ISSN 0104-4931 GRUPO DE TRABALHO 4: FORMAÇÃO PROFISSIONAL E EDUCAÇÃO PERMANENTE EM TERAPIA OCUPACIONAL Profª. Dra. Andrea Perosa Saigh Jurdi Profª. Drª Katia Penido Bueno Este texto tem a função de servir como disparador para as discussões que irão permear os trabalhos do GT IV que tem como eixo norteador a Formação Profissional e Educação Permanente em Terapia Ocupacional. A formação em Terapia Ocupacional tem sido tema de debates nos últimos encontros de docentes e, a cada encontro, tem oferecido contornos mais amadurecidos e condizentes com a realidade nacional e as políticas de formação em saúde no Brasil. Estas políticas vêm passando por reformulações e mudanças que têm provocado o redimensionamento de cursos de graduação em saúde. Desde 2001, as Diretrizes Curriculares Nacionais para os cursos de graduação da saúde afirmaram que a formação do profissional da saúde deveria contemplar o sistema de saúde vigente no país, a atenção integral em saúde e o trabalho em equipe. A partir desses parâmetros colocou-se a necessidade de que os cursos e universidades revissem suas posições pedagógicas e seus currículos de formação. (Brasil, 2014) Tarefa bastante árdua para docentes cuja formação foi realizada a partir de uma racionalidade inspirada nos domínios de saber das ciências biológicas, do higienismo e sua racionalidade técnica. O editorial do periódico Revista de Terapia Ocupacional USP de 2012 demonstra o quanto a tarefa de repensar a formação ainda precisa de tempo e empenho. O editorial faz um importante balanço de uma década das Diretrizes Curriculares Nacionais e as mudanças de ensino para o SUS na Terapia Ocupacional. Após uma década de reestruturações e inovações ainda são enormes os desafios a serem superados. Segundo o editorial, para a Terapia Ocupacional foi uma década de mudanças: ampliação do número de cursos de graduação, com significativa ampliação de cursos públicos; aumento do número de profissionais e significativa expansão da inserção de profissionais no Sistema Único de Saúde (SUS). Outra questão que tem ganhado mais força nos últimos anos e que reflete na discussão sobre a formação dos terapeutas ocupacionais, são os avanços legais de reconhecimento da profissão em setores outros que não necessariamente respondem ao setor saúde. Em 2010, houve a Revisão da Norma Operacional de Recursos Humanos ISSN 0104-4931 Cadernos de Terapia Ocupacional, UFSCar, São Carlos, v. 22, n. Suplemento Especial. 02, 2014. 349 ISSN 0104-4931 da Política Nacional da Assistência Social que referendou o terapeuta ocupacional como uma categoria profissional a compor as equipes dos serviços socioassistenciais, bem como ocupar cargos de gestão tanto dos serviços como da própria política. Atualmente, amplia-se a contratação de terapeutas ocupacionais via as secretarias municipais de educação que talvez num futuro próximo possamos alcançar um marco legal neste setor. E ainda, há um avanço relativo na discussão da incorporação de terapeutas ocupacionais no setor da cultura. Estas mudanças em processo faz com que continuemos a nos debatemos com a formação de nossos profissionais, com a formação de nossos estudantes e com a formação dos docentes terapeutas ocupacionais para responder as novas demandas apresentadas pela Sociedade. Entretanto, ainda nos deparamos com a racionalidade antes existente, mas que ainda hoje persiste nos modelos de assistência e de gestão setorial em saúde, inspira-se nos domínios de saber das ciências biológicas, e isto está fortemente refletido nos currículos. As Diretrizes levantaram pontos a serem trabalhados na direção da mudança na formação de profissionais de saúde e colocou para os cursos e universidades a necessidade de reverem posições pedagógicas e currículos de formação. Ao propor que os cursos de graduação tenham como eixo norteador a integralidade, novas concepções de saúde e assistência às doenças passam a fazer parte dos currículos. É preciso que os profissionais de saúde sejam formados para compreender a experiência singular do adoecimento e não apenas a doença. Em 2003, o Conselho Nacional de Saúde aprovou a Política Nacional de Educação e Desenvolvimento de Profissionais para o SUS, colocando o conceito de Educação Permanente em Saúde como um caminho de ajustamento entre política de atenção em saúde e política de formação para o trabalho na saúde. Segundo Furlan et al (2014) as instituições de ensino superior foram chamadas a repensar seus projetos políticos pedagógicos, com o desafio de avaliar as práticas de ensino, romper com a tradição de ensino vertical e da transmissão passiva do conhecimento. Mas de que formação se trata? Nessa nova formação que trata de mudanças nas concepções sobre o que seja saúde e assistência às doenças é preciso que o profissional conheça as pessoas que vai atender, seu cotidiano, sua casa. A formação hoje trata de conhecer os diversos cenários da prática de saúde, colocar-se no lugar do outro (em alteridade) para melhor compreendê-lo. Trata-se de conhecer o sistema de saúde vigente no país, saber sua história e se comprometer com ele. Para Ceccim e Pinto (2007) a ISSN 0104-4931 Cadernos de Terapia Ocupacional, UFSCar, São Carlos, v. 22, n. Suplemento Especial. 02, 2014. 350 ISSN 0104-4931 formação e o exercício profissional não podem seguir linhas paralelas no desenvolvimento de sistemas de saúde, eles precisam manter relações orgânicas. Os autores afirmam que há uma relação imediata entre ambos, pois a formação gera serviços, fixação de profissionais, formação de equipes, desenvolvimento e avaliação de tecnologias de cuidado e assistência. A Terapia Ocupacional, da mesma forma que as demais áreas da saúde, enfrenta o desafio de reformular currículos e práticas de processo educacional a partir de uma concepção de saúde voltada para os contextos de vida e não mais para a remissão de sintomas e curas. Temos o desafio de pensar e fazer acontecer a formação de um profissional apto para o trabalho em equipe de maneira interdisciplinar, que possa analisar a complexidade do contexto social de modo a trabalhar mais próximo das culturas populares, de constituir redes cuidadoras entre os serviços de saúde, de estabelecer relações orgânicas entre estruturas de serviço e estruturas de ensino/formação. Dessa maneira, um conjunto de estratégias têm sido deflagradas (Pró Saúde, Pet, Pró-Pet, Residências Multiprofissionais, Mestrados Profissionais) que visam apoiar concretamente as mudanças requeridas pelo SUS. O mesmo editorial do periódico Revista Terapia Ocupacional USP (2012) aborda os aspectos que as DCN estabeleceram para a Terapia Ocupacional, sendo estes em número de 34 aspectos que definem um profissional diferenciado, generalista, humanista e comprometido com uma visão ampliada do processo saúde-doença e inclusão social, com um currículo de formação voltado para o contexto da realidade nacional e coerente com as Políticas Públicas, preparando o profissional para atuar em todos os níveis e programas do SUS, dentro da lógica comunitária e participativa para que possa responder ao desafio da integralidade. Ainda segundo o editorial com a criação da Secretaria de Gestão de do Trabalho e da Educação em Saúde, em 2003, há uma melhor estruturação de apoio à formação de recursos humanos e à educação permanente, além de investimentos na ampliação de programas para induzir o alinhamento da formação para o SUS. No entanto, apesar de tantos avanços, Ceccim e Feuerweker (2004) apontam que a formação é ainda uma das áreas menos problematizadas na formulação de políticas públicas do SUS. ISSN 0104-4931 Cadernos de Terapia Ocupacional, UFSCar, São Carlos, v. 22, n. Suplemento Especial. 02, 2014. 351 ISSN 0104-4931 Um breve histórico No último encontro de docentes realizado em 2012, o GT IV Formação Profissional e Educação Continuada pautou alguns pontos importantes para discussão: - a grande influência de políticas públicas na formação de terapeutas ocupacionais; - forte influência e engajamento da área às proposições advindas das políticas públicas de saúde, assistência social e educação; - reconhecimento profissional junto às políticas públicas e importância da singularidade do olhar e das ações do terapeuta ocupacional; - descompasso entre aumento do mercado de trabalho e a baixa procura pelos cursos de Terapia Ocupacional, colocando em risco o futuro de cursos de graduação; - necessidade de formação continuada dos docentes. Ainda no último encontro a Profª. Kátia Bueno, para subsidiar as discussões, realizou um levantamento das publicações referentes ao tema educação e terapia ocupacional até o ano de 2012. Foram encontradas 13 publicações e apenas uma delas apresentou discussão sobre estruturação curricular. Outros artigos versaram sobre aspectos e propostas específicas presentes na formação, tais como: análise de atividade, uso de narrativas e registros clínicos em sua dimensão educativa. Para atualizar a produção acadêmica da terapia ocupacional em relação ao tema da formação foi feita uma rápida revisão bibliográfica nos periódicos Cadernos de Terapia Ocupacional UFSCar e na Revista de Terapia ocupacional USP, no período de 2013 a 2014, com o descritor formação. Foram encontrados 8 artigos na Revista de Terapia Ocupacional e um editorial que aponta para os progressos da produção acadêmica na área da formação de terapeutas ocupacionais. No periódico Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar foram encontrados 4 artigos. Do total de 12 artigos, no período de um ano, quatro deles volta-se para a temática do ensino de terapia ocupacional a partir da prática de estágios; apenas um deles está voltado para a experiência de revisão de matriz curricular de um curso de graduação. Os outros artigos abordam a análise de formação em áreas específicas da profissão, tais como: terapia ocupacional no campo social, atenção básica, o ensino em saúde mental. Entre os artigos pesquisados no Encontro de Docentes ocorrido em 2012 e o atual podemos observar um amadurecimento em torno das pesquisas que têm a formação e o ensino em terapia ocupacional como foco. ISSN 0104-4931 Cadernos de Terapia Ocupacional, UFSCar, São Carlos, v. 22, n. Suplemento Especial. 02, 2014. 352 ISSN 0104-4931 Porém, ainda temos poucos artigos sobre o processo de revisão de matriz curricular e revisão dos PPPs, assim como não foi possível encontrar artigo que se reportasse aos efeitos dos programas de Mestrado e Doutorado na formação de terapeutas ocupacionais. Nesse sentido, o momento atual nos faz caminhar para discussões que nos levem mais ao como fazer e menos ao por que fazemos. As políticas e diretrizes estão claras e o caminho a ser percorrido nos remete ao como estamos realizando a nossa formação e o impacto que os programas de graduação e pós-graduação têm gerado na formação dos profissionais de Terapia Ocupacional. Além disso, é o momento de nos debruçarmos sobre como estamos pensando e realizando as matrizes curriculares e os PPPs em nossos cursos de graduação. Assim, deixamos algumas perguntas disparadoras para darmos início aos trabalhos de nosso grupo: Como está ocorrendo a inserção de terapeutas ocupacionais nos projetos e programas indutores de formação do Ministério da Saúde – Pro e Pet Saúde? Quantos docentes estão inseridos em projetos de pós graduação? E como esses docentes equalizam as demandas da graduação e da pós-graduação? Como se dá a articulação universidade e serviços públicos e quais os efeitos na formação dos terapeutas ocupacionais dos serviços? Os currículos executados pelas universidades estão respondendo as formações necessárias para a atuação de terapeutas ocupacionais na lógica vigente da política de saúde? E ainda, os currículos executados pelas universidades estão respondendo as formações necessárias para a atuação de terapeutas ocupacionais nas políticas de assistência social, educação e cultura? REFERÊNCIAS BRASIL, Ministério da Saúde. Gestão e Protagonismo Participativo no Ensino e no Trabalho da Saúde. 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