Fundação Getulio Vargas 17/07/2011 Estado de Minas Online - MG Tópico: CPS Editoria: Economia Pg: 07:20:00 Pequenos construtores elegem os próprios bairros para erguer seu negócio Paulo Henrique Lobato O engenheiro Mário Lúcio Ferreira Júnior mostra a região do Jaraguá, onde nasceu, cresceu e investiu O engenheiro Mário Lúcio Ferreira Júnior, sócio da Londres Construções e Incorporações Ltda., ganha a vida erguendo prédios no Jaraguá, onde nasceu e foi criado, e região. Neste ano, espera que sua empresa, de pequeno porte, fature 40% a mais do que em 2010. Já Ricardo Catão tem carinho especial pelo bucólico Santa Tereza, local em que reside há quatro décadas, e pelos tradicionais Floresta e Sagrada Família, todos do lado leste da capital, área em que sua firma, a RC Engenharia e Comércio Ltda., também de pequeno porte, levantou 80% dos imóveis construídos pela empresa. Em 2011, prevê faturar 50% a mais. Os percentuais mostram que vínculos afetivos por regiões específicas possibilitam que pequenos construtores se destaquem no concorrido mercado. O segredo do sucesso, claro, não depende apenas do apego à região. Pelo menos outros dois indicadores favorecem o mercado. Um deles é o aumento do poder aquisitivo das famílias brasileiras. Estatística da Fundação Getulio Vargas (FGV) conclui que 29 milhões de pessoas migraram para a classe C, cuja renda residencial oscilava de R$ 1.126 a R$ 4.854, entre 2003 e 2009. Outro é a expansão do crédito nos últimos anos. Números da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) mostram que os ativos das cerca de 1,4 mil sociedades de crédito do país subiram 30% entre 2009 e 2010, de R$ 52,8 bilhões para R$ 68,7 bilhões, devendo manter o mesmo ritmo em 2011, quando poderá alcançar R$ 88 bilhões. O bom desempenho da economia se reflete no boom imobiliário. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) estima que o setor nacional deve crescer 6% este ano. Para se ter ideia, o Produto Interno Bruto (PIB) da construção civil no primeiro trimestre deste ano foi 2% maior do que o do acumulado dos últimos três meses de 2010. O percentual superou o avanço do PIB nacional – o indicador mede a soma de todas as riquezas do Brasil – em igual intervalo: aumento de 1,3%. As entidades do setor não têm estatísticas acerca do faturamento apenas das pequenas e médias empresas em BH, mas quem atua no mercado ressalta a importância do vínculo com a região em que atuam. “O fato de trabalharmos (apenas) no Jaraguá, Dona Clara e bairros da região facilita acordos com fornecedores e clientes”, afirma Mário Lúcio, formado em engenharia, em 1992, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Dois anos depois, na companhia do pai, “seu” Mário, e do irmão, Marcus Vinícius Ferreira, montou a Londres. O primeiro empreendimento da família teve quatro apartamentos. Atualmente, erguem prédios com oito ou 16 unidades. “São apartamentos de três ou quatro quartos. O preço médio do metro quadrado é de R$ 4 mil. Nosso orgulho, além de atuarmos na região, é não atrasarmos a obra. Conhecer bem a clientela facilita muito. De três anos para cá, vendemos todos os imóveis antes mesmo de terminarmos os edifícios”, disse Marcus. Saudosistas, os irmãos se recordam da infância no Jaraguá. “Dá saudade”, diz Mário. “Muita coisa mudou. Desde 1994, finalizamos ou ainda estamos erguendo cerca de 30 prédios”, afirma o engenheiro enquanto observa, da cobertura do condomínio Londres, a vista da região. AFINIDADE Distante dali, no lado leste da capital, cinco obras em execução na Sagrada Família e uma na Floresta reforçam o carinho que o dono da RC Engenharia e Comércio Ltda. tem por aquelas bandas de BH. “Estou há 20 anos no mercado. Moro no Santa Tereza há cerca de 40 anos e escolhi a Região Leste (para construção de imóveis) porque conheço bem (a área). Digo que 80% dos 40 imóveis que erguemos foram levantados nela. É uma região excelente, próxima ao Centro, à Savassi…”. Construtor individual, “seu” João (nome fictício), que prefere manter a identidade em sigilo, planeja faturar em 2011 até 35% a mais do que em 2010. O segredo, ressalta, é atuar na área em que mora há quase 20 anos. “Resido no Dona Clara e construo imóveis no Liberdade e no São José. Entreguei, em duas décadas de mercado, 10 edifícios. A região mudou bastante de lá para cá”. Pequenas empresas que apostam em regiões específicas, porém, podem sofrer com a supervalorização de terrenos. Diante do desafio, algumas são obrigadas a migrar para outros cantos. “Há lotes em que o dono acha que tem um poço de petróleo. No início, fizemos três prédios no Esplanada. Saímos de lá porque faltam lotes. Atualmente, estamos nos bairros Serra e São Lucas (ambos na Centro-Sul)”, diz Hélio Barbosa, dono da CMB, há 29 anos no mercado e cujo faturamento deve crescer 15% em 2011. MEMÓRIA Quatro empregos em seis horas Daniel Camargos Em 13 de fevereiro, o Estado de Minas mostrou que o déficit de empregados na construção civil soma cerca de 20 mil operários na região metropolitana, segundo estimativa do Sindicato dos Trabalhadores na Construção de Belo Horizonte, mais conhecido como Marreta. Diante do espantoso número, a reportagem percorreu, em seis horas, nove canteiros de obras nas regiões Leste e Nordeste da capital para conhecer de perto a dificuldade dos empresários em conseguir mão de obra qualificada. Em quatro delas, o repórter conseguiu ser aprovado na função de servente de pedreiro, com salário médio de R$ 605. Em todas as visitas, o discurso foi o mesmo: rapaz que havia acabado de chegar do interior e sem experiência na profissão. Logo na primeira obra, o encarregado foi claro ao dizer que a disposição para o trabalho pesava mais do que a experiência. Em outro endereço, dois serventes haviam sido contratados horas antes. Na terceira visita, o responsável admitiu que nenhum servente tinha experiência. Falta mão de obra nos canteiros A demanda aquecida da construção civil contrasta com a falta de mão de obra qualificada, um dos principais entraves ao crescimento das pequenas empresas que atuam em Belo Horizonte. A carência de trabalhadores especializados no segmento, por outro lado, é consequência do bom desempenho da economia brasileira. Isso porque vários pedreiros e serventes preferem trabalhar em reformas, ganhando por dia ou semana, a receber o salário médio das categorias pago por muitos empresários. Em maio, de acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o salário médio pago foi de R$ 583,71. O de pedreiro somou R$ 870,78. “Atualmente, nossa maior dificuldade é mão de obra, pois o mercado imobiliário está aquecido”, diz Marcus Vinícius Ferreira, sócio da Londres Construções e Incorporações Ltda. O bom desempenho do setor, apesar de causar otimismo no engenheiro Luís Eustáquio Cavalieri, da Construtora Ouro, fundada em 1995 e com 60 imóveis erguidos, também o leva a reclamar da oferta de bons profissionais na capital. “Está difícil conseguir mão de obra qualificada”, avalia. Apesar disso, a construção civil é uma das maiores empregadoras do país. Ainda segundo o MTE, o setor abriu 243,1 mil vagas formais em maio passado. No acumulado dos cinco primeiros meses do ano, são quase 1,2 milhão de postos. (PHL)