasília a atriz/escritora freqüentava praticamente todas as festas da nova capital e era sempre encontrada 77 78 79 80 (...) ficar longe de tudo (Tradução livre). Idem 50. Jornal O Anápolis, Anápolis, 30-out-1970: p. 04. Jornal Folha de Anápolis, Anápolis, 03-maio-1971, p. 04. 104 na seção da colunista social Katucha. Janet só foi citada em um jornal81, apenas para dizer que ela morava em Anápolis, e mais nada, sua passagem por Anápolis foi muito discreta. 3.6. Visitas Ilustres O amor de Mary Martin por Anápolis fica nítido em sua biografia, pois dedicou um capítulo para falar sobre seu rancho no Brasil, e exaltar as belezas naturais da região. Este sentimento acabou convencendo muitos de seus amigos e parentes a vir visitá-la. A partir da década de 1950, principalmente, Anápolis entrou em um período de estagnação, a cidade que num passado recente desfrutava do título de capital econômica do estado, que se destacava pela oferta dos mais variados serviços, e até pelo fato de ter um aeroporto com vôos diários e nacionais e internacionais, “escala importante no sentido Rio-Miami, e última no sentido inverso” (ROCHA, 2007: p.153), passou por uma fase muito complicada. A partir dos anos 1940 enfrentou uma grande crise, devido ao intenso progresso econômico que não adequadamente acompanhado de uma evolução estrutural; a localização do município, apesar de estratégica, causou grande estagnação principalmente após a consolidação das duas capitais, primeiramente de Goiânia, e depois de Brasília (a partir de 1960). Para Rocha (2007), contudo esta opinião é tema de muitos debates, e não há um consenso sobre o fato de Goiânia realmente ter inibido o desenvolvimento de Anápolis. Acredita-se inclusive que 81 Jornal O Anápolis, Anápolis, 02-dez- 1956, p. 01. 105 Brasília pode ter ampliado os horizontes da cidade, porque foi a partir da criação da capital federal que se construiu a BR153, rodovia que interliga o norte e o sul do país e que é conhecida como Belém-Brasíla, sugerindo, esta denominação, que seu percurso se estenda de Belém a Brasília, quando na verdade esta começa em Anápolis indo até a capital paraense A despeito desta crise para Mary Martin e seus hospedes Anápolis era um refúgio. Como já foi mencionado a presença das atrizes americanas em Anápolis em pouco ou nada alterou a dinâmica da cidade, exceto pela atuação de Joan Lowell que se integrou muito bem a sociedade anapolina a ponto de não retornar mais ao seu país para morar, visitando-o somente uma vez após sua vinda para o Brasil. Os jornais locais comprovam a pouca expressividade referente a presença destas mulheres aqui, pois com duas grandes atrizes residindo na cidade pouco se escreveram sobre elas, apenas notas, trechos ou citações. Na década de 1970 Mary Martin, foi notícia em algumas reportagens: uma sobre um almoço para autoridades que ela ofereceu em sua casa (cf. infra), e outra falava sobre sua biografia que havia sido lançada nos Estados Unidos em 1975.82 Elas estavam na cidade apenas para descansar, para elas não havia badalação, festas, nem colunas sociais apesar da cidade ter eventos e colunistas sociais que escreviam sobre os acontecimentos da sociedade anapolina. A vida das atrizes era aparentemente uma vida pacata, exceto ocasionalmente quando elas recebiam alguma visita importante em sua casa, como quando Mary Martin recebeu em sua casa o embaixador americano no Brasil, John Crimmins; o prefeito de Anápolis, Jamel Cecílio; o governador do estado, Irapuãn 82 Jornal Correio do Planalto, Anápolis, 31-jul-1975. 106 Costa Jr.; Geraldo Rosa, diretor do CERNE (Consórcio de Empresas de Radiodifusão e Notícias do Estado); o empresário Mounir Naoun, o empresário e amigo da atriz, Gibran El-Hadj; o deputado Habbib Issa; o médico Josiah Wilding; e os seus amigos norte-americanos, o arquiteto e decorador John Astin Perkins; o assessor da atriz , Bem Washer; e Ruth Zukerman.83 Sem contar os inúmeros artistas e pessoas ligadas à indústria cinematográfica norte-americana que vieram para Anápolis para visitar a casa da atriz. Na sua biografia Mary Martin cita que apenas sua família e de seu marido, e amigos do trabalho vinham para sua fazenda, mas alguns jornais atuais afirmam que por causa destas atrizes viverem aqui muitos atores estiveram em Anapolis para visitá-los, são eles: John Wayne, ícone dos filmes de faroeste; Ronald Regan, que antes de se tornar presidente dos Estados Unidos era ator e veio conhecer a casa de seus amigos;84 Janeth Leight, atriz do filme “Psicose” (1960); Clark Gable, o galã do filme “E o vento levou” (1939);85 e provavelmente atriz indicada ao Oscar por “Falam os Sinos” (1949), Loreta Young, que era muito amiga de Mary Martin86. Além de Robert Cumminngs, estrela do filme “Disque M para Matar” (1954), de Alfred Hitchcock; e Robert Mitchum, de “Herança de Carne” (1960), filme de Vincente Minneli.87 A respeito dos filhos de Mary Martin e de Janet Gaynor falou-se muito, pouco, pois sobre estes não há nada documentado, exceto pela biografia do filho de Mary Martin. Sobre Robin Gaynor, filho de Janet e Adrian, não existe nada escrito, e 83 Idem 75. Jornal Tribuna de Anápolis, Goiânia, 03 a 09-jul-2005. 85 Jornal Contexto, Anápolis, 22 a 28-jun-2005. 86 Gibram Ell-Hadj, que era o representante do casal Halliday no Brasil acabou ficando com muitos documentos deles, incluindo correspondências tocadas entre Loretta Young e Mary Martin (MENDES, 1995). 87 Página eletrônica de Expat American Living in Brasil. 84 107 sobre Heller Halliday sabe-se que veio com os seus pais na primeira vista ao Brasil e depois veio vê-los em Anápolis. Larry Hagmam, filho mais velho de Mary Martin veio visitar a casa de sua mãe, mas ele nunca residiu na cidade, pois preferia morar nos Estados Unidos. O Ator que interpretou o personagem J. R. do seriado de televisão “Dallas” e o Major Nelson em, “Jeannie É um Gênio”, era visto andando pelas ruas da cidade, certa vez acompanhado de um amigo “famoso” chamado Burt Lancaster, o protagonista do filme “A Um Passo da Eternidade”, de 1953. Além dos americanos que vieram visitar a Nossa fazenda, outros americanos viviam em Anápolis, como George Homer que viveu em Anápolis no mesmo período em que as atrizes moraram por aqui, sendo casado com Janet Homer (a mesma que entregou a carta de Janet Gaynor para Mary Martin no porto de Santos), e se tornou amigo delas, e também era amigo de Bernardo Sayão. Após a fundação de Brasília mudou-se para aquela cidade com sua família. 3.7. A Volta Richard Halliday e Mary Martin ao contrário de Joan, passavam na cidade apenas para tomar o vôo que partia da capital direto para Nova York, nunca freqüentaram a vida social de Brasília. O casal passava as temporadas na fazenda em Anápolis, mas não deixaram de trabalhar durante o período em que viveram no Brasil. De acordo com Cunha (Apud Mendes, 1995): Não estranhe se eu informar para todos que um dos grandes shows da Broadway está sendo bolado em Anápolis, pertinho de Brasília. Lá estão Mary Martin, seu esposo Richard Halliday e o compositor Smitz. É que Mary Martin está sendo, hoje, o grande sucesso dos Estados Unidos, e sempre que pode se recolhe a sua fazenda em Goiás, para novas criações (MENDES, 1995: p. 416). 108 O amor da atriz pela cidade era tanto que ela planejava aposentar-se e mudar-se definitivamente para o interior do brasil. Porém, seus planos se desfizeram em 1973, quando Richard Halliday faleceu em Brasília, vítima de pneumonia, e teve então seu corpo transportado para os Estados Unidos onde foi cremado (MARTIN, 1976). O sonho de mudar-se definitivamente para Anápolis foi interrompido. De acordo com algumas matérias88 de jornais da cidade a atriz ainda veio e permaneceu na cidade por alguns anos. Entretanto com a morte do companheiro foi impossível que ela continuasse na cidade vivendo longe de seus filhos e netos. No inicio a vida na fazenda era alegre, conta Mary Martin (...). Havia a presença de sua amiga Janet Gaynor e de seu marido Adrian, assim como outra Janet, a esposa de George Hommer. Havia, também, a presença de Joana Lowell e de seu marido, o capitão Bowen. Aos poucos, todos foram deixando Anápolis, permanecendo lá apenas Mary Martin, o marido e uma filha. Mais tarde, a filha casou e passou a residir nos Estados Unidos. O casal ficou sozinho. Com a morte do marido, tornou-se difícil para sra. Martin continuar ali, sozinha, cheia de recordações apesar de ser a terra que amava(...), (MENDES, 1995: p: 417). A atriz voltou para os EUA ainda no final da década de 1970 e em 1984 ela passou para o nome de seu caseiro, José Rodrigues Sobrinho a propriedade de sua fazenda89. Em 1978 a atriz foi homenageada na cerimônia de entrega do Oscar, e em 1989 ela ganhou uma honraria do Centro Kennedy de Artes, de Washington, pelo conjunto de sua obra, permaneceu trabalhando até por volta de 1986. Em 1982 Mary Martin e Janet Gaynor sofreram um grave acidente num táxi, quando veio a óbito seu assessor, Ben Washer. Janet também saiu muito machucada do acidente, não conseguindo recuperar-se totalmente das fraturas, e com o organismo fragilizado ela não resistiu a uma pneumonia que a levou em 14 de 88 Ver notas 83 e 75, que relatam fatos sobre Mary Martin em Anápolis que ocorreram após a morte de Richard Halliday, em1973. 89 Página eletrônica do Memorial da Fama. 109 setembro de 1984. Mary Martin ficou muito abalada pelo acidente e depois pela morte da melhor amiga, e em 11 de novembro, apenas um mês antes de completar 77 anos, ela faleceu em seu rancho na Califórnia, vítima de um câncer de cólon (ROCHA, 2007). Armando Bulcão, professor da Universidade de Brasília (UNB) produziu recentemente um documentário ainda não lançado90, sobre a vida destes atores em Anápolis e em Brasília e das outras personalidades que vieram visitá-los, buscando resgatar aspectos da história destes locais que ainda não foram documentados. 90 Jornal O Popular, Goiânia, 25-ago-2005: p. 1. 110 CONCLUSÃO O casal Joan Lowell e Leek Bowen vieram para Anápolis no final da década de 1930, por que naquela época a cidade se destacava em Goiás, ainda mais depois dos estímulos federais para a colonização do interior do país. Janet Gaynor e Gilbert Adrian vieram para Anápolis por influência de Joan Lowell, eles procuravam um lugar mais calmo para viver por causa dos problemas de saúde do Adrian. Mary Martin por sua vez, veio por causa de Janet Gaynor, que era sua amiga e já residia na cidade. Ao chegar em Anápolis, ela e Richard Halliday se encantavam com as características do naturais do local, bem como por sua paisagem urbana onde conviviam o moderno e o arcaico, mas que para eles tudo era muito exóticos. As histórias do livro de Joan Lowell são romanceadas bem ao estilo de um filme hollywoodiano, com direito a um início insosso, quando inicia-se o romance entre Joan e Leek; o desenrolar da história é de muita luta: existem vilões, como o advogado grileiro (Cobra-Sêca); situações embaraçosas como o incidente com família alemã; lições de vida, como quando Joan trocou o café pelos cristais do garimpeiro João Batista; e quando o casal pensa em sucumbir e desistir da construção da estrada eis o final triunfante, que tem eles morando em sua própria fazenda produtora de café, com uma casa com piscina, sem esquecer que ela deixa subentendido que estão a procura de novas terras e novas aventuras em outros lugares do Brasil. Exatamente como num enredo de um filme a história de Joan se desenvolve destacando pessoas importantes no contexto regional, que segundo ela teriam 111 participado dos acontecimentos: Quicas Borges teria comprado seus cachorros de caça, o governador Pedro Ludovico que a isentou do pagamento dos impostos da fazenda que haviam ganhado e finalmente Bernardo Sayão que ela conheceu na região da CANG, e que tornou-se seu amigo. A inconsistência de seu relato e seu passado, quando teve a primeira biografia desmascarada, nos faz crer que Joan Lowell não veio para o interior de Goiás abrir uma estrada, e os motivos são os seguintes: seu relato, como já foi citado, é muito fantasioso, as dificuldades descritas são tamanhas que dificilmente ela e o marido se aventurariam em uma região tão desabitada e selvagem, que segundo Castilho (2009) mesmo a viagem para chegar até ela “não era nada fácil, ao mesmo tempo que significava a possibilidade da “terra prometida”, o percurso levava muito tempo e as doenças poderiam levar à morte”; o casal não possuía os conhecimentos necessários para abrir uma estrada não era somente abrir uma “picada” na mata, eles precisavam saber para onde deveriam ir; o casal não dominava o língua portuguesa para poder lidar com os trabalhadores da estrada e para resolver os problemas que certamente surgiriam durante a construção da estrada, e mesmo para viver no interior de Goiás. Segundo Lowell (s/d: p. 151) Bernardo Sayão teria usado trechos da estrada aberta pelos norte-americanos para construir uma rodovia que foi origem da Transbrasiliana. No entanto, Léa Sayão (1976) afirma que seu pai construiu a esta estrada “aproveitando o traçado que já havia de Anápolis à Jaraguá, e que tinha consumido grandes somas de ambas as Prefeituras”. Não fala em estrada que tenha sido financiada por um grupo paulista. Aliás, Joan não cita o nome do grupo que os contratou, reforçando a tese de que o casal Bowen não teria aberto estrada alguma 112 em Goiás, pois se isso fosse verdade, não teria motivo para proteger o nome de um grupo, no caso os Monteiro de Barros, que teria agido com tamanha má-fé contratando os serviços de Joan e de seu marido e depois não os pagando. Sayão (1976) afirma ainda que a colônia recebia muitos visitantes entre eles estrangeiros e escritores que ficavam maravilhados com as possibilidades da região. Comenta inclusive que certa vez quando seu pai trazia um comboio de máquinas para a colônia em um dos acampamentos na estrada recebeu “amigos americanos, a família Platt, de Chicago, acompanhada do casal capitão Bowen’ (p. 85). Como podemos perceber, Joan Lowell de fato teve contato com Bernardo Sayão, e por causa desta amizade ela visitou a CANG diversas vezes, e como era amiga da família pode presenciar cenas as intimas de Léa Sayão ainda criança que ela descreveu na apresentação da biografia de Bernardo Sayão,escrita por Léa. Mas isso não significa que a atriz/escritora tenha vivido acampada naquela região. Sua história nos faz lembrar a trajetória de Bernardo Sayão: o casal Bowen vieram abrir uma estrada e ficaram acampados, a beira da via que estavam abrindo, com o tempo chegaram mais pessoas e o lugar foi se tranformando um aglomerado de gente, algo semelhante aos primeiros tempos da Colônia Agrícola de Goiás. Some a isto o fato de Bernardo Sayão ter ficado famoso pela abertura de estradas, e uma das primeiras construções ter sido justamente a melhoria e ampliação da estrada que ligava Anápolis a Jaraguá, mesmo antes de começar a Colônia. Joan então poderia ter se inspirado na história do próprio Bernardo Sayão para escrever suas memórias. O fato de ela afirmar ter, juntamente com o marido, aberto uma estrada que teria sido usada para a construção da Transbrasiliana, poderia desagradar Léa 113 Sayão, caso não fosse verdade, pois ela era a filha do verdadeiro construtor desta estrada. O livro de Joan foi publicado em 1952, naquela época Bernardo Sayão era apenas o ex administrador da CANG, que havia sido dispensado do cargo devido a indícios de má administração, na ocasião do lançamento do livro ninguém poderia imaginar ainda que aquela rodovia seria umas das mais importantes do país, e que seu construtor seria considerado um herói nacional . Mendes (1995), um jornalista que conheceu pessoalmente Joan Lowell afirmou que ela “dizia” (a conjugação do verbo evidencia que era a própria autora que falava) que veio dos Estados Unidos por causa da descoberta das mentiras do seu livro, e ainda segundo este ao contrário do que a atriz/escritora escreveu no livro, veio esperar o marido em Anápolis e não em uma praia deserta de Santos. Em Anápolis teria conhecido Bernardo Sayão e freqüentado a CANG. O fato de não ter vivido em um acampamento a beira da estrada não a impediu de ter passeado pelo interior de Goiás, em uma destas aventuras pelo sertão goiano ela e Leek Bowen foram acusados de assassinato de duas crianças que haviam medicado. Esta história reforça ainda mais a idéia que o casal Bowen não abriu estrada, pois é improvável que na situação que ela dizia estar vivendo, o casal pudesse passar vários dias cuidando das crianças enquanto as obras da estrada ficavam paradas. Existem poucas referências sobre as histórias de Joan Lowell em outras publicações, o que nos pode levar a crer que nem tudo no seu livro é verdade, isto não seria novidade, pois quando ainda estava morando nos Estados Unidos ela inventou boa parte de sua primeira autobiografia, sendo desmascarada algum tempo depois. Outras pesquisas que citam o fato de Joan Lowell ter ido abrir uma estrada que partia de Jaraguá rumo às terras da fazenda Lavrinhas, como o trabalho de 114 Silva (2002), baseiam-se no próprio livro da atriz/escritora, então não podem ser considerados evidência concreta de que ela realmente tenha vivido naquela região, pois não se fez uma análise da possibilidade deste fato ter ocorrido como é narrado em “Terra Prometida”. Estes são os indícios de que Joan Lowell e Leek Bowen não foram abrir uma estrada em direção a fazenda Lavrinhas, mas moravam em Anápolis, onde tinham uma fazenda; Joan participou ativamente da fundação da igreja Fraternidade Eclética Espiritualista Universal, e ficou muito amiga de seu fundador, Mestre Yokaanam. A atriz/escritora também emitia cheques sem fundos, e se envolveu em vendas fraudulentas de terras, quando recebeu dinheiro de muitos atores norteamericanos, deixando-os no prejuízo. As atrizes Janet Gaynor e Mary Martin também foram vítimas de Joan Lowell. Mas ambas conseguiram comprar as tão sonhadas propriedades em Anápolis, cidade que era destaque na região. Janet Gaynor foi embora ainda na década de 1950, pois seu marido continuava doente, e mesmo a calmaria da vida no interior não o havia curado, Mary Martin deixa Anápolis mais de vinte anos de pois de chegar, e após a morte de seu marido, quando decidiu ir para perto de sua família nos Estados Unidos. A presença destes atores na cidade em pouco, ou nada, alterou a dinâmica do município. Chegamos a esta conclusão após a análise dos periódicos regionais, quando verificamos a ausência de publicações sobre os atores nos jornais locais da época, uma evidência de que a presença destes norte-americamos em Anápolis teria sido bastante discreta. Atualmente poucos sabem deste fato, porém pessoas 115 mais velhas, que viveram naquela época, conhecem esta importante passagem da história de Anápolis. Mas com a consolidação de Goiânia como capital estadual, e posteriormente com o inicio da construção de Brasília, Anápolis perde um pouco do seu prestígio. Juntam-se a isto os fatos de: a Fraternidade Eclética estava construindo sua comunidade conhecida como Cidade Eclética nos arredores da futura capital; Joan Lowell se sentia-se ameaçada por causa de dívidas; e seu grande amigo, Bernardo Sayão tinha se mudado para o Planalto Central, para tomar frente das obras de construção de Brasília. Não havia mais nada que prendesse Joan Lowell em Anápolis, todas as atenções agora se voltavam para a construção de nova capital. Depois de inaugurada a capital ofereceu muito mais oportunidades para Joan Lowell, eram festas e outros eventos sociais onde ela quase sempre atraia a atenção por sua extravagância e desinibição ostentando sua condição de ex-estrelas de Hollywood. Em Brasília ela teve também a oportunidade de voltar a escrever para um jornal. Sobre os maridos destas três mulheres pouco se tem documentado, suas esposas se destacam por que elas eram as “estrelas de cinema”, além de serem mulheres corajosas e atuantes. Estes homens que trabalhavam nos bastidores da indústria cultural norte-americana, ou mesmo nem tivera contato com ela como no caso do capitão Leek Bowen, não tiveram muito espaço na mídia, não sendo citados nem mesmo em páginas eletrônicas puderam ser encontradas informações sobre eles; Adrian neste caso possuía a vantagem de ter sido um dos mais importantes estilistas de sua época, existindo maiores informações acerca de sua pessoa. 116 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Fontes Periódicos Digitalizados: “Adventure Girl” At Princess Sunday. Kentucky New Era, 24-set-1934. p.03. Disponível em: < http://news.google.com/newspapers?id=4coMAAAAIBAJ&sjid=RC0DAAAAIBAJ&pg= 5900,4630255&dq=joan+lowell&hl=en>. Acesso em: 15-out-2009. BRESSER-PEREIRA, Luis Carlos. (São Paulo, 1954). O tempo, Belo Horizonte, Mio-2004. Disponível em: < http://www.bresserpereira.org.br/selected/Cinema/FestivalInternacionalCinema.pdf> . Acesso em: 20-nov-2009. Child of Sea Brings Real Life to Reels. The Evening Independence, St. Petersburg, 08-jun-1923. p. 13. Disponível em: < http://news.google.com/newspapers?id=UKELAAAAIBAJ&sjid=zFQDAAAAIBAJ&pg= 3294,3373464&dq=joan+lowell&hl=en>. Acesso em: 20- jul-2009. Joan Lowell, Sea Author and Playwrigth End Dispute. Pittsburgh Post-Gazette, Pittsburgh, 26-dez-1929. p.02. Disponível em: < http://news.google.com/newspapers?id=8swMAAAAIBAJ&sjid=6WgDAAAAIBAJ&pg =3591,1042995&dq=joan+lowell&hl=en > . Acesso em: 15-out-2009. Joan Lowell’s 17 Years on Ship Really Just One. The Milwaukee Journal, Milwaukee, 07-abril-1929. p. 01-02. Disponível em: < http://news.google.com/newspapers?id=7QQaAAAAIBAJ&sjid=KyIEAAAAIBAJ&pg= 4065,4218880&dq=joan+lowell&hl=en> . Acesso em: 15-out-2009. O Globo, Rio de Janeiro, 05-jul-2007. Há 50 anos, p. 9. Disponível em: < http://arquivoglobo.globo.com/pesquisa/pesquisa.asp?retorno=S>. Acesso em: 20out-2009. PARSONS, Louella O. The Milwaukee Sentinel, Milwaukee, 25-mar-1951. p. 46. Disponível em: < http://news.google.com/newspapers?id=ecAVAAAAIBAJ&sjid=VBAEAAAAIBAJ&pg= 6383,2175216&dq=parsons&hl=e>. Acesso em: 25-jul-2009. PARSONS, O.J. Remembering Adrian. The Spokaman- Review, 12-nov-1983. p. 14. Disponível em:< http://news.google.com/newspapers?id=wDcSAAAAIBAJ&sjid=6O4DAAAAIBAJ&pg= 4951,5984778&dq=gilbert+adrian&hl=en>. Acesso em: 25-jul-2009. 117 Pleople. Toledo Blade, Toledo, 29-jun-1952. New Books at Library, p.05. Disponível em:< http://news.google.com/newspapers?id=dJ8TAAAAIBAJ&sjid=VgAEAAAAIBAJ&pg= 6103,5033005&dq=joan+lowell&hl=en>. Acesso em: 25-jul-2009. SUMERS, Alenne. What is This? The Evening Independence, St. Petersburg, 29abril-1929. The Womans Day, p. 05. Disponível em: < http://news.google.com/newspapers?id=54kLAAAAIBAJ&sjid=fFQDAAAAIBAJ&pg=4 268,3412485&dq=joan+lowell&hl=en>. Acesso em: 18-out-2009. Periódicos Eletrônicos: Brazil: Boom In the Backlands. Time, New York, 07-abril-1947. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,804092,00.html>. Acesso em: 24jul-2009. BRAZIL: Man in White.____________, New York, 24-jun-1948. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,888477,00.html>. Acesso em: 24jul-2009. COLBY, Anne. Meet the grandmother of memoir fabricators. Los Angeles Times, Los Angeles, 14-mar-2008. Disponível em: < http://articles.latimes.com/2008/mar/14/entertainment/et-cradle14>. Acesso em: 25jul-2009. Cradle Rocked. Time, New York, 15-abril-1929. Books. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,881822,00.html>. Acesso em: 24jul-2009.. Cradle of the Cheap.____________, Nova York, 24-jun-1933. Disponível em: <http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,745819,00.html>. Acesso em: 25-jul-2009. FREITAS, Conceição. A incrível Joan Lowell. Correio Brasiliense, Brasília, 01-ago2002. Disponível em: < http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://www2.correioweb.com.br/cw/EDICAO _20020801/fotos/VID-0108-0411.jpg&>. Acesso em: 25-set-2009. LÓPEZ, Fernando. Janet Gaynor, Primera Ganadora del Oscar. La Nacion, Buenos Aires, 03-out-2006. Disponível em: < http://www.lanacion.com.ar/nota.asp?nota_id=845839>. Acesso em: 20-out-2009. RIBEIRO, Adair. O dia D do Zebu. Jornal Opção On Line, Goiânia, 07 a10-jun2004. Disponível em: <http://www.jornalopcao.com.br/index.asp?secao=RuralBusiness&subsecao=Suplem entos&idjornal=84>. Acesso em: 29-set-2009. 118 Skipper’s Daugther. Time, New York, 18-mar- 1929. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,737574,00.html>. Acesso em: 25jul-2009. Time, New York, 19-fev-1933. People. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,747000,00.html>. Acesso em 12jul-2009. Time, New York, 06-set-1937. People. Disponível em: http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,758175,00.html >. Acesso em: 25jul-2009. Time, New York, 24-nov-1937. Milestone. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,844195,00.html>. Acesso em: 24jul-2009. Time, New York, 21-set-1959. Milestone. Disponível em: < http://www.time.com/time/magazine/article/0,9171,869257,00.html#ixzz0Ygsd28sW>. Acesso e: 24-jul-2009. Periódicos do Museu Histórico de Anápolis e Periódicos e atuais: A Cidade de Brasil. Anápolis, Anápolis, ano VI, n. 257, p. 02, 09-fev-1941. Anápolis-1956, O Anápolis, ano XXII, n. 3052, p. 01, 02-dez-1956. Autoridades Visitam A Artista Mary Martin. Correio do Planalto, Anápolis, ano II, n. 60, A Cidade, p. 01e 03, 18 a 24-set-1975 Bolsa de Estudo nos Estados Unidos. O Anápolis, Anápolis, ano XXVI, n. 4491, 17fev-1963. Cinegrafistas em Anápolis.___________, ano XXI, n. 1653, p. 01, 02-mar-1954. Expedição Científica ao interior de Goiás. ___________, Anápolis, ano. XXI, n. 2594. 17-mar-1956. Estrada Alaska-Rio. Annápolis, Anápolis, ano VII, n. 279, p. 01, 11-maio-1941. Folha de Anápolis, Anápolis, ano II, n. 114, p. 04, 03-maio-1971. Goiás em Evidência nos EE.UU: Grande Emprêsa Noticiosa Americana Solicita Informes e Fotos. O Anápolis, Anápolis, ano XXII, n. 3074, p. 01, 21-fev-1957. GUEDES, Rute. Glamour no Cerrado. O Popular, Goiânia, Magazine, p.01, 25-ago2005. Hollywood Passou por Aqui. Tribuna de Anápolis, Goiânia, p. 07, 03 a 09-jul-2005. 119 HONORATO, Jolcy. Luz, Câmera...Anápolis. Contexto, Anápolis, Cidades, p. 07, 22 a 28- jul-2005. Igualdade dos Sexos, Triste Balela da utopia Marxista. Folha de Anápolis, Anápolis, ano 01, n. 38, p. 04, 13-dez-1971. Mary Martin Lança Livro. Correio do Planalto, Anápolis, ano II, n. 58, p. 01, 31-jun75. Morre Carmem Miranda. O Anápolis, Anápolis, ano XX, n. 2023, p. 01, 07-ago1955. ___________, Anápolis, ano VI, n. 623, p. 03, 6-jan-1946 ___________, Anápolis, ano XVI, n. 988, p. 03. 28-maio-1950. O Brasil Foi o Primeiro a Falar na Assembléia Geral das Nações Unidas. ___________, Anápolis, ano XVI, n. 1039, p. 01, 15-out-1950 O Embaixador Americano.___________, Anápolis, ano XI, n. 511, 24-jun-1945. ___________, Anápolis, ano XXXVII, n. 5236, p. 04, 30-out-1972. O’NEIL, Edward. Os estados Unidos estão com Mania de Brasil. Anápolis, Anápolis, ano VII, n. 286, 08-jun-1941. Policiais Goianos Farão Estágio de Tres (sic) Meses nos E.E.U.U. O Anápolis, Anápolis, ano XXI, n. 2321, p. 03, 05-junho-1956. REBELLO, Pires. A Medicina nos Estados Unidos.___________, Anápolis, ano XXI, n. 2285, 29-set-1956. Páginas Eletrônicas: Expat Tales: Hollywood Comes to Goiás, Brazil. Expat American Living In Brazil. 11-jul-2008. Disponível em: http:<//expatbrazil.wordpress.com/2008/07/11/expattales-hollywood-comes-to-goias-brazil/>. Acesso em: 15-fev-2008. Fraternidade Eclética Espiritualista Universal. Disponível em: http://www.fraternidadeanapolis.kit.net/historia.htm>. Acesso em: 10-mar-2009. < FREITAS, Conceição. Crônicas da Cidade. Correio Brasiliense Blogs. Brasília, 17jun-2008. Disponível em: < http://www.dzai.com.br/blog/blogdaconceicao?tv_pos_id=23518>. Acesso em: 10dez-2009. Joan Lowell. IMDb (Internet Movie Database).Disponível em: < http://www.imdb.com/name/nm0523096/>. Acesso em: 20-abril-2009. 120 Mary Martin. Memorial da Fama. Disponível em: http://www.memorialdafama.com/biografiasMP/MaryMartin.html>>.Acesso em dez-2009. < 10- Portal de Informações da Prefeitura Municipal de Goianésia. História do Município. Disponível em:< http://www.goianesia.go.gov.br/portal/principal.asp?id=1>. Acesso em 19-nov-2009. Documentos: Registro de Membros-Adeptos da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal, Jan1957. GOIÁS (Estado). LEI Nº 8.845, de 10 de Junho de 1980. Dispõe sobre o desmembramento do Distrito de Castrinópolis, do Município de Jaraguá, e sua anexação ao Município de Rialma. Assembléia Legislativa do Estado de Goiás. Entrevista SANTOS, Maria Helena (Irmã Verônica)- Filha de um dos Fundadores da Fraternidade Eclética Espiritualista Universal. Depoimento concedido a Daiane Gomes de Lima, no dia 16-out-2009, em Anápolis, para elaboração de um trabalho de conclusão de curso. Bibliografia ABREU, S. E. A. A Criação da Faculdade de Filosofia “Bernardo Sayão” e o Protestantismo em Anápolis. Goiânia: UFG, 1997. 188 f. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Educação, 1997. AMADO, Janaína. Região, Sertão, Nação. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol.8, n.15, 1995, p.145-15. Disponível em: < http://www.cpdoc.fgv.br/revista/arq/169.pdf>. Acesso em: 15-jun-2009. BETTON, Gérard. História do Cinema (Das Origens até 1986). Europa-América, 1989. p. 19-36. Mem Martins: BORGES, Barsanulfo Gomides. O despertar dos dormentes – estudo sobre a Estrada de Ferro Goiás e seu papel nas transformações das estruturas regionais: 1909-1922. Goiânia, Cegraf, 1990. ____________. Estado e Economia no Brasil Central: o poder dos grandes produtores rurais. Goiânia: Ed. da UCG, 2008. p.125 a 141. 121 BUAINAIN, Antonio Carlos; VIEIRA, Adriana Carvalho P.; VIEIRA JUNIOR, Pedro Abel. O centro Oeste Brasileiro como Fronteira Agrícola. Disponível em: < http://www.alasru.org/cdalasru2006/07%20GT%20Pedro%20Abel%20Vieira%20Juni or,%20Adriana%20Carvalho%20Pinto%20Vieira,%20Antonio%20Marcio%20Buainai n.pdf >. Acesso em: 15 out 2009. CASTILHO, Denis. A Dinâmica Socioespacial de Ceres/Rialma no Âmbito da Modernização em Goiás. território em movimento, paisagem em transição. Goiânia: UFG, 2009. 188 f. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Goiás, Instituto de estudos Socio-Ambientais, 2009. CHAUL, Nars Fayad. A Contrução de Goiânia e a Transferência da Capital. Goiânia: Ed. da UFG, 1999. p. 21 a 52. CHOMSKY, N. O que o Tio Sam realmente quer. Brasília: editora da Universidade de Brasília, 1999. DAYRELL, Eliane Garcindo. Colônia Agrícola Nacional de Goiás: análise de uma política de Colonização. 1974. Dissertação (Mestrado) - da Universidade Federal de Goiás, Instituto de Ciências Humanas e Letras, Goiânia, 1974. FERNANDES, Arissane D. A Expansão Da Fronteira E A Formação De Uma Ideologia No Brasil. Disponível em:< www.anpuh.org/arquivo/download?ID_ARQUIVO=82>. Acesso em: 20-set-2009. FERNANDES, Luiz Estevam; et. al. A História dos Estados Unidos: das Origens ao Século XXI. São Paulo: Contexto, 2007. p. 126-232. FRANÇA, Maria Sousa. A formação Histórica de Anápolis e sua Área de Influência Regional. Separada dos Anais do VII Simpósio/ ANPUH. Belo Horizonte, 1973. p. 633 a 64. FREITAS, R. A. Anápolis, Fundos Públicos e expansão Urbana: 1957-1997. In: TOSCHI, M. S. (Org.). 100 anos: Anápolis em Pesquisa. Anápolis: 2007. (p. 35 a 45). GODINHO, Iuri Rincon. Médicos e a Medicina em Goiás. Do século XVIII aos dias de hoje. 2 ed. Goiânia: Ed. da UCG, 2005. p. 91 a 93 e 55 a 57. HAGMAN, Larry. Hello darling’: tall (and absolutely true) tales about my life. New York: Simon & Schuster, 2001.p. 84-86 e 152. LENHARO, Alcir. Sacralização da Política. Campinas. 2 ed. Papirus, 1986. p. 53 a 74. p. 53-74. LISITA, Cyro. Fronteira e conflito: O processo de ocupação das terás em Goiás Boletim Goiano de Geografia, 16(1): 29-40, Jan/dez, 1996. LOWELL, Joan. Terra Prometida. São Paulo: Edições Melhoramentos, s/d. 122 MARTIN, Mary. My Heart Belong. New York: Willian Morrow and Company, Inc., 1976. p. 180, 214-217, 254-266, 294-306. MARTINS, Jose de Souza. Fronteira: a degradação do Outro nos confins do humano. São Paulo: Hucitec, 1997. MASKE. W. Panorama da história das relações internacionais do Brasil, 19301995. In: Relações Internacionais no Mundo Atual. Faculdades Integradas Curitiba: Curitiba, 2000. MEDEIROS, Leonilde S. História dos Movimentos Sociais no Campo. Rio de Janeiro: Fase, 1989. p. 23-125. MELLO, GLÁUCIA BURATTO R. Cristãos Ecléticos e a Nova Jerusalem no Planalto Goiano. Rio de Janeiro, 2008. 209 f. Revisão traduzida da tese de doutoramento em Sociologia de: MELLO, GLÁUCIA BURATTO R. Millénarismes brésiliens: Contribution à l’étude de l’imaginaire contemporain. Université de Grenoble II. 1999. p. 15-55. MENDES, MANUEL. O Cerrado de Casaca. Brasília: Thesauros, 1995. p. 409 a 419. MESQUITA, S.Q.N. A Política Cultural norte-americana no Brasil: o caso do OCIAA e o papel das Seleções Reader’s Digest 1940-1946. Rio de Janeiro: UERJ, 2002. 178f. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual do Rio de Janeiro, 2002. P.88-110. MIZIARA, Fausto; SAMAPAIO, Jacinta de Fátima Rolim. Expansão da Fronteira e Grilagem de Terra em Porangatu (GO). In. MAGALHAES, Sonia Maria de; SERPA, Elio Cantalicio (org). Historia de Goiás: memória e poder. Goiânia: Ed. da UCG, 2008. p.35 a 75. POLONIAL, J. M. Anápolis nos Tempos da ferrovia. Anápolis: Associação Educativa Evangélica, 1995. ____________ Ensaios Sobre a História de Anápolis. Anápolis: Associação Educativa Evangélica, 2000. ____________ Anápolis: Das Origens do Povoado a Revolução de 1930. In: TOSCHI, M. S. (Org.). 100 anos: Anápolis em Pesquisa. Anápolis: 2007. p. 15 a 34. ROCHA, H. Anápolis: e Assim se Passaram 100 anos. Goiânia: Kelps, 2007. p. 30-235. SANTOS, R. E. Zé Carioca e a Cultura Brasileira. INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Salvador – 1 a 5 Set 2002. Disponível em: <(SITE)>. Acesso em: 23 Abr. 2009. 123 SAYAO, Lea. Meu Pai, Bernardo Sayao. 3 ed. Sem cidade: Centro Gráfico do Senado Federal, 1976. SCHILLING, V. Estados Unidos e América Latina: da Doutrina Monroe à Alca. Porto Alegre: Leitura XXI, 2002. SILVA, Halline M. S.; SILVA, Suely dos S. Fronteira uma Categoria Histórica. In: Intinerarius Reflectionis: Revista Eletrônica Do curso de Pedagogia do campus da UFG-Jataí, v.II, n. 05, jul/dez-2008. SILVA, Júlia. Bueno. M. O Interior e sua Importância no Projeto Centralizador do Brasil: Anápolis Anos 20-30. Goiânia: UFG, 1997. 93 f. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Goiás, Instituto de Ciências Humanas e Letras, 1997. SILVA, Júlio César dos Santos. A política Norte Americana para as Américas e a Revista em Guarda (1941-1946). In: Anais do XVIII Encontro Regional de História – O historiador e seu tempo. ANPUH/SP – UNESP/Assis, 24 a 28 de julho de 2006. Cd-rom. Disponível em: <http://www.anpuhsp.org.br/downloads/CD%20XVIII/pdf/ORDEM%20ALFAB%C9TI CA/Julio%20C%E9sar%20dos%20Santos%20Silva.pdf>. Acesso em: 18-ago-2009. SILVA, Sandro Dutra. Um Outro Olhar sobre o Lugar: A CANG no Tempo da Fronteira. Goiânia: UFG, 2007. 153 f. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Goiás, Faculdade de Sociologia, 2007. SIMMEL, George. O Estrangeiro. In: MORAES FILHO, Evaristo de (org.). 1983. Simmel – Sociologia. São Paulo: Ática. Coleção Grandes Cientistas Sociais, vol. 34. p.182-188. SOUZA, Candice Vidal e. A Pátria Geográfica: sertão e litoral no pensamento social brasileiro. Goiânia: Ed. da UFG, 1997. p. 109 a 166. TURNER, Frederick Jackson. The Frontier in American History. Nova York: Henry Holt and Company, 1921. Disponível em: <http://www.gutenberg.org/ebooks/22994>. Acesso em: 19 set 2009.