O DESAFIO DE ENSINAR E APRENDER CIÊNCIAS: UMA EXPERIÊNCIA DOCENTE NO ENSINO FUNDAMENTAL COSTA, Arlete Fatima Coradelli da – UNIGRAN [email protected] ARAÚJO, Juliana Muniz – UNIGRAN [email protected] MISSIRIAN, Giani Lopes Bergamo – UNIGRAN [email protected] Área Temática: Educação: Práticas e Estágios nas Licenciaturas Agência Financiadora: Não contou com financiamento. Resumo Embora o conhecimento científico seja fundamental, ele não é suficiente no processo de ensino-aprendizagem, pois também é essencial considerar o desenvolvimento cognitivo dos estudantes, relacionar a seu cotidiano, para que a aprendizagem seja significativa. Desse modo, a experiência do estágio supervisionado é de suma importância, não só por unir teoria a prática, mas por propiciar a reflexão acerca da realidade do ensino. Neste sentido, este trabalho teve como objetivo relatar as experiências vivenciadas durante o estágio supervisionado no ensino fundamental, em uma escola estadual, no município de Rio Brilhante, MS. As atividades de docência foram realizadas em abril e maio de 2008, com duas turmas de 7º ano, compreendendo: leitura, demonstração, utilização de mapa conceitual, pesquisa no laboratório de informática e montagem de painéis. A partir de um questionário aplicado no início e final da docência, observou-se que, no final, os alunos consideraram os fungos como seres vivos com seu próprio reino, atuando como decompositores sobre a matéria orgânica, participando na produção de alguns alimentos, como pães, e alguns sendo benéficos e outros maléficos para o ser humano. Diante das atividades desenvolvidas, concluise que é possível ministrar aulas diferenciadas e satisfatórias em uma escola pública, tendo os alunos como participantes ativos, favorecendo a aprendizagem dos conceitos científicos. Também pôde-se constatar a importância do estágio supervisionado tanto para o crescimento individual quanto coletivo, pois houve um amadurecimento e crescimento profissional, entendendo assim que a importância, disciplina e vontade do professor em sala de aula faz a diferença no aprendizado do aluno. Palavras-chave: Ensino de ciências; Fungos; Recursos didáticos. Introdução 12236 No estágio atual do ensino brasileiro, a formação biológica deve contribuir para que cada indivíduo seja capaz de compreender os processos e conceitos biológicos e a importância da ciência e da tecnologia na vida moderna, utilizando o que aprendeu ao tomar decisões de interesse individual e coletivo, tendo em vista a responsabilidade e respeito do papel do ser humano na biosfera (KRASILCHIK, 2004). A ciência é uma prática social indispensável ao desenvolvimento da sociedade, constituindo-se na forma mais eficiente de gerar conhecimento significativo tanto para resolução como para encaminhamento de muitos problemas humanos (VALE, 1998). Porém, embora o conhecimento científico seja fundamental, ele não é suficiente, pois também é essencial considerar o desenvolvimento cognitivo dos estudantes, relacionando a suas experiências, sua idade, ou seja, a seu cotidiano, para que a aprendizagem seja significativa (BRASIL, 1998). Assim, a manutenção de condições para um bom ensino de Ciências na escola depende dos esforços de seus professores ou mesmo do trabalho individual de um docente (KRASILCHIK, 1987). Para Moura e Vale (2003), os professores devem enfatizar atividades que favoreçam a espontaneidade do aluno e seus conceitos cotidianos, permitindo que (o aluno) construa noções necessárias para a compreensão da ciência. Porém, é necessário considerar a diversidade presente nos diferentes alunos, nas diferentes salas de aula, nas diferentes escolas, visto que o aluno é um sujeito social, histórico e cultural, e não um sujeito universal (OLIVEIRA, 1999). Desse modo, pode-se constatar que a experiência do estágio supervisionado é de suma importância, não somente pela prática da profissão, mas também porque une teoria a prática e propicia reflexão acerca da realidade do ensino (PICONEZ et al., 2004). Nesse contexto, este trabalho teve como objetivo relatar as experiências vivenciadas durante o estágio supervisionado no ensino fundamental, em uma escola estadual, no município de Rio Brilhante, MS. Desenvolvimento A escola localiza-se no centro da cidade e oferece ensino fundamental e médio, nos períodos matutino, vespertino e noturno, além da Educação de Jovens e Adultos (EJA), no período noturno. 12236 12237 A escola é destaque no município, no estado e no Brasil, pelo Prêmio Nestlé de Literatura, recebido em 2005. Neste mesmo ano, também recebeu o Prêmio Gestão Escolar, onde foi considerada a melhor escola pública estadual do centro-oeste, tornando-se um orgulho para a comunidade escolar e para Rio Brilhante, pois se classificou entre as seis melhores escolas públicas estaduais do Brasil. É a maior escola do município, contendo 10 salas de aula, sendo uma para alunos portadores de necessidades especiais; uma biblioteca muito bem estruturada não somente pelo prédio em si, mas também pelo seu acervo, com livros de literatura, livros didáticos, além de outros meios de comunicação como jornais e revistas, onde todo e qualquer material pode ser utilizado tanto pelo aluno quanto pelo professor; e um laboratório de informática amplo, muito bem cuidado e organizado, com acesso a internet, disponibilizado para uso dos professores e alunos. Os recursos audiovisuais compreendem: dois videocassetes, dois televisores e um retroprojetor. Como a escola não possui laboratório de Ciências, tenta sanar sua falta com modelos do corpo humano, que podem ser utilizados na sala de aula ou na biblioteca pelos professores de Ciências. Disponibilizar uma boa infra-estrutura é importante porque como afirma Pontilli (2005) quanto melhor equipada e bem estruturada for a escola, menor será a evasão escolar. Além disso, para Silva e Moradillo (2002) esta boa infra-estrutura ainda facilita e permite o acontecimento de trabalhos pedagógicos mais convenientes, melhorando o aprendizado e a motivação do aluno. As atividades de docência foram realizadas em abril e maio de 2008, com duas turmas de 7º ano, sendo uma no período matutino e outra no vespertino, contendo cerca de 34 alunos, cuja faixa etária variou entre 13 a 16 anos. Em cada turma foram ministradas seis horas-aula. No geral, as turmas eram unidas, tinham uma boa interação, mas eram pouco motivadas. Sabendo-se que aquilo que o aprendiz já conhece influencia sua aprendizagem, por isso a importância de descobrir o que ele sabe e basear nisso os ensinamentos (AUSUBEL et al., 1980), identificou-se os conhecimentos prévios dos alunos sobre fungos por meio da aplicação de um questionário para que expressassem o que são fungos, onde são encontrados e se são úteis ou prejudiciais ao ser humano. Percebeu-se que os alunos acreditavam que fungos eram bactérias ou plantas, sendo encontrados apenas em cima da terra, como em 12237 12238 florestas e troncos de árvores, e que são prejudiciais aos seres humanos, não trazendo benefício algum. Com base nisso e seguindo as orientações de Brasil (1998), as aulas foram planejadas selecionando problemas que correspondessem a situações interessantes a interpretar no que se refere as características quanto a adaptação ao ambiente e também as interações dos fungos com o ser humano, com outros seres vivos e com o ambiente, e utilizando diferentes métodos ativos (como demonstração, discussões, textos para obter e comparar informações, entre outros) para despertar o interesse dos estudantes pelo conteúdo. No primeiro dia, a turma foi organizada em semicírculo na sala de aula, pois segundo Cury (2003) organizá-los dessa forma melhora a concentração, criando um ambiente agradável. Iniciou-se a leitura de um texto, distribuído aos alunos, que não era do livro didático utilizado pela professora titular, observando que sua leitura constitui um recurso e não a aula, cabendo ao professor problematizá-lo e fornecer novas informações que direcionem a compreensão do conceito pretendido (SONCINI; CASTILHO Jr., 1990). Cada aluno leu uma pequena parte do texto para que os conceitos fossem introduzidos, visto que segundo Brasil (1998) a leitura no ensino fundamental não se deve restringir apenas a Língua Portuguesa, pois em Ciências Naturais oportunidades para ler representam um momento de estudo e elaboração de uma linguagem específica do conhecimento científico. Sabendo-se que aulas de demonstração servem, principalmente, para apresentar espécimes, e justificam-se quando não há material em quantidade suficiente para toda a turma (KRASILCHIK, 2004), ao término da leitura e introdução dos novos conceitos, foram expostos exemplares de fungos, como o champignon, que é um tipo de cogumelo comestível, o bolor, presente em uma laranja, e o fermento biológico, utilizado tanto na fabricação do pão quanto na produção de bebidas alcoólicas, como a cerveja. Alguns alunos acabaram provando o champignon e a maioria achou desagradável seu sabor. A participação deles reforçou a idéia de Krasilchik (1987), que o aprendizado de Ciências deve incluir não somente habilidades de observação, mas também a de manipulação para a formação de suas próprias idéias. A aula acabou por surpreender até mesmo a professora titular, pois acreditava que poderia “virar bagunça” e o “controle da turma” fosse perdido. Na segunda aula, utilizou-se um mapa conceitual do livro didático de Ciências Naturais, Aprendendo com o Cotidiano, de Canto (1999), como recurso no processo de 12238 12239 ensino-aprendizagem, pois somente a leitura é insuficiente para dar aos alunos uma visão de como as idéias são realmente apresentadas (KRASILCHIK, 1987). Para Hennig (1994), uma representação gráfica possibilita a identificação de inter-relações e conexões importantes, que de outra forma poderiam passar despercebidas. Ruiz-Moreno et al. (2007) destacam que trabalhar com mapas conceituais pode representar mais um caminho no percurso de um ensinar e um aprender significativo. Ao considerar o aluno como sujeito de sua aprendizagem, ele é quem deve construir explicações, com a intervenção fundamental do professor, informando, apontando relações, questionando, exemplificando (BRASIL, 1998). Por isso, enquanto interagia-se com os alunos, as palavras-chave do mapa conceitual, escritas em pedaços de cartolina, eram fixadas no quadro-negro e escrevia-se o que estava faltando, relembrando os conceitos discutidos. A participação dos alunos foi satisfatória, muitos perderam a timidez, e quando tinham dúvidas, alguns chamavam até a carteira e outros perguntavam em voz alta. A aula tornou-se mais agradável e interessante e os conceitos ficaram mais inteligíveis. No terceiro dia de aula, a professora titular questionou se algo não seria passado no quadro-negro para os alunos copiarem, pois em sua opinião é necessário que se tenha algum conteúdo no caderno por motivo de futuro questionamento dos pais. Assim, algumas questões abertas foram aplicadas valendo um ponto, de modo que para respondê-las os alunos, em duplas, consultaram seu livro didático e o texto entregue na primeira aula. As dúvidas eram esclarecidas à medida que surgiam. A participação dos alunos foi notada até mesmo pela professora titular, que os achou bem animados e interessados em responder. Na quarta aula, os alunos foram ao laboratório de informática, acomodando-se cada dois alunos em um computador. Os tópicos pesquisados por cada dupla compreenderam: primeiro grupo: benefícios e malefícios dos fungos (Na natureza e no ser humano); segundo grupo: penicilina e alimentação (A descoberta e a importância da penicilina e quais e onde encontramos fungos na alimentação-receitas); terceiro grupo: importância dos fungos e das leveduras (Na decomposição da matéria orgânica e na fabricação de alimentos-como ocorre esse processo); quarto grupo: tipos de fungos (exemplos de fungos, como e onde vivem). Durante a aula, alguns alunos apresentaram dificuldades em função da falta de prática de digitar e não em relação ao conteúdo. Sempre que surgiam dúvidas eles chamavam, sendo, na maioria das vezes, somente para reforçar e certificar-se de que era aquilo mesmo que haviam encontrado. As informações foram organizadas e utilizadas na construção de um 12239 12240 painel. Ambas as turmas foram bem participativas e motivadas a pesquisar e produzir a síntese, confirmando então o que afirma Brasil (1998) que o computador além de ser uma ferramenta como pesquisa bibliográfica, permite criar ambientes de aprendizagem que fazem surgir novas formas de pensar e aprender. Contudo, este mesmo documento ainda destaca que os computadores não substituem as tarefas básicas e essenciais dos estudantes e professores, mas apenas ampliam as possibilidades de sua atuação. No término da aula, foi pedido aos alunos que levassem na próxima aula algumas figuras de fungos ou alguma outra informação que eles acreditassem ser interessante colocar no painel, ou ainda o que gostariam que os outros alunos vissem e conhecessem sobre o tema que cada dupla apresentaria. Na quinta aula, foram levadas cartolinas e papel sulfite para iniciar a montagem dos painéis. As informações obtidas no laboratório de informática foram transcritas para o papel sulfite e, para ilustrar, alguns alunos desenharam e pintaram um cogumelo, outros trouxeram o fungo, como orelha-de-pau, e poucos trouxeram figuras de revistas ou da internet, já que a maioria não possui computador em casa. À medida que os trabalhos ficavam prontos, eram colados nas cartolinas. Na última aula, antes da exposição dos trabalhos, foi distribuído o mesmo questionário aplicado no início da docência para avaliar o conhecimento dos alunos sobre fungos. O questionário final evidenciou que os alunos de ambas as turmas obtiveram muitos acertos em relação ao questionário inicial, expressando-se com palavras e até mesmo em desenhos aquilo que foi discutido durante as aulas. Os fungos já não foram considerados bactérias ou plantas, mas seres vivos com seu próprio reino, atuando como decompositores sobre a matéria orgânica, participando na produção de alguns alimentos, como pães, e alguns sendo benéficos e outros maléficos ao ser humano. Pôde-se perceber que os alunos responderam com mais clareza as perguntas do questionário, queriam mostrar que haviam entendido o conteúdo e que haviam gostado de produzir os painéis. Com o término do questionário, estes foram expostos no quadro-negro e os alunos sentiram-se orgulhosos do trabalho desenvolvido, todos queriam explicar e mostrar onde e como tinham chegado àquelas informações e conclusões. 12240 12241 Conclusão Com o término do estágio supervisionado, conclui-se que os objetivos foram alcançados, pois foi possível ministrar aulas diferenciadas e satisfatórias em uma escola pública. Também pôde-se constatar a importância do estágio supervisionado tanto para o crescimento individual quanto coletivo, pois houve um amadurecimento e crescimento profissional, entendendo assim que a importância, disciplina e vontade do professor em sala de aula faz a diferença no aprendizado do aluno. Além disso, a dedicação e o amor ao trabalho influenciam a obtenção do sucesso na carreira profissional, pois sem essas qualidades o trabalho se torna árduo e cansativo. REFERÊNCIAS AUSUBEL, D.; NOVAK, J. D.; HANESIAN, H. Psicologia educacional. 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