Memórias de um sargento de milícias de Manuel Antônio de Almeida Um romance excêntrico na produção romântica do Brasil Informações importantes sobre a produção romântica brasileira • • • • Primeiro romance: O filho de pescador – 1843 Primeiro sucesso: A Moreninha – 1844 Teatro romântico brasileiro: O Noviço – 1845 Memórias de um sargento de milícias foi publicado em folhetim no suplemento dominical do Correio Mercantil, a Pacotilha entre 1852 e 1853 e, embora tenha obtido muito sucesso entre o público, foi recebido com silêncio pela crítica da época que estranhou os procedimentos pouco convencionais utilizados pelo jovem Manuel Antônio de Almeida, ainda estudante de medicina na época de sua publicação. Como eram, tradicionalmente, os romances da época? • A maioria dos romances eram traduzidos de autores europeus. • As personagens eram da classe dominante (burguesia). • A fronteira entre o bem e o mal era claramente estabelecida, tendo a trama um herói e um vilão diametralmente opostos. • A temática principal era sempre sentimental. • O estilo era predominantemente poético, com a utilização de uma linguagem elevada. Quais as diferenças principais encontradas no livro de Manuel Antônio de Almeida? • Quando publicado em livro, (1854 e 1855), era assinado simplesmente pela inscrição “Por um brasileiro”, o que o distinguia dos romances traduzidos. • A história não envolve personagens da classe dominante, mas sim pessoas de baixa renda. • A personagem central não é nem herói e nem vilão, mas um típico antiherói malandro. • As cenas são reais e apresentam aspectos muito pouco poéticos. • Não há moralismos na divisão das ações humanas entre boas e más. • O livro é muito mais humorístico do que sentimental. • O estilo é oral e descontraído, derivado do estilo jornalístico daquele tempo. Vamos ao enredo: LEONARDINHO – filho de uma pisadela e de um beliscão. MARIA DAS HORTALIÇAS – sua mãe, solaia, mulher rústica da feira, quitandeira nos últimos tempos. LEONARDO PATACA – seu pai, algibebe, alafaiate ou vendedor de roupas inferiores. Leonardinho é uma criança endiabrada desde muito pequena. Fruto de uma pisadela que seu pai dera no pé direito de sua mãe, a qual foi retribuída com um beliscão nas costas da mão esquerda. Os dois se conheceram no navio vindo para o Brasil, na época da chegada do rei D. JoãoVI por aqui (1808). Ambos de passado escuso em Portugal, foram morar juntos quando desembarcaram no Rio de Janeiro. Quando Leonardinho tinha sete anos, sua mãe foi pega em flagrante de adultério por seu pai. Ela fugiu para Portugal com o capitão do navio, seu amante, e o pai, após dar um pontapé no traseiro de Leonardinho, o abandonou com seu padrinho, o barbeiro. O PADRINHO – chamado de compadre no livro, o padrinho de Leonardinho é barbeiro. Apropriou-se indevidamente, no passado, de uma arca com dinheiro do capitão de um navio negreiro e abriu sua barbearia. Depois disso tornou-se uma pessoa de bem e não vê no menino todos os defeitos percebidos pela vizinhança em geral. A MADRINHA – chamada também de comadre, a madrinha é parteira e foi quem fez o parto de Leonardinho. É caracterizada como tia de Chiquinha no início do livro, mas depois aparece como mãe da menina com quem Leonardo se casa. Está sempre pronta a socorrer o genro nas confusões em que se mete ao longo da história e, após a morte do compadre, vai tratar da reaproximação entre Leonardinho e seu pai. A VIZINHA - personagem secundária, a vizinha não perde uma chance de provocar o compadre, por causa das diabruras do afilhado. Enquanto Leonardinho é educado por seu padrinho, que sonha mandá-lo para Coimbra ou torná-lo padre, seu pai faz de tudo para não perder o amor da cigana com quem se engraçara após a fuga de Maria das Hortaliças. Leonardo chega a recorrer aos serviços de um feiticeiro, (atividade proibida no Rio de Janeiro daquela época), para tentar recuperar sua amante. Por envolver-se com esse tipo de prática, Leonardo acaba preso pelo Major Vidigal e só é solto por causa dos apelos da comadre ao Tenente-Coronel. Leonardinho já tinha, a essa altura, provado ao padrinho sua total incompetência para os estudos e conseguido a troca da escola pelo emprego de sacristão na igreja, sob a guarda do Mestre-de-Cerimônias, que também tinha lá os seus pecados e com quem nosso herói vai aprontar muitas de suas estripulias. TENENTE-CORONEL – Pai do moço que desvirginara Maria das Hortaliças em Portugal, antes desta conhecer Leonardo, vivia no Brasil e sentia-se em eterna dívida com a família. MAJOR VIDIGAL – representante da lei e da ordem no Rio de Janeiro. Era ele quem prendia, julgava, condenava e aplicava a pena aos réus. Era considerado consciencioso e equilibrado. MESTRE-DE-CERIMÔNIAS – o padre responsável pela igreja na qual Leonardinho “trabalhava” e que tinha roubado a cigana de seu pai, pois tinha um caso com ela. Leonardo conseguiu desmascará-lo na frente de todos (foi pego de cuecas, meias pretas, sapato de fivelas e um gorrinho) e, assim, pôde unir-se à sua amante por mais uns tempos. Leonardo engana o mestre-de-cerimônias sobre o horário de uma missa que ele deveria celebrar em uma festa religiosa, causando uma grande confusão. Antes, ele já tinha sido responsável por um “acidente” em que derrubara cera derretida na vizinha dentro da igreja. Tudo isso foi mais do que suficiente para o fim de vida religiosa de nosso “herói”. D. MARIA – a única personagem realmente rica do livro. D. Maria era uma mulher que tinha mania de demandas judiciais e que havia conseguido a guarda de Luisinha, uma rica herdeira, sua sobrinha. LUISINHA – a personagem feminina mais importante do romance. É descrita inicialmente pelo narrador como uma menina feia, extremamente tímida e que já havia perdido as graças de menina sem ainda ter atingido as de mulher. JOSÉ MANUEL – sujeito de mais ou menos trinta e cinco anos que encantou-se com a condição de herdeira de Luisinha e acabou casando-se com ela. Leonardinho já era um moço a essa altura do livro. Quando conheceu Luisinha, que havia ido morar com sua tia, D. Maria, após esta ter vencido uma demanda pela posse da sobrinha, logo apaixonou-se por ela; ainda que a tenha achado “engraçada” da primeira vez que a viu. Percebeu, porém, que José Manuel estava interessado na moça e criou, junto a seu padrinho e também à comadre, uma forma de impedir que os dois acabassem se casando. Antes que a situação de Luisinha fosse resolvida, o padrinho adoeceu e faleceu, tendo nomeado o afilhado como seu herdeiro universal, deixando-lhe uma boa quantia em dinheiro. O pai, Leonardo, sabendo do ocorrido, prontificou-se a cuidar de seu filho. Estava agora casado com Chiquinha, a filha da comadre e os dois (a menina e Leonardinho, quase da mesma idade), não se davam nada bem. A situação na casa torna-se insustentável em pouco tempo, ocasionando uma nova discussão que faz com que Leonardo corra atrás do filho de espada em punho. O menino, que nunca esquecera o pontapé que levara aos sete anos, sai de casa sem destino e só pára quando encontra um grupo de jovens reunidos, cantando e festejando. TOMÁS-DA-SÉ – era o menino que havia trabalhado na sacristia junto com Leonardo quando eram crianças. Ele o reconhece e o convida para juntar-se ao grupo que era composto de três irmãos homens, primos de duas mulheres também irmãs. VIDINHA – mulata de cerca de vinte anos, dengosa e insinuante é uma das mulheres do grupo, exímia cantora de modinhas que fascina imediatamente Leonardo. Leonardinho, apaixonado por Vidinha, aceita o convite do grupo para ficar alguns dias na casa em que moram. Luisinha, sentindo-se abandonada, não tem porque não aceitar a proposta de casamento de José Manuel. Abençoados por D. Maria, os dois casam-se. Na casa de Vidinha, Leonardinho assume-se como um completo vadio e, denunciado pelos primos da moça, enciumados, acaba sendo preso por não fazer nada. No caminho da cadeia, porém, o malandro consegue fugir, voltando para a casa onde estava. Sua madrinha, informada de sua prisão e sem saber que escapara, foi tentar interceder em seu favor junto ao Major. Acaba sabendo de tudo e, inconformada com a vadiagem do afilhado, consegue arranjar-lhe um emprego. Como era de se esperar, este logo se mete em um novo problema, tendo se envolvido com a amante de um colega de trabalho que após bater nele consegue sua demissão. Para completar, Vidinha, louca de ciúmes, se insinua para o excolega de Leonardinho e este acaba finalmente preso pelo Major e, como castigo, é nomeado soldado. É claro que, mesmo como defensor da lei, Leonardinho não se emenda e acaba novamente preso por novas malandragens. Desta vez, sua madrinha só vai conseguir sua liberdade com a ajuda de Maria Regalada, que havia sido amante do Major Vidigal no passado. Maria Regalada não conseguiu apenas a liberdade de Leonardo, mas também sua nomeação como sargento de milícias. Finalmente, Leonardo reencontra Luisinha, que acabara de ficar viúva e, passado o período de luto, casa-se com ela. Ao final, Leonardo Pataca e D. Maria também morrem, deixando o casal numa situação financeira muito confortável, já que as heranças do padrinho de Leonardo, de Luisinha e de sua tia acabam somadas pelo casamento. Aspectos fundamentais da obra de Manuel Antônio de Almeida: • Narrativa de costumes, muito voltada para a descrição das ruas e das festas populares. • Utilização do português coloquial do Rio Joanino (época de D. João VI). O livro pode funcionar como um registro lingüístico do período. • Apesar da palavra “Memórias” no título, não se trata de uma autobiografia. A obra é escrita é terceira pessoa. • O texto possui propriedades do romance histórico e, desta forma, entende-se o sentido da palavra “Memórias”. • Constantes referências do narrador ao leitor – estabelecimento de um diálogo amigável com o público do jornal. • O livro mantém o equilíbrio emocional das personagens, ridicularizando qualquer transbordamento emotivo.