Artigo Original
Tumor odontogênico ceratocístico: análise de 69 casos
Keratocystic odontogenic tumor: analysis of 69 cases
Antonio Azoubel Antunes1
Rafael Linard Avelar1
Thiago de Santana Santos1
Emanuel Sávio de Souza Andrade2
Edwaldo Dourado3
RESUMO
Introdução: a partir de 2005, uma nova classificação incluiu o
ceratocisto odontogênico como uma entidade dentro dos tumores
odontogênicos, renomeando-o como tumor odontogênico
ceratocístico (TOC), que recebeu nova denominação para
enfatizar sua natureza neoplásica. Pacientes e Método: foi
realizado um estudo retrospectivo no período de janeiro de 1992 a
janeiro de 2007 de pacientes diagnosticados no Laboratório de
Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia de Pernambuco da
Universidade de Pernambuco – FOP/UPE. Foram registrados 238
casos de tumores odontogênicos, dos quais 69 pacientes (30%)
eram portadores de TOC. Resultados: observou-se que 56,5%
eram do gênero masculino, sendo mais freqüente o acometimento
da segunda à quarta décadas de vida. A mandíbula foi a localização
topográfica de maior ocorrência (75,4%), com a proporção de 3:1
em relação à maxila. Setenta e um por cento dos casos mostraramse assintomáticos e a maior parte das lesões variou de tamanho
até 6cm (92,7%). Conclusões: novos estudos de grandes séries
de casos com a inclusão do TOC se fazem necessários, a fim de se
ter maior conhecimento sobre a freqüência relativa dos mesmos
em relação ao novo grupo no qual se enquadram.
ABSTRACT
Introduction: the odontogenic keratocyst was reclassified as a
kind og odontogenic tumor since 2005, in order to emphasize its
neoplastic pattern. Thus, it was renamed odontogenic keratocystic
tumor (OKT). Patients and Methods: a retrospective study was
performed including patients diagnosed at the Laboratório de
Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia de Pernambuco da
Universidade de Pernambuco – FOP/UPE from January, 1992 to
January, 2007. There were 238 cases of odontogenic tumors
registered, from which 69 patients (30%) presented OKT. Results:
a rate of 56.5% were men and most part of the patients age was
from the second to the forth decades of life. The mandible was the
most prevalent site of lesion (75.4%), with a mandible to superior
maxilla ratio of 3:1. A rate of 71% of the patients were asymptomatic, whereas 92.7% of the lesions sizes were less than 6cm in the
larger axis. Conclusions: new future studies including the OKT are
necessary in order to improve the knowledge of its relative
frequence according to its current classification.
Key words: bone cysts; epidemiology; odontogenic tumors;
mandible; maxilla.
Descritores: cistos ósseos; epidemiologia; tumores odontogênicos; mandíbula; maxila.
INTRODUÇÃO
Os tumores odontogênicos têm sido um assunto de considerável interesse para os patologistas orais, que vêm estudando e
catalogando os mesmos durante décadas. Em virtude da
diversidade de lesões que podem surgir dos tecidos odontogênicos, diversos esquemas de classificação foram publicados na
tentativa de definir seus critérios diagnósticos1.
A primeira tentativa de classificar esse grupo de lesões foi
publicado em 1971, após um esforço conjunto, durante cinco
anos, da Organização Mundial de Saúde2. Devido aos avanços
em imunoistoquímica e biologia molecular na última década,
uma segunda edição atualizada da OMS foi publicada em
19923. A partir de 2005, uma nova classificação incluiu o
ceratocisto odontogênico como uma entidade dentro dos
tumores odontogênicos, renomeando-o como tumor odontogênico ceratocístico4.
O tumor odontogênico ceratocístico (TOC) recebeu nova
denominação para enfatizar sua natureza neoplásica.
Histologicamente, mostra uma delgada parede de tecido
conjuntivo composta de epitélio escamoso estratificado, com
uma camada basal de células colunares ou cubóides bem
definidas e com uma camada de superfície ondulada de
paraqueratina. A parede cística subjacente contém pequenos
cistos-filhos e ninhos epiteliais sólidos. Quando infectados, as
características histológicas típicas são substituídas por um
epitélio não queratinizado estratificado. Raramente o TOC
desenvolve-se para uma displasia epitelial ou um carcinoma
espinocelular4.
O TOC ocorre nas faixas etárias de 7 a 93 anos de idade, com
maior incidência na segunda e terceira décadas de vida, com
uma pequena prevalência pelo gênero masculino, sendo mais
comumente encontrado na região de terceiro molar inferior e
ramo ascendente da mandíbula5.
Radiograficamente, apresenta uma área radiotransparente
bem diferenciada, com cortical marginal bem definida. Lesões
1) Residente de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade de Pernambuco.
2) Doutor em Patologia Bucal pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); Professor da Disciplina de Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia de Pernambuco
(FOP/UPE).
3) Doutor em Estomatologia pela Universidade de Barcelona/ESP; Professor da Disciplina de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Faculdade de Odontologia de Pernambuco
(FOP/UPE).
Instituição: Laboratório de Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia de Pernambuco – Universidade de Pernambuco (FOP/UPE).
Correspondência: Antonio Azoubel Antunes, Rua Guilherme Pinto, 345/303 – 52010-210 Recife, PE. E-mail: [email protected]
Recebido em: 20/03/2007; aceito para publicação em: 23/04/2007; publicado on line em 10/06/2007.
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Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 36, nº 2, p. 80 - 82, abril / maio / junho 2007
grandes, particularmente na região posterior e ramo ascendente da mandíbula podem apresentar-se multinucleadas e, em 25
a 40% dos casos, um dente incluso mostra-se envolvido na
lesão e o aspecto radiográfico sugere o diagnóstico de cisto
dentígero5.
O objetivo do estudo foi o determinar o comportamento
epidemiológico dessas lesões em um período de 15 anos
(1992-2007), já as incluindo na nova classificação de tumores
da OMS (2005) e comparar com os achados da literatura
mundial.
PACIENTES E MÉTODO
Foi realizado um estudo retrospectivo no período de janeiro de
1992 a janeiro de 2007 de pacientes diagnosticados no
Laboratório de Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia
de Pernambuco da Universidade de Pernambuco – FOP/UPE.
Foram registrados 238 casos de tumores odontogênicos, dos
quais 69 pacientes (30%) eram portadores de TOC, com idade
entre 10 e 84 anos (média de 31 anos). Foram analisados os
indicadores gênero, faixa etária, localização topográfica,
presença de sintomatologia dolorosa e tamanho da lesão.
RESULTADOS
Com relação ao gênero, 56% eram do masculino e 44% do
feminino. A distribuição dos pacientes por faixa está no gráfico
1, onde se nota prevalência da segunda à quarta décadas.
Gráfico 1 – Distribuição dos pacientes por faixa etária.
Quanto à distribuição dos pacientes por localização topográfica, 75% das lesões ocorreram em mandíbula (52 casos) e 25%
em maxilar superior (17 casos). Quantos à sintomatologia
dolorosa, 49 pacientes (71%) eram assintomáticos, enquanto
20 (29%) apresentavam queixa. O gráfico 2 mostra a distribuição das lesões conforme o tamanho.
Gráfico 2 – Distribuição por tamanho da lesão (cm).
DISCUSSÃO
Os aspectos epidemiológicos relatados na literatura confirmam
a necessidade de um diagnóstico precoce para a programação
de um correto tratamento cirúrgico e redução do risco de
recidivas6. Os TOC são lesões clinicamente agressivas que se
originam da lâmina dentária ou seus remanescentes7, com alta
taxa de recorrência relacionada provavelmente aos resíduos do
epitélio cístico e potencial intrínseco de crescimento após a
excisão8.
O TOC não parece crescer como resultado do aumento de
pressão osmótica, mas sim por fatores inerentes desconhecidos do próprio epitélio ou por uma atividade enzimática da
cápsula fibrosa5. Por possuir tais características, já era
apontado como um neoplasma cístico benigno e, após a nova
classificação da OMS de 2005, o mesmo foi enquadrado no
grupo dos tumores odontogênicos benignos4.
Apesar de já estabelecida sua inclusão na nova classificação,
ainda é raro encontrar na literatura mundial grandes estudos de
séries de casos de tumores odontogênicos já incluindo o TOC,
ainda o referindo como ceratocisto odontogênico, argumentando necessitar de uma oficialização da literatura mundial e
maiores evidências sobre o mesmo ser um tumor9-11. Tal
situação torna impossível, até o momento, determinar sua
freqüência relativa dentro desse grupo de tumores.
Analisando os dados obtidos em relação ao gênero, o TOC
apresentou discreta predileção pelo masculino (56,5%) quando
comparado ao feminino (43,5%), na proporção de 1:1,29. Tal
achado corrobora com a literatura, que aponta o referido gênero
como o mais prevalente5,10,12.
Concernente à faixa etária, da segunda a quarta décadas de
vida foram as mais freqüentes, com extremos etários entre 10 e
84 anos e média de 31 anos (Gráfico 1). Outros estudos
mostram uma idade média de 45,89 e 13,4 anos10, divergindo
dos dados obtidos. A predileção pelas referidas décadas de vida
concordam com outros dados obtidos13.
A mandíbula foi a localização topográfica de maior ocorrência
(75,4%), com a proporção de aproximadamente 3:1 em relação
à maxila (24,6%). Já se apontou uma proporção de pouco mais
de 2:1 do osso mandibular em relação à maxila, evidenciando
também uma maior ocorrência neste sítio14.
A forma intra-óssea é a mais freqüente6,7 e pode estar associado
à síndrome de Gorlin ou síndrome do carcinoma nevóide
basocelular14,15. Em relato de 33 casos de pacientes portadores
de síndrome do carcinoma nevóide basocelular ou de GorlinGoltz, encontrou-se o TOC em 90,9% dos casos16.
As lesões de maior tamanho podem estar associadas à
sintomatologia dolorosa, tumefação ou drenagem. Entretanto,
algumas extremamente grandes podem mostrar-se assintomáticas, não existindo uma regra para a presença de sintomatologia associada. No presente estudo, a sintomatologia dolorosa
esteve presente em 29% dos casos, enquanto a maioria das
lesões (71%) de diferentes tamanhos apresentou-se assintomática. Em estudo em uma população de Singapura, encontrou-se um percentual de sintomatologia dolorosa em 9,9% dos
casos, ainda menor que os encontrados aqui14.
Em relação ao tamanho das lesões, o Gráfico 3 demonstra que
a maioria das mesmas media até 6cm. Os autores não acharam
relação entre a presença de sintomatologia dolorosa e o
tamanho das mesmas, sendo essa distribuição aleatória,
conforme demonstram os achados da literatura5.
Os TOC já devem ser incluídos nos estudos de série de casos
de acordo com a nova classificação da OMS para um detalhamento do perfil de comportamento dentro de um novo grupo de
doenças, otimizando seu diagnóstico e tratamento.
CONCLUSÕES
O TOC parece ter uma discreta predileção pelo gênero
masculino, pelas segunda a quarta décadas de vida e pelo osso
81
mandibular e, em sua grande maioria, apresentam-se assintomáticos. Novos estudos de grandes séries de casos com a
inclusão do TOC fazem-se necessários, visando maior
conhecimento sobre a freqüência relativa em relação ao novo
grupo no qual se enquadram.
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